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INSURGÊNCIAS
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NA GLOBALIZAÇÃO
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SAMUEL DE JESUS
Mulheres, população LGBTQIA+, comunidade afrodescendente e
indígenas na política internacional
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INSURGÊNCIAS NA
GLOBALIZAÇÃO
Mulheres, população LGBTQIA+, comunidade afrodescendente e
indígenas na política internacional
© 2022 - Samuel de Jesus
TÍTULO
INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO
Mulheres, população LGBTQIA+, comunidade afrodescendente e indígenas na política internacional
AUTOR
Samuel de Jesus
EDIÇÃO, PROJETO GRÁFICO
Editora Oeste
DIAGRAMAÇÃO, ILUSTRAÇÃO DA CAPA
Ricardo Barbosa Porto
REVISÃO
Samuel de Jesus
PUBLICAÇÃO DA
www.editoraoeste.com.br
contato@editoraoeste.com.br
ISBN 978854558426-1
Depósito Legal na Biblioteca Nacional
Impresso no Brasil
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP
, Brasil)
Jesus, Samuel de
Insurgências na globalização : mulheres, população LGBTQIA+, comunidade
afrodescendente e indígenas na política internacional / Samuel de Jesus. -- 1.
ed. -- Campo Grande, MS : Editora Oeste, 2022.
Bibliografia.
ISBN 978-85-45584-26-1
1. Globalização 2. Globalização - Aspectos sociais 3. Insurgência 4. LGBTI+
- Siglas - Direitos 5. Mulheres - Aspectos sociais 6. Mulheres - Direitos 7. Povos
indígenas 8. Violência I. Título.
22-117986 CDD-303.482
Índices para catálogo sistemático:
1. Globalização : Aspectos sociais : Sociologia 303.482
Aline Graziele Benitez - Bibliotecária - CRB-1/3129
Campo Grande
2022
SAMUEL DE JESUS
INSURGÊNCIAS NA
GLOBALIZAÇÃO
Mulheres, população LGBTQIA+, comunidade afrodescendente e
indígenas na política internacional
Todos os direitos reservados.
Nenhuma parte desta obra poderá ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou
quaisquer meios (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em
qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da editora,
como pesquisa é permitido desde que citada a fonte.
UMA PUBLICAÇÃO DA EDITORA ASSOCIADA
Obra aprovada pelo conselho editorial da Editora Oeste
através da Resolução n. 133/2022.
CONSELHO EDITORIAL
Drª. Alda Maria do Nascimento Osório / UFMS
Drª. Alexandra Ayach Anache / UFMS
Dr. Amaury de Souza / UFMS
Dr. Antônio Carlos do Nascimento Osório / UFMS
Drª. Carla Dupont – França / Vercors
Drª. Eurize Caldas Pessanha / UFMS
Drª. Fabiany de Cássia Tasvares Silva / UFMS
Dr. Flávio Aristone / UFMS
Me. Horacio Porto Filho / UTCD-PY
Dr. Leo Dayan – Univ. de Paris 1 / Sorbonne
Dr. Luiz Otavio Saraiva Ferreira / UNICAMP
Drª. Margarita Victoria Rodriguez / UFMS
Drª. Maria Dilnéia Espindola Fernandes / UFMS
Drª. Myrna Wolf B. dos Santos / UFMS
Drª. Regina Tereza Cestari de Oliveira / UCDB
Drª. Soraia Napoleão de Freitas / UFSM
Drª. Silvia Helena Andrade de Brito / UFMS
Drª. Tatiana Calheiros Lapas Leão / SED-MS
www.editoraoeste.com.br
contato@editoraoeste.com.br
Campo Grande • Mato Grosso do Sul
ISBN 978-85-45584-26-1
1ª Edição - Ano 2022
SUMÁRIO
Prólogo....................................................................................................7;
LGBTQIA+...............................................................................................15;
Os Direitos Lgbtqia e a Onu...................................................................22;
Temas Tabus nas Escolas Brasileiras: A Diversidade Sexual................27;
O Atlas da Violência no Brasil 2020 ......................................................30;
Pussy Riot ............................................................................................32;
Conferências Pelos Direitos Humanos das Mulheres...........................39;
ONU Mulher............................................................................................42;
Idealismo, Realismo e Pluralismo..........................................................42;
George Floyd e Jacob Blake..................................................................47;
#Blacklivematters...............................................................................49;
Brasil.....................................................................................................52;
Raoni, Um Insurgente Global em Defesa da Amazônia...........................60;
Belo Monte............................................................................................63;
Um Nobel para Raoni .............................................................................70;
Epílogo...................................................................................................73;
Bibliografia ...........................................................................................79;
7
PRÓLOGO
Aníbal Quijano, importante pensador peruano cunhou, no final dos anos
oitenta e início dos anos noventa do século XX, uma compreensão diversificada
sobre a modernidade e o capitalismo, denominou-a de colonialidade do poder. Afir-
mou que o processo histórico chamado de globalização e sua interface na Améri-
ca Latina demonstra o aprimoramento do padrão de poder capitalista, moderno,
eurocêntrico, sobretudo colonial. O que caracterizaria esta colonialidade seria a
continuidade da exploração dos povos não-brancos e a produção do conhecimento
ainda baseado no eurocentrismo. Ou seja, a permanência de uma exploração eco-
nômico-cultural. O padrão de poder colonial persiste mesmo após a independência
das nações latino-americanas ocorrida na primeira metade do século XIX.
É por isto que Quijano (2005) considera as discussões atuais em torno da
questão nacional um equívoco, pois o Estado-nação é uma estrutura de poder e
além de ser uma instituição-modelo europeia, articula forma de existências disper-
sas e diversas em uma totalidade única, ou seja, suprime as heterogeneidades para
construir uma identidade homogênea. O conhecimento na América Latina com
base no eurocentrismo teve sua construção teórica e conceitual na Europa Ocidental
a partir do século XVII. Conhecimento com base no princípio da racionalidade e
que embora tenha sido, inicialmente, uma imposição ao mundo colonizado, ainda
hoje é o modelo adotado na produção do conhecimento na América Latina.
Em sua posição de centro do capitalismo mundial, a Europa impôs seu regi-
me colonial e cultural sobre o mundo. Este fato gerou um processo de reidentifica-
ção histórica. Ou seja, a incorporação de diversas e heterogêneas histórias culturais
em um único mundo significou uma nova configuração cultural, intelectual. Todas
as experiências, histórias, recursos e produtos culturais foram articulados em uma
só ordem cultural global sob a hegemonia cultural europeia ocidental. Se o conceito
de modernidade se refere unicamente e fundamentalmente às ideias de novidade,
do avançado, do racional científico, laico, secular que são ideias associadas a este
conceito, assim é possível admitir que caberão em todas as culturas e em todas
as épocas históricas com todas as suas particularidades geográficas, temporais e
8
INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO
sociais, tais como a índia, China, Egito, Grécia, Maia, Asteca. As relações sociais
baseadas na ideia de raça produziram identidades sociais totalmente novas, índios,
negros e mestiços adquiriram uma conotação racial. Essas conotações raciais trans-
formaram-se em relações de dominação com hierarquia, lugares e papéis e sociais,
foram instrumentos sociais de classificação social baseada na população. As novas
identidades produzidas sobre a ideia de raça foram associadas à natureza dos papéis
e lugares na nova estrutura global de controle do trabalho. Assim, ambos os ele-
mentos: raça e trabalho foram estruturalmente associados. (QUIJANO, 2005).
A ciência entre o século XIX e XX conferiu uma veracidade ou legitimidade
ao imperialismo britânico, sobretudo no momento em que sua narrativa científica
preconiza a inferioridade de africanos e asiáticos. A Ciência do século XIX, da épo-
ca de Herbert Spencer (1873), é marcada pelo Darwinismo Social que se baseava na
tese de que a teoria darwinista poderia ser perfeitamente aplicada à sociedade. A
luta pela sobrevivência entre animais corresponderia à lógica capitalista, ou seja, o
mais apto sobreviveria. Dessa forma as sociedades mais capazes se sobressairiam
às demais e ocupariam um papel de liderança. Esta seria uma das fundamentações
para a criação do Império Colonial Britânico, assim a missão da “civilização” era
levá-la aos povos considerados bárbaros o “fardo da civilização branca“. Essa foi a
argumentação básica para a colonização da África e da Ásia.
Na História do Brasil a presença do Conde de Gobineau refletia as concep-
ções europeias do período, segundo ele; a mistura de raças era inevitável e levaria
a raça humana a graus sempre maiores de “degenerescência” física e intelectual.
É-lhe atribuída a frase “Não creio que viemos dos macacos, mas creio que vamos nessa
direção.” A mistura racial daria origem aos mestiços e pardos “degenerados e es-
téreis”. Esta característica já teria selado a sorte do país: a “degeneração” levaria ao
desaparecimento da população. A única saída para os brasileiros seria o incentivo
à imigração de “raças” europeias, consideradas superiores. O europeu pensava no
negro como um branco degenerado, que poderia ser doente ou desvirtuado. Na
simbologia das cores da civilização europeia a cor preta representa uma mancha
moral e física, a morte e a corrupção, enquanto a branca remete à vida e à pureza.
Missionários decepcionados com o fracasso da conversão afirmavam que o negro
refletia a natureza pecaminosa de suas almas resistentes à palavra de Deus, assim a
escravidão era a única possibilidade de “salvação” desses povos.
A desvalorização e a alienação do negro estende-se a tudo que
toca a ele: o continente, os países, as instituições, o corpo, a men-
9
PRÓLOGO
te, a língua, a música, a arte, etc. Seu continente é quente de-
mais, de clima viciado, malcheiroso, de geografia tão desesperada
que o condena à pobreza e à eterna dependência. O ser negro é
uma degeneração devido à temperatura excessivamente quente.
(MUNANGA, 2001, p. 21).
A herança social de um povo é legada às futuras gerações por meio da edu-
cação. A escola tradicional era a única possibilidade de aprendizado, o do coloni-
zador, assim a memória que lhe inculcam não é a de seu povo. A história de seus
ancestrais africanos é substituída pela História europeia dos francos, germanos,
anglos e bretões, povos de pele e olhos claros. Aprende a língua do colonizador
para fazer parte minimamente da vida social, pois apenas com a sua torna-se um
estranho dentro de sua própria terra.
A língua do colonizado não possui dignidade nenhuma no país
e nos concertos dos povos. Se o negro quiser obter uma colo-
cação, conquistar um lugar, existir na cidade e no mundo, deve,
primeiramente, dominar a estranha língua, de seus senhores.
(MUNANGA, 2001, p. 24).
Foi através da língua que a dominação aconteceu e dessa forma se deu sobre-
posição cultural de um povo sobre outro. A civilização europeia devora a cultura de
grupos étnicos distintos. A justificativa se baseou na ideia de que o homem branco
deve ajudar as civilizações, tidas como “atrasadas”, a darem um salto civilizatório.
Pelo fato deste livro tratar sobre a questão de gênero nas relações internacionais,
é preciso inclinar nossa análise para a problemática do feminismo. A partir deste
pressuposto podemos pensar na questão de gênero feminino, sobretudo do feminis-
mo negro que parte do pressuposto de que ser mulher e negra é uma particularidade
que movimento feminista deve levar em conta, pois afinal a terminologia mulher
requer um olhar, uma perspectiva heterogênea.
A primeira máxima de Achille M’Bembe e sua teoria da necropolítica é a de
que a desconstrução do sujeito autoriza sua morte, pois não estamos tratando com
um indivíduo, mas com uma coisa, um objeto ou alguém que perdeu sua individu-
alidade. Faz lembrar Rousseau em O Contrato Social, sobretudo na passagem a qual
se refere ao papel da escravidão na supressão do indivíduo e de sua individualidade.
Impediria a criação da esfera pública que emergiu a partir da Revolução Francesa
(1789). No caso em questão, o da necropolítica, é resultante da perda da individualida-
de que é legitimada socialmente. No caso, os atos de violência que levam à morte da-
quele não reconhecido como civilizado, como não sujeito é respaldada socialmente.
10
INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO
M’ Bembe fala sobre o biopoder conceituada por Michel Foucault e sua rela-
ção com a inimizade a partir de duas noções complementares: o Estado de exceção
e o Estado de Sítio. No Estado de Exceção em relação à inimizade torna-se uma base
normativa que confere o direito de matar. A noção de biopoder esta relacionada á
este caso, afinal, o poder advindo da exceção decide que possui o direito de viver
ou de morrer, uma divisão entre vivos e mortos definido biologicamente por quem
detém o controle e quem possui a capacidade de tipificar ou definir a espécie hu-
mana em grupos e subgrupos, algo semelhante, por exemplo, ao racismo. Foucault
afirma que o direito soberano de matar e os mecanismos de biopoder são inerentes
ao estado moderno, assim o Estado Nazista foi o arquétipo de um Estado que
exerce o poder de matar. (M’BEMBE, 2018).
É possível afirmar que a “solução final” possui origens no Imperialismo
Colonial e também na Revolução Industrial, sobretudo devido à serialização de
mecanismos técnicos para conduzir pessoas à morte, câmaras de gás, fornos, a
“industrialização da morte”, algo puramente técnico impessoal, silencioso e rápido.
Esse processo foi somente possível devido aos estereótipos racistas, sobretudo de
um racismo de classe que definiram os conflitos da sociedade industrial, ou seja,
introduziu o racismo como elemento fundamental para explicar os conflitos sociais
no mundo industrial. A relação entre nazismo e imperialismo reside no fato de que a
ocupação colonial pressupunha apreensão, demarcação, afirmação do controle físi-
co e geográfico e inserir um novo conjunto de relações sociais e especiais, ou seja, a
produção de fronteiras e hierarquias, zonas, enclaves, sobretudo a classificação das
pessoas em categorias distintas. A ocupação como exercício da soberania relega o
colonizado ao estatuto de objeto. Menciona Frantz Fanon quando este reafirma
que a colonização implica em uma divisão do espaço em compartimentos. Definir
o que é importante e quem não é, ou seja; descartável.
Diferentemente, hoje temos as guerras da época da globalização e uma das
suas características é o de fato de que o direito de matar não é mais exclusivo do
poder estatal, não é mais facultado aos Exércitos regulares. Este fato faz com que
algumas mudanças em relação á definição da autoridade suprema, sobretudo, em
um espaço político não seja consensual, ocorre uma sobreposição de uma organi-
zação de poder. Hoje, por exemplo, a coerção passou ao controle do mercado, o
novo agente político que pretende controlar o Estado em detrimento da política
em seu sentido público. A mão de obra militar é comprada é vendida num merca-
do em que a identidade dos fornecedores e compradores não é revelada. Milícias
urbanas, exércitos de senhores regionais, segurança privada invocam o direito de
11
PRÓLOGO
matar aqueles considerados lixos, escória alegam promover uma “limpeza” étnica,
social, moral ou religiosa. Muitas vezes isto ocorre sob o argumento da promoção
de uma “guerra santa” com o objetivo de “purificação” ou “regeneração” e onde todos
os expedientes violentos são autorizados. (M’BEMBE, 2018, p.53).
Voltando aos aspectos destinados à separação e distinção social, afinal ten-
tamos compreender as origens da divisão social quase sempre alimentada pelo
ódio, ou a diferenciação entre nós e eles. Para Bauman (1999, p. 114) a separação
espacial e seu produto de confinamento forçado tem sido por muito tempo na
história, uma forma de reagir a toda diferença não acomodada no âmbito social,
assim existe uma quebra imposta na comunicação objetivando a diminuição da
visão do outro, ou seja, a supressão das circunstâncias individuais possibilitada
pela convivência diária. O fim desse intercâmbio social permite a caracterização
que acaba por suprimir a capacidade de subjugação de qualquer disparidade exis-
tente entre as pessoas que se dilui no contato direto e frequente. O isolamento
distancia as pessoas e favorece o preconceito. O gasto orçamental com o aparato
repressivo, garantidoras da lei e da ordem sugere uma grande significação da via
institucional como parte da política criminal, assim os governos ganham apoio
dos setores sociais dominantes para disciplinar os grupos e segmentos popula-
cionais. Dessa maneira passa a existir uma intervenção das punições que resul-
tam em prisões, sobretudo daqueles setores. Poderíamos inserir neste exemplo
as comunidades das periferias brasileiras que são alvo destas intervenções todo
dia, sobretudo de pessoas de cor preta que são os mais atingidos estatisticamente
falando, podemos falar também da comunidade LGBTQIA+ neste caso, afinal,
é um grupo alvo das políticas de separação através do confinamento forçado e
entendendo-o como um grupo que guarda uma diferença não acomodada social-
mente. O aparato repressivo do Estado para repeli-los e suprimi-los são os mais
variados, dentre eles prisão, banimento, chibatadas e pena de morte.
