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Gastro-nómica e gastro-anómica. Sabedoria do corpo e crise biocultural da
alimentação moderna.
Artigo na Gazeta de Antropologia - abril de 2010
DOI: 10.30827/Digibug.6789 - Fonte: OAI
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1 autor:
Claude Fischler
Centro Nacional de Investigação Científica e École des Hautes Etudes en Sciences Sociales
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3. Gazeta de Antropología, 2010, 26 (1), artigo 09 - http://hdl.handle.net/10481/6789
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Recebido: 8 janeiro 2010 | Aceite: 12 março 2010 | Publicado: 2010-04
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Gastro-nómica e gastro-anómica. Sabedoria do corpo e crise
biocultural da alimentação moderna.
Gastro-nomia e gastro-anomia. A sabedoria do corpo e a crise biocultural da
alimentação moderna.
Claude Fischler
Centro Nacional de Investigação Científica (CNRS). École des Hautes Études en Sciences Sociales.
Centro Edgar Morin. Paris.
RESUMO
Nos países ocidentais desenvolvidos, as pessoas sofrem de problemas de saúde
relacionados com uma alimentação excessiva e desadequada. Quais são as causas desta
situação? Com a modernidade, generalizou-se um modo de comer baseado no snacking,
no petiscar em vez de comer; o sistema de regras (gastro- nomias) que regulava as
práticas alimentares está em crise e estas são deixadas à decisão e escolha individual
(tornam-se gastro-anomias). Os mecanismos biológicos envolvidos na alimentação,
seleccionados em situações de escassez e insegurança alimentar, deixam de ser
adaptativos quando, como acontece nas sociedades afluentes, há uma abundância de
alimentos continuamente disponíveis.
RESUMO
As pessoas dos países ocidentais desenvolvidos sofrem de problemas de saúde
relacionados com uma alimentação excessiva ou inadequada. Quais são as causas? Com
a modernidade, os hábitos alimentares baseiam-se mais em petiscar do que em comer.
Esta crise envolve também um sistema ou normas (gastro-nomias) que regulam as
práticas alimentares e que são libertadas para a decisão e
4. escolha do indivíduo (tornam-se gastro-anomalias). Os mecanismos biológicos envolvidos
na alimentação, seleccionados em situações de escassez e insegurança alimentar,
deixam de ser adoptados quando, como acontece nas sociedades opulentas, é possível
ter acesso contínuo a uma infinidade de produtos alimentares.
PALAVRAS-CHAVE | PALAVRAS-CHAVE
sócio-antropologia da alimentação | práticas alimentares | psicopatologia alimentar |
psicopatologia da alimentação
Consideremos o apetite atual do Ocidente industrializado: embora
sobrealimentados, os países desenvolvidos não estão saciados.
Mas a sobrealimentação atual numa parte do mundo não tem
precedentes. Não é certamente o resultado de "orgias alimentares"
semelhantes às dos caçadores que regressam de uma campanha
bem sucedida, nem de festas dionisíacas como as celebradas em
grandes ocasiões pela maioria das sociedades agrícolas, durante as
quais são consumidas quantidades extraordinárias de carne, gordura
e álcool. Muito pelo contrário: nas nossas sociedades, e apenas nas
nossas sociedades, parece que este tipo de excessos alimentares
festivos está a desaparecer ou a regredir. Quem é que, nos nossos
dias, ainda tem aqueles banquetes rústicos do século XIX, ou mesmo
aquelas refeições burguesas da mesma época, em que se comiam
vários milhares de calorias de uma só vez (Aron 1973)? Quase não
tivemos a oportunidade de experimentar os extremos terminais da
nossa saciedade. Mas todos nós, ou quase todos, desde a infância,
petiscamos diariamente uma variedade de doces e tapas; dedicamo-
nos à pilhagem nocturna dos frigoríficos; abandonamo-nos, mais ou
menos freneticamente ou distraidamente, aos caprichos de uma
oralidade que só deixa de ser comida para se tornar alcoólica ou
tabaqueira. No mundo urbano, desenvolveu-se uma "psicopatologia
da alimentação quotidiana" (ver Aimez 1979), muitas vezes
caracterizada por perturbações do apetite (1), ataques bulímicos,
mordidelas ansiosas ou compulsivas, etc. A fome não nos aperta, faz-
nos cócegas; neste sentido, não vivemos de modo algum na era da
"grande refeição", mas na era do grande lanche.
Mas, se o apetite rabelaisiano e o desejo de banquetes e refeições
partilhadas com comensais nos deixaram,
5. o apetite das nossas aves bem alimentadas é suficiente para
ameaçar a nossa saúde. Surgiram doenças (ou perturbações
patogénicas) ligadas, direta ou indiretamente, a um balanço
energético excedentário, ou mesmo mínimo (ingerimos mais calorias
do que aquelas que conseguimos queimar) ou a um desequilíbrio
qualitativo da nossa alimentação (excesso de gorduras saturadas,
açúcares de absorção rápida): obesidade, doenças cardiovasculares
e ateroscleróticas, etc. Nos países ocidentais, segundo os médicos,
até 30% da população pode ter excesso de peso ou ser
verdadeiramente obesa.
Consequentemente, somos obrigados a abster-nos de comer, ou
seja, a fazer dieta. Em suma, temos de reaprender voluntariamente a
viver com a fome, a controlá-la, a matá-la. Hoje, chegamos ao ponto
de consumir maciçamente medicamentos que suprimem a fome,
substitutos e sucedâneos alimentares, sem calorias, destinados a
silenciar a fome sem nos nutrir (uma evocação paradoxal e irrisória
das práticas dos povos famintos, que enchem o estômago para impor
silêncio ao sofrimento).
Sabedoria do corpo, loucura da cultura?
Surge assim uma questão crítica: a da relação, na alimentação
humana, entre o que é bom e o que é saudável, ou seja, entre o
prazer e as "necessidades".
Os fisiologistas asseguram-nos que o prazer desempenha "um papel
psicológico" (ver, por exemplo, Cabanac 1971). Por outro lado, vários
indicadores parecem mostrar que o ser humano possui mecanismos
de regulação da alimentação muito sofisticados e precisos. Sabemos,
de facto, que existe uma "sabedoria do corpo", segundo a fórmula de
Cannon (1932), ou seja, um conjunto de "processos fisiológicos
complexos e coordenados que mantêm estados estáveis no
organismo". Sabemos que existem mecanismos de fome-
saciedade, baseados em sinais de feedback internos ou psico-
sensoriais, que, consoante a quantidade e a frequência da nossa
ingestão alimentar, mantêm a composição e as reservas energéticas
do organismo (Le Magnen 1976, Rozin
6. 1976). Sabemos também que existem mecanismos de "fome
específica" que, em determinadas situações e/ou no caso de alguns
indivíduos, tendem a compensar os défices nutricionais ou a manter o
equilíbrio (por exemplo, a fome específica de sal no caso dos
adisonianos; ver Rozin 1976).
Clara Davis, numa série de experiências famosas realizadas a partir
do final dos anos 20, parece ter conseguido demonstrar que a
criança p e q u e n a "sabe" ajustar a sua alimentação às suas
necessidades. Crianças mal desmamadas foram submetidas a um
regime de "self-service" (dieta de cafetaria) durante vários meses.
Foi-lhes apresentado um tabuleiro com cerca de vinte pratos
diferentes, entre os quais podiam escolher livremente e em
quantidade ilimitada. As crianças passaram por dois ciclos.
Mostraram preferências muito fortes, ao ponto de, por vezes,
comerem apenas um alimento durante vários dias. Mas estas
variações, a longo prazo, eram sempre equilibradas, compensadas
por outras, embora, no conjunto, as escolhas efectuadas estivessem
de acordo com o equilíbrio nutricional (Davis 1928, 1935 e 1939) (2).
Estamos, portanto, perante uma situação paradoxal: se existe
realmente uma "sabedoria do corpo" aperfeiçoada em matéria de
alimentação, como explicar que as pessoas comam cada vez mais do
que necessitam, ou mesmo muito mais do que a sua boa saúde
exigiria?
Parece que, na liberdade conferida pela nova abundância, o homo
sapiens procurou o prazer sem se preocupar com as exigências
fisiológicas (3); em suma, "esqueceu" o princípio da realidade
biológica, provocando um curto-circuito nos sinais de saciedade.
Parece que, nas nossas sociedades, os "sinais externos" (Nisbett e
Schaechter) que solicitam incessantemente o nosso apetite
proliferaram ao ponto de nos impedirem de escutar os sinais internos
de saciedade e de repleção.
Pierre Aimez (1979) recorda que os dados disponíveis parecem
indicar que a sensação de fome seria de algum modo "primeira"; que
a saciedade resultaria, portanto, de uma inibição desta "pulsão". Se
isto for verdade, o que seria necessário explicar não seria
7. não é tanto o apelo lancinante e extemporâneo da fome, mas antes o
silêncio ou a fraqueza dos sinais inibitórios.
