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1
2
Depois de passarmos pelas semanas de anestesiologia e
oftalmologia, nós, estudantes da Turma 79, indignados e
insatisfeitos pelo fato de o curso ser extremamente pesado e pouco
proveitoso (uma síntese perfeita do que é o 4º ano e a graduação
como um todo), elaboramos esta apostila de maneira coletiva. O
intuito era produzir um material voltado às necessidades do
estudante: objetivo, de linguagem simples e clara e voltado para a
formação do médico generalista. Além de contribuir para o nosso
próprio aprendizado, por ser um método de avaliação que exige do
aluno competências mais importantes do que decorar informações
de um dia para o outro, a manufatura desta apostila é uma forma
de protesto pela falta de qualidade do curso e um pedido de
reformulação para os próximos estudantes. Quando falamos
“curso”, nos referimos às semanas de oftalmologia e anestesiologia,
aos demais módulos do 4º ano e aos 3 anos pelos quais já
passamos.
Esperamos que aproveitem o material e possam continuar
insistindo por mudanças que contribuam com nosso aprendizado.
Turma 79
3
SUMÁRIO
1. Classificação, nomenclatura e fisiopatologia da dor ....................................................... 8
1.1. Nomenclatura
1.2. Classificação
1.3. Fisiopatologia da Dor
1.4. Literatura consultada e sugerida
2. Avaliação do Paciente com Dor .................................................................................... 15
2.1. Introdução
2.2. Retomando o Conceito de Dor
2.2.1. Conceito genérico de dor
2.2.2. A dor aguda
2.2.3. A dor crônica
2.3. Avaliação Propedêutica da Dor
2.3.1. As dez características semiológicas da dor
2.4. Abordagem Clínica da Dor: uma breve introdução
2.5. Questões
2.6. Literatura consultada e sugerida
3. Tratamento da dor ...................................................................................................... 19
3.1.Fármacos
3.2. Modalidades físicas no tratamento da dor
3.3. Tratamentos invasivos
3.4. Procedimentos cirúrgicos
3.5. Questões
3.6. Literatura consultada e sugerida
4. Dor no câncer: características e controle ..................................................................... 29
4.1. Introdução
4.2. Etiopatogenia
4.3. Avaliação do Paciente
4.4. Tratamento
4.5. Literatura consultada e sugerida
5.Dor aguda pós-operatória ............................................................................................. 33
5.1. Introdução
5.2. Definição de DPO
5.3. Fisiopatologia da DPO
5.4. Efeitos e complicações sistêmicas da DPO
5.5. Tratamento da DPO
5.6. Questões
5.7. Literatura consultada e sugerida
6. Anestesia - conceitos .................................................................................................. 39
6.1. Conceitos gerais
6.1.1. O que é anestesia?
6.1.2. Tipos de anestesia
6.1.3. Técnicas anestésicas
6.2. Drogas anestésicas
6.2.1. Agentes inalatórios
6.2.2. Anestésicos intravenosos
4
6.2.3. Anestésicos locais
6.2.4. Bloqueadores neuromusculares
6.3. Questões
6.4. Literatura consultada e sugerida
7. Avaliação pré-anestésica ............................................................................................. 44
7.1. Introdução
7.2. O interrogatório complementar sobre os diversos aparelhos
7.3. Antecedentes pessoais
7.4. Exame físico
7.5. Exames complementares
7.6. Medicações pré-anestésicas
7.7. Questões
7.8. Literatura consultada e sugerida
8.Monitorização em Anestesia ........................................................................................ 48
8.1. Introdução
8.2. Monitorização hemodinâmica
8.2.1. Pressão venosa central
8.2.2. Pressão arterial invasiva
8.2.3. Cateter de artéria pulmonar
8.3. Monitorização da função respiratória
8.3.1. Monitorização da oxigenação
8.3.2. Monitorização da ventilação
8.4. Monitorização da mecânica respiratória
8.5. Questões
8.6. Literatura consultada e sugerida
9. Anestésicos locais ........................................................................................................ 52
9.1. Conceito
9.2. Propriedades físico-químicas
9.3. Mecanismo de ação
9.4. Farmacocinética
9.5. Dose
9.6. Efeitos adversos e toxicidade
9.7. Questões
9.8. Literatura consultada e sugerida
10. Bloqueadores Neuromusculares e Antagonismo de Bloqueio .................................... 59
10.1. Introdução
10.2. Transmissão Neuromuscular
10.3. Bloqueadores Neuromusculares Despolarizantes
10.4. Bloqueadores neuromusculares adespolarizantes ou por competição
10.5. Reversão do Bloqueio Neuromuscular
10.6. Monitorização da Transmissão e do Bloqueio Neuromuscular
10.7. Questões
10.8. Literatura consultada e sugerida
11. Anestesia Geral ......................................................................................................... 65
11.1. Introdução
11.1.1. Definição e objetivos da anestesia geral
11.1.2. Objetivos da anestesia geral
5
11.2. Anestesia Inalatória
11.2.1. Farmacocinética da anestesia inalatória
11.2.2. Farmacodinâmica da anestesia inalatória
11.2.3. Farmacologia dos agentes inalatórios
11.3. Anestesia Venosa
11.3.1. Anestésicos não opioides
11.3.2. Anestésicos opioides
11.4. Questões
11.5. Literatura consultada e sugerida
12. Raquianestesia e Anestesia Peridural ......................................................................... 73
12.1. Introdução
12.1.1. Conceitos importantes
12.1.2. Considerações anatômicas
12.2. Raquianestesia
12.2.1. Fisiologia
12.2.2. Técnica
12.2.3. Indicações e Contraindicações
12.3. Anestesia Peridural
12.3.1. Fisiologia
12.3.2. Técnica
12.3.3. Indicações e Contraindicações
12.4. Complicações dos bloqueios espinhais
12.5. Bloqueio combinado raquiperidural
12.5.1. Técnica
12.5.2. Indicações, contraindicações e vantagens
12.6. Questões
12.7. Literatura consultada e sugerida
-operatória ..........................................................................
80
13.1.Métodos de avaliação da responsividade a infusão de fluidos
13.1.1 Métodos estáticos
13.1.2 Métodos dinâmicos
13.2 Tipos de fluidos
13.2.1 Cristaloides
13.2. 2 Coloides
13.2.2.1 Albumina
13.2.2.2 Hidroxietilamidas (HES)
13.2.2.3 Dextranas
13.2.2.4 Gelatinas
13.2.3 Sangue
13.2.3.1 Sangue total
13.2.3.2 Concentrado de hemácias
13.3. Literatura consultada e sugerida
- ...................................................................................... 85
14.1. Introdução
14.2. Avaliação de pacientes e monitoramento
14.2.1. Função respiratória
6
14.2.2. Função cardiovascular
14.2.3. Função neuromuscular
14.2.4. Estado mental
14.2.5. Náuseas e vômitos
14.2.6. Temperatura
14.2.7. A produção de urina e micção
14.3. Critério de alta
14.4. Questões
14.5. Literatura consultada e sugerida
.......................................................................................
90
15.1. Introdução
15.2. Os pacientes críticos
15.3. O que causa dor?
15.4. Avaliação da dor e sedação
15.5. Tratamento da dor e sedação
15.6. Técnicas de analgesia e sedação
15.6.1. Técnica de analgesia antes da sedação
15.6.2. Administração em bolo e infusão
15.6.3. Interrupção diária da infusão
15.7. Medicamentos e técnicas para analgesia e sedação
15.7.1. Anti-inflamatórios, Paracetamol e Dipirona
15.7.2. Opioides
15.7.3. Analgesia Controlada pelo Paciente (PCA)
15.7.4. Agonistas do ácido gama amino butírico (GABA)
15.7.5. Agonistas adrenérgicos alfa-2
15.7.6. Etomidato
15.7.7. Bloqueadores neuromusculares
15.7.8. Outros fármacos
15.7.9. Analgesia regional
15.8. Questões
15.9. Literatura consultada e sugerida
16. O Paciente em Sepse ................................................................................................ 100
16.1. Introdução
16.2. Epidemiologia
16.3. Fisiopatologia
16.4. Critérios diagnósticos e definições
16.5. Tratamento
16.6. Questões
16.7. Literatura consultada e sugerida
17. Estados de Choque ................................................................................................... 104
17.1. Introdução
17.2. Fisiopatologia
17.2.1. Hemodinâmica
17.2.2. Alterações Hemodinâmica no Choque
17.3. Classificação dos Estados de Choque
17.3.1. Choque Hipovolêmico
7
17.3.2. Choque Cardiogênico
17.3.3. Choque Obstrutivo
17.3.4. Choque Distributivo
17.4. Estágios Evolutivos do Choque
17.4.1. Choque Compensado
17.4.2. Choque Descompensado
17.4.3. Choque Irreversível
17.5. Questões
17.6. Literatura consultada e sugerida
18. Insuficiência Respiratória e Síndrome da Angústia Respiratória Aguda .................... 109
18.1. Introdução
18.2. Insuficiência respiratória ventilatória
18.3. Insuficiência respiratória hipoxêmica
18.4. Investigação do mecanismo de hipoxemia
18.5. Síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA)
18.6. Questões
18.7. Literatura consultada e sugerida
19. Ventilação mecânica ................................................................................................ 113
19.1. Introdução
19.2. Ventilação não invasiva
19.3. Ventilação mecânica invasiva
19.4. Conceitos importantes
19.5. Modalidades respiratórias
19.6. Desmame
19.7. Complicações
19.8. Questões
19.9. Literatura consultada e sugerida
20. Distúrbios hidroeletrolítico e ácido-básico ............................................................... 123
20.1. Introdução
20.2. Equilíbrio hidroeletrolítico
20.2.1. Metabolismo normal da água e eletrólitos
20.2.2. Regulação do equilíbrio hidroeletrolítico
20.2.3. Alterações do equilíbrio hidroeletrolítico
20.3. Equilíbrio ácido-básico
20.3.1. Equação de Henderson-Hasselbalch
20.3.2. Mecanismos de compensação
20.3.3. Distúrbios ácido-básicos
20.4. Questões
20.5. Literatura consultada e sugerida
21. Gabarito .................................................................................................................. 131
8
1.Classificação, nomenclatura e fisiopatologia da dor
1.1. Introdução
1.2. Nomenclatura
1.3. Classificação
1.4. Fisiopatologia da Dor
1.5. Questões
1.6. Literatura consultada e sugerida
1.1. Introdução
“Dor é uma experiência sensitiva desagradável associada a uma lesão atual ou potencial”
(IASP, 1994). Conceituar e graduar experiências tão subjetivas como a dor é quase
impossível, como mostra essa definição bastante ampla e vaga da International Association
for the Study of Pain (IASP) feita em 1994. No entanto, convenções como essa, em que se
tenta ao máximo aproximar manifestações clínicas aparentemente desconexas, são a única
saída para que os profissionais e serviços de saúde possam conversar e juntar esforços no
diagnóstico e tratamento da dor.
1.2.Nomenclatura
A nomenclatura da dor é importante para homogeneizar descrições de
manifestações clínicas.
De acordo com a International Association for the Study of Pain (1994), temos:
 Dor: experiência sensitiva desagradável associada à lesão atual ou potencial;
 Dor referida: distante da área da lesão;
 Limiar de dor: menor intensidade de estímulo que leva à percepção;
 Neuralgia: dor na distribuição do nervo que pode ou não ser acompanhada de sinais de
hipofunção do nervo;
 Hiperalgesia: aumento da resposta ao estímulo que normalmente é doloroso;
 Hiperestesia: aumento da sensibilidade ao estímulo;
 Hiperpatia: síndrome dolorosa caracterizada por aumento da reação ao estímulo,
especialmente se for repetitivo;
 Hipoestesia: diminuição da sensibilidade ao estímulo, excluindo os sentidos especiais;
 Hipoalgesia: diminuição da sensibilidade ao estímulo nóxico;
 Analgesia: ausência de dor ao estímulo nociceptivo;
 Anestesia dolorosa: dor em região adormecida;
 Neurite: inflamação do nervo;
 Neuropatia: distúrbio da função ou alteração patológica do nervo;
 Alodínia: dor ao estímulo que geralmente não provoca dor;
 Parestesia: sensação anormal, espontânea ou evocada nem sempre agradável;
 Disestesia: sensação anormal, espontânea ou evocada, sempre desagradável.
9
1.3.Classificação
A dor pode ser classificada em
relação à:
1. Fisiopatologia;
2. Duração;
3. Localização;
4. Etiologia;
5. Dependência do sistema simpático;
6. Região afetada;
7. Síndrome.
1. Quanto à fisiopatologia, será discutida em tópico à parte.
2. Quanto à duração, a dor pode ser aguda ou crônica. A dor aguda desaparece junto com a
lesão. A dor crônica desaparece e tem duração maior que 3 a 4 meses.
CLASSIFICAÇÃO DA DOR QUANTO À DURAÇÃO
Dor Aguda Dor Crônica
Súbita Persistente, longa duração
Sintoma Doença
Causa ansiedade, medo irritação Não tem função biológica
Alerta para risco de lesão Causa alterações fisiológicas
Provoca alteração neurovegetativa:
Sudorese, dilatação da pupila
Causa alterações psicológicas:
depressão, ansiedade, falta de prazer,
letargia
Aumenta as frequências cardíaca e
Respiratória
Causa distúrbio do sono
Tem alívio inadequado
Acarreta perda social, incapacitação
3. Quanto à localização, a dor pode ser somática ou visceral.
Exemplos de dor somática: artrite, tumor ósseo, tendinite, bursite.
Exemplos de dor visceral: infarto do miocárdio, obstrução intestinal, tumor no pâncreas.
CLASSIFICAÇÃO DA DOR QUANTO À LOCALIZAÇÃO
Dor somática Dor visceral
Bem localizada Pouco localizada
Próxima à lesão Alterações autonômicas
Pode exacerbar com movimento Dor referida
4. Quanto à etiologia, a dor pode ser causada por: trauma, cirurgia, herpes zoster, câncer,
hérnia de disco, infecção, isquemia, espasmo.
5. A dor pode ser dependente ou independente do sistema simpático. Podem ser mantidas
pelo simpático: síndrome complexa de dor regional (SCDR), neuralgia, dor inflamatória, dor
central, dor fantasma.
10
6. Em relação à região afetada, a dor
pode ser classificada em:
 Lombar;
 Torácica;
 Cefálica;
 Cervical;
 Abdominal;
 Pélvica;
 Dos membros.
7. As síndromes dolorosas podem ser:
 Lombalgia e lombociatalgia;
 Cervicobraquialgia;
 Miofascial;
 Fibromiálgica;
 SCDR;
 Central;
 Neuropatia;
 Trauma
11
1.4. Fisiopatologia da Dor
A dor pode ser nociceptiva, resultante da ativação de nociceptores, ou
neuropática, decorrente de alteração ou lesão do sistema nervoso.
Dor por nocicepção
Nocicepção é um termo neurofisiológico que se refere aos mecanismos
neurológicos mediante os quais um estímulo lesivo é detectado.
O primeiro passo na sequência de eventos que originam a dor é a
transformação de estímulos lesivos em potenciais de ação (transdução), que serão
transmitidos ao sistema nervoso central (SNC) através de fibras nervosas periféricas.
A partir de um potencial gerado nos nociceptores, sejam eles viscerais,
osteoarticulares, musculoesqueléticos ou tegumentares, o estímulo seguirá pelas
fibras aferentes primárias até a medula espinal e, através das vias ascendentes, será
projetado no córtex, onde ocorre a percepção consciente da dor, após conexões com
estruturas como o tálamo e a formação reticular.
A lesão tecidual provoca formação e liberação de substâncias que sensibilizam
e ativam os nociceptores (terminações nervosas livres de fibras A-delta e C, que são
responsáveis pela transmissão da dor e que respondem aos estímulos mecânicos,
térmicos ou químicos), seguidas de transmissão do impulso para a medula espinal e
para os centros supra-espinais.
Existem três classes de nociceptores: mecanoceptores (sensíveis a estímulo
mecânico intenso), termoceptores (ativados por temperaturas extremas) e polimodais
(respondem a estímulo térmico, mecânico e químico).
A diferença de condução entre as fibras A-delta (pouco mielinizadas, com maior
velocidade de condução que as fibras C) e as fibras C (amielinizadas) faz que aquelas
sejam responsáveis pela “primeira dor” e estas, pela “segunda dor”.
O glutamato e a substância P são os principais neurotransmissores nociceptivos
das fibras aferentes A delta e C.
12
Dor neuropática
A dor neuropática é causada por lesão ou disfunção do sistema nervoso central
ou periférico e caracteriza-se por hipersensitividade patológica de membranas
excitáveis; inclui entidades heterogêneas, as quais diferem em etiologia e local da
lesão. As características da dor são variadas.
As condutas terapêuticas são diferentes e o alívio do sintoma é mais difícil que
na dor nociceptiva, tornando necessária, muitas vezes, a associação de medicamentos
e tratamentos.
Após alteração ou lesão do sistema nervoso, periférico ou central, pode ocorrer
dor neuropática, que está associada a uma cascata de eventos que inclui alterações
biológicas importantes.
A interrupção parcial ou total de fibras aferentes causa degeneração de
terminações pré-sinápticas da célula desaferentada e alterações funcionais e
morfológicas denominadas neuroplasticidade.
Na sinapse, o neurônio denervado pode ser reinervado por outros axônios; as
sinapses inibitórias podem ser substituídas por excitatórias, formando conexões
anormais; as sinapses ineficazes tornam-se ativas e ocorre aumento da efetividade das
sinapses ativas. As conexões excitatórias podem expandir-se para células próximas
com surgimento de células responsivas em regiões previamente silenciosas. Os
neurônios do SNP tornam-se mais sensíveis a estímulos neurotransmissores.
A representação sensitiva somática da região desaferentada é mantida no
sistema nervoso central. Essa memória pode ser ativada após longos períodos, o que
explica o aparecimento tardio da dor em alguns pacientes.
13
Resumindo...
1.5. Questões
1. Defina “dor”.
2. Diferencie neuralgia de neuropatia.
3. Cite no mínimo 3 etiologias de dor.
4. Diferencie dor por nocicepção de dor neuropática.
14
1.6. Literatura consultada e sugerida
Sakata, Rioko Kimiko; Issy, Adriana Machado. Dor. Guias de Medicina Ambulatorial e
Hospitalar da Unifesp-EPM. Editora Manole, 2ª edição. 2008.
15
2. Avaliação do Paciente com Dor
2.1. Introdução
2.2. Retomando o Conceito de Dor
2.2.1. Conceito genérico de dor
7.2.2. A dor aguda
7.2.3. A dor crônica
2.3. Avaliação Propedêutica da Dor
2.3.1. As dez características semiológicas da dor
A) Início
B) Frequência e duração
C) Localização
D) Irradiação
E) Caráter ou qualidade
F) Intensidade
G) Fatores desencadeantes
H) Fatores atenuantes
I) Fatores agravantes
J) Fatores concomitantes
2.4. Abordagem Clínica da Dor: uma breve introdução
2.4. Questões
2.5. Literatura consultada e sugerida
2.1. Introdução
Antes de entrarmos no assunto propriamente dito desse capítulo, a avaliação
do paciente com dor, é importante destacarmos a importância do estudo desse tema.
A avaliação do paciente em si não é um assunto recorrente em provas de residência
(encontramos mais em provas de residência de enfermagem do que de medicina), mas
é fundamental para a prática médica do dia-a-dia.
Esse capítulo, portanto, é muito mais voltado a relembrar algumas informações
aprendidas (na medida do possível) no curso de Semiologia do 3º ano, que serão uma
base para a compreensão de conceitos de anestesiologia, dor e terapia intensiva e
para o atendimento e a abordagem ao paciente com dor.
É importante lembrar que, em termos de epidemiologia, a queixa de dor, por se
tratar de lesão tecidual potencial ou real (como veremos na conceituação), é a mais
prevalente em todos os campos de atendimento na Medicina: consultório,
ambulatório, pronto-socorro e enfermaria. 50 a 65% dos pacientes internados em UTI
relatam terem sentido dor em algum momento da internação e, em 15 a 30% dos
casos, a dor referida foi de grande intensidade.
2.2. Retomando o Conceito de Dor
2.2.1. Conceito genérico de dor
A Internacional Association for the Study of Pain (IASP) define dor como “uma
experiência sensorial e emocional desagradável associada a lesão tecidual real ou
16
potencial, ou descrita em termos de tal dano”. Como já vimos no capítulo anterior, são
diversas as classificações que podem ser usadas para avaliar a dor, sendo uma das
mais habituais sua duração, que se divide em aguda e crônica.
2.2.2. A dor aguda
A dor aguda tem pequena duração (menos do
que 3 meses), geralmente associada a cirurgia,
traumatismo (Figura 1) ou doença aguda. Em geral, é
caracterizada por ter causa conhecida, ser temporária e
localizada na região do traumatismo ou lesão, e
resolver-se espontaneamente com a cura.
2.2.3. A dor crônica
A dor crônica tem uma definição mais complexa.
Uma dor passa a ser considerada crônica ao persistir 3
meses além do curso usual do problema agudo, porém,
alguns autores questionam a duração como fator
distintivo da dor crônica. Em vez disso, enfatizam
fatores comportamentais-cognitivos como critérios essenciais para as síndromes
dolorosas crônicas.
2.3. Avaliação Propedêutica da Dor
2.3.1. As dez características semiológicas da dor
Não existe um método padronizado para a avaliação do paciente com dor. No
entanto, é possível fazer uma simplificação didática em dez características
fundamentais a serem avaliadas, no que concerne a pacientes com essa queixa, por
meio da anamnese. O exame físico fornece apenas informações que comprovam
aquilo que foi constatado por meio de uma entrevista completa do paciente, por meio
de técnicas como a palpação e a punho-percussão, avaliação de força muscular,
reflexos e sensibilidade e avaliação músculo-esquelética.
Nesse sentido, para a avaliação da dor, a ênfase deve ser dada para uma
anamnese bem feita, questionando acerca dessas dez características, a saber:
A) Início: a data de início do quadro doloroso deve ser bem especificada (como já vimos,
tem importância em avaliar se é uma dor aguda ou crônica; além disso, pode servir
para associações temporais com outros fatores patológicos).
B) Frequência e duração: a dor pode ser constante, desde sua data de início; pode ser
cíclica ou intermitente, caso no qual o paciente deve ser questionado quanto à
duração de cada episódio e intervalo entre eles. Cada episódio de dor deve ser
plenamente caracterizado para melhor compreensão do quadro.
C) Localização: o paciente deve mostrar exatamente onde dói, se é em algum ponto
específico ou região, ou ainda se ele não consegue precisar os locais da dor (dor
difusa).
D) Irradiação: o médico deve avaliar se a dor se irradia, ou seja, se existem outras
manifestações da mesma dor no trajeto nervoso, como no infarto agudo do miocárdio,
no qual a dor na região peitoral esquerda pode ser irradiada para o braço esquerdo ou
mandíbula esquerda.
Figura 1 - Traumatismo pode causar dor
aguda...
17
E) Caráter ou qualidade: a sensação ou emoção que essa dor traz e com o que ela parece
para o paciente são questões que devem
ser levantadas pelo médico. Pode ser em
queimação, pontada, pulsátil, em cólica,
em aperto, contínua ou até mesmo a dor
do membro fantasma (em pacientes
amputados).
F) Intensidade: a avaliação da intensidade da
dor é polêmica, mas é importante estimar
o quanto dói para o paciente. Existem
diversas ferramentas para tanto, como
escalas visuais com números para adultos
(sendo 0 para nenhuma dor, e 10 para a
dor máxima) ou rostos para crianças . Para
os adultos, a dor é considerada leve de1 a 4, moderada de 5 a 7, e intensa de 8 a 10,
como mostra a figura 2. Os questionários verbais são menos utilizados (apenas com
objetivos clínicos e de pesquisa) e a
capacidade funcional também pode ser
usada como instrumento de medida para a avaliação da dor.
G) Fatores desencadeantes: alguma coisa que o paciente faz ou deixa de fazer gera esse
quadro doloroso? Existe algum fator relacionado com o início da crise?
H) Fatores atenuantes / de melhora: é importante saber se o paciente toma alguma
medida que melhore essa dor, seja farmacológica (analgésicos, por exemplo), seja não
farmacológica (posições que melhoram a dor, indução de vômito, sono, alimentação).
I) Fatores agravantes / de piora: da mesma forma, devemos questionar se alguma coisa
piora a dor do paciente, por exemplo, a exposição à luz (fotofobia) ou som (fonofobia),
alimentação, esforço, compressão do local.
J) Fatores concomitantes: a própria dor pode dar origem a outros sintomas (cólicas
podem originar náusea, vômito, sudorese, mal estar) ou, então, a dor pode ser
acompanhada de sintomas diretamente relacionados à sua causa.
