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LLIICCIITTAAÇÇÃÃOO SSUUSSTTEENNTTÁÁVVEELL
BIDDING SUSTAINABLE
Vanessa de Azevedo Guimarães1
Marinella Machado Araújo2
Resumo: Este trabalho apresentou um estudo sobre a possibilidade de adoção da licitação
sustentável face ao atual ordenamento jurídico brasileiro. Seu objetivo foi fundamentar a imposição
do instituto a partir de uma interpretação sistemática da legislação vigente o que permitiu constatar
que sua aplicabilidade atende aos fundamentos do Estado Democrático de Direito. A
sustentabilidade como pressuposto de validade no processo licitatório exige que a busca pela
proposta mais vantajosa atenda ao interesse público em todas as suas acepções. Para tanto, com
base no direito a proteção do meio ambiente ecologicamente equilibrado, explicitou que critérios
ambientais e sociais permitem um uso mais eficiente e responsável dos recursos públicos por meio
da diminuição das externalidades negativas e análise dos ciclos de vida. Por ser o desenvolvimento
sustentável um desafio global foram contextualizadas as iniciativas sustentáveis que permitiram a
introdução do instituto da licitação sustentável a nível internacional. A licitação sustentável é um
dever do Estado, e não mera faculdade uma vez que a Constituição da República Federativa do
Brasil de 1988 impõe ao Poder Público e à coletividade o dever de defender e preservar o meio
ambiente para as presentes e futuras gerações.
Palavras-chave: Licitação sustentável. Interesse público. Desenvolvimento Sustentável.
Abstract: This paper focused on a study about the utilization of sustainability aspects in public
procurement processes in the light of the Brazilian legal system. The main objective was to
substantiate the imposition of the subject taking into consideration a systematic interpretation of the
current legislation which led to the conclusion that its application fulfills the fundaments of the
Democratic State of Law. Sustainability as a premise of validity in the public procurement process
assumes the selection of the most beneficial proposal that completely fulfills the public interests in
all its meanings. Therefore, considering the rights to protect an ecologically balanced environment,
this study demonstrated that social and environmental criteria endure a more efficient and
responsible use of public resources by reducing the negative external effects and life cycle analysis.
Since sustainability development is labeled as a global challenge, similar international initiatives
that made possible the introduction of sustainability in public procurement processes were also
taken into consideration. Sustainable procurement processes are an mandatory to the State, not
merely a discretion once the Constitution of the Federative Republic of Brazil of 1988 imposes on
1 Acadêmica do curso de Direito da Faculdade Mineira de Direito da Pontificia Universidade Católica de Minas
Gerais.
2 Advogada doutora em direito administrativo, professora dos cursos de Graduação e Pós-Graduação em Direito da
PUC Minas, coordenadora do Núcleo Jurídico de Políticas Públicas do Programa de Pós-Graduação em Direito e
coordenadora de pesquisa da Faculdade Mineira de Direito da PUC Minas
the Government and on the community the duty to defend and preserve the environment for present
and future generations.
Keywords: Sustainable public procurement. Public Interest. Sustainable Development
1 INTRODUÇÃO
O presente artigo tem a finalidade de demonstrar a necessidade da adoção do instituto da
licitação sustentável face ao atual ordenamento jurídico. A exigência de critérios sociais e
ambientais no processo licitatório coaduna com a legislação vigente a partir de uma interpretação
sistemática uma vez que impõe ao Poder Público e à coletividade o dever de defender e preservar o
meio ambiente para as presentes e futuras gerações.
Sendo assim, não obstante o aperfeiçoamento da legislação, será demonstrado ao longo
desse estudo, a necessidade da adoção da licitação sustentável como forma de garantir o Estado
Democrático de Direito, o interesse público e direitos fundamentais como a proteção do meio
ambiente ecologicamente equilibrado.
Atenta-se que por ser um instituto jurídico recente, os diversos argumentos e opiniões entre
os especialistas estão sendo construídos a fim de aperfeiçoar a sua aplicabilidade no sistema
brasileiro.
2 LICITAÇÃO SUSTENTÁVEL
2.1 Conceitos e principais características
A Constituição da República Federativa do Brasil consagrou em seu artigo 37, inciso XXI, a
obrigatoriedade da adoção da licitação pela Administração Pública direta e indireta de qualquer dos
Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços,
compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação
pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com
cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições
efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as
exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do
cumprimento das obrigações. (BRASIL, 1988)
Nos ensinamentos Celso Antônio Bandeira de Mello, licitação:
[...] é o certame que as entidades governamentais devem promover e no qual
abrem disputa entre os interessados em com elas travar determinadas
relações de conteúdo patrimonial, para escolher a proposta mais vantajosa às
conveniências públicas. (MELLO, 2006, p.503)
José dos Santos Carvalho Filho, apresenta a seguinte definição:
[...] procedimento administrativo vinculado por meio do qual os entes da
Administração Pública e aqueles por ela controlados selecionam a melhor
proposta entre as oferecidas pelos vários interessados, com dois objetivos –
a celebração do contrato, ou a obtenção do melhor trabalho técnico, artístico
ou científico. (FILHO, 2009a, p. 226)
Hely Lopes Meirelles destaca a eficiência e moralidade na atuação da Administração
Pública:
[...] procedimento administrativo mediante o qual a Administração Pública
seleciona a proposta mais vantajosa para o contrato de seu interesse. Como
procedimento, desenvolve-se através de uma sucessão ordenada de atos
vinculantes para a Administração e para os licitantes, o que propicia igual
oportunidade a todos os interessados e atua como fator de eficiência e
moralidade nos negócios administrativos. (MEIRELLES, 2004, p.266)
A finalidade principal da licitação, qual seja, seleção da proposta mais vantajosa possui sua
base no interesse público ao atender precipuamente o interesse da coletividade e das conveniências
públicas. Para isso, todo o processo de licitação deve-se ater as situações do caso concreto e ao
momento em que a sociedade vive.
A Constituição da República de 1988 foi pioneira no Brasil ao consagrar expressamente a
importância do meio ambiente ecologicamente equilibrado com base, primordialmente, em seu
artigo 225. Estabeleceu, ainda, que a ordem econômica deve assegurar a todos existência digna
conforme os ditames da justiça social observado o princípio da defesa do meio ambiente.
A licitação sustentável busca integrar critérios ambientais, sociais e econômicos em toda
tomada de decisão no processo licitatório. Para avaliação desses critérios deve ser considerada a
real necessidade de aquisição do produto ou serviço, a disponibilidade de estudos e tecnologias
sustentáveis, o ciclo de vida e descarte.
A licitação sustentável é uma solução para integrar considerações
ambientais e sociais em todos os estágios do processo da compra e
contratação dos agentes públicos (de governo) com o objetivo de reduzir
impactos à saúde humana, ao meio ambiente e aos direitos humanos.
(ICLEI-LACS; GVces, 2008, p.21)
O desenvolvimento sustentável de acordo com o Relatório de Brundtland da Comissão
Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento da ONU, é o “desenvolvimento que satisfaz as
necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras satisfazerem suas
próprias necessidades.”
Além disso, a sustentabilidade não reflete apenas uma preocupação ambiental em um
sentido mais estrito, mas atinge diversas outras acepções sociais e econômicas. O desenvolvimento
sustentável compartilha a idéia de uma sociedade mais justa e redistribuição dos recursos como
incentivo ao crescimento econômico.
Atualmente é cada vez mais nítida a preocupação da sociedade e da gestão pública com a
defesa do meio ambiente em todos os níveis de tomada de decisões.
A expressão licitação sustentável é utilizada para designar o processo licitatório que integra
os critérios econômicos, sociais e ambientais a todos os estágios do processo regulado pela Lei n°
8.666, de 21 de junho de 1993. Para a escolha da proposta mais vantajosa é atribuído maior
benefício ao ambiente e a sociedade com base no interesse público e na promoção do
desenvolvimento sustentável. É também conhecido como compras públicas sustentáveis ou
compras verdes.
A licitação sustentável pode ser considerada forte instrumento para a promoção da
preservação do meio ambiente. O Estado, como um dos principais compradores de bens e serviços,
tem um papel fundamental no mercado competitivo. Seu poder de compra pode fomentar uma
mudança na produção e consumo de bens sustentáveis ao exercer suas funções de fiscalização,
incentivo e planejamento da atividade econômica, com base no artigo 174 da Constituição.
A proposta mais vantajosa é a que melhor atende aos objetivos da licitação e ao interesse
público entendidos de forma a garantir que a gestão pública tome decisões de minimizar as
externalidades e promover ações que considerem o desenvolvimento sustentável.
Para isso, a proposta deve ser analisada em um contexto mais amplo, ou seja, a escolha deve
considerar o interesse público em todas suas acepções. O critério apenas econômico tendo em vista
o menor preço poderia levar o próprio Estado, ao não analisar os critérios ambientais e sociais, a
afrontar sua própria legislação e, até mesmo, utilizar-se de forma irresponsável os seus recursos
financeiros. E, ainda, tendo em vista discussões sobre os fenômenos do aquecimento global, fazem-
se urgente atitudes e decisões das autoridades governamentais a fim de barrar a degradação do meio
ambiente.
2.2 Ordenamento jurídico e interpretação sistemática
A Constituição da República de 1988 foi pioneira no Brasil ao consagrar expressamente a
importância do meio ambiente ecologicamente equilibrado e reservar um Capítulo inteiro para seu
tratamento.
A Constituição brasileira de 1988 (Título VII), seguindo e aprimorando a
linha “sistêmica” adotada pelo constitucionalismo nacional, exige
interpretação pela interinfluência e conexão dos dispositivos sempre
referidos a “princípios”, os quais corporificam e definem a sua “ideologia”.
(SOUZA, 2002, p. 289)
A própria ordem econômica e financeira brasileira adotou o princípio da defesa do meio
ambiente. A idéia de desenvolvimento sustentável é enunciada pelo artigo 170 como princípio geral
da atividade econômica que tem como fim assegurar a todos existência digna conforme os ditames
da justiça social.
A Constituição Federal apresenta, mais uma vez, a importância da sustentabilidade em seu
artigo 225:
Art. 225 Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,
bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-
se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo
para as presentes e futuras gerações. (BRASIL, 1988)
A Lei de Política Nacional do Meio Ambiente n° 6.938, de 31 de agosto de 1981 foi
importante marco da sistematização da tutela ambiental. Ainda que anterior a própria Constituição
sua recepção proporcionou o nascimento do Direito Ambiental Brasileiro como ciência autônoma.
A referida lei objetiva harmonizar a preservação ambiental ao desenvolvimento sócio-
econômico e à proteção da dignidade da vida humana.
Art. 2º A Política Nacional do Meio Ambiente tem por objetivo a
preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida,
visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento sócio-econômico,
aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida
humana [...].
Art. 4º A Política Nacional do Meio Ambiente visará:
I - à compatibilização do desenvolvimento econômico-social com a
preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico.
(BRASIL, 1981)
Cumpre mencionar ainda a fim de demonstrar a preocupação do Estado com o meio
ambiente a Lei n° 7.347, de 24 de julho de 1985 que disciplina a Ação Civil Pública de
responsabilidade por danos causados ao meio ambiente e a Lei de Crimes Ambientais Lei n° 9.605,
de 12 de fevereiro de 1998 que dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de
condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e outras providências.
Pois bem. Atualmente o modelo de gestão e tomada de decisão dos administradores buscam
ampliar efetivamente esse equilíbrio entre o meio ambiente e o desenvolvimento sócio-econômico.
Pois, já ultrapassado conceber o desenvolvimento econômico e financeiro desatrelado a proteção
ambiental conforme consagrado pela própria Constituição.
O ordenamento jurídico brasileiro deve ser entendido como um todo em suas idéias e
aspirações. A Constituição Federal consagrou a proteção do meio ambiente como princípio
fundamental e, assim sendo, não poderá norma infraconstitucional contrariá-la.
O processo licitatório como instrumento essencial da gestão pública deve garantir o
princípio constitucional da defesa do meio ambiente. Além disso, sua interpretação deve
harmonizar-se com todo o ordenamento jurídico, em particular, com os objetivos da Política
Nacional do Meio Ambiente.
A interpretação jurídica é sistemática, ou seja, deve assinalar o sistema como um todo a fim
de compreender e alcançar a melhor solução para o caso concreto e garantir o Estado Democrático
de Direito.
Frise-se, ademais, que a ampliação do conceito de interpretação sistemática,
ora promovida, é proporcional àquela praticada quanto ao conceito de
sistema jurídico. Em outras palavras, a interpretação sistemática, em tal
visada, mais compatível com as presentes funções multifacetadas do Direito
contemporâneo, é bem mais do que descobrir o sentido e o alcance de
comandos legais, senão que é desvendar o alcance sistemático de cada
princípio, norma ou valor. Dito de outro modo, verdadeiramente a
interpretação sistemática, quando compreendida em profundidade, é a que
se realiza em consonância com a rede hierarquizada, máxime na
Constituição, tecida por princípios, normas e valores considerados
dinamicamente e em conjunto. Assim, ao se aplicar uma norma, está-se
aplicando o sistema inteiro, razão pela qual desassiste razão àqueles que
tentam fazer concentrar, por exemplo, direitos fundamentais apenas num
dado ponto normativo do sistema. (FREITAS, 1998, p.61)
Ademais, a interpretação do Direito Administrativo não pode ser considerada de forma
isolada, deverá ser sistemática, principiológica e hierarquizada. Conforme ensinamentos de Juarez
Freitas:
Assim, qualquer disposição, v. g., relativa às licitações públicas apenas pode
alcançar o seu esclarecimento teleológico em confronto com os princípios
máximos da Lei Maior. De resto, toda a legislação infraconstitucional em
matéria administrativa tem que ser lida sob o prisma dos mesmos princípios
fundamentais da Constituição, buscando-se a plena conformidade
sistemática da norma com os princípios, nunca o contrário, se se quiser
instauração da efetividade da dimensão teleológica do processo
interpretativo. (FREITAS, 1998, p.167)
A Administração Pública tem a finalidade de concretizar os efeitos determinados pelas
normas jurídicas, “nem é, pois, que ela se submete ao Direito, mas tão-somente que ela é o próprio
Direito tornada movimento realizador de seus efeitos para intervir e modificar a realidade social
sobre a qual incide.” (ROCHA, 1994, p.82).
Nesta relação, considera-se que o Direito tem que ser o mesmo, seja em sua formulação ou
em sua aplicação e concretização almejando a harmonia do Estado.