O tipo de explicação que surge espontaneamente, o mais frequente,
é bem ilustrado neste texto do fisiologista L. Beidler (1975): "Os
padrões culturais destruíram a capacidade do homem de equilibrar a
sua dieta da forma mais benéfica para a sua saúde e longevidade".
Por outras palavras: a cultura desarranja ou perverte a natureza; a
"sabedoria do corpo" é ridicularizada pela "loucura da cultura". Neste
tipo de explicação, a que poderíamos chamar neo-rousseauniana, a
"desordem" alimentar resulta de uma espécie de lento processo de
sedimentação, a "cultura" sobrepondo-se lentamente à "natureza",
enterrando lentamente os últimos resíduos arcaicos.
No entanto, o que a análise parece mostrar (ver abaixo) é que, se as
mudanças socioculturais recentes contribuíram obviamente para a
geração do fenómeno em questão, não é a evolução cultural em si
que contribui para a rutura dos mecanismos de regulação, É antes
a crise da cultura nos países desenvolvidos e, em particular, a rutura
ou a desconstrução dos sistemas normativos e dos controlos sociais
que regiam tradicionalmente as práticas e as representações
alimentares (gastro-nomias, no sentido etimológico do termo). Está a
emergir uma crise multidimensional do sistema alimentar, com os
seus aspectos biológicos, ecológicos, psicológicos e sociológicos, e
esta crise faz parte de uma crise de civilização.
Em segundo lugar, como também veremos, esta crise da alimentação
moderna, longe de se basear num "esquecimento", numa fossilização
do biológico sob sedimentação cultural, envolve muitas vezes, pelo
contrário, um regresso súbito, uma manifestação "selvagem", de
certos mecanismos fundamentais, activados ou reactivados pelos
desenvolvimentos mais recentes da modernidade.
Surgem aqui duas grandes questões, ainda sem resposta. Em
primeiro lugar, a questão da relação entre a evolução biológica e a
evolução cultural. A cultura injecta "ruído" ou
8. informação, desordem ou ordem, nos sistemas alimentares, mas
Em que condições? Os dados de que dispomos são contraditórios e
as posições são contraditórias.
Vários estudos antropológicos modernos fornecem-nos um número
crescente de exemplos de uma hipotética "sabedoria das culturas"
que poderia basear-se em processos evolutivos de natureza
selectiva. Certas práticas alimentares ou culinárias corresponderiam,
ao que tudo indica, a uma "funcionalidade" inconsciente de ordem
fisiológica ou ecológica (Katz et al. 1974, Katz 1979).
A antropologia ecológica, por outro lado, pode certamente lançar luz
sobre alguns aspectos das práticas alimentares, analisando-as em
termos de ajustamento aos constrangimentos do ecossistema, como
estratégias (conscientes) ou processos (inconscientes) de adaptação.
Outras correntes, em particular o controverso "materialismo cultural"
(ver especialmente Harris 1977, Ross 1978), vêem a cultura como
uma espécie de superestrutura e consideram que a infraestrutura é
constituída pela "maximização" da relação custo/benefício económico
e ecológico implícita nas práticas e representações culturais. Assim,
por exemplo - para esquematizar a análise de Harris, mesmo
correndo o risco de a caricaturar - a sacralidade da vaca na Índia
permitiria de facto às massas de camponeses pobres criar os bois de
que necessitam para lavrar os campos. Se o consumo de carne de
bovino fosse autorizado, a tentação de destruir os efectivos bovinos
seria efetivamente grande.
Na maior parte dos casos, porém, parece que
e n c o n t r a m o s apenas uma coerência interna, sui generis,
em sistemas de regras ou de representações, estruturas que não
vemos claramente como ligar ao biológico, a não ser que recorramos
à intermediação da organização do sistema nervoso central e das
suas implicações cognitivas. Como nos lembra Mary Douglas (1979),
se consideramos a raposa não comestível, não é porque a sua carne
represente um perigo fisiológico para o nosso organismo; a razão
para isso é, muito mais provavelmente, o lugar que lhe atribuímos na
ordem global que a nossa cultura atribui ao universo, na taxonomia
das espécies que estabelecemos para
9. determinam o puro e o impuro, o comestível e o não comestível. No
entanto, é fácil para os estruturalistas mostrar que esta taxonomia
tem aparentemente pouco a ver com a taxonomia que a ciência
estabelece por si própria. E, de facto, são inúmeros os casos de
práticas e representações alimentares cujo efeito é nutricionalmente
nocivo ou mesmo catastrófico, como assinala De Garine (1979) ao
ilustrar aquilo a que chama "o arbitrário cultural".
No entanto, continua a não ser claro como é que essa arbitrariedade
cultural pode escapar completamente às restrições biológicas. Parece
razoável pensar que um grupo humano não poderia sobreviver a
longo prazo e reproduzir-se como um grupo cultural se as categorias,
normas e representações alimentares que impõe aos seus membros
excederem radicalmente as capacidades de ajustamento humano e
as restrições do ecossistema.
De facto, a capacidade de adaptação biológica do homem parece ser
frequentemente maior do que se pensa e a sua maleabilidade cultural
muito menor. Assim, o facto de o homem sobreviver em condições
ecológicas extremas nem sempre pode ser explicado exclusivamente
por fenómenos de adaptação cultural (por exemplo, através de
inovações tecnológicas). Conhecemos agora casos em que é
necessário admitir que eles devem a sua sobrevivência àquilo a que
Cavalli-Sforza chama plasticidade genotípica, ou seja, "a propensão
de um traço genotípico para ser afetado pela pressão ambiental
sobre a sua expressão fenotípica" (Siccardi e Ananthakrishnan 1972).
Talvez seja este tipo de plasticidade que explica o facto de certos
grupos humanos com dietas pobres, pelo menos de acordo com os
"padrões nutricionais" definidos por nutricionistas e organizações
internacionais, serem, no entanto, muito fortes (ver De Garine 1979).
Simetricamente, alguns traços culturais revelam uma permanência
surpreendente. Assim, os Yakuts, tendo sido caçadores nas estepes
da região do lago Baikal, continuaram a investir recursos e esforços
na criação de cavalos, que atualmente lhes são de pouca utilidade
(Forde, citado por Barrau 1974).
10. No entanto, numa sociedade humana com práticas culturais
disfuncionais, biológica ou ecologicamente prejudiciais, seria
certamente legítimo esperar encontrar processos de correção,
ajustamentos conscientes ou inconscientes, inovações ou
reequilíbrios em ação.
Surge uma segunda questão: se se aceita que existe um "ruído"
cultural no sistema alimentar e que esse ruído é capaz de
desorganizar a maquinaria biológica, os dispositivos homeostáticos
internos, então resta perguntar através de que processos e
mediações isso ocorre. Se, neste caso, o equilíbrio nutricional é
realmente regulado de forma tão precisa, se a reposição das reservas
tem de facto um efeito sobre o comportamento alimentar, reduzindo
ou inibindo o apetite,
Como é que as representações podem atuar sobre este sistema
biológico, como é que o podem desalinhar? No estado atual dos
conhecimentos, parece que não temos praticamente nenhuma
indicação sobre a possível natureza deste elo perdido (cf. Piattelli-
Palmarini 1979).
O Homo sapiens na era industrial
De facto, para compreender por que razão e como os dispositivos
biológicos estão a falhar cada vez mais em evitar que o homem nas
civilizações "famintas" coma demasiado e demasiado mal, pode ser
necessário simplesmente admitir que estes dispositivos são mais
eficazes e mais precisos para corrigir uma deficiência e lidar com
uma deficiência do que para refrear um excesso; que as
possibilidades de aprendizagem, de aprendizagem, são maiores para
a auto-estimulação do que para a "auto-inibição". Talvez o homem
esteja biologicamente mais bem equipado para lidar ativamente com
a insegurança alimentar do que para suportar passivamente uma
abundância uniforme de alimentos, para lidar com flutuações
constantes de recursos do que para viver sem esforço com uma
pletora de bens. O passado filogenético parece atestar este facto.
O Homo sapiens viveu da caça e da coleta durante mais de 99% do
tempo desde o seu aparecimento (Lee e DeVore
11. 1968). Não é, portanto, descabido pensar que um bom número dos
seus traços filogenéticos fundamentais pode ter sido selecionado
durante este período da evolução humana, em função de certos tipos
de ecossistemas, de certos modos de interação com o ecossistema.
Foi certamente o caso dos traços da biologia humana que estão
relacionados com a função alimentar. Haveria, portanto, uma
correspondência, um ajuste, uma congruência, entre estes traços
filogenéticos e um certo tipo de ecossistema: aquele em que se deu a
seleção dos traços em causa, a que Bowlby (1969) chama o
ambiente de adaptabilidade.