Uma anamnese que aborde essas 10 características propedêuticas, além de
outras questões usuais, como tratamentos prévios para a dor (verificando tempo de
administração, dose, intervalo, associação de fármacos, resultado do tratamento,
efeitos colaterais e complicações) e antecedentes pessoais do paciente (em termos de
doenças, cirurgias, história de trauma ou hospitalizações, quimioterapia, radioterapia)
pode ser considerada uma anamnese completa, e permite uma avaliação integral da
dor do paciente.
2.4. Abordagem Clínica da Dor: uma breve introdução
A abordagem inicial do paciente com dor nem sempre resulta em um
diagnóstico. Muitas vezes, é necessário esperar a resposta terapêutica às drogas e
tratamentos anteriores, além de um detalhamento mais preciso das características da
dor e da avaliação psíquica e neurológica do paciente.
Quando se trata de um quadro com dores múltiplas, deve-se priorizar cada
manifestação conforme a repercussão na vida do paciente, ou pela gravidade que o
Figura 2 - Escalas de dor
18
médico atribui a cada uma delas. Também é importante avaliar a história familiar,
antecedentes de síndromes dolorosas e uso de álcool ou outras drogas.
Lembre-se sempre de tentar diminuir a intensidade da dor do paciente, mesmo
sem ter definida a sua causa. Abolir ou mitigar a dor é, afinal, uma das funções mais
importantes do médico.
2.5. Questões
1. Um paciente chega ao seu consultório com a queixa de uma dor lombar há 1 semana.
Como você conduziria a anamnese?
2. WW, 50 anos, ex-professor de química para o Ensino Médio e funcionário de lava-
rápido em Albuquerque, NM, atualmente de ocupação desconhecida, chega ao PS com
queixa de cefaleia há 3 semanas. Com relação ao quadro de dor e à conduta a ser
assumida nesse caso:
a. É necessário avaliar os antecedentes pessoais do paciente, como a possibilidade de um
quadro de câncer de pulmão em remissão, antes de medicá-lo.
b. Além dos antecedentes pessoais, é necessário questionar especificamente acerca da
localização específica da dor, bem como de suas características (se é em aperto,
pontada, etc.).
c. Além da avaliação b), é necessário conhecer características que podem acompanhar o
quadro doloroso, como o trabalho em ambiente com exposição a produtos químicos.
d. Junto à avaliação c), é importante buscar outros fatores de piora ou de melhora do
quadro, conhecer a frequência e duração dessa cefaleia, e avaliar outros sintomas
concomitantes.
e. Além das avaliações em d), é necessário iniciar com urgência tratamento com morfina
para aliviar a dor.
2.5. Literatura consultada e sugerida
Obs: Poucos ou nenhum desses livros estão disponíveis na Biblac. Por ser um tema de
revisão, é preferível investir mais tempo em outras matérias.
1) Slover, R; Davids, HR. Manejo da Dor Aguda. In: Duke, J. Segredos em
Anestesiologia. 4ªed. Rio de Janeiro, RJ: Di Livros Editora, 2013. P 527-534.
2)Valdivieso, R. Manejo da Dor Crônica. In: Duke, J. Segredos em Anestesiologia. 4ªed.
Rio de Janeiro, RJ: Di Livros Editora, 2013. P 535-540.
3) Tomic, ER. Dor – Conceitos Gerais. In: Benseñor, IM; Atta, JA; Martins, MA.
Semiologia Clínica, 1ª ed. São Paulo, SP: Sarvier, 2002. P. 509-512.
4) Junior, APN. Analgesia, Sedação e Bloqueio Neuromuscular. In: Azevedo, LCP;
Oliveira, AR; Ladeira, JP; Velasco, IT. Medicina Intensiva Baseada em Evidências, edição
Revista e Atualizada. São Paulo, SP: Editora Atheneu, 2009. P. 191-200.
5) Bicley, Lynn S. Bates, propedêutica médica essencial: avaliação clínica, anamnese,
exame físico. Rio de Janeiro, RJ: Guanabara Koogan, 2013. P. 41, 67-69.
19
3. Tratamento da dor
3.1. Introdução
3.2.Fármacos
3.3. Modalidades físicas no tratamento da dor
3.4. Tratamentos invasivos
3.5. Procedimentos cirúrgicos
3.6. Questões
3.7. Literatura consultada e sugerida
3.1.Introdução
O tratamento da dor pode ser realizado basicamente de quatro maneiras: por
meio da utilização de fármacos, medidas físicas, bloqueios ou intervenção cirúrgica
(raro). Tais medidas podem ser utilizadas isoladamente ou associadas levando em
consideração a intensidade e as características da dor a ser controlada.
Veremos no capítulo sobre “Dor oncológica” que o controle da dor nesses casos é
baseado na utilização da Escada Analgésica preconizada pela OMS, ilustrada abaixo. É
um método baseado na intensidade da dor referida pelo paciente e na resposta ao
analgésico empregado de forma sequencial, de acordo com a intensidade da dor.
Nesse contexto, é importante destacar que ela também pode auxiliar o tratamento das
dores não oncológicas e deve ser utilizada para o tratamento tanto de dores agudas
como crônicas.
Figura 1. Escada analgésica preconizada pela OMS, adaptada.
Serão abordados neste capítulo os diversos tipos de tratamento e suas
características de forma individualizada.
20
3.2. Fármacos
Existem diversas vias de administração dos medicamentos no controle da dor
como: via oral, sublingual, retal, venosa, subcutânea, intramuscular, intra-articular,
tópica, transdérmica, subaracnóidea e peridural. A via oral é a via comumente
utilizada.
Anti-inflamatórios não-esteroidais (AINE)
1. Mecanismos de Ação
O mecanismo de ação primário dos anti-inflamatórios é a inibição da enzima
ciclooxigenase (COX 1 e COX2), impedindo a formação de prostaglandinas. Como as
prostaglandinas sensibilizam os nociceptores dos nervos periféricos, ao bloquear a
formação delas impede-se a passagem do estímulo doloroso. Já a nível central, esses
medicamentos bloqueiam o processamento da dor na medula espinal por meio da
inibição da prostaglandina-sintetase central.
Além disso, possuem outras ações no processo inflamatório como: redução de
ácidos graxos livres, antagonizar a bradicinina, inibição da ativação e agregação de
neutrófilos, inibição dos radicais livres, entre outras.
Figura 2. Mecanismo de ação dos AINE.
2. Efeitos Farmacológicos
Os efeitos principais dos AINE são: anti-inflamatório, analgésico e antipirético.
3. Vias de Administração
A via oral é, em geral, a via de escolha para os AINE. Entretanto, podem ser
administrados também por via intramuscular, venosa, sublingual, retal e transdérmica.
4. Indicações
São os medicamentos mais indicados para o controle da dor aguda e crônica,
leve ou moderada. Em geral está indicado em:
- Dor pós-operatória ou trauma (fraturas, contusões);
- Diversas síndromes dolorosas: lombociatalgia, cervicobraquialgia, miofascial,
tendinite, bursite, osteoartrite, cefaleia, dor oncológica;
- Dor de origem visceral (cólica nefrética, dismenorréia).
5. Efeitos Colaterais
21
Os efeitos colaterais podem ser:
- Gastrointestinais: úlcera, erosão, hemorragia e perfuração gástrica e
intestinal;
- Renais: diminuição da perfusão e filtração glomerular que pode levar a
insuficiência renal;
- Hepáticos: elevação das transaminases, gamaglutamiltransferase (GGT) e
bilirrubinas, lesão hepática (maior risco em etilistas e fumantes);
- Dermatológicos: leves (prurido e erupções cutâneas) e graves (necrose
epidérmica tóxica).
6. Condições clínicas que exigem cautela no uso de AINE
A hipoalbuminemia aumenta a fração livre de AINE, o que aumenta o risco de
efeitos colaterais. Portanto, a dose administrada nesses casos deve ser corrigida. Na
hipovolemia e na cirrose hepática com hipertensão portal ocorre diminuição de
prostaglandinas (PG). O uso de AINE potencializaria a queda de PG em pacientes nessa
condição, o que pode levar a insuficiência renal. Em pacientes com asma brônquica e
alérgicos podem ocorrer crises asmáticas ou alérgicas.
7. Contra-indicações
Os AINE estão contraindicados em pacientes com úlcera ativa e hemorragia
digestiva recente. Devem ser evitados em pacientes com história de úlcera péptica,
esofagite de refluxo e varizes esofágicas.
Opioides
Os opiáceos são substâncias naturais derivadas do ópio com ação analgésica e
depressora do SNC. Por sua vez, os opióides são substâncias endógenas ou exógenas,
naturais ou sintéticas, que se ligam aos receptores opióides e atuam de forma
semelhante aos opiáceos.
Existem diversas formas de classificação dos opióides, das quais as mais
importantes são:
- Origem: naturais (morfina, codeína), semi-sintéticos (buprenorfina e
oxicodona) e sintéticos (nalbufina, naloxona, metadona, fentanil, entre outros);
- Potência: fracos (codeína, tramadol) e fortes (morfina, metadona, fentanil);
- Duração de ação: curta (codeína, morfina, fentanil) e longa duração
(metadona).
Além disso, os opióides podem ter efeitos agonistas, produzindo efeitos
farmacológicos desejados; agonistas parciais, produzindo efeitos menores do que a
resposta máxima; antagonistas, revertendo os efeitos farmacológicos e agonista-
antagonistas.
1. Mecanismos de Ação
São medicamentos que agem nos receptores mi (),kappa (), delta ()e sigma
()do SNC e SNP relacionados à analgesia, sedação e depressão respiratória. Estes
receptores estão localizados no corno dorsal da medula, no gânglio da raiz dorsal e nas
terminações periféricas. Dessa forma, os opióides diminuem a liberação de
neurotransmissores das terminações das fibras C, inibem neurônios medulares pós-
22
sinápticos e ativam vias inibitórias descendentes que envolvem serotonina e
noradrenalina.
2. Vias de Administração
Podem ser administrados por diversas vias: oral, sublingual, venosa,
subcutânea e transdérmica. A via espinal deve ser optada quando não existe
efetividade na administração por VO. Há ainda a possibilidade da utilização da
aplicação periférica local como em bloqueios de plexos e intra-articular.
3. Indicações
Os opioides estão indicados em:
- Dor pós-operatória e trauma;
- Diversas síndromes dolorosas: lombociatalgia, cervicobraquialgia, miofascial,
tendinite, bursite, osteoartrite, dor oncológica;
- Dor neuropática: síndrome complexa de dor regional (SCDR), neurite
traumática, neuralgia do trigêmeo, neuralgia pós-herpética, neuropatia diabética;
- Outras: crise de anemia falciforme, cólica nefrética.
4. Efeitos Colaterais
Constipação intestinal é o efeito colateral mais frequente decorrente do uso de
opioides. Náuseas e vômitos são comuns no início do tratamento por ação em
quimiorreceptores no assoalho do quarto ventrículo. Sedação e sonolência também
podem estar presentes. Retenção urinária se dá por bloqueio medular. Confusão
mental, delirium e alucinações são mais comuns em idosos. Depressão respiratória
ocorre por redução da resposta dos centros respiratórios da ponte e do bulbo ao
aumento da pCO₂, tendo como primeiro sinal de ocorrência a sedação do paciente. Ela
é relativamente mais comum em pacientes idosos ou debilitados que necessitem de
altas doses e em administração por via endovenosa, sendo um evento raro na
utilização de opióides por VO ou via subcutânea.
Além disso, os opióides podem causar dependência com o uso prolongado e,
caso ocorra retirada abrupta do medicamento, podem ocorrer sintomas de
abstinência. Entretanto, é importante lembrar que esses efeitos não são tão comuns
quanto se divulga. Sendo assim, a subutilização dos opióides decorrente do temor dos
seus efeitos colaterais deve ser revertida uma vez que esses medicamentos são as
melhores opções encontradas no tratamento para dores de forte intensidade.
Obs: Meperidina - É um opióide que sofre efeito de primeira passagem pelo
fígado, sendo metabolizado em normeperidina ou é hidrolisado a ácido meperidínico.
Em decorrência da formação de normeperidina, um metabólito psicomimético,
ocorrem efeitos colaterais intensos como alucinação, agitação psicomotora,
taquicardia e midríase. Além disso, ela causa depressão miocárdica direta mesmo em
pequenas doses e causa dependência psíquica por provocar muita euforia e disforia.
Portanto, não deve ser utilizada no tratamento de dor crônica.
5. Morfina
A morfina é o opióide mais comumente utilizado. É classificada como opióide
potente, hidrofílico com baixa ligação plasmática com a albumina. Além disso, é
23
metabolizada pelo fígado onde é transformada em morfina 3-glicuronídeo e morfina 6-
glicuronídeo, o qual possui importante ação analgésica.
6. Vantagens da utilização de opióides
É importante destacar que os opióides são muito vantajosos por:
- Aliviarem dores intensas e serem efetivos em grande parte das síndromes
dolorosas;
- Não possuirem dose teto, ou seja, o efeito analgésico é diretamente
proporcional à dose administrada dos opióides e não há limite para isso, o que os
diferencia do AINE (o limite é a dose que promove os efeitos indesejáveis)
- Possuirem possibilidade de reversão dos efeitos por meio da utilização de um
opióide antagonista (Naloxona).
Antidepressivos
As classes principais dos antidepressivos são: antidepressivos tricíclicos,
inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS), inibidores da recaptação
combinada de serotonina e noradrenalina, noradrenérgicos e serotoninérgicos
específicos, inibidores seletivos da recaptação de noradrenalina e inibidores da
monoaminoxidase (IMAO). Os antidepressivos tricíclicos são os mais utilizados.
Principais representantes das classes de antidepressivos:
- Triciclicos: imipramina, clomipramina, amitriptilina, nortriptilina.
- ISRS: fluoxetina, sertralina.
- IRNS: venlafaxina.
- Noradrenérgicos e serotoninérgicos específicos: mirtazapina.
- ISRN: bupropiona.
1. Mecanismo de Ação
- Bloqueio da recaptação da serotonina, da noradrenalina ou ambas nas
terminações nervosas pré-sinápticas;
- Aumento da ação GABA (mecanismo inibitório);
- Inibição da Liberação de substância-P;
- Bloqueio dos receptores NMDA, H1 da histamina e canais de sódio.
2. Efeitos farmacológicos
Os antidepressivos produzem efeitos: antidepressivo, analgésico, sedativo,
ansiolítico, miorrelaxante, anti-inflamatório e melhoram o ritmo do sono ao diminuir a
frequência de despertares e prolongar o sono REM.
Atenção! A dose utilizada para analgesia é menor do que a antidepressiva. O
efeito analgésico costuma ser independente e mais precoce do que o efeito
antidepressivo.
3. Indicações
Estão indicados em:
- Dor pós-operatória;
- Diversas síndromes dolorosas: lombalgia, cervicobraquialgia, fibromialgia,
miofascial, cefaleia, dor oncológica;
24
- Dor neuropática: síndrome complexa de dor regional, neurite traumática,
neuralgia pós-herpética, neuropatia diabética.
4. Efeitos Colaterais
- Anticolinérgicos: boca seca, visão turva, constipação, retenção urinária,
tontura, sonolência, e alteração da memória.
- Cardiovasculares: hipotensão postural (pelo bloqueio de receptores alfa-1
adrenérgicos); alteração na condução e arritmia cardíaca (principalmente pelo uso dos
antidepressivos tricíclicos).
Anticonvulsivantes
São divididos em anticonvulsivantes de:
- 1ª Geração: Fenitoína e Fenobarbital;
- 2ª Geração: Carbamazepina* e Valproato de Sódio,
- 3ª Geração: Oxcarbazepina, Lamotrigina, Gabapentina, Topiramato e
Tiapentina.
*É considerada um anticonvulsivante de primeira linha no tratamento da dor
neuropática.
1. Mecanismo de Ação
- Bloqueio de canais de sódio (Na), cálcio (Ca) e potássio (K);
- Potencialização da ação inibitória do acido gama-aminobutírico (GABA);
- Diminuição do glutamato (neurotransmissor excitatório do SNC).
2. Indicações
- Dor neuropática: síndrome complexa de dor regional, neuralgia do trigêmeo,
neuralgia pós-herpética, neuralgia do glossofaríngeo, neuropatia diabética, dor pós-
AVC;
- Outras: fibromialgia, enxaqueca.
3. Efeitos Colaterais
Os principais efeitos colaterais dos anticonvulsivantes são sonolência e tontura.
Outros efeitos podem ocorrer de acordo com o medicamento utilizado, como: ataxia;
diplopia; nistagmo; disartria; alterações cutâneas (exantema, prurido, erupções);
alteração da função hepática; entre outros.
Relaxantes musculares
1. Mecanismo de Ação
Possuem ação central por meio do:
- Aumento da estimulação de neurônios gabaérgicos (na região supra-espinal),
inibindo os impulsos facilitadores tônicos que atuam nos neurônios motores da
medula;
- Deprimem o reflexo polissináptico da medula espinal.
25
Figura 3. Mecanismo de ação dos relaxantes musculares
2. Indicações
São indicados geralmente para dor aguda, sendo associados a outros
medicamentos nesse caso. Mas podem ser utilizados também para dor crônica, como:
lombalgias, cervicalgias, síndrome miofascial e fibromialgia.
3. Efeitos Colaterais
OS efeitos colaterais principais são: tontura, astenia e fadiga. Efeitos como
sonolência, cefaleia, náuseas e vômitos, visão turva, boca seca, constipação, retenção
urinária e alteração na função hepática também podem ser observados.
Neurolépticos
Os principais representantes dos neurolépticos são: clorpromazina, haloperidol
e clozapina.
1. Mecanismo de Ação
- Atuam nos receptores serotoninérgicos; bloqueiam receptores adrenérgicos,
colinérgicos e histaminérgicos; bloqueiam receptores dopaminérgicos pós-sinápticos;
- Atuam na ativação da modulação da dor.
2. Efeitos Farmacológicos
Os neurolépticos possuem efeitos: sedativo, ansiolítico e antiemético.
3. Indicações
Utilizados quando não há controle da dor com outros analgésicos e são
indicados, sobretudo, para dor neuropática.
4. Efeitos Colaterais
Os principais efeitos colaterais são:
- Sintomas extrapiramidais (distonia, agitação, discinesia, parkinsonismo);
- Aumento na pressão ocular, constipação e retenção urinária;
- Hipotensão, hipotermia.
26
Ansiolíticos/ benzodiazepínicos
1. Mecanismo de Ação
Principal: estimulação dos neurônios gabaérgicos (inibitórios).
2. Efeitos Farmacológicos
Os benzodiazepínicos possuem efeitos: ansiolítico, anticonvulsivante e
miorrelaxante.
3. Indicações
Indicados no alívio da dor neuropática, espasmos musculares relacionados à
dor e tratamento da ansiedade.
4. Efeitos Colaterais
Os efeitos colaterais principais são: sedação, sonolência, déficit de atenção e
memória. Além disso, pode ocorrer: agitação, irritação, confusão mental, alterações
comportamentais, cefaleia, ataxia e visão dupla.
Corticoesteróides
1. Mecanismo de Ação / Efeitos Farmacológicos
- Estabilização da membrana neural e redução o nível de mediadores que
estimulam os nociceptores, possuindo ação antiinflamatória.
2. Vias de Administração
Os corticoesteróides podem ser administrados por via oral, intramuscular,
venosa, peridural e intra-articular.
3. Indicações
- Neuropatias compressivas*: dor causada pela compressão de raízes nervosas
e medula espinal, dor de hérnia de disco, síndrome do túnel do carpo;
- Tendinite, epicondilite, bursite e osteoartrite
- Dor oncológica: dor por distensão visceral (ex: distensão da capsula do fígado
por metástase), lesão óssea por tumor e obstrução intestinal maligna.
*Os corticoesteróides são medicamentos de primeira escolha para neuropatias
compressivas já que atuam na melhora da dor neural e da compressão medular,
reduzindo o edema em tecidos nervosos e tumorais.
4. Efeitos Colaterais
Os efeitos colaterais devido ao uso de CEs podem ser precoces (até 2 semanas
após o inicio do tratamento), dos quais podemos destacar: hiperglicemia, hipertensão
arterial, imunossupressão e possíveis alterações comportamentais. Mas ocorrem
principalmente pela administração crônica desses medicamentos, como: ganho de
peso, síndrome de Cushing, úlcera péptica, insônia, osteoporose e necrose asséptica
de cabeça de fêmur.
27
3.3. Modalidades físicas no tratamento da dor
As medidas físicas para o tratamento da dor englobam o uso de calor superficial
e profundo e de resfriamento com o objetivo de atingir a analgesia e relaxamento
muscular.
- Medidas por Calor Superficial: parafina, compressas quentes, laser, radiação
infra-vermelha, hidrotermoterapia.
- Medidas por Calor Profundo: diatermia por ondas curtas, diatermia por ultra-
som, diatermia por micro-ondas.
- Medidas por Resfriamento: crioterapia.
- Cinesioterapia e Reabilitação Postural Global (RPG).
3.4. Tratamentos invasivos
Esse tipo de tratamento é indicado somente quando os métodos não invasivos
são ineficazes ou pouco eficazes ou quando ocorre intolerância ou toxicidade
inaceitáveis. É importante destacar a existência desses métodos de tratamento,
entretanto, não iremos caracterizá-los com detalhes.
Analgesias regionais- Bloqueios
Podem ser realizadas por administração de:
- Anestésicos locais por via EV: Lidocaína por via venosa – indicada
principalmente para dor neuropática e diversas síndromes dolorosas (fibromialgia,
lombociatalgia etc.), queimaduras;
- Injeções em pontos gatilho: injeção do medicamento em pontos dolorosos
identificados à palpação. Está indicado na síndrome miofascial;
- Opióides espinais: indicado na analgesia intra e pós-operatória, analgesia de
parto, queimaduras, dor neuropática;
- Bloqueio simpático: podem ser realizados bloqueios do gânglio estrelado,
bloqueio simpático lombar, bloqueio do plexo celíaco, bloqueio do plexo hipogástrico.
- Infiltrações intra-articulares: indicada para osteoartrite, artrite reumatoide,
bursite e tendinite. Em geral os medicamentos utilizados são: corticosteroides,
anestésicos locais, opióides ou clonidina.
3.5. Procedimentos cirúrgicos
Os procedimentos cirúrgicos são medidas raras e que devem ser indicadas
apenas quando a dor é refratária a todos os outros procedimentos clínicos. Os
métodos que podem ser realizados no tratamento da dor crônica são principalmente
os procedimentos neuroablativos (rizotomias, meilotomias, entre outros) e
procedimentos de neuroestimulação (estimulação elétrica do SNC ou do SNP).
3.6. Questões
1. Quais são os principais mecanismos de ação dos anti-inflamatórios não-esteroides
(AINE)?
2. Quais são os principais efeitos colaterais do AINE?
3. Quais são as principais vantagens na utilização de Opióides?
4. Porque a Meperidina (opióide) não deve ser utilizada no tratamento da dor?
28
3.7. Literatura consultada e sugerida
Rioko Kimiko Sakata, Adriana Machado Issy. Guias de Medicina Ambulatorial e
Hospitalar da UNIFESP-EPM – Dor, 2ª Edição.
Fauzia F. Naime. Manual de Tratamento da Dor, 1ª Edição.
29
4. Dor no câncer: características e controle
4.1. Introdução
4.2. Etiopatogenia
4.3. Avaliação do Paciente
4.4. Tratamento
4.5. Questões
4.6. Literatura consultada e sugerida
4.1.Introdução
A dor é um sintoma frequente nas neoplasias malignas. Ela acarreta grande
estresse e sofrimento aos doentes e àqueles que os rodeiam. Os sintomas álgicos
somam-se às incapacidades primariamente relacionadas à neoplasia e ao seu
tratamento e podem ser causa de insônia, anorexia, confinamento ao leito, perda do
convívio social e redução das atividades profissionais e de lazer.
No Brasil e no Estado de São Paulo, o câncer é a terceira causa mais frequente
de morte geral e a segunda entre as mulheres. Nos próximos 30 anos, o aumento do
número de casos de câncer será de 20% nos países desenvolvidos e de 100% nos
países em desenvolvimento e atualmente mais da metade dos 9 milhões de casos
novos de câncer ocorre nos países em desenvolvimento. Agravando este quadro, a
falta de acesso à informação pela população e a carência de recursos na área da saúde
resultam em retardo no diagnóstico da neoplasia. Assim, em cerca de 80% das vezes o
processo patológico só é identificado em fases muito avançadas, quando a doença é
incurável e a dor muito frequente.