Desta maneira, a Administração deverá agir em consonância e compatibilidade com o
sistema jurídico vigente em atenção ao princípio da legalidade administrativa ou juridicidade.
A lei n° 8.666/93 que estabelece as normas gerais de licitação indica em seu artigo 3°, caput,
que deverão ser observados os princípios constitucionais. Não obstante, a aplicação e interpretação
da lei de licitações devem abranger o princípio constitucional do desenvolvimento sustentável.
O direito a proteção ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é um direito
fundamental, conforme artigos 225 e 170 da Constituição, portanto deve ser garantido por todo o
ordenamento jurídico.
A Política Nacional do Meio Ambiente, lei n° 6.938/81, também, promove o
desenvolvimento sustentável como dever do Estado, e não mera faculdade.
A licitação sustentável não é vedada pelo ordenamento jurídico por não afrontar nenhum
dispositivo legal. Pelo contrário, a Constituição Federal, a Política Nacional do Meio Ambiente e a
própria Lei de Licitações a partir de uma interpretação sistemática permite concluir que a proteção
do meio ambiente é um dever do Poder Público.
O interesse público base da proposta mais vantajosa considerada no processo de licitação,
portanto, abrange a proteção do meio ambiente. A exigência de critérios sociais e ambientais neste
processo coaduna-se com a atual legislação sem fazer necessária alteração para sua atuação.
Entretanto, não se desconsidera o aprimoramento da legislação vigente a fim de aperfeiçoar o
instituto.
2.3 Sustentabilidade como pressuposto de validade
Embora a doutrina seja uníssona no tocante aos objetivos e finalidades da licitação quanto à
busca da seleção da proposta mais vantajosa tendo em vista os princípios orientadores do instituto,
o mesmo não se diz em relação a sua natureza jurídica de procedimento ou processo administrativo.
Contudo, ressalta-se que mesmo entre os doutrinadores não há uma uniformidade entre a
conceituação de processo e procedimento. Certamente, a classificação da natureza jurídica da
licitação é comprometida por esse embate.
O presente trabalho não tem a pretensão de esgotar o tema. As considerações explicitadas
buscam apenas atender a concepção de que o instituto da licitação incorpora a natureza de processo
como forma de garantir direitos constitucionalmente previstos.
Celso Antônio Bandeira de Mello, mesmo considerando a divergência da terminologia entre
os doutrinadores refere-se a processo ou procedimento administrativo de forma indiferente.
Procedimento ou processo administrativo é uma sucessão itinerária e
encadeada de atos administrativos que tendem, a um resultado final e
conclusivo. Isto significa que para existir o processo ou procedimento
cumpre que haja uma seqüência de atos conectados entre si, isto é, armados
em uma ordenada sucessão visando a um ato derradeiro, em vista do qual se
compôs esta cadeia, sem prejuízo, entretanto, de que cada um dos atos
integrados neste todo conserve sua identidade funcional própria, que
autoriza a neles reconhecer o que os autores qualificam como “autonomia
relativa”. (MELLO, 2007, p.466)
Para José dos Santos Carvalho Filho, a licitação é uma espécie da categoria dos processos
administrativos classificado quanto ao objeto contratual, qual seja, a celebração de um contrato em
que uma das partes é a Administração Pública.
O processo administrativo é instrumento formal que, vinculando
juridicamente os sujeitos que dele participam, através da sucessão ordenada
de atos e atividades, tem por fim alcançar determinado objetivo,
previamente identificado pela Administração Pública. (FILHO, 2009b, p.
24)
Ademais, a licitação por ter natureza de processo orienta-se por todos os princípios
aplicáveis ao processo administrativo em geral como, da legalidade, finalidade, motivação,
razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica,
interesse público e eficiência, previstos no caput do artigo 2° da Lei n° 9.784, de 29 de janeiro de
1999, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal.
O artigo 37, inciso XXI, da Constituição Federal destaca que as compras e alienações
públicas serão contratadas mediante processo de licitação e em seu artigo 5°, inciso LV, “aos
litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o
contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.”
O instituto da licitação sustentável garante a observância dos princípios do direito público
como a supremacia e indisponibilidade do interesse público pela Administração e os princípios
constitucionais gerais e específicos do próprio instituto. Além de garantir direitos
constitucionalmente previstos como a eficiência e a proteção do meio ambiente.
A licitação sustentável assegura que a introdução de critérios socioambientais é pressuposto
de validade do processo. Para tanto, a Administração Pública não possui discricionariedade em
relação à adoção desses critérios.
Na realidade, como forma de melhor administrar os recursos públicos, a análise da proposta
mais vantajosa deverá integrar aspectos ambientais como o custo do produto ou serviço ao longo de
seu ciclo de vida uma vez que a aquisição de produtos que consideram esses aspectos podem ao
minimizar as externalidades propiciar mais economia.
Sendo assim, sempre que existir no mercado opções de produtos e tecnologias que integram
aspectos econômicos e ambientais, a Administração tendo em vista o princípio da eficiência e a fim
de almejar a proposta mais vantajosa, obrigar-se-á a adotar a licitação sustentável.
Importante ressaltar que a gestão pública, sendo responsável pelo meio ambiente equilibrado
assume custos em relação à coleta, a disposição dos produtos, a poluição e a saúde pública, aspectos
que normalmente não são considerados na análise meramente econômica tradicional.
Entretanto, na hipótese de restar demonstrado que a escolha de produtos sustentáveis é
incompatível com a realidade financeira daquela Administração em relação ao mercado à
disposição, motivadamente, a gestão pública, naquele caso, poderá concluir pela proposta em favor
da manutenção do equilíbrio das contas públicas, indispensáveis a toda boa administração.
2.4 Interesse público
Como visto, o objetivo principal da licitação nos termos da Lei de Licitação de acordo com
o artigo 3° é selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração. Na colocação de Celso
Antônio Bandeira de Mello é escolher a proposta mais vantajosa “às conveniências públicas” (2006,
p.503). Para Hely Lopes Meirelles, a Administração Pública seleciona a proposta mais vantajosa
“para o contrato de seu interesse” (2004, p.266).
Consoante as colocações, o entendimento é uníssono que a busca da proposta mais vantajosa
dever ser a que melhor atenda ao interesse público. Contudo, cumpre esclarecer o que se entende
por interesse público.
Pois bem, o interesse público é o interesse do todo, da coletividade. O próprio vocábulo
público nos remete a premissa que trata-se de povo. Mas não somente isso, é a “dimensão pública
dos interesses individuais”, é um “interesse resultante do conjunto de interesses que os indivíduos
pessoalmente têm quando considerados em sua qualidade de membros da Sociedade e pelo simples
fato de o serem.” (MELLO, 2007, p.57 -58)
Ressalta-se que o interesse público não é o interesse de um grupo de pessoas ou parte da
sociedade mesmo que fundamentado e de relevância política e sociológica. Porquanto, “uma coisa é
a estrutura do interesse público, e outra é a inclusão e o próprio delineamento, no sistema
normativo, de tal ou qual interesse que, perante este mesmo sistema, será reconhecido como
dispondo desta qualidade.” (MELLO, 2007, p.65)
A inclusão no sistema normativo determinando tal qualificação é dada pela Constituição e
por todo ordenamento jurídico uma vez que a concretização do interesse público se dá pela lei, mas
não exclusivamente dela.
os interesses públicos concretos não se determinam só pela lei ou pela
jurisprudência, se bem que sejam importantes. Pelo contrário, a sua
determinação deve resultar da combinação de influências passadas ou da
decisão que cada ente jurídico realiza em cada momento preciso, no
exercício das funções públicas da sua competência. (ANTUNES, 1989, p.
36)
A República Federativa do Brasil como Estado Democrático de Direito tem o dever de
garantir os direitos previstos em sua Constituição. Na colocação de Marçal, “o Estado Democrático
de Direito é instrumento de realização do interesse público. Ou seja, o interesse público existe antes
do Estado.” (JUSTEN FILHO, 2010, p.65)
Para o lusitano Luis Filipe Colaço Antunes, “não existe um interesse público, mas uma
pluralidade de interesses públicos.” Este, só existe em abstrato, sendo o interesse difuso uma
espécie do gênero interesse público.
os interesses públicos são finalidades concretas, que os órgãos e entes
públicos devem realizar, e que num ordenamento jurídico de base pluralista
há tantos interesses difusos como comunidades existentes no âmbito do
mesmo. (ANTUNES,1989, p.38)
Neste pensamento, os direitos difusos seriam esses interesses protegidos no caso concreto e
a forma como tornar esses interesses públicos eficazes, o desafio da Administração Pública e da
sociedade atual como um todo.
Desta forma, busca-se um direito administrativo que se preste tanto a limitar o poder do
Estado como a instrumentalizar esse poder à satisfação das necessidades coletivas.
A busca pelo conceito de interesse público traz estimulantes discussões entre os
doutrinadores. Para Marçal Justen Filho, não é fácil definir interesse público pela sua natureza de
conceito jurídico indeterminado e pela ausência de conteúdo próprio. Para ele, há uma
impossibilidade de reconhecimento de um único interesse público.
Tudo evidencia que a questão não reside num “interesse público”, de
conteúdo obscuro. O ponto fundamental é a questão da ética, a configuração
de um direito fundamental. Ou seja, o núcleo do direito administrativo não
reside no interesse público, mas na promoção dos direitos fundamentais.
Quando se invoca o “interesse público” somente se pode ter em vista a
realização de direitos fundamentais, cuja titularidade pode ser atribuída ao
Estado precisamente pela inviabilidade de sua realização pelos sujeitos
privados, de modo individual. (JUSTEN FILHO, 2010, p.72)
Nesta linha, conclui-se que não há apenas a supremacia do interesse público como base do
direito administrativo, mas pode-se dizer em uma supremacia dos direitos fundamentais.
O interesse público “só se justifica na medida em que se constitui em veículo de realização
dos interesses das partes que o integram no presente e das que o integrarão no futuro.” (MELLO,
2007, p.58)
A determinação dos critérios que permitirão aferir a proposta mais vantajosa pela
Administração Pública a fim de atender ao maior número de interesses públicos propriamente ditos
deve levar em consideração não apenas os critérios econômicos, mas os sociais e ambientais.
A finalidade da licitação não está apenas no atendimento do interesse público pela
economicidade na aquisição de bens e serviço. O processo não pode desconsiderar outros interesses
públicos igualmente legítimos, como a proteção do meio ambiente.
Porquanto, o interesse público de proteção ao meio ambiente é um direito garantido pela
Constituição, e não mera expectativa do povo. Ademais, conforme artigo 170, inciso VI da CF, a
defesa do meio ambiente forma os princípios que asseguram a ordem econômica e financeira.
No processo licitatório existe uma série de interesses públicos legítimos que devem ser
considerados pelo Estado. Pois não seria eficiente e ao menos razoável realizar uma contratação
definindo o critério a formar a proposta mais vantajosa ignorando outros interesses igualmente
legítimos, como a proteção do meio ambiente.
3 PRINCÍPIOS
A licitação é orientada pelos princípios constitucionais expressos no caput do artigo 37 da
Constituição Federal tais como a legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
E, ainda, pelos princípios específicos arrolados no artigo 3° da Lei n° 8.666/93 quais sejam da
igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório
e do julgamento objetivo. Além do princípio constitucional da isonomia.
No estudo da licitação sustentável destacam-se os princípios constitucionais da eficiência,
isonomia e desenvolvimento sustentável que a seguir serão abordados. Sem, contudo, distanciar a
aplicação de todos os princípios gerais e específicos no processo licitatório.
3.1 Princípio constitucional da eficiência
A Emenda Constitucional n° 19, de 04 de junho de 1998 acrescentou a redação original do
artigo 37 da Constituição Federal o princípio da eficiência. Ressaltou, ainda mais, a sua
importância ao torná-lo explicito no texto, já que a obrigação da Administração de eficiência é
inerente à própria tutela do interesse público.
Não basta atuar de maneira conforme a lei. Não faz sentido emperrar a
administração para dar estrito cumprimento à literalidade da lei. Agora é
preciso mais: a administração deve buscar a forma mais eficiente de cumprir
a lei, deve buscar, entre as soluções teoricamente possíveis, aquela que,
diante das circunstâncias do caso concreto, permita atingir os resultados
necessários à satisfação do interesse público. (DALLARI; FERRAZ, 2000,
p.77-78)
A eficiência gerencial dos recursos pela Administração incide pelo dever de melhores
resultados do ponto de vista quantitativo e qualitativo. Consoante Marçal Justen Filho, a questão da
eficiência completa o princípio da vantajosidade.
A eficácia impõe a adoção da solução mais conveniente e eficiente sob o
ponto de vista da gestão dos recursos públicos. Toda atividade
administrativa envolve uma relação sujeitável a enfoque de custo-benefício.
O desenvolvimento da atividade implica a produção de custos em diversos
níveis. Assim, há custos relacionados com o tempo, com a mão de obra etc.
(JUSTEN FILHO, 2010, p.432-433)
Nesta concepção, nenhuma licitação pode ser orientada apenas por princípios jurídicos uma
vez que a gestão dos gastos públicos deve guiar-se pelo melhor custo beneficio na compra ou
contratação pública. Além do âmbito da economia, várias considerações devem ser feitas em
relação aos impactos que serão gerados.
Para Celso Antônio Bandeira de Mello, parece óbvio o princípio da eficiência por ser este,
uma faceta do princípio da “boa administração”.
Trata-se evidentemente, de algo mais do que desejável. Contudo é
juridicamente tão fluido e de tão difícil controle ao lume do Direito, que
mais parece um simples adorno agregado ao art. 37 ou o extravasamento de
uma inspiração dos que buliram no texto. De toda sorte, o fato é que tal
princípio não pode ser concebido senão na intimidade do princípio da
legalidade, pois jamais uma suposta busca da eficiência justificaria
postergação daquele que é o dever administrativo por excelência. (MELLO,
2006.p 117-118)
A proposta mais vantajosa referida na Lei n° 8.666/93 deve ser entendida pela administração
como a forma mais eficiente de cumprir a lei e resguardar o interesse público.
A adoção de práticas sustentáveis permite uma melhor eficiência em relação ao uso de
produtos e recursos naturais, econômicos e sociais, possibilitando a harmonia no desafio da
sustentabilidade.
