O documento resume o filme brasileiro "O céu de Suely" do diretor Karim Aïnouz. A protagonista Mila tenta a vida em São Paulo mas volta para sua pequena cidade natal Iguatu. Ela inventa a personagem Suely para vender uma rifa e ganhar dinheiro. O filme captura a vida cotidiana de Iguatu de uma forma poética e descontraída, misturando ficção e documentário.
Uma visita ao Salão Internacional do Humor de Piracicaba é apresentada aqui, quando dois amigos, Carlos Elson L da Cunha e Marco Aurélio de Paula, visitam a cidade. Estudando Arquitetura e Urbanismo no Mackenzie ambos focam a questão urbana e o design nos cartazes. Como alguns cartazes são meio sutis, Carlos Elson explica a piada em cada um deles. Confira. Contato em criarefazer@hotmail.com Ah, novidade: Marcão já anda com celular. Imposição da mãe...
Sagarana - leitura obrigatória da FUVEST 2018Luiz Felipe
Os 3ºs anos matutinos da E.E. Ilda Vieira Vilela, participaram ao longo de dois bimestres, de um projeto referente às nove leituras obrigatórias do vestibular FUVEST 2018, onde cada uma das 4 salas ficaria responsável por duas obras, apresentadas nos dois primeiros bimestres de 2017.
O 3ºA teve como primeira obra a ser explorada "O Cortiço", romance naturalista escrito por Aluísio de Azevedo e agora, como segunda obra, foi explorada "Sagarana", uma coletânea de contos do sertão, de autoria de João Guimarães Rosa. Através desse projeto, foi possível compreender cada um dos nove contos, seus personagens, as influências históricas da época, o movimento literário e correntes de pensamento presentes, uma pequena biografia do autor, além de praticar esse conhecimento em questões de vestibulares.
Parabéns, 3ºA!
Uma visita ao Salão Internacional do Humor de Piracicaba é apresentada aqui, quando dois amigos, Carlos Elson L da Cunha e Marco Aurélio de Paula, visitam a cidade. Estudando Arquitetura e Urbanismo no Mackenzie ambos focam a questão urbana e o design nos cartazes. Como alguns cartazes são meio sutis, Carlos Elson explica a piada em cada um deles. Confira. Contato em criarefazer@hotmail.com Ah, novidade: Marcão já anda com celular. Imposição da mãe...
Sagarana - leitura obrigatória da FUVEST 2018Luiz Felipe
Os 3ºs anos matutinos da E.E. Ilda Vieira Vilela, participaram ao longo de dois bimestres, de um projeto referente às nove leituras obrigatórias do vestibular FUVEST 2018, onde cada uma das 4 salas ficaria responsável por duas obras, apresentadas nos dois primeiros bimestres de 2017.
O 3ºA teve como primeira obra a ser explorada "O Cortiço", romance naturalista escrito por Aluísio de Azevedo e agora, como segunda obra, foi explorada "Sagarana", uma coletânea de contos do sertão, de autoria de João Guimarães Rosa. Através desse projeto, foi possível compreender cada um dos nove contos, seus personagens, as influências históricas da época, o movimento literário e correntes de pensamento presentes, uma pequena biografia do autor, além de praticar esse conhecimento em questões de vestibulares.
Parabéns, 3ºA!
Apresentação das obras de leitura obrigatória de Literatura de UFPR de 2023.
Sagarana, Quarto de despejo, Morte e Vida severina, Nove noites, O uraguai.
Sérgio Helle revisita o tema com retratos em técnica mista sobre tela. Perfil Cearense é uma exposição que pretende resgatar a importância do retrato como registro artístico de uma época e sociedade específicas. Foram retratadas pessoas de diferentes segmentos da cidade de Fortaleza, que se destacaram em suas áreas de atuação e representam o momento atual da sociedade em que estão inseridas. Perfil Cearense, a segunda incursão do artista plástico Sérgio Helle no universo do retrato, é um mosaico contemporâneo dos diversos talentos urbanos que formam a Fortaleza do século XXI.