A dor relacionada ao câncer acomete cerca de 50% dos doentes em todos os
estágios da doença e em torno de 70% dos indivíduos com doença avançada. A
experiência dolorosa resulta da interpretação do aspecto físico-químico do estímulo
nocivo e da interação deste com características individuais como o humor, o
significado simbólico atribuído ao fenômeno sensitivo e os aspectos culturais e afetivos
dos indivíduos. A dor é sempre subjetiva e cada indivíduo aprende a utilizar este termo
a partir de suas experiências traumáticas.
A necessidade de se conhecer e comparar quadros dolorosos entre populações
diferentes e de quantificar a resposta às diversas terapias despertou, nos
pesquisadores, o interesse em desenvolver metodologia para a avaliação de dor
passíveis de comparação e que possibilitassem o desenvolvimento de uma linguagem
universal sobre a experiência dolorosa. Os métodos para a avaliação da dor crônica
aplicáveis a adultos baseiam-se na descrição verbal.
4.2.Etiopatogenia
A avaliação da dor visa a aferir as qualidades do sintoma álgico, duração e
impacto na esfera psico-afetiva e na funcionalidade, além de determinar sua
intensidade. Tem a finalidade de auxiliar no diagnóstico, ajudar na escolha da terapia e
quantificar a efetividade da terapêutica implementada.
A dor do câncer pode ser devida ao tumor primário ou suas metástases, à
terapia anticancerosa e aos métodos de investigação; em alguns pacientes pode,
também, não estar relacionada à neoplasia. O sofrimento dos doentes é produto da
30
interação da percepção aversiva (dor) com a incapacidade física, isolamento social e
familiar, preocupações financeiras e medo da mutilação e da morte. Como um
fenômeno individual e subjetivo envolvendo aspectos diversos e complexos, a dor no
câncer deve ser avaliada e tratada em seus vários componentes.
Em geral, as diversas síndromes dolorosas relacionadas ao câncer são resultado
da extensão do tumor para ossos, nervos ou vísceras em 80% dos casos.
A invasão óssea é considerada a causa mais comum de dor, uma vez que
metástases ósseas acometem cerca de 30 a 70% de todos os pacientes com câncer. As
vértebras são o sítio mais frequentemente acometido por metástase, usualmente
resultado da disseminação tumoral por via hematogênica.
Invasões de estruturas nervosas pelo tumor são comumente observadas em
pacientes com câncer. Alguns tumores de cabeça e pescoço podem comprimir o plexo
cervical, resultando em dor retro auricular, no ombro e mandíbula. Tumores de mama
e pulmão podem invadir o plexo braquial, por extensão direta ou por aumento dos
linfonodos, resultando em dor de difícil controle. A infiltração da pleura parietal e da
parede torácica, por extensão direta do tumor, pode resultar em hiperalgesia cutânea.
As estruturas viscerais, quando acometidas pela neoplasia, podem apresentar
síndromes características. Exemplos são o tumor de esôfago, que não raramente
resulta em dor retroesternal, irradiada para as costas, ou para a região retro escapular,
e a distensão da cápsula de Glisson do fígado, que pode ocasionar dor abdominal, que
também pode ser referida como dor no pescoço, ombro e escápula, usualmente à
direita.
4.3. Avaliação do Paciente
A avaliação clinica deve ser baseada na história do paciente e em exames
complementares, quando necessário. A dor deve ser bem caracterizada apontando
localização, irradiação, qualidade/caráter, intensidade, temporalidade, fatores que
melhoram e pioram a dor e fatores acompanhantes.
A diferenciação entre dor localizada e generalizada é muito importante já que
pode ditar o diagnóstico e a terapêutica. A intensidade da dor deve ser questionada ao
paciente e pede-se que ele a classifique na escala de 0 a 10 (0 é ausência e 10 é a pior
dor possível), já exposta no capítulo “Avaliação do paciente com dor”. A irradiação da
dor tem importância diagnóstica, como no exemplo do paciente com dor abdominal
em barra com irradiação para o dorso, que é altamente sugestivo de pancreatite e
observado em alguns pacientes com tumor de pâncreas. Ainda, alguns pacientes
referem episódios de dor intensa ou “crises de dor”, de inicio súbito e sobrepostos ao
quadro álgico basal. Tradicionalmente, a presença de dor episódica sinaliza uma
síndrome de difícil tratamento e nesses casos é fundamental a prescrição de opióides
adicionais para as “crises de dor”.
Por fim, quanto à classificação da dor, a maioria dos pacientes com câncer
apresenta síndromes dolorosas mistas onde a distinção entre nocicepção somática,
visceral e dor neuropática é dificultada.
4.4. Tratamento
A Organização Mundial da Saúde (OMS), com o objetivo de propor diretrizes
para o controle da dor relacionada ao câncer, reuniu especialistas que elaboraram o
"Guia para Tratamento da Dor no Câncer". A terapêutica preferencial para o alívio da
31
dor deve ser o tratamento do câncer em si, sempre que possível. O uso de
medicamentos analgésicos, medidas de apoio psicoterápicas e fisioterápicas, bloqueios
nervosos, secção de vias sensitivas e estimulação das vias supressoras da nocicepção
são complementares às medidas anticancerosas.
A utilização de medicamentos analgésicos e adjuvantes é a terapêutica mais
frequente e baseia-se em um algoritmo publicado pela OMS em 1986, a escada
analgésica, que serve de modelo até os dias de hoje para o tratamento da dor
oncológica e que foi estendido para outros tipos de analgesia.
Antes de apresentá-la, saiba que há 5 princípios básicos a serem respeitados na
analgesia da dor do paciente com câncer:
- a medicação deve ser oferecida preferencialmente pela via oral;
- é fundamental respeitar o intervalo de administração de acordo com a meia
vida de cada droga. O medicamento deve ser prescrito de forma regular e doses
adicionais, caso necessário.
- deve haver uma avaliação continua e individualizada para cada paciente
durante todo o tratamento, antecipando os efeitos adversos e corrigindo as doses e,
eventualmente, trocando o medicamento no caso de falha.
- respeitar a escada analgésica proposta pela OMS.
- é fundamental a orientação ao paciente e aos cuidadores e a avaliação das
condições psicossociais dos dois, o que nos ajuda a selecionar um esquema
terapêutico mais adequado e a enxergar possíveis limitações ao esquema proposto.
Escada analgésica
- Degrau 1 : Pacientes que ainda não estão sob tratamento analgésico e estão
com dor leve a moderada devem ser tratados com drogas antiinflamatórias, entre elas
o paracetamol e anti-inflamatórios não hormonais (AINES).
- Degrau 2: Pacientes com dor moderada, e já em uso de AINE, devem receber
também tratamento com opióides fracos como tramadol ou codeína.
- Degrau 3: Esse degrau é reservado para os pacientes que não obtiveram
controle da dor com o uso de opióides fracos e AINEs. Assim, substituem-se os
opióides fracos por opióides fortes como a morfina, metadona, oxicodona ou fentanil.
A dose máxima dessas medicações é aquela que consegue o melhor balanço entre
analgesia e efeitos colaterais.
4.5. Questões
1. Como deve ser a avaliação do paciente com dor?
2. Quais os cinco princípios básicos a serem respeitados na analgesia da dor?
3. Explique sucintamente a escada analgésica aceita pela OMS.
4.6. Literatura consultada e sugerida
Bonica, J.J. Treatment of cancer pain: current status and future needs. In: Fields, H.L.;
Dubner R.; Cervero, F. Advances in pain research and therapy: proceeding of the
Fourth World Congress on Pain, New York, Raven, 9:.589-615, 1985.
Cleeland, C.S. et al. Pain and its treatment in outpatients with metastatic cancer, N
Engl J Med,.330 (9):, 592-6, 1994.
32
Daut, R.L.; Cleeland, C.S. The prevalence and severity of cancer pain. Cancer, 50
(1): 1913-8, 1982.
Twycross, R.G., Fairfield, S. Pain in far-advanced cancer. Pain 14 (3): 303-10, 1982.
Foley, K.M. The treatment of cancer pain. N England J Med, 313 (2): 84-95, 1985.
Organización Mundial de la Salud. Alivio del dolor en el cáncer. Ginebra, 1987
Paredes, H. et al. - Tratamiento farmacologico en tres pasos del dolor en cancer:
experiencia preleiminar en Chile, Rev Med Chil, 116 (5): p.433-8, 1988.
Ventafrida, V. et al. A validation study of the WHO method for cancer pain
relief. Cancer, 59 (4): 850-6, 1987.
Cleeland, C.S. The impact of pain on the patient with cancer. Cancer 54 (11): 2635-41,
1984.
33
5.Dor aguda pós-operatória
5.1. Introdução
5.2. Definição de DPO
5.3. Fisiopatologia da DPO
5.4. Efeitos e complicações sistêmicas da DPO
5.5. Tratamento da DPO
5.6. Questões
5.7. Literatura consultada e sugerida
5.1. Introdução
A dor aguda pós-operatória (DPO) aparece depois de 80% das cirurgias. No
entanto, não é devidamente remediada em mais da metade dos casos, por conta de
falhas na avaliação da dor e no conhecimento de métodos analgésicos pelos
profissionais de saúde. Além do óbvio sofrimento desnecessário, a dor pós-operatória
pode diminuir a velocidade do processo de recuperação e cura, aumentar o tempo e
os custos de internação e a chance de aparecimento de dores crônicas ligadas à
cirurgia.
Não bastando isso, você verá que há uma relação forte entre DPO e
complicações sistêmicas graves, incapacitantes e às vezes fatais, como infarto agudo
do miocárdio, trombose venosa profunda (TVP), tromboembolismo pulmonar (TEP),
depressão, ansiedade, pneumonia, íleo paralítico etc. Tem-se buscado minimizar esses
danos e a DPO hoje é tópico que faz parte da avaliação anestésica pós-operatória e
que deve estar indicado no prontuário de todos os pacientes submetidos a cirurgias.
A ideia deste capítulo é primeiro rever brevemente os mecanismos
fisiopatológicos da dor, com foco na dor aguda no pós-operatório. Depois, trazer
noções básicas dos efeitos e complicações sistêmicas da DPO e, por fim, de como
tratá-la. Não se atenham a detalhes, o que é importante saber estará destacado.
5.2. Definição de DPO
Dor aguda pós-operatória é uma dor temporária (geralmente de curta duração)
relacionada a um tipo de lesão definida (característica para cada cirurgia) e que se
resolve com o progresso da recuperação pós-operatória. Na maioria das vezes, a DPO
responde bem ao uso de analgésicos.
5.3. Fisiopatologia da DPO
A dor aguda pós-operatória é, de maneira geral, uma dor nociceptiva.
Revisando: o estímulo nocivo (como o corte de um bisturi) provoca dano tecidual, que,
somado ao acúmulo de substâncias pró-inflamatórias, sensibilizam as terminações
nervosas livres (receptores nociceptivos) das fibras nociceptivas A delta (rápida) e C
(lenta). A informação dolorosa se dirige ao corno posterior da medula e, ao ascender
pelos tratos paleo e neoespinotalâmicos, chega ao córtex cerebral, sistema límbico e
outras estruturas do sistema nervoso central.
Além do mecanismo nociceptivo, o ato cirúrgico pode levar a eventuais
lesões/alterações neuropáticas, que afetam diretamente o tecido nervoso (imagine um
bisturi cortando um nervo). A expressão da dor é distinta, bem como seu tratamento.
34
Para tornar isso mais claro, a tabela a seguir (Tab.1) trás exemplos clínicos de
situações que levam a dores nociceptivas e neuropáticas. Foque nas dores somática e
visceral, bem mais comuns e lembre-se que elas são só subdivisões regionais da dor
nociceptiva. Por ora, esqueça o item 5 da tabela.
Tab.1 - Dores nociceptiva e neuropática
Dor Somática Dor Visceral Dor Neuropática
1) Localização Localizada Generalizada Específica ou irradiante
2) Característica
Alfinetada,
facada, corte
Latejante,
compressão
Queimadura, coceira,
formigamento, choque
elétrico, lancinante
3)Mecanismo da
Dor
Fibra A-delta
(inervação
periférica)
Fibra C
(inervação
profunda)
Dermatomal (periférica)
ou não-dermatomal
(central)
4)Exemplos
clínicos
Laceração
superficial
Queimadura
superficial
Injeção
intramuscular
Acesso venoso
Abrasão extensa
Lesão de periósteo,
articular e muscular
Cólica e espasmo
muscular
Apendicite
Litíase renal
Neuralgia trigeminal
Neuralgia pós-trauma
Amputação de membro
5)Tratamentos
mais efetivos
Gelo
Estimulação tátil
AINEs
Opióides
Anestésicos locais
AINEs
Opióides
Anestesia local
intraespinal
Drogas
antiespasmódicas
Anticonvulsivantes
Antidepressivos
tricíclicos
Bloqueios nervosos
Fonte: http://www.paincommunitycentre.org/article/acute-postoperative-pain-
definition-acute-pain
5.4. Efeitos e complicações sistêmicas da DPO
Os efeitos da dor aguda pós-operatória não se restringem à sensação dolorosa.
As respostas autonômica e endócrino-metabólica do corpo à DPO são também muito
importantes por conta das complicações que podem gerar.
A dor é um sinal de perigo para o corpo e, por isso, aumenta a atividade do
sistema nervoso simpático (SNS), levando ao aumento da síntese de catecolaminas
(adrenalina e noradrenalina) e demais hormônios catabolizantes, como o cortisol
(hormônio do estresse) e o glucagon. A liberação intensa e prolongada destas
substâncias produz alterações em diversos sistemas do nosso organismo, colocadas
abaixo em esquemas para maior clareza. Esses efeitos podem ser muito graves,
tornando o tratamento da DPO quase tão importante quanto a cirurgia em si, por
afetar o prognóstico do paciente de maneira impactante.
35
A.Efeitos cardiocirculatórios
- Ativação do SNS  taquicardia
 vasoconstrição periférica ( da PA, portanto do RV)
 do trabalho cardíaco  do consumo de O2 pelo miocárdio, com mesma oferta
 isquemia do miocárdio
(PA- pressão arterial; RV- retorno venoso)
B. Efeitos gastrointestinais
- Direcionamento do sangue para órgãos nobres (cérebro, coração e pulmões), em
detrimento de vísceras e pele:
Motilidade gastro-intestinal  náusea e vômitos
 íleo paralítico
Tempo de cicatrização em vísceras e pele
C. Efeitos respiratórios
-Ativação do SNS  taquipneia hipocapnia inicial e alcalose respiratória
 fadiga diafragmática
-Fadiga diafragmática + possível dor ventilatório-dependente 
 hipoventilação + hipóxia + hipercapnia subsequente  atelectasia  infecções
p pulmonares
(hipo/hipercapnia- alterações da PaCO2; hipóxia- diminuição da PaO2)
D. Efeitos endócrino-metabólicos
Ativação do SNC  catecolaminas, cortisol, glucagon  alterações ana/catabólicas
 da glicemia
E. Efeitos urinários
Ativação do SNC  tônus esfíncter vesical  retenção urinária
F. Hemostasia
A soma das complicações acima e as dores referentes a algumas cirurgias
(principalmente ortopédicas) diminuem a mobilidade do paciente e aumentam seu
tempo acamado:
Imobilidade  estase sanguínea  TVP  TEP
G. Efeitos psicológicos
complicações + tempo de internação + dores não tratadas  ansiedade
d  depressão
5.5. Tratamento da DPO
O diagnóstico e avaliação da dor aguda pós-operatória pouco diferem do que
foi exposto no capítulo “Avaliação do paciente com dor”, portanto iremos direto para
o tratamento, que será uma complementação do capítulo “Tratamento da dor”.
Antes de expor as múltiplas classes e técnicas de administração de analgésicos,
deve-se falar dos esquemas de analgesia. Existe o esquema em horário fixo, o
esquema SN (se necessário) e o esquema misto. Vários estudos já apontaram o
esquema misto (fixo + SN) como o melhor dos três. Ele indica a prescrição de
analgésicos em horários pré-determinados, evitando grandes flutuações nos níveis
plasmáticos dos medicamentos e prevenindo picos de dor, e ainda dá a possibilidade
36
de analgesia suplementar. Assim, evita-se o atraso no reconhecimento de boa parte
das dores, que já estarão remediadas; tratam-se as dores leves, que não forçariam o
paciente a pedir analgesia; e há certa flexibilidade no tratamento, porém, sem margem
para imprudências.
Outro conceito importante é o do tratamento multimodal da dor. Ele consiste
em associar mais de uma forma de administração e/ou classe de medicamento para
analgesia. Desse modo, somam-se os benefícios de cada estratégia terapêutica e
diminuem-se os riscos associados a grandes doses de fármacos sem que haja perda da
efetividade do tratamento (conceito de janela terapêutica- therapeutic range) (Fig.1).
Fig. 1. Janela terapêutica
Você já viu que há uma infinidade de possibilidades no mundo da analgesia. A
intenção aqui não é esmiuçar todas elas, e sim ajudá-lo a entrar nesta selva, mais
especificamente na área de DPO. O importante aqui não é decorar o nome dos
medicamentos de cada classe, mas ter uma noção da ampla variedade de opções
disponíveis e da importância em se associarem classes diferentes de medicamentos no
tratamento da DPO. Como último conselho, algumas características te guiarão no
gerenciamento dessas dores: tipo da cirurgia e características, intensidade (leve,
moderada e grave) e local da dor. Agora é a hora de voltar ao item 5 da tabela 1, para
depois ler os itens abaixo.
Anti-inflamatórios não-esteroidais (AINEs)
Dipirona, paracetamol, nimesulida, diclofenaco sódico e potássico, ibuprofeno
etc. Os AINEs têm características anti-inflamatórias, analgésicas e anti-piréticas, que
variam em potência e especificidade em cada um dos medicamentos, mas não é
intenção deste capítulo mostrar as indicações de cada um dos exemplos acima.
Podem ser usados por diversas vias, sendo mais comuns a oral e a venosa.
Eles são os medicamentos básicos no tratamento da dor aguda leve e moderada de
maneira geral e serão utilizados na DPO sempre que não houver contraindicação. São
os mais usados isoladamente ou em associação a outros fármacos, por aliarem
efetividade a poucos efeitos colaterais, como já visto no capítulo anterior.
Opioides
São ótimos nas dores fortes e podem ser utilizados associados aos AINEs acima
mencionados e a bloqueios regionais em casos de dores bastante intensas. Morfina e
37
fentanil são bastante empregados pela via peridural no pós-operatório de cirurgias
ortopédicas, vasculares, toracotomias e laparotomias extensas. Esta modalidade é
mais eficiente que a via oral na DPO e será melhor descrita adiante.
Analgesia regional
É um conjunto de vias de administração, não uma só via ou classe
medicamentosa.
Dentre as possibilidades há:
- Infiltração da incisão com anestésicos locais;
- Uso de corticoide e morfina em intervenções intra-articulares;
- Bloqueios de plexos e nervos periféricos, como o bloqueio de plexo braquial em
cirurgias de ombro, cotovelo e braço;
- Anestesia peridural e subaracnóidea
Analgesia peridural
Geralmente são utilizados anestésicos locais (bupi e ropivacaína) em associação
com opióides (morfina e fentanil) e aproveita-se o cateter peridural utilizado na
anestesia cirúrgica. Os anestésicos locais por via peridural bloqueiam a aferência
sensitiva e o sistema simpático, o que evita a dor e seus efeitos autonômicos
deletérios. Eles ainda causam vasodilatação, com aumento do fluxo sanguíneo das
regiões pretendidas e melhora da coagulação e cicatrização.
A analgesia peridural é melhor que por via oral na DPO, pois não há acréscimo
de riscos além dos da própria anestesia e sua subutilização é decorrente da falta de
conhecimento pelos profissionais de saúde.
Analgesia controlada pelo paciente (ACP)
A ACP é boa, porque consegue manter constante o nível plasmático do
medicamento pelo fornecimento de infusão contínua de medicamento ou infusão
programada para horários determinados. Além disso, sua principal vantagem é
possibilitar ao paciente acionar mecanismo de liberação de analgesia suplementar
quando necessário, o que acelera o tempo entre o aparecimento da dor e a analgesia.
Esse tempo parece desprezível, mas pode levar de alguns minutos a horas, como
mostrado no exemplo abaixo. A liberação dos medicamentos respeita limites de
concentração plasmática, tempo de começo de ação e duração do efeito do
medicamento, então o paciente não pode ficar apertando seu botão de morfina
indefinidamente. A maior desvantagem da ACP é o preço alto.
Exemplo prático: Pense nas enfermarias do HSP. O paciente grita pela
enfermeira e fica esperando alguém vir. O enfermeiro ou auxiliar de enfermagem
termina o que está fazendo e vai até o leito do paciente, que relata o que está
acontecendo. O enfermeiro leva a queixa ao médico, que prescreve o medicamento
depois de acabar o que está fazendo. A enfermeira prepara a medicação e aplica-a,
para então haver o tempo de absorção do fármaco e só depois desse processo todo, o
alívio da dor.
Analgesia preemptiva
É um nome bonito que significa analgesia profilática. Sua ideia é começar a
analgesia antes da cirurgia, com a intenção de diminuir a necessidade, potência e
38
tempo de medicação no pós-operatório. Ainda há poucos estudos sobre o tema, mas
parece promissora.
5.6. Questões
1) Por que é importante reconhecer e tratar precocemente a DPO?
2) Qual a relação entre DPO e infarto agudo do miocárdio, íleo paralítico, pneumonia
hospitalar e eventos tromboembólicos? Qual a fisiopatologia de cada um desses
desfecho desagradáveis?
3) Explique o que é esquema misto de analgesia e tratamento multimodal da dor.
4) Por que o uso de opioides por via peridural é interessante para dores pós-cirúrgicas
intensas?
5.7. Literatura consultada e sugerida
- Miriam C. Bellini Gazi, EPM/UNIFESP. Apresentação de aula “Dor Pós-operatória”.
- Hazem Adel Ashmawi, FMUSP. Apresentação de aula “Dor Aguda Pós-Operatória”.
Disponível em <http://www.anestesiologiausp.com.br/wp-content/uploads/extensao-
universitaria/iii-programa-de-educacao-continuada-em-fisiopatologia-e-terapeutica-
da-dor-2013/aula-de-dor-p%C3%B3s-operat%C3%B3ria_31_07_2013.pdf>-PIMENTA,
CAM et al. Controle da dor no pós-operatório. Rev Esc Enf USP, v. 35, n. 2, p. 180-3,
jun. 2001. Disponível em <http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v35n2/v35n2a12.pdf>
- BASSANEZI, Betina Sílvia Beozzo; OLIVEIRA FILHO, Antonio Gonçalves de. Analgesia
pós-operatória. Rev. Col. Bras. Cir., Rio de Janeiro, v. 33, n. 2, Apr. 2006. Disponível em
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-
69912006000200012&lng=en&nrm=iso>.
- Mayo clinic. Artigo “Pain medications after surgery”. Disponível em
<http://www.mayoclinic.org/pain-medications/art-20046452?pg=1>
- Cardiff University Pain Community Centre. Artigos: “Acute postoperative pain:
Definition of Acute Pain” e “Acute postoperative pain: General Overview”. Disponíveis
em <http://www.paincommunitycentre.org/article/acute-postoperative-pain-
definition-acute-pain> e <http://www.paincommunitycentre.org/article/acute-
postoperative-pain-general-overview>
- International Association for the Study of Pain (IASP). Cartilhas de divulgação do Ano
Mundial Contra a Dor Aguda “Mecanismos de Dor Aguda” e “Dor Aguda e Cirurgia”.
Disponíveis em <http://www.iasp-
pain.org/Advocacy/Content.aspx?ItemNumber=1097>
39
6. Anestesia - conceitos
6.1. Conceitos gerais
6.1.1. O que é anestesia?
6.1.2. Tipos de anestesia
6.1.3. Técnicas anestésicas
6.2. Drogas anestésicas
6.2.1. Agentes inalatórios
6.2.2. Anestésicos intravenosos
6.2.3. Anestésicos locais
6.2.4. Bloqueadores neuromusculares
6.3. Questões
6.4. Literatura consultada e sugerida
6.1. Conceitos gerais
6.1.1. O que é anestesia?
A anestesia é considerada um processo farmacológico reversível de bloqueio
completo da dor e/ou consciência com o objetivo de realizar um procedimento.
6.1.2. Tipos de anestesia
Alguns autores dividem as anestesias em dois grupos: a anestesia geral e a
anestesia locorregional.
A anestesia geral possui um plano anestésico que visa:
1. Analgesia, que busca o bloqueio da dor e dos reflexos autonômicos.
2. Hipnose e amnésia, para bloqueio da consciência.
3. Bloqueio neuromuscular, para realizar o relaxamento muscular e como
consequência inibir os movimentos.
Já a anestesia locorregional tem como função atuar na perda da sensação em
Anestesia: Perda de dor e/ou consciência, como quando um anestésico é administrado
antes da cirurgia do procedimento.