Nesta disposição uma atitude mais sustentável diante das circunstâncias do mundo atual é
imprescindível à “boa administração”. No Guia Compras Públicas Sustentáveis: Uso de poder de
compra do governo para a promoção do desenvolvimento sustentável, apresentado pelos Governos
Locais pela Sustentabilidade, Secretariado para América Latina e Caribe (ICLEI-LACS) afirma que
não tem como separar a eficiência do olhar sustentável, o interesse público, da proteção ambiental.
Na realidade, um programa de licitação sustentável é uma estratégia que
combina diversas soluções inovadoras de compras. Se implementado
adequadamente, não deve envolver custos adicionais. Além disso, tal
programa melhora o custo-eficiência geral de operações licitatórias. Em
muitos casos pode-se obter mais valor pelo mesmo custo ou até por menos.
E mais, esse enfoque desonera a sociedade, que deixa de pagar pelos “custos
externos” associados à produção de bens sem respeito ao meio ambiente e à
população, já que os custos de poluição, saúde pública, desmatamento, entre
outros, não são incluídos no preço dos produtos, e quem paga a conta somos
nós. (ICLEI-LACS; GVces, 2008, p. 41)
O caminho do desenvolvimento com sustentabilidade busca o uso eficiente dos recursos
públicos através de decisões que minimizam as externalidades além de cumprir a legislação
ambiental em vigor e, até mesmo as metas do governo como, por exemplo, a redução da emissão de
gases poluidores.
3.2 Princípio constitucional da isonomia
Conforme previsto no artigo 3° da Lei de Licitações, o princípio constitucional da isonomia
deve ser observado no processo licitatório.
Por isso, a licitação para selecionar a proposta mais vantajosa deve assegurar igualdade de
condições aos participantes tanto no que se refere ao julgamento das propostas quanto à
participação dos interessados que tenham condições de assegurar o objeto do contrato.
Deste modo, tanto na fase interna de fixação dos critérios quanto na escolha do contratante é
repelida a desigualdade injustificada, a descriminação arbitrária e opções pessoais e políticas.
O ato convocatório define os critérios objetivos para participação dos interessados no
processo de licitação para se chegar à proposta mais vantajosa. Neste momento, a Administração
deve fixar os critérios de forma a não frustrar a competitividade, mas isso não quer dizer que não
haverá diferenciação entre os participantes. O que é vedado pelo ordenamento é a arbitrariedade.
Na proposta da licitação sustentável todos os participantes devem promover a proteção
ambiental e, mais do que isso, devem respeitar a legislação ambiental em vigor. Nesta base, pode-se
observar um passo importante a consolidação das licitações mais sustentáveis a Lei n° 11.079, de 30
de dezembro de 2004, que institui normas gerais para licitação e contratação de parceria público-
privada no âmbito da administração pública que condiciona a licitação à licença ambiental, nos
termo de seu artigo 10.
Nota-se que a licitação sustentável coaduna com o princípio da isonomia. Não há violação a
igualdade dos licitantes uma vez que o critério socioambiental não frustra a competividade e não
discrimina a participação de todos aqueles aptos a promover a proposta mais vantajosa.
Destarte, não será arbitrária ou injustificada a adoção de critérios socioambientais no
processo licitatório tendo em vista a proteção do meio ambiente um direito fundamental de interesse
de todos.
3.3 Princípio constitucional do desenvolvimento sustentável
O conceito de desenvolvimento sustentável, divulgado pela Comissão Mundial Sobre o
Meio Ambiente e Desenvolvimento, é conhecido como o desenvolvimento que satisfaz as
necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias
necessidades.
A noção de sustentabilidade destaca o meio ambiente, o crescimento econômico e a
equidade social. Ou seja, não basta a proteção ambiental, há de se garantir uma justiça social,
redistribuição dos recursos e crescimento econômico através de mudanças tecnológicas e sociais.
Assim, eliminar ou reduzir as formas de consumo e produção insustentáveis dos recursos a
fim de se manter a qualidade de vida tendo em vista a esgotabilidade das riquezas naturais.
A Constituição brasileira apresenta o princípio do desenvolvimento sustentável em seus
artigos 170 e 225, como um princípio geral da atividade econômica em que todos têm o direito ao
meio ambiente ecologicamente equilibrado. Há, assim, uma inevitável interligação do
desenvolvimento ecônomico e a proteção ambiental.
O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado exposto no art. 225
se faz presente como princípio a ser respeitado pela atividade econômica no
artigo 170, IV. A positivação deste princípio ilumina o desenvolver da
ordem econômica, impondo sua sustentabilidade.
[...]
Não se pode pensar em desenvolvimento da atividade econômica sem o uso
adequado dos recursos naturais, posto que esta atividade é dependente do
uso da natureza, para sintetizar de maneira mais elementar. Destarte, a
elaboração de políticas visando ao desenvolvimento econômico sustentável,
razoavelmente garantido das crises cíclicas, está diretamente relacionada à
manutenção do fator natureza da produção (defesa do meio ambiente), na
mesma razão de proteção do fator capital (ordem econômica fundada na
livre iniciativa) e da manutenção do fator trabalho ( ordem econômica
fundada na valorização do trabalho humano). A consideração conjunta
destes três fatores garante a possibilidade de atingir fins colimados pela
ordem econômica constitucional: assegurar a todos existência digna,
conforme os ditames da justiça social. É o que se impõe textualmente o
caput do artigo 170 da CF. (DERANI, 1997, p. 240)
A Política Nacional do Meio Ambiente Lei n° 6.938/81 objetivou harmonizar a preservação
ambiental ao desenvolvimento socio-econômico e à protecao da dignidade da vida humana
principalmente em referência aos seus artigos 2° e 4°.
Desta forma, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado está estritamente ligado
à protecao do direito à vida e, assim sendo, conforme artigo 5° da Constituição sua natureza de
garantia constitucional e fundamental exige aplicação imediata.
Contudo, é necessária uma mobilização global de toda a sociedade e governos para
concretização do desenvolvimento sustentável. Não há como aceitar a concepção do crescimento
sem desenvolvimento econômico, social e ambiental.
O princípio do desenvolvimento sustentável “só pode ser entendido se associado ao
princípio da ubiquidade e realizado, portanto, numa parceria global.” (RODRIGUES, 2005, p.170).
Desta forma, os governos devem atentar-se pela importância da licitação sustentável como
um dos instrumentos de garantia do desenvolvimento sustentável tanto na esfera pública, como em
relação aos particulares a partir de uma mudança nos padrões de produção e consumo.
4. LICITAÇÃO SUSTENTÁVEL NO MUNDO
A preocupação com a conservação do meio ambiente é um tema fundamental na atualidade e
vem sendo discutido desde a década de 70. Na Conferência Internacional do Meio Ambiente,
realizada na cidade Estocolmo em 1972, iniciou a discussão sobre a necessidade de reagir ao
problema da deterioração ambiental.
O Relatório de Brundtland de 1987 delimitou e divulgou o conceito de desenvolvimento
sustentável conhecido com o desenvolvimento que satisfaz as necessidades presentes, sem
comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades.
Em 1992, a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente, realizada no Rio,
aprovou a Agenda 21 que prevê políticas para a promoção do desenvolvimento sustentável através
de planejamentos que conciliam proteção ambiental, justiça social e eficiência econômica.
A Agenda 21 funciona como um instrumento de planejamento para a construção de uma
sociedade sustentável. Um dos seus objetivos é desenvolver políticas que estimulem a adoção de
padrões de produção e consumo mais sustentáveis. Para isso, importante se faz o sistema de tomada
de decisões no exercício de liderança que harmonizem o desenvolvimento econômico com o meio
ambiente.
Exercício da liderança por meio das aquisições pelos Governos
4.23. Os próprios Governos também desempenham um papel no consumo,
especialmente nos países onde o setor público ocupa uma posição
preponderante na economia, podendo exercer considerável influência tanto
sobre as decisões empresariais como sobre as opiniões do público.
Conseqüentemente, esses Governos devem examinar as políticas de
aquisição de suas agências e departamentos de modo a aperfeiçoar, sempre
que possível, o aspecto ecológico de suas políticas de aquisição, sem
prejuízo dos princípios do comércio internacional. (AGENDA 21, cap. 4)
As experiências da Agenda 21 não deixaram de ser atuais e essenciais a busca do novo
paradigma de desenvolvimento sustentável. Entretanto, não se pode deixar de analisar o que foi
realmente feito até o presente momento e o que ainda deve ser feito.
A integração entre o meio ambiente e o desenvolvimento deve ocorrer em todos os níveis de
tomada de decisão. O Estado tem um papel fundamental nesse aspecto uma vez que se revela um
forte instrumento do mercado através de suas políticas e seu poder de compra.
(a) Melhoramento dos processos de tomada de decisão
8.4. A principal necessidade consiste em integrar os processos de tomada de
decisão relativos a questões de meio ambiente e desenvolvimento. Para
tanto, os Governos devem realizar um exame nacional e, quando apropriado,
aperfeiçoar os processos de tomada de decisão de modo a efetivar uma
integração gradual entre as questões econômicas, sociais e ambientais, na
busca de um desenvolvimento economicamente eficiente, socialmente
eqüitativo e responsável e ambientalmente saudável. (AGENDA 21, cap. 8)
Em continuidade às discussões da Agenda 21, no ano de 2002, ocorreu em Johanesburgo, na
África do Sul o encontro da Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável, conhecida como
Rio+10 que resultou na Declaração de Johanesburgo, importante marco da Licitação Sustentável.
O Plano de Implementação divulgado nesse encontro ressaltou a adoção de mudanças no
consumo e produção sustentáveis a nível mundial a fim de promover políticas de contratação
pública que favoreçam o desenvolvimento e a difusão de mercadorias e serviços favoráveis ao meio
ambiente.
O desafio da sustentabilidade vai além de medidas regionais ou setoriais. O desafio deve ser
incorporado pela sociedade internacional como forma de superar a crise ecológica em relação ao
estilo de vida tanto em relação ao consumo e a produção insustentáveis, conseqüência do
“distanciamento do homem com a natureza” (MELO, 2006, p.41).
A complexidade da crise ecológica vai além das questões hoje em pauta,
como o esgotamento dos “recurso naturais”, a poluição do solo, água e o ar,
a geração de dejetos e resíduos industriais, a extinção da flora e da fauna, a
desestabilização de ecossistemas, entre outras catástrofes.
(...)
O desafio imposto pela crise ecológica exige medidas que vão além das
políticas setoriais, que possuem alcance limitado, devendo-se portanto
incorporar a ecologia na discussão (no planejamento e ação) política acerca
dos caminhos e prioridades das sociedades contemporâneas a fim de mudar
o status quo que prioriza as políticas nacionais de cunho estritamente
economicista, que tem como critério principal a “viabilidade econômica”.
(MELO, 2006, p.40-41)
O Direito Ambiental Internacional está estritamente vinculado a cooperação internacional.
No artigo 4°, inciso IX, da CF, a “cooperação entre os povos para o progresso da humanidade” é um
dos princípios que regem a relações internacionais e, consequentemente, a política do meio
ambiente.
Os Governos Locais pela Sustentabilidade, Secretariado para América Latina e Caribe
(ICLEI-LACS) é a maior associação de governos locais e organizações governamentais nacionais e
regionais com compromisso com o desenvolvimento sustentável. O ICLEI-LACS desenvolve e
gerencia diversas campanhas e programas pela sustentabilidade, além de funcionar como agência
ambiental na implementação de projetos, treinamento, conferências, pesquisas e consultoria em prol
do desenvolvimento sustentável internacional para governos locais.
No âmbito internacional é responsável por diversos projetos da Rede Compre Verde (BIG-
Net) que possibilita um intercâmbio de informações das experiências sustentáveis e da Campanha
Procura+ que avalia o que é um produto sustentável. No Brasil lançou o Guia de Compras Públicas
Sustentáveis: uso do poder de compra do governo para a promoção do desenvolvimento sustentável
atual referência nos estudos sobre o tema.
No mundo, existe um debate sobre a possibilidade da adoção da licitação sustentável e sua
legalidade. Contudo, muitos países, como Reino Unido, Canadá, Estados Unidos, Países Baixos,
Noruega, África do Sul, Japão, Suécia, Áustria, Coréia do Sul e Suíça (ICLEI-LACS; GVces, 2008,
p.29) já incorporaram a adoção de critérios sócio-ambientais nas licitações públicas em seu
ordenamento jurídico.
A premissa de todas essas experiências é a promoção da sustentabilidade através da
iniciativa governamental e, a partir daí, viabilizar uma influência notória por parte dos fornecedores
e consumidores. A licitação sustentável em nível internacional busca através de certificações,
rótulos e selos determinar e divulgar os produtos e serviços mais ecológicos.
5. APLICAÇÃO DA LICITAÇÃO SUSTENTÁVEL
No caso da licitação o certame vigente desconsidera o desenvolvimento sustentável.
Entretanto, algumas iniciativas já demonstram a necessidade de adequação do desenvolvimento
econômico e o meio ambiente ecologicamente equilibrado como a Cartilha de Compra Sustentáveis
divulgada pelo governo do Estado de Minas Gerais.
No âmbito federal foi publicado a Instrução Normativa n° 01, de 19 de janeiro de 2010,
sobre a adoção de critérios de sustentabilidade ambiental no processo licitatório pela Administração
Pública.
Ora, não é somente o Estado que tem o poder de fomentar novas atitudes de mercado em
prol da sustentabilidade, mas a própria sociedade atual exige e busca produtos e serviços mais
preocupados com a questão ambiental.
A licitação sustentável deverá ser aplicada em todas as fases do processo. Além da
formalização do contrato e sua execução.
Com isso, ressalta-se a importância dos estudos no que concerne a caracterização de um
produto, serviço ou obra sustentável. O desempenho ambiental ao longo do ciclo de vida considera
o impacto ambiental na produção, distribuição, uso e disposição.
perspectiva do ciclo de vida — para evitar a transferência de impactos
ambientais negativos de um meio ambiente para outro, e para incentivar
melhorias ambientais em todos os estágios da vida do produto, é preciso que
todos os impactos e custos de um produto durante todo seu ciclo de vida
(produção, distribuição, uso e disposição) sejam levados em conta quando
se tomam decisões de compras. A oferta economicamente mais vantajosa
deve ser determinada com base nos custos econômicos e ambientais totais
causados pelo produto durante toda sua vida. (ICLEI-LACS; GVces, 2008,
p.22)
Ademais, a sustentabilidade considera a real necessidade de compra e consumo, a demanda
dos consumidores, incluindo a Administração Pública, em adquirir produtos e serviços que
consideram os aspectos ambientais, inovação tecnológica e o ciclo de vida.
