1. O documento apresenta orientações para a elaboração de Planos Diretores de Transporte e da Mobilidade (PlanMob) de forma a promover a construção de cidades sustentáveis.
2. Discutem-se conceitos como mobilidade, sustentabilidade e acessibilidade e a importância da participação social e da gestão democrática das políticas de mobilidade.
3. São apresentados os componentes do planejamento da mobilidade urbana, incluindo fatores condicionantes, o papel do sistema viário e dos modos de transporte, e métodos
7. GUIA PlanMob
O Guia PlanMob é uma contribuição do Ministério das Cidades para estimular e orientar os
municípios no processo de elaboração dos Planos Diretores de Transporte e da Mobilidade, obri-
gatórios para as cidades com mais de 500 mil habitantes, fundamental para as com mais de 100
mil habitantes e importantíssimo para todos os municípios brasileiros.
Sua concepção pretende ser inovadora, seguindo os princípios estabelecidos na Política
Nacional de Desenvolvimento Urbano e na Política Nacional de Mobilidade Urbana Sustentável,
principalmente na reorientação do modelo de urbanização e de circulação das nossas cidades.
O PlanMob pretende ser efetivamente um instrumento na construção de cidades mais eficientes,
com mais qualidade de vida, ambientalmente sustentáveis, socialmente includentes e democra-
ticamente geridas.
Nesse sentido, o Guia é preciso, ao afirmar novos conceitos e princípios para o planeja-
mento da mobilidade urbana, e também genérico para poder contribuir para dirigentes públicos
e técnicos vivendo situações particulares e distintas em suas respectivas cidades. Afinal, os
problemas de desenvolvimento urbano, transporte e circulação se manifestam de forma desi-
gual em função de um enorme conjunto de fatores que foram tratados neste documento: do
porte da cidade à sua inserção na rede de cidades, passando por suas características físicas,
econômicas e sociais.
5
Com tamanha diversidade, um ponto fundamental unifica a nova abordagem da gestão das
políticas de mobilidade urbana em qualquer cidade do país, independente de seu tamanho, de
sua localização geográfica ou da dinâmica de sua economia, é que ela deve ser orientada para
as pessoas. Por isso tiveram tanto destaque no Guia temas que tratam da inclusão social, da
sustentabilidade ambiental, da equidade na apropriação dos espaços públicos e da gestão de-
mocrática.
O Guia PlanMob não pretende ser um manual, apesar de conter, em alguns capítulos, orien-
tações precisas sobre metodologias e formas de organização dos trabalhos; também não é um
texto teórico, apesar de ter se aprofundado na definição de alguns conceitos considerados es-
tratégicos. Nele os leitores, com maior ou menor preocupação técnica, encontrarão um conjunto
sistematizado de informações sobre os elementos que constituem o planejamento da mobilidade,
sobre métodos de trabalho e sobre o processo de planejamento. Nem todas as suas informações
serão de interesse de todos os leitores, mas todos encontrarão nele referências que poderão
ajudar na elaboração do PlanMob para suas cidades.
O Ministério das Cidades pretende, com este trabalho, contribuir para que as mudanças
necessárias no planejamento e na gestão das políticas de mobilidade urbana ocorram no maior
número de cidades possível, afinal se trata de alterar significativamente o padrão de urbanização
e de circulação nos municípios, de implementar um processo de desenvolvimento econômico
sustentável e de garantir inclusão social de toda a população.
Secretaria Nacional de Transporte e da Mobilidade Urbana – SeMob
11. SUMÁRIO
1. Apresentação ........................................................................................................................................13
2. Introdução .............................................................................................................................................17
2.1 A Reforma urbana e o direito à cidade ...................................................................................19
2.2 A atuação do Ministério das Cidades .....................................................................................19
2.3 A atuação da SeMob – Secretaria Nacional de Transporte e da Mobilidade Urbana .........20
2.4 A política de mobilidade urbana para a construção de cidades sustentáveis ...................21
2.5 Mobilidade, meio ambiente e planejamento urbano .............................................................22
2.5.1 Consumo e externalidades ................................................................................................23
2.6 O Caderno PlanMob .................................................................................................................23
3. Conhecendo o Caderno PlanMob .......................................................................................................27
3.1 Conhecendo o Caderno PlanMob ...........................................................................................29
4. Definindo o Plano Diretor de Transporte e da Mobilidade ...............................................................31
4.1 O planejamento da mobilidade ...............................................................................................33
4.2 Princípios do PlanMob.............................................................................................................34
5. Conhecendo os Fundamentos para o Planejamento da Mobilidade ...............................................37
5.1 Cidades sustentáveis e com qualidade de vida – objetivo final do planejamento da
mobilidade e do transporte .............................................................................................................39
5.2 Conceitos básicos para formulação dos Planos Diretores de Transporte e da Mobilidade... 40
5.2.1 Mobilidade ..........................................................................................................................41
5.2.2 Sustentabilidade.................................................................................................................42
5.2.3 Acessibilidade ....................................................................................................................42
5.2.4 Circulação ..........................................................................................................................44
5.3 A gestão democrática da política de mobilidade urbana .....................................................45
5.3.1 A gestão pública do transporte ...........................................................................................45
5.3.2 A participação da sociedade ..............................................................................................47
6. Apresentando os Componentes do Planejamento da Mobilidade ..................................................49
6.1 Entendendo os fatores condicionantes da mobilidade urbana ...........................................51
6.1.1 Porte das cidades ..............................................................................................................51
6.1.1.1 Classificação dos municípios .....................................................................................51
6.1.1.2 Perfil da mobilidade....................................................................................................52
6.1.2 Organização institucional ...................................................................................................54
6.1.3 Urbanização e mobilidade urbana .....................................................................................56
12. SUMÁRIO
6.1.3.1 Inserção na rede de cidades ......................................................................................57
6.1.3.2 Características morfológicas e urbanas .....................................................................59
6.1.3.3 Cidades com características específicas ...................................................................60
6.1.3.4 Mobilidade em zonas rurais .......................................................................................62
6.1.4 Plano Diretor e os Instrumentos urbanísticos ...................................................................63
6.1.5 Aspectos sócio-econômicos ...............................................................................................70
6.1.5.1 Condições sociais ......................................................................................................70
6.1.5.2 Aspectos econômicos ................................................................................................73
6.2 Entendendo o papel do sistema viário no planejamento da mobilidade ...........................74
6.2.1 Sistema viário.....................................................................................................................74
6.2.1.1 Classificação funcional...............................................................................................74
6.2.1.2 Hierarquização viária regional....................................................................................75
6.2.1.3 Gestão do sistema viário............................................................................................76
6.2.1.4 Planejamento e projeto da circulação ........................................................................77
6.2.1.5 Sinalização das vias...................................................................................................78
6.2.1.6 Operação e fiscalização .............................................................................................79
6.2.1.7 Paz no trânsito e educação para a circulação ...........................................................80
6.3 Entendendo os serviços de transporte público ....................................................................81
6.3.1 Serviços de transporte coletivo ..........................................................................................81
6.3.2 Serviço de táxis ..................................................................................................................83
6.3.3 Serviço de mototáxi e motofrete ........................................................................................84
6.3.4 Serviço de transporte escolar ............................................................................................85
6.4 As características e o papel dos diferentes modos de transporte ......................................86
6.4.1 Modos não motorizados .....................................................................................................86
6.4.1.1 Circulação das pessoas no sistema viário .................................................................86
6.4.1.2 Bicicleta ......................................................................................................................88
6.4.1.3 Carroças e veículos com tração animal .....................................................................89
6.4.2 Modos motorizados coletivos .............................................................................................90
6.4.2.1 Microônibus e ônibus convencionais .........................................................................90
6.4.2.2 Sistemas estruturais com veículos leves sobre pneus e trilhos .................................91
6.4.2.3 Trens urbanos e regionais..........................................................................................92
6.4.2.4 Metrôs ........................................................................................................................92
6.4.2.5 Barcas ........................................................................................................................93
6.4.3 Modos motorizados individuais ..........................................................................................93
6.4.3.1 Automóveis.................................................................................................................93
13. SUMÁRIO
6.4.3.2 Motos .........................................................................................................................94
7. Construindo o Plano de Mobilidade ...................................................................................................97
7.1 Conhecendo métodos para o trabalho de análise das condições da mobilidade .............99