Sedação: É o ato que envolve um amplo espectro de condições desde um simples
estado de cooperação, tranquilidade e vigília, com orientação temporoespacial
preservada, até estados de depressão das respostas aos comandos, podendo ou não
incluir a hipnose.
Analgesia: Estado em que os estímulos dolorosos são percebidos, mas não são
entendidos como dor, normalmente, seguidos de sedação sem que haja perda da
consciência.
40
uma determinada região do corpo, e o paciente pode estar consciente ou apenas
sedado durante o procedimento. Diferentemente da anestesia geral, visa
obrigatoriamente o bloqueio da dor e dos reflexos autonômicos, todavia não é
necessário obrigatoriamente o bloqueio da consciência ou do relaxamento muscular,
apesar de serem positivos para os procedimentos.
6.1.3. Técnicas anestésicas
A anestesia é divida em etapas para melhor manejo do paciente durante os
procedimentos. As fases são resumidas na tabela abaixo:
Tabela 1. Fases da assistência anestésica
Quadro 1. Exemplo de um plano de anestesia geral
Fonte: Bases da Anestesia Fonte: Bases da Anestesia
Efeitos desejados da anestesia:
HIPNOSE
AMNÉSIA
ANALGESIA
IMOBILIDADE
41
6.2. Drogas anestésicas
6.2.1. Agentes inalatórios (AI)
Os anestésicos inalatórios mais utilizados na anestesia atual são os líquidos
voláteis (halotano, enflurano, isoflurano, desflurano e sevoflurano) e apenas um gás, o
óxido nitroso. Apesar das diferenças (especialmente farmacocinéticas) entre esses
agentes, existem algumas características universais desses compostos, como a
produção de imobilidade e efeitos anestésicos.
A imobilidade ocorre majoritariamente pela ação do AI na medula espinhal.
Esse efeito é medido pela concentração alveolar mínima (CAM)* para suprimir o
movimento em uma incisão cirúrgica em 50% dos pacientes.
Efeitos amnésicos e depressão do sistema nervoso também podem ser
observados.
6.2.2. Anestésicos intravenosos (AIV)
Anestésicos não-opioides intravenosos são utilizados em larga escala para
indução rápida da anestesia ou garantir a sedação durante os cuidados anestésicos
monitorados para pacientes em unidades de terapia intensiva.
Os utilizados para indução de anestesia geral são os AVI lipofílicos.
Principais agentes intravenosos
Propofol: amplamente utilizado, leva a uma diminuição a pressão arterial, tem
atividade antiemética, é depressor respiratório, reduz os reflexos respiratórios
superiores, entre outras características gerais.
Tiopental: é um barbitúrico utilizado na indução da anestesia, produzindo
depressão dose-dependente do sistema nervoso central (afeta fluxo sanguíneo
cerebral e a taxa metabólica cerebral), vasodilatação periférica e depressão
respiratória. Não tem propriedades analgésicas.
Midazolan: é um benzodiazepínico cuja ação pode ser rapidamente
interrompida pela administração do antagonista seletivo Flumazenil. Espera-se que
tenha efeito hipnótico e de amnésia anterógrada.
Etomidato: efeitos hipnóticos não analgésicos. Bom para infusão contínua, mas
com efeitos colaterais endócrinos. Não é muito utilizado.
Fentanil: é um opioide**, e como os fármacos desta classe, é ótimo para a
analgesia. Também suprime o reflexo da tosse, mas apresenta marcadamente a
depressão respiratória como Efeito colateral principal (frequência respiratória e
volume corrente diminuem progressivamente e se relacionam diretamente com a dose
administrada).
**Outros opioides: morfina, sulfentanil, alfentanil, rimefentanil
Fique esperto: injeção intra-arterial acidental de barbitúricos resulta em dor intensa e
vasoconstrição, podendo levar à gangrena.
42
6.2.3. Anestésicos locais
Os efeitos adversos dos anestésicos locais são raros, mas quando aparecem
decorrem da absorção sistêmica. Dentre eles, pode haver toxicidade tecidual local,
reações alérgicas e efeitos nos sistemas nervoso (convulsões, depressão respiratória) e
cardiovascular (hipotensão).
6.2.4. Bloqueadores neuromusculares
Os fármacos bloqueadores neuromusculares interrompem a transmissão dos
impulsos nervosos na junção neuromuscular, produzindo paresia ou paralisia dos
músculos esqueléticos.
São utilizados para produzir relaxamento muscular para facilitar intubação
traqueal e para fornecer condições ideais de trabalho cirúrgico. Não têm efeitos
analgésicos ou anestésicos (amnésia, inconsciência).
Succinilcolina: não despolarizante, apresenta ação rápida que fornece paralisia do
músculo esquelético que facilita intubação orotraqueal, pode ter como efeito colateral
arritmia cardíaca, hipercalemia, aumento da pressão intracraniana, mialgia,
hipertermia maligna*** e devido a reações adversas importantes nas crianças seu uso
é limitado a controle de vias aéreas em emergenciais.
***Hipertermia maligna: é uma doença muscular hereditária, latente, potencialmente
grave, de herança autossômica dominante, caracterizada por resposta
hipermetabólica após exposição a determinados anestésicos inalatórios ou ao
relaxante muscular succinilcolina. Uma crise de hipertermia maligna consiste na
liberação maciça de cálcio do músculo esquelético, causando uma contratura
Aminoamidas
lidocaína - mais comumente utilizado
bupivacaína- maior cardiotoxidade do que a lidocaína
outros: rilocaína, mepivacaína, ropivacaína
Aminoésteres:
procaína- possui importante potencial de causar reações de hipersensibilidade
tetracaína - utilizada na raquianestesia e possui ação de longa duração,
cloprocaína - possui uso limitado
Fique esperto: paciente paralisado (bloqueio neuromuscular) inadequadamente
anestesiado apresenta grande risco de estar consciente durante a cirurgia.
43
muscular exacerbada, o que provoca aumento de temperatura e um quadro de
hipermetabolismo. O tratamento consiste na administração de dantrolene e terapia de
suporte.
Agentes não despolarizantes são divididos em fármacos de ação longa (pancurônio)
intermediária (rocurônio, vecurônio) ou curta (mivacúrio). Possuem diferenças quanto
à farmacocinética e a indicação de um ou de outro pode variar dependendo do tipo de
paciente.
6.3. Questões
1) Quais são as fases da assistência anestésica?
2) Quais são as principais categorias de drogas utilizadas na anestesia? Cite exemplo de
um fármaco de cada categoria.
3) O que é anestesia balanceada?
4) Quais são as principais complicações anestésicas?
6.4. Literatura consultada e sugerida
Guia de Medicina Ambulatorial e Hospitalar da UNIFESP – EPM – Anestesiologia e
Medicina Intensiva, Editora Manole.
Miranda M.L., Bersot C.D.A., Vilela N.R., Sedação, analgesia e bloqueio neuromuscular
na unidade de terapia intensiva
Miller, Ronald, D., Bases da anestesia [recurso eletronico] pg 19-23, Rio de Janeiro,
Elsiever, 2012
44
7. Avaliação pré-anestésica
7.1. Introdução
7.2. O interrogatório complementar sobre os diversos aparelhos
7.3. Antecedentes pessoais
7.4. Exame físico
7.5. Exames complementares
7.6. Medicações pré-anestésicas
7.7. Questões
7.8. Literatura consultada e sugerida
7.1. Introdução
A avaliação pré-anestésica consiste em uma ponderação do estado do paciente
que visa definir riscos do procedimento anestésico para ele. Deve ser feita antes de
toda e qualquer anestesia, mesmo que de urgência. Preferencialmente pelo
anestesiologista que realizará o procedimento.
Antes de qualquer procedimento deve-se obter o consentimento livre
esclarecido do paciente. Deve-se ter em mente que não existe cirurgia pequena para o
paciente e a ansiedade dificulta a retenção de informações pelo mesmo, por isso é
essencial explicar com clareza e elucidar as dúvidas do paciente, para que não se criem
problemas futuros.
Em moldes gerais essa avaliação visa responder a duas perguntas simples:
I) Está o paciente nas melhores condições possíveis para ser submetido à
cirurgia proposta?
II) Os riscos de operar o paciente agora são maiores que o de não operar?
Caso a resposta seja não para qualquer uma das perguntas, a cirurgia deve ser
adiada.
A avaliação pré-anestésica dá ao anestesista a chance de criar vínculo com o
paciente e colher informações importantes que possam ajudar na escolha do melhor
método anestésico. Ela possibilita uma estimativa do risco peri-operatório, que é o
período entre um dia antes da cirurgia e 30 dias depois da cirurgia. Busca, portanto,
avaliar idade, peso, comorbidades, medicações, hábitos que possam afetar o
procedimento considerando sempre o tipo de operação que o paciente será
submetido. Para identificar os fatores de risco e quais são as medidas apropriadas para
o indivíduo aplica-se um questionário, semelhante a uma anamnese, que sonda a
história médica do paciente e realiza-se o exame físico. Interconsultas e exames
subsidiários podem ser requisitados.
A história é focada no interrogatório sobre os diversos aparelhos, antecedentes
pessoais, hábitos e uso de medicações, que estão detalhados logo abaixo.
7.2. O interrogatório complementar sobre os diversos aparelhos
São tópicos importantes:
45
a) Sistema cardiovascular: arritmias, dor precordial e palpitações, buscando
valvopatias, arritmias e hipertensão arterial sistêmica;
b) Sistema respiratório: tosse, dispneia e cianose, buscando doença pulmonar
obstrutiva crônica (DPOC), doença pulmonar restritiva e apneia;
c) Sistema nervoso: cefaleia, convulsão, alteração da consciência, buscando epilepsia
e acidente vascular encefálico;
d) Sistema urinário: oligúria, polaciúria e disúria, buscando insuficiência renal,
desequilíbrio ácido-básico e uremia;
e) Sistema digestório: icterícia, constipação, flatulência e melena, buscando condições
que retardam o esvaziamento gástrico e hepatopatias;
f) Sistema endócrino: tem um espectro grande de apresentação e muitas vezes é
suspeitado após exame laboratorial, busca-se diabetes, disfunção adrenal e
tireoidiana;
g) Sistema hematológico: palidez e sangramentos, buscando anemias, coagulopatias e
porfirias.
Para as mulheres deve-se tomar cuidado com possível gravidez, visto que
muitos fármacos são teratogênicos.
7.3. Antecedentes pessoais
Devem-se levar em conta quais os medicamentos que o indivíduo toma e o
porquê deles. Existe a possibilidade de interação medicamentosa e alguns fármacos
devem ser suspensos por um longo tempo antes da cirurgia como os inibidores de
monoamina oxidase (IMAO) utilizados para transtorno bipolar. Importante lembrar
que, no caso de medicamentos anti-hipertensivos, NÃO é recomendado suspender seu
uso antes da cirurgia, devendo o paciente tomá-lo de modo habitual.
Hábitos como tabagismo, etilismo e uso de drogas ilícitas (especialmente
opioides) devem ser explorados, principalmente o último item levando em conta o
potencial de tolerância, dependência e abstinência que pode provocar.
Alergias a medicamentos, antissépticos, esparadrapo e látex devem ser bem
estabelecidas. Lembrando que é importante diferenciar alergia a medicamento de
efeito colateral do mesmo, uma coisa é o paciente referir que dipirona sódica causa
sonolência, outra coisa é ele referir que teve edema de glote. É bom ter em mente que
não é obrigação do paciente saber diferenciar essas manifestações.
7.4. Exame físico
Avaliam-se os sinais vitais, consciência, dados antropométricos, estado
nutricional e tenta-se prever se a via aérea do paciente é de difícil intubação. Portanto
o exame físico analisa a altura, peso e constituição física (ex: obeso, tórax em barril e
pescoço de touro). Esse item é importante para prever a via aérea difícil e também
para cálculo de dose do anestésico, lembrando que muitas drogas são lipofílicas e se
distribuem para a gordura, em pessoas obesas essa distribuição pode afetar a
anestesia e ajustes de dose devem ser feitos.
A previsão da via aérea difícil é importante para prever possíveis dificuldades
de intubação. Uma das classificações utilizadas atualmente para essa previsão é a de
Mallampati, ela é realizada com o paciente em posição sentada, boca totalmente
aberta, língua protraída e sem fonação. O paciente é classificado de acordo com a
quantidade de estruturas observadas, isto é, Classe I quando se observa palato mole,
46
úvula, fauce e pilares visíveis; Classe II quando se observa palato mole, úvula e fauce;
Classe III quando se observa palato mole e úvula; Classe IV quando se observa apenas
o palato mole. A classe I é a com menos dificuldade e a classe IV com maior
dificuldade.
Deve-se levar em conta também que distância tireomentoniana menor que 6,5
cm é preditor de dificuldade, assim como a rigidez atlanto-occipital.
A previsão de ventilação difícil sob máscara também deve ser feita. Ela é
simples e envolve cinco variáveis: a) barba; b) índice de massa corpórea (IMC) maior
que 26; c) adentado; d) mais de 55 anos; e) história de ronco.
7.5. Exames complementares
Considerando pacientes assintomáticos, só se realizam alguns exames de rotina
para algumas faixas etárias e gênero. Para homens de 6 meses a 40 anos não se
realizam exames subsidiários, de 40 a 64 anos se faz eletrocardiograma e para os
maiores de 64 pede-se hematócrito, hemoglobina, ECG, clearance de creatinina e
glicemia. Para mulheres de 6 meses a 50 anos pede-se hematócrito, de 50 a 64 faz-se
hematócrito e ECG e para maiores de 64 anos pede-se hematócrito, hemoglobina,
ECG, clearance de creatinina e glicemia.
Para pacientes assintomáticos vale o esquema:
Idade Homem Mulher
6 meses – 40 anos nenhum Htc
40 – 50 anos ECG Htc
50 – 64 anos ECG Htc, ECG
Maiores de 64 anos ECG, Htc, Hb, U/C,
Glicemia
ECG, Htc, Hb, U/C,
Glicemia
Htc – hematócrito; ECG – eletrocardiograma; Hb – hemoglobina; U/C – ureia e
creatinina
Para pacientes sintomáticos o exame depende do tipo de acometimento. Por
exemplo, pacientes com hepatopatias devem ser submetidos à testes de coagulação e
pacientes com doenças respiratórias ou tabagistas devem realizar Raio-X de tórax.
O paciente é classificado pelo seu estado físico conforme seu risco anestésico
em seis classes. Essa classificação é da sociedade americana de anestesiologistas, do
Classe I Classe II Classe III Classe IV
47
inglês American Society of Anesthesiologists, por isso é denominada ASA. São seis
grupos (importante saber):
Tab. Classificação de risco anestésico da ASA
ASA I Paciente hígido
ASA II Paciente com doença sistêmica leve
ASA III Paciente com doença sistêmica grave
ASA IV Paciente com doença sistêmica grave com risco iminente de morte
ASA V Paciente que não se espera que sobreviva sem cirurgia
ASA VI Paciente com morte cerebral
Para emergências pode-se adicionar a letra E na classificação.
7.6. Medicações pré-anestésicas
É comum a utilização de medicações ansiolíticas como benzodiazepínicos,
opioides e metoclopramida. Esses fármacos aumentam a segurança do paciente e
reduzem o consumo de anestésico na operação. Para esses é importante levar em
conta possíveis interações medicamentosas e sobrecarga hepática em renal em
pacientes com comorbidades.
7.7. Questões
1) Qual é o principal objetivo da avaliação pré-anestésica?
2) Dê um exemplo de paciente para cada classificação de ASA.
3) O que é a escala de Mallampati?
7.8. Literatura consultada e sugerida
- CANGIANI, L.M.; POSSO, I. P.; BRAGA, G. M.; NOGUE, C. S. Tratado de Anestesiologia
– - SAESP. 6. ed. São Paulo: Atheneu, 2011. V II (pg. 1299 – 1323).
- MANICA J. Anestesiologia Princípios e Técnicas. 3. ed. Porto Alegre: Artes Médicas,
2004. (pg. 323 – 342).
48
8. Monitorização em Anestesia
8.1. Introdução
8.2. Monitorização hemodinâmica
8.2.1. Pressão venosa central
8.2.2. Pressão arterial invasiva
8.2.3. Cateter de artéria pulmonar
8.3. Monitorização da função respiratória
8.3.1. Monitorização da oxigenação
8.3.2. Monitorização da ventilação
8.4. Monitorização da mecânica respiratória
8.5. Questões
8.6. Literatura consultada e sugerida
8.1. Introdução
A monitorização consiste na vigilância contínua a qual os pacientes devem ser
submetidos desde a indução da anestesia, até sua recuperação. Tem como objetivos
principais: analisar a resposta do paciente a determinado procedimento (utilização de
anestésicos, reposição volêmica, ventilação, etc.) e diagnosticar ou reconhecer um
problema precocemente, como alterações produzidas por hemorragia, politransfusão,
compressão de vasos sanguíneos, etc.
8.2. Monitorização Hemodinâmica
A monitorização hemodinâmica é fundamental durante qualquer tipo de
anestesia, pois os anestésicos modificam as funções cardiovasculares e cirurgia pode
produzir alterações agudas e marcantes na hemodinâmica em consequência da
posição corporal, manipulação cirúrgica, perda sanguínea e redistribuição de líquidos.
Ela tem como objetivo detectar alterações agudas e adequar a perfusão e a oxigenação
tecidual e celular às necessidades do organismo.
Os métodos utilizados variam em um grande número de técnicas que diferem em seu
grau de precisão, complexidade, segurança e custo. A monitorização hemodinâmica
básica compreende: monitorização da frequência cardíaca, diurese, ECG contínuo,
oximetria de pulso contínua (SpO2), pressão arterial média (PAM) não invasiva,
frequência respiratória, temperatura, pressão venosa central (PVC) e PAM invasiva.
Segue abaixo a explicação de alguns métodos de monitorização hemodinâmica
invasiva:
8.2.1. Pressão venosa central
A pressão venosa central pode ser monitorada pelo acesso venoso central e
reflete indiretamente a pressão do átrio direito (PAD), que representa a pressão
gerada pelo volume de sangue do retorno venoso. Há uma curva de pressão, composta
por ondas, que representam o ciclo mecânico cardíaco.
As indicações de PVC são: choque; lesão pulmonar ou SDRA; insuficiência renal
aguda; sepse grave; paciente com alto risco cirúrgico; cirurgia de grande porte.
49
Onda a = Contração atrial
Onda c = Fechamento das valvas a-v
Onda v = Enchimento atrial
Onda descendente x = Relaxamento atrial
Onda descendente y = Esvaziamento atrial
Elevações e quedas dos componentes das ondas podem ser causadas por
alterações: do volume sanguíneo, na tensão miocárdica e na pressão intratorácica.
Todo paciente com instabilidade hemodinâmica deve ter a PVC monitorada. A
PVC pode contribuir para avaliação e controle do estado do volume intravascular,
devendo ser monitorada continuamente por meio de transdutores de pressão
conectados aos monitores.
8.2.2. Pressão arterial invasiva
A pressão arterial invasiva (PAi) é um determinante da perfusão dos órgãos
associada ao débito cardíaco. Considera-se que a pressão arterial media (PAM) é igual
à pressão de perfusão (PP), uma vez que a pressão venosa central (PVC), em indivíduos
sadios, e próxima de zero (PP = PAM – PVC). Dessa forma, a manutenção de um nível
adequado de PAM propicia, em geral, uma adequada perfusão orgânica.
A cateterização arterial pode ser realizada nas artérias radiais, pediosas,
femorais, axilares e braquiais, obedecendo a essa ordem de preferência.
As indicações da PAi são: emergências hipertensivas; choque; gasometrias
frequentes; hipertensão intracraniana; peri e pós-operatório de cirurgia cardíaca e
neurológica.
8.2.3. Cateter de artéria pulmonar
O cateter de artéria pulmonar é um dos maiores progressos na monitorização
do sistema cardiovascular nas últimas décadas. São utilizados cateteres de Swan-Ganz,
50
que permitem a medida da PVC, das pressões sistólicas, diastólica e média da artéria
pulmonar e da pressão ocluída da artéria pulmonar. A presença de um termossensor
na extremidade do cateter permite a medida do débito cardíaco pela técnica da
termodiluição e o cálculo das resistências vasculares pulmonar e sistêmica. A
incorporação de fios de derivação elétrica permite monitorar ECG atrial ou ventricular
ou estimular o coração por meio de um gerador externo de marca-passo. Alguns
cateteres também podem medir continuamente a saturação venosa de oxigênio.
As indicações para sua utilização são muito amplas, tais como: infarto agudo do
miocárdio com instabilidade hemodinâmica, cardiopatias instáveis, choque, trauma,
cirurgias de grande parte (principalmente em pacientes graves) e outras situações em
que a volemia e o estado hemodinâmico são de difícil avaliação.
Técnicas de monitorização minimamente invasiva: bioimpedância elétrica
torácica (BET), Doppler esofágico, termodiluição transpulmonar, análise de contorno
de pulso e avaliação da variação de pressão arterial.
8.3. Monitorização da função respiratória
A monitorização da função respiratória trouxe grande benefício em antecipar
uma possível complicação intraoperatória, sendo que, ventilação e oxigenação
inadequadas são as causas mais frequentes de complicações graves em anestesia.
8.3.1. Monitorização da oxigenação
A manutenção da oxigenação sanguínea é uma das principais metas durante o
tratamento intensivo ou a anestesia. A presença de hipoxemia grave não detectada
rapidamente tem efeitos deletérios, incluindo lesão neurológica irreversível e parada
cardíaca.
Os principais métodos utilizados são: Gasometria arterial e oximetria de pulso.
8.3.2. Monitorização da ventilação
51
É realizada pelo controle da pressão parcial de gás carbônico no sangue arterial
(PaCO2); Capnometria (medida da pressão parcial de gás carbônico no gás exalado) e
Capnografia (Observação continua da curva de exalação durante o ciclo respiratório e
pode ser expressa em função do tempo ou do volume exalado).
*A hipercapnia (PaCO2> 45 mmHg) reflete sempre uma ventilação inadequada,
enquanto a hipocapnia (PaCO2 < 35 mmHg) reflete hiperventilação como resposta à
hipoxemia, à acidose metabólica ou às alterações neurológicas.
8.4. Monitorização da mecânica respiratória
Os ventiladores mecânicos modernos utilizados em anestesiologia são dotados
de transdutores que realizam a mensuração do fluxo e pressão nas vias aéreas
proximais ao tubo endotraqueal. A mensuração contínua de pressão nas vias aéreas,
volume corrente e fluxo são os parâmetros de mecânica mais frequentemente
utilizados durante a anestesia, fornecendo informações em tempo real da interação do
sistema respiratório – ventilador mecânico e possibilitando o diagnóstico precoce de
falhas no sistema e mudanças da mecânica, auxiliando nos ajustes dos parâmetros
ventilatórios.
8.5. Questões
1) Método, considerado um dos maiores progressos na monitorização
cardiovascular, permite a medida da PVC, das pressões sistólicas, diastólica e média da
artéria pulmonar e da pressão ocluída da artéria pulmonar:
a) Oximetria de pulso
b) Pressão arterial invasiva
c) Cateter de artéria pulmonar
d) Acesso venoso central
2) O controle da pressão parcial da PaCO2, a Capnometria e a Capnografia são
métodos utilizados para:
a) Monitorar a função renal
b) Monitorar a oxigenação
c) Monitorar a função cardiovascular
d) Monitorar a ventilação
3) É um método não invasivo de monitorização hemodinâmica:
a) Pressão venosa central
b) Oximetria de pulso
c) Cateter de Swan-Ganz
d) Cateter de artéria pulmonar
8.6. Literatura consultada e sugerida
http://www.unifesp.br/denf/NIEn/hemodinamica/pag/cateter.htm <acesso em: 28/08/2014>
http://www.somiti.org.br/protocolo/3_monitorizacao.pdf <acesso em: 28/08/2014>
AMARAL, José Luiz; GERETTO, Pedro; TARDELLI, Maria Ângela; R. MACHADO, Flávia; M. YAMASHIT,
Américo. Guias de Medicina Ambulatorial e Hospitalar: Guia de Anestesiologia e Medicina
Intensiva. 1. ed. Barueri: Editora Manole, 2011.
CANGIANI, Luiz Marciano; SLULLITEL, Alexandre; PORTÉRIO, Glória Maria Braga; PIRES, Oscar César;
POSSO, Irimar de Paula; NOGUEIRA, Celso Schmalfuss; FEREZ, David; CALLEGARI, Desiré Carlos.
Tratado de Anestesiologia – SAESP. 7. Ed. São Paulo: Editora Atheneu, 2011.