São, aproximadamente, 70 países que proíbem a homossexualidade, incluin-
do países europeus como a Rússia. Neste país a aprovação de uma lei que proíbe a
propaganda gay durante as olimpíadas de inverno de Sochi em 2014 gerou protes-
tos que repercutiram em todo mundo. Na África, em Uganda, a tentativa uma lei
anti-homossexualidade também gerou uma comoção internacional e revelam que
em muitos países existem severas proibições chegando à pena de morte. Assim
como as mulheres em sua luta por igualdade, respeito e direitos em movimento
como “A Marcha das Vadias” e as feministas contra Trump em 2017. A comunidade
afrodescendente se insurgindo contra a violência policial como o caso em que um
12
INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO
afrodescendente George Floyd foi enforcado na rua à vista de todos pelo policial
Derek Chavin e mais quatro policiais. O surgimento de protestos virais sob a hash-
tag #BlackLiveMatters é um fato novo que se refere a uma nova modalidade de
insurgência, sem uma cadeia de comando como era o caso dos Panteras Negras nos
anos sessenta e uma massa articulada pelas redes de forma espontânea e eficiente,
difícil de prever e que não possui um rosto que possa ser eliminado. Essas são as
novas insurgências da globalização.
INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO
15
LGBTQIA+
Um caso que nos permite entender como a questão da orientação sexu-
al se insere nas relações internacionais é a criminalização da homossexualidade
na Rússia. O presidente russo Putin provocou revolta em todo mundo quando
tentou impor uma legislação nacional que criminaliza o comportamento homos-
sexual nas olimpíadas de inverno de Sochi. Segundo a matéria da agencia DW de
21.11.2013, assinada por Jonathan Sachse, intitulada: Jogos de Inverno podem ser
alvo de polêmica com lei contra “propaganda gay” afirma que Estrangeiros também são
afetados por criminalização de declarações positivas sobre homossexualismo na Rússia.
Ativistas tentam sensibilizar entidades esportivas durante Olimpíadas de Inverno em
Sochi, em 2014. (SACHSE, 2013).
FONTE: Dayle Beast: lefteris: Pitarakis/aP
httPs://images.aPP.goo.gl/XCDe6moyzg9ltkNw6
Os Jogos Olímpicos de Inverno foram realizados entre 07 e 23 de fevereiro
de 2014, na cidade de Sochi, na Rússia. O presidente russo, Vladimir Putin, assinou
uma lei contra a “propaganda homossexual”. Desde então, declarações positivas sobre
“relações sexuais não-tradicionais” na presença de menores ou em espaços públicos, como
a internet, são passíveis de punição, como multas pesadas. (SACHSE, 2013). A matéria
16
INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO
destaca a atuação do estadunidense Leviathen Hendricks, estadunidense radicado
em Londres porta-voz da Federação de Jogos Gays1
(FGG, na sigla em inglês),
manifestou sua posição contrária à lei ao Comitê Olímpico Internacional e cobrou
providencias. Contudo, a instituição respondeu que a lei foi aprovada somente a
escolha oficial da cidade de Sochi na Rússia. Lembra Hendricks que “De cerca de
12 mil atletas em 2012, em Londres, apenas 23 se declararam abertamente homossexuais.”
Outra matéria do DW de 10.07.2013 assinada por Sabrina Pabst e intitulada
Homossexualidade ainda é tabu em partes da Europa afirma que: “muitos homossexuais
não se sentem seguros na Europa por serem discriminados apesar das leis vigentes que ga-
rantem os seus direitos. Leis nacionais diferentes também restringem possibilidades dos gays
europeus”. Pabst (2013) destaca a Parada Gay europeia chamada Euro-Pride realizada
em Marselha na França: As ruas da cidade francesa de Marselha ficam movimentadas
a partir desta quarta-feira (10/07), com a realização da parada. Marselha não é apenas
a capital europeia da cultura de 2013, mas também a capital para homossexuais este ano.
Diferentemente ao ocorreu em Marselha lembra das barricadas em chamas, bombas
de gás lacrimogêneo e jatos de água, milhares de opositores ao casamento gay tomaram as
ruas da França. Segundo Evelyne Paradis, da ILGA-Europa (sigla em inglês para As-
sociação Internacional para Lésbicas, Gays, Bi, Trans e Interssexuais) em Bruxelas:
“As pessoas precisam de bodes expiatórios porque estão confusas, com raiva e frustradas”.
Na África, em Uganda a Lei Anti-homossexualidade foi proposta pela presi-
dente do parlamento de Uganda, Sra. Rebecca Kadaga em 2012. Cerca de 90% da popu-
lação da Uganda considera a homossexualidade inaceitável para a sociedade, tornando o país
altamente homofóbico e com grandes taxas de violência contra LGBTs. Estima-se que existam
aproximadamente 500 mil LGBTs ugandeses. (QUERINO, 2017). Esta lei foi aprovada
pelo Parlamento de Uganda , em 20 de dezembro de 2013, chamado popularmente de
“ Kill the Gays bill “, porém a pena de morte foi substituída por prisão perpétua. Che-
gou a ser sancionado pelo Presidente de Uganda Yoweri Museveni em 24 de fevereiro
de 2014, contudo, o Tribunal Constitucional de Uganda considerou a lei invalida por
razões processuais. (Presidente de Uganda sanciona lei que pune gays com prisão
perpétua: G1, 24.02.2014). Em entrevista à CNN o então presidente Yowery Museveni
disse que os homossexuais são “nojentos” e sua conduta, segundo ele: “não natural”
1 A cada quatro anos, a entidade organiza competições de que participam atletas gays de todo o mundo. Hendricks se emociona com
a história do jogador de futebol norte-americano Robbie Rogers, que jogava na primeira divisão inglesa e se declarou homossexual
no início de 2013 para, ao mesmo tempo, anunciar o fim de sua carreira, com apenas 25 anos de idade. (SACHSE, 2013)
17
LGBTQIA+
não é questão de Direitos Humanos. (Após assinar a lei antigay, presidente de
Uganda diz que homossexuais são “nojentos”. Revista Veja 25.02.2014).
O Tribunal Constitucional de Uganda acabou por anular esta lei por unani-
midade: O Tribunal Constitucional de Uganda anulou nesta sexta-feira, por unanimi-
dade, a polêmica “lei anti-homossexual” que entrou em vigor no país em fevereiro e que
qualificava os gays como criminosos, informou a imprensa local. (Tribunal de Uganda
anula lei contra homossexuais. In: Revista Exame 01/08/2014). O aniversário de
um ano da anulação foi comemorado com uma Parada do Orgulho Gay, aproxi-
madamente duzentos ativistas ugandenses se reuniram na cidade de Entebbe. Neste
sábado, dezenas de pessoas se reuniram em Entebbe, cerca de 40 quilômetros ao sul da
capital, Kampala, nas margens do Lago Vitória, agitando bandeiras e guarda-chuvas com
as cores do arco-íris, símbolo do movimento LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros).
(Uganda celebra revogação de lei anti-homossexualidade com Parada do Or-
gulho Gay. In: O Globo: 08.08.2015)
Durante o ato ativistas afirmaram que ainda temem novas lei de repressão
à comunidade Gay. Essa para faz parte do Dia da Consciência Transgênero. Essa
Parada do Orgulho Gay concluiu uma semana de ações, que contou com o Dia da Consci-
ência Transgênero e com o concurso de beleza “Mister e Miss Orgulho”, do qual participa-
ram 200 candidatos. Segundo Richard Lusimbo, um dos organizadores da marcha;
Para nós, este evento celebra quem somos, o que vivemos, mas também nossos amigos e
aliados. (Uganda celebra revogação de lei anti-homossexualidade com Parada
do Orgulho Gay. In: O Globo: 08.08.2015).
FOTO: striNger/reUters:
18
INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO
A legislação homofóbica, como é o caso de Uganda, na África e de muitos
países pós-coloniais, é um legado maldito do período da colonização. Foram
introduzidas, originalmente pelas administrações coloniais, como é o caso da ad-
ministração colonial britânica. Trata-se de uma politização formal da sexualidade
e que está sendo denunciado internacionalmente, ou seja, denunciam interna-
cionalmente a discriminação sexual em caráter doméstico. Temas como este já
foram incorporados na geopolítica mundial, inclusive foi criada a denominação:
International Gay. As reivindicações LGBTQIA+ adquiriram uma relevância glo-
bal. Caberá algumas perguntas: qual o impacto da política sexual nas relações
internacionais ? Ela pode influenciar a tomada de decisão nas relações interna-
cionais? Em 2014, fora 78, os países que criminalizaram a homossexualidade e
destes, cinco a punição é a pena de morte.
Atualmente o mapa mundi está dividido em duas cores no que se refere
à proibição da liberdade sexual. O primeiro é composto por 70 países onde a
homossexualidade é ilegal e o segundo se refere a 123 países onde não existe esta
proibição. O relatório Homofobia Patrocinada pelo Estado 2019, elaborado pela
Associação Internacional de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais e Intersexu-
ais (ILGA2
) informa que a Índia, Trinidad e Tobago e Angola saíram do bloco de
países que proíbem a liberdade sexual. Na última revisão feita em 2017; Austrá-
lia, Malta, Alemanha e Áustria aderiram ao casamento entre pessoas do mesmo
sexo, ou o casamento igualitário e sendo assim o número de países onde existe
o casamento igualitário subiu para 26. Nove países incluíram em sua constituição
a menção explícita de que a orientação sexual não deve ser motivo de discriminação.
Entre eles estão Portugal, Equador, Bolívia e África do Sul, uma ilha de igualdade no
panorama africano. Estas informações estão contidas no estudo da ILGA onde
é revisada a legislação dos países membros da ONU. O estudo que se encontra
em sua 17ª edição foi apresentado na reunião anual da ILGA, na Nova Zelândia.
Os países cuja homossexualidade poderá levar a morte são: Arábia Saudita, Irã,
Iêmen, Sudão, Nigéria e Somália. Países onde existe a pena de morte à homosse-
xualidade são Mauritânia, nos Emirados Árabes Unidos, no Catar, no Paquistão
e no Afeganistão. O relatório destaca que, embora o Iraque tenha desaparecido da lista
devido à “eliminação do Estado Islâmico, continua a ser um país que criminaliza de
2 AAssociação Internacional de Gays e Lésbicas, em inglês International Lesbian and GayAssociation (ILGA) é uma federação mundial
que congrega grupos locais e nacionais dedicados à promoção e defesa da igualdade de direitos das pessoas lésbicas, gays, bisse-
xuais, trans e intersexo (LGBTI) em todo o mundo.
19
LGBTQIA+
facto, porque persegue os homossexuais utilizando leis de atentado ao pudor, prostituição
e outras”. (ALFAGEME. In: El País: 22.03.2019).
Em 26 países, a sentença máxima para esses atos varia entre 10 anos de pri-
são ou prisão perpétua. Em 31 é punível com até oito anos de prisão. Em 68 países
“há leis que proíbem explicitamente atos sexuais consensuais entre pessoas do mesmo sexo,
e outros dois os criminalizam de facto”. Além disso, as jurisdições que não pertencem aos
estados membros da ONU também punem as relações homossexuais, como Gaza, Ilhas Cook
e certas províncias da Indonésia”. 32 países promoveram medidas para limitar a liber-
dade de expressão. A situação da Chechênia é descrita como “crítica” e reflete as
torturas e perseguições das autoridades contra gays e lésbicas. (ALFAGEME. In: El
País: 22.03.2019). Nos países considerados como parte da civilização contemporâ-
nea, crimes e atentados contra os LGBTQIA+ são cometidos também. Um desses
casos, é o massacre de Orlando nos Estados Unidos.
O Massacre de Orlando ocorreu no dia 12 de junho de 2016, na boate
LGBT “Pulse”, em Orlando, estado da Flórida, nos Estados Unidos. Aproxima-
damente 50 pessoas foram mortas e 53 ficaram gravemente feridas. O atirador,
Omar Mir Seddique Mateen era muçulmano norte-americano de origem afegã.
Foi o ataque mais grave ocorrido nos EUA contra a comunidade LGBT. Um
ex-colega de trabalho do assassino afirmou que Omar sempre fazia comen-
tários homofóbicos, racistas e admitia a possibilidade de matar por ódio. Seu
pai afirmou que o massacre teve como motivação seu ódio aos gays. Alguns
meses, antes, Omar passeava em Miami Beach e viu dois homens se beijando
publicamente e ficou muito irritado, seu pai, contudo negou que seu filho agiu
com base em questões religiosas. Porém, Omar mantinha contato com o Estado
Islâmico através das redes sociais, inclusive seus colegas de trabalho chegaram
a denunciá-lo por relações com Al-Qaeda e Hezbollah. Foi investigado e inter-
rogado pelo FBI e por uma segunda vez ao contatar Moner Mohammad Abu-
salha, americano, filho de pai palestino que se explodiu na província de Idlib
na Síria no ano de 2014. (Ataque em boate gay deixa 50 mortos em Orlando,
nos EUA. In: G1 12.06.2016). Nos Estados Unidos o ataque terrorista homo-
fóbico ocorrido em Orlando EUA é sintomático. A Coligação Nacional Norte-
-Americana de Programas Contra a Violência informou que o ano anterior ao
massacre, em 2015, ocorreu os maiores níveis de violência contra a comunidade
LGBTQIA+ desde 2011. As vítimas em sua maioria foram mulheres trans de
cor. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos documentou 770 assassinatos
e ataques violentos graves contra pessoas LGBT entre 1º de janeiro de 2013 e 31 de
20
INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO
março de 2014, incluindo 594 assassinatos relacionados a ódio contra pessoas LGBT
no Brasil (Grumbach & McNamara). Na periferia do capitalismo a repressão
é oficializada. É o caso da Nigéria e a condenação ao chicoteamento em praça
púbica de homossexuais.
Na Nigéria Um tribunal islâmico ordenou o chicoteamento de quatro ho-
mens considerados “culpados” de homossexualidade. Os quatro homens, de 22 a
28 anos de idade, receberam quinze chibatadas cada. A sentença, pronunciada por uma
corte islâmica da cidade de Bauchi, não foi executada em público. De acordo com o
oficial de justiça Abdul Mohammed, o julgamento foi fechado ao público porque uma
multidão em fúria havia atacado o tribunal, exigindo a execução dos acusados. Os
condenados criaram um clube gay na cidade de Bauchi. Foi aprovada uma lei que
proíbe a união gay. A lei prevê uma pena de 14 anos de prisão em caso de casamento
homossexual e de 10 anos para pessoas do mesmo sexo que assumem seu relacionamento
publicamente. Sempre é a religião que condena e estimula as condenações por via
oficial o extraoficial. Snyder já escrevia em 1988 sobre os pouquíssimos artigos
que consideravam a religião um fator de impacto nas relações internacionais.
(SNYDER, 1988), no entanto, atualmente existe uma crescente percepção entre os
estudiosos das relações internacionais de que a religião é um fator importante de
compreensão sobre a política global. Dentre diversos fatos históricos é possível
destacar a presença de nações cujo regime é o teocrático, dentre eles menciona-
mos a Revolução Iraniana de 1979 ou o 11 de setembro de 2001 nos Estados Unidos
com o ataque às torres gêmeas e ao pentágono considerado, pelos terroristas,
uma jihad, guerra santa. A ascensão do Estado Islâmico e os conflitos na antiga
Iugoslávia, Irlanda do Norte. Sobretudo a atuação política de líderes religiosos
como o Dalai Lama e o Papa Francisco I.
Segundo matéria do Portal G1 de 22.10.2020: Papa defende união civil gay:
o que Francisco já disse sobre homossexualidade segundo o Papa: “Os homossexuais têm
direito a formar uma família (...) Eles são filhos de Deus e têm direito a uma família.