7.1.1 Obtendo dados de campo ..................................................................................................99
7.1.1.1 Inventários físicos ....................................................................................................100
7.1.1.2 Pesquisas de comportamento na circulação ...........................................................101
7.1.1.3 Pesquisas operacionais do transporte coletivo ........................................................103
7.1.2 Obtendo dados secundários ............................................................................................107
7.1.2.1 Informações sócio-econômicas................................................................................107
7.1.2.2 Informações gerais do setor de transportes.............................................................107
7.1.2.3 Levantamento da legislação ....................................................................................107
7.1.2.4 Análise de estudos e projetos existentes .................................................................108
7.1.3 Ouvindo a sociedade .......................................................................................................108
7.2 Utilizando métodos de planejamento de transporte ...........................................................109
7.2.1 Utilizando modelos de transporte.....................................................................................109
7.2.2 Realizando estudos de projeção ......................................................................................110
7.2.3 Analisando alternativas ....................................................................................................111
7.2.3.1 Análise de viabilidade...............................................................................................111
7.2.3.2 Hierarquização das alternativas ...............................................................................112
7.3 Temas a serem tratados no Plano de Mobilidade ...............................................................112
7.3.1 Temas gerais e de presença obrigatória ..........................................................................112
7.3.1.1 Diretrizes e instrumentos para a difusão dos conceitos de mobilidade ...................113
7.3.1.2 Diretrizes para avaliação dos impactos ambientais e urbanísticos dos
sistemas de transporte .........................................................................................................114
7.3.1.3 Diretrizes e normas gerais para o planejamento integrado da
gestão urbana e de transporte ..................................................................................... 115
7.3.1.4 Diretrizes normas gerais e modelo para a participação da população no
planejamento e acompanhamento da gestão do transporte ................................................116
7.3.1.5 Diretrizes para a execução continuada dos instrumentos de planejamento ............116
7.3.1.6 Diretrizes e meios para a acessibilidade universal ..................................................117
7.3.1.7 Diretrizes e meios para a difusão dos conceitos de circulação em
condições seguras e humanizadas ......................................................................................119
7.3.1.8 Diretrizes e modelo de gestão pública da política de mobilidade urbana ...............120
7.3.2 Temas particulares ..........................................................................................................121
7.3.2.1 Classificação e hierarquização do sistema viário ....................................................122
7.3.2.2 Implantação e qualificação de calçadas e áreas de circulação a pé .......................123
7.3.2.3 Criação de condições adequadas à circulação de bicicletas ...................................126
14. A
SUMÁRIO
7.3.2.4 Tratamento viário para o transporte coletivo ............................................................127
7.3.2.5 Sistemas integrados de transporte coletivo .............................................................129
7.3.2.6 Sistemas estruturais de transporte coletivo de média capacidade ..........................131
7.3.2.7 Sistemas estruturais de transporte coletivo de alta capacidade ..............................132
7.3.2.8 Modelo tarifário para o transporte coletivo urbano ..................................................133
7.3.2.9 Sistemática para avaliação permanente da qualidade do
transporte coletivo e de indicadores de trânsito...................................................................135
7.3.2.10 Acessibilidade, transporte coletivo e escolar para a área rural ..............................136
7.3.2.11 Organização da circulação .....................................................................................137
7.3.2.12 A circulação nas áreas centrais..............................................................................138
7.3.2.13 Controle de demanda de tráfego urbano ...............................................................139
7.3.2.14 Regulamentação da circulação do transporte de carga ........................................139
7.3.2.15 Modelo institucional em regiões metropolitanas e áreas conurbadas ...................140
8. Orientando o Processo de Elaboração do PlanMob .......................................................................143
8.1 Preparando o Termo de Referência para a elaboração do PlanMob .................................145
8.1.1 Considerações iniciais .....................................................................................................145
8.1.2 Definindo objetivos ...........................................................................................................145
8.1.3 Definindo metodologias....................................................................................................146
8.1.4 Estabelecendo o plano de trabalho..................................................................................147
8.1.5 Estabelecendo cronogramas ...........................................................................................155
8.1.6 Definindo recursos ...........................................................................................................156
8.1.7 Estabelecendo acompanhamento e gestão dos trabalhos ..............................................156
8.2 Sugestões de roteiros............................................................................................................156
8.2.1 Municípios com população de 60 a 100 mil habitantes ...................................................157
8.2.2 Municípios com população de 100 a 250 mil habitantes .................................................158
8.2.3 Municípios com população de 250 a 500 mil habitantes .................................................160
8.2.4 Municípios com população de 500 mil a um milhão de habitantes ..................................163
8.2.5 Municípios com população superior a um milhão de habitantes .....................................166
8.2.6 Municípios em regiões metropolitanas.............................................................................169
8.3 Instituindo o Plano de Transporte e da Mobilidade ............................................................170
8.4 Implementando o Plano de Transporte e da Mobilidade ....................................................172
9. Referências para Elaboração do PlanMob .......................................................................................175
9.1 Referências bibliográficas empregadas neste Guia ...........................................................177
9.2 Bibliografia Complementar ...................................................................................................179
9.3 Sites de referência para consulta .........................................................................................180
15. A
APRESENTAÇÃO
APRESENTAÇÃO
Foto: Christian knepper (Embratur)
17. 1. APRESENTAÇÃO
O Estatuto da Cidade determina que todas Distrito Federal. Neste Caderno 1, foram abor-
as cidades brasileiras com mais de 500 mil ha- dados os aspectos relacionados à infra-estrutu-
bitantes elaborem um plano de transportes e ra do sistema de mobilidade, os meios de trans-
trânsito, rebatizado pela SeMob de Plano Dire- portes urbanos e seus serviços. Oportunamente
tor de Mobilidade, ou na expressão simplifica- serão tratados em outra publicação o arranjo
da aqui usada, PlanMob. institucional e o modelo de gestão associada,
bem como o modelo de financiamento e os as-
Não é só uma mudança de nome, mas pectos fundamentais para a implementação do
uma reformulação de conteúdo: a mobilidade sistema de mobilidade urbana.
urbana é um atributo das cidades, relativo ao
deslocamento de pessoas e bens no espaço O apoio à elaboração dos Planos de Mo-
urbano, utilizando para isto veículos, vias e bilidade é apenas uma das ações do Ministé-
toda a infra-estrutura urbana. Este é um con- rio das Cidades desenvolvidas pela Secretaria
ceito bem mais abrangente do que a forma Nacional de Transporte e da Mobilidade Urba-
antiga de tratar os elementos que atuam na na – SeMob. A Política Nacional de Mobili-
circulação de forma fragmentada ou estan- dade Urbana para a construção de cidades
que e de administrar a circulação de veículos sustentáveis, coordenada pela SeMob, con-
e não de pessoas. ta com um programa de ações para diversos
projetos neste sentido, incluindo apoio a pro-
Esse conceito recebe ainda quatro com- jetos, consolidação institucional, capacitação 15
plementos, igualmente estruturais da política de equipes, investimentos diretos de recursos
desenvolvida pelo Ministério das Cidades: a do orçamento da União e diversas linhas de
inclusão social, a sustentabilidade ambiental, financiamento.
a gestão participativa e a democratização do
espaço público. O primeiro afirma o compro- Este novo conceito de planejamento da
misso do Governo Federal com a construção mobilidade, com escopo ampliado, precisa ser
de um país para todos, tendo o direito à mo- incorporado pelos municípios. Duas outras di-
bilidade como meio de se atingir o direito à ferenças fundamentais devem ser destacadas
cidade. O segundo demonstra a preocupação entre os planos de transporte tradicionais e o
com as gerações futuras e com a qualidade PlanMob para evitar que as administrações
de vida nas cidades. O terceiro traduz a bus- municipais incorram nos mesmos problemas
ca pela construção da democracia política, que levaram a que aqueles planos, muitas ve-
econômica e social. E o quarto complemento zes, “não saíssem do papel”.
se refere ao princípio da equidade no uso do
espaço público Primeiro, em sua maioria, os antigos pla-
nos se limitavam a propostas de intervenções
A importância estratégica desta nova abor- na infra-estrutura e na organização espacial
dagem é tanta, que o Ministério das Cidades dos serviços de transporte público, quando
decidiu avançar na obrigação legal e incentivar muito estimando os investimentos necessá-
a elaboração do PlanMob por todas as cidades rios para a sua execução. Normalmente os
com mais de 100 mil habitantes e as situadas processos de planejamento ignoravam a di-
em regiões metropolitanas e em regiões de de- mensão estratégica da gestão da mobilidade
senvolvimento integrado. Afinal, é nesta faixa urbana, principalmente nos aspectos institu-
de cidades que ainda é possível reorientar os cionais e de financiamento, como também,
modelos de urbanização e de circulação de ma- não abordavam adequadamente conflitos so-
neira preventiva, sem descuidar das propostas ciais de apropriação dos espaços públicos ou
corretivas para as grandes metrópoles e para o de mercado, no caso do transporte coletivo. A
18. APRESENTAÇÃO
omissão daqueles planos com relação a es- ticamente implantado em qualquer lugar. Ao
tes aspectos, desconsiderando as reais con- contrário, seu objetivo é contribuir para que o
dicionantes da mobilidade urbana, é talvez a debate das políticas públicas de transporte e
principal razão da sua baixa efetividade. de circulação urbanas seja levado ao maior nú-
mero de cidades possível, envolvendo os seg-
O caderno PlanMob não é uma enciclopé- mentos organizados da população de forma
dia, muito menos um receituário a ser automa- democrática e participativa.