No entanto, embora continuemos a depender em grande medida
deste passado filogenético, vivemos há muito tempo em
ecossistemas que só remotamente se relacionam com este ambiente
de adaptabilidade. O Homo sapiens, desde o Neolítico até à
revolução industrial, pouco mudou biologicamente, mas culturalmente
e, sobretudo, no que respeita à relação do homem com o
ecossistema, assistimos a uma verdadeira reviravolta. É portanto
legítimo perguntar se o mundo criado pelo homem moderno é sempre
compatível com a "natureza humana" (Tiger 1978). Se, de facto,
subitamente (à escala do tempo evolutivo, entenda-se), os
próprios fundamentos da adaptação entre o homem biológico e a
esfera eco-cultural são de novo postos em causa, substituídos por
outro tipo de relação, podemos interrogar-nos se esta mudança pode
ameaçar, ultrapassando-as, as capacidades de ajustamento do
organismo. Por outras palavras: a plasticidade do genoma metabólico
não estará cada vez mais sobrecarregada? O ambiente está a mudar
muito rapidamente; o grau de adaptabilidade também está a mudar
consideravelmente. Alguns traços, seleccionados sob o efeito de
certas pressões, poderiam de alguma forma "mudar de sinal" sob
diferentes tipos de pressões.
Assim, para alguns nutricionistas, a propensão para a obesidade,
flagelo das sociedades industriais-urbanas abastadas, pode resultar
da transformação de uma vantagem selectiva numa desvantagem.
Há pessoas obesas que podem, de facto, ser consideradas como
indivíduos cujo metabolismo tem a particularidade de ser
12. Os indivíduos com membros longos e "magros" seriam "gastadores
de energia", na medida em que queimam as calorias em vez de as
armazenar (Payne, comunicação pessoal; ver também Apfelbaum e
Lepoutre). Inversamente, alguns indivíduos "magros" de membros
longos seriam "gastadores de energia", na medida em que queimam
as calorias em vez de as armazenar (Payne, comunicação pessoal;
ver também Apfelbaum e Lepoutre 1978). Os primeiros, numa
situação "selvagem", teriam tido uma vantagem considerável: teriam
podido recorrer às suas reservas de gordura para enfrentar mais
facilmente os períodos "magros". Mas esta vantagem, numa situação
de abundância permanente, transformar-se-ia, por outro lado, numa
desvantagem: as reservas acumular-se-iam sem nunca serem
totalmente utilizadas, conduzindo à obesidade efectiva.
Um segundo exemplo desta "mudança de sinal" é dado pelo
consumo de açúcar e de substâncias de sabor doce (abordei esta
questão mais pormenorizadamente em Fischler 1978).
A apetência específica pelo sabor doce parece ser claramente uma
caraterística com uma forte componente inata. Em todo o caso,
encontra-se em muitas outras espécies para além da nossa, o homo
sapiens, e podemos supor que pode ter sido selecionado num
ambiente onde, como os açúcares de absorção rápida são
relativamente raros, os alimentos de sabor doce eram uma fonte
vantajosa de calorias rapidamente mobilizadas. O sabor doce é um
"sinal inato de calorias" (Le Magnen) e o limiar de saciedade é mais
elevado para os alimentos doces do que para outros alimentos,
provavelmente porque participa num subsistema especializado de
regulação puramente calórica (quantitativa) (Rozin 1976). Isto é
ilustrado pelo facto de, em muitas culturas, os alimentos doces serem
consumidos no final da refeição. Mesmo depois de nos termos
saciado, continuamos a sentir apetite p o r doces (Le Magnen,
comunicação pessoal).
O poder de atração do açúcar é tal que está intimamente ligado a
processos históricos mais vastos. Desde o século XVI, quando se
formou o binómio quase inseparável cana-de-açúcar/escravatura, a
expansão dos territórios colonizados foi acompanhada por uma
expansão das culturas produtoras de açúcar e da escravatura (Deer
1950, Aykroyd 1967, Tannahill 1974).
13. Nas sociedades agrícolas, onde a alimentação se estrutura em torno
de um alimento básico, geralmente rico em hidratos de carbono
(cereais, leguminosas e tubérculos), as substâncias doces eram
ainda relativamente raras, muito apreciadas e o seu consumo estava
sujeito a controlos culturais precisos e rigorosos.
No entanto, há menos de duzentos anos, e com uma aceleração
acentuada no período mais recente, o açúcar tornou-se excessivo.
Desde 1900, o consumo mundial decuplicou. A combinação do
"apelo" ao açúcar e das sobredeterminações socioeconómicas e
culturais (Fischler 1978; ver infra) conduziu a um desajustamento,
a uma rutura da congruência entre o apetite pelo açúcar, por um lado,
e as capacidades metabólicas, cada vez mais sobrecarregadas, por
outro (4). Este fenómeno desempenha, sem dúvida, um papel não
negligenciável na geração da totalidade ou de parte das patologias
"civilizacionais" ligadas à alimentação. O excesso de açúcar, ao
fornecer um aporte calórico importante e rapidamente absorvido face
ao baixo gasto energético dos citadinos sedentários, contribui para
o aumento excessivo de peso e para a obesidade, ela própria um
fator de risco ou de agravamento na etiologia das doenças
cardiovasculares, da diabetes e da hipertensão. Além disso, o
excesso de açúcar é diretamente responsável pela propagação
considerável de cáries dentárias.
Estamos, portanto, na presença de uma espécie de paradoxo crítico
da evolução bio-cultural. Uma "exigência" biológica selecionada numa
fase anterior da filogénese desempenhou claramente um papel
ativo em certos desenvolvimentos sócio-económicos e sócio-
históricos que tendiam a satisfazê-la. Mas estes desenvolvimentos
tornaram-se tão extensos que, desde então, o próprio dispositivo
biológico ameaça aquilo que protegia. A apetência biológica pelo
açúcar e a disponibilidade ilimitada deste produto formam, em todo o
caso, uma amálgama crítica, de tal modo que todos os controlos
socioculturais que poderiam ter estado envolvidos na regulação do
seu consumo, já muito enfraquecidos p e l a civilização moderna
(voltaremos a este ponto em pormenor mais tarde), se desintegram,
acelerando assim a reação em cadeia.
14. O caçador omnívoro
O açúcar desempenha um papel importante na "desordem" alimentar
contemporânea. Mas será que os fenómenos que tentámos analisar
podem ser extrapolados para a alimentação como um todo ou para
outros aspectos da mesma?
Segundo Sdrobici (1972), "o drama biológico do homem" é o facto de
a mensagem genética "limitar as suas capacidades metabólicas, mas
deixar livre a sua escolha alimentar". Seguindo a mesma linha de
raciocínio, devemos ver que, antes de se tornar um "drama
biológico", esta caraterística pode muito bem ter sido uma bênção
durante muito tempo.
Esta (relativa) liberdade de escolha é, de facto, caraterística do
omnívoro em que se transformou o primata ancestral (5), ao tornar-se
predador e caçador, abandonando o vegetarianismo e abrindo, ao
mesmo tempo, caminho a formas de organização social mais
refinadas e mais cooperativas (Tiger e Fox 1971).
Desde então, este antepassado do homem tem sido capaz de fazer
face a uma gama quase ilimitada de situações ecológicas. O facto de
ser omnívoro implicava, com efeito, uma liberdade considerável
obtida a um preço mínimo. O preço é a exigência de variedade: o ser
humano omnívoro só pode obter os nutrientes de que necessita para
sobreviver (vitaminas, aminoácidos essenciais, etc.) a partir de uma
gama bastante vasta de alimentos (Gaulin 1979). A liberdade é
precisamente a possibilidade de escolha, cuja extensão permite uma
adaptabilidade considerável às flutuações dos recursos alimentares.
Ligado a este binómio constrição/liberdade está o "paradoxo do
omnívoro" (ver Rozin 1976). O omnívoro está constantemente sujeito
à tensão de duas tendências contraditórias. Por um lado, deve
inovar, experimentar novas substâncias alimentares (neofilia),
precisamente para satisfazer as suas necessidades metabólicas
variadas e para se adaptar às mudanças ecológicas. Por outro lado,
isso expõe-na a riscos (a possível toxicidade de géneros alimentícios
desconhecidos). Por conseguinte, deve, ao mesmo tempo, ser capaz
de superar ou evitar esses riscos.
15. Os riscos e, por conseguinte, desconfiar dos alimentos
desconhecidos (neofobia), aprender a evitar ou a rejeitar os alimentos
tóxicos. Esta tensão constante entre o desejo de inovação e o medo
da novidade dá origem a uma ansiedade que é, sem dúvida,
consubstancial ao estado omnívoro. Veremos mais tarde que,
paradoxalmente, esta ansiedade fundamental é reactivada de forma
paroxística pela modernidade alimentar.
O homem, enquanto caçador-recolector, parece ser capaz de
satisfazer, em geral, bastante bem a procura de variedade. Por um
lado, a recolha parece permitir-lhe obter um leque de alimentos
provavelmente mais variado e abundante do que se pensou durante
muito tempo (Gaulin 1979, Lee e De Vore 1968, Sahlins 1972): frutos
e bagas, mas também larvas e pequenos animais; depois,
leguminosas, tubérculos; eventualmente gramíneas selvagens, etc.