Ninguém deve ser excluído ou forçado a ser infeliz por isso. (...) O que temos que fazer
é criar uma legislação para a união civil. Dessa forma, eles ficam legalmente cobertos”
A matéria prossegue lembrando que o corpo doutrinário do Vaticano, em 2003,
manifestou-se desaprovação em relação ao casamento de pessoas de mesmo sexo:
“o respeito pelas pessoas homossexuais não pode levar de forma alguma à aprovação do
comportamento homossexual ou ao reconhecimento legal das uniões homossexuais”. (Papa
defende união civil gay: o que Francisco já disse sobre homossexualidade. In:
Portal G1 de 22.10.2020)
21
LGBTQIA+
Segundo Astrid Prange em sua análise publicada na página do DW em
23.10.2020 intitulado: Homossexualidade, um ponto crucial para o catolicismo. Muito
embora, o Papa defenda a união civil entre homossexuais, por outro lado rejeita
o seu casamento religioso e expulsa da igreja os padres gays. Essa controvérsia é
resultado da pressão dos novos fiéis oriundos da África e Ásia. Explica: Quase a
metade dos 1,3 bilhão de católicos do mundo inteiro vive no continente americano, em
especial na América Latina. Na Europa, cerca de 20% da população professa a fé cató-
lica. No entanto, enquanto no Velho Mundo eles são cada vez menos, seu número cresce
fortemente na Ásia e África, segundo o serviço de imprensa do Vaticano, Fides. Atualmen-
te, 18% da população da África é católica. (PRANGE, 2020). Recentemente, o Papa
Francisco adotou uma postura contraditória. Matéria do jornal O Globo informou
em 15.03.2021 que: Com aval do Papa, Vaticano proíbe bênção à união gay e classifica
homossexualidade como pecado. Uma vitória da ala conservadora da Igreja Católica.
Afirma ainda a matéria: O Vaticano anunciou, nesta segunda-feira, que padres e outros
ministros não podem abençoar uniões entre pessoas do mesmo sexo. Segundo nota oficial
divulgada pela Congregação para a Doutrina da Fé, um dos órgãos responsáveis por esta-
belecer diretrizes para os católicos, “Deus não pode abençoar o pecado”.
22
OS DIREITOS LGBTQIA+ E A ONU
Foi em julho de 2013 que o do Alto Comissariado das Nações Unidas para
os Direitos Humanos – ACNUDH – lançou a iniciativa ONU Livres & Iguais. Uma
campanha de informação pública das Nações Unidas, global e sem precedentes, com o obje-
tivo de promover direitos iguais e tratamento justo para pessoas LGBTI. Esta campanha
contou com versões nacionais, ou seja, foi organizado em mais de trinta países.
Consistiu na geração de materiais compartilhados com imagens impactantes sobre
atos discriminatórios e vídeos de conscientização, incluindo o popular clipe no estilo
Bollywood “The Welcome”. (ONU LIVRES & IGUAIS. Disponível em: https://www.
unfe.org/pt-pt/about/ Extraído em 17.03.2021).
Em 2020, a Organização das Nações Unidas – ONU - produziu um relató-
rio onde alerta que terapias de conversão de gays e transgêneros causam riscos de
tortura, assim solicita aos governos do mundo que inibam esta prática. Tais terapias,
segundo a ONU, são baseadas “na noção incorreta e prejudicial de que a diversidade
sexual e de gênero são distúrbios a serem corrigidos”. Portanto, diz o texto, tais práticas
“são de natureza discriminatória”. “Além disso, ações para submeter pessoas lésbicas, gays,
bissexuais, trans ou de gênero à práticas de “terapia de conversão” são consideradas
degradantes à condição humana. Este documento ainda aponta que esta prática
em tese de “cura gay” incluem prestadores de serviços públicos e privados, lideres
religiosos e curandeiros, dentre outros como membros de famílias e autoridades
políticas e alerta que estas terapias podem levar à responsabilização internacional
do Estado que adotar oficialmente estas práticas, pois causam danos psicológicos e
físicos profundos.. (CHADE, 2020).
Mundialmente, desde os anos 80, a ONU tem fomentado o debate e pro-
movido ações em assuntos relativos à orientação sexual dissidente, tal como o
UNAIDS, ou seja, seu programa sobre o HIV-AIDS. Essas ações ocorrem sobre o
resguardo do Alto Comissariado para Direitos Humanos. As demandas relacio-
nadas à questão da orientação sexual somente passaram a ser incorporadas ao Di-
reito Internacional a partir do caso Toonen v. Australia. Trata-se de uma queixa
histórica levada ao Comitê de Direitos Humanos da ONU – UNHRC – em 1994
23
Os dIReITOs LGBTQIA+ e A ONU
por Nicholas Toonen que se queixou das leis da Tasmania que criminalizavam o
sexo consensual entre homens adultos em local privado. Sobretudo, alegou que
era uma violação de seu direito à privacidade que está expresso no artigo 17 do
Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (PIDCP) e também a violação
do Artigo 26 em o qual prevê que homens gays são iguais perante a lei. Sua quei-
xa fez com que perdesse o cargo de Diretor Geral do Conselho Tasmaniano de
AIDS. O Comité concordou que, devido a lei tasmaniana, a Austrália violava as obri-
gações sob o tratado. Em resposta, o Governo da Commonwealth aprovou uma lei que
sobrepunha a criminalização de sexo gay da Tasmânia, as últimas leis da sodomia da
Austrália. Este caso abriu um vasto precedente na legislação internacional. Esta
decisão tem sido frequentemente referida pelo Comitê de Direitos Humanos,
dentre outros órgãos. O Comitê de Direitos Humanos que aplica a normativa
sobre os Direitos Civis e Políticos entende que discriminações por sexo são proi-
bidas. (NAGAMINE, 2019)
Os direitos LGBT foram, nas últimas décadas, objeto de disputas no in-
terior de diferentes países, por exemplo; na República Sul-Africana, na França,
no Canadá, na Dinamarca, na Bélgica, na Holanda e nos Estados Unidos até a
metade dos anos 2000, a discussão girou em torno da legalização da sodomia,
casamento gay e parentalidade. No caso do Brasil são discutidos os direitos su-
cessórios e direitos de guarda. Destaca-se que a descriminalização da sodomia
nos Estados Unidos data de 2003 e a instituição do casamento entre pessoas do
mesmo sexo na Holanda só ocorreu em 2001, na Espanha em 2005 e na França
em 2006. (NAGAMINE, 2019).
No Relatório do Conselho de Direitos Humanos na Organização das Nações Uni-
das: Discriminação e violência contra indivíduos Com base em sua orientação sexual e
identidade de gênero. Está expresso:
Em 1 de junho de 2015, o Alto Comissário das Nações Uni-
das para os Direitos Humanos emitiu um relatório sobre viola-
ções de direitos humanos contra indivíduos com base em sua
orientação sexual e identidade de gênero. O relatório - apenas
o segundo relatório oficial da ONU sobre o assunto - foi soli-
citado pelo Conselho de Direitos Humanos em uma resolução
adotada em setembro de 2014. O primeiro relatório, também
preparado por o Alto Comissário a pedido do Conselho, foi
liberado em dezembro de 2011. O novo relatório baseia-se em
descobertas recentes sobre direitos humanos da ONU órgãos,
24
INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO
organizações regionais e não governamentais organizações,
bem como informações enviadas por Governos. Ele detalha
alguns avanços recentes importantes na proteção dos direitos
de lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros (LGBT) e pessoas
intersex - incluindo a introdução de novas leis contra a discri-
minação e crimes de ódio, reconhecimento legal de relações do
mesmo sexo, proteção de crianças intersex, e mudanças que
tornam mais fácil para pessoas transexuais ter sua identidade
de gênero legalmente reconhecida. Mesmo assim, o relatório
observações, pessoas LGBT e intersex em todas as regiões
enfrentam “Abuso contínuo, generalizado e violento, assédio
e discriminação.”. (“Relatório do Conselho de Direitos Hu-
manos na Organização das Nações Unidas: Discriminação
e violência contra indivíduos Com base em sua orientação
sexual e identidade de gênero”)
Os casos mencionados neste texto como o massacre de Orlando e as leis
que condenam a homossexualidade como no caso da Nigéria e Uganda.
Principais conclusões · A violência motivada pelo ódio contra pes-
soas LGBT é generalizada, brutal e muitas vezes perpetrada com
impunidade. Pessoas LGBT e intersex também são vítimas de tor-
tura e maus tratos, inclusive sob custódia e em clínicas e hospitais.
• Em muitos países, a lei é usada para punir indivíduos com base
em sua orientação sexual e gênero identidade, e para restringir
os direitos à liberdade de expressão, associação e assembleia:
76 países criminalizam relações consensuais entre pessoas do
mesmo sexo; em sete a morte penalidade pode ser aplicada.
• “Discriminação diária”, alimentada por entrincheirados atitu-
des discriminatórias e facilitadas pela falta de leis antidiscrimi-
nação eficazes, afetam LGBT e pessoas intersex em todos os
lugares - inclusive na educação, saúde, emprego, habitação e
dentro das famílias.
• Os Estados estão legalmente vinculados aos direitos humanos
internacionais lei para respeitar, proteger e cumprir os direitos
humanos de todos pessoas dentro de sua jurisdição - incluindo
aqueles que são LGBT e intersex. (“Relatório do Conselho
de Direitos Humanos na Organização das Nações Unidas:
Discriminação e violência contra indivíduos Com base em
sua orientação sexual e identidade de gênero”)
O relatório afirma que as pessoas de orientação homossexual enfrentam
atitudes discriminatórias diariamente e detecta que isto ocorre devido á ausência
25
Os dIReITOs LGBTQIA+ e A ONU
de uma legislação antidiscriminação nos Estados vinculados aos direitos humanos.
O relatório da ONU recomenda a revogação das leis discriminatórias aplicadas à
comunidade LGBT adotados por países como a Nigéria, dentre outros:
Recomendações principais
• Revogar as leis usadas para punir as pessoas com base em sua
orientação sexual e identidade e expressão de gênero - incluin-
do leis que criminalizam relações consensuais entre pessoas do
mesmo sexo e as chamadas “anti-propaganda” leis.
• Promulgar leis anti-discriminação eficazes que protegem Pes-
soas LGBT e intersexo da discriminação, e trabalhar para aca-
bar com os estereótipos negativos, inclusive por meio campa-
nhas de educação pública.
• Investigar alegado ódio homofóbico e transfóbico crimes, tor-
tura e abusos relacionados. Promulgar crime de ódio leis que
impõem penas mais duras a criminosos que visar as vítimas
por causa de sua orientação sexual ou identidade de gênero.
Torne ilegal incitar ao ódio e violência contra pessoas LGBT.
• Proibir tratamentos forçados e involuntários e médicos pro-
cedimentos em pessoas LGBT e intersex. · Fornecer reco-
nhecimento legal para casais do mesmo sexo e proteger os
direitos de seus filhos.
• Certifique-se de que todos tenham acesso à identidade legal
documentos que refletem seu gênero autoidentificado, sem
requisitos abusivos, como esterilização, tratamento forçado
ou divórcio.
• Certifique-se de que ninguém sofra perseguição porque eles
são LGBT ou intersexuais são devolvidos a um território
onde sua vida ou liberdade seriam ameaçadas.
• Consultar LGBT e pessoas intersex e a sociedade civil ao fa-
zer leis e políticas que afetam seus direitos.
(“Relatório do Conselho de Direitos Humanos na Organi-
zação das Nações Unidas: Discriminação e violência contra
indivíduos Com base em sua orientação sexual e identidade
de gênero”)
O relatório destaca medidas positivas que são adotadas em muitos países.
Destaca o caso de países que introduziram o casamento ou união estável entre
pessoas do mesmo sexo a adoção de leis que tornam mais fácil o reconhecimento
de gênero no âmbito legal.
26
INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO
Maré de Progresso O relatório destaca muitos exemplos de ini-
ciativas positivas tomadas por governos nacionais, provinciais e
locais - incluindo medidas para combater crimes de ódio, lidar
com o bullying de crianças e garantir um tratamento justo para
pessoas LGBT e intersex no local de trabalho e no acesso à ha-
bitação, saúde e público Serviços. Desde 2011, quando o Alto
Comissário foi convidado pela última vez para relatório sobre
este assunto ao Conselho de Direitos Humanos da ONU:
• 3 países descriminalizaram consensualmente o mesmo sexo
relacionamentos;
• 14 adotaram ou fortaleceram a antidiscriminação ou leis con-
tra crimes de ódio, estendendo a proteção para LGBT e pes-
soas intersex;
• 12 introduziram casamento ou união civil para casais do mes-
mo sexo que oferecem benefícios equivalentes e direitos;
• 10 mudaram as leis de reconhecimento de gênero para torná-lo
mais fácil para pessoas transexuais obterem legalmente docu-
mentos de identificação que refletem seu gênero identidade;
• 1 país introduziu proteção legal para a integridade física de
crianças intersex; e · Em dezenas de países, equipes médicas,
professores, polícia, juízes e guardas prisionais agora estão re-
cebendo gênero e HTS.
(“Relatório do Conselho de Direitos Humanos na Organi-
zação das Nações Unidas: Discriminação e violência contra
indivíduos Com base em sua orientação sexual e identidade
de gênero”)
Alguns exemplos se encontram nos Estados Unidos e na índia. No caso dos
Estados Unidos a tribo dos Apaches Chiricahua possuem identidades de gênero
sagradas, tais como gênero o masculino-masculino/feminino-masculino/femini-
no-feminino. Gerônimo Francisco que vive na reserva Navajo afirma que o gênero
feminino-masculino é algo que está mais próximo dela, a designação é Nádleehí, ou
seja, alguém que possui o corpo masculino e uma natureza feminina, ou que performa o
papel de homem e mulher e que pode se vestir de maneira feminina ou masculina. Em
Nova Dhelí os gêneros vão para além do feminino-masculino, ou seja, legalmente
existem três gêneros. Em 2014, a Suprema Corte da Índia reconheceu legalmente
a existência de um terceiro gênero, mas para além do aspecto legal existem, apro-
ximadamente, vinte a vinte e oito gêneros diferentes. A indiana Leher de 23 anos,
afirma que não é transgênero, pois na índia existe um terceiro gênero também cha-
mado de “gênero sagrado” que possui o poder de abençoar ou amaldiçoar. Afirma
também que o gênero binário nunca existiu ali. Tanto Leher quanto Gerônimo
27
TemAs TABUs NAs escOLAs BRAsILeIRAs: A dIveRsIdAde sexUAL
afirmam que a ideia de múltiplos gêneros se perdeu após o colonialismo europeu,
sobretudo os ingleses e espanhóis que assassinaram as pessoas que não eram bi-
nárias e movidos por suas concepções religiosas, pela fé católica ou protestante,
segundo a indiana Leher a colonização corrompeu a mentalidade da população indiana
que hoje talvez seja transfobica ou homofóbica. (“Os povos em que o gênero vão para
além de masculino e feminino há séculos”. In: BBC News Brasil. 02.08.2020).
Na índia as consideradas no ocidente, transgêneros, possuem como divindade as
Deusas Bahuchara Mata e Yellama Devi. Acreditam que o Ser Supremo ao criar
o homem e mulher também criou a pessoa transgênero. Muitos acreditam que as
pessoas trans são enviadas/enviados de Deus, assim as pessoas as procuram para
receber sua benção, acreditam que suas preces chegarão mais rápidas aos Deuses.
(“A mais antiga comunidade transgênero da Índia ainda luta para ser aceita.”
In: BBC News Brasil: 25.12.2020).
TEMAS TABUS NAS ESCOLAS BRASILEIRAS:
A DIVERSIDADE SEXUAL
Independente do fato de ser adequado ou inadequado, o chamado jocosa-
mente de kit gay levantou a polêmica. Esse foi o material informativo que seria
distribuído às escolas do Brasil pelo Ministério da Educação para informar sobre a
homossexualidade com o objetivo de combater o preconceito. A bancada religiosa
do Congresso Nacional do Brasil pressionou o governo da então presidenta Dilma
Rousseff que cedeu e suspendeu sua distribuição. Naquele momento, a presidenta
teve receio de perder o apoio da bancada religiosa no Congresso Nacional, ou seja,
o caso ganhou contornos políticos. Foi como se estivéssemos em um sistema de
governo teocrático (governo que une política e religião) e não republicano. Na es-
cola, os educadores, trabalham com jovens que possuem individualidades as mais
variadas, são evangélicos, católicos, umbandistas, espíritas. Gostam de rap, funk,
rock e axé. São negros, brancos e de origem oriental e em muitos casos possuem
diferentes orientações sexuais. Na escola brasileira, questões como a homossexua-
lidade são veladas, assim como; outros grupos negligenciados pela escola brasileira
como os negros e a questão do preconceito racial, as mulheres e a questão de gê-
nero, ou seja, o papel da mulher na sociedade e os soropositivos, esses são os mais
invisíveis de toda a escola brasileira, pois não se ouve falar deles.