1. Imagens: divulgação
CULTURA
cinema
O céu de Suely, ao rés-do-chão
O filme de Aïnouz coroa o amadurecimento do cinema brasileiro
contemporâneo, afirmando uma nova estética, que se diz “hiper-
realista”, aberta ao real, mas lúcida sobre seu caráter construído
Leandro Saraiva
Acenda a luz de leve tudo já viu. Mas aí ele, mais os ato- apresenta no improviso da vida.
eu lhe mostro uma beleza res, foram viver em Iguatu um tem- Hermila, Mila, para os amigos e famí-
bola de neve po, preparando e se preparando para lia, não está reinventando a poesia,
a filmagem. O povo de lá, acostuman- como Bashô, lá no século 17, em suas
Será que vale falar de um filme brasi- do com eles e sem saber da tal viagens a pé pelas estradas do Japão
leiro contemporâneo, muito contem- ficcional Barcelona, devolvia a ironia: feudal. Mas ela quer reinventar a sua
porâneo, que parece ter sido feito “e os artistas, quando chegam?”, vida. Por paixão, como conta para sua
hoje de manhã, citando um haicai ja- diziam, rindo daquele cinema que se tia e amiga, Maria, foi “feito uma lou-
ponês do mestre Bashô, que viveu no fazia vizinho. Caiu a ficha do Karim: ca” para São Paulo. De lá voltou com
século 17? Acho que vale. que Barcelona que nada, é Iguatu Mateuzinho, filho dessa paixão, pre-
Nada a ver com samurais, apesar da mesmo. E é. E por mais que já se te- parando o terreno para a volta do pai.
errância de Hermila, a protagonista nha visto, é preciso aprender a ver. Volta prosaica e também muito con-
de O céu de Suely. Também não pa- temporânea: o jovem Mateus pai, fi-
rece bom apelar para alguma preten- Improviso da vida A possível afini- camos sabendo, vai logo chegar de
sa “condição humana”. Afinal, dade entre a viagem poética de Bashô São Paulo com uma copiadora de CDs
Hermila foi tentar a vida em São Pau- e a de Karim Aïnouz está nessa busca e DVDs, para vender pirataria na pra-
lo, ralou, se virou e resolver voltar ao de um olhar inaugural, pré-codifica- ça de Iguatu. No mundo digitalizado
Nordeste, para a sua minúscula do, ao que surge a cada momento, de não existe centro (só periferia e repres-
Iguatu. Estamos bem longe de algum modo imediato. Nas entrevistas que são, seja na paulistana Santa Efigênia,
deserto místico ou deu, o diretor de O céu em Iguatu ou em Bombaim).
mítico, onde “o Ho- O CÉU DE SUELY de Suely conta que Mas a aventura e a paixão engripam:
mem vaga”. Iguatu é direção Karim Aïnouz esse foi o lema íntimo Mateus e sua copiadora não vêm mais
Iguatu mesmo. Karim roteiro Karim Aïnouz, Felipe que adotou na realiza- e Mila está solta no espaço. Ou talvez
Aïnouz conta que no Bragança, Maurício Zacharias ção do filme: “deixa seja melhor dizer, rodando no vazio.
roteiro o lugar cha- fotografia Walter Carvalho eu ver”. Prestar aten- Tudo isso acontece logo de cara, sem
mava-se Barcelona, produção Videofilmes, 2006 ção no ínfimo, nos in- suspenses, e ficamos nós ao sabor da
talvez meio por piadi- 88 min terstícios da vida. Nada deriva inquieta de Mila, naquele lu-
nha de moço cosmo- de grandes histórias, gar que é dos seus – de sua avó costu-
polita – Karim viveu entre Recife, Nova de plot, como se diz nos manuais de reira, de uma amiga prostituta de pos-
Iorque e Rio – que se volta para o roteiro. Cinema como exercício de to de gasolina, de sua tia motoqueira
interior profundo, com ares de quem olhar, de abrir os olhos para o que se e do também motoqueiro João, um
42 | Retrato do BRASIL | REPORTAGEM
2. antigo, discreto mas ainda apaixona- rido, um destaque na paisagem, é ção dessa mercantilização. O céu de
do namorado – mas não é mais dela. todo uma figura, um personagem”, Suely cria uma aura de fantasia subje-
Como tantos e tantos brasileiros e mas que no fundo, diz o autor, mui- tiva em torno da mercantilização de si
brasileiras, Mila caiu na vida, não exa- to auto-irônico, “é gente como a (da prostituição); uma transcendência
tamente atrás de “um sonho” (como gente, a gente sente, pois se aperta em relação à mercantilização pobre e
dizem os trailers dos filmes norte- ele chora. E ele vagueia, vagueia”. precária que subsume a tudo e todos
americanos), mas atrás da vida mes- Mila poderia se reconhecer nessa le- na beira de estrada que é Iguatu, cuja
mo, de si própria, talvez. tra que trata poeticamente da inqui- economia, ao que parece, se equilibra
Como disse o antropólogo Otávio etude paulistana, filha da mais exas- nos gastos dos caminhoneiros que
Velho recentemente em entrevista à perada manifestação de nossa circulam por ali.