Assim, as decisões devem considerar todos os custos econômicos e ambientais a partir da
adoção desses critérios, como no ato convocatório e nos projetos das obras públicas.
O ato convocatório é um ato administrativo prévio que define o objeto e os critérios
objetivos para participação da licitação. Este ato é chamado usualmente de edital ou convite, na
modalidade de licitação convite.
A fase interna da licitação é responsável pela elaboração do edital e definição do que será
licitado, o objeto, as cláusulas do futuro contrato, condições de participação, critérios de julgamento
além do requisitos apresentados no artigo 40 da Lei de Licitação.
Além disso, de acordo com esse artigo, a Administração não pode descumprir as normas e
condições do edital, ao qual se acha estritamente vinculada. Daí, a importância de fixação dos
critérios na fase interna da licitação anterior a publicação do edital.
Os critérios estabelecidos serão objetivos, necessários e úteis e constituirão um vínculo com
o interesse público. O edital deve conter exigências de qualificação técnica e econômica
indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações conforme artigo 37, inciso XXI, da
Constituição Federal.
Sendo assim, os critérios a serem adotados pela Administração Pública para
julgamento e declaração da proposta mais vantajosa devem ser àqueles que
realmente atendam ao interesse público (assim concebido como aquele
resultante da aferição e da mediação dos diversos interesses coletivos
legítimos existentes em cada caso) efetivamente existente no caso da
contratação em análise. A definição ex ante e automática de apenas um
critério a formar a proposta mais vantajosa (preço, por exemplo), ignorando
outros interesses legítimos e que serão afetados pela contratação a ser
realizada, não se coaduna com a hodierna Administração Pública.
(SCHIRATO, 2006, p. 104)
Um dos desafios atuais do governo e de toda a sociedade é a busca pela sustentabilidade.
Desta maneira, a opção de adotar um edital mais sustentável é o primeiro passo.
No caso de aquisição de produtos pela Administração Pública entende-se que “produto
sustentável é aquele que apresenta o melhor desempenho ambiental ao longo de seu ciclo de vida,
com função, qualidade e nível de satisfação igual ou melhor, se comparado com um produto-
padrão.” (ICLEI-LACS; GVces, 2008, p. 59)
É necessário que as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis sejam
entendidas de maneira a garantir a proteção do meio ambiente na composição do edital.
Com base nos princípios da Política Nacional do Meio Ambiente de ação governamental de
manutenção do equilíbrio ecológico e controle e zoneamento das atividades potencialmente
poluidoras foi formulada a Instrução Normativa n° 01, de 19 de janeiro de 2010, pelo Secretário de
Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, em
relação a aquisição de bens, contratação de serviços ou obras pela Administração Pública Federal
direta, autárquica e fundacional. Em seu artigo 2o, dispõe que “o instrumento convocatório deverá
formular as exigências de natureza ambiental de forma a não frustrar a competitividade.”
Em relação ao tipo de licitação o rol do artigo 45 da Lei n° 8.666/93 é taxativo cabendo ao
edital especificar de forma clara e objetiva o tipo a ser adotado: menor preço, melhor técnica,
técnica e preço e maior lance. O tipo menor preço é o mais usado tendo em vista a preocupação com
a gestão dos recursos públicos.
Contudo, o próprio artigo 45 determina que a proposta vencedora é a que apresentar a
proposta de acordo com as especificações do edital e ofertar o menor preço. Ou seja, o vencedor
não será o que oferecer o menor preço pois deverá preencher todos os demais requisitos
especificados no edital.
Um dos problemas enfrentados nesse tipo de licitação, menor preço, corresponde a
desconsideração de outros requisitos relevantes para alcance da proposta mais vantajosa, como a
qualidade do objeto licitado e, além disso, se o produto atende a requisitos ambientais.
O desenvolvimento sustentável como princípio constitucional da ordem econômica,
atualmente, depende de uma atuação mais empírica entre os envolvidos.
Para os economistas ecológicos, entretanto, é fundamental que se
(re)conheça a priori a capacidade de suporte da biosfera, condição e pré-
requisito para a definição dos limites da escala de produção e das atividades
humanas, segundo critérios que a sustentabilidade social, econômica e
ecológica. (MELO, 2006, p.112)
Com isso, importante determinar previamente os critérios no edital como forma de garantir
que o objeto contratado atenda as necessidades da Administração, sociais, econômicas e ecológicas.
Ademais, a própria lei de licitação determina que o vencedor deverá atender não somente o critério
de menor preço, mas apresentar proposta de acordo com as especificações do edital.
É necessário que gestão dos recursos públicos tome uma postura mais condizente com a
complexidade que envolve a sustentabilidade ao analisar o menor preço sob a perspectiva de
minimizar as externalidades.
O atual processo de valorização monetária dos bens e serviços ambientais
determina as preferências das gerações futuras, o que é bastante
problemático, inclusive eticamente: as gerações atuais não têm condições
objetivas (de natureza histórica) para estabelecerem as preferências, os
gostos e os hábitos das gerações futuras. Além disso, o sistema de preços
não considera a degradação ambiental total. A esta situação, de não
incorporar todos os custos sociais e ecológicos no sistema geral de preços,
os economistas ecológicos denominaram troca ecologicamente desigual.
(MONTIBELLER apud, MELO, 2006, p. 112)
Neste caminho, a exigência de critérios de sustentabilidade no edital pode garantir que o
interesse da Administração seja alcançado naquele caso concreto, além da proteção ao meio
ambiente e o cumprimento da legislação ambiental em vigor. É nessa oportunidade, de elaboração
do ato convocatório, que a Administração opta pelos critérios que satisfazem ao interesse público.
O Estado tem um importante papel na transformação do mercado voltado à produção e
consumo de bens mais sustentáveis. A licitação sustentável levará a uma readequação dos
fornecedores e até mesmo dos consumidores em direção ao uso racional e sustentável dos recursos.
Os critérios e exigências socioambientais devem conduzir principalmente essa fase do
processo. Neste momento, a Administração possui discricionariedade para atender a finalidade da
lei.
A finalidade da lei é a busca pela proposta mais vantajosa possível ao interesse público. Para
tanto, vital é estabelecer tais requisitos, critérios e seus limitadores compatíveis com a visão mais
sustentável dos contratos e tomada de decisões dos governos tendo em vista exigência e
comprometimento com a proteção do meio ambiente.
No caso de obras e serviços, o artigo 12 da Lei de Licitação demonstra a preocupação do
Estado com a questão ambiental ao estabelecer o impacto ambiental como um dos requisitos a
serem considerados pelos projetos básicos e executivos. O licenciamento ambiental é outro
instrumento que demonstra essa preocupação fundamentada pela Política Nacional do Meio
Ambiente.
A Constituição Federal estabelece o dever do Estado de garantir o direito fundamental de
preservação do meio ambiente através de políticas que minimizam as externalidades de potenciais
obras que degradam o ambiente através de estudos prévios de impacto ambiental.
Todavia, não exaure a necessidade de um projeto mais sustentável. Neste pensamento surgiu
a Instrução Normativa n° 01, de 19 de janeiro de 2010, que dispõe sobre os critérios de
sustentabilidade ambiental na aquisição de bens, contratação de serviços ou obras pela
Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional. Em seu artigo 4° determina que as
especificações e demais exigências do projeto básico ou executivo devem ser elaborados visando à
economia da manutenção e operacionalização da edificação, a redução do consumo de energia e
água, bem como a utilização de tecnologias e matérias que reduzam o impacto ambiental.
Outro importante documento que pretende promover esse olhar mais sustentável
imprescindível aos projetos é o Manual de Obras Sustentáveis disponibilizado pelo Governo do
Estado de Minas Gerais.
No entanto, ainda há muito que se fazer para alcançar a sustentabilidade de uma obra
pública de modo mais efetivo. O objetivo da integração de critério ambientais contempla a
utilização da tecnologia em favor da sustentabilidade agregando valores na implementação,
execução, operacionalização e manutenção.
Uma boa gestão de todos os aspectos de planejamento, construção e uso
podem reduzir dramaticamente o custo de uma edificação ao longo de sua
vida-útil, sem que necessariamente sejam necessários mais investimentos no
processo inicial de projeto e construção. Ademais, considerada a escala das
compras e contratações para obras públicas, o estado, através de projetistas e
executores, tem grande capacidade potencial de criar novos parâmetros de
mercado, tornando produtos e serviços sustentáveis cada vez mais
economicamente acessíveis. (MINAS GERAIS, 2008, p.10-11)
A gestão pública atual prioriza o menor preço. A obra pública sustentável porém, estimula
uma revisão do que seria o menor preço e menor custo considerando outros aspectos além do
econômico, como a vida útil e o ciclo de vida de materiais e serviços. Importante exemplo refere-se
à Política Nacional de Conservação e Uso Racional de Energia, Lei n° 10.295, de 17 de outubro de
2001 que, de acordo com seu artigo 1°, visa a alocação eficiente de recursos energéticos e a
preservação do meio ambiente.
A licitação sustentável no que se refere à obra pública, apenas de forma exemplificativa,
promove a necessidade que seus projetos assimilem políticas de eficiência energética, gestão
econômica da água e gestão de resíduos e garantem o cumprimento das exigências legais ambientais
dessas políticas já em vigor.
Em relação à aquisição direta e o emprego de produtos e subprodutos de madeira de origem
nativa, o objeto é parte da legislação especifica no país através de Decretos estaduais como, no
Estado de Minas Gerais, o Decreto n° 44.903, de 24 de setembro de 2008 e no Estado de São Paulo,
o Decreto n° 49.674, de 6 de junho de 2005, que estabelecem procedimentos de controle ambiental.
Neste caso, cabe a reflexão, se houvesse o cumprimento de todas as exigências ambientais
legais e reformulações de suas políticas, poderia ser desnecessária a promoção da licitação
sustentável uma vez que toda licitação seria, de certa forma, sustentável.
CONCLUSÃO
Atualmente, é cada vez mais discutida pela sociedade e governos a necessidade de proteção
do meio ambiente. Fazem-se urgentes atitudes e decisões das autoridades governamentais a fim de
barrar a degradação do meio ambiente tendo em vista discussões sobre os fenômenos do
aquecimento global.
Além disso, a busca pela sustentabilidade não reflete apenas uma preocupação ambiental
em seu sentido mais estrito, mas atinge diversas outras acepções sociais e econômicas. O
desenvolvimento sustentável compartilha a idéia de uma sociedade mais justa com a redistribuição
de recursos como incentivo ao crescimento econômico.
A partir daí, a integração entre o meio ambiente e o desenvolvimento deve ocorrer em todos
os níveis de tomada de decisão. O Estado tem um papel fundamental nesse aspecto uma vez que se
revela detentor de fortes instrumentos de fomento do mercado na produção e consumo de bens mais
sustentáveis como a implementação de políticas e o uso consciente de seu poder de compra.
A Administração Pública deve orientar suas atividades pelos princípios constitucionais da
legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Desta forma, ao realizar os
processos licitatórios obedecerá a estes e, ainda, aos princípios específicos arrolados na lei de
licitações, quais sejam da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao
instrumento convocatório e do julgamento objetivo. Além observar o princípio constitucional da
isonomia e garantir a seleção da proposta mais vantajosa.
Para a licitação sustentável a busca pela proposta mais vantajosa deve ser entendida e
analisada em um contexto mais amplo, ou seja, a escolha deve considerar o interesse público em
todas suas acepções. O critério apenas econômico tendo em vista o menor preço poderia levar o
próprio Estado, ao não analisar os critérios ambientais e sociais, a afrontar sua própria legislação e,
até mesmo, utilizar-se de forma irresponsável os seus recursos financeiros.
A proteção ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é direito fundamental, conforme
artigos 225 e 170 da Constituição e deve, portanto, ser garantido por todo o ordenamento jurídico. A
Política Nacional do Meio Ambiente, também, promove o desenvolvimento sustentável como dever
do Estado, e não mera faculdade.
A interpretação sistemática do ordenamento permite constatar a necessidade do Estado em
adotar a licitação de modo sustentável o que, inclusive, torna o processo mais eficiente. Produtos e
serviços sustentáveis minimizam os custos estatais com seus ciclos de vida, em razão da menor
impacto de externalidades negativas. Consequentemente, promove uma eficiente gestão dos
recursos públicos vez que se considera todas as possibilidades de dispêndios, atendendo aos
preceitos da Administração Pública e, em especial, à legislação ambiental.
Desta forma, a exigência desses critérios como pressuposto de validade no processo
licitatório permite que o interesse público atenda concomitantemente à economicidade e outros
interesses igualmente legítimos como a proteção ambiental. Sendo assim, não caberá juízo de
conveniência e oportunidade a adoção desses critérios.
Portanto, a Administração Pública deve sempre optar pela licitação sustentável. Porém,
diante da realidade das tecnologias, produtos e serviços disponíveis no mercado e suas finanças,
pode ser constatado pela Administração a impossibilidade ou extrema dificuldade que poderia
causar-lhe ônus insuperáveis. Nestes casos excepcionais é indispensável que a autoridade
responsável justifique a inviabilidade motivando-a devidamente.
Além disso, a sustentabilidade é um desafio que exige uma parceria global, logo, sua
concretização depende de toda a sociedade internacional em todos os níveis de tomada de decisão
para mudança de padrões de consumo mais sustentáveis.
O Poder Público destaca-se como o maior comprador e detentor de importante ferramenta de
influência. Surge então a possibilidade do Estado, desenvolvendo seu papel de fomento à economia,
estimular o mercado de produtos e serviços sustentáveis, viabilizando uma maior competitividade
que terá como consequência a busca de tecnologias mais eficientes e menores preços.
Os critérios ambientais, sociais e econômicos devem orientar todas as fases do processo
licitatório. Deste modo, a aplicação da licitação sustentável exige a incorporação no ato
convocatório de critérios não meramente econômicos. Diante da imposição do art. 37, inciso XXI,
da Constituição, que somente permite exigências de qualificação técnica e econômica
indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações, temos que a aderência aos critérios
expostos, desde que assegurada a igualdade de participação para todos os interessados, não ofende
qualquer dispositivo legal. Ademais, a proteção do meio ambiente consubstancia um direito
fundamental, sendo indispensável seu atendimento em todos os institutos do nosso ordenamento.