28
INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO
Esses são temas tabus nas escolas brasileiras. O mundo nos últimos anos
passa por mudanças onde os grupos sociais, considerados excluídos, estão se
organizando e reivindicando o direito à sua individualidade. Movimentos que
protestam contra as violências cometidas às mulheres, violências físicas e ver-
bais, assédios morais, sexuais e assassinatos. Elas estão indo as ruas com carta-
zes chamando a atenção para a sua causa, movimento como a parada gay que
reúne a cada ano um número cada vez maior de adeptos. Os soropositivos fa-
zem campanhas e contam ainda com o dia internacional de combate a AIDS.
A escola brasileira passa ao largo dessas questões que o mundo está discutindo
e há enormes resistências. Esses temas que chamo de temas tabu para a escola
brasileira. Essa visão dos gestores educacionais resulta no aumento vertiginoso
de casos de bullying: agressões verbais e físicas, assédio moral, constrangimentos
ilegais. A escola brasileira faz a opção por silenciar frente a estas questões. Muitos
educadores, desde os gestores, até mesmo os professores, tem sérias limitações
em lidar com tais temas. Muitos professores são conservadores e na maioria
dos casos, não agem como um agente público de um estado laico, mas educam
baseados em seus pressupostos religiosos (como se vivessem em uma teocra-
cia), assim repelem qualquer discussão referente à homoafetividade, pois segun-
do eles; Deus desaprova tal orientação sexual. Em outros casos o machismo de
professores leva a um preconceito velado, seus comentários e comportamentos
são homofóbicos. Na maioria dos casos o silêncio e a invisibilidade são, de lon-
ge, as medidas mais adotadas entre os educadores e a escola contra a discussão
sobre a homossexualidade. O polêmico kit escolar, embora constrangedor para
um mundo predominantemente heterossexual, fora importante, pois iniciou uma
discussão sobre o tema. Hoje há consenso de que ninguém se torna homosse-
xual, assim o tal kit não irá incentivar os jovens a aderirem à homossexualidade,
mas conscientizá-los sobre o preconceito. A escola jamais deverá incentivar a
homossexualidade e de tal modo não deverá também incentivar igualmente seus
alunos a heterossexualidade.
29
TemAs TABUs NAs escOLAs BRAsILeIRAs: A dIveRsIdAde sexUAL
30
O ATLAS DA VIOLÊNCIA NO BRASIL 2020
O documento Atlas da violência de 2020 aponta que a grande dificuldade é a
escassez de indicadores de violência contra pessoas da comunidade LGBTQIA+.
Indica que um grande passo seria a inclusão de questões de identidade de gênero e
orientação sexual no próximo recenseamento de 2021 e também estejam presentes
nos Boletins de Ocorrência e nas estatísticas geradas através do sistema de segu-
rança pública. As informações do Atlas da violência 2020 foram obtidas a partir
do trabalho desenvolvido pelo Grupo Gay da Bahia – GGB - Associação Nacional de
Travestis e Transexuais – ANTRA, ou seja, dados recolhidos pela sociedade oriundos
de denúncias registradas pelo Disque 100, do Ministério da Mulher, da Família e dos
Direitos Humanos – MMFDH - e dos registros do Sistema de Informação de Agravos
de Notificação – SINAN - e Ministério da Saúde.
A tabela dos dados obtidos a partir do Disque 100 que recebe denúncias de
violações dos direitos humanos. As denúncias totais de violências cometidas contra
a população LGBTQIA+ tiveram seu pico em 2012. Os anos seguintes demonstram
que embora os números ainda sejam altos, ocorreu uma redução. Destacamos que
os números de 2018 são ainda superiores aos do ano de 2011, assim como pode ser
observado na tabela abaixo.
GRÁFICO 21
Número de denúncias de homicídio e de tentativa de homicídio contra pessoas LGBTQI+, segundo o Disque 100 – Brasil
(2011-2018)
2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018
5
19
26
35
28
85
193
138
30
41
28
15
22 17
26
49
0
50
100
150
200
250
Homicídios Tentativas de homicídio
FONTE: atlas Da ViolêNCia 2020:
httPs://www.iPea.goV.Br/atlasVioleNCia/DowNloaD/24/atlas-Da-VioleNCia-2020 (PágiNa 56)
31
O ATLAs dA vIOLêNcIA NO BRAsIL 2020
O Sistema de Informação de Agravos de Notificação – SINAN – reúne os da-
dos de violência nos serviços de saúde do Brasil notificados compulsoriamente.
O SINAN classifica como violência: a violência física; violência psicológica; tráfi-
co humano; trabalho infantil; tortura; violência sexual; violência financeira; negli-
gência ou abandono; intervenção legal, etc. Categoriza somente orientação sexual,
conforme as categorias heterossexual, homossexual ou bissexual, não categoriza
identidade de gênero, o que nos impossibilita obter dados sobre a violência come-
tida contra pessoas trans.
GRÁFICO 23
Número total de casos de violência contra homossexuais e bissexuais (2017-2018)
23A – Homossexuais
0
1.000
2.000
3.000
4.000
5.000
6.000
7.000
8.000
Δ= 24,5%
Δ= 25,6%
Δ= -12,7%
Bruto Mesmo município Mesmas unidades
2017 2018
FONTE: atlas Da ViolêNCia 2020:
httPs://www.iPea.goV.Br/atlasVioleNCia/DowNloaD/24/atlas-Da-VioleNCia-2020 (PágiNa 63)
O gráfico acima descreve registros de violência cometida contra os homos-
sexuais e bissexuais ocorridos entre 2017 e 2018. O procedimento é o mesmo do
Atlas da violência de 2019, ou seja, é realizada em etapas; primeiro, a comparação
do número bruto entre 2017 e 2018; segundo: o tratamento isolado os municípios
que já possuíam o serviço especializado de atendimento a homossexuais e bisse-
xuais em 2017, assim isolando possíveis aumentos no número de casos devidos ao
incremento da rede de serviços especializados. Os dados mostram uma redução no
número de violência contra a população LGBTQIA+. Tanto no Atlas da Violência
de 2019 quanto à edição de 2020 nota-se que as vítimas são em sua maioria negras
habitantes da área urbana e solteiras, com exceção das vítimas bissexuais em 2017
e mulheres são mais vitimadas que os homens, estes são majoritariamente os que
cometeram as agressões. Carecemos de ampliação dos registros sobre a popula-
ção LGBTQIA+ e fazer uma conexão com a dimensão racial considerando a Lei
de Racismo (Lei no 7.716/1989). Em 13.06.2019 O Supremo Tribunal Federal do
Brasil enquadrou a homofobia e da transfobia como tipo penal definido na Lei do
Racismo (Lei 7.716/1989). Assim como a comunidade LGBTQIA+ as mulheres
32
INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO
também fazem parte de um grupo que possui grandes vulnerabilidades impostas
pelo machismo e misoginia que agride, restringe, persegue, discrimina as mulheres.
Um caso explicito que diz respeito à condição feminina e também à homofobia,
lesbofobia na considerada civilização ocidental, mas especificamente a Rússia é o
Caso do grupo punk chamado Pussy Riot.
PUSSY RIOT
É um grupo de punk rock formado em 2011 que transforma seus shows em
manifestação política. Suas influências feministas são Simone de Beauvoir, Andrea
Dworkin, Emmeline Pankhurst, Shulamith Firestone, Kate Millett, Rosi Braidotti
e Judith Butler. É formado por 10 artistas, 15 assistentes técnicos que filmam e
editam seus vídeos postados e difundidos na internet. Dentre seus temas, o prin-
cipal; os direitos das mulheres na Rússia. As posições políticas dos grupos vão do
liberalismo ao anarquismo defendem a união do feminismo e o anti-autoritarismo,
sobretudo oposição ao presidente Vladmir Putin, segundo elas: “o continuador da
política imperial agressiva da antiga União Soviética”. São também contra a desigual-
dade econômica que é uma característica comum entre Rússia e Estados Unidos
e, sobretudo contra as políticas discriminatórias das mulheres como o aborto. Em
21.11.2012 o grupo promoveu na Catedral Cristo Salvador em Moscou um protesto
contra o apoio da Igreja Ortodoxa à candidatura de Vladimir Putin e, sobretudo à
sua lei discriminatória à propaganda gay. Neste protesto cantam uma música cuja
letra narra um pedido do grupo à Virgem Maria para tirar Putin do poder e questio-
na como o Patriarca da Igreja Ortodoxa Kirril I pode acreditar em Putin e não em
Deus. A manifestação foi considerada sacrilégio pela Igreja Ortodoxa.
Membros do P. R. foram presas sem direito à fiança. Maria Alyokhina, Na-
dezhda Tolokonnikova e Yekaterina Samutsevich foram condenadas por “hooliga-
nismo motivado pelo ódio religioso”. As duas últimas foram para as prisões russas
incomunicáveis e submetidas a trabalhos forçados. A prisão teve repercussão inter-
nacional, pois organizações como a Anistia Internacional, inclusive artistas como
Madonna, Paul McCartney, U2, Adele e Yoko Ono se manifestaram em solidarieda-
de ao Pussy Riot e denunciaram o caso. Tolokonnikova foi encarcerada no IK-14 na
Mordóvia mesmo local onde existiam os campos de trabalho dos lendários Gulags
da época do stalinismo. No mês de setembro de 2013, Tolokonnikova começou a
33
PUssy RIOT
fazer greve de fome para denunciar as condições desumanas desta prisão. Cumpri-
ram 21 meses de pena sendo libertadas em 23.12.2013 após a anistia concedida pelo
parlamento russo. No momento em que saiu da prisão Maria Alyokhina afirmou
que a libertação do grupo era propaganda do governo e que continuariam sua lu-
tam em defesa do feminismo e da causa LGBT
PROTESTO DA PUSSY RIOT NA CATEDRAL CRISTO SALVADOR EM
MOSCOU NO DIA 21.11.2012
FONTE: mazsol:
httPs://maszol.ro/kUlfolD/5778-a-moszkVai-Birosag-Betiltotta-a-PUssy-riot-kliPjeit
TOLOKONNIKOVA NA CELA DURANTE SEU JULGAMENTO
FONTE: CryPtome.org/getty images
httPs://CryPtome.org/2012-iNfo/PUssy-riot/PUssy-riot.htm
34
INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO
MARIA ALYOKHINA, NADEZHDA TOLOKONNIKOVA E YEKATERINA
SAMUTSEVICH
FOTO: Dw/aP:
httPs://www.Dw.Com/eN/PUssy-riot-trial-BegiNs/a-16114145
Na Copa do Mundo 2018 no jogo final entre França e Croácia, aos 52 minu-
tos da partida, membros do Pussy Riot disfarçados de policiais, invadiram o grama-
do protestando contra o presidente russo Vladimir Putin. Outro protesto ocorreu
no dia 13 de novembro de 2019, em Brasília, no Festival Bravas Brasil3
- em defesa
da vida das mulheres. Na ocasião a cidade recebia também o encontro dos pre-
sidentes do BRICS – grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do
Sul. Nadya Riot afirmou: “O BRICS não é nada além de um grupo de criminosos, que
praticam o autoritarismo, violência baseada em gênero, racismo e neoliberalismo. Tudo o
que a gente odeia. As mulheres precisam reagir!”, a vocalista Nadya Tolokno também
se expressou ao dizer que os BRICS eram “Um grupo de criminosos que se juntaram
em uma gangue para aprimorarem sua criminalidade. Nada bom virá deles. Mudança
sempre terá de vir de você. Fora Bolsonaro! Fora Putin! Eles nunca!”.
3 BRAVAS mulheres que unem forças, expertises e talentos, na captação de parcerias para a realização de ações que visam por meio
da expressão artística, chamar a atenção da sociedade para os graves problemas: importunação sexual, violência online, estupro,
feminicídio e violência doméstica.
35
PUssy RIOT
FOTO: C. hartmaNN / reUters
liNk Da foto. httPs://ogloBo.gloBo.Com/esPortes/grUPo-femiNista-PUssy-riot-assUme-
aUtoria-De-iNVasao-Na-fiNal-Da-CoPa-22888286
O caso dos membros da banda Pussy Riot revela a repressão do ocidente às
questões de gênero. Em se falando em feminismo, é correto, antes, perguntarmos;
qual feminismo? As respostas poderão ser as mais variadas, dentre eles poderíamos
responder, por exemplo; o feminismo negro.
O Feminismo negro ganhou impulso somente após 1960, sobretudo após
a fundação do National Black Feminist em 1973, nos Estados Unidos. A partir da
NBF surgiu a partir do que podemos chamar de literatura feminista negra. No
Brasil, a origem do movimento feminista negro data de 1985 com a realização do
III Encontro Feminista Latino-Americano. Este evento influenciará a criação dos pri-
meiros coletivos de mulheres negras e também encontros regionais e nacionais. O
Encontro de Bertioga em 1995 foi também muito importante, pois foi a partir dele
que as mulheres negras aderiram completamente ao feminismo. Para Djamila Ri-
beiro é preciso que as mulheres feministas brancas reconheçam as particularidades
do movimento feminista negro, sobretudo reconhecer seus privilégios em relação
em relação às mulheres negras. (RIBEIRO, 2018)
Djamila Ribeiro (2018) relata que a primeira onda do feminismo ocorreu
no início do século XX com a criação da Federação Brasileira pelo Progresso Fe-
minino cujas reivindicações eram a igualdade na vida pública como o direito ao
voto (sufrágio feminino) e o direito ao trabalho sem a necessidade de autorização
do marido. A terceira onda corresponde aos anos 90 tendo como sua principal
36
INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO
expoente Judith Butler que colocou em discussão no âmbito da micropolítica, so-
bretudo o fato de que as mulheres não são oprimidas da mesma forma e assim é
preciso rejeitar o discurso universal sobre a mulher por ter no caráter excludente,
assim necessitamos de um recorte de classe e raça. Menciona Simone de Beauvoir
e sua afirmação sobre a desnaturalização do ser mulher descrita em seu livro,
intitulado: “O Segundo Sexo”. Conhecida no Brasil pela afirmação: “Ninguém
nasce mulher, torna-se mulher”. Distingue a construção de “gênero” e “sexo dado”,
assim demonstrando que não é possível atribuir às mulheres certos valores e
comportamentos biológicos determinados, ou seja, a divisão entre sexo e gênero
torna-se o sustentáculo da política feminista, pois o sexo é natural, mas o gênero
é social ou socialmente construído e imposto. É a partir desta constatação que
Butler questiona o conceito de mulheres como sujeito do feminismo, rejeita o
modelo binário: “homem” e “mulher” e desnaturaliza o gênero. Este movimen-
to permite a incorporação das mulheres trans ao gênero feminino, ou seja, uma
rejeição à biologização da mulher (destino biológico). (RIBEIRO, 2018). Estas
questões colocam em evidência o que é gênero e exigem uma reconceitualização
sobre o feminino. A luta das mulheres passa pelo aspecto conceitual, sobretudo
nos espaços acadêmicos, na universidade, no entanto o próprio espaço universi-
tário revela sua misoginia. Este também é um espaço de luta contra a heteronor-
matividade e o machismo. Os abusos cometidos contra as mulheres poderão ser
observados, no caso dos protestos da chamada “Marcha das Vadias”.