Para além disso, a caça fornece, de forma mais ou menos irregular,
recursos proteicos suplementares. Mas o consumo de caça grossa
levanta o problema vital da corrupção alimentar. A menos que
existam técnicas de conservação aperfeiçoadas (secagem, fumagem,
salga, etc.), a escolha é entre comer o mais possível no local onde a
presa é obtida ou deixar os restos apodrecerem. Daí, segundo Lorenz
(1969), as "orgias" de carne, durante as quais os homens armazenam
no seu corpo o máximo de proteínas possível. Haveria, em suma,
uma vantagem selectiva na gula. Na ausência de reservas
alimentares, o consumidor arcaico de alimentos podia constituir
reservas internas, pelo menos simbólicas.
Revolução/regressão neolítica
O aparecimento da agricultura, há algumas dezenas de milhares de
anos, aumentou, sem dúvida, a quantidade global de recursos
alimentares; aumentou também as possibilidades de armazenamento
(cereais e gado). Mas, provavelmente, a agricultura também tende,
como salienta Gaulin (1979), a reduzir a gama de alimentos
consumidos e a introduzir uma monotonia crescente na dieta
humana. Além disso, o sistema alimentar baseado na produção
agrícola está a tornar-se cada vez mais frágil, uma vez que
16. pelo menos nos territórios pobres, como resultado do processo de
especialização crescente ligado à produção agrícola. Esta "lenta
marcha para a especialização do progresso agrícola, que (...)
começou no saltus (6) do crescente fértil durante o período neolítico"
(Barrau 1974), significa que a alimentação se baseia cada vez mais
num produto de base, geralmente rico em hidratos de carbono:
cereais sob a forma de papas, bolos, biscoitos, pão; batatas ou
tubérculos diversos; alfarroba, etc. Este produto de base, que é
também a cultura de base, é acompanhado, mais ou menos
frequentemente e mais ou menos abundantemente, consoante as
circunstâncias, por uma carne dominante proveniente da criação de
gado. A oposição alimento básico/complemento ou alimento de
prazer (a carne em particular) encontra-se na distinção tradicional
chinesa entre fan (o grão, ou seja, o arroz, considerado como "o que
nutre") e ts'ai (legumes e carne que animam o fan; em suma, a parte
de prazer da refeição) (Chang 1977). Desde então, qualquer crise de
produção de produtos de base tem consequências catastróficas: a
subnutrição de populações inteiras, a fome. Mais
f r e q u e n t e m e n t e , são os " complementos" do alimento básico
que estão em falta. É então a subnutrição qualitativa que se propaga,
porque a exigência de variedade não foi satisfeita (carências
vitamínicas, proteicas ou de aminoácidos essenciais, com as doenças
que daí resultam). Assim, as sociedades agrícolas, ao reduzirem
parcialmente a flutuação dos recursos ou, pelo menos, a
irregularidade d o s ciclos alimentares, introduziram o risco de crises
com consequências catastróficas.
Neste sentido - o de um estreitamento do leque alimentar, de uma
perda relativa de complexidade devido à especialização progressiva
e, consequentemente, de uma fragilidade acrescida do sistema
agroalimentar - pode talvez dizer-se que a revolução neolítica é, em
certos aspectos, uma regressão.
No entanto, como vimos, o processo de especialização é lento. E,
nas sociedades agrícolas que sobreviveram no Ocidente até muito
recentemente, a alimentação faz parte de ecossistemas domésticos
diversificados (Barrau 1974, Harris 1969), pelo menos na maioria dos
casos: policulturas, pequenas p a r c e l a s de terra, cultivo de
uma diversidade e variedade de culturas (Barrau 1974, Harris 1969).
17. Exceptuam-se, no entanto, certos produtos que já tinham um valor de
troca e cujo sistema de produção e de distribuição funcionava, desde
muito cedo, a uma escala inter-regional ou mesmo internacional. É o
caso das especiarias, evidentemente, mas também do açúcar (cujo
estatuto, até à "revolução doce" do século XIX, pouco diferia do das
especiarias) e, em certa medida, do sal. São produtos que vêm do
estrangeiro, literalmente para apimentar a monotonia da alimentação.
Uma vez que as práticas alimentares assim ligadas à produção local
permanecem fortemente limitadas, caracterizam-se por uma grande
rigidez e repetitividade, que só são atenuadas por dois outros
elementos. Em primeiro lugar, no ecossistema doméstico
diversificado, estão disponíveis múltiplas sub-variedades de espécies
consumíveis, o que permite uma variação subtil dos sabores (Barrau
1978 e comunicação pessoal). Mas, acima de tudo, o que atenua
esta monotonia é o regime de alternância, o carácter cíclico muito
marcado da alimentação. Os ciclos estão sujeitos a condicionalismos
ecológicos e culturais: épocas de produção e de escassez de
alimentos, períodos de escassez e de abundância, períodos de
trabalho intenso e períodos de repouso relativo, celebração de rituais
ligados aos grandes trabalhos agrícolas, festas e jejuns religiosos,
festividades diversas, etc. A vida quotidiana é assim pontuada por
pausas, quer restritivas (jejuns, "vigílias"), quer festivas, em que as
pessoas se embriagam literalmente com iguarias ricas e raras,
nomeadamente carnes gordas, como no caso dos caçadores que
regressam de uma campanha bem sucedida, mas também com
álcool.
Os condicionalismos socioculturais são poderosos e complexos. As
gramáticas culinárias, os princípios de associação e exclusão entre
diferentes alimentos, as prescrições e proibições tradicionais e/ou
religiosas, os rituais de mesa e de cozinha estruturam a
alimentação quotidiana. A utilização dos alimentos, bem como a
ordem, a composição e o horário das refeições, são codificados com
precisão. Um certo número de "marcadores" gustativos afirmam a
identidade alimentar, imprimindo firmemente a pertença culinária a
um território local, em
18. Em particular, a utilização exclusiva de uma gordura culinária
específica. A este respeito, os historiadores demonstraram a
grande estabilidade e rigidez do que designam por "gorduras
alimentares": azeite no Sul do Mediterrâneo, banha ou manteiga no
Ocidente, etc. (Febvre 1938).
A exigência de variedade e de liberdade de escolha, juntamente com
o paradoxo neofilia/neofobia, gerador de ansiedade (mas protetor e,
sem dúvida, criativo), apontam para uma constante. Esta constante é
o facto de a história alimentar do filo humano ser marcada, não por
uma penúria permanente, mas pela flutuação qualitativa e
quantitativa dos recursos; pela alternância de períodos "gordos" e
"magros" e pelo consumo de espécies diferentes; pelo carácter
cíclico, mais ou menos irregular, da alimentação (estações e
pluviosidade, alterações climáticas, caprichos e sorte da caça,
incertezas da produção agrícola, catástrofes naturais ou militares,
etc.). É esta periodicidade flutuante e esta insegurança radical que
constituem o ambiente de adaptabilidade da alimentação humana.
No entanto, dentro de algumas décadas, a revolução industrial, a
especialização e o aumento dos rendimentos da produção agrícola e
o desenvolvimento hipertrófico das cidades criarão uma modernidade
alimentar que irá perturbar ou mesmo subverter completamente a
relação do homem com a sua alimentação. No passado, reinava a
insegurança do abastecimento e a estabilidade da utilização. A
modernidade alimentar traz uma pletora, um afluxo contínuo de
alimentos que parece inesgotável, mas também uma mudança
acelerada e uma crise nos usos da cozinha e da mesa. Com a
modernidade alimentar vem a crise moderna do regime.
Modernidade alimentar
Na era industrial, a modernização da agricultura (através de uma
especialização crescente) e depois a industrialização agroalimentar
eliminaram o "espetro da fome" nos países ricos. O homem ocidental
pôde satisfazer cada vez mais
19. Os desejos alimentares do mundo desenvolvido estão a aumentar e a
exprimir-se cada vez mais livremente. No mundo desenvolvido, o
consumo de alimentos "excepcionais" aumentou fortemente em todo
o lado, enquanto o consumo de alimentos de "necessidade" diminuiu
(Claudian e Serville). O consumo de carne, de açúcar, de produtos
gordos, de lacticínios e de frutos frescos aumentou, sobretudo a partir
da Segunda Guerra Mundial, na maior parte dos países ocidentais,
ao contrário do consumo de cereais (pão), de leguminosas secas e
de outros alimentos de primeira necessidade. Como muitos autores já
r e f e r i r a m , não é o pão que ganhamos com o suor do nosso
rosto, mas sim o bife.