Renato Boareto
Diretor de Mobilidade Urbana
16
19. I INTRODUÇÃO
INTRODUÇÃO
Foto: Sérgio Fecuri (Embratur)
21. 2. INTRODUÇÃO
2.1 A Reforma urbana e o direito à cidade 2.2 A atuação do Ministério das Cidades
O Brasil é um país predominantemente Ao retomar a questão urbana como
urbano, com mais de 80% da população vi- parte importante da agenda nacional, o Go-
vendo em cidades, onde deveriam ter acesso verno Federal parte do reconhecimento da
às oportunidades de trabalho, educação, saú- existência de uma crise que, para ser supe-
de, lazer e a todas outras dimensões da vida rada, exige uma política nacional orienta-
cotidiana. Não é isto, porém, o que ocorre: na dora e coordenadora de esforços, planos,
maioria das cidades, os benefícios da urbani- ações e investimentos dos vários níveis de
zação são inacessíveis para uma boa parcela governo e, também, dos legislativos, do
das pessoas. judiciário, do setor privado e da socieda-
de civil, porém formulada e implementada
Esta foi, sem dúvida, uma das razões do de forma democrática e participativa, to-
surgimento, por ocasião do processo cons- talmente distinta do modelo tecnocrático e
tituinte no final da década de 1980, do movi- autoritário adotado no passado. (Ministério
mento pela Reforma Urbana, uma luta em de- das Cidades, 2004a, p. 7)
fesa do direito à cidade, à habitação digna, ao
transporte e aos demais serviços públicos de O planejamento participativo procura
qualidade e em prol da gestão participativa e envolver os diferentes segmentos sociais nas
democrática. definições da cidade e do desenvolvimento 19
desejado. Estas definições indicarão o produ-
A inclusão na Constituição de 1988 de um to das relações econômicas, sociais e políti-
capítulo específico sobre a política urbana foi cas de cada local. Mas, na visão do Ministério
um avanço, ao afirmar o princípio da função das Cidades, este planejamento deve seguir
social da propriedade urbana. Porém, para algumas das diretrizes que foram expres-
surtir efeito, dependeu de uma legislação com- sas para a elaboração dos Planos Diretores:
plementar específica para a qual foram neces- (Ministério das Cidades, 2004d, p. 40 - 41)
sários quase onze anos de mobilizações, ela-
borações e negociações até a aprovação do • Prover espaços adequados para toda a
Estatuto da Cidade1, em 2001. população do município e garantir instru-
mentos para que a propriedade urbana e
É nesse ambiente de fortalecimento da rural cumpra a sua função social.
política urbana que foi criado, em 2003, o
Ministério das Cidades, reunindo as áreas • Reverter a lógica que orienta as polí-
mais relevantes, do ponto de vista econô- ticas urbanas que realocam as classes
mico e social, e de estratégicas do desen- populares em lugares distantes, sem
volvimento urbano, em torno da Política infra-estrutura, onde o preço da terra é
Nacional de Desenvolvimento Urbano que mais baixo.
pretende, como objetivo último, a melhoria
das condições materiais e subjetivas de vida • Descentralizar as atividades, melhorando seu
nas cidades, a diminuição da desigualdade acesso, criar espaços econômicos nas áreas
social e a garantia da sustentabilidade am- periféricas, redistribuir setores econômicos
biental, social e econômica. industriais e comerciais em todo o território.
1
A lei federal nº 10.257, de 10 de julho de 2001 ficou conhecida como Estatuto da Cidade.
22. 2. INTRODUÇÃO
• Preservar a qualidade ambiental das áreas integrado de transporte e uso do solo, a atuali-
rurais, diversificando as atividades. zação da regulação e da gestão do transporte
coletivo urbano, a promoção da circulação não
Desde a criação do Ministério das Cida- motorizada e o uso racional do automóvel”. (Mi-
des, em 2003, o Governo Federal concentrou nistério das Cidades, 2004a)
em uma única Pasta as políticas públicas de
trânsito e transporte urbano que, até então, Com essa nova visão, o Ministério das Cida-
encontravam-se dispersas, articulando-as tam- des estabeleceu diversos programas que passa-
bém com outras políticas setoriais essenciais ram a nortear a aplicação dos recursos do Orça-
para o desenvolvimento urbano do ponto de mento Geral da União (ver www.cidades.gov.br)
vista econômico, social e estratégico.
Quase todos estes programas interfe-
Quatro Secretarias Nacionais: Habitação, rem, direta ou indiretamente, nas condições
Saneamento Ambiental, Transporte e Mobili- de circulação e de transporte das cidades,
dade Urbana e Programas Urbanos; o Depar- ora induzindo a instalação das atividades no
tamento Nacional de Trânsito (DENATRAN) e território, principalmente onde há população
duas empresas públicas: Companhia Brasileira de baixa renda, ora atuando sobre a dinâmi-
de Trens Urbanos (CBTU) e Empresa de Trens ca econômica e social da cidade ou de re-
Urbanos de Porto Alegre S/A (TRENSURB) giões, ora condicionando a implantação da
constituem a estrutura para o desenvolvimento infra-estrutura viária.
e a condução da Política Nacional de Desen-
volvimento Urbano (PNDU), cujo objetivo é: 2.3 A atuação da SeMob – Secretaria
Nacional de Transporte e da Mobilidade
20 “orientar e coordenar esforços, planos, Urbana
ações e investimentos dos vários níveis de
governo e, também, dos legislativos, do A atuação da SeMob promove a articulação
judiciário, do setor privado e da socieda- das políticas de transporte, trânsito e acessibi-
de civil... (na) busca (da) equidade social, lidade, qualificando os sistemas de transporte
maior eficiência administrativa, ampliação público, por meio de ações que estimulam a
da cidadania, sustentabilidade ambiental e prioridade ao transporte coletivo e aos meios
resposta aos direitos das populações vul- não motorizados de transporte e a implementa-
neráveis: crianças e adolescentes, idosos, ção do conceito de acessibilidade universal. São
pessoas com deficiência, mulheres, negros desenvolvidas também atividades relacionadas
e índios.” (Ministério das Cidades, 2004a, p. 7) à estruturação da gestão pública e atualização
profissional dos técnicos envolvidos no planeja-
Especificamente para a mobilidade urbana, mento e implantação da mobilidade urbana.
a PNDU estabeleceu objetivos em três campos
estratégicos de ação: para o desenvolvimento Estas ações são fundamentais para a mu-
urbano, “a integração entre transporte e con- dança de valores pretendida pelo Ministério
trole territorial, a redução das deseconomias da das Cidades, atuando diretamente sobre seus
circulação e a oferta de transporte público efi- principais elementos:
ciente e de qualidade”; para a sustentabilidade
ambiental, “o uso equânime do espaço urbano, • Ação 1 - Apoio a projetos de corredores es-
a melhoria da qualidade de vida, a melhoria da truturais de transporte coletivo urbano: con-
qualidade do ar e a sustentabilidade energética”; templa projetos de implantação, ampliação
e para a inclusão social, “o acesso democrático ou adequação de infra-estrutura metroferro-
à cidade e ao transporte público e a valorização viária ou viária, que priorizem a circulação do
da acessibilidade universal e dos deslocamen- transporte coletivo em relação ao individual,
tos de pedestres e ciclistas”. A consecução des- incluindo corredores exclusivos e de trans-
tes objetivos, por sua vez, é orientada por três porte coletivo, sistema viário nas áreas cen-
conceitos de aplicação prática: “o planejamento trais, terminais e pontos de parada.