A Marcha das Vadias ocorreu no dia 3 de abril de 2011 em Toronto, no
Canadá, um protesto contra a afirmação de que as mulheres vitimadas por estu-
pro são responsáveis por esta violência devido a um comportamento considerado
“inapropriado”. No protesto elas contaram as violências sexuais que sofreram e
usaram roupas provocantes: blusinhas transparentes, lingerie, saias, salto alto ou
apenas o sutiã. No dia 11 de janeiro de 2011 ocorreram casos de abuso sexual na
Universidade de Toronto no Canadá. O policial responsável por apurar os casos fez
uma observação misógina ao dizer que “as mulheres evitassem se vestir como vadias,
para não serem vítimas”. Os protestos se espalharam pelo mundo em Los Angeles,
Chicago, Buenos Aires e Amsterdã e no Brasil: São Paulo, Rio de Janeiro, Vitória,
Recife, Fortaleza, Salvador, Itabuna, Goiânia, Belo Horizonte, Brasília, Curitiba,
Ponta Grossa, Pelotas, Florianópolis, Porto Alegre, João Pessoa, Campina Grande,
Santa Maria, Londrina, São José do Rio Preto, Cuiabá e Maceió, além de outras. A
antropóloga Julia Zamboni afirma que “Ser chamada de vadia é uma condição machis-
ta. Os homens dizem que a gente é vadia quando dizemos sim para eles e também quando
dizemos não” (...) A gente é vadia porque a gente é livre”, destacou.
37
PUssy RIOT
FOTO: reDe Brasil atUal.
DISPONÍVEL EM: ‘marCha Das VaDias’, em são PaUlo, CritiCa o maChismo - reDe Brasil atUal
Segundo AZEVEDO JUNIOR, CASAREJOS & VIANA (2015) no texto intitu-
lado: “A Marcha das Vadias: o corpo-signo da autonomia feminina na mídia”, a marcha
é a declaração feminina de que toda mulher possui autonomia de decisão sobre seu
corpo. A Marcha intenta construir uma subversão, propor um liberalismo além do político
e cultural, valorizar o corpo-signo, também, como um corpo individual e não apenas coleti-
vo, portanto, objeto de uma legislação cerceadora. A utilização do termo marcha permite
compreender a cadencia deste movimento tal como um cortejo que ocupa o espaço
público de forma caricata, divertida, combativa, explícita e ao mesmo tempo séria,
fazendo uso de um intenso aparato midiático horizontal e descentralizado.
Assim, ao ampliar o significado do termo ‘marcha’, teremos
uma compreensão desse movimento que segue cadenciado, de-
senvolve-se como expressão, em cortejo, marcando o desejo de
possuir o corpo-suporte de sua individualidade. Como espa-
ço feminista, a Marcha pode ser compreendida como releitura
contemporânea de antigos happenings, como a queima de sutiãs
ou os discursos exaltados nas universidades, no sentido de que
ocupa espaços públicos de forma caricata, divertida, combativa,
explícita e ao mesmo tempo séria, fazendo uso de um intenso
aparato midiático horizontal e descentralizado. Desta forma, não
há um site oficial do movimento, não há uma sede específica, ou
algum coletivo que assume para si o direito autoral ou de ori-
gem da Marcha. Como fenômeno e representação da realidade.
(AZEVEDO JUNIOR, CASAREJOS & VIANA, 2015).
38
INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO
Segundo a revista Carta Capital de 22.01.2017 a Marcha das Mulheres reúne
milhares contra Trump em todo o mundo. Foi uma série de manifestações em favor
dos direitos das mulheres e das minorias que começaram nos Estados Unidos,
mas que ganhou a adesão em todo o mundo. Foram marcadas mais de 670 ma-
nifestações em 20 países, como a Austrália e a Nova Zelândia. Em Washington,
personalidades como as atrizes Scarlett Johansson, Ashley Judd e Julianne Moo-
re, Alicia Keys, o documentarista Michael Moore compareceram. Madonna fez
um discurso contra Trump. Um gorro cor de rosa com orelhas de gato se tornou
um símbolo das mulheres que criticam Trump. O gorro é conhecido como pussy
hat, um trocadilho com a palavra pussycat. Em inglês, pussy pode significar tanto
gatinha ou gatinho como o órgão sexual feminino, em linguajar vulgar. A atriz
America Ferrer, declarou; “Marchamos hoje pelo núcleo moral desta nação, contra o
qual o novo presidente está entrando em guerra” (...) Nossa dignidade, nosso caráter,
nossos direitos estão sob ataque, e a plataforma de ódio e divisão assumiu o poder ontem.
Mas o presidente não é os Estados Unidos. Nós somos os Estados Unidos e estamos aqui
para ficar. (Marcha das Mulheres reúne milhares contra Trump em todo o
mundo. In: CARTA CAPITAL, 22/01/2017).
Segundo a matéria da BBC DE 06.02.2013 assinada por Jill McGivering Mi-
lhares de indianas teriam tido útero retirado sem necessidade tais procedimentos
estariam sendo realizados por médicos inescrupulosos, motivados por dinheiro.
A reportagem menciona o caso de uma mulher que se identifica por Sunita e que
afirma morar na aldeia do Rajastão na Índia. Ela é uma jovem de 25 anos. Ela conta
que foi à clinica após um sangramento durante a menstruação. Afirma: “Fui inter-
nada no mesmo dia e a operação foi realizada no final da tarde (...) O médico fez
uma ultrassonografia e disse que eu poderia desenvolver câncer. Ele me pressionou
para que fizesse a histerectomia (operação de retirada do útero) no mesmo dia.”
Sunita disse que não teve tempo para decidir se faria ou não a cirurgia, pois o mé-
dico afirmou que deveria ser operada imediatamente, assim enviou-a para a mesa
de cirurgia após algumas horas. Após esta cirurgia Sunita afirma que sua saúde
não é mais a mesma, pois encontra dificuldades em realizar suas tarefas cotidianas.
(SUNITA Apud MCGIVERING, 2013).
Metade das vizinhas de Sunita afirmou ter sofrido uma histerectomia, ge-
ralmente mulheres entre 20 e 30 anos. Os médicos cobram em torno de duzentos
dólares pela cirurgia de retirada de útero. Nem todos possuem recursos e o que
ocorre é que as famílias vendem seus pertences. Ao ser questionado sobre seu
método de diagnóstico sobre a existência de células pré-cancerígenas o médico
39
cONfeRêNcIAs PeLOs dIReITOs hUmANOs dAs mULheRes
admitiu que não faz biópsias antes da retirada do útero. Outras localidades como
Bihar, Chhattisgarh e Andhra Pradesh estão ocorrendo isto. Em geral as mulheres
dizem que se submetem à cirurgia ao serem alertadas pelos médicos de que, caso
contrário, poderiam desenvolver câncer. A reportagem menciona que o ativista
Narendra Gupta, da organização Prayas (parceira local da conhecida ONG Oxfam),
está convicta de que são abusos cometidos por muitos médicos particulares, afir-
ma; “As pessoas dizem que em alguns lugares há distritos inteiros sem útero (...) Parece que
os médicos particulares veem isso (a operação) como uma oportunidade para fazer dinheiro
rápido com doenças que poderiam ser tratadas de forma mais simples e menos invasiva.”
(MCGIVERING, 2013).
O relatório de Kundan Kumar, juiz em Samastipur, que convidou mulheres
operadas a se submeteram a uma avaliação realizada por médicos independentes,
indicou que das 2.606 mulheres examinadas, 12% ou 316 mulheres tiveram seus
úteros removidos desnecessariamente. Foi verificado também que em alguns ca-
sos, os médicos não realizaram as cirurgias, apenas fizeram uma incisão superficial
para enganar sua paciente. Kumar acusa algumas clínicas privadas de cometerem
“excessos” para obter “ganhos egoístas” e está preparando processos contra elas.
(MCGIVERING, 2013).
Casos como este revelam as violações dos direitos humanos aos quais as
mulheres estão sendo submetidas em todo mundo. Um dos seus instrumentos de
luta são as conferências mundiais que reúne mulheres de diferentes regiões do
mundo, elas trocam experiências e estabelecem estratégias e diretrizes políticas co-
muns a serem implementadas pelos Estados e governos sob o respaldo e chancela
da ONU que incorpora suas diretrizes, denunciam e cobram seus países membros
para a adoção de medidas que salvaguardem o direitos humanos das mulheres.
CONFERÊNCIAS PELOS DIREITOS HUMANOS DAS
MULHERES
O marco da luta das mulheres por igualdade foi a Conferência sobre População
e Desenvolvimento realizada em 1994 na cidade do Cairo Egito. Foram estabelecidas
diretrizes de atuação e implantação de políticas públicas para o combate à violência
40
INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO
contra as mulheres no mundo. Esta foi a quinta Conferência Mundial de População
das Nações Unidas, antes tivemos as conferências de Roma, em 1954, em Belgrado,
1965, Bucareste, 1974 e, em 1984 na Cidade do México. Esta conferencia foi realizada
pela Organização das Nações Unidas – ONU – no Cairo, Egito, entre os dias 05 e
13 de setembro de 1994. A conferência estabeleceu um Programa de Ação que é o
documento orientador do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), reuniu
20.000 delegados representando governos, agências da ONU, ONGs e a mídia. Os te-
mas em discussão envolveram questões populacionais. A conferência obteve consenso
em relação, a) educação universal; b) Redução da mortalidade infantil; c) Redução da
mortalidade materna; d) Acesso a serviços relativos à sexualidade, reprodução e plane-
amento familiar. (Fonte: ONU MULHERES Brasil: Conferências Mundiais da Mulher).
Outras conferências foram realizadas em todo o mundo deixando clara a
disposição das mulheres em atuar mundialmente pela libertação feminina dos gri-
lhões de uma sociedade com uma hegemonia cultural: machista e misógina. Des-
tacamos na sequência outros eventos importantes que ocorreram em todo mundo
segundo o site da ONU Mulheres.
1980 – II Conferência Mundial da Mulher sob o lema “Educação, Emprego
e Saúde”, Copenhague: “a comunidade internacional tomou mais consciência sobre a
falta de participação dos homens no processo de igualdade, vontade política insuficiente por
parte dos Estados para o enfrentamento às desigualdades de gênero, escassez de mulheres nos
postos de decisões, baixo investimento nos serviços sociais de apoio, entre outros fatores. O
programa de ação da II Conferência Mundial sobre a Mulher demandou medidas nacio-
nais mais fortes para garantir a propriedade e controle de propriedade das mulheres, bem
como melhorias nos direitos das mulheres em relação à herança, guarda dos filhos e nacio-
nalidade. No balanço do decênio chegou-se à constatação de que poucas metas tinham sido
alcançadas, conduzindo a mais organização e pressão da sociedade civil. Houve cobrança
de mais participação das mulheres na produção das riquezas das sociedades. Em razão disso,
foram apontadas medidas de caráter jurídico, para alcançar a igualdade na participação
social e na participação política e nos lugares de tomada de decisões. Dentre os compromissos,
destacam-se: a igualdade no acesso à educação, oportunidades no trabalho e atenção à saúde
das mulheres.” (Fonte: ONU MULHERES Brasil: Conferências Mundiais da Mulher).
1985 – III Conferência Mundial sobre a Mulher com tema central “Estraté-
gias Orientadas ao Futuro, para o Desenvolvimento da Mulher até o Ano 2000”,
Nairóbi. “No balanço do decênio chegou-se à constatação de que poucas metas tinham
sido alcançadas, conduzindo a mais organização e pressão da sociedade civil. Houve co-
41
cONfeRêNcIAs PeLOs dIReITOs hUmANOs dAs mULheRes
brança de mais participação das mulheres na produção das riquezas das sociedades. Em
razão disso, foram apontadas medidas de caráter jurídico, para alcançar a igualdade na
participação social e na participação política e nos lugares de tomada de decisões. Dentre
os compromissos, destacam-se: a igualdade no acesso à educação, oportunidades no trabalho
e atenção à saúde das mulheres. O programa de ação da Segunda Conferência Mundial
sobre a Mulher demandou medidas nacionais mais fortes para garantir a propriedade e
controle de propriedade das mulheres, bem como melhorias nos direitos das mulheres em
relação à herança, guarda dos filhos e nacionalidade. A comunidade internacional tomou
mais consciência sobre a falta de participação dos homens no processo de igualdade, von-
tade política insuficiente por parte dos Estados para o enfrentamento às desigualdades de
gênero, escassez de mulheres nos postos de decisões, baixo investimento nos serviços sociais de
apoio, entre outros fatores. Dentre os compromissos, destacam-se: a igualdade no acesso à
educação, oportunidades no trabalho e atenção à saúde das mulheres. O programa de ação
da Segunda Conferência Mundial sobre a Mulher demandou medidas nacionais mais
fortes para garantir a propriedade e controle de propriedade das mulheres, bem como me-
lhorias nos direitos das mulheres em relação à herança, guarda dos filhos e nacionalidade.”
(Fonte: ONU MULHERES Brasil: Conferências Mundiais da Mulher).
1995 – IV Conferência Mundial sobre a Mulher com tema central “Ação
para a Igualdade, o Desenvolvimento e a Paz”, China. “A Plataforma de Ação de
Pequim afirma os direitos das mulheres como direitos humanos e comprometidos com
ações específicas para garantir o respeito a esses direitos. Define o conceito de gênero para
a agenda internacional, empoderamento das mulheres e transversalidade das políticas
públicas com a perspectiva de gênero. Para a ONU, “a transformação fundamental em
Pequim foi o reconhecimento da necessidade de mudar o foco da mulher para o conceito
de gênero, reconhecendo que toda a estrutura da sociedade, e todas as relações entre ho-
mens e mulheres dentro dela, tiveram que ser reavaliados. Só por essa fundamental rees-
truturação da sociedade e suas instituições poderiam as mulheres ter plenos poderes para
tomar o seu lugar de direito como parceiros iguais aos dos homens em todos os aspectos
da vida. Essa mudança representou uma reafirmação de que os direitos das mulheres são
direitos humanos e que a igualdade de gênero era uma questão de interesse universal,
beneficiando a todos”. São estabelecidas 12 áreas de preocupação sobre os direitos de
mulheres e meninas: 1. Mulheres e pobreza; 2. Educação e Capacitação de Mulheres; 3.
Mulheres e Saúde; 4. Violência contra a Mulher; 5. Mulheres e Conflitos Armados; 6.
Mulheres e Economia; 7. Mulheres no Poder e na liderança; 8. Mecanismos institucio-
nais para o Avanço das Mulheres; 9. Direitos Humanos das Mulheres; 10. Mulheres
e a mídia; 11. Mulheres e Meio Ambiente; 12. Direitos das Meninas.” (Fonte: ONU
MULHERES Brasil: Conferências Mundiais da Mulher).
42
ONU MULHER
Foi apenas em 2010 que a Organização das Nações Unidas criou a ONU Mu-
lheres criada com o objetivo de unir, fortalecer e ampliar os esforços mundiais em
defesa dos direitos humanos das mulheres. No âmbito da ONU, o primeiro gesto
foi o Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher (UNIFEM)
criado em defesa dos direitos humanos das mulheres, sobretudo pelo apoio em
relação às articulações do movimento de mulheres e feministas: mulheres negras,
indígenas, jovens, trabalhadoras domésticas e trabalhadoras rurais. Reúne seis áreas
prioritárias para atuação: 01. Liderança e participação política das mulheres. 02.
Empoderamento econômico. 03. Fim da violência contra mulheres e meninas. 04.
Paz e segurança e emergências humanitárias. 05. Governança e planejamento. 6.
Normas globais e regionais. A sede da ONU Mulheres é Nova Iorque, nos Estados
Unidos e escritórios regionais na África, Américas, Ásia e Europa. Faz parte do
secretariado da Comissão da Organização sobre a Situação das Mulheres (CSW),
responsável pela negociação e de monitoramento de compromissos internacionais
sobre direitos humanos das mulheres. (Fonte: ONU MULHERES Brasil: Sobre a
ONU Mulheres Disponível em: https://www.onumulheres.org.br/onu-mulheres/
sobre-a-onu-mulheres/. Extraído em: 15.03.2021).
