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outros relatos dos mesmos atos Quinta, 25 de setembro de 2014 
A cada edição, uma outra 
versão do que diz a grande 
mídia televisiva ou do que 
ela muitas vezes nem diz. 
O OUTRO LADO DA COISA 
Edição 2 
Expediente: Léo Mackellene (Editor). 
Há avanços que se parecem com 
atrasos e atrasos que se parecem 
com avanços. 
Léo Mackellene 
é professor universitário 
e escritor. 
Contato: ooutroladodacoisa@gmail.com 
O que pode um presidente? 
POR QUE É MESMO QUE A 
GENTE TEM QUE ESCOLHER 
UM CANDIDATO, HEIN? Você 
já parou pra pensar que um 
presidente talvez não tenha poder de 
mandar em nada?! Como assim?! 
Bem... 
1) Vamos supor que eu produza 10 
sapatos por dia, e contrato 2 ajudan-tes; 
passando a produzir 30 sapatos 
por dia; 
2) Depois, inventam uma máquina 
que substitui esses dois ajudantes e 
ainda produz o dobro de sapatos. 
Isso se chama Revolução Industrial, 
e aconteceu no século XVII. Então, 
agora, produzo 60 sapatos/dia. Pois 
bem, eu compro a máquina e 
dispenso os dois ajudantes. Preciso, 
no entanto, de mão-de-obra espe-cializada 
pra lidar com a máquina; se 
não tiver no meu país, eu trago de 
fora; como aconteceu no @nal do 
séc. XIX, com os operários italianos 
que vieram pro Brasil trabalhar nas 
máquinas das plantações de café, no 
lugar dos escravos, que não sabiam 
nem apertar um botão. Opa! E para 
onde eles foram, os escravos? Ad-vinha!!! 
Eles receberam terras pra ir 
quando foram libertos? Não. Não 
houve uma reforma agrária! Eles 
foram pra onde? Aglomerarem-se 
nas periferias dos bairros distantes 
nas grandes cidades, constituindo as 
favelas. 
3) Um tempo depois, uma revolução 
microeletrônica inventa o computa-dor, 
que pode coordenar sozinho as 
máquinas. Com o lucro obtido com 
a dispensa dos ajudantes e a venda 
dos 60 sapatos em troca de um 
operário, eu compro um compu-tador. 
Dispenso o operário e preciso 
de uma mão-de-obra mais especia-lizada 
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país, pressiono o governo pra fundar 
Universidades e cursos técnicos por 
aqui. É até bom, que aí ele @ca bem 
falado como aquele que trouxe mais 
Universidades e Cursos técnicos na 
história do meu país; 
Seja como for, os meus ajudantes 
artesanais e o meu operário já estão 
desempregados. 
4) Com o aumento do desemprego, 
há um consequente aumento do 
mercado informal, da violência 
urbana, da miséria social... e, conse-quentemente, 
há uma queda no 
mercado de consumo. Vixe! Quase 
ninguém está comprando os meus 
60 pares de sapato. O que eu faço? 
Opção 1) Começo a produzir sapa-tos 
com durabilidade cada vez me-nor 
(isso se chama "obsolescência 
planejada", e isso não fui eu que 
inventei: lembra daquela frase "não 
fazem mais carros como antiga-mente"? 
Pois é!). Isso diminui os 
custos de produção, barateia o pro-duto 
e acaba compensando a queda 
do mercado de consumo - até por-que, 
como os produtos duram me-nos, 
logo, logo se precisará comprar 
um novo; 
Opção 2) Posso @nanciar a cam-panha 
de algum candidato que já 
tenha percebido que a solução é o 
mínimo de distribuição de renda, 
a@nal, se não tiver consumo, o 
sistema trava. Aí, com uma ajudinha 
do governo ("distribuindo renda" a 
partir de programas como "Bolsa- 
Família", "Minha casa, minha vida", 
"Minha casa melhor"), as pessoas 
voltam a comprar os meus 60 pares 
de sapato. 