23. Caderno para Elaboração de Plano Diretor de Transporte e da Mobilidade - PlanMob
• Ação 2 - Apoio à elaboração de projetos 2.4 A política de mobilidade urbana para a
de sistemas integrados de transporte co- construção de cidades sustentáveis
letivo urbano: estimula a elaboração de
projetos de sistemas de transporte públi- Entre tantos temas envolvidos na gestão
co intermodais, incluindo a implantação da urbana, o da mobilidade tem suma importân-
infra-estrutura necessária. cia. Primeiro, por ser um fator essencial para
todas as atividades humanas; segundo, por ser
• Ação 3 – Apoio a projetos de sistemas de um elemento determinante para o desenvolvi-
circulação não motorizados: financia pro- mento econômico e para a qualidade de vida;
jetos e intervenções que promovam e va- e, terceiro, pelo seu papel decisivo na inclusão
lorizem os meios de transporte não moto- social e na equidade na apropriação da cida-
rizados, priorizando a sua integração com de e de todos os serviços urbanos. Também
os sistemas de transporte coletivo, mais devem ser destacados os efeitos negativos do
especificamente estimulando o transporte atual modelo de mobilidade, como a poluição
a pé (construção de passeios, com espe- sonora e atmosférica; o elevado número de
cial atenção para os princípios do desenho acidentes e suas vítimas, bem como seus im-
universal) e o uso de bicicletas. Esta ação pactos na ocupação do solo urbano.
contempla as iniciativas previstas no Pro-
grama Bicicleta Brasil. As cidades brasileiras vivem um momen-
to de crise da mobilidade urbana, que exige
• Ação 4 – Apoio a projetos de acessibilidade uma mudança de paradigma, talvez de forma
para pessoas com restrição de mobilidade e mais radical do que outras políticas setoriais.
deficiência: financia projetos e implantação Trata-se de reverter o atual modelo de mo-
de infra-estrutura que garantam a circula- bilidade, integrando-a aos instrumentos 21
ção pela cidade e o acesso aos sistemas de de gestão urbanística, subordinando-se
transporte público para toda a população. aos princípios da sustentabilidade am-
Esta ação contempla as iniciativas previstas biental e voltando-se decisivamente para
no Programa Brasil Acessível. a inclusão social.
• Ação 5 – Apoio à elaboração de Planos Di- O novo conceito (mobilidade urbana) é
retores de Mobilidade Urbana: contempla em si uma novidade, um avanço na maneira
as ações da SeMob, destinadas à promo- tradicional de tratar, isoladamente, o trânsi-
ção da elaboração de planos de mobilida- to, o planejamento e a regulação do trans-
de urbana por parte dos municípios com porte coletivo, a logística de distribuição das
população superior à 100 mil habitantes. mercadorias, a construção da infra-estrutura
Contempla os estudos, pesquisas e ativi- viária, das calçadas e assim por diante. Em
dades relacionadas ao PlanMob. seu lugar, deve-se adotar uma visão sistê-
mica sobre toda a movimentação de bens
• Ação 6 – Desenvolvimento Institucional e e de pessoas, envolvendo todos os modos
capacitação de pessoal: contempla as ati- e todos os elementos que produzem as ne-
vidades relacionadas à regulação e gestão cessidades destes deslocamentos. Sob esta
dos serviços de mobilidade urbana, com ótica, também para a elaboração dos Planos
ênfase na atualização profissional dos técni- de Mobilidade, foram definidos dez princípios
cos vinculados aos órgãos gestores munici- para o planejamento da mobilidade, consi-
pais e estaduais. Destaca-se o curso “Ges- derando também sua relação com o planeja-
tão Integrada da Mobilidade Urbana” mento urbano:
• Ação 7 – Sistema de Informações: envolve 1. Diminuir a necessidade de viagens moto-
a realização de pesquisas sobre mobilida- rizadas, posicionando melhor os equipa-
de urbana, cujos resultados são disponibi- mentos sociais, descentralizando os servi-
lizados para toda a sociedade. ços públicos, ocupando os vazios urbanos,
24. 2. INTRODUÇÃO
favorecendo a multi-centralidade, como 9. Promover a integração dos diversos modos
formas de aproximar as oportunidades de de transporte, considerando a demanda,
trabalho e a oferta de serviços dos locais as características da cidade e a redução
de moradia. das externalidades negativas do sistema
de mobilidade.
2. Repensar o desenho urbano, planejando
o sistema viário como suporte da política 10. Estruturar a gestão local, fortalecendo o
de mobilidade, com prioridade para a se- papel regulador dos órgãos públicos ges-
gurança e a qualidade de vida dos mora- tores dos serviços de transporte público e
dores em detrimento da fluidez do tráfego de trânsito.
de veículos.
2.5 Mobilidade, meio ambiente e
3. Repensar a circulação de veículos, prio- planejamento urbano
rizando os meios não motorizados e de
transporte coletivo nos planos e projetos No plano internacional, é cada vez mais
- em lugar da histórica predominância dos claro que o transporte motorizado apesar de
automóveis - considerando que a maioria suas vantagens, resulta em impactos am-
das pessoas utiliza estes modos para seus bientais negativos, como a poluição sonora
deslocamentos e não o transporte individu- e atmosférica, derivada da primazia no uso
al. A cidade não pode ser pensada como, de combustíveis fósseis como fonte energé-
se um dia, todas as pessoas fossem ter um tica, bem como de outros insumos que ge-
automóvel. ram grande quantidade de resíduos, como
pneus, óleos e graxas. Não há solução pos-
22 4. Desenvolver os meios não motorizados de sível dentro do padrão de expansão atual,
transporte, passando a valorizar a bicicleta com os custos cada vez mais crescentes de
como um meio de transporte importante, infra-estruturas para os transportes moto-
integrado-a com os modos de transporte rizados, o que compromete boa parte dos
coletivo. orçamentos municipais.
5. Reconhecer a importância do deslocamen- A política de mobilidade urbana adotada
to dos pedestres, valorizando o caminhar pelo Ministério das Cidades se inspira larga-
como um modo de transporte para a rea- mente das principais resoluções e planos ema-
lização de viagens curtas e incorporando nados dos encontros internacionais sobre meio
definitivamente a calçada como parte da ambiente e desenvolvimento sustentável, com
via pública, com tratamento específico. particular referência àqueles aprovados nas
Conferências do Rio (1992) e de Joanesburgo
6. Reduzir os impactos ambientais da mobi- (2002). Nestes encontros, que contaram com a
lidade urbana, uma vez que toda viagem participação ativa do Brasil, foi fundamental o
motorizada que usa combustível, produz entendimento atual de que a interdependência
poluição sonora, atmosférica e resíduos. entre o desenvolvimento humano e a proteção
ao meio ambiente é crucial para assegurar uma
7. Propiciar mobilidade às pessoas com de- vida digna e saudável para todos.
ficiência e restrição de mobilidade, permi-
tindo o acesso dessas pessoas à cidade e Torna-se cada vez mais evidente que não
aos serviços urbanos. há como escapar à progressiva limitação das
viagens motorizadas, seja aproximando os
8. Priorizar o transporte público coletivo no sis- locais de moradia dos locais de trabalho ou
tema viário, racionalizando os sistemas, am- de acesso aos serviços essenciais, seja am-
pliando sua participação na distribuição das pliando o modo coletivo e os meios não mo-
viagens e reduzindo seus custos, bem como torizados de transporte. Evidentemente que
desestimular o uso do transporte individual. não se pode reconstruir as cidades, porém é
25. Caderno para Elaboração de Plano Diretor de Transporte e da Mobilidade - PlanMob
possível e necessária a formação e a conso- por habitante cerca de três vezes maior que o
lidação de novas centralidades urbanas, com consumo nos municípios menores.
a descentralização de equipamentos sociais,
a informatização e descentralização de ser- Emissão de Poluentes: A poluição pro-
viços públicos e, sobretudo, com a ocupação duzida pelo transporte individual custa à so-
dos vazios urbanos, modificando-se assim os ciedade o dobro da produzida pelo transporte
fatores geradores de viagens e diminuindo-se público. No caso dos Poluentes Locais esta
as necessidades de deslocamentos, principal- relação passa de cinco vezes. Na mobilidade
mente motorizados. urbana são emitidas 1,6 milhão de toneladas/
ano de poluentes locais, sendo 84% atribuída
2.5.1 Consumo e externalidades ao transporte individual. São emitidas ainda
22,7 milhões de toneladas/ano de CO2 (estufa),
No estudo “Perfil da Mobilidade Urbana no sendo 66% atribuída ao transporte individual.
