Livro O QUE É LUGAR DE FALA - Autora Djamila Ribeiro
Reconhecimento para escolas públicas com bons resultados no Ideb
1. CMYK AD-10
10 BRASIL
CORREIO BRAZILIENSE
BRASÍLIA, DOMINGO, 26 DE ABRIL DE 2009
Editora: Ana Paula Macedo// anapaula.df@diariosassociados.com.br
Subeditores: Lourenço Flores// lourencoflores.df@diariosassociados.com.br
Humberto Rezende//humbertorezende.df@diariosassociados.com.br
Tel. 3214-1172
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É POSSÍVEL FAZER UM BOM TRABALHO COM POUCO
RECURSO, EM LOCAIS ONDE HÁ RISCO SOCIAL
Mônica Messenberg, diretora da Fundação Santillana
4,2 é a nota mínima no Ideb que as instituições
precisam alcançar para serem incluídas no projeto
EDUCAÇÃO
Projeto reconhece o trabalho de 14 escolas públicas que conseguiram, com ideias simples, melhorar o
aprendizado dos alunos e obter bom desempenho no Ideb. Colégio de Ceilândia é uma dessas instituições
Ensino valorizado
PALOMA OLIVETO
Paulo H. Carvalho/CB/D.A Press
garotada aguarda, ansio-
A sa, a chegada da bruxa.
“Cre-mil-da, Cre-mil-
da”, clamam, batendo
palmas. Vestida a caráter, Deise
Saraiva, vice-diretora da Escola
Classe 52, em Ceilândia Sul, entra
em cena, para o delírio dos pe-
quenos estudantes. Quem vê o
colégio modesto, localizado nu-
ma das regiões com menor índice
de desenvolvimento humano
(IDH) do Distrito Federal, não
imagina que seus alunos — boa
parte moradores de uma invasão
vizinha — ostentam notas mais
altas que a média do restante do
país. O segredo, revela a diretora,
está na gestão. “É um trabalho
conjunto de professores e coor-
denadores”, diz Deoclides Pereira
de Carvalho.
Sem investimentos financei-
ros, os profissionais da EC 52 con-
seguiram que os estudantes tiras-
sem 4,8 no índice de desenvolvi-
mento da educação básica (Ideb),
indicador do Ministério da Edu-
cação (MEC) que combina notas
da Prova Brasil e dados de evasão
escolar. A média brasileira é de 4,2
para os primeiros anos do ensino
fundamental. Por causa do bom
desempenho e dos projetos de-
senvolvidos, o colégio ganhou o
título de escola de valor, um reco-
nhecimento de organizações da
sociedade civil que lutam pela
qualidade da educação no país.
No site www.escolasdevalor. A PROFESSORA DEISE DIVERTE AS CRIANÇAS DA ESCOLA CLASSE 52 COM A PERSONAGEM CREMILDA. DEPOIS DO PROJETO, OS ALUNOS DESENVOLVERAM MELHOR SUAS HABILIDADES ORAIS E ARTÍSTICAS
com.br, estão relatadas 14 expe-
riências bem-sucedidas de colé-
gios públicos que, assim como a globo terrestre na sala estimu-
EC 52, alcançaram Ideb acima de lam a pesquisa e o interesse pela
4,2 e criaram programas que fize- CONHEÇA OUTRAS EXPERIÊNCIAS DE ESCOLAS DE VALOR matéria”, conta Maria Eloise Li-
ram a diferença entre os alunos e ma, professora de geografia. O
a comunidade. As seis melhores projeto, que começou neste ano,
vão ganhar um prêmio e serão re- Uma escola especial Criança em festa Normas de convivência estabelecer limites na resultou em duas salas de portu-
tratadas num livro editado pela A escola Dr. Décio Gomes O projeto foi desenvolvido na “Como a realidade gera educação são atendidos e, guês, duas de matemática, duas
Fundação Santillana. “A ideia é Pereira, no município de escola Viver e Conhecer, conflitos, se percebeu a com eles, a inibição da de ciências, uma compartilhada
organizar um grande fórum de Sapiranga (RS), era localizada num loteamento, a necessidade de identificar, violência”, diz Vera. por geografia e história e outra
experiências que possam ser tro- conhecida como Carandiru, 2km do centro de Capinzal compreender, reconhecer e rotativa, para qualquer discipli-
cadas na rede pública. Os proje- por causa da quantidade de (SC). A intenção era envolver mediar essas situações. O Somos todos moradores na. Para tanto, a escola não rece-
tos mostram que é possível fazer episódios violentos que mais os pais na realidade instrumento usado foram as de uma só casa beu dinheiro extra, apenas re-
um bom trabalho com poucos re- ocorriam na instituição. Os escolar. Alunos do pré à 4ª normas de convivência O projeto da escola de ensino manejou os recursos de que já
cursos em locais onde há risco pais não apareciam nas série do ensino fundamental criadas com participação dos médio D. Pedro II, em Novo dispunha.