revista CartaCapital, “não há mais modernidade capitalista periférica. Não é apenas o sertão cinemanovista,
grotões”. Rompido esse isolamento, ou mesmo as releituras alegóricas do
o sertão de Iguatu não só já não está Escândalo e fascínio Mila, que já che- cinema da retomada, que parecem, à
mais para Diadorins, Lampiões, deu- ga em Iguatu “toda colorida”, de ca- luz de O céu de Suely, datados. Tam-
ses e diabos, como também não serve belo meio escuro, meio loiro, inventa bém a beira de estrada de Iracema,
como espaço de redenção ao estilo que vai novamente embora e para isso uma transa amazônica (1973), filme
de Central do Brasil. Mila parte, volta se reinventa como a personagem Suely, de Jorge Bodanzky e Orlando Senna,
e parte de novo. Está “correndo moça que vende uma rifa que vale parece ter ficado para trás.
atrás”, como diz a expressão popular “uma noite no paraíso”, com ela pró- Ali, há mais de três décadas, pela do-
que, sem objeto, caracteriza tão bem pria, num motel da cidade. Nessa cumentação da realidade de beira de
nem tanto alguma “condição huma- reinvenção de si, ela, que não quer estrada da Transamazônica, era figu-
na”, mas uma condição comum a tan- “ser puta – puta vai com qualquer um rada a degradação social criada como
tos brasileiros, que não encontram e só vou com o ganhador da rifa” – efeito secundário da modernização
lugar – nem trabalho – e, por isso nem ser “porra nenhuma”, como diz conservadora em curso no regime mi-
mesmo, não param de encontrar e para sua tia, Mila/Suely permite um litar, que mercantiliza precariamente o
reinventar, fazendo da angústia uma olhar também reinventado sobre sua País. Agora, na Iguatu de Suely, essa
companheira de viagem, sempre no- experiência. mercantilização claudicante está ple-
vos lugares e afazeres. São Paulo, Primeiro, porque nessa passagem à namente estabelecida. É dentro dela
para onde Mila partiu, é a metrópole personagem, ela sintetiza e mantém a que Mila, jovem de 21 anos, nasceu,
que concentra esses andarilhos con- ambivalência entre várias determina- cresceu, viajou, voltou e se rifou. Sua
temporâneos e faz dessa condição, ções e reações. Ela se revaloriza: de postura, de consciência e reação a essa
de quem “corre atrás”, sem saber subempregada (Mila lava carros num condição, é parente de outra persona-
muito do que, nem como, um modo posto de gasolina) e abandonada pelo gem marcante do cinema brasileiro re-
de ser. Como numa célebre canção marido, ela passa a ser o centro das cente: em Edifício Master (2002),
do Grupo Rumo, sintomaticamente atenções de Iguatu. Os homens com- documentário de Eduardo Coutinho,
entitulada Esboço, na qual Luiz Tatit pram em peso sua rifa e as famílias se Alessandra, garota de programa, cheia
descreve o “paulistano” como “in- escandalizam. O escândalo e o fascí- de charme, lúcida de seu desempenho
quebrável, flexível”, “meio deliran- nio vêm menos do corpo oferecido como entrevistada, se diz “a mentiro-
te, meio inconseqüente, muito colo- como mercadoria do que da denega- sa verdadeira” e produz uma “mistura
de espontaneidade e de teatro, de au-
tenticidade e de exibicionismo, de um
fazer-se imagem e ser verdadeiro”
(como disse o crítico Ismail Xavier).
Ambas escapam ao ressentimento, que
marcou parte importante do cinema
da retomada, se reinventado como
imagem, o que as valoriza, justamente
por escancararem a fatura dessa inven-
ção. São mulheres do povo que tomam
Diferente do Cinema Novo, em O céu
de Suely predomina a câmera no
tripé. Mas, esse procedimento não é
onipresente: há momentos de câmera
na mão – o filme não deixa de aderir
mais fortemente às variações
emocionais da personagem, que se
entrega a momentos de intensidade e
transbordamento
REPORTAGEM | Retrato do BRASIL | 43
3. para si a “magia” de se fazer imagem abandonada pelo marido, reaproxima- contracenando com os atores, mas tam-
e mercadoria, tão crucial na sociedade se de um ex-namorado, rompe com ele, bém nas filigranas do estilo.