Brasil – 2003”, elaborado pela ANTP, BNDES O total de emissões por habitante apresenta
e Ministério das Cidades, foi possível estimar uma média de 225 quilos por habitantes por
os seguintes resultados para o consumo de ano, sendo que os municípios maiores emitem
energia, emissão de poluentes e custo de aci- cerca de seis vezes mais poluentes por habi-
dentes para o conjunto das cidades com mais tantes do que os municípios menores. O custo
de 60 mil habitantes. das emissões atinge um total de 4,5 bilhões de
reais por ano, representando um valor médio de
Energia: São consumidas 10,7 milhões R$ 41,80 por habitante.
de TED (Tonelada Equivalente de Petróleo)
por ano na realização da mobilidade urbana, Acidentes: O custo dos acidentes repre-
sendo 75% no transporte individual e 25% no senta um total de 4,9 bilhões de reais por ano, 23
transporte coletivo. Considerando o consumo correspondendo um valor médio de R$ 45,89
de energia por habitante, a mobilidade urbana por habitante.
representa um consumo médio de aproxima-
damente 100 mil GEP (Grama Equivalente de Seguem, na tabela abaixo, Indicadores com-
Petróleo) por habitante por ano, sendo que os parativos entre ônibus, moto, automóvel e bicicleta
municípios maiores apresentam um consumo 2003 (municípios com mais de 60 mil habitantes).
Indicadores Comparativos
ÍNDICES POR PASS-KM
MODO
ENERGIA1 POLUIÇÃO2 CUSTO TOTAL3 ÁREA DE VIA
Ônibus 1,0 1,0 1,0 1,0
Moto 1,9 14,0 3,9 4,2
Auto 4,5 6,4 8,0 6,4
Bicicleta 0 0 0,1 1,1
1
Base calculada em gramas equivalentes de petróleo (diesel e gasolina).
2
Monóxido de carbono (CO), Hidrocarbonetos (HC), Óxidos de Nitrogênio (NOx) e Material Particulado (MP).
3
Custos totais (fixos e variáveis). Fonte: “Panorama da Mobilidade no Brasil, ANTP, 2006” e SeMob.
2.6 O Caderno PlanMob cidades possível, envolvendo os segmentos
organizados da população de forma democrá-
O caderno PlanMob não pretende ser um tica e participativa.
receituário a ser seguido e automaticamente
implantado em qualquer lugar. Ao contrário, O público alvo deste caderno são técnicos
seu objetivo é contribuir para que o debate e dirigentes públicos que atuam diretamente
das políticas públicas de transporte e de circu- com as questões de mobilidade e transporte
lação urbana seja levado ao maior número de nas administrações municipais, bem como di-
26. 2. INTRODUÇÃO
rigentes municipais, lideranças políticas e dos redes de transporte coletivo e toda a infra-
movimentos sociais que se interessam pelas estrutura urbana associada à mobilidade. O
questões urbanas. Está voltado tanto aos técni- arranjo institucional e o modelo de gestão
cos responsáveis pela condução da elaboração associada, principalmente nas regiões metro-
do Plano Diretor de Mobilidade, como aqueles politanas também fazem parte do PlanMob.
a quem compete a definição dos objetivos, al-
cances e recursos que podem ser mobilizados Nos dois casos, o resultado final do Plano
para a sua realização. Nesta condição, é um será um conjunto de normas e diretrizes, que
público que reúne distintos perfis profissionais, devem ser transformadas em lei ou decreto,
cada um com interesses específicos. e medidas concretas a serem implementadas
durante o seu horizonte de vigência para atin-
Some-se a isso, o fato de que o Caderno gir as metas fixadas, a partir do diagnóstico das
orienta a execução de Planos Diretores de Mobi- condições de mobilidade dos municípios.
lidade para cidades de portes populacionais, situ-
ações urbanas, inserção regional e outras carac- Plano de Ação
terísticas distintas, o que conduz os interesses do
leitor para alguns temas, em detrimento de ou- No mínimo, uma versão estratégica do
tros. Para conciliar tantas diversidades o conteú- PlanMob deverá conter um Plano de Ação,
do do Caderno PlanMob é modular, podendo ser compreendendo um conjunto de medidas para
lido integralmente ou de forma orientada por um serem executadas pelo poder público, pelo se-
interesse específico. Não obstante, alguns itens tor privado ou pela sociedade, para atendimen-
são de interesse geral, sem os quais a compre- to das suas diretrizes.
ensão dos elementos necessários à elaboração
24 do Plano poderá ficar prejudicada. É importante destacar que uma ação é
entendida como um comando para que algo
Os temas abordados foram divididos venha a ser planejado, projetado ou executa-
em dois conjuntos: um, de presença obri- do, como, por exemplo: a regulamentação do
gatória, traz assuntos que todo o Plano de Mo- serviço de transporte coletivo, a estruturação
bilidade deverá abordar, independente do porte do órgão municipal gestor das políticas de mo-
ou das outras características dos municípios; e bilidade urbana, a reorganização da rede de
outro, denominado temas particulares, apre- transporte coletivo, a implantação de campa-
senta uma longa lista de assuntos que variam nhas permanentes de divulgação de trânsito
em necessidade e importância, em razão das seguro, a qualificação da infra-estrutura nas
características de cada localidade. paradas de ônibus, a execução de plano de
transporte de cargas perigosas e outros.
O Plano de Mobilidade pode ser elaborado
com diferentes níveis de aprofundamento. O Plano de Ação tratará mais dos temas
identificados neste Caderno como de presença
Pode assumir uma versão estratégica, obrigatória, de caráter mais geral e aplicáveis a
quando se limita a estabelecer as diretrizes ge- qualquer cidade, concentrando as suas proposi-
rais do sistema de mobilidade, do modelo de ções basicamente nas condições estruturais da
financiamento e da gestão pública, somadas a gestão pública da mobilidade urbana e os concei-
uma relação de ações, programas e proje- tos da Política Nacional de Mobilidade Urbana.
tos com vistas à sua implementação.
Sistema de Mobilidade Urbana e sua
Pode assumir uma versão executiva, quan- infra-estrutura
do acrescenta, à visão estratégica, um maior
detalhamento dessas propostas, por exemplo, O Sistema de Mobilidade Urbana é um
compondo um plano de investimentos e o conjunto de sub-sistemas de infra-estrutura,
modelo de financiamento para realizações dos meios de transporte e seus serviços, orga-
nos campo operacional ou tecnológico para as nizados segundo comandos de gestão e dispo-
27. Caderno para Elaboração de Plano Diretor de Transporte e da Mobilidade - PlanMob
sitivos regulatórios, cujo objetivo é proporcio- Arranjo institucional, gestão associada
nar o acesso equânime das pessoas aos bens e seus instrumentos
e oportunidades que a cidade oferece.
A articulação entre as diferentes esferas
A aplicação dos dez princípios fundamen- de governo envolvidas nos sistemas de trans-
tais para a elaboração do PlanMob resultará em portes públicos metropolitanos e regionais
um sistema de mobilidade.que passará a tratar deve resultar em um arranjo institucional ade-
de forma mais efetiva e eficaz os serviços e a quado, que resulte em uma gestão única e as-
infra-estrutura propriamente ditos, avançando sociada, que contemple também a participa-
em propostas para a melhoria do transporte co- ção da população. O trabalho de preparação
letivo, com a utilização dos modos adequados do PlanMob resulta em um acúmulo razoável
à demanda verificada (corredores de ônibus e de dados sistematizados sobre a mobilidade
sistemas sobre trilhos) sua integração física e no município que constituem ferramentas da
tarifária evitando deseconomias, propostas de maior importância para o acompanhamento
intervenções urbanas, implantação e ampliação da política de mobilidade e da gestão cotidia-
da rede cicloviária, vias para pedestres e aces- na dos serviços de transporte
sibilidade para pessoas com deficiência, com
metas de implantação, indicadores de resulta- O PlanMob deve ainda ser entendido
dos, dimensionamentos preliminares dos inves- como um elemento necessário e fundamental
timentos necessários e outras medidas de ca- para a alimentação de um processo continu-
ráter mais operacional. A abordagem deve ser ado de planejamento e gestão da mobilidade
integrada e os temas serão tratados de acordo urbana, isto é, o Plano não é apenas o pon-
com as condições específicas de cada cidade. to final de um trabalho de reflexão e planeja-
mento, mas também é ponto de partida para 25
Plano de investimentos e modelo de a Administração Municipal implementar suas
financiamento políticas, e reavaliar e atualizar continuamen-
te as propostas formuladas.