IDEALISMO, REALISMO E PLURALISMO
Qual o lugar da luta das mulheres e da comunidade LGBTQIA+ na teoria
das relações internacionais ? O realismo não admitiria a atuação internacional, pois
entende que somente o Estado é o legitimo ator político internacional, assim o
realismo apresenta uma fórmula estadocêntrica para o estudo das relações interna-
cionais. Segundo Hans Morgenthau - considerado um dos fundadores do realismo
nas relações internacionais, a atuação do Estado é baseado na demonstração de
poder. As correntes liberais embora tenham vertentes diferentes, historicamente
contestaram a presença do Estado na economia como sendo um desvio. Por outro
lado, o Estado tem sido chamado para corrigir os defeitos do sistema e propiciar
43
IdeALIsmO, ReALIsmO e PLURALIsmO
a contínua reprodução ampliada do capital, por exemplo, na criação de créditos
diversos, socorro às empresas privadas e bancos. A insurgência das mulheres po-
deria encontrar abrigo nas teorias pluralistas liberais de J. Nye e R. Keohane. Eles
observam que os Estados nacionais estão perdendo sua importância e que está
nascendo uma nova ordem política e econômica mundial regulada por regimes
supranacionais, legítimos, capazes de funcionar com eficácia mesmo na ausência de
potências hegemônicas. Verdadeiras redes de regras, normas e procedimentos que
regularizem os comportamentos e controlem seus efeitos, e que uma vez estabele-
cidos é muito difícil erradicá-los ou mudá-las. (KEOHANE & NYE, 1977).
A partir destes pressupostos consideramos que os estudos tradicionalmente
desenvolvidos nos cursos de Relações Internacionais seguem o viés realista, pois o
objeto de suas pesquisas consideram os atores estatais, por exemplo, as relações en-
tre países, a política exterior de determinado Estado, nação ou governo em relação
aos seus pares. Desenvolvem uma análise política institucional. Para além dos estu-
dos das relações internacionais que compreendem que o único ator internacional é
o Estado, é preciso dizer sobre a frequência cada vez mais frequente da atuação no
plano internacional instituições não-estatais como organizações, associações, mo-
vimentos, ligas, etc que atuam mundialmente como, por exemplo, os Médicos Sem
Fronteiras, O Greenpeace, Anistia Internacional ou a Transparência Internacional que
são organizações cuja atuação global em defesa do meio-ambiente, assistência mé-
dica, combate à corrupção e de direitos civis. Ou empresas privadas ou os fundos
e bancos como o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional ou até mesmo
empresas que investem na exploração espacial fomentando o desenvolvimento de
tecnologias aeroespaciais e de pesquisas nesta área. Se pensarmos que se o mercado
realmente se converteu em um ator global que subordina a esfera pública aos seus
interesses e que impõe a sua política empresarial em detrimento da política pública,
isto como um fenômeno da globalização.
Para quem considera como objeto de estudos das relações internacionais
apenas temas ligados à política institucional, governamental e não-governamental,
do direito, economia e meio ambiente se surpreenderá ao observar o surgimento
de temas no âmbito da política internacional relacionada às questões de gênero:
mulheres, LGBTs, indígenas, racismo, entre outros. Dimensões da identidade e cul-
tura estão cada vez mais presentes. Tal recorte demonstra a democratização dos
estudos das relações internacionais que não é mais visto de cima, mas dos de baixo,
aqueles chamados de excluídos. Cresce em todo mundo a organização de mulheres
e LGBTs por igualdade que se insere nas discussões relativas aos direitos humanos.
44
INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO
São movimentos que viralizam nas redes sociais e ocorrem em todo mundo. Lu-
tam para garantirem o poder aos seus corpos, assim lutam contra o feminicídio, a
misoginia e a homofobia. Reivindicam a construção de sua identidade, o direito de
escolha e o poder de decisão. Lutam contra os fatores de exclusão como a pobre-
za, o abandono e demais fatores de vulnerabilidade. No âmbito da Organização
das Nações Unidas, sobretudo a Organização dos Direitos Humanos existe uma
atuação que exerce pressão sobre os Estados e seus respectivos governos contra
os abusos e violência contra mulheres e a comunidade LGBTs. Promove fóruns
internacionais que além de promoverem o intercâmbio com mulheres e membros
da comunidade LGBT do mundo inteiro e como resultado do encontro o estabele-
cimento de diretrizes a serem adotadas pelos países membros da ONU.
O Relatório da ONU publicado em 2019 intitulado: “formas contemporâneas de
racismo, discriminação racial, xenofobia e intolerância”, de autoria da Sra. E. Tendayi
Achiume, relata que o populismo nacionalista ou também conhecido como gover-
nos de extrema-direita avança heteronormativamente impondo os valores conside-
rados tradicionais, o que acaba por resultar em sérias violações mulheres, negros e
membros da comunidade LGBTQIA+, também minorias religiosas. Afirma:
13. O populismo nacionalista muitas vezes avança com sucesso
heteronormativo, patriarcal visões da nação, e uma versão dos
“valores tradicionais” que leva a sérias violações contra grupos
sociais marginalizados (incluindo mulheres, gênero e sexual mi-
norias e pessoas com deficiência), especialmente quando aque-
les que são socialmente marginalizados também são minorias
raciais, étnicas ou religiosas. Ela reforça o domínio dos homens
e impõe rígidos papéis de gênero, negando às mulheres e a ou-
tros plena agência, especialmente sobre seus direitos reproduti-
vos e sexuais. Mulheres inconformadas tornam-se um alvo para
nacionalistas populistas, que em alguns casos praticam misógi-
nos online e outros ataques contra essas mulheres. Fervor po-
pulista nacionalista em algumas partes do mundo também avan-
çou contra a igualdade de direitos para lésbicas, gays, bissexuais,
pessoas transgênero, queer e intersex (LGBTQIA+) de manei-
ras que negam suas características inerentes dignidade humana
e direito ao pleno gozo dos direitos humanos. Um abrangente a
análise da igualdade racial do populismo nacionalista deve man-
ter de vista as formas que múltiplas identidades sociais que se
cruzam transformam a experiência racial discriminação neste
contexto, como fazem em outros. Ele também deve manter de
vista os caminhos que os Estados usem leis patriarcais e dis-
45
IdeALIsmO, ReALIsmO e PLURALIsmO
criminatórias de gênero para alcançar objetivos raciais, étnicos
e exclusão religiosa, conforme apresentado no relatório mais
recente deste mandato para o Humano Conselho de Direitos.
(Contemporary forms of racism, racial discrimination, xe-
nophobia and related intolerance ONU, 2018, p. 7)
O presente relatório apresenta um renascimento das ideologias totalitárias
do período anterior a Segunda Grande Guerra ocorrida entre 1939 a 1945, agora;
presente em grupos supremacistas como é o caso ocorrido em Charlottesville no
primeiro ano da Administração Trump em 2017. O grupo de supremacistas, nacio-
nalistas, neo-confederados, neonazistas, milícias marcharam rumo à Charlottesville
portando rifles, suásticas, bandeiras confederadas, antissemitas e de apoio à chapa
“Trump-Pence” que se tornou vitoriosa nas eleições presidenciais de 2016 nos Es-
tados Unidos. Esta manifestação foi chamada de “Unite the Right” ou “unir a direi-
ta”. Seu objetivo era impedir a remoção do monumento do General Confederado
Robert E. Lee, ídolo da extrema direita por supostamente simbolizar o passado
escravista, pois era proprietário de pessoas feitas escravas e também por simbolizar
à resistência do sul dos Estados Unidos frente ao norte liberal. Após o poder local
decidir remover a estátua por simbolizar a divisão social na cidade, movimentos su-
premacistas e neonazistas tentaram impedir. Imediatamente os grupos antifascistas
e o movimento negro reagiram e isto deu início à Batalha de Charlottesville. Os dois
grupos entraram em choque. O governador da Virginia chegou a declarar estado de
emergência para solicitar forças adicionais com o objetivo de acabar com os con-
frontos. Este ato resultou no incidente em que um supremacista James Alex Fields
Jr. avançou com seu carro sobre um grupo de manifestantes antifascistas, matou
Heather Heyer e feriu outras 20 pessoas. Foi condenado à prisão perpétua. O atro-
pelamento foi interpretado como um ato de terrorismo doméstico. O ocorrido
em Charlottesville gerou outras manifestações pelo país, tanto de grupos anti-ódio
quanto de grupos supremacistas, ou seja, a sociedade estadunidense dividiu-se e
manteve-se polarizada nos anos seguintes.
O então presidente Donald Trump foi acusado de não condenar de forma
veemente os grupos supremacistas brancos e os grupos neonazistas. Ao afirmar
em sua declaração que existiam “muitos lados” em relação ao conflito. O Congres-
so considerou ambíguo e insuficiente esta declaração já que nela Trump não con-
denou, de fato, a ação dos grupos de extrema-direita e também não considerou
que os grupos antifascistas e o movimento negro foram vitimados fatalmente.
Disse Trump em 12 de agosto de 2017 que ocorreu uma “exibição flagrante de
ódio, fanatismo e violência em muitos lados, em muitos lados”. Sua Porta Voz pos-
46
INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO
teriormente tentou enfatizar que Trump condenava os supremacistas. Disse: “O
Presidente disse veementemente em sua declaração ontem de que ele condena todas as
formas de violência, intolerância e ódio. Claro que isto inclui supremacistas brancos,
KKK, neonazistas e todos os grupos extremistas. Ele pediu a união nacional a todos os
americanos”. Esta declaração não aplacou o efeito negativo do termo utilizado
pelo então presidente na primeira declaração de que o conflito teve “muitos la-
dos”. Quatro anos depois nas eleições presidenciais de 2020, seu oponente, Joe
Biden, lembrará deste termo nos debates contra Trump para tentar demonstrar
que ele apoiava grupos de extrema direita e apostava na divisão do país pelo ódio.
JOSHUA ROBERTS REUTERS
LINK PARA A FOTO: httPs://Brasil.elPais.Com/Brasil/2017/08/12/alBUm/1502552919_477485.
html#foto_gal_18
A eleição de Donald Trump encorajou os movimentos de extrema-direita,
antes na administração Obama estavam ativos, porém não se sentiam tão à vonta-
de para promover uma marcha, na luz do dia, sem vergonha alguma de defender
seu credo racista. É fato que Trump se elegeu com os votos dos supremacistas,
em estados conservadores como a Virginia, Mississippi, Texas, Novo México,
dentre outros. Estados com tradição em movimentos white power. Charlottesville
foi chocante, pois fazia muito tempo não víamos movimentos tão repugnantes à
luz do dia e parece que eles reacenderam, encontraram permissão para agir não
47
GeORGe fLOyd e JAcOB BLAke
mais à sombra da noite profunda. Segundo reportagem da Revista Exame intitu-
lada: Crimes de supremacistas brancos crescem nos EUA informa que entre 2016 para
2017, casos de violência cometidos por grupos de extrema direita e supremacistas brancos
saltaram de 20% para 59% do total de ataques. A chamada Liga Anti-Difamação
informa que no ano de 2017 aumentaram os casos de violência perpetrados por
grupos de extrema direita e supremacistas brancos na casa dos 59% dos ata-
ques cometidos pelos extremistas nos EUA. Os dados anteriores à administração
Trump, ou seja, no ano de 2016 esta porcentagem se encontrava em 20%. Este
aumento também é corroborado por outras instituições como o Centro para Es-
tudos Internacionais e Estratégicos (CSIS). (Crimes de supremacistas brancos
crescem nos EUA. In: Estadão conteúdo: 12.05.2019).
GEORGE FLOYD E JACOB BLAKE
É possível dizer que Charlottesville gestou a morte covarde do Sr. George
Floyd por estrangulamento, assassinato cometido à luz do dia e gravado por ce-
lular de forma impiedosa em Minneapolis no ano de 2020, em plena pandemia.
Floyd foi colocado deitado de bruços no chão e imobilizado por três policiais,
um deles, o policial Derek Chauvin, (do Departamento de Polícia de Minneapo-
lis) passou cruelmente a estrangulá-lo com o joelho colocado em seu pescoço. O
Sr. George Floyd, de 46 anos agonizava dizendo: ‘não consigo respirar’. Sua triste
morte ocasionou uma avalanche de indignação, sobretudo após a divulgação do
vídeo mostrando como Floyd foi morto. O episódio é muito parecido ao que
ocorreu com o Sr. Eric Garner, que faleceu após ser preso em Nova York no ano
de 2014. Igualmente Garner repetiu a frase: “Não consigo respirar” por onze vezes.
Esta frase foi dita por Eric Garner em 2014 e George Floyd em 2020. Aproxi-
madamente dois meses após a morte de George Floyd outro caso envolvendo
a violência policial contra afrodescendentes chocou os Estados Unidos. No dia
23 de agosto de 2020, Jacob S. Blake de 29 anos foi baleado pelo policial Rusten
Sheskey na cidade de Kenosha no Estado de Wisconsin. O policial atirou nele
pelas costas, efetuou sete disparos. Os filhos de Blake se encontravam no banco
de trás de seu carro e testemunharam tudo que ocorreu. Estes atos violentos
mobilizaram os ativistas antirracistas como #BlackLivesMatter (Vidas Negras Im-
portam). A morte de George Floyd e o caso de Jacob Blake geraram semanas de
protestos violentos e seria junto à pandemia um dos fatores que influenciariam
48
INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO
na derrota da candidatura à reeleição de Donald Trump. Estes protestos virali-
zaram nas redes e ganharam as ruas, em plena pandemia, geraram uma onda de
protestos em todo mundo.
FONTE WIKIPEDIA: httPs://Pt.wikiPeDia.org/wiki/assassiNato_De_george_floyD#/meDia/
fiCheiro:george_floyD_imoBilizaDo.jPg
THE HILL: GETTY IMAGES: httPs://thehill.Com/homeNews/CamPaigN/514150-harris-DeliVers-
VirtUal-Call-to-aCtioN-to-Protestors-at-New-marCh-oN
49
#BLAckLIvemATTeRs
AGENCIA FRANCE PRESSE: httPs://www.CorreioBrazilieNse.Com.Br/aPP/NotiCia/mUNDo/2020/
06/06/iNterNa_mUNDo,861644/oNDa-De-Protesto-CoNtra-morte-De-george-floyD-se-
esPalha-Pelo-mUNDo.shtml
#BLACKLIVEMATTERS
Estes grandes movimentos de protesto que emergem das redes sociais são
um novo elemento que os estudos sobre a política internacional devem considerar.
A reação à morte de George Floyd e o atentado à Jacob Blake enceta a viralização
do movimento ativista internacional #BlackLiveMatters que se originou na socie-
dade afrodescendente estadunidense contra as violências cometidas às pessoas ne-
gras. O grupo é responsável por organizar protestos contra a violência policial e a
desigualdade do sistema judicial à comunidade negra nos EUA. Começou em 2013
a partir da absolvição de George Zimmerman acusado de matar a tiros um jovem
negro chamado Trayvon Martin. Indignados com a absolvição, protestaram nas
redes utilizando a hashtag #BlackLivesMatter. Este foi o impulso inicial para a cria-
ção de um movimento ativista e que ganhou reconhecimento após o movimento
sair das redes e ganhar as ruas em 2014, após o assassinato de dois afro-americanos:
Michael Brown e Eric Garner na cidade de Nova York. Desde então o movimento
tem protestado contra a morte da população negra, em casos, tais como: Tamir
Rice, Eric Harris, Walter Scott, Jonathan Ferrell, Sandra Branda, Samuel DuBose,
50
INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO
e Freddie Gray. É um movimento que não possui uma sede, célula ou liderança,
é viral, ou seja, #BlackLiveMatters é o que se escreve nas fotos ou reportagens
após a divulgação de violências policiais cometidas contra os afrodescendentes nas
redes sociais em forma de denúncia. Este conteúdo viraliza nas redes com a hash-
tag #BlackLiveMatters e toma as ruas em forma de protesto, mas não existe uma
cadeia de comando, pois os movimentos de rua surgem a partir de uma viralização
nas redes sociais. Os protestos contra a morte de George Floyd foram iniciados na
Região Metropolitana de Minneapolis-Saint Paul e se espalhou por mais de 2.000 ci-
dades em mais de 60 países, estima-se que até o dia 03 de julho entre 15 e 26 milhões
de pessoas já tinham participado dos protestos nos Estados Unidos. Tumultos, pi-
lhagens, e confrontos com a polícia. Em mais de 200 cidades estadunidenses foram
decretados o Toque de Recolher, mobilizado mais de 62 mil efetivos da Guarda
Nacional e foram detidas mais de 14.000 pessoas.