52
9. Anestésicos locais
9.1. Conceito
9.2. Propriedades físico-químicas
9.3. Mecanismo de ação
9.4. Farmacocinética
9.5. Dose
9.6. Efeitos adversos e toxicidade
9.7. Questões
9.8. Literatura consultada e sugerida
9.1. Conceito
Os anestésicos locais (AL) são fármacos que, em concentrações adequadas,
possuem a propriedade específica de bloquear de forma reversível a geração e a
propagação de impulsos elétricos em tecidos excitáveis, abolindo a sensibilidade e até
a atividade motora. A ação dos AL é reversível: sua utilização é seguida pela
recuperação completa na função do nervo, sem evidências de lesão nas células ou
fibras nervosas.
9.2. Propriedades físico-químicas
Os AL são classificados conforme a ligação do resíduo aromático em tipo éster
ou amida. A estrutura molecular básica dos anestésicos locais mais utilizados
atualmente é constituída de três partes: um grupo hidrofóbico e lipofílico,
normalmente um anel aromático; uma cadeia intermediária, geralmente um éster ou
uma amida; um grupo hidrofílico, em geral uma amina terciária.
A ligação entre a cadeia intermediária e o grupo aromático pode ser do tipo
éster ou do tipo amida. Esse tipo de ligação permite uma das classificações dos
anestésicos locais em aminoésteres e aminoamidas, com diferente biotransformação e
potencial alergênico.
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Apostila Anestesiologia

  • 1. 1
  • 2. 2 Depois de passarmos pelas semanas de anestesiologia e oftalmologia, nós, estudantes da Turma 79, indignados e insatisfeitos pelo fato de o curso ser extremamente pesado e pouco proveitoso (uma síntese perfeita do que é o 4º ano e a graduação como um todo), elaboramos esta apostila de maneira coletiva. O intuito era produzir um material voltado às necessidades do estudante: objetivo, de linguagem simples e clara e voltado para a formação do médico generalista. Além de contribuir para o nosso próprio aprendizado, por ser um método de avaliação que exige do aluno competências mais importantes do que decorar informações de um dia para o outro, a manufatura desta apostila é uma forma de protesto pela falta de qualidade do curso e um pedido de reformulação para os próximos estudantes. Quando falamos “curso”, nos referimos às semanas de oftalmologia e anestesiologia, aos demais módulos do 4º ano e aos 3 anos pelos quais já passamos. Esperamos que aproveitem o material e possam continuar insistindo por mudanças que contribuam com nosso aprendizado. Turma 79
  • 3. 3 SUMÁRIO 1. Classificação, nomenclatura e fisiopatologia da dor ....................................................... 8 1.1. Nomenclatura 1.2. Classificação 1.3. Fisiopatologia da Dor 1.4. Literatura consultada e sugerida 2. Avaliação do Paciente com Dor .................................................................................... 15 2.1. Introdução 2.2. Retomando o Conceito de Dor 2.2.1. Conceito genérico de dor 2.2.2. A dor aguda 2.2.3. A dor crônica 2.3. Avaliação Propedêutica da Dor 2.3.1. As dez características semiológicas da dor 2.4. Abordagem Clínica da Dor: uma breve introdução 2.5. Questões 2.6. Literatura consultada e sugerida 3. Tratamento da dor ...................................................................................................... 19 3.1.Fármacos 3.2. Modalidades físicas no tratamento da dor 3.3. Tratamentos invasivos 3.4. Procedimentos cirúrgicos 3.5. Questões 3.6. Literatura consultada e sugerida 4. Dor no câncer: características e controle ..................................................................... 29 4.1. Introdução 4.2. Etiopatogenia 4.3. Avaliação do Paciente 4.4. Tratamento 4.5. Literatura consultada e sugerida 5.Dor aguda pós-operatória ............................................................................................. 33 5.1. Introdução 5.2. Definição de DPO 5.3. Fisiopatologia da DPO 5.4. Efeitos e complicações sistêmicas da DPO 5.5. Tratamento da DPO 5.6. Questões 5.7. Literatura consultada e sugerida 6. Anestesia - conceitos .................................................................................................. 39 6.1. Conceitos gerais 6.1.1. O que é anestesia? 6.1.2. Tipos de anestesia 6.1.3. Técnicas anestésicas 6.2. Drogas anestésicas 6.2.1. Agentes inalatórios 6.2.2. Anestésicos intravenosos
  • 4. 4 6.2.3. Anestésicos locais 6.2.4. Bloqueadores neuromusculares 6.3. Questões 6.4. Literatura consultada e sugerida 7. Avaliação pré-anestésica ............................................................................................. 44 7.1. Introdução 7.2. O interrogatório complementar sobre os diversos aparelhos 7.3. Antecedentes pessoais 7.4. Exame físico 7.5. Exames complementares 7.6. Medicações pré-anestésicas 7.7. Questões 7.8. Literatura consultada e sugerida 8.Monitorização em Anestesia ........................................................................................ 48 8.1. Introdução 8.2. Monitorização hemodinâmica 8.2.1. Pressão venosa central 8.2.2. Pressão arterial invasiva 8.2.3. Cateter de artéria pulmonar 8.3. Monitorização da função respiratória 8.3.1. Monitorização da oxigenação 8.3.2. Monitorização da ventilação 8.4. Monitorização da mecânica respiratória 8.5. Questões 8.6. Literatura consultada e sugerida 9. Anestésicos locais ........................................................................................................ 52 9.1. Conceito 9.2. Propriedades físico-químicas 9.3. Mecanismo de ação 9.4. Farmacocinética 9.5. Dose 9.6. Efeitos adversos e toxicidade 9.7. Questões 9.8. Literatura consultada e sugerida 10. Bloqueadores Neuromusculares e Antagonismo de Bloqueio .................................... 59 10.1. Introdução 10.2. Transmissão Neuromuscular 10.3. Bloqueadores Neuromusculares Despolarizantes 10.4. Bloqueadores neuromusculares adespolarizantes ou por competição 10.5. Reversão do Bloqueio Neuromuscular 10.6. Monitorização da Transmissão e do Bloqueio Neuromuscular 10.7. Questões 10.8. Literatura consultada e sugerida 11. Anestesia Geral ......................................................................................................... 65 11.1. Introdução 11.1.1. Definição e objetivos da anestesia geral 11.1.2. Objetivos da anestesia geral
  • 5. 5 11.2. Anestesia Inalatória 11.2.1. Farmacocinética da anestesia inalatória 11.2.2. Farmacodinâmica da anestesia inalatória 11.2.3. Farmacologia dos agentes inalatórios 11.3. Anestesia Venosa 11.3.1. Anestésicos não opioides 11.3.2. Anestésicos opioides 11.4. Questões 11.5. Literatura consultada e sugerida 12. Raquianestesia e Anestesia Peridural ......................................................................... 73 12.1. Introdução 12.1.1. Conceitos importantes 12.1.2. Considerações anatômicas 12.2. Raquianestesia 12.2.1. Fisiologia 12.2.2. Técnica 12.2.3. Indicações e Contraindicações 12.3. Anestesia Peridural 12.3.1. Fisiologia 12.3.2. Técnica 12.3.3. Indicações e Contraindicações 12.4. Complicações dos bloqueios espinhais 12.5. Bloqueio combinado raquiperidural 12.5.1. Técnica 12.5.2. Indicações, contraindicações e vantagens 12.6. Questões 12.7. Literatura consultada e sugerida -operatória .......................................................................... 80 13.1.Métodos de avaliação da responsividade a infusão de fluidos 13.1.1 Métodos estáticos 13.1.2 Métodos dinâmicos 13.2 Tipos de fluidos 13.2.1 Cristaloides 13.2. 2 Coloides 13.2.2.1 Albumina 13.2.2.2 Hidroxietilamidas (HES) 13.2.2.3 Dextranas 13.2.2.4 Gelatinas 13.2.3 Sangue 13.2.3.1 Sangue total 13.2.3.2 Concentrado de hemácias 13.3. Literatura consultada e sugerida - ...................................................................................... 85 14.1. Introdução 14.2. Avaliação de pacientes e monitoramento 14.2.1. Função respiratória
  • 6. 6 14.2.2. Função cardiovascular 14.2.3. Função neuromuscular 14.2.4. Estado mental 14.2.5. Náuseas e vômitos 14.2.6. Temperatura 14.2.7. A produção de urina e micção 14.3. Critério de alta 14.4. Questões 14.5. Literatura consultada e sugerida ....................................................................................... 90 15.1. Introdução 15.2. Os pacientes críticos 15.3. O que causa dor? 15.4. Avaliação da dor e sedação 15.5. Tratamento da dor e sedação 15.6. Técnicas de analgesia e sedação 15.6.1. Técnica de analgesia antes da sedação 15.6.2. Administração em bolo e infusão 15.6.3. Interrupção diária da infusão 15.7. Medicamentos e técnicas para analgesia e sedação 15.7.1. Anti-inflamatórios, Paracetamol e Dipirona 15.7.2. Opioides 15.7.3. Analgesia Controlada pelo Paciente (PCA) 15.7.4. Agonistas do ácido gama amino butírico (GABA) 15.7.5. Agonistas adrenérgicos alfa-2 15.7.6. Etomidato 15.7.7. Bloqueadores neuromusculares 15.7.8. Outros fármacos 15.7.9. Analgesia regional 15.8. Questões 15.9. Literatura consultada e sugerida 16. O Paciente em Sepse ................................................................................................ 100 16.1. Introdução 16.2. Epidemiologia 16.3. Fisiopatologia 16.4. Critérios diagnósticos e definições 16.5. Tratamento 16.6. Questões 16.7. Literatura consultada e sugerida 17. Estados de Choque ................................................................................................... 104 17.1. Introdução 17.2. Fisiopatologia 17.2.1. Hemodinâmica 17.2.2. Alterações Hemodinâmica no Choque 17.3. Classificação dos Estados de Choque 17.3.1. Choque Hipovolêmico
  • 7. 7 17.3.2. Choque Cardiogênico 17.3.3. Choque Obstrutivo 17.3.4. Choque Distributivo 17.4. Estágios Evolutivos do Choque 17.4.1. Choque Compensado 17.4.2. Choque Descompensado 17.4.3. Choque Irreversível 17.5. Questões 17.6. Literatura consultada e sugerida 18. Insuficiência Respiratória e Síndrome da Angústia Respiratória Aguda .................... 109 18.1. Introdução 18.2. Insuficiência respiratória ventilatória 18.3. Insuficiência respiratória hipoxêmica 18.4. Investigação do mecanismo de hipoxemia 18.5. Síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA) 18.6. Questões 18.7. Literatura consultada e sugerida 19. Ventilação mecânica ................................................................................................ 113 19.1. Introdução 19.2. Ventilação não invasiva 19.3. Ventilação mecânica invasiva 19.4. Conceitos importantes 19.5. Modalidades respiratórias 19.6. Desmame 19.7. Complicações 19.8. Questões 19.9. Literatura consultada e sugerida 20. Distúrbios hidroeletrolítico e ácido-básico ............................................................... 123 20.1. Introdução 20.2. Equilíbrio hidroeletrolítico 20.2.1. Metabolismo normal da água e eletrólitos 20.2.2. Regulação do equilíbrio hidroeletrolítico 20.2.3. Alterações do equilíbrio hidroeletrolítico 20.3. Equilíbrio ácido-básico 20.3.1. Equação de Henderson-Hasselbalch 20.3.2. Mecanismos de compensação 20.3.3. Distúrbios ácido-básicos 20.4. Questões 20.5. Literatura consultada e sugerida 21. Gabarito .................................................................................................................. 131
  • 8. 8 1.Classificação, nomenclatura e fisiopatologia da dor 1.1. Introdução 1.2. Nomenclatura 1.3. Classificação 1.4. Fisiopatologia da Dor 1.5. Questões 1.6. Literatura consultada e sugerida 1.1. Introdução “Dor é uma experiência sensitiva desagradável associada a uma lesão atual ou potencial” (IASP, 1994). Conceituar e graduar experiências tão subjetivas como a dor é quase impossível, como mostra essa definição bastante ampla e vaga da International Association for the Study of Pain (IASP) feita em 1994. No entanto, convenções como essa, em que se tenta ao máximo aproximar manifestações clínicas aparentemente desconexas, são a única saída para que os profissionais e serviços de saúde possam conversar e juntar esforços no diagnóstico e tratamento da dor. 1.2.Nomenclatura A nomenclatura da dor é importante para homogeneizar descrições de manifestações clínicas. De acordo com a International Association for the Study of Pain (1994), temos:  Dor: experiência sensitiva desagradável associada à lesão atual ou potencial;  Dor referida: distante da área da lesão;  Limiar de dor: menor intensidade de estímulo que leva à percepção;  Neuralgia: dor na distribuição do nervo que pode ou não ser acompanhada de sinais de hipofunção do nervo;  Hiperalgesia: aumento da resposta ao estímulo que normalmente é doloroso;  Hiperestesia: aumento da sensibilidade ao estímulo;  Hiperpatia: síndrome dolorosa caracterizada por aumento da reação ao estímulo, especialmente se for repetitivo;  Hipoestesia: diminuição da sensibilidade ao estímulo, excluindo os sentidos especiais;  Hipoalgesia: diminuição da sensibilidade ao estímulo nóxico;  Analgesia: ausência de dor ao estímulo nociceptivo;  Anestesia dolorosa: dor em região adormecida;  Neurite: inflamação do nervo;  Neuropatia: distúrbio da função ou alteração patológica do nervo;  Alodínia: dor ao estímulo que geralmente não provoca dor;  Parestesia: sensação anormal, espontânea ou evocada nem sempre agradável;  Disestesia: sensação anormal, espontânea ou evocada, sempre desagradável.
  • 9. 9 1.3.Classificação A dor pode ser classificada em relação à: 1. Fisiopatologia; 2. Duração; 3. Localização; 4. Etiologia; 5. Dependência do sistema simpático; 6. Região afetada; 7. Síndrome. 1. Quanto à fisiopatologia, será discutida em tópico à parte. 2. Quanto à duração, a dor pode ser aguda ou crônica. A dor aguda desaparece junto com a lesão. A dor crônica desaparece e tem duração maior que 3 a 4 meses. CLASSIFICAÇÃO DA DOR QUANTO À DURAÇÃO Dor Aguda Dor Crônica Súbita Persistente, longa duração Sintoma Doença Causa ansiedade, medo irritação Não tem função biológica Alerta para risco de lesão Causa alterações fisiológicas Provoca alteração neurovegetativa: Sudorese, dilatação da pupila Causa alterações psicológicas: depressão, ansiedade, falta de prazer, letargia Aumenta as frequências cardíaca e Respiratória Causa distúrbio do sono Tem alívio inadequado Acarreta perda social, incapacitação 3. Quanto à localização, a dor pode ser somática ou visceral. Exemplos de dor somática: artrite, tumor ósseo, tendinite, bursite. Exemplos de dor visceral: infarto do miocárdio, obstrução intestinal, tumor no pâncreas. CLASSIFICAÇÃO DA DOR QUANTO À LOCALIZAÇÃO Dor somática Dor visceral Bem localizada Pouco localizada Próxima à lesão Alterações autonômicas Pode exacerbar com movimento Dor referida 4. Quanto à etiologia, a dor pode ser causada por: trauma, cirurgia, herpes zoster, câncer, hérnia de disco, infecção, isquemia, espasmo. 5. A dor pode ser dependente ou independente do sistema simpático. Podem ser mantidas pelo simpático: síndrome complexa de dor regional (SCDR), neuralgia, dor inflamatória, dor central, dor fantasma.
  • 10. 10 6. Em relação à região afetada, a dor pode ser classificada em:  Lombar;  Torácica;  Cefálica;  Cervical;  Abdominal;  Pélvica;  Dos membros. 7. As síndromes dolorosas podem ser:  Lombalgia e lombociatalgia;  Cervicobraquialgia;  Miofascial;  Fibromiálgica;  SCDR;  Central;  Neuropatia;  Trauma
  • 11. 11 1.4. Fisiopatologia da Dor A dor pode ser nociceptiva, resultante da ativação de nociceptores, ou neuropática, decorrente de alteração ou lesão do sistema nervoso. Dor por nocicepção Nocicepção é um termo neurofisiológico que se refere aos mecanismos neurológicos mediante os quais um estímulo lesivo é detectado. O primeiro passo na sequência de eventos que originam a dor é a transformação de estímulos lesivos em potenciais de ação (transdução), que serão transmitidos ao sistema nervoso central (SNC) através de fibras nervosas periféricas. A partir de um potencial gerado nos nociceptores, sejam eles viscerais, osteoarticulares, musculoesqueléticos ou tegumentares, o estímulo seguirá pelas fibras aferentes primárias até a medula espinal e, através das vias ascendentes, será projetado no córtex, onde ocorre a percepção consciente da dor, após conexões com estruturas como o tálamo e a formação reticular. A lesão tecidual provoca formação e liberação de substâncias que sensibilizam e ativam os nociceptores (terminações nervosas livres de fibras A-delta e C, que são responsáveis pela transmissão da dor e que respondem aos estímulos mecânicos, térmicos ou químicos), seguidas de transmissão do impulso para a medula espinal e para os centros supra-espinais. Existem três classes de nociceptores: mecanoceptores (sensíveis a estímulo mecânico intenso), termoceptores (ativados por temperaturas extremas) e polimodais (respondem a estímulo térmico, mecânico e químico). A diferença de condução entre as fibras A-delta (pouco mielinizadas, com maior velocidade de condução que as fibras C) e as fibras C (amielinizadas) faz que aquelas sejam responsáveis pela “primeira dor” e estas, pela “segunda dor”. O glutamato e a substância P são os principais neurotransmissores nociceptivos das fibras aferentes A delta e C.
  • 12. 12 Dor neuropática A dor neuropática é causada por lesão ou disfunção do sistema nervoso central ou periférico e caracteriza-se por hipersensitividade patológica de membranas excitáveis; inclui entidades heterogêneas, as quais diferem em etiologia e local da lesão. As características da dor são variadas. As condutas terapêuticas são diferentes e o alívio do sintoma é mais difícil que na dor nociceptiva, tornando necessária, muitas vezes, a associação de medicamentos e tratamentos. Após alteração ou lesão do sistema nervoso, periférico ou central, pode ocorrer dor neuropática, que está associada a uma cascata de eventos que inclui alterações biológicas importantes. A interrupção parcial ou total de fibras aferentes causa degeneração de terminações pré-sinápticas da célula desaferentada e alterações funcionais e morfológicas denominadas neuroplasticidade. Na sinapse, o neurônio denervado pode ser reinervado por outros axônios; as sinapses inibitórias podem ser substituídas por excitatórias, formando conexões anormais; as sinapses ineficazes tornam-se ativas e ocorre aumento da efetividade das sinapses ativas. As conexões excitatórias podem expandir-se para células próximas com surgimento de células responsivas em regiões previamente silenciosas. Os neurônios do SNP tornam-se mais sensíveis a estímulos neurotransmissores. A representação sensitiva somática da região desaferentada é mantida no sistema nervoso central. Essa memória pode ser ativada após longos períodos, o que explica o aparecimento tardio da dor em alguns pacientes.
  • 13. 13 Resumindo... 1.5. Questões 1. Defina “dor”. 2. Diferencie neuralgia de neuropatia. 3. Cite no mínimo 3 etiologias de dor. 4. Diferencie dor por nocicepção de dor neuropática.
  • 14. 14 1.6. Literatura consultada e sugerida Sakata, Rioko Kimiko; Issy, Adriana Machado. Dor. Guias de Medicina Ambulatorial e Hospitalar da Unifesp-EPM. Editora Manole, 2ª edição. 2008.
  • 15. 15 2. Avaliação do Paciente com Dor 2.1. Introdução 2.2. Retomando o Conceito de Dor 2.2.1. Conceito genérico de dor 7.2.2. A dor aguda 7.2.3. A dor crônica 2.3. Avaliação Propedêutica da Dor 2.3.1. As dez características semiológicas da dor A) Início B) Frequência e duração C) Localização D) Irradiação E) Caráter ou qualidade F) Intensidade G) Fatores desencadeantes H) Fatores atenuantes I) Fatores agravantes J) Fatores concomitantes 2.4. Abordagem Clínica da Dor: uma breve introdução 2.4. Questões 2.5. Literatura consultada e sugerida 2.1. Introdução Antes de entrarmos no assunto propriamente dito desse capítulo, a avaliação do paciente com dor, é importante destacarmos a importância do estudo desse tema. A avaliação do paciente em si não é um assunto recorrente em provas de residência (encontramos mais em provas de residência de enfermagem do que de medicina), mas é fundamental para a prática médica do dia-a-dia. Esse capítulo, portanto, é muito mais voltado a relembrar algumas informações aprendidas (na medida do possível) no curso de Semiologia do 3º ano, que serão uma base para a compreensão de conceitos de anestesiologia, dor e terapia intensiva e para o atendimento e a abordagem ao paciente com dor. É importante lembrar que, em termos de epidemiologia, a queixa de dor, por se tratar de lesão tecidual potencial ou real (como veremos na conceituação), é a mais prevalente em todos os campos de atendimento na Medicina: consultório, ambulatório, pronto-socorro e enfermaria. 50 a 65% dos pacientes internados em UTI relatam terem sentido dor em algum momento da internação e, em 15 a 30% dos casos, a dor referida foi de grande intensidade. 2.2. Retomando o Conceito de Dor 2.2.1. Conceito genérico de dor A Internacional Association for the Study of Pain (IASP) define dor como “uma experiência sensorial e emocional desagradável associada a lesão tecidual real ou
  • 16. 16 potencial, ou descrita em termos de tal dano”. Como já vimos no capítulo anterior, são diversas as classificações que podem ser usadas para avaliar a dor, sendo uma das mais habituais sua duração, que se divide em aguda e crônica. 2.2.2. A dor aguda A dor aguda tem pequena duração (menos do que 3 meses), geralmente associada a cirurgia, traumatismo (Figura 1) ou doença aguda. Em geral, é caracterizada por ter causa conhecida, ser temporária e localizada na região do traumatismo ou lesão, e resolver-se espontaneamente com a cura. 2.2.3. A dor crônica A dor crônica tem uma definição mais complexa. Uma dor passa a ser considerada crônica ao persistir 3 meses além do curso usual do problema agudo, porém, alguns autores questionam a duração como fator distintivo da dor crônica. Em vez disso, enfatizam fatores comportamentais-cognitivos como critérios essenciais para as síndromes dolorosas crônicas. 2.3. Avaliação Propedêutica da Dor 2.3.1. As dez características semiológicas da dor Não existe um método padronizado para a avaliação do paciente com dor. No entanto, é possível fazer uma simplificação didática em dez características fundamentais a serem avaliadas, no que concerne a pacientes com essa queixa, por meio da anamnese. O exame físico fornece apenas informações que comprovam aquilo que foi constatado por meio de uma entrevista completa do paciente, por meio de técnicas como a palpação e a punho-percussão, avaliação de força muscular, reflexos e sensibilidade e avaliação músculo-esquelética. Nesse sentido, para a avaliação da dor, a ênfase deve ser dada para uma anamnese bem feita, questionando acerca dessas dez características, a saber: A) Início: a data de início do quadro doloroso deve ser bem especificada (como já vimos, tem importância em avaliar se é uma dor aguda ou crônica; além disso, pode servir para associações temporais com outros fatores patológicos). B) Frequência e duração: a dor pode ser constante, desde sua data de início; pode ser cíclica ou intermitente, caso no qual o paciente deve ser questionado quanto à duração de cada episódio e intervalo entre eles. Cada episódio de dor deve ser plenamente caracterizado para melhor compreensão do quadro. C) Localização: o paciente deve mostrar exatamente onde dói, se é em algum ponto específico ou região, ou ainda se ele não consegue precisar os locais da dor (dor difusa). D) Irradiação: o médico deve avaliar se a dor se irradia, ou seja, se existem outras manifestações da mesma dor no trajeto nervoso, como no infarto agudo do miocárdio, no qual a dor na região peitoral esquerda pode ser irradiada para o braço esquerdo ou mandíbula esquerda. Figura 1 - Traumatismo pode causar dor aguda...