Em um nível mais avançado de propos-
tas, na versão executiva do PlanMob, está Avaliação da política de Mobilidade
o Plano de Investimentos, com definição de
um conjunto de obras priorizadas, serviços Outro componente do PlanMob é a pro-
e tecnologias necessárias para a efetivação posta de uma metodologia de avaliação da
do seu Plano de Ação e a implantação do política de mobilidade desenvolvida pelo
Sistema de Mobilidade. município. Inicialmente a avaliação pode ser
feita a partir de existência ou não de temas
No Plano de Investimentos, cada elemento considerados fundamentais e de presen-
incluído deve ser identificado, nominado, quan- ça obrigatória, estabelecendo-se níveis de
tificado e dimensionado, inclusive do ponto de amadurecimento. Como exemplo podem ser
vista financeiro. O nível de detalhamento deve considerados os temas “controle social sobre
ser suficiente para permitir o seu desenvolvi- a política de mobilidade” e “acessibilidade
mento posterior, na forma de projetos básicos, para pessoas com deficiência”, que podem
especificações e demais providências para sua estar em estágio de desenvolvimento inicial,
efetivação. O modelo de financiamento deve intermediário ou avançado. Numa segunda
identificar todas as fontes de recursos existen- etapa, a metodologia pode envolver o esta-
tes e aquelas que podem ser criadas, a partir belecimento de indicadores e metas para a
da utilização dos instrumentos urbanísticos pre- política de mobilidade, como por exemplo a
vistos no Estatuo da Cidade, da Lei de PPPs e redução de emissão de poluentes, o aumen-
Lei de Concessões, contemplando investimen- to da participação das viagens coletivas em
tos em infra-estrutura, custeio dos sistemas de relação às individuais, o aumento da parti-
transporte coletivo de média e alta capacidades cipação da bicicleta e a redução do número
e os investimentos na gestão e regulação. de acidentes.
31. 3. CONHECENDO O PlanMob
3.1 Conhecendo o Caderno PlanMob das cidades, medido pela sua população; a
relação entre os instrumentos de política urba-
Como afirmado anteriormente, o público na e a mobilidade urbana; e a influência dos
alvo deste Caderno são técnicos e dirigentes aspectos sócio-econômicos (item 6.1). O pa-
públicos que atuam diretamente com as ques- pel do sistema viário e da gestão da circula-
tões de mobilidade e transporte nas adminis- ção (item 6.2), as características dos serviços
trações municipais. Para conciliar tantas di- de transporte público (item 6.3) e os diferentes
versidades envolvidas no tema, o conteúdo do modos de transporte (item Erro! Fonte de re-
PlanMob é modular, podendo ser lido integral- ferência não encontrada.) são introduzido de
mente ou de forma orientada por um interesse forma resumida, com elementos de reflexão e
específico. Não obstante, alguns itens são de de problematização que serão úteis na avalia-
leitura obrigatória, sem os quais a compreen- ção da situação particular de cada cidade, sem
são dos elementos necessários à elaboração entretanto esgotar os temas, que devem ser
do Plano poderá ficar prejudicada. aprofundados na literatura técnica.
Os capítulos 4 e 5 são obrigatórios. No pri- O objetivo do capítulo 7, “Construindo o
meiro estão expressos os princípios e os pro- Plano de Mobilidade”, é apresentar indicações
dutos de um Plano Diretor de Transporte e da objetivas e, sempre que recomendado, com
Mobilidade, entendido como um instrumento normas de execução. Sua abordagem também
de planejamento e de gestão. No segundo, são não é linear e permite uma leitura aleatória dos 29
apresentados os fundamentos para o planeja- temas abordados, cujo objetivo, mais uma vez,
mento da mobilidade. O objetivo de construção não foi substituir ou consolidar o conhecimento
de cidades sustentáveis e com qualidade de vida acumulado nas diversas áreas que atuam no
é explicitado em um sub-item do capítulo. Em planejamento dos transportes, mas apenas
seguida, são definidos os conceitos básicos que apresentar um rol de metodologias que a equi-
norteiam a discussão sobre o tema, na visão do pe de execução do Plano poderá se valer para
Ministério das Cidades (mobilidade, sustentabi- a condução adequada de suas atividades. Os
lidade, acessibilidade e circulação); são concei- assuntos de maior interesse podem ser aces-
tos amplos, usados às vezes com outros senti- sados com maior detalhamento diretamente
dos, por isto o seu entendimento na forma como nas fontes bibliográficas citadas.
é usado no Caderno PlanMob é fundamental.
Um último item aborda a gestão democrática A primeira seção do capítulo aborda os mé-
do transporte nas cidades, também como um todo de trabalho para obtenção de dados de fon-
conceito geral e imprescindível para a adequa- tes primárias ou secundárias (itens 7.1.1 e 7.1.2),
da formulação de um Plano de Transporte e da com destaque à importância da participação da
Mobilidade que se coadune com a finalidade de sociedade também nesta etapa (item 7.1.3). Os
ser um instrumento da sociedade para a promo- métodos utilizados pela engenharia no planeja-
ção de mudanças na política urbana. mento de transportes constituem o conteúdo do
item 7.2. Ambas procuram simplesmente ofere-
O capítulo 6 apresenta, em temas modu- cer o conhecimento básico do conjunto de técni-
lados, os principais componentes do planeja- cas e procedimentos utilizados tradicionalmente
mento da mobilidade. Os assuntos podem ser no planejamento dos transportes.
lidos de forma salteada, segundo o interesse
de cada leitor e a particularidade de cada ci- Ainda na linha de orientação metodoló-
dade, sem prejuízo da compreensão do con- gica, o capítulo apresenta temas que devam
junto. Nele, são expostos alguns fatores condi- ser tratados no PlanMob (item 7.3), isto é,
cionantes na mobilidade da população: o porte para os quais deve haver análise e reflexão
32. D
CONHECENDO O PlanMob
sobre a situação de cada cidade e proposi- é direcionada para os municípios divididos de
ções de medidas a serem implementadas acordo com sua dimensão populacional, con-
pelo poder público ou pelos agentes privados tendo roteiros indicativos com sugestões de
que contribuam para melhorar as condições temas, metodologias e atividades a serem tra-
da mobilidade local. Os temas abordados tados pelo PlanMob.
foram divididos em dois conjuntos: um, de
presença obrigatória, traz assuntos que todo Ainda neste capítulo, dois últimos sub-itens
o Plano de Mobilidade deverá abordar, inde- (8.3 e 8.4) tratam dos processos finais de con-
pendente do porte ou das outras característi- solidação do PlanMob como instrumento da
cas dos municípios; e outro, denominado te- política urbana, abordando a sua formalização
mas particulares, apresenta uma longa lista e a sua implementação.
de assuntos que variam em necessidade e
importância, em razão das características de Finalizando o Caderno, o capítulo 9 traz
cada localidade. referências bibliográficas para aqueles que
pretendam aprofundar os temas aqui apre-
Os temas de presença obrigatória tradu- sentados de forma sucinta e de sites básicos
zem, na forma de diretrizes, instrumentos e que constituem importantes fontes de consul-
ações propostas, as iniciativas necessárias ta para uma melhor compreensão das condi-
para implementar os conceitos definidos na ções de mobilidade urbana no país ou para
30 política de mobilidade urbana para a cons- a obtenção de informações direta ou indireta-
trução de cidades sustentáveis de fortaleci- mente relacionadas com os temas tratados.
mento da gestão pública, de prioridade ao
transporte coletivo e aos meios não motori-
zados de transporte, de inclusão social, de
gestão democrática e sustentabilidade am-
biental. Os temas particulares dependem
das condições locais de cada município e
adquirem maior complexidade conforme
o porte da cidade, exigindo, muitas vezes,
maiores investimentos.