Por fim, conclui-se que a licitação sustentável, não obstante a necessidade de aprimoramento
da legislação vigente, coaduna com o ordenamento jurídico brasileiro como forma de garantir os
fundamentos do Estado Democrático de Direito, o interesse público e direitos fundamentais. Sendo
assim, não caberá à Administração Pública a discricionariedade em relação à adoção do instituto
uma vez que conforme disposto na Constituição Federal, impõe-se ao Poder Público e à
coletividade o dever de defender e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações.
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Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005.
SCHIRATO, Vitor Rhein. A composição da proposta mais vantajosa nas licitações públicas.
Interesse Público, Sapucaia do Sul, RS , v.8, n.37, p.95-118, maio/jun. 2006.
SOUZA, Washington Peluso Albino de. Teoria da Constituição Econômica. Belo Horizonte: Del
Rey, 2002.

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  • 1. LLIICCIITTAAÇÇÃÃOO SSUUSSTTEENNTTÁÁVVEELL BIDDING SUSTAINABLE Vanessa de Azevedo Guimarães1 Marinella Machado Araújo2 Resumo: Este trabalho apresentou um estudo sobre a possibilidade de adoção da licitação sustentável face ao atual ordenamento jurídico brasileiro. Seu objetivo foi fundamentar a imposição do instituto a partir de uma interpretação sistemática da legislação vigente o que permitiu constatar que sua aplicabilidade atende aos fundamentos do Estado Democrático de Direito. A sustentabilidade como pressuposto de validade no processo licitatório exige que a busca pela proposta mais vantajosa atenda ao interesse público em todas as suas acepções. Para tanto, com base no direito a proteção do meio ambiente ecologicamente equilibrado, explicitou que critérios ambientais e sociais permitem um uso mais eficiente e responsável dos recursos públicos por meio da diminuição das externalidades negativas e análise dos ciclos de vida. Por ser o desenvolvimento sustentável um desafio global foram contextualizadas as iniciativas sustentáveis que permitiram a introdução do instituto da licitação sustentável a nível internacional. A licitação sustentável é um dever do Estado, e não mera faculdade uma vez que a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 impõe ao Poder Público e à coletividade o dever de defender e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações. Palavras-chave: Licitação sustentável. Interesse público. Desenvolvimento Sustentável. Abstract: This paper focused on a study about the utilization of sustainability aspects in public procurement processes in the light of the Brazilian legal system. The main objective was to substantiate the imposition of the subject taking into consideration a systematic interpretation of the current legislation which led to the conclusion that its application fulfills the fundaments of the Democratic State of Law. Sustainability as a premise of validity in the public procurement process assumes the selection of the most beneficial proposal that completely fulfills the public interests in all its meanings. Therefore, considering the rights to protect an ecologically balanced environment, this study demonstrated that social and environmental criteria endure a more efficient and responsible use of public resources by reducing the negative external effects and life cycle analysis. Since sustainability development is labeled as a global challenge, similar international initiatives that made possible the introduction of sustainability in public procurement processes were also taken into consideration. Sustainable procurement processes are an mandatory to the State, not merely a discretion once the Constitution of the Federative Republic of Brazil of 1988 imposes on 1 Acadêmica do curso de Direito da Faculdade Mineira de Direito da Pontificia Universidade Católica de Minas Gerais. 2 Advogada doutora em direito administrativo, professora dos cursos de Graduação e Pós-Graduação em Direito da PUC Minas, coordenadora do Núcleo Jurídico de Políticas Públicas do Programa de Pós-Graduação em Direito e coordenadora de pesquisa da Faculdade Mineira de Direito da PUC Minas
  • 2. the Government and on the community the duty to defend and preserve the environment for present and future generations. Keywords: Sustainable public procurement. Public Interest. Sustainable Development 1 INTRODUÇÃO O presente artigo tem a finalidade de demonstrar a necessidade da adoção do instituto da licitação sustentável face ao atual ordenamento jurídico. A exigência de critérios sociais e ambientais no processo licitatório coaduna com a legislação vigente a partir de uma interpretação sistemática uma vez que impõe ao Poder Público e à coletividade o dever de defender e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações. Sendo assim, não obstante o aperfeiçoamento da legislação, será demonstrado ao longo desse estudo, a necessidade da adoção da licitação sustentável como forma de garantir o Estado Democrático de Direito, o interesse público e direitos fundamentais como a proteção do meio ambiente ecologicamente equilibrado. Atenta-se que por ser um instituto jurídico recente, os diversos argumentos e opiniões entre os especialistas estão sendo construídos a fim de aperfeiçoar a sua aplicabilidade no sistema brasileiro. 2 LICITAÇÃO SUSTENTÁVEL 2.1 Conceitos e principais características A Constituição da República Federativa do Brasil consagrou em seu artigo 37, inciso XXI, a obrigatoriedade da adoção da licitação pela Administração Pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições
  • 3. efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações. (BRASIL, 1988) Nos ensinamentos Celso Antônio Bandeira de Mello, licitação: [...] é o certame que as entidades governamentais devem promover e no qual abrem disputa entre os interessados em com elas travar determinadas relações de conteúdo patrimonial, para escolher a proposta mais vantajosa às conveniências públicas. (MELLO, 2006, p.503) José dos Santos Carvalho Filho, apresenta a seguinte definição: [...] procedimento administrativo vinculado por meio do qual os entes da Administração Pública e aqueles por ela controlados selecionam a melhor proposta entre as oferecidas pelos vários interessados, com dois objetivos – a celebração do contrato, ou a obtenção do melhor trabalho técnico, artístico ou científico. (FILHO, 2009a, p. 226) Hely Lopes Meirelles destaca a eficiência e moralidade na atuação da Administração Pública: [...] procedimento administrativo mediante o qual a Administração Pública seleciona a proposta mais vantajosa para o contrato de seu interesse. Como procedimento, desenvolve-se através de uma sucessão ordenada de atos vinculantes para a Administração e para os licitantes, o que propicia igual oportunidade a todos os interessados e atua como fator de eficiência e moralidade nos negócios administrativos. (MEIRELLES, 2004, p.266) A finalidade principal da licitação, qual seja, seleção da proposta mais vantajosa possui sua base no interesse público ao atender precipuamente o interesse da coletividade e das conveniências públicas. Para isso, todo o processo de licitação deve-se ater as situações do caso concreto e ao momento em que a sociedade vive. A Constituição da República de 1988 foi pioneira no Brasil ao consagrar expressamente a importância do meio ambiente ecologicamente equilibrado com base, primordialmente, em seu artigo 225. Estabeleceu, ainda, que a ordem econômica deve assegurar a todos existência digna conforme os ditames da justiça social observado o princípio da defesa do meio ambiente. A licitação sustentável busca integrar critérios ambientais, sociais e econômicos em toda tomada de decisão no processo licitatório. Para avaliação desses critérios deve ser considerada a real necessidade de aquisição do produto ou serviço, a disponibilidade de estudos e tecnologias sustentáveis, o ciclo de vida e descarte.
  • 4. A licitação sustentável é uma solução para integrar considerações ambientais e sociais em todos os estágios do processo da compra e contratação dos agentes públicos (de governo) com o objetivo de reduzir impactos à saúde humana, ao meio ambiente e aos direitos humanos. (ICLEI-LACS; GVces, 2008, p.21) O desenvolvimento sustentável de acordo com o Relatório de Brundtland da Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento da ONU, é o “desenvolvimento que satisfaz as necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras satisfazerem suas próprias necessidades.” Além disso, a sustentabilidade não reflete apenas uma preocupação ambiental em um sentido mais estrito, mas atinge diversas outras acepções sociais e econômicas. O desenvolvimento sustentável compartilha a idéia de uma sociedade mais justa e redistribuição dos recursos como incentivo ao crescimento econômico. Atualmente é cada vez mais nítida a preocupação da sociedade e da gestão pública com a defesa do meio ambiente em todos os níveis de tomada de decisões. A expressão licitação sustentável é utilizada para designar o processo licitatório que integra os critérios econômicos, sociais e ambientais a todos os estágios do processo regulado pela Lei n° 8.666, de 21 de junho de 1993. Para a escolha da proposta mais vantajosa é atribuído maior benefício ao ambiente e a sociedade com base no interesse público e na promoção do desenvolvimento sustentável. É também conhecido como compras públicas sustentáveis ou compras verdes. A licitação sustentável pode ser considerada forte instrumento para a promoção da preservação do meio ambiente. O Estado, como um dos principais compradores de bens e serviços, tem um papel fundamental no mercado competitivo. Seu poder de compra pode fomentar uma mudança na produção e consumo de bens sustentáveis ao exercer suas funções de fiscalização, incentivo e planejamento da atividade econômica, com base no artigo 174 da Constituição. A proposta mais vantajosa é a que melhor atende aos objetivos da licitação e ao interesse público entendidos de forma a garantir que a gestão pública tome decisões de minimizar as externalidades e promover ações que considerem o desenvolvimento sustentável. Para isso, a proposta deve ser analisada em um contexto mais amplo, ou seja, a escolha deve considerar o interesse público em todas suas acepções. O critério apenas econômico tendo em vista o menor preço poderia levar o próprio Estado, ao não analisar os critérios ambientais e sociais, a afrontar sua própria legislação e, até mesmo, utilizar-se de forma irresponsável os seus recursos financeiros. E, ainda, tendo em vista discussões sobre os fenômenos do aquecimento global, fazem- se urgente atitudes e decisões das autoridades governamentais a fim de barrar a degradação do meio
  • 5. ambiente. 2.2 Ordenamento jurídico e interpretação sistemática A Constituição da República de 1988 foi pioneira no Brasil ao consagrar expressamente a importância do meio ambiente ecologicamente equilibrado e reservar um Capítulo inteiro para seu tratamento. A Constituição brasileira de 1988 (Título VII), seguindo e aprimorando a linha “sistêmica” adotada pelo constitucionalismo nacional, exige interpretação pela interinfluência e conexão dos dispositivos sempre referidos a “princípios”, os quais corporificam e definem a sua “ideologia”. (SOUZA, 2002, p. 289) A própria ordem econômica e financeira brasileira adotou o princípio da defesa do meio ambiente. A idéia de desenvolvimento sustentável é enunciada pelo artigo 170 como princípio geral da atividade econômica que tem como fim assegurar a todos existência digna conforme os ditames da justiça social. A Constituição Federal apresenta, mais uma vez, a importância da sustentabilidade em seu artigo 225: Art. 225 Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo- se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. (BRASIL, 1988) A Lei de Política Nacional do Meio Ambiente n° 6.938, de 31 de agosto de 1981 foi importante marco da sistematização da tutela ambiental. Ainda que anterior a própria Constituição sua recepção proporcionou o nascimento do Direito Ambiental Brasileiro como ciência autônoma. A referida lei objetiva harmonizar a preservação ambiental ao desenvolvimento sócio- econômico e à proteção da dignidade da vida humana. Art. 2º A Política Nacional do Meio Ambiente tem por objetivo a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento sócio-econômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana [...].
  • 6. Art. 4º A Política Nacional do Meio Ambiente visará: I - à compatibilização do desenvolvimento econômico-social com a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico. (BRASIL, 1981) Cumpre mencionar ainda a fim de demonstrar a preocupação do Estado com o meio ambiente a Lei n° 7.347, de 24 de julho de 1985 que disciplina a Ação Civil Pública de responsabilidade por danos causados ao meio ambiente e a Lei de Crimes Ambientais Lei n° 9.605, de 12 de fevereiro de 1998 que dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e outras providências. Pois bem. Atualmente o modelo de gestão e tomada de decisão dos administradores buscam ampliar efetivamente esse equilíbrio entre o meio ambiente e o desenvolvimento sócio-econômico. Pois, já ultrapassado conceber o desenvolvimento econômico e financeiro desatrelado a proteção ambiental conforme consagrado pela própria Constituição. O ordenamento jurídico brasileiro deve ser entendido como um todo em suas idéias e aspirações. A Constituição Federal consagrou a proteção do meio ambiente como princípio fundamental e, assim sendo, não poderá norma infraconstitucional contrariá-la. O processo licitatório como instrumento essencial da gestão pública deve garantir o princípio constitucional da defesa do meio ambiente. Além disso, sua interpretação deve harmonizar-se com todo o ordenamento jurídico, em particular, com os objetivos da Política Nacional do Meio Ambiente. A interpretação jurídica é sistemática, ou seja, deve assinalar o sistema como um todo a fim de compreender e alcançar a melhor solução para o caso concreto e garantir o Estado Democrático de Direito. Frise-se, ademais, que a ampliação do conceito de interpretação sistemática, ora promovida, é proporcional àquela praticada quanto ao conceito de sistema jurídico. Em outras palavras, a interpretação sistemática, em tal visada, mais compatível com as presentes funções multifacetadas do Direito contemporâneo, é bem mais do que descobrir o sentido e o alcance de comandos legais, senão que é desvendar o alcance sistemático de cada princípio, norma ou valor. Dito de outro modo, verdadeiramente a interpretação sistemática, quando compreendida em profundidade, é a que se realiza em consonância com a rede hierarquizada, máxime na Constituição, tecida por princípios, normas e valores considerados dinamicamente e em conjunto. Assim, ao se aplicar uma norma, está-se aplicando o sistema inteiro, razão pela qual desassiste razão àqueles que tentam fazer concentrar, por exemplo, direitos fundamentais apenas num dado ponto normativo do sistema. (FREITAS, 1998, p.61) Ademais, a interpretação do Direito Administrativo não pode ser considerada de forma
  • 7. isolada, deverá ser sistemática, principiológica e hierarquizada. Conforme ensinamentos de Juarez Freitas: Assim, qualquer disposição, v. g., relativa às licitações públicas apenas pode alcançar o seu esclarecimento teleológico em confronto com os princípios máximos da Lei Maior. De resto, toda a legislação infraconstitucional em matéria administrativa tem que ser lida sob o prisma dos mesmos princípios fundamentais da Constituição, buscando-se a plena conformidade sistemática da norma com os princípios, nunca o contrário, se se quiser instauração da efetividade da dimensão teleológica do processo interpretativo. (FREITAS, 1998, p.167) A Administração Pública tem a finalidade de concretizar os efeitos determinados pelas normas jurídicas, “nem é, pois, que ela se submete ao Direito, mas tão-somente que ela é o próprio Direito tornada movimento realizador de seus efeitos para intervir e modificar a realidade social sobre a qual incide.” (ROCHA, 1994, p.82). Nesta relação, considera-se que o Direito tem que ser o mesmo, seja em sua formulação ou em sua aplicação e concretização almejando a harmonia do Estado. Desta maneira, a Administração deverá agir em consonância e compatibilidade com o sistema jurídico vigente em atenção ao princípio da legalidade administrativa ou juridicidade. A lei n° 8.666/93 que estabelece as normas gerais de licitação indica em seu artigo 3°, caput, que deverão ser observados os princípios constitucionais. Não obstante, a aplicação e interpretação da lei de licitações devem abranger o princípio constitucional do desenvolvimento sustentável. O direito a proteção ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é um direito fundamental, conforme artigos 225 e 170 da Constituição, portanto deve ser garantido por todo o ordenamento jurídico. A Política Nacional do Meio Ambiente, lei n° 6.938/81, também, promove o desenvolvimento sustentável como dever do Estado, e não mera faculdade. A licitação sustentável não é vedada pelo ordenamento jurídico por não afrontar nenhum dispositivo legal. Pelo contrário, a Constituição Federal, a Política Nacional do Meio Ambiente e a própria Lei de Licitações a partir de uma interpretação sistemática permite concluir que a proteção do meio ambiente é um dever do Poder Público. O interesse público base da proposta mais vantajosa considerada no processo de licitação, portanto, abrange a proteção do meio ambiente. A exigência de critérios sociais e ambientais neste processo coaduna-se com a atual legislação sem fazer necessária alteração para sua atuação. Entretanto, não se desconsidera o aprimoramento da legislação vigente a fim de aperfeiçoar o instituto.