O tempo e o trabalho necessários para preparar os alimentos no
passado foram consideravelmente reduzidos. As novas técnicas de
conservação, a extensão e o aperfeiçoamento da indústria
agroalimentar (conservas, congelação, pasteurização, liofilização,
liofilização, novas embalagens de todos os tipos) afastaram
definitivamente o perigo imemorial da corrupção biológica dos
géneros alimentícios e tendem cada vez mais a transferir para a
fábrica as tarefas que outrora eram realizadas na cozinha. A
distribuição moderna, ao utilizar plenamente os transportes mais
rápidos, permite o consumo dos mais diversos alimentos sem
qualquer restrição de origem, estação ou clima. Morangos (de Israel
ou da Califórnia), feijão verde (da África do Sul ou do Senegal),
abacates ou frutos exóticos são cada vez mais comuns nas mesas
europeias.
Assim, no espaço de algumas décadas, uma parte da humanidade
viu-se com todas as facilidades alimentares com que o seu
antepassado paleolítico poderia ter sonhado. E, de facto, é um
verdadeiro sonho alimentar de caçador-recolector que realizamos
diariamente, mesmo sem nos preocuparmos com isso: carne em
todas as refeições, frutas e legumes à vontade e durante todo o ano,
gorduras e uma variedade de doces, etc. Abolimos a alternância
entre gordura e gordura; a gordura tornou-se o pão nosso de cada
dia. Na sociedade urbana, abolimos mesmo a própria alternância;
segundo uma fórmula utilizada por Edgar Morin noutro contexto,
substituímos a alternância pela alternância.
20. e, pela primeira vez, esquecemos o nosso sentimento de insegurança
alimentar.
Mas nesta nova liberdade e segurança estão também as sementes
de uma ansiedade e insegurança igualmente novas.
Os antigos ecossistemas domésticos diversificados deram lugar a
outros ecossistemas hiper-especializados ou "hiper-homogeneizados"
(Barrau). Poder-se-ia mesmo afirmar, no limite, que os ecossistemas
domésticos praticamente desapareceram enquanto tais. As
paisagens agrícolas modernas são, em grande parte, constituídas por
vastos campos de monoculturas, que são o resultado final dos
processos de especialização iniciados no Neolítico. Os territórios
fazem agora parte de vastos sistemas de produção agroalimentar à
escala internacional, em vez de subsistemas locais ou regionais. No
domínio alimentar, isto significa, em suma, uma inversão da
situação anterior: muitos alimentos essenciais, como era o caso no
passado das especiarias, provêm agora do estrangeiro, no quadro de
um sistema de produção e de distribuição muito mais vasto.
Esta situação tem o efeito de alargar (pelo menos potencialmente) o
repertório alimentar e de reduzir consideravelmente a repetição de
alimentos. Mas também conduz a uma homogeneização dos géneros
alimentícios. Os produtos que encontramos atualmente nos
supermercados são cada vez mais os mesmos de uma região para
outra, ou mesmo de um continente para outro. A variedade intra-
específica dos alimentos vegetais é reduzida. O etnobotânico
Jacques Barrau recorda que, em França, onde no século XIX eram
enumeradas 88 variedades de melões, hoje em dia mal se encontram
mais de 5; que, em 1853, os irmãos Audibert, viveiristas provençais,
propunham 28 variedades de figos para venda, enquanto hoje em dia
mal se encontram mais de 2 ou 3 (Barrau 1978 e comunicação
pessoal).
Com a evolução da produção e da distribuição agroalimentar,
estamos a perder progressivamente qualquer contacto com o
ambiente.
21. ciclo de produção dos nossos alimentos. Cada v e z m a i s ,
p e r d e m o s d e vista a cadeia de operações que leva os
produtos do solo até às nossas mesas. Para dizer a verdade, não
fazemos a mínima ideia da sua verdadeira origem, dos
procedimentos e técnicas utilizados para a sua produção, expedição
e transformação. A sociedade agroindustrial e a cidade
transformaram-nos em "puros consumidores". Começamos agora a
ver como e porque é que, se na situação tradicional, os alimentos
vindos do estrangeiro eram procurados e apreciados, hoje em dia,
cada vez com mais frequência, são os alimentos do "território" local
que são altamente valorizados.
O banquete envenenado
Consciência, crise de confiança: descobrimos que o progresso
tecnológico e industrial é acompanhado por um declínio (real ou
imaginário, real e imaginário) das qualidades gustativas dos
alimentos, por uma estandardização e homogeneização dos
produtos, ou mesmo pelo desaparecimento dos produtos artesanais
(queijo, charcutaria, pão, etc.), a sua substituição por substitutos
industriais e o seu declínio em benefício destes últimos.
A preocupação com a higiene e a pureza assumiu, durante muito
tempo, formas obsessivas, como o demonstram, nomeadamente, o
consumo de massa, sobretudo a partir dos anos 60, as designações
de pureza como a cor branca (pão branco, açúcar branco, vitela
branca, decoração branca das modernas lojas de produtos
alimentares, dos laboratórios de cozinha, das blusas brancas dos
empregados dos supermercados, etc.), a utilização extensiva do
celofane e das embalagens de plástico. A generalização dos
procedimentos de conservação e de higiene e a obsessão
bacteriológica, ao esterilizarem os alimentos, parecem ter esterilizado
também os seus sabores; as embalagens de plástico e o celofane
colocaram os alimentos numa terra de n i n g u é m asséptica, que
os separa ainda mais das suas origens e do seu consumidor.
22. Mas a preocupação com a higiene e a pureza volta a si e amplifica-
se, pois à obsessão da pureza biológica segue-se a obsessão da
pureza química. Descobrimos, com angústia, que o progresso
alimentar, no momento em que aumenta a proteção contra perigos
imemoriais (carências alimentares e corrupção), dá obscuramente
origem a novos perigos. Os alimentos embrulhados em celofane,
empilhados nas gavetas dos frigoríficos dos supermercados, ou
alinhados em prateleiras intermináveis, são cada vez mais, aos
nossos olhos, um objeto desconhecido, provavelmente cheio de
venenos misteriosos, um objeto reduzido à sua aparência ou, pior
ainda, um engodo. Descobrimos, então, que o belo e o bom já não
se encaixam, que já não combinam; os frutos sumptuosos que
mastigamos estão impregnados de pesticidas, manchados de
silicones, e são também insípidos. Verifica-se que os alimentos mais
familiares, mais quotidianos, se revelam enganadores: descobrimos
que os hambúrgueres contêm pouca ou nenhuma carne; que os
vinhos são "cortados", adoçados, sulfurados; que os frutos são
"tratados". Ficamos a saber que existem "aditivos" misteriosos:
conservantes, corantes, "agentes texturizantes", "agentes
aromatizantes", etc. De facto, a tecnologia alimentar conseguiu hoje
manipular e controlar à vontade todas as características em que se
baseia o nosso reconhecimento dos alimentos: forma e aspeto,
textura, cor, cheiro, sabor. Este poder é usado e abusado para
estimular o consumo.
A utilização do açúcar na indústria alimentar moderna é
particularmente ilustrativa a este respeito.
As investigações dos psicofisiologistas mostraram, como já vimos,
que a atração pelo sabor doce é em grande parte inata. Se forem
apresentadas a um recém-nascido duas soluções, uma açucarada e
outra não açucarada, ele beberá voluntariamente mais da primeira e,
se ambas forem açucaradas, consumirá mais da solução com maior
concentração. Além disso, aceita soluções com sabor amargo ou
azedo (mesmo muito fortes, inaceitáveis para um adulto) desde que
lhe seja adicionado açúcar. Assim, o sabor doce aparece como uma
espécie de sinal de aceitação e como um sinal que tende a aumentar
a quantidade ingerida (Desor, Maller e Andrews 1975; Maller e Desor
1974; Desor, Maller e Turner 1973).
23. Nos últimos tempos, o aumento maciço do consumo de açúcar nos
países ocidentais baseou-se quase exclusivamente no consumo do
chamado açúcar "invisível", ou seja, o açúcar que é introduzido
n o s alimentos preparados pela indústria alimentar. Assim,
produtos que, de acordo com as nossas categorias culturais, são
mais salgados do que doces, contêm, no entanto, quantidades
significativas de açúcar. O ketchup Heinz, de acordo com a sua
composição, contém 27% (Que choisir?, dezembro de 1978). O
açúcar encontra-se também em grandes quantidades na maionese e
nos enchidos industriais. É evidente que este açúcar foi concebido
para nos fazer comer mais. Ao ser introduzido em alimentos que
classificamos como "salgados", o sinal açucarado só é percebido
subliminarmente, de modo que a mecânica biológica é activada sem
que as censuras sociais sejam alertadas, sem que os códigos e
normas culturais sejam aparentemente atacados, quando na
realidade estão a ser profundamente transgredidos, através, neste
caso, da oposição-incompatibilidade radical entre doce e salgado.