  • 17. 17 E) Caráter ou qualidade: a sensação ou emoção que essa dor traz e com o que ela parece para o paciente são questões que devem ser levantadas pelo médico. Pode ser em queimação, pontada, pulsátil, em cólica, em aperto, contínua ou até mesmo a dor do membro fantasma (em pacientes amputados). F) Intensidade: a avaliação da intensidade da dor é polêmica, mas é importante estimar o quanto dói para o paciente. Existem diversas ferramentas para tanto, como escalas visuais com números para adultos (sendo 0 para nenhuma dor, e 10 para a dor máxima) ou rostos para crianças . Para os adultos, a dor é considerada leve de1 a 4, moderada de 5 a 7, e intensa de 8 a 10, como mostra a figura 2. Os questionários verbais são menos utilizados (apenas com objetivos clínicos e de pesquisa) e a capacidade funcional também pode ser usada como instrumento de medida para a avaliação da dor. G) Fatores desencadeantes: alguma coisa que o paciente faz ou deixa de fazer gera esse quadro doloroso? Existe algum fator relacionado com o início da crise? H) Fatores atenuantes / de melhora: é importante saber se o paciente toma alguma medida que melhore essa dor, seja farmacológica (analgésicos, por exemplo), seja não farmacológica (posições que melhoram a dor, indução de vômito, sono, alimentação). I) Fatores agravantes / de piora: da mesma forma, devemos questionar se alguma coisa piora a dor do paciente, por exemplo, a exposição à luz (fotofobia) ou som (fonofobia), alimentação, esforço, compressão do local. J) Fatores concomitantes: a própria dor pode dar origem a outros sintomas (cólicas podem originar náusea, vômito, sudorese, mal estar) ou, então, a dor pode ser acompanhada de sintomas diretamente relacionados à sua causa. Uma anamnese que aborde essas 10 características propedêuticas, além de outras questões usuais, como tratamentos prévios para a dor (verificando tempo de administração, dose, intervalo, associação de fármacos, resultado do tratamento, efeitos colaterais e complicações) e antecedentes pessoais do paciente (em termos de doenças, cirurgias, história de trauma ou hospitalizações, quimioterapia, radioterapia) pode ser considerada uma anamnese completa, e permite uma avaliação integral da dor do paciente. 2.4. Abordagem Clínica da Dor: uma breve introdução A abordagem inicial do paciente com dor nem sempre resulta em um diagnóstico. Muitas vezes, é necessário esperar a resposta terapêutica às drogas e tratamentos anteriores, além de um detalhamento mais preciso das características da dor e da avaliação psíquica e neurológica do paciente. Quando se trata de um quadro com dores múltiplas, deve-se priorizar cada manifestação conforme a repercussão na vida do paciente, ou pela gravidade que o Figura 2 - Escalas de dor
  • 18. 18 médico atribui a cada uma delas. Também é importante avaliar a história familiar, antecedentes de síndromes dolorosas e uso de álcool ou outras drogas. Lembre-se sempre de tentar diminuir a intensidade da dor do paciente, mesmo sem ter definida a sua causa. Abolir ou mitigar a dor é, afinal, uma das funções mais importantes do médico. 2.5. Questões 1. Um paciente chega ao seu consultório com a queixa de uma dor lombar há 1 semana. Como você conduziria a anamnese? 2. WW, 50 anos, ex-professor de química para o Ensino Médio e funcionário de lava- rápido em Albuquerque, NM, atualmente de ocupação desconhecida, chega ao PS com queixa de cefaleia há 3 semanas. Com relação ao quadro de dor e à conduta a ser assumida nesse caso: a. É necessário avaliar os antecedentes pessoais do paciente, como a possibilidade de um quadro de câncer de pulmão em remissão, antes de medicá-lo. b. Além dos antecedentes pessoais, é necessário questionar especificamente acerca da localização específica da dor, bem como de suas características (se é em aperto, pontada, etc.). c. Além da avaliação b), é necessário conhecer características que podem acompanhar o quadro doloroso, como o trabalho em ambiente com exposição a produtos químicos. d. Junto à avaliação c), é importante buscar outros fatores de piora ou de melhora do quadro, conhecer a frequência e duração dessa cefaleia, e avaliar outros sintomas concomitantes. e. Além das avaliações em d), é necessário iniciar com urgência tratamento com morfina para aliviar a dor. 2.5. Literatura consultada e sugerida Obs: Poucos ou nenhum desses livros estão disponíveis na Biblac. Por ser um tema de revisão, é preferível investir mais tempo em outras matérias. 1) Slover, R; Davids, HR. Manejo da Dor Aguda. In: Duke, J. Segredos em Anestesiologia. 4ªed. Rio de Janeiro, RJ: Di Livros Editora, 2013. P 527-534. 2)Valdivieso, R. Manejo da Dor Crônica. In: Duke, J. Segredos em Anestesiologia. 4ªed. Rio de Janeiro, RJ: Di Livros Editora, 2013. P 535-540. 3) Tomic, ER. Dor – Conceitos Gerais. In: Benseñor, IM; Atta, JA; Martins, MA. Semiologia Clínica, 1ª ed. São Paulo, SP: Sarvier, 2002. P. 509-512. 4) Junior, APN. Analgesia, Sedação e Bloqueio Neuromuscular. In: Azevedo, LCP; Oliveira, AR; Ladeira, JP; Velasco, IT. Medicina Intensiva Baseada em Evidências, edição Revista e Atualizada. São Paulo, SP: Editora Atheneu, 2009. P. 191-200. 5) Bicley, Lynn S. Bates, propedêutica médica essencial: avaliação clínica, anamnese, exame físico. Rio de Janeiro, RJ: Guanabara Koogan, 2013. P. 41, 67-69.
  • 19. 19 3. Tratamento da dor 3.1. Introdução 3.2.Fármacos 3.3. Modalidades físicas no tratamento da dor 3.4. Tratamentos invasivos 3.5. Procedimentos cirúrgicos 3.6. Questões 3.7. Literatura consultada e sugerida 3.1.Introdução O tratamento da dor pode ser realizado basicamente de quatro maneiras: por meio da utilização de fármacos, medidas físicas, bloqueios ou intervenção cirúrgica (raro). Tais medidas podem ser utilizadas isoladamente ou associadas levando em consideração a intensidade e as características da dor a ser controlada. Veremos no capítulo sobre “Dor oncológica” que o controle da dor nesses casos é baseado na utilização da Escada Analgésica preconizada pela OMS, ilustrada abaixo. É um método baseado na intensidade da dor referida pelo paciente e na resposta ao analgésico empregado de forma sequencial, de acordo com a intensidade da dor. Nesse contexto, é importante destacar que ela também pode auxiliar o tratamento das dores não oncológicas e deve ser utilizada para o tratamento tanto de dores agudas como crônicas. Figura 1. Escada analgésica preconizada pela OMS, adaptada. Serão abordados neste capítulo os diversos tipos de tratamento e suas características de forma individualizada.
  • 20. 20 3.2. Fármacos Existem diversas vias de administração dos medicamentos no controle da dor como: via oral, sublingual, retal, venosa, subcutânea, intramuscular, intra-articular, tópica, transdérmica, subaracnóidea e peridural. A via oral é a via comumente utilizada. Anti-inflamatórios não-esteroidais (AINE) 1. Mecanismos de Ação O mecanismo de ação primário dos anti-inflamatórios é a inibição da enzima ciclooxigenase (COX 1 e COX2), impedindo a formação de prostaglandinas. Como as prostaglandinas sensibilizam os nociceptores dos nervos periféricos, ao bloquear a formação delas impede-se a passagem do estímulo doloroso. Já a nível central, esses medicamentos bloqueiam o processamento da dor na medula espinal por meio da inibição da prostaglandina-sintetase central. Além disso, possuem outras ações no processo inflamatório como: redução de ácidos graxos livres, antagonizar a bradicinina, inibição da ativação e agregação de neutrófilos, inibição dos radicais livres, entre outras. Figura 2. Mecanismo de ação dos AINE. 2. Efeitos Farmacológicos Os efeitos principais dos AINE são: anti-inflamatório, analgésico e antipirético. 3. Vias de Administração A via oral é, em geral, a via de escolha para os AINE. Entretanto, podem ser administrados também por via intramuscular, venosa, sublingual, retal e transdérmica. 4. Indicações São os medicamentos mais indicados para o controle da dor aguda e crônica, leve ou moderada. Em geral está indicado em: - Dor pós-operatória ou trauma (fraturas, contusões); - Diversas síndromes dolorosas: lombociatalgia, cervicobraquialgia, miofascial, tendinite, bursite, osteoartrite, cefaleia, dor oncológica; - Dor de origem visceral (cólica nefrética, dismenorréia). 5. Efeitos Colaterais
  • 21. 21 Os efeitos colaterais podem ser: - Gastrointestinais: úlcera, erosão, hemorragia e perfuração gástrica e intestinal; - Renais: diminuição da perfusão e filtração glomerular que pode levar a insuficiência renal; - Hepáticos: elevação das transaminases, gamaglutamiltransferase (GGT) e bilirrubinas, lesão hepática (maior risco em etilistas e fumantes); - Dermatológicos: leves (prurido e erupções cutâneas) e graves (necrose epidérmica tóxica). 6. Condições clínicas que exigem cautela no uso de AINE A hipoalbuminemia aumenta a fração livre de AINE, o que aumenta o risco de efeitos colaterais. Portanto, a dose administrada nesses casos deve ser corrigida. Na hipovolemia e na cirrose hepática com hipertensão portal ocorre diminuição de prostaglandinas (PG). O uso de AINE potencializaria a queda de PG em pacientes nessa condição, o que pode levar a insuficiência renal. Em pacientes com asma brônquica e alérgicos podem ocorrer crises asmáticas ou alérgicas. 7. Contra-indicações Os AINE estão contraindicados em pacientes com úlcera ativa e hemorragia digestiva recente. Devem ser evitados em pacientes com história de úlcera péptica, esofagite de refluxo e varizes esofágicas. Opioides Os opiáceos são substâncias naturais derivadas do ópio com ação analgésica e depressora do SNC. Por sua vez, os opióides são substâncias endógenas ou exógenas, naturais ou sintéticas, que se ligam aos receptores opióides e atuam de forma semelhante aos opiáceos. Existem diversas formas de classificação dos opióides, das quais as mais importantes são: - Origem: naturais (morfina, codeína), semi-sintéticos (buprenorfina e oxicodona) e sintéticos (nalbufina, naloxona, metadona, fentanil, entre outros); - Potência: fracos (codeína, tramadol) e fortes (morfina, metadona, fentanil); - Duração de ação: curta (codeína, morfina, fentanil) e longa duração (metadona). Além disso, os opióides podem ter efeitos agonistas, produzindo efeitos farmacológicos desejados; agonistas parciais, produzindo efeitos menores do que a resposta máxima; antagonistas, revertendo os efeitos farmacológicos e agonista- antagonistas. 1. Mecanismos de Ação São medicamentos que agem nos receptores mi (),kappa (), delta ()e sigma ()do SNC e SNP relacionados à analgesia, sedação e depressão respiratória. Estes receptores estão localizados no corno dorsal da medula, no gânglio da raiz dorsal e nas terminações periféricas. Dessa forma, os opióides diminuem a liberação de neurotransmissores das terminações das fibras C, inibem neurônios medulares pós-
  • 22. 22 sinápticos e ativam vias inibitórias descendentes que envolvem serotonina e noradrenalina. 2. Vias de Administração Podem ser administrados por diversas vias: oral, sublingual, venosa, subcutânea e transdérmica. A via espinal deve ser optada quando não existe efetividade na administração por VO. Há ainda a possibilidade da utilização da aplicação periférica local como em bloqueios de plexos e intra-articular. 3. Indicações Os opioides estão indicados em: - Dor pós-operatória e trauma; - Diversas síndromes dolorosas: lombociatalgia, cervicobraquialgia, miofascial, tendinite, bursite, osteoartrite, dor oncológica; - Dor neuropática: síndrome complexa de dor regional (SCDR), neurite traumática, neuralgia do trigêmeo, neuralgia pós-herpética, neuropatia diabética; - Outras: crise de anemia falciforme, cólica nefrética. 4. Efeitos Colaterais Constipação intestinal é o efeito colateral mais frequente decorrente do uso de opioides. Náuseas e vômitos são comuns no início do tratamento por ação em quimiorreceptores no assoalho do quarto ventrículo. Sedação e sonolência também podem estar presentes. Retenção urinária se dá por bloqueio medular. Confusão mental, delirium e alucinações são mais comuns em idosos. Depressão respiratória ocorre por redução da resposta dos centros respiratórios da ponte e do bulbo ao aumento da pCO₂, tendo como primeiro sinal de ocorrência a sedação do paciente. Ela é relativamente mais comum em pacientes idosos ou debilitados que necessitem de altas doses e em administração por via endovenosa, sendo um evento raro na utilização de opióides por VO ou via subcutânea. Além disso, os opióides podem causar dependência com o uso prolongado e, caso ocorra retirada abrupta do medicamento, podem ocorrer sintomas de abstinência. Entretanto, é importante lembrar que esses efeitos não são tão comuns quanto se divulga. Sendo assim, a subutilização dos opióides decorrente do temor dos seus efeitos colaterais deve ser revertida uma vez que esses medicamentos são as melhores opções encontradas no tratamento para dores de forte intensidade. Obs: Meperidina - É um opióide que sofre efeito de primeira passagem pelo fígado, sendo metabolizado em normeperidina ou é hidrolisado a ácido meperidínico. Em decorrência da formação de normeperidina, um metabólito psicomimético, ocorrem efeitos colaterais intensos como alucinação, agitação psicomotora, taquicardia e midríase. Além disso, ela causa depressão miocárdica direta mesmo em pequenas doses e causa dependência psíquica por provocar muita euforia e disforia. Portanto, não deve ser utilizada no tratamento de dor crônica. 5. Morfina A morfina é o opióide mais comumente utilizado. É classificada como opióide potente, hidrofílico com baixa ligação plasmática com a albumina. Além disso, é
  • 23. 23 metabolizada pelo fígado onde é transformada em morfina 3-glicuronídeo e morfina 6- glicuronídeo, o qual possui importante ação analgésica. 6. Vantagens da utilização de opióides É importante destacar que os opióides são muito vantajosos por: - Aliviarem dores intensas e serem efetivos em grande parte das síndromes dolorosas; - Não possuirem dose teto, ou seja, o efeito analgésico é diretamente proporcional à dose administrada dos opióides e não há limite para isso, o que os diferencia do AINE (o limite é a dose que promove os efeitos indesejáveis) - Possuirem possibilidade de reversão dos efeitos por meio da utilização de um opióide antagonista (Naloxona). Antidepressivos As classes principais dos antidepressivos são: antidepressivos tricíclicos, inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS), inibidores da recaptação combinada de serotonina e noradrenalina, noradrenérgicos e serotoninérgicos específicos, inibidores seletivos da recaptação de noradrenalina e inibidores da monoaminoxidase (IMAO). Os antidepressivos tricíclicos são os mais utilizados. Principais representantes das classes de antidepressivos: - Triciclicos: imipramina, clomipramina, amitriptilina, nortriptilina. - ISRS: fluoxetina, sertralina. - IRNS: venlafaxina. - Noradrenérgicos e serotoninérgicos específicos: mirtazapina. - ISRN: bupropiona. 1. Mecanismo de Ação - Bloqueio da recaptação da serotonina, da noradrenalina ou ambas nas terminações nervosas pré-sinápticas; - Aumento da ação GABA (mecanismo inibitório); - Inibição da Liberação de substância-P; - Bloqueio dos receptores NMDA, H1 da histamina e canais de sódio. 2. Efeitos farmacológicos Os antidepressivos produzem efeitos: antidepressivo, analgésico, sedativo, ansiolítico, miorrelaxante, anti-inflamatório e melhoram o ritmo do sono ao diminuir a frequência de despertares e prolongar o sono REM. Atenção! A dose utilizada para analgesia é menor do que a antidepressiva. O efeito analgésico costuma ser independente e mais precoce do que o efeito antidepressivo. 3. Indicações Estão indicados em: - Dor pós-operatória; - Diversas síndromes dolorosas: lombalgia, cervicobraquialgia, fibromialgia, miofascial, cefaleia, dor oncológica;
  • 24. 24 - Dor neuropática: síndrome complexa de dor regional, neurite traumática, neuralgia pós-herpética, neuropatia diabética. 4. Efeitos Colaterais - Anticolinérgicos: boca seca, visão turva, constipação, retenção urinária, tontura, sonolência, e alteração da memória. - Cardiovasculares: hipotensão postural (pelo bloqueio de receptores alfa-1 adrenérgicos); alteração na condução e arritmia cardíaca (principalmente pelo uso dos antidepressivos tricíclicos). Anticonvulsivantes São divididos em anticonvulsivantes de: - 1ª Geração: Fenitoína e Fenobarbital; - 2ª Geração: Carbamazepina* e Valproato de Sódio, - 3ª Geração: Oxcarbazepina, Lamotrigina, Gabapentina, Topiramato e Tiapentina. *É considerada um anticonvulsivante de primeira linha no tratamento da dor neuropática. 1. Mecanismo de Ação - Bloqueio de canais de sódio (Na), cálcio (Ca) e potássio (K); - Potencialização da ação inibitória do acido gama-aminobutírico (GABA); - Diminuição do glutamato (neurotransmissor excitatório do SNC). 2. Indicações - Dor neuropática: síndrome complexa de dor regional, neuralgia do trigêmeo, neuralgia pós-herpética, neuralgia do glossofaríngeo, neuropatia diabética, dor pós- AVC; - Outras: fibromialgia, enxaqueca. 3. Efeitos Colaterais Os principais efeitos colaterais dos anticonvulsivantes são sonolência e tontura. Outros efeitos podem ocorrer de acordo com o medicamento utilizado, como: ataxia; diplopia; nistagmo; disartria; alterações cutâneas (exantema, prurido, erupções); alteração da função hepática; entre outros. Relaxantes musculares 1. Mecanismo de Ação Possuem ação central por meio do: - Aumento da estimulação de neurônios gabaérgicos (na região supra-espinal), inibindo os impulsos facilitadores tônicos que atuam nos neurônios motores da medula; - Deprimem o reflexo polissináptico da medula espinal.
  • 25. 25 Figura 3. Mecanismo de ação dos relaxantes musculares 2. Indicações São indicados geralmente para dor aguda, sendo associados a outros medicamentos nesse caso. Mas podem ser utilizados também para dor crônica, como: lombalgias, cervicalgias, síndrome miofascial e fibromialgia. 3. Efeitos Colaterais OS efeitos colaterais principais são: tontura, astenia e fadiga. Efeitos como sonolência, cefaleia, náuseas e vômitos, visão turva, boca seca, constipação, retenção urinária e alteração na função hepática também podem ser observados. Neurolépticos Os principais representantes dos neurolépticos são: clorpromazina, haloperidol e clozapina. 1. Mecanismo de Ação - Atuam nos receptores serotoninérgicos; bloqueiam receptores adrenérgicos, colinérgicos e histaminérgicos; bloqueiam receptores dopaminérgicos pós-sinápticos; - Atuam na ativação da modulação da dor. 2. Efeitos Farmacológicos Os neurolépticos possuem efeitos: sedativo, ansiolítico e antiemético. 3. Indicações Utilizados quando não há controle da dor com outros analgésicos e são indicados, sobretudo, para dor neuropática. 4. Efeitos Colaterais Os principais efeitos colaterais são: - Sintomas extrapiramidais (distonia, agitação, discinesia, parkinsonismo); - Aumento na pressão ocular, constipação e retenção urinária; - Hipotensão, hipotermia.
  • 26. 26 Ansiolíticos/ benzodiazepínicos 1. Mecanismo de Ação Principal: estimulação dos neurônios gabaérgicos (inibitórios). 2. Efeitos Farmacológicos Os benzodiazepínicos possuem efeitos: ansiolítico, anticonvulsivante e miorrelaxante. 3. Indicações Indicados no alívio da dor neuropática, espasmos musculares relacionados à dor e tratamento da ansiedade. 4. Efeitos Colaterais Os efeitos colaterais principais são: sedação, sonolência, déficit de atenção e memória. Além disso, pode ocorrer: agitação, irritação, confusão mental, alterações comportamentais, cefaleia, ataxia e visão dupla. Corticoesteróides 1. Mecanismo de Ação / Efeitos Farmacológicos - Estabilização da membrana neural e redução o nível de mediadores que estimulam os nociceptores, possuindo ação antiinflamatória. 2. Vias de Administração Os corticoesteróides podem ser administrados por via oral, intramuscular, venosa, peridural e intra-articular. 3. Indicações - Neuropatias compressivas*: dor causada pela compressão de raízes nervosas e medula espinal, dor de hérnia de disco, síndrome do túnel do carpo; - Tendinite, epicondilite, bursite e osteoartrite - Dor oncológica: dor por distensão visceral (ex: distensão da capsula do fígado por metástase), lesão óssea por tumor e obstrução intestinal maligna. *Os corticoesteróides são medicamentos de primeira escolha para neuropatias compressivas já que atuam na melhora da dor neural e da compressão medular, reduzindo o edema em tecidos nervosos e tumorais. 4. Efeitos Colaterais Os efeitos colaterais devido ao uso de CEs podem ser precoces (até 2 semanas após o inicio do tratamento), dos quais podemos destacar: hiperglicemia, hipertensão arterial, imunossupressão e possíveis alterações comportamentais. Mas ocorrem principalmente pela administração crônica desses medicamentos, como: ganho de peso, síndrome de Cushing, úlcera péptica, insônia, osteoporose e necrose asséptica de cabeça de fêmur.
  • 27. 27 3.3. Modalidades físicas no tratamento da dor As medidas físicas para o tratamento da dor englobam o uso de calor superficial e profundo e de resfriamento com o objetivo de atingir a analgesia e relaxamento muscular. - Medidas por Calor Superficial: parafina, compressas quentes, laser, radiação infra-vermelha, hidrotermoterapia. - Medidas por Calor Profundo: diatermia por ondas curtas, diatermia por ultra- som, diatermia por micro-ondas. - Medidas por Resfriamento: crioterapia. - Cinesioterapia e Reabilitação Postural Global (RPG). 3.4. Tratamentos invasivos Esse tipo de tratamento é indicado somente quando os métodos não invasivos são ineficazes ou pouco eficazes ou quando ocorre intolerância ou toxicidade inaceitáveis. É importante destacar a existência desses métodos de tratamento, entretanto, não iremos caracterizá-los com detalhes. Analgesias regionais- Bloqueios Podem ser realizadas por administração de: - Anestésicos locais por via EV: Lidocaína por via venosa – indicada principalmente para dor neuropática e diversas síndromes dolorosas (fibromialgia, lombociatalgia etc.), queimaduras; - Injeções em pontos gatilho: injeção do medicamento em pontos dolorosos identificados à palpação. Está indicado na síndrome miofascial; - Opióides espinais: indicado na analgesia intra e pós-operatória, analgesia de parto, queimaduras, dor neuropática; - Bloqueio simpático: podem ser realizados bloqueios do gânglio estrelado, bloqueio simpático lombar, bloqueio do plexo celíaco, bloqueio do plexo hipogástrico. - Infiltrações intra-articulares: indicada para osteoartrite, artrite reumatoide, bursite e tendinite. Em geral os medicamentos utilizados são: corticosteroides, anestésicos locais, opióides ou clonidina. 3.5. Procedimentos cirúrgicos Os procedimentos cirúrgicos são medidas raras e que devem ser indicadas apenas quando a dor é refratária a todos os outros procedimentos clínicos. Os métodos que podem ser realizados no tratamento da dor crônica são principalmente os procedimentos neuroablativos (rizotomias, meilotomias, entre outros) e procedimentos de neuroestimulação (estimulação elétrica do SNC ou do SNP). 3.6. Questões 1. Quais são os principais mecanismos de ação dos anti-inflamatórios não-esteroides (AINE)? 2. Quais são os principais efeitos colaterais do AINE? 3. Quais são as principais vantagens na utilização de Opióides? 4. Porque a Meperidina (opióide) não deve ser utilizada no tratamento da dor?
  • 28. 28 3.7. Literatura consultada e sugerida Rioko Kimiko Sakata, Adriana Machado Issy. Guias de Medicina Ambulatorial e Hospitalar da UNIFESP-EPM – Dor, 2ª Edição. Fauzia F. Naime. Manual de Tratamento da Dor, 1ª Edição.