5) Mas o mercado informal conti-nua 
crescendo. A@nal, todas as em-presas 
querem se modernizar, e, 
assim, a mão-de-obra humana vem 
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máquinas e computadores. Ocorre, 
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cada vez mais (pra concorrer a 
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mercado pra poderem ter dinheiro 
pra comprar os meus 60 pares de 
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@nancio (através de FIES e PRO-UNI, 
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amarradas por anos e anos pagando 
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6) Mas o crescimento do mercado 
informal pega mal pro governo. O 
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com uma cajadada só: começa a ur-banizar 
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empresas com isenção @scal, por 
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comprar os meus 60 pares de 
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"melhorar" sua condição de vida: 
comprar ar-condicionado, uma TV 
maior, um notebook, um tablet, 
celulares, uma geladeira maior, um 
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sensação de que estamos avançando, 
confundindo poder de consumo 
com qualidade de vida. Alguns 
começam a celebrar isso através da 
música e da dança: cantando "Funk 
ostentação", "Forró ostentação"... e 
outras formas pós-modernas do 
Barroco... é o novo Barroco, o bar-roco 
do lixo. 
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Mas lá vivem muitos índios! Ora, 
põe pra fora! É o crescimento, meu 
@lho! É o crescimento! 
10) O avanço do marketing e da 
propaganda torna o consumo um 
fetiche, solução, inclusive, para nos-sa 
solidão, nossa carência contem-porânea, 
a@nal, trabalhando tanto, 
que tempo eu tenho pra mim, pra 
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interessam? Que tempo eu tenho pra 
me relacionar com elas? Só se for 
a t r a v é s d e u m a r e d e s o c i a l . 
Resultado? Fico mais carente e 
sozinho. E sozinho, eu sinto medo. 
Os telejornais são agências de propa-ganda 
do medo. E esse medo é que 
alimenta a ansiedade. E a ansiedade, 
o consumo. Os objetos se sobre-põem 
aos sujeitos, é a degradação do 
homem: as pessoas se matam e 
matam as outras pra conseguir esses 
objetos. 
11) Com as pessoas consumindo 
mais, o que acontece? Extração cada 
vez mais acelerada dos recursos na-turais. 
Como as coisas quebram rá-pido 
(a tal da "obsolescência plane-jada"), 
o que acontece? Lixo, 
poluição, degradação da natureza. 
Como resposta da natureza: desas-tres, 
tsunamis, deslizamentos, 
tufões, seca, cheias... 
E aqui, o ciclo se completa: "Há 
avanços que se parecem com atrasos, 
e atrasos que se parecem com 
avanços". 
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um presidente, @nanciado por gran-des 
empresas, pode fazer pra evitar a 
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Preciso, no entanto, de mão-de-obra espe-cializada pra lidar com a máquina; se não tiver no meu país, eu trago de fora; como aconteceu no @nal do séc. XIX, com os operários italianos que vieram pro Brasil trabalhar nas máquinas das plantações de café, no lugar dos escravos, que não sabiam nem apertar um botão. Opa! E para onde eles foram, os escravos? Ad-vinha!!! Eles receberam terras pra ir quando foram libertos? Não. Não houve uma reforma agrária! Eles foram pra onde? Aglomerarem-se nas periferias dos bairros distantes nas grandes cidades, constituindo as favelas. 3) Um tempo depois, uma revolução microeletrônica inventa o computa-dor, que pode coordenar sozinho as máquinas. Com o lucro obtido com a dispensa dos ajudantes e a venda dos 60 sapatos em troca de um operário, eu compro um compu-tador. Dispenso o operário e preciso de uma mão-de-obra mais especia-lizada ainda. Se não tiver no meu país, pressiono o governo pra fundar Universidades e cursos técnicos por aqui. É até bom, que aí ele @ca bem falado como aquele que trouxe mais Universidades e Cursos técnicos na história do meu país; Seja como for, os meus ajudantes artesanais e o meu operário já estão desempregados. 