O consumidor moderno de alimentos já não sabe literalmente o que
come. As suas pistas e critérios mais fundamentais estão confusos,
enganados e distorcidos. A sua consciência crescente das
manipulações exercidas sobre os géneros alimentícios corroeu a sua
confiança; assim, ele prova os alimentos mais comuns com a
ansiedade e a reticência inquietante que manifestaria perante uma
cozinha desconhecida. Encontra-se como que dominado pelo velho
fantasma da "incorporação do mau objeto", como que aprisionado de
novo por uma "neofobia" que se exerceria mesmo contra o alimento
mais familiar. Entre o consumidor de alimentos e o seu alimento, já
não existe qualquer laço de pertença comum; já não existe aquela
ligação que ligava o consumidor e o alimento a um mesmo nicho
ecológico ou a um mesmo território. A comida, para o dizer
corretamente, tornou-se um objeto sem história conhecida, um
artefacto que flutua num vazio quase sideral, entre o passado e o
futuro, ao mesmo tempo ameaçador e fascinante.
Assim, a tecnologia alimentar, apoiada pelas forças combinadas do
marketing e da publicidade, provoca um curto-circuito nos quadros
culturais da alimentação, nas gramáticas culinárias, e perturba o que
é não só cultural, mas também culinário.
24. o que é mais fundamental na alimentação, na biologia das escolhas
alimentares. Mas se os códigos, as regras e as normas que
enquadram culturalmente o ato de comer podem ser tão facilmente
desrespeitados ou subvertidos, é sem dúvida porque já estão
enfraquecidos, fissurados e perturbados.
As divisões sociais correspondiam tradicionalmente a divisões
alimentares, codificações simbólicas da alimentação. Por exemplo,
para a infância (e para as mulheres, essa "eterna criança"): leite, mel,
doces; para os homens: carne vermelha viril, álcool de alto teor
alcoólico. Assim, entre outros ritos de passagem que sancionavam o
acesso ao mundo adulto, havia, nomeadamente, a renúncia aos
doces, ou seja, à doçura da infância e dos cuidados maternos. Era
necessário passar da dependência à independência, passar por um
segundo desmame. Mas acontece que todas as divisões sociais são
abaladas. Os papéis sociais são postos em causa; as imagens
tradicionais da virilidade e da feminilidade, mas também as da
infância e da adolescência, são esbatidas. Desde então, o encaixe
perfeito entre as "grelhas sociais" e as categorias alimentares foi
perturbado. Todo o sistema de "codificação" alimentar está sujeito a
tensões. Assim, se nos cingirmos às referências tradicionais,
teríamos de dizer que a comida masculina é "desvirilizada", que a
comida adulta é "infantilizada" e/ou "feminizada". Há uma vacilação
generalizada, uma crise dos códigos e das representações
alimentares, que reflecte uma crise mais geral da cultura e da
civilização, dando lugar a uma crise biocultural da alimentação.
A crise dos ritmos alimentares: o império dos snacks
No passado, o dia de trabalho era regido pelo ritmo dos rituais
alimentares colectivos: pequeno-almoço, almoço, jantares de família,
etc. Hoje em dia, é cada vez mais a alimentação que está sujeita às
exigências do trabalho; com a jornada de trabalho contínua e as
pausas programadas, generaliza-se cada vez mais uma espécie de
taylorismo alimentar, tanto na fábrica como no escritório.
25. As refeições em família são diretamente afectadas por este domínio
crescente do mundo do trabalho. Os rituais das refeições com outras
pessoas estão a desmoronar-se e a comida está a tornar-se
individualizada. O consumidor moderno de alimentos é um
consumidor solitário. Tanto mais que estas novas exigências da
modernidade alimentar são duplas, pois permitem uma nova
liberdade individualista e transgressiva num sentido regressivo, uma
liberdade em relação à qual estas exigências aparecem
simultaneamente como a verdadeira causa e o principal álibi.
Os conteúdos do comer coletivo ligados às refeições com comensais
são descartados e decompostos na restauração e no consumo
funcional, industrializado e m a s s i f i c a d o (cantinas, fast-food,
self-service, etc.). Mas, ao mesmo tempo, este universo da
alimentação moderna encarna a liberdade de comer fora das
exigências e das regras da sociabilidade alimentar, fora das
constrições cronológicas, fora dos horários familiares, fora das
exigências rituais estabelecidas. Encarna a satisfação de uma gula
infantil (se não infantilista) (7) em que o doce (hambúrgueres, sandes,
gelados monumentais) triunfa sobre a comida, em que o elemento
fetichizado triunfa sobre o todo organizado.
Um fenómeno importante: a comida, ou seja, a forma altamente
socializada e codificada do ato de comer, tende cada vez mais, nos
padrões alimentares, a recuar perante, ou a concorrer com, um tipo
de alimentação baseado naquilo a que em inglês se chama snacking
(em francês, talvez por repugnância, este termo não tem equivalente,
pelo menos eu não o conheço), ou seja, um modo de comer
fraccionado, baseado em múltiplas ingestões, num mordiscar
constante, que escapa, consequentemente, às exigências e controlos
socioculturais tradicionais.
De acordo com alguns estudos americanos, a refeição em grupo com
comensais está praticamente a desaparecer nos Estados Unidos.
Nas famílias urbanas de classe média, os membros só se sentam
juntos à mesa de jantar duas ou três vezes por semana e, nesse
caso, a refeição dura apenas vinte minutos. Os mesmos estudos
mostram que a média de
26. O número de contactos alimentares durante o dia é de cerca de vinte,
e o suposto ritmo de três refeições por dia é apenas um vestígio
(Fine, citado por Hess 1977). Fenómenos talvez da mesma ordem,
embora em menor escala, são também observados na Europa.
Estudos realizados nos Países Baixos revelaram uma taxa média
diária de contacto com os alimentos que é metade da dos Estados
Unidos (Jorritsma, comunicação pessoal). De uma forma mais geral,
para ver a amplitude do fenómeno, basta olhar para a expansão do
mercado dos doces (doces e salgados), ou seja, dos alimentos
destinados a "mordiscar" (batatas fritas, bolachas estaladiças,
rebuçados, chocolates, barras de chocolate, pastilhas elásticas,
bolachas e pastelaria industrial, etc.). As refeições em restaurantes
são muitas vezes substituídas por uma alimentação baseada no
agarrar aqui e ali, no petiscar mais ou menos compulsivo, ou em
pratos únicos que constituem, por si só, uma digestão alimentar
(sanduíches, misturas de fiambre e queijo, pizzas, crepes, saladas
com vários ingredientes, hambúrgueres e cachorros quentes) (8).
Deste modo, o comer moderno coloca-se fora do quadro das regras
alimentares estabelecidas; liberta-se das exigências sintácticas do
comer com os comensais; e, ao evoluir (ou regressar) do
sintagmático para o paradigmático, escapa aos controlos sociais. No
decurso deste processo, cai de imediato na esfera quase exclusiva
do indivíduo e massifica-se; a comunicação e a comunhão alimentar
dão lugar a o prazer solitário das massas.
Comensalismo e alimentação vagabunda
A oposição entre alimentação estruturada e petiscar corresponde a
categorias de comportamento alimentar conhecidas em etologia. Bilz
(1971), por exemplo, distingue dois grandes tipos de comportamentos
deste tipo, designados por comensalismo e vagabundismo,
respetivamente. Entre os primatas, os predadores sociais comem em
grupo, de acordo com uma ordem bem estabelecida, obedecendo a
uma hierarquia (os indivíduos dominantes ficam com os melhores
bocados ou são servidos primeiro); as quantidades ingeridas são
importantes e um longo intervalo separa-os uns dos outros.
27. Estas verdadeiras refeições: é o comensalismo. Os babuínos, quando
mantidos em cativeiro num recinto, adoptam este tipo de
comportamento. Na natureza, pelo contrário, são mais propensos a
uma alimentação vagabunda. Alimentam-se de forma solitária,
em intervalos irregulares e menos espaçados, retirando pequenas
quantidades ao acaso das suas deambulações. No entanto, as
espécies filogeneticamente mais antigas (como a tupaya), que
representam atualmente os antepassados sobreviventes comuns de
todos os primatas superiores, incluindo o homem, apenas
apresentam um comportamento vagabundo, mesmo em cativeiro.
Segundo Bilz, os dois tipos de comportamento são reconhecíveis no
caso do homem.
Podemos agora nomear o fenómeno que tentámos caraterizar nas
sociedades humanas mais desenvolvidas: existe nelas uma
tendência preponderante para a alimentação vagabunda, ou seja,
para um tipo de comportamento alimentar filogeneticamente mais
arcaico do que o comensalismo, para um comportamento de coletor
vegetariano e não de caçador. Se isto for verdade, então deve ser
visto como uma confirmação de que o próprio desenvolvimento da
civilização urbano-industrial moderna está a conduzir a um regresso
ao arcaico, a uma espécie de "regressão filogenética". E, de facto,
como vimos, uma tendência dominante da modernidade alimentar
tende a despertar comportamentos errantes e erráticos. Assim, o
supermercado é, sem dúvida, pela sua configuração, um lugar
reservado a um colecionador errante que, ao sabor do seu
movimento, "colecciona" os produtos que encontra entre os milhares
que se encontram nas prateleiras. E esta relação do consumidor com
os produtos, que é ao mesmo tempo uma relação consigo próprio,
desenrola-se num ambiente acolhedor de silêncio e discrição,
cuidadosamente orquestrado pela estratégia comercial moderna, que
já não se baseia apenas no "exagero publicitário" e na sedução ou
intimidação exercida pelo vendedor.