  • 8. 2.3 Sustentabilidade como pressuposto de validade Embora a doutrina seja uníssona no tocante aos objetivos e finalidades da licitação quanto à busca da seleção da proposta mais vantajosa tendo em vista os princípios orientadores do instituto, o mesmo não se diz em relação a sua natureza jurídica de procedimento ou processo administrativo. Contudo, ressalta-se que mesmo entre os doutrinadores não há uma uniformidade entre a conceituação de processo e procedimento. Certamente, a classificação da natureza jurídica da licitação é comprometida por esse embate. O presente trabalho não tem a pretensão de esgotar o tema. As considerações explicitadas buscam apenas atender a concepção de que o instituto da licitação incorpora a natureza de processo como forma de garantir direitos constitucionalmente previstos. Celso Antônio Bandeira de Mello, mesmo considerando a divergência da terminologia entre os doutrinadores refere-se a processo ou procedimento administrativo de forma indiferente. Procedimento ou processo administrativo é uma sucessão itinerária e encadeada de atos administrativos que tendem, a um resultado final e conclusivo. Isto significa que para existir o processo ou procedimento cumpre que haja uma seqüência de atos conectados entre si, isto é, armados em uma ordenada sucessão visando a um ato derradeiro, em vista do qual se compôs esta cadeia, sem prejuízo, entretanto, de que cada um dos atos integrados neste todo conserve sua identidade funcional própria, que autoriza a neles reconhecer o que os autores qualificam como “autonomia relativa”. (MELLO, 2007, p.466) Para José dos Santos Carvalho Filho, a licitação é uma espécie da categoria dos processos administrativos classificado quanto ao objeto contratual, qual seja, a celebração de um contrato em que uma das partes é a Administração Pública. O processo administrativo é instrumento formal que, vinculando juridicamente os sujeitos que dele participam, através da sucessão ordenada de atos e atividades, tem por fim alcançar determinado objetivo, previamente identificado pela Administração Pública. (FILHO, 2009b, p. 24) Ademais, a licitação por ter natureza de processo orienta-se por todos os princípios aplicáveis ao processo administrativo em geral como, da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência, previstos no caput do artigo 2° da Lei n° 9.784, de 29 de janeiro de
  • 9. 1999, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal. O artigo 37, inciso XXI, da Constituição Federal destaca que as compras e alienações públicas serão contratadas mediante processo de licitação e em seu artigo 5°, inciso LV, “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.” O instituto da licitação sustentável garante a observância dos princípios do direito público como a supremacia e indisponibilidade do interesse público pela Administração e os princípios constitucionais gerais e específicos do próprio instituto. Além de garantir direitos constitucionalmente previstos como a eficiência e a proteção do meio ambiente. A licitação sustentável assegura que a introdução de critérios socioambientais é pressuposto de validade do processo. Para tanto, a Administração Pública não possui discricionariedade em relação à adoção desses critérios. Na realidade, como forma de melhor administrar os recursos públicos, a análise da proposta mais vantajosa deverá integrar aspectos ambientais como o custo do produto ou serviço ao longo de seu ciclo de vida uma vez que a aquisição de produtos que consideram esses aspectos podem ao minimizar as externalidades propiciar mais economia. Sendo assim, sempre que existir no mercado opções de produtos e tecnologias que integram aspectos econômicos e ambientais, a Administração tendo em vista o princípio da eficiência e a fim de almejar a proposta mais vantajosa, obrigar-se-á a adotar a licitação sustentável. Importante ressaltar que a gestão pública, sendo responsável pelo meio ambiente equilibrado assume custos em relação à coleta, a disposição dos produtos, a poluição e a saúde pública, aspectos que normalmente não são considerados na análise meramente econômica tradicional. Entretanto, na hipótese de restar demonstrado que a escolha de produtos sustentáveis é incompatível com a realidade financeira daquela Administração em relação ao mercado à disposição, motivadamente, a gestão pública, naquele caso, poderá concluir pela proposta em favor da manutenção do equilíbrio das contas públicas, indispensáveis a toda boa administração. 2.4 Interesse público Como visto, o objetivo principal da licitação nos termos da Lei de Licitação de acordo com o artigo 3° é selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração. Na colocação de Celso Antônio Bandeira de Mello é escolher a proposta mais vantajosa “às conveniências públicas” (2006, p.503). Para Hely Lopes Meirelles, a Administração Pública seleciona a proposta mais vantajosa
  • 10. “para o contrato de seu interesse” (2004, p.266). Consoante as colocações, o entendimento é uníssono que a busca da proposta mais vantajosa dever ser a que melhor atenda ao interesse público. Contudo, cumpre esclarecer o que se entende por interesse público. Pois bem, o interesse público é o interesse do todo, da coletividade. O próprio vocábulo público nos remete a premissa que trata-se de povo. Mas não somente isso, é a “dimensão pública dos interesses individuais”, é um “interesse resultante do conjunto de interesses que os indivíduos pessoalmente têm quando considerados em sua qualidade de membros da Sociedade e pelo simples fato de o serem.” (MELLO, 2007, p.57 -58) Ressalta-se que o interesse público não é o interesse de um grupo de pessoas ou parte da sociedade mesmo que fundamentado e de relevância política e sociológica. Porquanto, “uma coisa é a estrutura do interesse público, e outra é a inclusão e o próprio delineamento, no sistema normativo, de tal ou qual interesse que, perante este mesmo sistema, será reconhecido como dispondo desta qualidade.” (MELLO, 2007, p.65) A inclusão no sistema normativo determinando tal qualificação é dada pela Constituição e por todo ordenamento jurídico uma vez que a concretização do interesse público se dá pela lei, mas não exclusivamente dela. os interesses públicos concretos não se determinam só pela lei ou pela jurisprudência, se bem que sejam importantes. Pelo contrário, a sua determinação deve resultar da combinação de influências passadas ou da decisão que cada ente jurídico realiza em cada momento preciso, no exercício das funções públicas da sua competência. (ANTUNES, 1989, p. 36) A República Federativa do Brasil como Estado Democrático de Direito tem o dever de garantir os direitos previstos em sua Constituição. Na colocação de Marçal, “o Estado Democrático de Direito é instrumento de realização do interesse público. Ou seja, o interesse público existe antes do Estado.” (JUSTEN FILHO, 2010, p.65) Para o lusitano Luis Filipe Colaço Antunes, “não existe um interesse público, mas uma pluralidade de interesses públicos.” Este, só existe em abstrato, sendo o interesse difuso uma espécie do gênero interesse público. os interesses públicos são finalidades concretas, que os órgãos e entes públicos devem realizar, e que num ordenamento jurídico de base pluralista há tantos interesses difusos como comunidades existentes no âmbito do mesmo. (ANTUNES,1989, p.38)
  • 11. Neste pensamento, os direitos difusos seriam esses interesses protegidos no caso concreto e a forma como tornar esses interesses públicos eficazes, o desafio da Administração Pública e da sociedade atual como um todo. Desta forma, busca-se um direito administrativo que se preste tanto a limitar o poder do Estado como a instrumentalizar esse poder à satisfação das necessidades coletivas. A busca pelo conceito de interesse público traz estimulantes discussões entre os doutrinadores. Para Marçal Justen Filho, não é fácil definir interesse público pela sua natureza de conceito jurídico indeterminado e pela ausência de conteúdo próprio. Para ele, há uma impossibilidade de reconhecimento de um único interesse público. Tudo evidencia que a questão não reside num “interesse público”, de conteúdo obscuro. O ponto fundamental é a questão da ética, a configuração de um direito fundamental. Ou seja, o núcleo do direito administrativo não reside no interesse público, mas na promoção dos direitos fundamentais. Quando se invoca o “interesse público” somente se pode ter em vista a realização de direitos fundamentais, cuja titularidade pode ser atribuída ao Estado precisamente pela inviabilidade de sua realização pelos sujeitos privados, de modo individual. (JUSTEN FILHO, 2010, p.72) Nesta linha, conclui-se que não há apenas a supremacia do interesse público como base do direito administrativo, mas pode-se dizer em uma supremacia dos direitos fundamentais. O interesse público “só se justifica na medida em que se constitui em veículo de realização dos interesses das partes que o integram no presente e das que o integrarão no futuro.” (MELLO, 2007, p.58) A determinação dos critérios que permitirão aferir a proposta mais vantajosa pela Administração Pública a fim de atender ao maior número de interesses públicos propriamente ditos deve levar em consideração não apenas os critérios econômicos, mas os sociais e ambientais. A finalidade da licitação não está apenas no atendimento do interesse público pela economicidade na aquisição de bens e serviço. O processo não pode desconsiderar outros interesses públicos igualmente legítimos, como a proteção do meio ambiente. Porquanto, o interesse público de proteção ao meio ambiente é um direito garantido pela Constituição, e não mera expectativa do povo. Ademais, conforme artigo 170, inciso VI da CF, a defesa do meio ambiente forma os princípios que asseguram a ordem econômica e financeira. No processo licitatório existe uma série de interesses públicos legítimos que devem ser considerados pelo Estado. Pois não seria eficiente e ao menos razoável realizar uma contratação definindo o critério a formar a proposta mais vantajosa ignorando outros interesses igualmente legítimos, como a proteção do meio ambiente.
  • 12. 3 PRINCÍPIOS A licitação é orientada pelos princípios constitucionais expressos no caput do artigo 37 da Constituição Federal tais como a legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. E, ainda, pelos princípios específicos arrolados no artigo 3° da Lei n° 8.666/93 quais sejam da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório e do julgamento objetivo. Além do princípio constitucional da isonomia. No estudo da licitação sustentável destacam-se os princípios constitucionais da eficiência, isonomia e desenvolvimento sustentável que a seguir serão abordados. Sem, contudo, distanciar a aplicação de todos os princípios gerais e específicos no processo licitatório. 3.1 Princípio constitucional da eficiência A Emenda Constitucional n° 19, de 04 de junho de 1998 acrescentou a redação original do artigo 37 da Constituição Federal o princípio da eficiência. Ressaltou, ainda mais, a sua importância ao torná-lo explicito no texto, já que a obrigação da Administração de eficiência é inerente à própria tutela do interesse público. Não basta atuar de maneira conforme a lei. Não faz sentido emperrar a administração para dar estrito cumprimento à literalidade da lei. Agora é preciso mais: a administração deve buscar a forma mais eficiente de cumprir a lei, deve buscar, entre as soluções teoricamente possíveis, aquela que, diante das circunstâncias do caso concreto, permita atingir os resultados necessários à satisfação do interesse público. (DALLARI; FERRAZ, 2000, p.77-78) A eficiência gerencial dos recursos pela Administração incide pelo dever de melhores resultados do ponto de vista quantitativo e qualitativo. Consoante Marçal Justen Filho, a questão da eficiência completa o princípio da vantajosidade. A eficácia impõe a adoção da solução mais conveniente e eficiente sob o ponto de vista da gestão dos recursos públicos. Toda atividade administrativa envolve uma relação sujeitável a enfoque de custo-benefício. O desenvolvimento da atividade implica a produção de custos em diversos níveis. Assim, há custos relacionados com o tempo, com a mão de obra etc.