4) Com o aumento do desemprego, há um consequente aumento do mercado informal, da violência urbana, da miséria social... e, conse-quentemente, há uma queda no mercado de consumo. Vixe! Quase ninguém está comprando os meus 60 pares de sapato. O que eu faço? Opção 1) Começo a produzir sapa-tos com durabilidade cada vez me-nor (isso se chama "obsolescência planejada", e isso não fui eu que inventei: lembra daquela frase "não fazem mais carros como antiga-mente"? Pois é!). Isso diminui os custos de produção, barateia o pro-duto e acaba compensando a queda do mercado de consumo - até por-que, como os produtos duram me-nos, logo, logo se precisará comprar um novo; Opção 2) Posso @nanciar a cam-panha de algum candidato que já tenha percebido que a solução é o mínimo de distribuição de renda, a@nal, se não tiver consumo, o sistema trava. Aí, com uma ajudinha do governo ("distribuindo renda" a partir de programas como "Bolsa- Família", "Minha casa, minha vida", "Minha casa melhor"), as pessoas voltam a comprar os meus 60 pares de sapato. 5) Mas o mercado informal conti-nua crescendo. A@nal, todas as em-presas querem se modernizar, e, assim, a mão-de-obra humana vem sendo substituída cada vez mais por máquinas e computadores. Ocorre, então, uma corrida cada vez mais desenfreada por postos de traba-lho... as pessoas precisam se especia-lizar cada vez mais (pra concorrer a estes postos) e, quem sabe até, con-seguirem mais de um emprego. Parece bom, não é? Parece. Quem vai se quali@car mais?! Oxe!!! Quem pode fazer isso, ora! Mas no meu país, existem muitas pessoas que não podem. Então, como essas pessoas podem se especializar e, assim, se inserir no mercado pra poderem ter dinheiro pra comprar os meus 60 pares de sapato? Fácil: reservo algumas vagas para essas pessoas ("Cotas sociais") nas Universidades Públicas e @nancio (através de FIES e PRO-UNI, por exemplo) a entrada dessas pessoas em faculdades particulares... faculdades, universidades, centro universitários... E essas pessoas @cam amarradas por anos e anos pagando o "nanciamento! 6) Mas o crescimento do mercado informal pega mal pro governo. O que ele faz? Mata alguns coelhos com uma cajadada só: começa a ur-banizar e modernizar áreas ainda muito pouco "urbanizadas", o que signi@ca inserir no mercado, mas t a m b é m s i g n i @ c a d e s m a t a r , desapropriar comunidades que vi-viam nestas áreas... incentivando as empresas com isenção @scal, por exemplo, como aconteceu com a Gr e n d e n e e m So b r a l - C E . O mercado formal volta a crescer. Graças a Deus! 7) Com a volta do crescimento do Mercado Formal, a economia volta a aquecer, e as pessoas poderão, en@m, comprar os meus 60 pares de sapatos, que a essa altura já devem ser sei lá quantos, a@nal, são 60 por dia!!! Ufa!!! 8) A modernização/urbanização/ca-pitalização/ industrialização do interior implica em "desenvolvi-mento". As pessoas começam a "melhorar" sua condição de vida: comprar ar-condicionado, uma TV maior, um notebook, um tablet, celulares, uma geladeira maior, um carro, uma moto... E todos têm a sensação de que estamos avançando, confundindo poder de consumo com qualidade de vida. Alguns começam a celebrar isso através da música e da dança: cantando "Funk ostentação", "Forró ostentação"... e outras formas pós-modernas do Barroco... é o novo Barroco, o bar-roco do lixo. 9) Pra manter todos os aparelhos funcionando, é preciso de mais energia... Oxe!!! Vamos lá na Ama-zônia, ué, onde tem muita água, e mandamos construir umas hidre-létricas lá, né, não? A@nal, lá tem um Belo Monte, donde se pode ver o futuro da construção civil no Brasil. Mas lá vivem muitos índios! Ora, põe pra fora! É o crescimento, meu @lho! É o crescimento! 10) O avanço do marketing e da propaganda torna o consumo um fetiche, solução, inclusive, para nos-sa solidão, nossa carência contem-porânea, a@nal, trabalhando tanto, que tempo eu tenho pra mim, pra estar com as pessoas que realmente interessam? Que tempo eu tenho pra me relacionar com elas? Só se for a t r a v é s d e u m a r e d e s o c i a l . Resultado? Fico mais carente e sozinho. E sozinho, eu sinto medo. Os telejornais são agências de propa-ganda do medo. E esse medo é que alimenta a ansiedade. E a ansiedade, o consumo. Os objetos se sobre-põem aos sujeitos, é a degradação do homem: as pessoas se matam e matam as outras pra conseguir esses objetos. 11) Com as pessoas consumindo mais, o que acontece? Extração cada vez mais acelerada dos recursos na-turais. Como as coisas quebram rá-pido (a tal da "obsolescência plane-jada"), o que acontece? Lixo, poluição, degradação da natureza. Como resposta da natureza: desas-tres, tsunamis, deslizamentos, tufões, seca, cheias... E aqui, o ciclo se completa: "Há avanços que se parecem com atrasos, e atrasos que se parecem com avanços". Dessa forma, o que você acha que um presidente, @nanciado por gran-des empresas, pode fazer pra evitar a d e g r a d a ç ã o d o h omem e d a natureza? Será que ele realmente manda em alguma coisa ou será que quem manda mesmo é a lógica do dinheiro e das grandes empresas? Não será assim também para o cargo de governador? E de prefeito?