Mas há mais. Bilz também considera que o comportamento
"individualista" dos vagabundos tem um "valor de sobrevivência" em
condições de escassez de alimentos. Compara este comportamento
com o das pessoas que sofrem de anorexia nervosa (as pessoas que
sofrem de anorexia nervosa são quase exclusivamente raparigas).
28. jovens). A anoréxica evita sempre comer com outras pessoas,
sobretudo na presença dos pais, come às escondidas, petisca
enquanto faz outras actividades. Bilz vê aqui, portanto, uma
regressão à caraterística errante da adaptação à fome. Se o
seguirmos e a Demaret (1977), que, alargando as hipóteses de Bilz,
tenta explicar a predominância feminina da anorexia mental do
mesmo ponto de vista, talvez seja necessário admitir que a
civilização da abundância é também, neste sentido, uma civilização
anoréctica. Se os efeitos do desenvolvimento e da crise da civilização
moderna sobre a alimentação conduzem efetivamente a uma rutura
do alimentarismo e favorecem um aumento ou uma escalada
paradoxal da alimentação vagabunda, a questão é saber se este
modo de comer corresponde realmente à anorexia da mulher
anoréctica; se este modo de alimentação corresponde de facto a um
padrão etológico "eficaz" em situações de fome (o que está por
provar, evidentemente), ou seja, tende a maximizar o rendimento
calórico, então podemos imaginar que este tipo de comportamento,
transposto de uma situação de penúria ou de insegurança para uma
situação de abundância uniforme, acarreta perturbações nutricionais
profundas.
Mas, em todo o caso, seja qual for o fundamento de tais
especulações, é evidente que a crise do comensalismo na situação
moderna, que analisámos em termos de etologia (padrões de
comportamento inscritos no filo), de socioantropologia (crise dos
controlos socioculturais) e das interacções entre estas dimensões,
desempenha um papel na desordem da alimentação e na etiologia de
certas "doenças da civilização" ligadas à alimentação. Assim, por
exemplo, os efeitos da cárie provocada pelo açúcar são gravemente
agravados, segundo os dentistas, quando os doces são consumidos
como lanche, fora da refeição (FTC 1978). A crise alimentar tem,
portanto, pelo menos um efeito comprovado: em certas
circunstâncias, agrava as patologias para as quais (provavelmente)
contribuiu.
Gastro-nómica e gastro-anómica
Como já dissemos, a abundância associada à modernidade traz
consigo uma nova liberdade e uma nova insegurança, pois
29. De facto, a dieta torna-se uma questão de escolha individual. Até
então, como o que fazer era ditado pelos recursos disponíveis, pelo
grupo, pela tradição, pelos rituais e representações, a escolha era
auto-imposta. Mas depois volta como um boomerang para o
indivíduo, que passa a ser sobrecarregado por ela como um fardo,
pois agora está literalmente na situação de ter de escolher.
No entanto, este indivíduo, atomizado pela civilização moderna, ou
seja, reduzido ao estatuto de partícula da sociedade de massas, corta
cada vez mais os laços familiares, sociais e culturais tradicionais e
quase não tem indicadores para fazer uma escolha. O novo
comedor-consumidor, como vimos, já não sabe distinguir o
comestível do não comestível, pelo q u e quase acaba por não se
reconhecer a si próprio. Os alimentos que incorporamos em nós
próprios, por sua vez, incorporam-nos no mundo, situam-nos no
universo; e, por isso, o consumidor moderno, ao identificar mal os
alimentos que ingere, tem cada vez mais dúvidas sobre a sua própria
identidade.
A crise (9) dos critérios de escolha, dos códigos e dos valores
alimentares, a crise do simbolismo alimentar, a rutura do
comensalismo, conduzem-nos a essa noção fundamental da
sociologia durkheimiana: a anomia. À medida que o sistema alimentar
nomológico e as "taxonomias" alimentares, que deveriam orientar as
escolhas alimentares, são enfraquecidos ou relaxados, o consumidor
individual de alimentos é deixado à sua própria sorte. É neste sentido
que se pode dizer que, no centro da crise do regime, passámos da
gastro-nómica à gastro-anómica.
É no espaço da anomia que proliferam as pressões múltiplas e
contraditórias exercidas sobre o consumidor moderno de alimentos:
publicidade, meios de comunicação, sugestões e prescrições
diversas e, sobretudo, cada vez mais, advertências médicas. A
"liberdade" anómica é também uma tensão que cria ansiedade, e
esta ansiedade, por sua vez, sobredetermina os comportamentos
alimentares aberrantes.
30. Rumo a novas gastro-nomias?
As gastro-nomias estão em crise; é portanto necessário inventar
novas. Na brecha aberta pela crise do regime alimentar,
contracorrentes dietéticas e estético-culinárias, cliques e sectarismos
alimentares, crenças ou concepções erráticas individuais e colectivas,
fugas contraditórias para o futuro e para o passado, prescrições e
advertências médicas, etc., começam a rodopiar num verdadeiro
movimento browniano.
O mais surpreendente é, sem dúvida, a proliferação simultânea de
receitas e dietas de emagrecimento nos meios de comunicação social
e nas publicações. Sectores inteiros da sociedade estão a fazer dieta
ou a regressar à cozinha, ou as duas coisas ao mesmo tempo (como
se a arte culinária e a dietética procurassem conciliar-se).
Nos sectores sociais "piloto" da sociedade urbana, vemos que a
cozinha, contrariamente à falta de sensibilidade da modernidade
alimentar dominante, volta a ser um elemento central, tanto na arte
de viver como no saber viver.
A grande cozinha, a dos chefes, é novamente elevada à categoria de
arte. Os cozinheiros são estrelas sagradas e as suas criações, tal
como as dos grandes costureiros, são expostas em papel brilhante,
exportadas de um extremo ao outro do planeta, recuperadas,
imitadas e caricaturadas por industriais ou artesãos do novo prêt-à-
porter culinário, vulgarizadas sob a forma de modelos de receitas em
revistas e livros de culinária. Uma nova estética culinária está a
propagar-se. O seu credo é restabelecer a "verdade dos produtos".
O chefe, a partir de agora, seria um maiêutico alimentar, alguém que,
socraticamente, faria com que os pratos revelassem a sua verdade
natural. Rompe assim com o antigo "chef", o sumo sacerdote da
acomodação, o feiticeiro do artefacto, que assegurava o triunfo da
Cultura sobre a Natureza (Fischler 1979).
A própria contracultura (ou a sua posteridade), os herdeiros
envelhecidos do maio de 68, os pioneiros do neo
31. O regionalismo, o ambientalismo e o neo-feminismo, durante muito
tempo anorécticos ou indiferentes, redescobrem a comida ("la
comilona") como base da identidade corporal e cultural, como refúgio
da "festa", da comunhão entre comensais.
Os sectarismos alimentares desenvolvem-se ou despertam, e por
vezes sincretizam-se: vegetarianismo, vegetalismo, macrobiótica,
jejum, etc. No entanto, a sociedade moderna secularizou a dieta
ascética e, no momento da crise alimentar, as dietas estão a
proliferar (10). As numerosas dietas propostas pelos meios de
comunicação e pelas publicações são, sem dúvida, em grande parte,
encantadoras e fantasmagóricas (11), tal como, por outro lado, as
receitas subtis que coleccionamos sem nunca as preparar. Mas
chega o momento de passar à ação: a alternância gordura/leite
restabelece-se, pois é caraterístico dos regimes modernos serem
provisórios.
O regime, ao impor uma norma consensual e ao dar um sentido
transgressor ao desvio, é sem dúvida a tentativa mais clara de
restabelecer a ordem e a gramática na alimentação.
Mas a proliferação contemporânea de dietas de emagrecimento, bem
como a alteração dos valores da estética culinária (leveza, privação,
natural, etc.), remetem-nos para a questão do reequilíbrio, da
regulação e dos ajustamentos culturais.
Em primeiro lugar, verificamos que estão a ser postas em prática
estratégias deliberadas, mas também voluntaristas. Como noutros
domínios, o Estado e a ciência (esta última representada aqui pela
medicina, como é frequentemente o caso) tendem cada vez mais a
afirmar a sua competência e o seu domínio sobre os comportamentos
alimentares. Não é por ser novidade que os médicos indiquem
necessidades e perigos, emitam proibições e prescrições. A
alimentação é, de facto, uma terapia fundamental e, desde a
antiguidade, existem laços estreitos entre a estética culinária e a
dietética, entre a alimentação e a medicina.