O conteúdo de cada item apresentado
deve ser utilizado como uma referência para o
desenvolvimento dos trabalhos. A abordagem
adotada procurou sensibilizar o leitor e ofere-
cer uma orientação inicial para o debate de
cada questão.
O capítulo 8 é outro item que deve ser
lido obrigatoriamente. Ele traz orientações
objetivas para a elaboração dos Planos. Na
sua primeira parte, o processo de trabalho ne-
cessário para o desenvolvimento do Plano é
apresentado na forma de um Termo de Re-
ferência (item 8.1.), contendo referências bá-
sicas para o planejamento das atividades re-
comendadas neste Caderno. A segunda parte
35. 4. DEFININDO O PLANO DIRETOR DE TRANSPORTE E DA MOBILIDADE
4.1 O planejamento da mobilidade III. O planejamento da mobilidade, tratado
de forma ampliada e, em particular, con-
Os planos de transporte, independente do siderando a sustentabilidade das cida-
seu nível de detalhe e grau de abrangência, des, deve dedicar atenção especial para
são um instrumento conhecido e bastante em- os modos não motorizados e motoriza-
pregado na gestão do transporte urbano nas dos coletivos e observar as condições de
grandes cidades, principalmente após a déca- acessibilidade universal;
da de 70, através dos esforços do Governo Fe-
deral, por meio da Empresa Brasileira de Pla- IV. O planejamento da mobilidade deve ser reali-
nejamento de Transportes Urbanos - GEIPOT zado com a máxima participação da socieda-
e da Empresa Brasileira de Transportes Urba- de na elaboração dos planos e projetos, para
nos – EBTU, já extintas. garantir legitimação e sustentação política na
sua implementação e continuidade.
Deste processo, ficaram alguns legados:
a ação pública federal no trato das questões Este novo conceito de planejamento da
do transporte urbano (que foi interrompida por mobilidade, com escopo ampliado, precisa ser
um longo período e retomada com a criação incorporado pelos municípios.
do Ministério das Cidades); a disseminação de
uma cultura de planejamento em transportes; Recentemente, o Estatuto das Cidades es-
a implantação de vários órgãos de gestão de tabeleceu a obrigatoriedade das cidades com 33
transporte nos municípios; e a formação de um mais de 500 mil habitantes elaborarem um Pla-
quadro de dirigentes públicos e técnicos. no de Transporte Urbano Integrado, compatível
com o seu plano diretor ou nele inserido (arti-
Segundo a visão predominante na época go 41, § 2º, da lei nº 10.257, de 10 de julho de
sobre os problemas de transporte urbano, es- 2001). Para a atuação da SeMob, a denomina-
ses planos se concentraram nos modos motori- ção destes planos foi alterada pela Resolução
zados, com a proposição de uma infra-estrutu- nº 34, de 01 de julho de 2005, do Conselho das
ra viária e de transporte coletivo capaz de fazer Cidades, recebendo o nome de Plano Diretor
frente a um acelerado processo de urbanização de Transporte e da Mobilidade (PlanMob).
e de crescimento populacional do país.
A mesma Resolução estabeleceu os prin-
De lá para cá, foram muitas as mudanças cípios e diretrizes gerais a serem observadas
ocorridas no cenário urbano, do transporte e da na elaboração destes Planos:
gestão pública de transporte. Em particular, há
quatro entendimentos básicos: I. “Garantir a diversidade das modalidades
de transporte, respeitando as característi-
I. O transporte deve ser inserido em um con- cas das cidades, priorizando o transporte
texto mais amplo, o da mobilidade urbana coletivo, que é estruturante, sobre o indi-
(ver item 5.2.1), que relaciona qualidade vidual, os modos não motorizados e valori-
de vida, inclusão social e acesso às opor- zando o pedestre;
tunidades da cidade;
II. Garantir que a gestão da Mobilidade Urba-
II. A política de mobilidade deve estar cres- na ocorra de modo integrado com o Plano
centemente associada à política urbana, Diretor Municipal;
submetida às diretrizes do planejamento
urbano expressas nos Planos Diretores III. Respeitar às especificidades locais e re-
Participativos; gionais;
36. 4. DEFININDO O PLANO DIRETOR DE TRANSPORTE E DA MOBILIDADE
IV. Garantir o controle da expansão urbana, a Tomando como base essas considerações,
universalização do acesso à cidade, a me- é necessário que os planos de transporte e da
lhoria da qualidade ambiental, e o controle mobilidade sejam elaborados de uma forma re-
dos impactos no sistema de mobilidade novada em relação às aplicações tradicionais,
gerados pela ordenação do uso do solo.” incorporando além dos aspectos metodológi-
cos consagrados, novas vertentes de análise
Duas outras diferenças fundamentais de- do problema, bem como uma maior participa-
vem ser destacadas entre os planos de trans- ção social na sua elaboração.
porte tradicionais e o PlanMob para evitar que
as administrações municipais incorram nos Define-se, assim, o Plano de Transporte e da
mesmos problemas que levaram a que aqueles Mobilidade:
planos, muitas vezes, “não saíssem do papel”.
Primeiro, em sua maioria, os antigos pla- O Plano Diretor de Transporte e da
nos se limitavam a propostas de intervenções Mobilidade é um instrumento da política
na infra-estrutura e na organização espacial de desenvolvimento urbano, integrado
dos serviços, quando muito estimando os in- ao Plano Diretor do município, da região
vestimentos necessários para a sua execução. metropolitana ou da região integrada de
Normalmente os processos de planejamento desenvolvimento, contendo diretrizes,
ignoravam a dimensão estratégica da gestão instrumentos, ações e projetos voltados à
da mobilidade urbana, principalmente nos as- proporcionar o acesso amplo e democrático
pectos institucionais e de financiamento, como às oportunidades que a cidade oferece,
também, não abordavam adequadamente con- através do planejamento da infra-estrutura
34 flitos sociais de apropriação dos espaços públi- de mobilidade urbana, dos meios de
cos ou de mercado, no caso do transporte co- transporte e seus serviços, possibilitando
letivo. A omissão daqueles planos com relação condições adequadas ao exercício da
a isso, desconsiderando as reais condicionan- mobilidade da população e da logística de
tes da mobilidade urbana, é talvez a principal distribuição de bens e serviços
razão da sua baixa efetividade.
Os Planos, por exemplo, devem incorporar 4.2 Princípios do PlanMob
mecanismos que ampliem a capacidade ges-
tora do poder público; tratar dos interesses e A partir da definição do PlanMob, podem
da forma de organização do setor privado na ser identificados os principais elementos que
exploração dos diversos serviços; avaliar o im- devem nortear a elaboração destes planos:
pacto das medidas propostas sobre o custeio
das atividades desenvolvidas tanto pelo setor I. O PlanMob é instrumento de orientação
público como por agentes privados; e propor da política urbana, isto é, faz parte do
ações que contribuam para mudar as próprias arcabouço normativo e diretivo que a ci-
expectativas da população com relação a um dade dispõe para lidar com o processo
padrão de mobilidade urbana econômica e de consolidação, renovação e controle
operacionalmente eficiente, socialmente in- da expansão urbana, logo, dele se exi-
cludente e ambientalmente sustentável. ge que contenha, no campo da mobilida-
de, as diretrizes que: (i) fundamentam a
Um segundo cuidado não se refere pro- ação pública em transporte; (ii) delimitam
priamente ao conteúdo do Plano, mas a forma os espaços de circulação dos modos de
como ele é concebido e implementado, quando transporte, incluindo as prioridades; (iii)
deve contar com ampla participação e o máximo regulam a relação com os agentes pri-
envolvimento da sociedade em todas as suas vados, provedores de serviços de trans-
etapas, desde a população usuária até os prin- porte; e (iv) disciplinam o uso público dos
cipais agentes econômicos e políticos locais. espaços de circulação.
37. Caderno para Elaboração de Plano Diretor de Transporte e da Mobilidade - PlanMob
II. O PlanMob deve estar vinculado ao Plano produtos por elas gerados e das cargas em
Diretor Municipal, e aos planos regionais geral que circulam nas cidades, de forma
caso o município esteja inserido em uma a contribuir para a eficiência do processo
região metropolitana, aglomerado urbano econômico;
ou região integrada de desenvolvimen-
to, obedecendo as diretrizes urbanísticas • melhoria da qualidade de vida urbana; e
neles fixadas; é importante destacar que
o PlanMob não é um outro plano urbano, • sustentabilidade das cidades.
mas parte complementar, seqüencial e
harmônica do Plano Diretor.