  • 13. (JUSTEN FILHO, 2010, p.432-433) Nesta concepção, nenhuma licitação pode ser orientada apenas por princípios jurídicos uma vez que a gestão dos gastos públicos deve guiar-se pelo melhor custo beneficio na compra ou contratação pública. Além do âmbito da economia, várias considerações devem ser feitas em relação aos impactos que serão gerados. Para Celso Antônio Bandeira de Mello, parece óbvio o princípio da eficiência por ser este, uma faceta do princípio da “boa administração”. Trata-se evidentemente, de algo mais do que desejável. Contudo é juridicamente tão fluido e de tão difícil controle ao lume do Direito, que mais parece um simples adorno agregado ao art. 37 ou o extravasamento de uma inspiração dos que buliram no texto. De toda sorte, o fato é que tal princípio não pode ser concebido senão na intimidade do princípio da legalidade, pois jamais uma suposta busca da eficiência justificaria postergação daquele que é o dever administrativo por excelência. (MELLO, 2006.p 117-118) A proposta mais vantajosa referida na Lei n° 8.666/93 deve ser entendida pela administração como a forma mais eficiente de cumprir a lei e resguardar o interesse público. A adoção de práticas sustentáveis permite uma melhor eficiência em relação ao uso de produtos e recursos naturais, econômicos e sociais, possibilitando a harmonia no desafio da sustentabilidade. Nesta disposição uma atitude mais sustentável diante das circunstâncias do mundo atual é imprescindível à “boa administração”. No Guia Compras Públicas Sustentáveis: Uso de poder de compra do governo para a promoção do desenvolvimento sustentável, apresentado pelos Governos Locais pela Sustentabilidade, Secretariado para América Latina e Caribe (ICLEI-LACS) afirma que não tem como separar a eficiência do olhar sustentável, o interesse público, da proteção ambiental. Na realidade, um programa de licitação sustentável é uma estratégia que combina diversas soluções inovadoras de compras. Se implementado adequadamente, não deve envolver custos adicionais. Além disso, tal programa melhora o custo-eficiência geral de operações licitatórias. Em muitos casos pode-se obter mais valor pelo mesmo custo ou até por menos. E mais, esse enfoque desonera a sociedade, que deixa de pagar pelos “custos externos” associados à produção de bens sem respeito ao meio ambiente e à população, já que os custos de poluição, saúde pública, desmatamento, entre outros, não são incluídos no preço dos produtos, e quem paga a conta somos nós. (ICLEI-LACS; GVces, 2008, p. 41) O caminho do desenvolvimento com sustentabilidade busca o uso eficiente dos recursos
  • 14. públicos através de decisões que minimizam as externalidades além de cumprir a legislação ambiental em vigor e, até mesmo as metas do governo como, por exemplo, a redução da emissão de gases poluidores. 3.2 Princípio constitucional da isonomia Conforme previsto no artigo 3° da Lei de Licitações, o princípio constitucional da isonomia deve ser observado no processo licitatório. Por isso, a licitação para selecionar a proposta mais vantajosa deve assegurar igualdade de condições aos participantes tanto no que se refere ao julgamento das propostas quanto à participação dos interessados que tenham condições de assegurar o objeto do contrato. Deste modo, tanto na fase interna de fixação dos critérios quanto na escolha do contratante é repelida a desigualdade injustificada, a descriminação arbitrária e opções pessoais e políticas. O ato convocatório define os critérios objetivos para participação dos interessados no processo de licitação para se chegar à proposta mais vantajosa. Neste momento, a Administração deve fixar os critérios de forma a não frustrar a competitividade, mas isso não quer dizer que não haverá diferenciação entre os participantes. O que é vedado pelo ordenamento é a arbitrariedade. Na proposta da licitação sustentável todos os participantes devem promover a proteção ambiental e, mais do que isso, devem respeitar a legislação ambiental em vigor. Nesta base, pode-se observar um passo importante a consolidação das licitações mais sustentáveis a Lei n° 11.079, de 30 de dezembro de 2004, que institui normas gerais para licitação e contratação de parceria público- privada no âmbito da administração pública que condiciona a licitação à licença ambiental, nos termo de seu artigo 10. Nota-se que a licitação sustentável coaduna com o princípio da isonomia. Não há violação a igualdade dos licitantes uma vez que o critério socioambiental não frustra a competividade e não discrimina a participação de todos aqueles aptos a promover a proposta mais vantajosa. Destarte, não será arbitrária ou injustificada a adoção de critérios socioambientais no processo licitatório tendo em vista a proteção do meio ambiente um direito fundamental de interesse de todos. 3.3 Princípio constitucional do desenvolvimento sustentável
  • 15. O conceito de desenvolvimento sustentável, divulgado pela Comissão Mundial Sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, é conhecido como o desenvolvimento que satisfaz as necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades. A noção de sustentabilidade destaca o meio ambiente, o crescimento econômico e a equidade social. Ou seja, não basta a proteção ambiental, há de se garantir uma justiça social, redistribuição dos recursos e crescimento econômico através de mudanças tecnológicas e sociais. Assim, eliminar ou reduzir as formas de consumo e produção insustentáveis dos recursos a fim de se manter a qualidade de vida tendo em vista a esgotabilidade das riquezas naturais. A Constituição brasileira apresenta o princípio do desenvolvimento sustentável em seus artigos 170 e 225, como um princípio geral da atividade econômica em que todos têm o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Há, assim, uma inevitável interligação do desenvolvimento ecônomico e a proteção ambiental. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado exposto no art. 225 se faz presente como princípio a ser respeitado pela atividade econômica no artigo 170, IV. A positivação deste princípio ilumina o desenvolver da ordem econômica, impondo sua sustentabilidade. [...] Não se pode pensar em desenvolvimento da atividade econômica sem o uso adequado dos recursos naturais, posto que esta atividade é dependente do uso da natureza, para sintetizar de maneira mais elementar. Destarte, a elaboração de políticas visando ao desenvolvimento econômico sustentável, razoavelmente garantido das crises cíclicas, está diretamente relacionada à manutenção do fator natureza da produção (defesa do meio ambiente), na mesma razão de proteção do fator capital (ordem econômica fundada na livre iniciativa) e da manutenção do fator trabalho ( ordem econômica fundada na valorização do trabalho humano). A consideração conjunta destes três fatores garante a possibilidade de atingir fins colimados pela ordem econômica constitucional: assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social. É o que se impõe textualmente o caput do artigo 170 da CF. (DERANI, 1997, p. 240) A Política Nacional do Meio Ambiente Lei n° 6.938/81 objetivou harmonizar a preservação ambiental ao desenvolvimento socio-econômico e à protecao da dignidade da vida humana principalmente em referência aos seus artigos 2° e 4°. Desta forma, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado está estritamente ligado à protecao do direito à vida e, assim sendo, conforme artigo 5° da Constituição sua natureza de garantia constitucional e fundamental exige aplicação imediata.
  • 16. Contudo, é necessária uma mobilização global de toda a sociedade e governos para concretização do desenvolvimento sustentável. Não há como aceitar a concepção do crescimento sem desenvolvimento econômico, social e ambiental. O princípio do desenvolvimento sustentável “só pode ser entendido se associado ao princípio da ubiquidade e realizado, portanto, numa parceria global.” (RODRIGUES, 2005, p.170). Desta forma, os governos devem atentar-se pela importância da licitação sustentável como um dos instrumentos de garantia do desenvolvimento sustentável tanto na esfera pública, como em relação aos particulares a partir de uma mudança nos padrões de produção e consumo. 4. LICITAÇÃO SUSTENTÁVEL NO MUNDO A preocupação com a conservação do meio ambiente é um tema fundamental na atualidade e vem sendo discutido desde a década de 70. Na Conferência Internacional do Meio Ambiente, realizada na cidade Estocolmo em 1972, iniciou a discussão sobre a necessidade de reagir ao problema da deterioração ambiental. O Relatório de Brundtland de 1987 delimitou e divulgou o conceito de desenvolvimento sustentável conhecido com o desenvolvimento que satisfaz as necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades. Em 1992, a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente, realizada no Rio, aprovou a Agenda 21 que prevê políticas para a promoção do desenvolvimento sustentável através de planejamentos que conciliam proteção ambiental, justiça social e eficiência econômica. A Agenda 21 funciona como um instrumento de planejamento para a construção de uma sociedade sustentável. Um dos seus objetivos é desenvolver políticas que estimulem a adoção de padrões de produção e consumo mais sustentáveis. Para isso, importante se faz o sistema de tomada de decisões no exercício de liderança que harmonizem o desenvolvimento econômico com o meio ambiente. Exercício da liderança por meio das aquisições pelos Governos 4.23. Os próprios Governos também desempenham um papel no consumo, especialmente nos países onde o setor público ocupa uma posição preponderante na economia, podendo exercer considerável influência tanto sobre as decisões empresariais como sobre as opiniões do público. Conseqüentemente, esses Governos devem examinar as políticas de aquisição de suas agências e departamentos de modo a aperfeiçoar, sempre
  • 17. que possível, o aspecto ecológico de suas políticas de aquisição, sem prejuízo dos princípios do comércio internacional. (AGENDA 21, cap. 4) As experiências da Agenda 21 não deixaram de ser atuais e essenciais a busca do novo paradigma de desenvolvimento sustentável. Entretanto, não se pode deixar de analisar o que foi realmente feito até o presente momento e o que ainda deve ser feito. A integração entre o meio ambiente e o desenvolvimento deve ocorrer em todos os níveis de tomada de decisão. O Estado tem um papel fundamental nesse aspecto uma vez que se revela um forte instrumento do mercado através de suas políticas e seu poder de compra. (a) Melhoramento dos processos de tomada de decisão 8.4. A principal necessidade consiste em integrar os processos de tomada de decisão relativos a questões de meio ambiente e desenvolvimento. Para tanto, os Governos devem realizar um exame nacional e, quando apropriado, aperfeiçoar os processos de tomada de decisão de modo a efetivar uma integração gradual entre as questões econômicas, sociais e ambientais, na busca de um desenvolvimento economicamente eficiente, socialmente eqüitativo e responsável e ambientalmente saudável. (AGENDA 21, cap. 8) Em continuidade às discussões da Agenda 21, no ano de 2002, ocorreu em Johanesburgo, na África do Sul o encontro da Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável, conhecida como Rio+10 que resultou na Declaração de Johanesburgo, importante marco da Licitação Sustentável. O Plano de Implementação divulgado nesse encontro ressaltou a adoção de mudanças no consumo e produção sustentáveis a nível mundial a fim de promover políticas de contratação pública que favoreçam o desenvolvimento e a difusão de mercadorias e serviços favoráveis ao meio ambiente. O desafio da sustentabilidade vai além de medidas regionais ou setoriais. O desafio deve ser incorporado pela sociedade internacional como forma de superar a crise ecológica em relação ao estilo de vida tanto em relação ao consumo e a produção insustentáveis, conseqüência do “distanciamento do homem com a natureza” (MELO, 2006, p.41). A complexidade da crise ecológica vai além das questões hoje em pauta, como o esgotamento dos “recurso naturais”, a poluição do solo, água e o ar, a geração de dejetos e resíduos industriais, a extinção da flora e da fauna, a desestabilização de ecossistemas, entre outras catástrofes. (...) O desafio imposto pela crise ecológica exige medidas que vão além das políticas setoriais, que possuem alcance limitado, devendo-se portanto incorporar a ecologia na discussão (no planejamento e ação) política acerca dos caminhos e prioridades das sociedades contemporâneas a fim de mudar o status quo que prioriza as políticas nacionais de cunho estritamente
  • 18. economicista, que tem como critério principal a “viabilidade econômica”. (MELO, 2006, p.40-41) O Direito Ambiental Internacional está estritamente vinculado a cooperação internacional. No artigo 4°, inciso IX, da CF, a “cooperação entre os povos para o progresso da humanidade” é um dos princípios que regem a relações internacionais e, consequentemente, a política do meio ambiente. Os Governos Locais pela Sustentabilidade, Secretariado para América Latina e Caribe (ICLEI-LACS) é a maior associação de governos locais e organizações governamentais nacionais e regionais com compromisso com o desenvolvimento sustentável. O ICLEI-LACS desenvolve e gerencia diversas campanhas e programas pela sustentabilidade, além de funcionar como agência ambiental na implementação de projetos, treinamento, conferências, pesquisas e consultoria em prol do desenvolvimento sustentável internacional para governos locais. No âmbito internacional é responsável por diversos projetos da Rede Compre Verde (BIG- Net) que possibilita um intercâmbio de informações das experiências sustentáveis e da Campanha Procura+ que avalia o que é um produto sustentável. No Brasil lançou o Guia de Compras Públicas Sustentáveis: uso do poder de compra do governo para a promoção do desenvolvimento sustentável atual referência nos estudos sobre o tema. No mundo, existe um debate sobre a possibilidade da adoção da licitação sustentável e sua legalidade. Contudo, muitos países, como Reino Unido, Canadá, Estados Unidos, Países Baixos, Noruega, África do Sul, Japão, Suécia, Áustria, Coréia do Sul e Suíça (ICLEI-LACS; GVces, 2008, p.29) já incorporaram a adoção de critérios sócio-ambientais nas licitações públicas em seu ordenamento jurídico. A premissa de todas essas experiências é a promoção da sustentabilidade através da iniciativa governamental e, a partir daí, viabilizar uma influência notória por parte dos fornecedores e consumidores. A licitação sustentável em nível internacional busca através de certificações, rótulos e selos determinar e divulgar os produtos e serviços mais ecológicos. 5. APLICAÇÃO DA LICITAÇÃO SUSTENTÁVEL No caso da licitação o certame vigente desconsidera o desenvolvimento sustentável. Entretanto, algumas iniciativas já demonstram a necessidade de adequação do desenvolvimento econômico e o meio ambiente ecologicamente equilibrado como a Cartilha de Compra Sustentáveis divulgada pelo governo do Estado de Minas Gerais.