O então presidente Donald Trump ordenou a repressão aos manifestantes e
logo em seguida foi à uma igreja Saint John com a Bíblia nas mãos, assim tentando
cativar setores da população como os conservadores, brancos e supremacistas. O
gesto foi duramente criticado pelos líderes religiosos, inclusive a Episcopisa Ma-
riann Budde da diocese de Washington afirmou: “Foi traumático e profundamente
ofensivo no sentido de que algo sagrado foi mal utilizado para um gesto político”. O arce-
bispo de Washington, Wilton Gregory também reprovou seu gesto ao dizer: “Acho
desconcertante e reprovável que um lugar católico possa ser usado e manipulado de
maneira a violar os princípios religiosos mais básicos” (Líderes religiosos reagem
indignados a gesto de Trump com a Bíblia. In: G1/France Presse: 02.06.2020)
FOTO: reUters/tom
BreNNer
Insurgências contra a desigualdade
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Insurgências contra a desigualdade

  • 1. INSURGÊNCIAS INSURGÊNCIAS INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO NA GLOBALIZAÇÃO NA GLOBALIZAÇÃO SAMUEL DE JESUS Mulheres, população LGBTQIA+, comunidade afrodescendente e indígenas na política internacional
  • 3. INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO Mulheres, população LGBTQIA+, comunidade afrodescendente e indígenas na política internacional
  • 4. © 2022 - Samuel de Jesus TÍTULO INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO Mulheres, população LGBTQIA+, comunidade afrodescendente e indígenas na política internacional AUTOR Samuel de Jesus EDIÇÃO, PROJETO GRÁFICO Editora Oeste DIAGRAMAÇÃO, ILUSTRAÇÃO DA CAPA Ricardo Barbosa Porto REVISÃO Samuel de Jesus PUBLICAÇÃO DA www.editoraoeste.com.br contato@editoraoeste.com.br ISBN 978854558426-1 Depósito Legal na Biblioteca Nacional Impresso no Brasil Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP , Brasil) Jesus, Samuel de Insurgências na globalização : mulheres, população LGBTQIA+, comunidade afrodescendente e indígenas na política internacional / Samuel de Jesus. -- 1. ed. -- Campo Grande, MS : Editora Oeste, 2022. Bibliografia. ISBN 978-85-45584-26-1 1. Globalização 2. Globalização - Aspectos sociais 3. Insurgência 4. LGBTI+ - Siglas - Direitos 5. Mulheres - Aspectos sociais 6. Mulheres - Direitos 7. Povos indígenas 8. Violência I. Título. 22-117986 CDD-303.482 Índices para catálogo sistemático: 1. Globalização : Aspectos sociais : Sociologia 303.482 Aline Graziele Benitez - Bibliotecária - CRB-1/3129
  • 5. Campo Grande 2022 SAMUEL DE JESUS INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO Mulheres, população LGBTQIA+, comunidade afrodescendente e indígenas na política internacional
  • 6. Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra poderá ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da editora, como pesquisa é permitido desde que citada a fonte. UMA PUBLICAÇÃO DA EDITORA ASSOCIADA Obra aprovada pelo conselho editorial da Editora Oeste através da Resolução n. 133/2022. CONSELHO EDITORIAL Drª. Alda Maria do Nascimento Osório / UFMS Drª. Alexandra Ayach Anache / UFMS Dr. Amaury de Souza / UFMS Dr. Antônio Carlos do Nascimento Osório / UFMS Drª. Carla Dupont – França / Vercors Drª. Eurize Caldas Pessanha / UFMS Drª. Fabiany de Cássia Tasvares Silva / UFMS Dr. Flávio Aristone / UFMS Me. Horacio Porto Filho / UTCD-PY Dr. Leo Dayan – Univ. de Paris 1 / Sorbonne Dr. Luiz Otavio Saraiva Ferreira / UNICAMP Drª. Margarita Victoria Rodriguez / UFMS Drª. Maria Dilnéia Espindola Fernandes / UFMS Drª. Myrna Wolf B. dos Santos / UFMS Drª. Regina Tereza Cestari de Oliveira / UCDB Drª. Soraia Napoleão de Freitas / UFSM Drª. Silvia Helena Andrade de Brito / UFMS Drª. Tatiana Calheiros Lapas Leão / SED-MS www.editoraoeste.com.br contato@editoraoeste.com.br Campo Grande • Mato Grosso do Sul ISBN 978-85-45584-26-1 1ª Edição - Ano 2022
  • 7. SUMÁRIO Prólogo....................................................................................................7; LGBTQIA+...............................................................................................15; Os Direitos Lgbtqia e a Onu...................................................................22; Temas Tabus nas Escolas Brasileiras: A Diversidade Sexual................27; O Atlas da Violência no Brasil 2020 ......................................................30; Pussy Riot ............................................................................................32; Conferências Pelos Direitos Humanos das Mulheres...........................39; ONU Mulher............................................................................................42; Idealismo, Realismo e Pluralismo..........................................................42; George Floyd e Jacob Blake..................................................................47; #Blacklivematters...............................................................................49; Brasil.....................................................................................................52; Raoni, Um Insurgente Global em Defesa da Amazônia...........................60; Belo Monte............................................................................................63;
  • 8. Um Nobel para Raoni .............................................................................70; Epílogo...................................................................................................73; Bibliografia ...........................................................................................79;
  • 9. 7 PRÓLOGO Aníbal Quijano, importante pensador peruano cunhou, no final dos anos oitenta e início dos anos noventa do século XX, uma compreensão diversificada sobre a modernidade e o capitalismo, denominou-a de colonialidade do poder. Afir- mou que o processo histórico chamado de globalização e sua interface na Améri- ca Latina demonstra o aprimoramento do padrão de poder capitalista, moderno, eurocêntrico, sobretudo colonial. O que caracterizaria esta colonialidade seria a continuidade da exploração dos povos não-brancos e a produção do conhecimento ainda baseado no eurocentrismo. Ou seja, a permanência de uma exploração eco- nômico-cultural. O padrão de poder colonial persiste mesmo após a independência das nações latino-americanas ocorrida na primeira metade do século XIX. É por isto que Quijano (2005) considera as discussões atuais em torno da questão nacional um equívoco, pois o Estado-nação é uma estrutura de poder e além de ser uma instituição-modelo europeia, articula forma de existências disper- sas e diversas em uma totalidade única, ou seja, suprime as heterogeneidades para construir uma identidade homogênea. O conhecimento na América Latina com base no eurocentrismo teve sua construção teórica e conceitual na Europa Ocidental a partir do século XVII. Conhecimento com base no princípio da racionalidade e que embora tenha sido, inicialmente, uma imposição ao mundo colonizado, ainda hoje é o modelo adotado na produção do conhecimento na América Latina. Em sua posição de centro do capitalismo mundial, a Europa impôs seu regi- me colonial e cultural sobre o mundo. Este fato gerou um processo de reidentifica- ção histórica. Ou seja, a incorporação de diversas e heterogêneas histórias culturais em um único mundo significou uma nova configuração cultural, intelectual. Todas as experiências, histórias, recursos e produtos culturais foram articulados em uma só ordem cultural global sob a hegemonia cultural europeia ocidental. Se o conceito de modernidade se refere unicamente e fundamentalmente às ideias de novidade, do avançado, do racional científico, laico, secular que são ideias associadas a este conceito, assim é possível admitir que caberão em todas as culturas e em todas as épocas históricas com todas as suas particularidades geográficas, temporais e
  • 10. 8 INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO sociais, tais como a índia, China, Egito, Grécia, Maia, Asteca. As relações sociais baseadas na ideia de raça produziram identidades sociais totalmente novas, índios, negros e mestiços adquiriram uma conotação racial. Essas conotações raciais trans- formaram-se em relações de dominação com hierarquia, lugares e papéis e sociais, foram instrumentos sociais de classificação social baseada na população. As novas identidades produzidas sobre a ideia de raça foram associadas à natureza dos papéis e lugares na nova estrutura global de controle do trabalho. Assim, ambos os ele- mentos: raça e trabalho foram estruturalmente associados. (QUIJANO, 2005). A ciência entre o século XIX e XX conferiu uma veracidade ou legitimidade ao imperialismo britânico, sobretudo no momento em que sua narrativa científica preconiza a inferioridade de africanos e asiáticos. A Ciência do século XIX, da épo- ca de Herbert Spencer (1873), é marcada pelo Darwinismo Social que se baseava na tese de que a teoria darwinista poderia ser perfeitamente aplicada à sociedade. A luta pela sobrevivência entre animais corresponderia à lógica capitalista, ou seja, o mais apto sobreviveria. Dessa forma as sociedades mais capazes se sobressairiam às demais e ocupariam um papel de liderança. Esta seria uma das fundamentações para a criação do Império Colonial Britânico, assim a missão da “civilização” era levá-la aos povos considerados bárbaros o “fardo da civilização branca“. Essa foi a argumentação básica para a colonização da África e da Ásia. Na História do Brasil a presença do Conde de Gobineau refletia as concep- ções europeias do período, segundo ele; a mistura de raças era inevitável e levaria a raça humana a graus sempre maiores de “degenerescência” física e intelectual. É-lhe atribuída a frase “Não creio que viemos dos macacos, mas creio que vamos nessa direção.” A mistura racial daria origem aos mestiços e pardos “degenerados e es- téreis”. Esta característica já teria selado a sorte do país: a “degeneração” levaria ao desaparecimento da população. A única saída para os brasileiros seria o incentivo à imigração de “raças” europeias, consideradas superiores. O europeu pensava no negro como um branco degenerado, que poderia ser doente ou desvirtuado. Na simbologia das cores da civilização europeia a cor preta representa uma mancha moral e física, a morte e a corrupção, enquanto a branca remete à vida e à pureza. Missionários decepcionados com o fracasso da conversão afirmavam que o negro refletia a natureza pecaminosa de suas almas resistentes à palavra de Deus, assim a escravidão era a única possibilidade de “salvação” desses povos. A desvalorização e a alienação do negro estende-se a tudo que toca a ele: o continente, os países, as instituições, o corpo, a men-
  • 11. 9 PRÓLOGO te, a língua, a música, a arte, etc. Seu continente é quente de- mais, de clima viciado, malcheiroso, de geografia tão desesperada que o condena à pobreza e à eterna dependência. O ser negro é uma degeneração devido à temperatura excessivamente quente. (MUNANGA, 2001, p. 21). A herança social de um povo é legada às futuras gerações por meio da edu- cação. A escola tradicional era a única possibilidade de aprendizado, o do coloni- zador, assim a memória que lhe inculcam não é a de seu povo. A história de seus ancestrais africanos é substituída pela História europeia dos francos, germanos, anglos e bretões, povos de pele e olhos claros. Aprende a língua do colonizador para fazer parte minimamente da vida social, pois apenas com a sua torna-se um estranho dentro de sua própria terra. A língua do colonizado não possui dignidade nenhuma no país e nos concertos dos povos. Se o negro quiser obter uma colo- cação, conquistar um lugar, existir na cidade e no mundo, deve, primeiramente, dominar a estranha língua, de seus senhores. (MUNANGA, 2001, p. 24). Foi através da língua que a dominação aconteceu e dessa forma se deu sobre- posição cultural de um povo sobre outro. A civilização europeia devora a cultura de grupos étnicos distintos. A justificativa se baseou na ideia de que o homem branco deve ajudar as civilizações, tidas como “atrasadas”, a darem um salto civilizatório. Pelo fato deste livro tratar sobre a questão de gênero nas relações internacionais, é preciso inclinar nossa análise para a problemática do feminismo. A partir deste pressuposto podemos pensar na questão de gênero feminino, sobretudo do feminis- mo negro que parte do pressuposto de que ser mulher e negra é uma particularidade que movimento feminista deve levar em conta, pois afinal a terminologia mulher requer um olhar, uma perspectiva heterogênea. A primeira máxima de Achille M’Bembe e sua teoria da necropolítica é a de que a desconstrução do sujeito autoriza sua morte, pois não estamos tratando com um indivíduo, mas com uma coisa, um objeto ou alguém que perdeu sua individu- alidade. Faz lembrar Rousseau em O Contrato Social, sobretudo na passagem a qual se refere ao papel da escravidão na supressão do indivíduo e de sua individualidade. Impediria a criação da esfera pública que emergiu a partir da Revolução Francesa (1789). No caso em questão, o da necropolítica, é resultante da perda da individualida- de que é legitimada socialmente. No caso, os atos de violência que levam à morte da- quele não reconhecido como civilizado, como não sujeito é respaldada socialmente.
  • 12. 10 INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO M’ Bembe fala sobre o biopoder conceituada por Michel Foucault e sua rela- ção com a inimizade a partir de duas noções complementares: o Estado de exceção e o Estado de Sítio. No Estado de Exceção em relação à inimizade torna-se uma base normativa que confere o direito de matar. A noção de biopoder esta relacionada á este caso, afinal, o poder advindo da exceção decide que possui o direito de viver ou de morrer, uma divisão entre vivos e mortos definido biologicamente por quem detém o controle e quem possui a capacidade de tipificar ou definir a espécie hu- mana em grupos e subgrupos, algo semelhante, por exemplo, ao racismo. Foucault afirma que o direito soberano de matar e os mecanismos de biopoder são inerentes ao estado moderno, assim o Estado Nazista foi o arquétipo de um Estado que exerce o poder de matar. (M’BEMBE, 2018). É possível afirmar que a “solução final” possui origens no Imperialismo Colonial e também na Revolução Industrial, sobretudo devido à serialização de mecanismos técnicos para conduzir pessoas à morte, câmaras de gás, fornos, a “industrialização da morte”, algo puramente técnico impessoal, silencioso e rápido. Esse processo foi somente possível devido aos estereótipos racistas, sobretudo de um racismo de classe que definiram os conflitos da sociedade industrial, ou seja, introduziu o racismo como elemento fundamental para explicar os conflitos sociais no mundo industrial. A relação entre nazismo e imperialismo reside no fato de que a ocupação colonial pressupunha apreensão, demarcação, afirmação do controle físi- co e geográfico e inserir um novo conjunto de relações sociais e especiais, ou seja, a produção de fronteiras e hierarquias, zonas, enclaves, sobretudo a classificação das pessoas em categorias distintas. A ocupação como exercício da soberania relega o colonizado ao estatuto de objeto. Menciona Frantz Fanon quando este reafirma que a colonização implica em uma divisão do espaço em compartimentos. Definir o que é importante e quem não é, ou seja; descartável. Diferentemente, hoje temos as guerras da época da globalização e uma das suas características é o de fato de que o direito de matar não é mais exclusivo do poder estatal, não é mais facultado aos Exércitos regulares. Este fato faz com que algumas mudanças em relação á definição da autoridade suprema, sobretudo, em um espaço político não seja consensual, ocorre uma sobreposição de uma organi- zação de poder. Hoje, por exemplo, a coerção passou ao controle do mercado, o novo agente político que pretende controlar o Estado em detrimento da política em seu sentido público. A mão de obra militar é comprada é vendida num merca- do em que a identidade dos fornecedores e compradores não é revelada. Milícias urbanas, exércitos de senhores regionais, segurança privada invocam o direito de
  • 13. 11 PRÓLOGO matar aqueles considerados lixos, escória alegam promover uma “limpeza” étnica, social, moral ou religiosa. Muitas vezes isto ocorre sob o argumento da promoção de uma “guerra santa” com o objetivo de “purificação” ou “regeneração” e onde todos os expedientes violentos são autorizados. (M’BEMBE, 2018, p.53). Voltando aos aspectos destinados à separação e distinção social, afinal ten- tamos compreender as origens da divisão social quase sempre alimentada pelo ódio, ou a diferenciação entre nós e eles. Para Bauman (1999, p. 114) a separação espacial e seu produto de confinamento forçado tem sido por muito tempo na história, uma forma de reagir a toda diferença não acomodada no âmbito social, assim existe uma quebra imposta na comunicação objetivando a diminuição da visão do outro, ou seja, a supressão das circunstâncias individuais possibilitada pela convivência diária. O fim desse intercâmbio social permite a caracterização que acaba por suprimir a capacidade de subjugação de qualquer disparidade exis- tente entre as pessoas que se dilui no contato direto e frequente. O isolamento distancia as pessoas e favorece o preconceito. O gasto orçamental com o aparato repressivo, garantidoras da lei e da ordem sugere uma grande significação da via institucional como parte da política criminal, assim os governos ganham apoio dos setores sociais dominantes para disciplinar os grupos e segmentos popula- cionais. Dessa maneira passa a existir uma intervenção das punições que resul- tam em prisões, sobretudo daqueles setores. Poderíamos inserir neste exemplo as comunidades das periferias brasileiras que são alvo destas intervenções todo dia, sobretudo de pessoas de cor preta que são os mais atingidos estatisticamente falando, podemos falar também da comunidade LGBTQIA+ neste caso, afinal, é um grupo alvo das políticas de separação através do confinamento forçado e entendendo-o como um grupo que guarda uma diferença não acomodada social- mente. O aparato repressivo do Estado para repeli-los e suprimi-los são os mais variados, dentre eles prisão, banimento, chibatadas e pena de morte. São, aproximadamente, 70 países que proíbem a homossexualidade, incluin- do países europeus como a Rússia. Neste país a aprovação de uma lei que proíbe a propaganda gay durante as olimpíadas de inverno de Sochi em 2014 gerou protes- tos que repercutiram em todo mundo. Na África, em Uganda, a tentativa uma lei anti-homossexualidade também gerou uma comoção internacional e revelam que em muitos países existem severas proibições chegando à pena de morte. Assim como as mulheres em sua luta por igualdade, respeito e direitos em movimento como “A Marcha das Vadias” e as feministas contra Trump em 2017. A comunidade afrodescendente se insurgindo contra a violência policial como o caso em que um
  • 14. 12 INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO afrodescendente George Floyd foi enforcado na rua à vista de todos pelo policial Derek Chavin e mais quatro policiais. O surgimento de protestos virais sob a hash- tag #BlackLiveMatters é um fato novo que se refere a uma nova modalidade de insurgência, sem uma cadeia de comando como era o caso dos Panteras Negras nos anos sessenta e uma massa articulada pelas redes de forma espontânea e eficiente, difícil de prever e que não possui um rosto que possa ser eliminado. Essas são as novas insurgências da globalização.