Os elementos para a estruturação
III. O PlanMob deve analisar e propor diretri- da gestão da mobilidade são ampla-
zes, ações e projetos para: mente abordados nos cadernos “Mo-
bilidade e política urbana: subsídios
• a infra-estrutura da circulação motorizada para uma gestão integrada” e “Uma
e não motorizada das pessoas e das mer- abordagem sistêmica à gestão da mo-
cadorias, incluindo: calçadas, travessias, bilidade” (editados pela SeMob) e no
passarelas, passagens inferiores, esca- outro caderno “Curso Gestão Integra-
darias, ciclovias, terminais de ônibus, es- da da Mobilidade Urbana” (oferecido
tacionamentos públicos, píers, pistas de no plano de capacitação), disponíveis
rolamento, viadutos, túneis e demais ele- na página eletrônica do Ministério das
mentos físicos; Cidades na Internet.
• a funcionalidade da circulação, definindo 35
as regras de apropriação da infra-estrutura
viária pelos diferentes modos de transpor-
te e a regulamentação de seu uso, expres-
sando prioridades;
• a organização, o funcionamento e a gestão
dos serviços de transporte público e da po-
lítica de mobilidade urbana, com especial
atenção ao transporte coletivo.
IV. O PlanMob tem como principal objetivo
proporcionar o acesso à toda a população
às oportunidades que a cidade oferece,
com a oferta de condições adequadas ao
exercício da mobilidade da população e da
logística de circulação de bens e serviços,
devendo os seus produtos refletir a preo-
cupação com:
• ampliação da mobilidade da população, prin-
cipalmente de baixa renda, em condições
qualificadas e adequadas;
• oferta de condições adequadas para pres-
tação de serviços e a circulação das mer-
cadorias que abastecem o comércio, dos
insumos que alimentam as indústrias, dos
41. 5. CONHECENDO OS FUNDAMENTOS
PARA O PLANEJAMENTO DA MOBILIDADE
5.1 Cidades sustentáveis e com qualidade O intenso processo de urbanização do
de vida – objetivo final do planejamento da país nas últimas décadas se deu com pro-
mobilidade e do transporte fundas diferenças regionais, mas com um
elemento comum: a tendência para a con-
Segundo os dados do Censo 2000, 82% centração, para o crescimento das grandes
da população brasileira vivem em áreas ur- cidades, para a metropolização. Hoje, cerca
banas e, mesmo nas regiões consideradas de 70 milhões de pessoas vivem em 27 regi-
como rurais, é crescente a presença de rela- ões metropolitanas oficialmente constituídas;
ções sociais e econômicas características do nelas, 453 municípios concentram 41% da
modo de vida urbano. população brasileira.
% acumulada da quant. de cidades x % acumulada de população
100%
90%
80%
70%
% acumulada de habitantes
60%
50% 39
40%
30%
20%
10%
0%
0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100%
% acumulada da quant. de cidades
A concentração não ocorre apenas nas Porém, esta acessibilidade não é homo-
regiões metropolitanas: 50% dos brasileiros vi- gênea. O padrão desta urbanização, de baixa
vem em apenas 209 cidades (3,77%) enquan- densidade e com expansão horizontal contí-
to em metade do número de cidades vivem nua, comandada pela especulação imobiliá-
91,15% da população. Se consideradas as 224 ria, segrega a população de baixa renda em
cidades com mais de 100 mil habitantes, são áreas cada vez mais inacessíveis, desprovidas
86,6 milhões de pessoas (51%), e apenas as total ou parcialmente de infra-estrutura e de
31 cidades com mais de 500 mil habitantes so- serviços, prejudicando o seu acesso a essas
mam 46,9 milhões de pessoas (27,7%). oportunidades, impedindo uma apropriação
eqüitativa da própria cidade e agravando a de-
As projeções oficiais para os anos de sigualdade na distribuição da riqueza gerada
2005 e 2015 mostram que esta concentração na sociedade.
tende a se acentuar. E, quanto maior a cida-
de, mais os seus habitantes dependem das A política de mobilidade verificada na qua-
redes de infra-estrutura de circulação para ter se totalidade das cidades brasileiras, ao invés
pleno acesso às oportunidades de trabalho e de contribuir para a melhoria da qualidade da
de consumo nela concentradas. vida urbana, têm representado um fator de sua
42. 5. CONHECENDO OS FUNDAMENTOS PARA O PLANEJAMENTO DA MOBILIDADE
deterioração, causando redução dos índices “Esta situação permanece e tende a se
de mobilidade e acessibilidade, degradação agravar: a falta de transporte público de
das condições ambientais, desperdício de tem- qualidade estimula o uso do transporte in-
po em congestionamentos crônicos, elevada dividual, que aumenta os níveis de conges-
mortalidade devido a acidentes de trânsito e tionamento e poluição. Esse uso ampliado
outros problemas, já presentes até mesmo em do automóvel estimula no médio prazo a
cidades de pequeno e médio portes. expansão urbana e a dispersão das ativi-
dades, elevando o consumo de energia e
Esta situação tem raízes em fatores sociais, criando grandes diferenças de acessibili-
políticos e econômicos mas, fundamentalmente, dade às atividades.” (ANTP, 1997, p. 19)
é produto de decisões passadas nas políticas
urbanas. Nossas cidades foram, ao longo de O desafio que se apresenta para o planeja-
décadas, construídas, reformadas e adaptadas mento, objeto dos Planos Diretores e dos Pla-
para um modelo de circulação, hoje percebido nos de Mobilidade está em alterar as condições
como insustentável, fundado no transporte mo- que produziram esse quadro. Serão necessá-
torizado, rodoviário e individual: o automóvel. rias medidas no âmbito estrito das políticas de
mobilidade, acompanhadas de outras, relacio-
Poucos são os investimentos nos sistemas nadas aos instrumentos de controle urbano,
de transporte público, relegados ao delicado parcelamento e uso e ocupação do solo, con-
(des)equilíbrio entre custos operacionais, tari- trole ambiental, desenvolvimento econômico e
fas e receitas. O resultado é uma apropriação inclusão social.
diferenciada do espaço público com “uma clara
separação entre aqueles que têm acesso ao au- 5.2 Conceitos básicos para formulação
40 tomóvel e aqueles que dependem do transporte dos Planos Diretores de Transporte e da
coletivo, refletindo, na prática, as grandes dis- Mobilidade
paridades sociais e econômicas da nossa socie-
dade; enquanto uma parcela reduzida desfruta Tradicionalmente, as questões de trans-
de melhores condições de transporte, a maioria porte, circulação e mobilidade têm sido trata-
continua limitada nos seus direitos de desloca- das de maneira isolada: planejamento urbano,
mento e acessibilidade”. (ANTP, 1997, p. 18-19) gestão do uso do solo, implantação de siste-
ma viário, gestão do sistema viário, gestão dos
À falta de uma infra-estrutura urbana ade- serviços de transporte coletivo, gestão do trân-
quada, deve ser acrescida a frágil atuação dos sito, gestão do uso das calçadas, e outras ativi-
poderes públicos na gestão dos serviços de dades inter-relacionadas com as condições de
transporte coletivo urbano. Em muitos casos, circulação são comumente administradas pelo
a subordinação aos interesses econômicos poder público, dentro das estruturas adminis-
privados dos operadores, e não ao interesse trativas, de forma estanque. Esta abordagem
público, impediu um planejamento adequado é, em si, um dos problemas para a construção
das redes de transporte coletivo, já prejudica- de um novo modelo de mobilidade urbana.
das pela falta de prioridade no uso do sistema
viário, moldando-a de forma insuficiente, de- Naturalmente, a estrutura da Administração
sarticulada, inadequada aos desejos e neces- Pública deve considerar aspectos característi-
sidades da população e ineficiente operacional cos de cada local - técnicos, políticos ou cultu-
e economicamente. rais, além de refletir concepções e prioridades
também particulares. Além disto, nas cidades
A combinação destes dois movimentos: maiores, a complexidade dos problemas, as
investimentos em infra-estrutura direcionados diversidades regionais e o tamanho da própria
para o transporte individual e subordinação da estrutura gestora exigem divisão de atribuições
organização da rede aos interesses privados, e especialização das equipes. Porém, é neces-
produz um ciclo vicioso que está conduzindo sário que haja a máxima articulação e coorde-
as cidades à imobilidade. nação entre as diversas unidades.