social”, conta Mônica Messen- reuniões e, quando havia têm atividades esportivas, de segmentos — pais, alunos, Hamburgo (RS), visa Também no Rio, uma peque-
berg, diretora da fundação. provas, os alunos as teatro, pintura, leitura e lazer, professores e funcionários —, desenvolver o espírito crítico na escola de apenas um andar,
A experiência de Ceilândia é a entregavam em branco. Em desenvolvidas por toda a buscando estabelecer limites dos jovens alunos em relação localizada na zona rural, conse-
única do DF registrada pela ini- 2005, a realidade começou a comunidade. Mesmo quem no ambiente escolar e, ao meio ambiente. A guiu modificar a realidade dos
ciativa. Intitulado Momento da mudar. Os novos gestores não tem filhos na escola consequentemente, prevenir educação ambiental é alunos com um projeto simples
história legal, o projeto da escola investiram em projetos de participa, o que aproximou os a violência”, explica Vera trabalhada nas disciplinas e mas eficaz. No “blog educativo”,
nasceu do gosto da vice-diretora teatro, dança, coral, moradores do município do Lermen Bohn, responsável em atividades como coleta de desenvolvido pela Escola Muni-
Deise em contar histórias para os banda, além de criarem dia a dia escolar. “Os recursos pelo projeto desenvolvido pilhas, baterias, produção de cipal Comunidade de Vargem
alunos. No ano passado, ela fez um hino da escola e um mais utilizados foram os pelo Colégio Estadual sacolas ecológicas, peças de Grande, os alunos têm acesso a
um curso de contadora e, com di- jornal que divulga a humanos, com pais, Poncho Verde, em Mato teatro e gincanas. Para levar a suporte didático postado por
nheiro do próprio bolso, investiu conquista dos alunos. Hoje, professores, funcionários e Leitão (RS). As normas são ideia adiante, a escola não professores além de poderem se
em fantasias e objetos lúdicos. de acordo com a alunos se empenhando para o discutidas e aprovadas por tem gastos financeiros comunicar com os mestres, a co-
Uma vez por mês, os alunos da coordenação, o clima é de desempenho de sua função e um conselho, composto por expressivos. O maior recurso é munidade e entre eles mesmos.
educação infantil e convidados harmonia e participação, o sucesso da mesma”, relata a representantes de todos os o humano, com o empenho No espaço, há um resumo das
das demais turmas reúnem-se com pais, alunos e responsável pelo projeto, setores. “Os resultados são dos funcionários e da disciplinas e atividades propos-
num pequeno espaço próximo à professores orgulhosos. Veranice Lovatel. expressivos. Os objetivos de comunidade no projeto. tas para os estudantes. O blog
sala da direção, transformado em também serve de material didá-
palco, para ouvir os contos. tico nas aulas de informática.