Mas as prescrições dietéticas da medicina moderna são profilácticas
e já não meramente terapêuticas; são para uso
32. São transmitidas através dos meios de comunicação social e não
apenas na prática privada; chegam através das políticas estatais de
prevenção e não apenas através da clínica. Cada vez mais, é o
Estado que tende a impor a aplicação de regras dietéticas ordenadas
pelos médicos, inaugurando assim a era da prescrição dietética em
massa, ditando as nossas ementas através de ordens e portarias
ministeriais.
Forma-se e difunde-se uma vulgata médico-alimentar, constituída
pelo produto difuso da medicina nutricional científica filtrado pela
medicina popular, pela consciência alimentar comum e pelos meios
de comunicação social. Mas não se pode argumentar que este
fenómeno seja tão poderoso que induza por si só as mudanças que
apontámos na sensibilidade alimentar contemporânea, com todos os
seus aspectos imaginários, mitológicos e fantasmagóricos. No
entanto, não será surpreendente constatar que o efeito óbvio daquilo
a que poderíamos chamar a contra-tendência estética e dietética é
bastante reequilibrador? É o caso, por exemplo, do fenómeno
misterioso que constitui, na época contemporânea, o predomínio
crescente da magreza nas imagens corporais ideais, predomínio esse
que se a c e n t u a à medida que se sobe na hierarquia social (ver
Apfelbaum e Lepoutre 1978). É evidente que, objetivamente, o
predomínio do modelo de magreza na sociedade afluente é mais
favorável do que o modelo inverso - que, no entanto, está presente
noutras culturas. Poderemos, então, falar de processos de
ajustamento?
Uma análise antropo-sócio-histórica dos modelos corporais mostraria,
sem dúvida, que sempre existiu uma profunda ambivalência nas
representações do corpo gordo e que, neste sentido, a reprovação da
obesidade não é realmente tão recente como poderia parecer à
primeira vista (ver Nahoum 1979). É verdade que, já no século XIX, a
corpulência ainda era era ainda designada
em francês embonpoint (12) (hoje, para refletir o espírito do
tempo, seria necessário dizermalenpoint (13)), com o significado de
saúde, prosperidade, honra. Mas existe também, mesmo nas
sociedades arcaicas, uma imagem maligna do gordo. O obeso é
33. também alguém que come mais do que a sua quota-parte. Há um
canibal obeso, um comedor de carne fresca, um senhor carnívoro
(sanguinário?) (14), que encarna completamente o mito do ogre à
maneira de Gilles de Rais e que reencarna parcialmente, nas
mitologias modernas, a caricatura do patrão capitalista, esse homem
obeso de cartola, engordado com o sangue e o suor das classes
trabalhadoras. Os obesos, provavelmente em todas as sociedades,
estão condenados a redistribuir o que receberam em excesso, a
devolver a gordura capitalizada, sob a forma de força física posta ao
serviço da coletividade, com ou sem alegria (Paillard, comunicação
pessoal). Simetricamente, a magreza, ou a magreza, foi no passado
um sinal de miséria ou de consumo, mas também de pureza ascética,
ou mesmo de santidade.
Se existe, de facto, antropologicamente, uma ambivalência
fundamental e sempre latente das imagens do corpo, podemos
imaginar que, sob o efeito de uma ou outra pressão ou exigência eco-
cultural, um ou outro aspeto da representação é mais ou menos
acentuado, modelado, remodelado. Mas uma tal afirmação levanta,
mais uma vez, mais questões do que resolve.
É típico das situações de crise que os processos de desestruturação
possam ser acompanhados por - e determinar reciprocamente -
reestruturações, contra-correntes, emergências. A crise do regime
alimentar dará talvez origem a emergências que gerarão uma inflexão
duradoura nas representações e nas práticas, que permitirão
reabilitar, definir ou redefinir os quadros e as normas gastro-nómicas.
Talvez estas dinâmicas já estejam em curso. Mas como saber se a
nova tendência que está a ser posta em marcha será capaz de
conciliar o "bom" e o "saudável", a arte culinária e a nutrição, o prazer
e a necessidade?
Notas
Claude Fischler é Diretor de Investigação no Centre National de la
Recherche Scientifique (CNRS, França) e Diretor do Centre
34. Edgar Morin (Institut Interdisciplinaire d'Anthropologie du
Contemporain, École des Hautes Études en Sciences Sociales,
Paris). Em 1995, a editora Anagrama publicou uma das suas obras
mais importantes, El (h)omnívoro. El gusto, la cocina y el cuerpo (ed.
original 1990), que é, sem dúvida, uma referência fundamental no
domínio da sociologia e da antropologia sociocultural da alimentação.
Este artigo foi originalmente publicado em Communications, n.º 31,
1979 (monografia sobre Alimentação. Para uma antropologia
biocultural da alimentação: 189-210). Tradução e adaptação de José
Luis Solana, Departamento de Antropologia, Geografia e História,
Universidade de Jaén. Agradecemos ao Professor Claude Fischler a
sua gentil autorização para traduzir e publicar este texto.
1. A palavra francesa utilizada pelo autor é dérèglement. Este termo designa o estado do
que está déréglé, desarranjado, desajustado, o que já não está em conformidade com a
regra estabelecida; bem como o facto de se afastar, deixar de lado ou ignorar as regras
da moral, do equilíbrio e da moderação, de se desviar delas. Tem também o significado
de desordem e mau funcionamento. Pode ser traduzido para o inglês como
disarrangement, disorder, alteration, maladjustment, malfunction (Nota do tradutor).
2. No entanto, há que ter em conta um pormenor importante: a fruta era o único produto
de sabor doce presente nestes tabuleiros.
3. O termo utilizado por Fischler é contraintes. No plural ou no singular (contraite),
aparece em várias frases ao longo do texto. O dicionário Petit Robert da língua francesa
atribui-lhe, entre outros, os significados de coação, pressão, regra obrigatória, disciplina.
Nos dicionários franco-espanhóis, contrainte é geralmente traduzido por coação e
obrigação. No entanto, ao traduzi-la, também é possível utilizar outras palavras
espanholas, geralmente sinónimas das anteriores, como constrição, constrangimento,
imposição, exigência (e até restrição, requisito ou limitação), que, em certos contextos,
permitem traduções mais precisas para espanhol. Assim, p a r a ajustar a tradução ao
significado mais adequado em cada um dos contextos em que aparecem contrainte e o
seu pluralcontraintes, não utilizarei uma única palavra espanhola
- ( Nota do t r a d u t o r ).
4. O psicólogo Donald Campbell (1977) faz uma interpretação idêntica do fenómeno: "O
gosto humano inato pelos doces deixou de ser adaptativo e passou a ser desadaptativo";
assim, quando se trata de doces, estamos sujeitos a "uma tentação inata de
de pecar".
5. De facto, o primata pré-hominídeo provavelmente comia carne antes de se tornar um
caçador; como o chimpanzé de hoje, que, embora não seja um caçador, está longe de ser
exclusivamente vegetariano. É comum, por exemplo, ver dois machos a lutar por uma
pequena presa.
35. (roedores, aves, pequenos animais, etc.) (Wrangham, comunicação pessoal; ver também
Van Lawick-Goodall 1971).
6. Latim, região de florestas e pastagens (Nota do tradutor).
7. Utilizo este neologismo, como tal não incluído no Diccionario de la Real Academia de la
Lengua Española (que inclui o substantivo infantilismo), para tentar manter, na medida do
possível, o jogo de palavras feito pelo autor entre enfantine (o que pertence ou se
relaciona com a infância; enfance em francês, de enfant, criança) e infantile (persistência
na idade adulta de comportamentos típicos da infância). Enquanto o primeiro tem um
sentido neutro, o segundo tem uma conotação crítica ou pejorativa, devido ao facto de um
adulto não se comportar como uma criança. O problema de tradução surge porque o
adjetivo espanhol infantil inclui os dois significados (Nota do tradutor).
8. Nos Estados Unidos, esta mistura de alimentos é conhecida como "junk food".
9. É útil consultar o número das Comunicações sobre La Crise (n.º 25, 1976),
nomeadamente o artigo de André Béjin "Crise des valeurs, crise des mesures": 39-72.
10. O autor joga aqui com dois dos significados que o termo régime tem em francês, tal
como em inglês: conjunto de regras e dieta. A crise do regime é, pois, a crise do conjunto
de regras que regulam a alimentação; e a proliferação dos regimes é a proliferação das
dietas.
11. Fantasmática, no sentido em que este termo é utilizado na teoria psicanalítica (Nota
do tradutor)
12. Este termo é utilizado atualmente na língua francesa com o significado de gordura, e
é assim que poderia ser traduzido. Mas significa literalmente "em bom estado" (en bon
point), em boa forma, ou seja, de boa saúde, com aspeto saudável. (Nota do tradutor)
13. Ou seja, mal-en-point ou mal en point: em mau estado, doente.
14. Jogo de palavras entre seigneur (senhor) e saigneur (sangrador) (Nota do tradutor).
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