contemporânea brasileira. inventa a rifa, briga e se reconcilia com Essa indistinção de fronteiras entre
Mas O céu de Suely tem outras bele- a família. Mas tudo isso acontece por documentário e ficção, marcante no
zas, que surgem a partir dessa meio de saltos e elipses, com o rumo da cinema moderno, no mundo em ge-
“assunção” de Mila ao céu de Suely. personagem sendo composto às apal- ral e no cinema brasileiro especifica-
Assim como Mila foge dos papéis a padas, sem destino certo (ela vagueia, mente, é brilhantemente retomada
ela reservados, inserindo-se na gale- como diz Tatit). em O céu de Suely, colocando seu
ria de personagens modernos, mar- autor entre um grupo de continuado-
cados pela deriva e não pelo cumpri- Sem fronteiras Desobrigado da nar- res desse cinema de fronteira –
mento de uma missão, o modo de rativa cerrada e dos sistemas de con- Kiarostami e Makmalbaf, Agnés
olhar – o cinema como modo de trole funcional da emoção (ou seja, Varda, Jem Cohen, para citar alguns
reinventar o olhar – para sua experi- do espectador), o filme se abre ao ime- novos e velhos cineastas que trilham
ência também se abre para o não-co- diato. Somos mergulhados nos ambi- esse caminho estreito.
dificado. É aí que o cinema de Karim entes de Iguatu – a casa pobre da fa- Mas O céu de Suely o faz de modo
Aïnouz revela mais afinidades com a mília, as ruazinhas, o posto de gasoli- muito próprio. Diferencia-se, em termos
poética do fragmento, do insignifican- na, sempre repleto de caminhoneiros, estilísticos, da famosa câmera na mão,
te e do contingente, típica do haicai. centro da vida social – pelos quais o que deu o tom documental aos mo-
O modo que o filme nos dá a ver a olhar também vagueia. Os atores es- mentos de auge do Cinema Novo. No
experiência de Mila e do outros habi- tão também desobrigados de rígidas filme de Karim, predomina a câmera no
tantes de Iguatu é também um esfor- marcações de cena, de coreografias tripé. Um certa suavidade melancólica e
ço de desautomatização. de posições de câmera calculadas em contemplativa, mais do que a urgência
De início, trata-se de uma narrativa de função dos efeitos necessários à amar- da câmera na mão. Sinal, talvez, de ou-
situações, muito mais do que de pro- ração e progressão narrativa. Se mo-
gressão dramática. Cada seqüência fixa- vem de modo livre, com a câmera se
se num instante existencial – uma noite submetendo a essa liberdade, para Mila/Suely caiu na vida: está
onde o filho de Mila chora e ela olha o captá-la. “correndo atrás”, como muitos
céu; um passeio de moto com um anti- É esse modo de operação que abre o brasileiros, que não encontram
go namorado; uma balada e bebedeira filme a uma dimensão documental, fa- lugar e nem trabalho e fazem da
com a amiga prostituta –, muito mais zendo dele uma ficção que se esboça angústia uma companheira de
viagem. São Paulo, para onde foi a
do que serve ao avanço e modulação em meio e em tensão com o ambiente
personagem, é a metrópole que
de alguma curva dramática. Os fios da real de Iguatu (e não de “Barcelona”). concentra os andarilhos
narrativa vão se tecendo de forma tê- Isso está não apenas nas cenas em que contemporâneos e torna essa
nue. Mila chega e parte novamente, é se incorporam pessoas reais, do local, condição um modo de ser
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4. de limites e sufoco. Há, entretanto, pe- quase em preto e branco.
quenos momentos, preciosos e fugidi- Essa síntese entre espontaneidade e
os, de detalhes flagrados, delicadamen- construção altamente elaborada (a
te recortados do contexto e como que serviço e reforço da espontaneidade)
bordados nos interstícios do fluxo de foi resumida pelo próprio diretor, que,
imagens, como a pipa presa nos fios de com felicidade, caracterizou sua pos-
eletricidade ou a água caindo no corpo tura nos seguintes temos: “O filme
da protagonista, durante o banho (são tem o desejo, o tempo inteiro, de brin-
as “bolas de neve” da poesia de Karim car e se apropriar do real. Mas tem
Aïnouz). também um desejo, maior do que
O procedimento do tripé, se predo- esse, que é dizer que não tem real, é
mina, não é onipresente. Há momen- tudo uma construção. O filme não é
tos de câmera na mão, colada ao cor- neo-realista, ele é hiper-realista”.
