1. 18 Mundo ZERO HORA DOMINGO, 20 DE JUNHO DE 2010
VAZAMENTO NOS EUA
Desastre acendeu alerta no mundo
Acidente no Golfo do México gera questionamentos e mudanças, inclusive no Brasil, relativos à segurança na exploração de petróleo
TED JACKSON, THE TIMES-PICAYUNE, AP
PRISCILA DE MARTINI
Estimativas de uma equipe do
Lições do desastre
governo americano indicam
A explosão da plataforma De- que estariam vazando do O que é preciso fazer no
epwater Horizon, na noite do dia poço entre 35 mil e 60 mil Brasil, segundo especialistas:
20 de abril, não atingiu apenas barris de petróleo por dia
a costa americana, ao macular AUMENTAR MULTAS
praias e ameaçar a vida de animais G A legislação brasileira pre-
com a maré negra que provocou vê multa de R$ 7 mil a R$ 50
ao longo do Golfo do México. milhões para as empresas do
Enquanto o petróleo ainda setor petrolífero responsáveis
jorra nas águas da região, mes- por acidentes em águas sob ju-
mo dois meses após o acidente, risdição nacional (excluídos os
a indústria petrolífera enfrenta custos com limpeza e possíveis
um raro abalo em sua sólida indenizações). O diretor-geral da
estrutura garantida pela depen- Agência Nacional do Petróleo
dência econômica mundial ao (ANP), Haroldo Lima, porém,
seu produto. afirmou que o valor-limite de R$
50 milhões tornou-se muito baixo
N ada que coloque em risco o do-
mínio do petróleo, garantem
especialistas. Mas o fato é que muitas
diante do acidente ocorrido no
Golfo do México. Especialistas
também alegam que a legislação
mudanças devem ocorrer no setor, não é clara o suficiente na defi-
diante da desconfiança de populações nição dos critérios para a aplica-
e governos, que querem garantias de ção das penalidades.
segurança na exploração do recurso
natural. Não é interesse de ninguém PLANO EMERGENCIAL
encarar um desastre ambiental como G Deveria ser criado o Plano
o do Golfo do México – que já é consi- Nacional de Contingência para
derado o maior da história dos EUA. Derramamento de Óleo (PNC),
Como era de se esperar, Washington inexistente mesmo depois de ter
tomou a dianteira nessa direção. A pri- sido exigido pela legislação há 10
meira medida foi a moratória por seis anos. Atualmente, os planos de
meses da exploração de petróleo em emergência são individuais (para
alto-mar, ordenada por Barack Oba- cada plataforma, por exemplo). Já
ma. E muitas outras estão por vir. o PNC é um documento nacional,
– É um precedente que vai, segu- que consolida todas as atribui-
ramente, originar medidas novas de ções de empresas e governos no
legislação, aumento de fiscalização e, caso de um acidente, sobretudo
principalmente, aumento de compen- em episódios mais graves.
sações ambientais – observa José Tun-
disi, presidente do Instituto Internacio- MENOS PODER
nal de Ecologia e professor do doutora- À PETROBRAS
do em qualidade ambiental da Feevale. G Para Doneivan Ferreira, espe-
O Brasil também foi um dos que cialista em economia do petróleo,
decidiu agir para tentar evitar catás- a Petrobras deveria ter menos in-
trofes semelhantes. Na sexta-feira, foi fluência no governo:
divulgado que o governo pretende re- – Se a companhia tem tanto po-
ver as diretrizes que regem os planos der que o órgão regulador não
de emergência em todo o país para consegue fazer exatamente o
acidentes com petróleo. Hoje, cada que quer, manter essa empresa
empresa tem seu plano de emergên- na linha, até em termos de segu-
cia (que precisa ser aprovado pelo rança, pode se tornar um risco.
governo). A intenção, porém, é de que É muito importante que o Brasil
exista um plano nacional que trate do se desenvolva, e os recursos do
assunto. Além disso, um desastre de
Consciência ambiental
pré-sal são importantes no mo-
grande proporção passará a ser tido com grande vazão e pressão intensa mento. Agora, tem que saber se
como “provável”. – algo que não existe no Brasil.
é um trunfo brasileiro
o poder dado à Petrobras não vai
– Eles têm o pior cenário possível. A fazer dela uma empresa intocá-
Catástrofe na costa maior parte do óleo que temos na Ba- vel. Ela tem de ser regulável.
americana foi “inusitada” cia de Campos é pesada. Se aconteces- Outro fator que beneficia o Brasil, Barack Obama e insistem em reto-
se esse acidente lá, o óleo não teria for- por incrível que pareça, é a consci- mar a atividade, apesar da catástro- CORPO TÉCNICO
Preparar-se, sim. Alarmar-se, não, ça suficiente e congelaria na boca do ência ambiental dos cidadãos, que é fe. Isso se reflete no licenciamento e G Ferreira alerta que o Ibama não
pondera o especialista em economia poço, porque a temperatura da água é maior do que na região do Golfo do na fiscalização do setor do petróleo, tem um corpo técnico adequado
do petróleo Doneivan Ferreira, profes- baixa. E se vazasse na água, o óleo su- México. Em Estados como a Loui- mais flexíveis. Por aqui, é diferente. para avaliar o licenciamento para
sor da Universidade Federal da Bahia. biria e ficaria duro como vela, porque siana, a economia tornou-se muito Doneivan Ferreira diz que se impres- exploração de petróleo. Além dis-
Segundo ele, dificilmente ocorrerá um é parafínico.Você só recolheria alguma dependente da indústria do petróleo, sionou com os relatórios de impacto so, a burocracia dos órgãos regu-
acidente semelhante na costa brasileira, coisa sólida em cima – exemplifica. responsável por grande parte dos ambiental de algumas empresas de ladores seria um entrave.
devido ao tipo de poços existentes por No petróleo do pré-sal, a situação é postos de trabalho na região, destaca petróleo que têm chegado ao Brasil
aqui. Geralmente, é preciso bombear o um pouco diferente. Apesar de o pe- a americana Stephanie Mills, auto- – a quantidade de medidas de segu-
óleo para fora. O poço que continua va- tróleo ser leve, Ferreira destaca que ra de livros sobre biodiversidade e rança é superior à dos EUA. O brasi- ZEROHORA.COM
zando nos EUA é inusitado, explica ele, um dos problemas enfrentados hoje biorregionalismo e integrante do Post leiro tem menos tolerância, aponta: Confira trechos das entrevistas com
porque tem uma rara junção de fatores pela Petrobras é o inverso: a perfura- Carbon Institute. A dependência é – Se as empresas fazem uma bo- os brasileiros Doneivan Ferreira, José
problemáticos: óleo leve e um poço que ção passa por camadas estáveis de sal tanta, que muitos grupos protestam bagem ambiental no Brasil, estão Tundisi e a americana Stephanie Mills
em www.zerohora.com/blogarpuro
expele petróleo em forma de chafariz, e é complicado manter o poço aberto. contra a moratória determinada por perdendo um negócio. Acabou.