  • 29. 29 4. Dor no câncer: características e controle 4.1. Introdução 4.2. Etiopatogenia 4.3. Avaliação do Paciente 4.4. Tratamento 4.5. Questões 4.6. Literatura consultada e sugerida 4.1.Introdução A dor é um sintoma frequente nas neoplasias malignas. Ela acarreta grande estresse e sofrimento aos doentes e àqueles que os rodeiam. Os sintomas álgicos somam-se às incapacidades primariamente relacionadas à neoplasia e ao seu tratamento e podem ser causa de insônia, anorexia, confinamento ao leito, perda do convívio social e redução das atividades profissionais e de lazer. No Brasil e no Estado de São Paulo, o câncer é a terceira causa mais frequente de morte geral e a segunda entre as mulheres. Nos próximos 30 anos, o aumento do número de casos de câncer será de 20% nos países desenvolvidos e de 100% nos países em desenvolvimento e atualmente mais da metade dos 9 milhões de casos novos de câncer ocorre nos países em desenvolvimento. Agravando este quadro, a falta de acesso à informação pela população e a carência de recursos na área da saúde resultam em retardo no diagnóstico da neoplasia. Assim, em cerca de 80% das vezes o processo patológico só é identificado em fases muito avançadas, quando a doença é incurável e a dor muito frequente. A dor relacionada ao câncer acomete cerca de 50% dos doentes em todos os estágios da doença e em torno de 70% dos indivíduos com doença avançada. A experiência dolorosa resulta da interpretação do aspecto físico-químico do estímulo nocivo e da interação deste com características individuais como o humor, o significado simbólico atribuído ao fenômeno sensitivo e os aspectos culturais e afetivos dos indivíduos. A dor é sempre subjetiva e cada indivíduo aprende a utilizar este termo a partir de suas experiências traumáticas. A necessidade de se conhecer e comparar quadros dolorosos entre populações diferentes e de quantificar a resposta às diversas terapias despertou, nos pesquisadores, o interesse em desenvolver metodologia para a avaliação de dor passíveis de comparação e que possibilitassem o desenvolvimento de uma linguagem universal sobre a experiência dolorosa. Os métodos para a avaliação da dor crônica aplicáveis a adultos baseiam-se na descrição verbal. 4.2.Etiopatogenia A avaliação da dor visa a aferir as qualidades do sintoma álgico, duração e impacto na esfera psico-afetiva e na funcionalidade, além de determinar sua intensidade. Tem a finalidade de auxiliar no diagnóstico, ajudar na escolha da terapia e quantificar a efetividade da terapêutica implementada. A dor do câncer pode ser devida ao tumor primário ou suas metástases, à terapia anticancerosa e aos métodos de investigação; em alguns pacientes pode, também, não estar relacionada à neoplasia. O sofrimento dos doentes é produto da
  • 30. 30 interação da percepção aversiva (dor) com a incapacidade física, isolamento social e familiar, preocupações financeiras e medo da mutilação e da morte. Como um fenômeno individual e subjetivo envolvendo aspectos diversos e complexos, a dor no câncer deve ser avaliada e tratada em seus vários componentes. Em geral, as diversas síndromes dolorosas relacionadas ao câncer são resultado da extensão do tumor para ossos, nervos ou vísceras em 80% dos casos. A invasão óssea é considerada a causa mais comum de dor, uma vez que metástases ósseas acometem cerca de 30 a 70% de todos os pacientes com câncer. As vértebras são o sítio mais frequentemente acometido por metástase, usualmente resultado da disseminação tumoral por via hematogênica. Invasões de estruturas nervosas pelo tumor são comumente observadas em pacientes com câncer. Alguns tumores de cabeça e pescoço podem comprimir o plexo cervical, resultando em dor retro auricular, no ombro e mandíbula. Tumores de mama e pulmão podem invadir o plexo braquial, por extensão direta ou por aumento dos linfonodos, resultando em dor de difícil controle. A infiltração da pleura parietal e da parede torácica, por extensão direta do tumor, pode resultar em hiperalgesia cutânea. As estruturas viscerais, quando acometidas pela neoplasia, podem apresentar síndromes características. Exemplos são o tumor de esôfago, que não raramente resulta em dor retroesternal, irradiada para as costas, ou para a região retro escapular, e a distensão da cápsula de Glisson do fígado, que pode ocasionar dor abdominal, que também pode ser referida como dor no pescoço, ombro e escápula, usualmente à direita. 4.3. Avaliação do Paciente A avaliação clinica deve ser baseada na história do paciente e em exames complementares, quando necessário. A dor deve ser bem caracterizada apontando localização, irradiação, qualidade/caráter, intensidade, temporalidade, fatores que melhoram e pioram a dor e fatores acompanhantes. A diferenciação entre dor localizada e generalizada é muito importante já que pode ditar o diagnóstico e a terapêutica. A intensidade da dor deve ser questionada ao paciente e pede-se que ele a classifique na escala de 0 a 10 (0 é ausência e 10 é a pior dor possível), já exposta no capítulo “Avaliação do paciente com dor”. A irradiação da dor tem importância diagnóstica, como no exemplo do paciente com dor abdominal em barra com irradiação para o dorso, que é altamente sugestivo de pancreatite e observado em alguns pacientes com tumor de pâncreas. Ainda, alguns pacientes referem episódios de dor intensa ou “crises de dor”, de inicio súbito e sobrepostos ao quadro álgico basal. Tradicionalmente, a presença de dor episódica sinaliza uma síndrome de difícil tratamento e nesses casos é fundamental a prescrição de opióides adicionais para as “crises de dor”. Por fim, quanto à classificação da dor, a maioria dos pacientes com câncer apresenta síndromes dolorosas mistas onde a distinção entre nocicepção somática, visceral e dor neuropática é dificultada. 4.4. Tratamento A Organização Mundial da Saúde (OMS), com o objetivo de propor diretrizes para o controle da dor relacionada ao câncer, reuniu especialistas que elaboraram o "Guia para Tratamento da Dor no Câncer". A terapêutica preferencial para o alívio da
  • 31. 31 dor deve ser o tratamento do câncer em si, sempre que possível. O uso de medicamentos analgésicos, medidas de apoio psicoterápicas e fisioterápicas, bloqueios nervosos, secção de vias sensitivas e estimulação das vias supressoras da nocicepção são complementares às medidas anticancerosas. A utilização de medicamentos analgésicos e adjuvantes é a terapêutica mais frequente e baseia-se em um algoritmo publicado pela OMS em 1986, a escada analgésica, que serve de modelo até os dias de hoje para o tratamento da dor oncológica e que foi estendido para outros tipos de analgesia. Antes de apresentá-la, saiba que há 5 princípios básicos a serem respeitados na analgesia da dor do paciente com câncer: - a medicação deve ser oferecida preferencialmente pela via oral; - é fundamental respeitar o intervalo de administração de acordo com a meia vida de cada droga. O medicamento deve ser prescrito de forma regular e doses adicionais, caso necessário. - deve haver uma avaliação continua e individualizada para cada paciente durante todo o tratamento, antecipando os efeitos adversos e corrigindo as doses e, eventualmente, trocando o medicamento no caso de falha. - respeitar a escada analgésica proposta pela OMS. - é fundamental a orientação ao paciente e aos cuidadores e a avaliação das condições psicossociais dos dois, o que nos ajuda a selecionar um esquema terapêutico mais adequado e a enxergar possíveis limitações ao esquema proposto. Escada analgésica - Degrau 1 : Pacientes que ainda não estão sob tratamento analgésico e estão com dor leve a moderada devem ser tratados com drogas antiinflamatórias, entre elas o paracetamol e anti-inflamatórios não hormonais (AINES). - Degrau 2: Pacientes com dor moderada, e já em uso de AINE, devem receber também tratamento com opióides fracos como tramadol ou codeína. - Degrau 3: Esse degrau é reservado para os pacientes que não obtiveram controle da dor com o uso de opióides fracos e AINEs. Assim, substituem-se os opióides fracos por opióides fortes como a morfina, metadona, oxicodona ou fentanil. A dose máxima dessas medicações é aquela que consegue o melhor balanço entre analgesia e efeitos colaterais. 4.5. Questões 1. Como deve ser a avaliação do paciente com dor? 2. Quais os cinco princípios básicos a serem respeitados na analgesia da dor? 3. Explique sucintamente a escada analgésica aceita pela OMS. 4.6. Literatura consultada e sugerida Bonica, J.J. Treatment of cancer pain: current status and future needs. In: Fields, H.L.; Dubner R.; Cervero, F. Advances in pain research and therapy: proceeding of the Fourth World Congress on Pain, New York, Raven, 9:.589-615, 1985. Cleeland, C.S. et al. Pain and its treatment in outpatients with metastatic cancer, N Engl J Med,.330 (9):, 592-6, 1994.
  • 32. 32 Daut, R.L.; Cleeland, C.S. The prevalence and severity of cancer pain. Cancer, 50 (1): 1913-8, 1982. Twycross, R.G., Fairfield, S. Pain in far-advanced cancer. Pain 14 (3): 303-10, 1982. Foley, K.M. The treatment of cancer pain. N England J Med, 313 (2): 84-95, 1985. Organización Mundial de la Salud. Alivio del dolor en el cáncer. Ginebra, 1987 Paredes, H. et al. - Tratamiento farmacologico en tres pasos del dolor en cancer: experiencia preleiminar en Chile, Rev Med Chil, 116 (5): p.433-8, 1988. Ventafrida, V. et al. A validation study of the WHO method for cancer pain relief. Cancer, 59 (4): 850-6, 1987. Cleeland, C.S. The impact of pain on the patient with cancer. Cancer 54 (11): 2635-41, 1984.
  • 33. 33 5.Dor aguda pós-operatória 5.1. Introdução 5.2. Definição de DPO 5.3. Fisiopatologia da DPO 5.4. Efeitos e complicações sistêmicas da DPO 5.5. Tratamento da DPO 5.6. Questões 5.7. Literatura consultada e sugerida 5.1. Introdução A dor aguda pós-operatória (DPO) aparece depois de 80% das cirurgias. No entanto, não é devidamente remediada em mais da metade dos casos, por conta de falhas na avaliação da dor e no conhecimento de métodos analgésicos pelos profissionais de saúde. Além do óbvio sofrimento desnecessário, a dor pós-operatória pode diminuir a velocidade do processo de recuperação e cura, aumentar o tempo e os custos de internação e a chance de aparecimento de dores crônicas ligadas à cirurgia. Não bastando isso, você verá que há uma relação forte entre DPO e complicações sistêmicas graves, incapacitantes e às vezes fatais, como infarto agudo do miocárdio, trombose venosa profunda (TVP), tromboembolismo pulmonar (TEP), depressão, ansiedade, pneumonia, íleo paralítico etc. Tem-se buscado minimizar esses danos e a DPO hoje é tópico que faz parte da avaliação anestésica pós-operatória e que deve estar indicado no prontuário de todos os pacientes submetidos a cirurgias. A ideia deste capítulo é primeiro rever brevemente os mecanismos fisiopatológicos da dor, com foco na dor aguda no pós-operatório. Depois, trazer noções básicas dos efeitos e complicações sistêmicas da DPO e, por fim, de como tratá-la. Não se atenham a detalhes, o que é importante saber estará destacado. 5.2. Definição de DPO Dor aguda pós-operatória é uma dor temporária (geralmente de curta duração) relacionada a um tipo de lesão definida (característica para cada cirurgia) e que se resolve com o progresso da recuperação pós-operatória. Na maioria das vezes, a DPO responde bem ao uso de analgésicos. 5.3. Fisiopatologia da DPO A dor aguda pós-operatória é, de maneira geral, uma dor nociceptiva. Revisando: o estímulo nocivo (como o corte de um bisturi) provoca dano tecidual, que, somado ao acúmulo de substâncias pró-inflamatórias, sensibilizam as terminações nervosas livres (receptores nociceptivos) das fibras nociceptivas A delta (rápida) e C (lenta). A informação dolorosa se dirige ao corno posterior da medula e, ao ascender pelos tratos paleo e neoespinotalâmicos, chega ao córtex cerebral, sistema límbico e outras estruturas do sistema nervoso central. Além do mecanismo nociceptivo, o ato cirúrgico pode levar a eventuais lesões/alterações neuropáticas, que afetam diretamente o tecido nervoso (imagine um bisturi cortando um nervo). A expressão da dor é distinta, bem como seu tratamento.
  • 34. 34 Para tornar isso mais claro, a tabela a seguir (Tab.1) trás exemplos clínicos de situações que levam a dores nociceptivas e neuropáticas. Foque nas dores somática e visceral, bem mais comuns e lembre-se que elas são só subdivisões regionais da dor nociceptiva. Por ora, esqueça o item 5 da tabela. Tab.1 - Dores nociceptiva e neuropática Dor Somática Dor Visceral Dor Neuropática 1) Localização Localizada Generalizada Específica ou irradiante 2) Característica Alfinetada, facada, corte Latejante, compressão Queimadura, coceira, formigamento, choque elétrico, lancinante 3)Mecanismo da Dor Fibra A-delta (inervação periférica) Fibra C (inervação profunda) Dermatomal (periférica) ou não-dermatomal (central) 4)Exemplos clínicos Laceração superficial Queimadura superficial Injeção intramuscular Acesso venoso Abrasão extensa Lesão de periósteo, articular e muscular Cólica e espasmo muscular Apendicite Litíase renal Neuralgia trigeminal Neuralgia pós-trauma Amputação de membro 5)Tratamentos mais efetivos Gelo Estimulação tátil AINEs Opióides Anestésicos locais AINEs Opióides Anestesia local intraespinal Drogas antiespasmódicas Anticonvulsivantes Antidepressivos tricíclicos Bloqueios nervosos Fonte: http://www.paincommunitycentre.org/article/acute-postoperative-pain- definition-acute-pain 5.4. Efeitos e complicações sistêmicas da DPO Os efeitos da dor aguda pós-operatória não se restringem à sensação dolorosa. As respostas autonômica e endócrino-metabólica do corpo à DPO são também muito importantes por conta das complicações que podem gerar. A dor é um sinal de perigo para o corpo e, por isso, aumenta a atividade do sistema nervoso simpático (SNS), levando ao aumento da síntese de catecolaminas (adrenalina e noradrenalina) e demais hormônios catabolizantes, como o cortisol (hormônio do estresse) e o glucagon. A liberação intensa e prolongada destas substâncias produz alterações em diversos sistemas do nosso organismo, colocadas abaixo em esquemas para maior clareza. Esses efeitos podem ser muito graves, tornando o tratamento da DPO quase tão importante quanto a cirurgia em si, por afetar o prognóstico do paciente de maneira impactante.
  • 35. 35 A.Efeitos cardiocirculatórios - Ativação do SNS  taquicardia  vasoconstrição periférica ( da PA, portanto do RV)  do trabalho cardíaco  do consumo de O2 pelo miocárdio, com mesma oferta  isquemia do miocárdio (PA- pressão arterial; RV- retorno venoso) B. Efeitos gastrointestinais - Direcionamento do sangue para órgãos nobres (cérebro, coração e pulmões), em detrimento de vísceras e pele: Motilidade gastro-intestinal  náusea e vômitos  íleo paralítico Tempo de cicatrização em vísceras e pele C. Efeitos respiratórios -Ativação do SNS  taquipneia hipocapnia inicial e alcalose respiratória  fadiga diafragmática -Fadiga diafragmática + possível dor ventilatório-dependente   hipoventilação + hipóxia + hipercapnia subsequente  atelectasia  infecções p pulmonares (hipo/hipercapnia- alterações da PaCO2; hipóxia- diminuição da PaO2) D. Efeitos endócrino-metabólicos Ativação do SNC  catecolaminas, cortisol, glucagon  alterações ana/catabólicas  da glicemia E. Efeitos urinários Ativação do SNC  tônus esfíncter vesical  retenção urinária F. Hemostasia A soma das complicações acima e as dores referentes a algumas cirurgias (principalmente ortopédicas) diminuem a mobilidade do paciente e aumentam seu tempo acamado: Imobilidade  estase sanguínea  TVP  TEP G. Efeitos psicológicos complicações + tempo de internação + dores não tratadas  ansiedade d  depressão 5.5. Tratamento da DPO O diagnóstico e avaliação da dor aguda pós-operatória pouco diferem do que foi exposto no capítulo “Avaliação do paciente com dor”, portanto iremos direto para o tratamento, que será uma complementação do capítulo “Tratamento da dor”. Antes de expor as múltiplas classes e técnicas de administração de analgésicos, deve-se falar dos esquemas de analgesia. Existe o esquema em horário fixo, o esquema SN (se necessário) e o esquema misto. Vários estudos já apontaram o esquema misto (fixo + SN) como o melhor dos três. Ele indica a prescrição de analgésicos em horários pré-determinados, evitando grandes flutuações nos níveis plasmáticos dos medicamentos e prevenindo picos de dor, e ainda dá a possibilidade
  • 36. 36 de analgesia suplementar. Assim, evita-se o atraso no reconhecimento de boa parte das dores, que já estarão remediadas; tratam-se as dores leves, que não forçariam o paciente a pedir analgesia; e há certa flexibilidade no tratamento, porém, sem margem para imprudências. Outro conceito importante é o do tratamento multimodal da dor. Ele consiste em associar mais de uma forma de administração e/ou classe de medicamento para analgesia. Desse modo, somam-se os benefícios de cada estratégia terapêutica e diminuem-se os riscos associados a grandes doses de fármacos sem que haja perda da efetividade do tratamento (conceito de janela terapêutica- therapeutic range) (Fig.1). Fig. 1. Janela terapêutica Você já viu que há uma infinidade de possibilidades no mundo da analgesia. A intenção aqui não é esmiuçar todas elas, e sim ajudá-lo a entrar nesta selva, mais especificamente na área de DPO. O importante aqui não é decorar o nome dos medicamentos de cada classe, mas ter uma noção da ampla variedade de opções disponíveis e da importância em se associarem classes diferentes de medicamentos no tratamento da DPO. Como último conselho, algumas características te guiarão no gerenciamento dessas dores: tipo da cirurgia e características, intensidade (leve, moderada e grave) e local da dor. Agora é a hora de voltar ao item 5 da tabela 1, para depois ler os itens abaixo. Anti-inflamatórios não-esteroidais (AINEs) Dipirona, paracetamol, nimesulida, diclofenaco sódico e potássico, ibuprofeno etc. Os AINEs têm características anti-inflamatórias, analgésicas e anti-piréticas, que variam em potência e especificidade em cada um dos medicamentos, mas não é intenção deste capítulo mostrar as indicações de cada um dos exemplos acima. Podem ser usados por diversas vias, sendo mais comuns a oral e a venosa. Eles são os medicamentos básicos no tratamento da dor aguda leve e moderada de maneira geral e serão utilizados na DPO sempre que não houver contraindicação. São os mais usados isoladamente ou em associação a outros fármacos, por aliarem efetividade a poucos efeitos colaterais, como já visto no capítulo anterior. Opioides São ótimos nas dores fortes e podem ser utilizados associados aos AINEs acima mencionados e a bloqueios regionais em casos de dores bastante intensas. Morfina e
  • 37. 37 fentanil são bastante empregados pela via peridural no pós-operatório de cirurgias ortopédicas, vasculares, toracotomias e laparotomias extensas. Esta modalidade é mais eficiente que a via oral na DPO e será melhor descrita adiante. Analgesia regional É um conjunto de vias de administração, não uma só via ou classe medicamentosa. Dentre as possibilidades há: - Infiltração da incisão com anestésicos locais; - Uso de corticoide e morfina em intervenções intra-articulares; - Bloqueios de plexos e nervos periféricos, como o bloqueio de plexo braquial em cirurgias de ombro, cotovelo e braço; - Anestesia peridural e subaracnóidea Analgesia peridural Geralmente são utilizados anestésicos locais (bupi e ropivacaína) em associação com opióides (morfina e fentanil) e aproveita-se o cateter peridural utilizado na anestesia cirúrgica. Os anestésicos locais por via peridural bloqueiam a aferência sensitiva e o sistema simpático, o que evita a dor e seus efeitos autonômicos deletérios. Eles ainda causam vasodilatação, com aumento do fluxo sanguíneo das regiões pretendidas e melhora da coagulação e cicatrização. A analgesia peridural é melhor que por via oral na DPO, pois não há acréscimo de riscos além dos da própria anestesia e sua subutilização é decorrente da falta de conhecimento pelos profissionais de saúde. Analgesia controlada pelo paciente (ACP) A ACP é boa, porque consegue manter constante o nível plasmático do medicamento pelo fornecimento de infusão contínua de medicamento ou infusão programada para horários determinados. Além disso, sua principal vantagem é possibilitar ao paciente acionar mecanismo de liberação de analgesia suplementar quando necessário, o que acelera o tempo entre o aparecimento da dor e a analgesia. Esse tempo parece desprezível, mas pode levar de alguns minutos a horas, como mostrado no exemplo abaixo. A liberação dos medicamentos respeita limites de concentração plasmática, tempo de começo de ação e duração do efeito do medicamento, então o paciente não pode ficar apertando seu botão de morfina indefinidamente. A maior desvantagem da ACP é o preço alto. Exemplo prático: Pense nas enfermarias do HSP. O paciente grita pela enfermeira e fica esperando alguém vir. O enfermeiro ou auxiliar de enfermagem termina o que está fazendo e vai até o leito do paciente, que relata o que está acontecendo. O enfermeiro leva a queixa ao médico, que prescreve o medicamento depois de acabar o que está fazendo. A enfermeira prepara a medicação e aplica-a, para então haver o tempo de absorção do fármaco e só depois desse processo todo, o alívio da dor. Analgesia preemptiva É um nome bonito que significa analgesia profilática. Sua ideia é começar a analgesia antes da cirurgia, com a intenção de diminuir a necessidade, potência e
  • 38. 38 tempo de medicação no pós-operatório. Ainda há poucos estudos sobre o tema, mas parece promissora. 5.6. Questões 1) Por que é importante reconhecer e tratar precocemente a DPO? 2) Qual a relação entre DPO e infarto agudo do miocárdio, íleo paralítico, pneumonia hospitalar e eventos tromboembólicos? Qual a fisiopatologia de cada um desses desfecho desagradáveis? 3) Explique o que é esquema misto de analgesia e tratamento multimodal da dor. 4) Por que o uso de opioides por via peridural é interessante para dores pós-cirúrgicas intensas? 5.7. Literatura consultada e sugerida - Miriam C. Bellini Gazi, EPM/UNIFESP. Apresentação de aula “Dor Pós-operatória”. - Hazem Adel Ashmawi, FMUSP. Apresentação de aula “Dor Aguda Pós-Operatória”. Disponível em <http://www.anestesiologiausp.com.br/wp-content/uploads/extensao- universitaria/iii-programa-de-educacao-continuada-em-fisiopatologia-e-terapeutica- da-dor-2013/aula-de-dor-p%C3%B3s-operat%C3%B3ria_31_07_2013.pdf>-PIMENTA, CAM et al. Controle da dor no pós-operatório. Rev Esc Enf USP, v. 35, n. 2, p. 180-3, jun. 2001. Disponível em <http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v35n2/v35n2a12.pdf> - BASSANEZI, Betina Sílvia Beozzo; OLIVEIRA FILHO, Antonio Gonçalves de. Analgesia pós-operatória. Rev. Col. Bras. Cir., Rio de Janeiro, v. 33, n. 2, Apr. 2006. Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100- 69912006000200012&lng=en&nrm=iso>. - Mayo clinic. Artigo “Pain medications after surgery”. Disponível em <http://www.mayoclinic.org/pain-medications/art-20046452?pg=1> - Cardiff University Pain Community Centre. Artigos: “Acute postoperative pain: Definition of Acute Pain” e “Acute postoperative pain: General Overview”. Disponíveis em <http://www.paincommunitycentre.org/article/acute-postoperative-pain- definition-acute-pain> e <http://www.paincommunitycentre.org/article/acute- postoperative-pain-general-overview> - International Association for the Study of Pain (IASP). Cartilhas de divulgação do Ano Mundial Contra a Dor Aguda “Mecanismos de Dor Aguda” e “Dor Aguda e Cirurgia”. Disponíveis em <http://www.iasp- pain.org/Advocacy/Content.aspx?ItemNumber=1097>
  • 39. 39 6. Anestesia - conceitos 6.1. Conceitos gerais 6.1.1. O que é anestesia? 6.1.2. Tipos de anestesia 6.1.3. Técnicas anestésicas 6.2. Drogas anestésicas 6.2.1. Agentes inalatórios 6.2.2. Anestésicos intravenosos 6.2.3. Anestésicos locais 6.2.4. Bloqueadores neuromusculares 6.3. Questões 6.4. Literatura consultada e sugerida 6.1. Conceitos gerais 6.1.1. O que é anestesia? A anestesia é considerada um processo farmacológico reversível de bloqueio completo da dor e/ou consciência com o objetivo de realizar um procedimento. 6.1.2. Tipos de anestesia Alguns autores dividem as anestesias em dois grupos: a anestesia geral e a anestesia locorregional. A anestesia geral possui um plano anestésico que visa: 1. Analgesia, que busca o bloqueio da dor e dos reflexos autonômicos. 2. Hipnose e amnésia, para bloqueio da consciência. 3. Bloqueio neuromuscular, para realizar o relaxamento muscular e como consequência inibir os movimentos. Já a anestesia locorregional tem como função atuar na perda da sensação em Anestesia: Perda de dor e/ou consciência, como quando um anestésico é administrado antes da cirurgia do procedimento. Sedação: É o ato que envolve um amplo espectro de condições desde um simples estado de cooperação, tranquilidade e vigília, com orientação temporoespacial preservada, até estados de depressão das respostas aos comandos, podendo ou não incluir a hipnose. Analgesia: Estado em que os estímulos dolorosos são percebidos, mas não são entendidos como dor, normalmente, seguidos de sedação sem que haja perda da consciência.