Karim Aïnouz (acima), Marcelo
po de Hermila (nome tanto da atriz
Gomes e Sérgio Machado são como quanto da personagem). Se o filme Atencão e detalhe É importante perce-
um time afinado. Nesse sentido, O não se constrói como uma curva dra- ber que O céu de Suely não é uma flor
céu de Suely não é uma exceção, mática, ele não deixa de, por vezes, do deserto, surgida de modo surpre-
surgida de modo surpreendente e oscilar, aderir mais fortemente às va- endente e inexplicável. É resultado de
inexplicável – é resultado do riações emocionais de Mila, que, im- um amadurecimento. Por um lado, de
amadurecimento desse grupo, que
pulsiva e visceral, volta e meia se en- um grupo, com debate interno e coe-
desenvolve o debate interno e a
coesão estética, apesar das trega a momentos de intensidade e são estética, apesar das diferenças de
diferenças de estilos transbordamento. estilos entre os filmes de seus autores.
Como nas baladas, filmadas em closes Marcelo Gomes (Cinema, aspirina e
bem fechados, à flor da pele e em te- urubus), Sérgio Machado (Cidade bai-
leobjetiva, o que transmite uma sen- xa) e Karim Aïnouz (Madame Satã e O
tra relação com o real, que escapa e que sação de sensualidade exasperada. céu de Suely) constituem, senão um
se quer flagrar. O Cinema Novo violen- Ou, nos momentos líricos com João – movimento, um grupo esteticamente
tava o real, levado pelo impulso revolu- suaves, como no passeio de moto que afinado, como há muito não se via no
cionário do qual fazia parte. Hoje, em precede o encontro sexual (filmado cinema nacional. Buscam um cinema
Iguatu ou em São Paulo, no país de com movimentos de grua, na estrada) de atenção e detalhe, de embate com
Mila e dos espectadores contemporâ- ou na câmera na mão do encontro ambientes e personagens reais. Dife-
neos, os tempos são outros e a inquie- final, de ruptura. São momentos de renciam-se, assim, tanto da honorável
tação de Mila e seu embate com seu irrupção da intensidade da persona- tradição cinemanovista, de pendor ale-
ambiente se processa em termos indivi- gem, em meio àquela condição de górico, quanto da produção cinema-
duais. De certa forma, o peso do mun- tolhimento de seu impulso de mudan- tográfico-televisiva, que tem em Guel
do, de suas limitações, parece maior ça e de busca. Arraes e Jorge Furtado seus expoen-
nesses enquadramentos fixos, dentro A fotografia do filme é um achado. De tes, que parte da constatação do mun-
dos quais Mila vive e se debate. grande beleza, sem que em nenhum do tornado imagem, impossibilitando
momento se destaque desse corpo-a- – na visão deles – outra postura crítica
Um achado A combinação entre liber- corpo do mundo que caracteriza o fil- que não a da metalinguagem e da des-
dade de improviso para os atores e me de modo geral. A iluminação res- construção. Karim Aïnouz e seus com-
câmera fixa resulta numa parcimônia de peita a luz dos ambientes. É feita do panheiros cinematográficos acreditam
planos, em geral mais abertos (dando sol a pino nordestino, no meio da rua, na possibilidade de um corpo-a-corpo
espaço às interpretações). Dois ou três mas também de uma luz lateral que com o real que não descarta consciên-
ângulos são suficientes para dar conta entra por uma porta estreita na casa cia da construção discursiva (daí o
da ação, deixando entrar e impregnar modesta, das luzes quentes de um “hiper-realismo”).
no quadro a materialidade dos ambi- forró, ou das luzes frias do posto de Como base para esse movimento es-
entes, sem que essa se dissolva numa gasolina. Fica nítido que a montagem tético em ascensão, há a Videofilmes,
montagem volátil e frenética. A casa da da luz para a filmagem apenas refor- guarda-chuva não apenas dos filmes
avó de Mila impregna as ações com seu çou, sem alterar, o jogo de luzes local. do Walter Salles – com sua antiguida-
peso e precariedade; o posto aparece Mas isso se faz com tal organicidade e de entre redenção cristã e momentos
como um palco estático, atravessado harmonia com os momentos da histó- de flerte com a “ida ao mundo”, de
por um movimento incessante de cami- ria, que a luz se torna quase como uma impulso documental –, mas também
nhoneiros. Apesar da liberdade conce- emanação dos tons da experiência: o dos documentários de João Salles, de
dida aos atores, nos ambientes inter- calor sensual de um dança ou a prosai- Eduardo Coutinho e desse trio de
nos, de pouca luz e apertados, o campo ca melancolia de uma pausa no traba- nordestinos – Sérgio Machado, Mar-
focal é curto, o que restringe a faixa lho, num dos planos mais bonitos do celo Gomes e Karim Aïnouz – que des-
dentro da qual se concede essa liberda- filme, quando Mila enche um balde pontam como o futuro mais promis-
de de movimentos e reforça a sensação nos fundos do posto, numa imagem sor da cinematografia nacional.
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