Deise reconhece que um audi- Segundo a professora Andréa
tório seria bem mais adequado, cobrança é dos próprios peque- nicipal Professora Áurea Canti- para os demais colegas, apontan- Rita. Ela conta que o sucesso do Barreto, que coordena o projeto,
mas não há recursos para tanto. nos, que fazem questão de recon- nho Rodrigues um índice de lei- do quais aspectos gostaram ou projeto pode ser atribuído à for- os alunos estão mais empenha-
Sentadas no chão, as crianças re- tar o que ouviram. “Eles também tura superior ao registrado em não gostaram na leitura. No fim ma como a direção conduz a ges- dos. “Aumentou a autoestima do
cebem as personagens, que po- pedem mais histórias, buscam a países europeus. Lá, os estudan- do ano, os estudantes que mais tão da escola. “Aqui ninguém tra- corpo docente e dos alunos. Al-
dem ser a bruxinha Cremilda, o leitura, realmente desenvolve- tes “devoram”, em média, oito li- leram recebem homenagens e balha sozinho. Muitas escolas fa- guns que se mostravam desinte-
menino Jonas ou o palhacinho ram um grande interesse pelos li- vros por ano. “Em 2004, começa- condecorações. O acervo da bi- zem planejamento solitário. Nós ressados em ler ou participar de
sem nome. Dependendo da his- vros”, diz, orgulhosa. De acordo mos a trabalhar com metas e so- blioteca da escola, que tem 1,3 preferimos o coletivo”, diz. qualquer atividade promovida
tória a ser contada, a fantasia é com a vice-diretora, o desenvol- luções. Percebemos que os alu- mil estudantes, reflete o interesse No Rio de Janeiro, foi o am- no projeto estão mais dispostos”,
substituída por outros recursos, vimento, principalmente das tur- nos tinham um problema sério dos pequenos pelos livros: são 15 biente escolar que fez a diferen- comemora.
como dobraduras. Na última minhas de educação infantil, é vi- de interpretação de texto, então mil livros, mais de mil por criança ça. Na Escola Municipal Júlio de Para Mônica Messenberg, é
quarta-feira, foi dia de assistir sível. “Eles melhoraram muito a nos concentramos nisso”, conta matriculada. Mesquita, que tirou nota 5 no esse o espírito de uma escola de
Cremilda e seus batons magnéti- oralidade, produção de textos co- a coordenadora pedagógica, Ri- Agora, o colégio colhe os frutos Ideb, as salas de aula do ensino valor. “São pequenas ações que,
cos. Em meia hora, as crianças fi- letivos, ilustração”, enumera. ta Mesquita. do investimento. No último Ideb, médio são individualizadas. Pa- seja com foco na aprendizagem,
zeram contas, cantaram e se en- Com apoio do governo muni- recebeu nota 6, uma das mais al- ra cada disciplina há uma sala na formação dos profissionais ou
cantaram com as brincadeiras. Coletivo cipal, cada professor recebeu um tas do estado de São Paulo e bem diferente. O objetivo foi permitir na relação com a comunidade,
O programa, porém, não ter- Em São José dos Campos (SP), kit com 40 livros. Todos os dias, os superior ao registrado no restante que os professores e alunos ti- desencadeiam uma mudança na
mina com as últimas palmas da um projeto voltado à leitura tam- alunos das séries iniciais do ensi- do país. “A leitura é o carro-chefe. vessem acesso aos materiais pe- educação”, diz. “Não existe uma
plateia. “Os professores são esti- bém ganhou o título de escola de no fundamental têm 50 minutos Quem lê escreve bem e sabe in- dagógicos de forma permanen- regra única nem uma receita de
mulados a trabalhar as histórias valor. Mais antiga que a do DF, a para ler o título que escolherem. terpretar, o que é fundamental te. “Na minha disciplina, que é bolo. O importante é ter uma boa
na sala de aula”, conta Deise. A experiência rendeu à Escola Mu- Eles são estimulados a escrever para todas as disciplinas”, destaca geografia, os mapas expostos e o ideia”, ensina.
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