1. Nas sociedades primitivas e no Oriente, a máscara é
um objeto sagrado através do qual o homem se
comunica com forças cósmicas e recebe energias da
natureza. É um objeto emissor e receptor de forças. A
máscara é um elemento de ligação e de transformação,
por isso surge sempre ligado à dança. É usado nos
ritos de passagem, na iniciação da criança ao mundo
adulto. Mas no Ocidente ela quase não tem conotação
sagrada, nem provoca em nós os mesmos efeitos e as
mesmas transformações que ocorrem no Oriente.
No teatro no a máscara colabora para o distanciamento
e a desindividualização do ator. Apresenta o essencial
e confere ao personagem um visual tão insólito quanto
os sons não humanos que o nô busca. A máscara é
sempre o genérico, é a tipificação, está sempre mais
próxima da ideia. No teatro grego antigo era usada, à princípio, para representar entidades
mitológicas. Na commedia dell’arte representava-se com ela os tipos da sociedade, como já
vinham sendo apresentados pelos atores cômicos desde os primeiros mimos. Nas sátiras
sócio-políticas, no carnaval e nos festejos populares, é dissimulação; provoca, com seu
grotesco irreal, uma inversão de valores; tem uma função denunciadora e subversiva.
A máscara é sempre metamorfose. Ao esconder um rosto, revela sempre uma outra
personalidade; ao eliminar a pessoa do ator, revela imediatamente um personagem.
Na medida em que a máscara traz a essência de um personagem, ela despersonifica o ator ou o
indivíduo, colocando em seu lugar um conceito abstrato. Ao identificar o homem com uma
máscara, com um protótipo, Alfred Jarry priva-o de sua natureza, de suas peculiaridades e o
transforma em objeto, torna-o uma ideia. Ao mesmo tempo, a humanização do objeto-máscara
implica numa despersonalização do homem.
No Oriente e nos rituais primitivos, a máscara, por si mesma, tem uma significação, tem uma
vida própria, e quando usada no palco ou numa cerimônia, a sua vivência é imediata. Já no
Ocidente, um ator, para usá-la dramaticamente, precisa passar antes por um aprendizado, pois
se ela não for bem manipulada, se o ator não souber animá-la devidamente, a máscara pode,
num primeiro instante, causar um grande impacto, mas só no primeiro instante, porque logo
esse impacto se perde. Ela se torna um objeto morto. Enquanto simples adorno, a máscara não
comunica nada, torna-se estranhamente patética.
Se no Oriente o seu portador se sente transformado com ela, se recebe dela energias, no
Ocidente quem a usa não sente que receba coisa alguma; ao contrário, ele a vê como um objeto
ao qual precisa dar vida. O ator ocidental usa máscaras sem conotação alguma de passado ou
de energias cósmicas, sem outros significados senão aquele que o seu visual lhe confere.
Por suas qualidades, a máscara é usada como um instrumento de preparação do ator. A
máscara faz com que ele perca a relação habitual que mantém com o mundo à sua volta e lhe
dá uma sensação nova de espaço e tempo, favorecendo também sua introspecção. A máscara
ensina o ator a manter uma atenção contínua sobre seu corpo e sobre seu rosto, obriga-o a
controlar seus movimentos mais lentos e mais energéticos. Ao mesmo tempo em que provoca
uma conscientização do corpo, a máscara favorece a interiorização.
No Oriente, como no Ocidente, qualquer que seja o seu uso, a máscara provoca uma
transformação. Os seus significados são sempre intuitivamente captados, pois a máscara
exclui o pensamento racional.
Postado há 6th Maio 2011 por Marcelo Marat
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