  • 19. No âmbito federal foi publicado a Instrução Normativa n° 01, de 19 de janeiro de 2010, sobre a adoção de critérios de sustentabilidade ambiental no processo licitatório pela Administração Pública. Ora, não é somente o Estado que tem o poder de fomentar novas atitudes de mercado em prol da sustentabilidade, mas a própria sociedade atual exige e busca produtos e serviços mais preocupados com a questão ambiental. A licitação sustentável deverá ser aplicada em todas as fases do processo. Além da formalização do contrato e sua execução. Com isso, ressalta-se a importância dos estudos no que concerne a caracterização de um produto, serviço ou obra sustentável. O desempenho ambiental ao longo do ciclo de vida considera o impacto ambiental na produção, distribuição, uso e disposição. perspectiva do ciclo de vida — para evitar a transferência de impactos ambientais negativos de um meio ambiente para outro, e para incentivar melhorias ambientais em todos os estágios da vida do produto, é preciso que todos os impactos e custos de um produto durante todo seu ciclo de vida (produção, distribuição, uso e disposição) sejam levados em conta quando se tomam decisões de compras. A oferta economicamente mais vantajosa deve ser determinada com base nos custos econômicos e ambientais totais causados pelo produto durante toda sua vida. (ICLEI-LACS; GVces, 2008, p.22) Ademais, a sustentabilidade considera a real necessidade de compra e consumo, a demanda dos consumidores, incluindo a Administração Pública, em adquirir produtos e serviços que consideram os aspectos ambientais, inovação tecnológica e o ciclo de vida. Assim, as decisões devem considerar todos os custos econômicos e ambientais a partir da adoção desses critérios, como no ato convocatório e nos projetos das obras públicas. O ato convocatório é um ato administrativo prévio que define o objeto e os critérios objetivos para participação da licitação. Este ato é chamado usualmente de edital ou convite, na modalidade de licitação convite. A fase interna da licitação é responsável pela elaboração do edital e definição do que será licitado, o objeto, as cláusulas do futuro contrato, condições de participação, critérios de julgamento além do requisitos apresentados no artigo 40 da Lei de Licitação. Além disso, de acordo com esse artigo, a Administração não pode descumprir as normas e condições do edital, ao qual se acha estritamente vinculada. Daí, a importância de fixação dos critérios na fase interna da licitação anterior a publicação do edital. Os critérios estabelecidos serão objetivos, necessários e úteis e constituirão um vínculo com o interesse público. O edital deve conter exigências de qualificação técnica e econômica
  • 20. indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações conforme artigo 37, inciso XXI, da Constituição Federal. Sendo assim, os critérios a serem adotados pela Administração Pública para julgamento e declaração da proposta mais vantajosa devem ser àqueles que realmente atendam ao interesse público (assim concebido como aquele resultante da aferição e da mediação dos diversos interesses coletivos legítimos existentes em cada caso) efetivamente existente no caso da contratação em análise. A definição ex ante e automática de apenas um critério a formar a proposta mais vantajosa (preço, por exemplo), ignorando outros interesses legítimos e que serão afetados pela contratação a ser realizada, não se coaduna com a hodierna Administração Pública. (SCHIRATO, 2006, p. 104) Um dos desafios atuais do governo e de toda a sociedade é a busca pela sustentabilidade. Desta maneira, a opção de adotar um edital mais sustentável é o primeiro passo. No caso de aquisição de produtos pela Administração Pública entende-se que “produto sustentável é aquele que apresenta o melhor desempenho ambiental ao longo de seu ciclo de vida, com função, qualidade e nível de satisfação igual ou melhor, se comparado com um produto- padrão.” (ICLEI-LACS; GVces, 2008, p. 59) É necessário que as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis sejam entendidas de maneira a garantir a proteção do meio ambiente na composição do edital. Com base nos princípios da Política Nacional do Meio Ambiente de ação governamental de manutenção do equilíbrio ecológico e controle e zoneamento das atividades potencialmente poluidoras foi formulada a Instrução Normativa n° 01, de 19 de janeiro de 2010, pelo Secretário de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, em relação a aquisição de bens, contratação de serviços ou obras pela Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional. Em seu artigo 2o, dispõe que “o instrumento convocatório deverá formular as exigências de natureza ambiental de forma a não frustrar a competitividade.” Em relação ao tipo de licitação o rol do artigo 45 da Lei n° 8.666/93 é taxativo cabendo ao edital especificar de forma clara e objetiva o tipo a ser adotado: menor preço, melhor técnica, técnica e preço e maior lance. O tipo menor preço é o mais usado tendo em vista a preocupação com a gestão dos recursos públicos. Contudo, o próprio artigo 45 determina que a proposta vencedora é a que apresentar a proposta de acordo com as especificações do edital e ofertar o menor preço. Ou seja, o vencedor não será o que oferecer o menor preço pois deverá preencher todos os demais requisitos especificados no edital. Um dos problemas enfrentados nesse tipo de licitação, menor preço, corresponde a
  • 21. desconsideração de outros requisitos relevantes para alcance da proposta mais vantajosa, como a qualidade do objeto licitado e, além disso, se o produto atende a requisitos ambientais. O desenvolvimento sustentável como princípio constitucional da ordem econômica, atualmente, depende de uma atuação mais empírica entre os envolvidos. Para os economistas ecológicos, entretanto, é fundamental que se (re)conheça a priori a capacidade de suporte da biosfera, condição e pré- requisito para a definição dos limites da escala de produção e das atividades humanas, segundo critérios que a sustentabilidade social, econômica e ecológica. (MELO, 2006, p.112) Com isso, importante determinar previamente os critérios no edital como forma de garantir que o objeto contratado atenda as necessidades da Administração, sociais, econômicas e ecológicas. Ademais, a própria lei de licitação determina que o vencedor deverá atender não somente o critério de menor preço, mas apresentar proposta de acordo com as especificações do edital. É necessário que gestão dos recursos públicos tome uma postura mais condizente com a complexidade que envolve a sustentabilidade ao analisar o menor preço sob a perspectiva de minimizar as externalidades. O atual processo de valorização monetária dos bens e serviços ambientais determina as preferências das gerações futuras, o que é bastante problemático, inclusive eticamente: as gerações atuais não têm condições objetivas (de natureza histórica) para estabelecerem as preferências, os gostos e os hábitos das gerações futuras. Além disso, o sistema de preços não considera a degradação ambiental total. A esta situação, de não incorporar todos os custos sociais e ecológicos no sistema geral de preços, os economistas ecológicos denominaram troca ecologicamente desigual. (MONTIBELLER apud, MELO, 2006, p. 112) Neste caminho, a exigência de critérios de sustentabilidade no edital pode garantir que o interesse da Administração seja alcançado naquele caso concreto, além da proteção ao meio ambiente e o cumprimento da legislação ambiental em vigor. É nessa oportunidade, de elaboração do ato convocatório, que a Administração opta pelos critérios que satisfazem ao interesse público. O Estado tem um importante papel na transformação do mercado voltado à produção e consumo de bens mais sustentáveis. A licitação sustentável levará a uma readequação dos fornecedores e até mesmo dos consumidores em direção ao uso racional e sustentável dos recursos. Os critérios e exigências socioambientais devem conduzir principalmente essa fase do processo. Neste momento, a Administração possui discricionariedade para atender a finalidade da lei. A finalidade da lei é a busca pela proposta mais vantajosa possível ao interesse público. Para
  • 22. tanto, vital é estabelecer tais requisitos, critérios e seus limitadores compatíveis com a visão mais sustentável dos contratos e tomada de decisões dos governos tendo em vista exigência e comprometimento com a proteção do meio ambiente. No caso de obras e serviços, o artigo 12 da Lei de Licitação demonstra a preocupação do Estado com a questão ambiental ao estabelecer o impacto ambiental como um dos requisitos a serem considerados pelos projetos básicos e executivos. O licenciamento ambiental é outro instrumento que demonstra essa preocupação fundamentada pela Política Nacional do Meio Ambiente. A Constituição Federal estabelece o dever do Estado de garantir o direito fundamental de preservação do meio ambiente através de políticas que minimizam as externalidades de potenciais obras que degradam o ambiente através de estudos prévios de impacto ambiental. Todavia, não exaure a necessidade de um projeto mais sustentável. Neste pensamento surgiu a Instrução Normativa n° 01, de 19 de janeiro de 2010, que dispõe sobre os critérios de sustentabilidade ambiental na aquisição de bens, contratação de serviços ou obras pela Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional. Em seu artigo 4° determina que as especificações e demais exigências do projeto básico ou executivo devem ser elaborados visando à economia da manutenção e operacionalização da edificação, a redução do consumo de energia e água, bem como a utilização de tecnologias e matérias que reduzam o impacto ambiental. Outro importante documento que pretende promover esse olhar mais sustentável imprescindível aos projetos é o Manual de Obras Sustentáveis disponibilizado pelo Governo do Estado de Minas Gerais. No entanto, ainda há muito que se fazer para alcançar a sustentabilidade de uma obra pública de modo mais efetivo. O objetivo da integração de critério ambientais contempla a utilização da tecnologia em favor da sustentabilidade agregando valores na implementação, execução, operacionalização e manutenção. Uma boa gestão de todos os aspectos de planejamento, construção e uso podem reduzir dramaticamente o custo de uma edificação ao longo de sua vida-útil, sem que necessariamente sejam necessários mais investimentos no processo inicial de projeto e construção. Ademais, considerada a escala das compras e contratações para obras públicas, o estado, através de projetistas e executores, tem grande capacidade potencial de criar novos parâmetros de mercado, tornando produtos e serviços sustentáveis cada vez mais economicamente acessíveis. (MINAS GERAIS, 2008, p.10-11) A gestão pública atual prioriza o menor preço. A obra pública sustentável porém, estimula uma revisão do que seria o menor preço e menor custo considerando outros aspectos além do econômico, como a vida útil e o ciclo de vida de materiais e serviços. Importante exemplo refere-se
  • 23. à Política Nacional de Conservação e Uso Racional de Energia, Lei n° 10.295, de 17 de outubro de 2001 que, de acordo com seu artigo 1°, visa a alocação eficiente de recursos energéticos e a preservação do meio ambiente. A licitação sustentável no que se refere à obra pública, apenas de forma exemplificativa, promove a necessidade que seus projetos assimilem políticas de eficiência energética, gestão econômica da água e gestão de resíduos e garantem o cumprimento das exigências legais ambientais dessas políticas já em vigor. Em relação à aquisição direta e o emprego de produtos e subprodutos de madeira de origem nativa, o objeto é parte da legislação especifica no país através de Decretos estaduais como, no Estado de Minas Gerais, o Decreto n° 44.903, de 24 de setembro de 2008 e no Estado de São Paulo, o Decreto n° 49.674, de 6 de junho de 2005, que estabelecem procedimentos de controle ambiental. Neste caso, cabe a reflexão, se houvesse o cumprimento de todas as exigências ambientais legais e reformulações de suas políticas, poderia ser desnecessária a promoção da licitação sustentável uma vez que toda licitação seria, de certa forma, sustentável. CONCLUSÃO Atualmente, é cada vez mais discutida pela sociedade e governos a necessidade de proteção do meio ambiente. Fazem-se urgentes atitudes e decisões das autoridades governamentais a fim de barrar a degradação do meio ambiente tendo em vista discussões sobre os fenômenos do aquecimento global. Além disso, a busca pela sustentabilidade não reflete apenas uma preocupação ambiental em seu sentido mais estrito, mas atinge diversas outras acepções sociais e econômicas. O desenvolvimento sustentável compartilha a idéia de uma sociedade mais justa com a redistribuição de recursos como incentivo ao crescimento econômico. A partir daí, a integração entre o meio ambiente e o desenvolvimento deve ocorrer em todos os níveis de tomada de decisão. O Estado tem um papel fundamental nesse aspecto uma vez que se revela detentor de fortes instrumentos de fomento do mercado na produção e consumo de bens mais sustentáveis como a implementação de políticas e o uso consciente de seu poder de compra. A Administração Pública deve orientar suas atividades pelos princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Desta forma, ao realizar os processos licitatórios obedecerá a estes e, ainda, aos princípios específicos arrolados na lei de
  • 24. licitações, quais sejam da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório e do julgamento objetivo. Além observar o princípio constitucional da isonomia e garantir a seleção da proposta mais vantajosa. Para a licitação sustentável a busca pela proposta mais vantajosa deve ser entendida e analisada em um contexto mais amplo, ou seja, a escolha deve considerar o interesse público em todas suas acepções. O critério apenas econômico tendo em vista o menor preço poderia levar o próprio Estado, ao não analisar os critérios ambientais e sociais, a afrontar sua própria legislação e, até mesmo, utilizar-se de forma irresponsável os seus recursos financeiros. A proteção ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é direito fundamental, conforme artigos 225 e 170 da Constituição e deve, portanto, ser garantido por todo o ordenamento jurídico. A Política Nacional do Meio Ambiente, também, promove o desenvolvimento sustentável como dever do Estado, e não mera faculdade. A interpretação sistemática do ordenamento permite constatar a necessidade do Estado em adotar a licitação de modo sustentável o que, inclusive, torna o processo mais eficiente. Produtos e serviços sustentáveis minimizam os custos estatais com seus ciclos de vida, em razão da menor impacto de externalidades negativas. Consequentemente, promove uma eficiente gestão dos recursos públicos vez que se considera todas as possibilidades de dispêndios, atendendo aos preceitos da Administração Pública e, em especial, à legislação ambiental. Desta forma, a exigência desses critérios como pressuposto de validade no processo licitatório permite que o interesse público atenda concomitantemente à economicidade e outros interesses igualmente legítimos como a proteção ambiental. Sendo assim, não caberá juízo de conveniência e oportunidade a adoção desses critérios. Portanto, a Administração Pública deve sempre optar pela licitação sustentável. Porém, diante da realidade das tecnologias, produtos e serviços disponíveis no mercado e suas finanças, pode ser constatado pela Administração a impossibilidade ou extrema dificuldade que poderia causar-lhe ônus insuperáveis. Nestes casos excepcionais é indispensável que a autoridade responsável justifique a inviabilidade motivando-a devidamente. Além disso, a sustentabilidade é um desafio que exige uma parceria global, logo, sua concretização depende de toda a sociedade internacional em todos os níveis de tomada de decisão para mudança de padrões de consumo mais sustentáveis. O Poder Público destaca-se como o maior comprador e detentor de importante ferramenta de influência. Surge então a possibilidade do Estado, desenvolvendo seu papel de fomento à economia, estimular o mercado de produtos e serviços sustentáveis, viabilizando uma maior competitividade que terá como consequência a busca de tecnologias mais eficientes e menores preços. Os critérios ambientais, sociais e econômicos devem orientar todas as fases do processo
  • 25. licitatório. Deste modo, a aplicação da licitação sustentável exige a incorporação no ato convocatório de critérios não meramente econômicos. Diante da imposição do art. 37, inciso XXI, da Constituição, que somente permite exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações, temos que a aderência aos critérios expostos, desde que assegurada a igualdade de participação para todos os interessados, não ofende qualquer dispositivo legal. Ademais, a proteção do meio ambiente consubstancia um direito fundamental, sendo indispensável seu atendimento em todos os institutos do nosso ordenamento. Por fim, conclui-se que a licitação sustentável, não obstante a necessidade de aprimoramento da legislação vigente, coaduna com o ordenamento jurídico brasileiro como forma de garantir os fundamentos do Estado Democrático de Direito, o interesse público e direitos fundamentais. Sendo assim, não caberá à Administração Pública a discricionariedade em relação à adoção do instituto uma vez que conforme disposto na Constituição Federal, impõe-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defender e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações. REFERÊNCIAS AGENDA 21. Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. Disponível em: <http://www.mma.gov.br/sitio/index.php?ido=conteudo.monta&id Estrutura=18&id Conteudo=575> Acesso em: 10 mar. 2010. ANTUNES, Luis Filipe Colaço. A tutela dos interesses difusos em direito administrativo: para uma legitimação procedimental. Coimbra: Almedina,1989. BRASIL. Constituição (1988) Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado, 1988. BRASIL. Lei 8.666, de 21 jun. 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências. Diário Oficial, Brasília, 22 jun. 1993. BRASIL. MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO, ORÇAMENTO E GESTÃO. Instrução Normativa n. 01, de 19 de janeiro de 2010. Dispõe sobre os critérios de sustentabilidade ambiental na aquisição de bens, contratação de serviços ou obras pela Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional e dá outras providências. Disponível em: <http://www.int.gov.br/Novo/pregao/pdfs/INT_RJ_Instrucao_Normativa_012010.pdf> Acesso em:
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