  • 40. 40 uma determinada região do corpo, e o paciente pode estar consciente ou apenas sedado durante o procedimento. Diferentemente da anestesia geral, visa obrigatoriamente o bloqueio da dor e dos reflexos autonômicos, todavia não é necessário obrigatoriamente o bloqueio da consciência ou do relaxamento muscular, apesar de serem positivos para os procedimentos. 6.1.3. Técnicas anestésicas A anestesia é divida em etapas para melhor manejo do paciente durante os procedimentos. As fases são resumidas na tabela abaixo: Tabela 1. Fases da assistência anestésica Quadro 1. Exemplo de um plano de anestesia geral Fonte: Bases da Anestesia Fonte: Bases da Anestesia Efeitos desejados da anestesia: HIPNOSE AMNÉSIA ANALGESIA IMOBILIDADE
  • 41. 41 6.2. Drogas anestésicas 6.2.1. Agentes inalatórios (AI) Os anestésicos inalatórios mais utilizados na anestesia atual são os líquidos voláteis (halotano, enflurano, isoflurano, desflurano e sevoflurano) e apenas um gás, o óxido nitroso. Apesar das diferenças (especialmente farmacocinéticas) entre esses agentes, existem algumas características universais desses compostos, como a produção de imobilidade e efeitos anestésicos. A imobilidade ocorre majoritariamente pela ação do AI na medula espinhal. Esse efeito é medido pela concentração alveolar mínima (CAM)* para suprimir o movimento em uma incisão cirúrgica em 50% dos pacientes. Efeitos amnésicos e depressão do sistema nervoso também podem ser observados. 6.2.2. Anestésicos intravenosos (AIV) Anestésicos não-opioides intravenosos são utilizados em larga escala para indução rápida da anestesia ou garantir a sedação durante os cuidados anestésicos monitorados para pacientes em unidades de terapia intensiva. Os utilizados para indução de anestesia geral são os AVI lipofílicos. Principais agentes intravenosos Propofol: amplamente utilizado, leva a uma diminuição a pressão arterial, tem atividade antiemética, é depressor respiratório, reduz os reflexos respiratórios superiores, entre outras características gerais. Tiopental: é um barbitúrico utilizado na indução da anestesia, produzindo depressão dose-dependente do sistema nervoso central (afeta fluxo sanguíneo cerebral e a taxa metabólica cerebral), vasodilatação periférica e depressão respiratória. Não tem propriedades analgésicas. Midazolan: é um benzodiazepínico cuja ação pode ser rapidamente interrompida pela administração do antagonista seletivo Flumazenil. Espera-se que tenha efeito hipnótico e de amnésia anterógrada. Etomidato: efeitos hipnóticos não analgésicos. Bom para infusão contínua, mas com efeitos colaterais endócrinos. Não é muito utilizado. Fentanil: é um opioide**, e como os fármacos desta classe, é ótimo para a analgesia. Também suprime o reflexo da tosse, mas apresenta marcadamente a depressão respiratória como Efeito colateral principal (frequência respiratória e volume corrente diminuem progressivamente e se relacionam diretamente com a dose administrada). **Outros opioides: morfina, sulfentanil, alfentanil, rimefentanil Fique esperto: injeção intra-arterial acidental de barbitúricos resulta em dor intensa e vasoconstrição, podendo levar à gangrena.
  • 42. 42 6.2.3. Anestésicos locais Os efeitos adversos dos anestésicos locais são raros, mas quando aparecem decorrem da absorção sistêmica. Dentre eles, pode haver toxicidade tecidual local, reações alérgicas e efeitos nos sistemas nervoso (convulsões, depressão respiratória) e cardiovascular (hipotensão). 6.2.4. Bloqueadores neuromusculares Os fármacos bloqueadores neuromusculares interrompem a transmissão dos impulsos nervosos na junção neuromuscular, produzindo paresia ou paralisia dos músculos esqueléticos. São utilizados para produzir relaxamento muscular para facilitar intubação traqueal e para fornecer condições ideais de trabalho cirúrgico. Não têm efeitos analgésicos ou anestésicos (amnésia, inconsciência). Succinilcolina: não despolarizante, apresenta ação rápida que fornece paralisia do músculo esquelético que facilita intubação orotraqueal, pode ter como efeito colateral arritmia cardíaca, hipercalemia, aumento da pressão intracraniana, mialgia, hipertermia maligna*** e devido a reações adversas importantes nas crianças seu uso é limitado a controle de vias aéreas em emergenciais. ***Hipertermia maligna: é uma doença muscular hereditária, latente, potencialmente grave, de herança autossômica dominante, caracterizada por resposta hipermetabólica após exposição a determinados anestésicos inalatórios ou ao relaxante muscular succinilcolina. Uma crise de hipertermia maligna consiste na liberação maciça de cálcio do músculo esquelético, causando uma contratura Aminoamidas lidocaína - mais comumente utilizado bupivacaína- maior cardiotoxidade do que a lidocaína outros: rilocaína, mepivacaína, ropivacaína Aminoésteres: procaína- possui importante potencial de causar reações de hipersensibilidade tetracaína - utilizada na raquianestesia e possui ação de longa duração, cloprocaína - possui uso limitado Fique esperto: paciente paralisado (bloqueio neuromuscular) inadequadamente anestesiado apresenta grande risco de estar consciente durante a cirurgia.
  • 43. 43 muscular exacerbada, o que provoca aumento de temperatura e um quadro de hipermetabolismo. O tratamento consiste na administração de dantrolene e terapia de suporte. Agentes não despolarizantes são divididos em fármacos de ação longa (pancurônio) intermediária (rocurônio, vecurônio) ou curta (mivacúrio). Possuem diferenças quanto à farmacocinética e a indicação de um ou de outro pode variar dependendo do tipo de paciente. 6.3. Questões 1) Quais são as fases da assistência anestésica? 2) Quais são as principais categorias de drogas utilizadas na anestesia? Cite exemplo de um fármaco de cada categoria. 3) O que é anestesia balanceada? 4) Quais são as principais complicações anestésicas? 6.4. Literatura consultada e sugerida Guia de Medicina Ambulatorial e Hospitalar da UNIFESP – EPM – Anestesiologia e Medicina Intensiva, Editora Manole. Miranda M.L., Bersot C.D.A., Vilela N.R., Sedação, analgesia e bloqueio neuromuscular na unidade de terapia intensiva Miller, Ronald, D., Bases da anestesia [recurso eletronico] pg 19-23, Rio de Janeiro, Elsiever, 2012
  • 44. 44 7. Avaliação pré-anestésica 7.1. Introdução 7.2. O interrogatório complementar sobre os diversos aparelhos 7.3. Antecedentes pessoais 7.4. Exame físico 7.5. Exames complementares 7.6. Medicações pré-anestésicas 7.7. Questões 7.8. Literatura consultada e sugerida 7.1. Introdução A avaliação pré-anestésica consiste em uma ponderação do estado do paciente que visa definir riscos do procedimento anestésico para ele. Deve ser feita antes de toda e qualquer anestesia, mesmo que de urgência. Preferencialmente pelo anestesiologista que realizará o procedimento. Antes de qualquer procedimento deve-se obter o consentimento livre esclarecido do paciente. Deve-se ter em mente que não existe cirurgia pequena para o paciente e a ansiedade dificulta a retenção de informações pelo mesmo, por isso é essencial explicar com clareza e elucidar as dúvidas do paciente, para que não se criem problemas futuros. Em moldes gerais essa avaliação visa responder a duas perguntas simples: I) Está o paciente nas melhores condições possíveis para ser submetido à cirurgia proposta? II) Os riscos de operar o paciente agora são maiores que o de não operar? Caso a resposta seja não para qualquer uma das perguntas, a cirurgia deve ser adiada. A avaliação pré-anestésica dá ao anestesista a chance de criar vínculo com o paciente e colher informações importantes que possam ajudar na escolha do melhor método anestésico. Ela possibilita uma estimativa do risco peri-operatório, que é o período entre um dia antes da cirurgia e 30 dias depois da cirurgia. Busca, portanto, avaliar idade, peso, comorbidades, medicações, hábitos que possam afetar o procedimento considerando sempre o tipo de operação que o paciente será submetido. Para identificar os fatores de risco e quais são as medidas apropriadas para o indivíduo aplica-se um questionário, semelhante a uma anamnese, que sonda a história médica do paciente e realiza-se o exame físico. Interconsultas e exames subsidiários podem ser requisitados. A história é focada no interrogatório sobre os diversos aparelhos, antecedentes pessoais, hábitos e uso de medicações, que estão detalhados logo abaixo. 7.2. O interrogatório complementar sobre os diversos aparelhos São tópicos importantes:
  • 45. 45 a) Sistema cardiovascular: arritmias, dor precordial e palpitações, buscando valvopatias, arritmias e hipertensão arterial sistêmica; b) Sistema respiratório: tosse, dispneia e cianose, buscando doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), doença pulmonar restritiva e apneia; c) Sistema nervoso: cefaleia, convulsão, alteração da consciência, buscando epilepsia e acidente vascular encefálico; d) Sistema urinário: oligúria, polaciúria e disúria, buscando insuficiência renal, desequilíbrio ácido-básico e uremia; e) Sistema digestório: icterícia, constipação, flatulência e melena, buscando condições que retardam o esvaziamento gástrico e hepatopatias; f) Sistema endócrino: tem um espectro grande de apresentação e muitas vezes é suspeitado após exame laboratorial, busca-se diabetes, disfunção adrenal e tireoidiana; g) Sistema hematológico: palidez e sangramentos, buscando anemias, coagulopatias e porfirias. Para as mulheres deve-se tomar cuidado com possível gravidez, visto que muitos fármacos são teratogênicos. 7.3. Antecedentes pessoais Devem-se levar em conta quais os medicamentos que o indivíduo toma e o porquê deles. Existe a possibilidade de interação medicamentosa e alguns fármacos devem ser suspensos por um longo tempo antes da cirurgia como os inibidores de monoamina oxidase (IMAO) utilizados para transtorno bipolar. Importante lembrar que, no caso de medicamentos anti-hipertensivos, NÃO é recomendado suspender seu uso antes da cirurgia, devendo o paciente tomá-lo de modo habitual. Hábitos como tabagismo, etilismo e uso de drogas ilícitas (especialmente opioides) devem ser explorados, principalmente o último item levando em conta o potencial de tolerância, dependência e abstinência que pode provocar. Alergias a medicamentos, antissépticos, esparadrapo e látex devem ser bem estabelecidas. Lembrando que é importante diferenciar alergia a medicamento de efeito colateral do mesmo, uma coisa é o paciente referir que dipirona sódica causa sonolência, outra coisa é ele referir que teve edema de glote. É bom ter em mente que não é obrigação do paciente saber diferenciar essas manifestações. 7.4. Exame físico Avaliam-se os sinais vitais, consciência, dados antropométricos, estado nutricional e tenta-se prever se a via aérea do paciente é de difícil intubação. Portanto o exame físico analisa a altura, peso e constituição física (ex: obeso, tórax em barril e pescoço de touro). Esse item é importante para prever a via aérea difícil e também para cálculo de dose do anestésico, lembrando que muitas drogas são lipofílicas e se distribuem para a gordura, em pessoas obesas essa distribuição pode afetar a anestesia e ajustes de dose devem ser feitos. A previsão da via aérea difícil é importante para prever possíveis dificuldades de intubação. Uma das classificações utilizadas atualmente para essa previsão é a de Mallampati, ela é realizada com o paciente em posição sentada, boca totalmente aberta, língua protraída e sem fonação. O paciente é classificado de acordo com a quantidade de estruturas observadas, isto é, Classe I quando se observa palato mole,
  • 46. 46 úvula, fauce e pilares visíveis; Classe II quando se observa palato mole, úvula e fauce; Classe III quando se observa palato mole e úvula; Classe IV quando se observa apenas o palato mole. A classe I é a com menos dificuldade e a classe IV com maior dificuldade. Deve-se levar em conta também que distância tireomentoniana menor que 6,5 cm é preditor de dificuldade, assim como a rigidez atlanto-occipital. A previsão de ventilação difícil sob máscara também deve ser feita. Ela é simples e envolve cinco variáveis: a) barba; b) índice de massa corpórea (IMC) maior que 26; c) adentado; d) mais de 55 anos; e) história de ronco. 7.5. Exames complementares Considerando pacientes assintomáticos, só se realizam alguns exames de rotina para algumas faixas etárias e gênero. Para homens de 6 meses a 40 anos não se realizam exames subsidiários, de 40 a 64 anos se faz eletrocardiograma e para os maiores de 64 pede-se hematócrito, hemoglobina, ECG, clearance de creatinina e glicemia. Para mulheres de 6 meses a 50 anos pede-se hematócrito, de 50 a 64 faz-se hematócrito e ECG e para maiores de 64 anos pede-se hematócrito, hemoglobina, ECG, clearance de creatinina e glicemia. Para pacientes assintomáticos vale o esquema: Idade Homem Mulher 6 meses – 40 anos nenhum Htc 40 – 50 anos ECG Htc 50 – 64 anos ECG Htc, ECG Maiores de 64 anos ECG, Htc, Hb, U/C, Glicemia ECG, Htc, Hb, U/C, Glicemia Htc – hematócrito; ECG – eletrocardiograma; Hb – hemoglobina; U/C – ureia e creatinina Para pacientes sintomáticos o exame depende do tipo de acometimento. Por exemplo, pacientes com hepatopatias devem ser submetidos à testes de coagulação e pacientes com doenças respiratórias ou tabagistas devem realizar Raio-X de tórax. O paciente é classificado pelo seu estado físico conforme seu risco anestésico em seis classes. Essa classificação é da sociedade americana de anestesiologistas, do Classe I Classe II Classe III Classe IV
  • 47. 47 inglês American Society of Anesthesiologists, por isso é denominada ASA. São seis grupos (importante saber): Tab. Classificação de risco anestésico da ASA ASA I Paciente hígido ASA II Paciente com doença sistêmica leve ASA III Paciente com doença sistêmica grave ASA IV Paciente com doença sistêmica grave com risco iminente de morte ASA V Paciente que não se espera que sobreviva sem cirurgia ASA VI Paciente com morte cerebral Para emergências pode-se adicionar a letra E na classificação. 7.6. Medicações pré-anestésicas É comum a utilização de medicações ansiolíticas como benzodiazepínicos, opioides e metoclopramida. Esses fármacos aumentam a segurança do paciente e reduzem o consumo de anestésico na operação. Para esses é importante levar em conta possíveis interações medicamentosas e sobrecarga hepática em renal em pacientes com comorbidades. 7.7. Questões 1) Qual é o principal objetivo da avaliação pré-anestésica? 2) Dê um exemplo de paciente para cada classificação de ASA. 3) O que é a escala de Mallampati? 7.8. Literatura consultada e sugerida - CANGIANI, L.M.; POSSO, I. P.; BRAGA, G. M.; NOGUE, C. S. Tratado de Anestesiologia – - SAESP. 6. ed. São Paulo: Atheneu, 2011. V II (pg. 1299 – 1323). - MANICA J. Anestesiologia Princípios e Técnicas. 3. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 2004. (pg. 323 – 342).
  • 48. 48 8. Monitorização em Anestesia 8.1. Introdução 8.2. Monitorização hemodinâmica 8.2.1. Pressão venosa central 8.2.2. Pressão arterial invasiva 8.2.3. Cateter de artéria pulmonar 8.3. Monitorização da função respiratória 8.3.1. Monitorização da oxigenação 8.3.2. Monitorização da ventilação 8.4. Monitorização da mecânica respiratória 8.5. Questões 8.6. Literatura consultada e sugerida 8.1. Introdução A monitorização consiste na vigilância contínua a qual os pacientes devem ser submetidos desde a indução da anestesia, até sua recuperação. Tem como objetivos principais: analisar a resposta do paciente a determinado procedimento (utilização de anestésicos, reposição volêmica, ventilação, etc.) e diagnosticar ou reconhecer um problema precocemente, como alterações produzidas por hemorragia, politransfusão, compressão de vasos sanguíneos, etc. 8.2. Monitorização Hemodinâmica A monitorização hemodinâmica é fundamental durante qualquer tipo de anestesia, pois os anestésicos modificam as funções cardiovasculares e cirurgia pode produzir alterações agudas e marcantes na hemodinâmica em consequência da posição corporal, manipulação cirúrgica, perda sanguínea e redistribuição de líquidos. Ela tem como objetivo detectar alterações agudas e adequar a perfusão e a oxigenação tecidual e celular às necessidades do organismo. Os métodos utilizados variam em um grande número de técnicas que diferem em seu grau de precisão, complexidade, segurança e custo. A monitorização hemodinâmica básica compreende: monitorização da frequência cardíaca, diurese, ECG contínuo, oximetria de pulso contínua (SpO2), pressão arterial média (PAM) não invasiva, frequência respiratória, temperatura, pressão venosa central (PVC) e PAM invasiva. Segue abaixo a explicação de alguns métodos de monitorização hemodinâmica invasiva: 8.2.1. Pressão venosa central A pressão venosa central pode ser monitorada pelo acesso venoso central e reflete indiretamente a pressão do átrio direito (PAD), que representa a pressão gerada pelo volume de sangue do retorno venoso. Há uma curva de pressão, composta por ondas, que representam o ciclo mecânico cardíaco. As indicações de PVC são: choque; lesão pulmonar ou SDRA; insuficiência renal aguda; sepse grave; paciente com alto risco cirúrgico; cirurgia de grande porte.
  • 49. 49 Onda a = Contração atrial Onda c = Fechamento das valvas a-v Onda v = Enchimento atrial Onda descendente x = Relaxamento atrial Onda descendente y = Esvaziamento atrial Elevações e quedas dos componentes das ondas podem ser causadas por alterações: do volume sanguíneo, na tensão miocárdica e na pressão intratorácica. Todo paciente com instabilidade hemodinâmica deve ter a PVC monitorada. A PVC pode contribuir para avaliação e controle do estado do volume intravascular, devendo ser monitorada continuamente por meio de transdutores de pressão conectados aos monitores. 8.2.2. Pressão arterial invasiva A pressão arterial invasiva (PAi) é um determinante da perfusão dos órgãos associada ao débito cardíaco. Considera-se que a pressão arterial media (PAM) é igual à pressão de perfusão (PP), uma vez que a pressão venosa central (PVC), em indivíduos sadios, e próxima de zero (PP = PAM – PVC). Dessa forma, a manutenção de um nível adequado de PAM propicia, em geral, uma adequada perfusão orgânica. A cateterização arterial pode ser realizada nas artérias radiais, pediosas, femorais, axilares e braquiais, obedecendo a essa ordem de preferência. As indicações da PAi são: emergências hipertensivas; choque; gasometrias frequentes; hipertensão intracraniana; peri e pós-operatório de cirurgia cardíaca e neurológica. 8.2.3. Cateter de artéria pulmonar O cateter de artéria pulmonar é um dos maiores progressos na monitorização do sistema cardiovascular nas últimas décadas. São utilizados cateteres de Swan-Ganz,
  • 50. 50 que permitem a medida da PVC, das pressões sistólicas, diastólica e média da artéria pulmonar e da pressão ocluída da artéria pulmonar. A presença de um termossensor na extremidade do cateter permite a medida do débito cardíaco pela técnica da termodiluição e o cálculo das resistências vasculares pulmonar e sistêmica. A incorporação de fios de derivação elétrica permite monitorar ECG atrial ou ventricular ou estimular o coração por meio de um gerador externo de marca-passo. Alguns cateteres também podem medir continuamente a saturação venosa de oxigênio. As indicações para sua utilização são muito amplas, tais como: infarto agudo do miocárdio com instabilidade hemodinâmica, cardiopatias instáveis, choque, trauma, cirurgias de grande parte (principalmente em pacientes graves) e outras situações em que a volemia e o estado hemodinâmico são de difícil avaliação. Técnicas de monitorização minimamente invasiva: bioimpedância elétrica torácica (BET), Doppler esofágico, termodiluição transpulmonar, análise de contorno de pulso e avaliação da variação de pressão arterial. 8.3. Monitorização da função respiratória A monitorização da função respiratória trouxe grande benefício em antecipar uma possível complicação intraoperatória, sendo que, ventilação e oxigenação inadequadas são as causas mais frequentes de complicações graves em anestesia. 8.3.1. Monitorização da oxigenação A manutenção da oxigenação sanguínea é uma das principais metas durante o tratamento intensivo ou a anestesia. A presença de hipoxemia grave não detectada rapidamente tem efeitos deletérios, incluindo lesão neurológica irreversível e parada cardíaca. Os principais métodos utilizados são: Gasometria arterial e oximetria de pulso. 8.3.2. Monitorização da ventilação
  • 51. 51 É realizada pelo controle da pressão parcial de gás carbônico no sangue arterial (PaCO2); Capnometria (medida da pressão parcial de gás carbônico no gás exalado) e Capnografia (Observação continua da curva de exalação durante o ciclo respiratório e pode ser expressa em função do tempo ou do volume exalado). *A hipercapnia (PaCO2> 45 mmHg) reflete sempre uma ventilação inadequada, enquanto a hipocapnia (PaCO2 < 35 mmHg) reflete hiperventilação como resposta à hipoxemia, à acidose metabólica ou às alterações neurológicas. 8.4. Monitorização da mecânica respiratória Os ventiladores mecânicos modernos utilizados em anestesiologia são dotados de transdutores que realizam a mensuração do fluxo e pressão nas vias aéreas proximais ao tubo endotraqueal. A mensuração contínua de pressão nas vias aéreas, volume corrente e fluxo são os parâmetros de mecânica mais frequentemente utilizados durante a anestesia, fornecendo informações em tempo real da interação do sistema respiratório – ventilador mecânico e possibilitando o diagnóstico precoce de falhas no sistema e mudanças da mecânica, auxiliando nos ajustes dos parâmetros ventilatórios. 8.5. Questões 1) Método, considerado um dos maiores progressos na monitorização cardiovascular, permite a medida da PVC, das pressões sistólicas, diastólica e média da artéria pulmonar e da pressão ocluída da artéria pulmonar: a) Oximetria de pulso b) Pressão arterial invasiva c) Cateter de artéria pulmonar d) Acesso venoso central 2) O controle da pressão parcial da PaCO2, a Capnometria e a Capnografia são métodos utilizados para: a) Monitorar a função renal b) Monitorar a oxigenação c) Monitorar a função cardiovascular d) Monitorar a ventilação 3) É um método não invasivo de monitorização hemodinâmica: a) Pressão venosa central b) Oximetria de pulso c) Cateter de Swan-Ganz d) Cateter de artéria pulmonar 8.6. Literatura consultada e sugerida http://www.unifesp.br/denf/NIEn/hemodinamica/pag/cateter.htm <acesso em: 28/08/2014> http://www.somiti.org.br/protocolo/3_monitorizacao.pdf <acesso em: 28/08/2014> AMARAL, José Luiz; GERETTO, Pedro; TARDELLI, Maria Ângela; R. MACHADO, Flávia; M. YAMASHIT, Américo. Guias de Medicina Ambulatorial e Hospitalar: Guia de Anestesiologia e Medicina Intensiva. 1. ed. Barueri: Editora Manole, 2011. CANGIANI, Luiz Marciano; SLULLITEL, Alexandre; PORTÉRIO, Glória Maria Braga; PIRES, Oscar César; POSSO, Irimar de Paula; NOGUEIRA, Celso Schmalfuss; FEREZ, David; CALLEGARI, Desiré Carlos. Tratado de Anestesiologia – SAESP. 7. Ed. São Paulo: Editora Atheneu, 2011.
  • 52. 52 9. Anestésicos locais 9.1. Conceito 9.2. Propriedades físico-químicas 9.3. Mecanismo de ação 9.4. Farmacocinética 9.5. Dose 9.6. Efeitos adversos e toxicidade 9.7. Questões 9.8. Literatura consultada e sugerida 9.1. Conceito Os anestésicos locais (AL) são fármacos que, em concentrações adequadas, possuem a propriedade específica de bloquear de forma reversível a geração e a propagação de impulsos elétricos em tecidos excitáveis, abolindo a sensibilidade e até a atividade motora. A ação dos AL é reversível: sua utilização é seguida pela recuperação completa na função do nervo, sem evidências de lesão nas células ou fibras nervosas. 9.2. Propriedades físico-químicas Os AL são classificados conforme a ligação do resíduo aromático em tipo éster ou amida. A estrutura molecular básica dos anestésicos locais mais utilizados atualmente é constituída de três partes: um grupo hidrofóbico e lipofílico, normalmente um anel aromático; uma cadeia intermediária, geralmente um éster ou uma amida; um grupo hidrofílico, em geral uma amina terciária. A ligação entre a cadeia intermediária e o grupo aromático pode ser do tipo éster ou do tipo amida. Esse tipo de ligação permite uma das classificações dos anestésicos locais em aminoésteres e aminoamidas, com diferente biotransformação e potencial alergênico.