  • 16.
  • 17. 15 LGBTQIA+ Um caso que nos permite entender como a questão da orientação sexu- al se insere nas relações internacionais é a criminalização da homossexualidade na Rússia. O presidente russo Putin provocou revolta em todo mundo quando tentou impor uma legislação nacional que criminaliza o comportamento homos- sexual nas olimpíadas de inverno de Sochi. Segundo a matéria da agencia DW de 21.11.2013, assinada por Jonathan Sachse, intitulada: Jogos de Inverno podem ser alvo de polêmica com lei contra “propaganda gay” afirma que Estrangeiros também são afetados por criminalização de declarações positivas sobre homossexualismo na Rússia. Ativistas tentam sensibilizar entidades esportivas durante Olimpíadas de Inverno em Sochi, em 2014. (SACHSE, 2013). FONTE: Dayle Beast: lefteris: Pitarakis/aP httPs://images.aPP.goo.gl/XCDe6moyzg9ltkNw6 Os Jogos Olímpicos de Inverno foram realizados entre 07 e 23 de fevereiro de 2014, na cidade de Sochi, na Rússia. O presidente russo, Vladimir Putin, assinou uma lei contra a “propaganda homossexual”. Desde então, declarações positivas sobre “relações sexuais não-tradicionais” na presença de menores ou em espaços públicos, como a internet, são passíveis de punição, como multas pesadas. (SACHSE, 2013). A matéria
  • 18. 16 INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO destaca a atuação do estadunidense Leviathen Hendricks, estadunidense radicado em Londres porta-voz da Federação de Jogos Gays1 (FGG, na sigla em inglês), manifestou sua posição contrária à lei ao Comitê Olímpico Internacional e cobrou providencias. Contudo, a instituição respondeu que a lei foi aprovada somente a escolha oficial da cidade de Sochi na Rússia. Lembra Hendricks que “De cerca de 12 mil atletas em 2012, em Londres, apenas 23 se declararam abertamente homossexuais.” Outra matéria do DW de 10.07.2013 assinada por Sabrina Pabst e intitulada Homossexualidade ainda é tabu em partes da Europa afirma que: “muitos homossexuais não se sentem seguros na Europa por serem discriminados apesar das leis vigentes que ga- rantem os seus direitos. Leis nacionais diferentes também restringem possibilidades dos gays europeus”. Pabst (2013) destaca a Parada Gay europeia chamada Euro-Pride realizada em Marselha na França: As ruas da cidade francesa de Marselha ficam movimentadas a partir desta quarta-feira (10/07), com a realização da parada. Marselha não é apenas a capital europeia da cultura de 2013, mas também a capital para homossexuais este ano. Diferentemente ao ocorreu em Marselha lembra das barricadas em chamas, bombas de gás lacrimogêneo e jatos de água, milhares de opositores ao casamento gay tomaram as ruas da França. Segundo Evelyne Paradis, da ILGA-Europa (sigla em inglês para As- sociação Internacional para Lésbicas, Gays, Bi, Trans e Interssexuais) em Bruxelas: “As pessoas precisam de bodes expiatórios porque estão confusas, com raiva e frustradas”. Na África, em Uganda a Lei Anti-homossexualidade foi proposta pela presi- dente do parlamento de Uganda, Sra. Rebecca Kadaga em 2012. Cerca de 90% da popu- lação da Uganda considera a homossexualidade inaceitável para a sociedade, tornando o país altamente homofóbico e com grandes taxas de violência contra LGBTs. Estima-se que existam aproximadamente 500 mil LGBTs ugandeses. (QUERINO, 2017). Esta lei foi aprovada pelo Parlamento de Uganda , em 20 de dezembro de 2013, chamado popularmente de “ Kill the Gays bill “, porém a pena de morte foi substituída por prisão perpétua. Che- gou a ser sancionado pelo Presidente de Uganda Yoweri Museveni em 24 de fevereiro de 2014, contudo, o Tribunal Constitucional de Uganda considerou a lei invalida por razões processuais. (Presidente de Uganda sanciona lei que pune gays com prisão perpétua: G1, 24.02.2014). Em entrevista à CNN o então presidente Yowery Museveni disse que os homossexuais são “nojentos” e sua conduta, segundo ele: “não natural” 1 A cada quatro anos, a entidade organiza competições de que participam atletas gays de todo o mundo. Hendricks se emociona com a história do jogador de futebol norte-americano Robbie Rogers, que jogava na primeira divisão inglesa e se declarou homossexual no início de 2013 para, ao mesmo tempo, anunciar o fim de sua carreira, com apenas 25 anos de idade. (SACHSE, 2013)
  • 19. 17 LGBTQIA+ não é questão de Direitos Humanos. (Após assinar a lei antigay, presidente de Uganda diz que homossexuais são “nojentos”. Revista Veja 25.02.2014). O Tribunal Constitucional de Uganda acabou por anular esta lei por unani- midade: O Tribunal Constitucional de Uganda anulou nesta sexta-feira, por unanimi- dade, a polêmica “lei anti-homossexual” que entrou em vigor no país em fevereiro e que qualificava os gays como criminosos, informou a imprensa local. (Tribunal de Uganda anula lei contra homossexuais. In: Revista Exame 01/08/2014). O aniversário de um ano da anulação foi comemorado com uma Parada do Orgulho Gay, aproxi- madamente duzentos ativistas ugandenses se reuniram na cidade de Entebbe. Neste sábado, dezenas de pessoas se reuniram em Entebbe, cerca de 40 quilômetros ao sul da capital, Kampala, nas margens do Lago Vitória, agitando bandeiras e guarda-chuvas com as cores do arco-íris, símbolo do movimento LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros). (Uganda celebra revogação de lei anti-homossexualidade com Parada do Or- gulho Gay. In: O Globo: 08.08.2015) Durante o ato ativistas afirmaram que ainda temem novas lei de repressão à comunidade Gay. Essa para faz parte do Dia da Consciência Transgênero. Essa Parada do Orgulho Gay concluiu uma semana de ações, que contou com o Dia da Consci- ência Transgênero e com o concurso de beleza “Mister e Miss Orgulho”, do qual participa- ram 200 candidatos. Segundo Richard Lusimbo, um dos organizadores da marcha; Para nós, este evento celebra quem somos, o que vivemos, mas também nossos amigos e aliados. (Uganda celebra revogação de lei anti-homossexualidade com Parada do Orgulho Gay. In: O Globo: 08.08.2015). FOTO: striNger/reUters:
  • 20. 18 INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO A legislação homofóbica, como é o caso de Uganda, na África e de muitos países pós-coloniais, é um legado maldito do período da colonização. Foram introduzidas, originalmente pelas administrações coloniais, como é o caso da ad- ministração colonial britânica. Trata-se de uma politização formal da sexualidade e que está sendo denunciado internacionalmente, ou seja, denunciam interna- cionalmente a discriminação sexual em caráter doméstico. Temas como este já foram incorporados na geopolítica mundial, inclusive foi criada a denominação: International Gay. As reivindicações LGBTQIA+ adquiriram uma relevância glo- bal. Caberá algumas perguntas: qual o impacto da política sexual nas relações internacionais ? Ela pode influenciar a tomada de decisão nas relações interna- cionais? Em 2014, fora 78, os países que criminalizaram a homossexualidade e destes, cinco a punição é a pena de morte. Atualmente o mapa mundi está dividido em duas cores no que se refere à proibição da liberdade sexual. O primeiro é composto por 70 países onde a homossexualidade é ilegal e o segundo se refere a 123 países onde não existe esta proibição. O relatório Homofobia Patrocinada pelo Estado 2019, elaborado pela Associação Internacional de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais e Intersexu- ais (ILGA2 ) informa que a Índia, Trinidad e Tobago e Angola saíram do bloco de países que proíbem a liberdade sexual. Na última revisão feita em 2017; Austrá- lia, Malta, Alemanha e Áustria aderiram ao casamento entre pessoas do mesmo sexo, ou o casamento igualitário e sendo assim o número de países onde existe o casamento igualitário subiu para 26. Nove países incluíram em sua constituição a menção explícita de que a orientação sexual não deve ser motivo de discriminação. Entre eles estão Portugal, Equador, Bolívia e África do Sul, uma ilha de igualdade no panorama africano. Estas informações estão contidas no estudo da ILGA onde é revisada a legislação dos países membros da ONU. O estudo que se encontra em sua 17ª edição foi apresentado na reunião anual da ILGA, na Nova Zelândia. Os países cuja homossexualidade poderá levar a morte são: Arábia Saudita, Irã, Iêmen, Sudão, Nigéria e Somália. Países onde existe a pena de morte à homosse- xualidade são Mauritânia, nos Emirados Árabes Unidos, no Catar, no Paquistão e no Afeganistão. O relatório destaca que, embora o Iraque tenha desaparecido da lista devido à “eliminação do Estado Islâmico, continua a ser um país que criminaliza de 2 AAssociação Internacional de Gays e Lésbicas, em inglês International Lesbian and GayAssociation (ILGA) é uma federação mundial que congrega grupos locais e nacionais dedicados à promoção e defesa da igualdade de direitos das pessoas lésbicas, gays, bisse- xuais, trans e intersexo (LGBTI) em todo o mundo.
  • 21. 19 LGBTQIA+ facto, porque persegue os homossexuais utilizando leis de atentado ao pudor, prostituição e outras”. (ALFAGEME. In: El País: 22.03.2019). Em 26 países, a sentença máxima para esses atos varia entre 10 anos de pri- são ou prisão perpétua. Em 31 é punível com até oito anos de prisão. Em 68 países “há leis que proíbem explicitamente atos sexuais consensuais entre pessoas do mesmo sexo, e outros dois os criminalizam de facto”. Além disso, as jurisdições que não pertencem aos estados membros da ONU também punem as relações homossexuais, como Gaza, Ilhas Cook e certas províncias da Indonésia”. 32 países promoveram medidas para limitar a liber- dade de expressão. A situação da Chechênia é descrita como “crítica” e reflete as torturas e perseguições das autoridades contra gays e lésbicas. (ALFAGEME. In: El País: 22.03.2019). Nos países considerados como parte da civilização contemporâ- nea, crimes e atentados contra os LGBTQIA+ são cometidos também. Um desses casos, é o massacre de Orlando nos Estados Unidos. O Massacre de Orlando ocorreu no dia 12 de junho de 2016, na boate LGBT “Pulse”, em Orlando, estado da Flórida, nos Estados Unidos. Aproxima- damente 50 pessoas foram mortas e 53 ficaram gravemente feridas. O atirador, Omar Mir Seddique Mateen era muçulmano norte-americano de origem afegã. Foi o ataque mais grave ocorrido nos EUA contra a comunidade LGBT. Um ex-colega de trabalho do assassino afirmou que Omar sempre fazia comen- tários homofóbicos, racistas e admitia a possibilidade de matar por ódio. Seu pai afirmou que o massacre teve como motivação seu ódio aos gays. Alguns meses, antes, Omar passeava em Miami Beach e viu dois homens se beijando publicamente e ficou muito irritado, seu pai, contudo negou que seu filho agiu com base em questões religiosas. Porém, Omar mantinha contato com o Estado Islâmico através das redes sociais, inclusive seus colegas de trabalho chegaram a denunciá-lo por relações com Al-Qaeda e Hezbollah. Foi investigado e inter- rogado pelo FBI e por uma segunda vez ao contatar Moner Mohammad Abu- salha, americano, filho de pai palestino que se explodiu na província de Idlib na Síria no ano de 2014. (Ataque em boate gay deixa 50 mortos em Orlando, nos EUA. In: G1 12.06.2016). Nos Estados Unidos o ataque terrorista homo- fóbico ocorrido em Orlando EUA é sintomático. A Coligação Nacional Norte- -Americana de Programas Contra a Violência informou que o ano anterior ao massacre, em 2015, ocorreu os maiores níveis de violência contra a comunidade LGBTQIA+ desde 2011. As vítimas em sua maioria foram mulheres trans de cor. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos documentou 770 assassinatos e ataques violentos graves contra pessoas LGBT entre 1º de janeiro de 2013 e 31 de
  • 22. 20 INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO março de 2014, incluindo 594 assassinatos relacionados a ódio contra pessoas LGBT no Brasil (Grumbach & McNamara). Na periferia do capitalismo a repressão é oficializada. É o caso da Nigéria e a condenação ao chicoteamento em praça púbica de homossexuais. Na Nigéria Um tribunal islâmico ordenou o chicoteamento de quatro ho- mens considerados “culpados” de homossexualidade. Os quatro homens, de 22 a 28 anos de idade, receberam quinze chibatadas cada. A sentença, pronunciada por uma corte islâmica da cidade de Bauchi, não foi executada em público. De acordo com o oficial de justiça Abdul Mohammed, o julgamento foi fechado ao público porque uma multidão em fúria havia atacado o tribunal, exigindo a execução dos acusados. Os condenados criaram um clube gay na cidade de Bauchi. Foi aprovada uma lei que proíbe a união gay. A lei prevê uma pena de 14 anos de prisão em caso de casamento homossexual e de 10 anos para pessoas do mesmo sexo que assumem seu relacionamento publicamente. Sempre é a religião que condena e estimula as condenações por via oficial o extraoficial. Snyder já escrevia em 1988 sobre os pouquíssimos artigos que consideravam a religião um fator de impacto nas relações internacionais. (SNYDER, 1988), no entanto, atualmente existe uma crescente percepção entre os estudiosos das relações internacionais de que a religião é um fator importante de compreensão sobre a política global. Dentre diversos fatos históricos é possível destacar a presença de nações cujo regime é o teocrático, dentre eles menciona- mos a Revolução Iraniana de 1979 ou o 11 de setembro de 2001 nos Estados Unidos com o ataque às torres gêmeas e ao pentágono considerado, pelos terroristas, uma jihad, guerra santa. A ascensão do Estado Islâmico e os conflitos na antiga Iugoslávia, Irlanda do Norte. Sobretudo a atuação política de líderes religiosos como o Dalai Lama e o Papa Francisco I. Segundo matéria do Portal G1 de 22.10.2020: Papa defende união civil gay: o que Francisco já disse sobre homossexualidade segundo o Papa: “Os homossexuais têm direito a formar uma família (...) Eles são filhos de Deus e têm direito a uma família. Ninguém deve ser excluído ou forçado a ser infeliz por isso. (...) O que temos que fazer é criar uma legislação para a união civil. Dessa forma, eles ficam legalmente cobertos” A matéria prossegue lembrando que o corpo doutrinário do Vaticano, em 2003, manifestou-se desaprovação em relação ao casamento de pessoas de mesmo sexo: “o respeito pelas pessoas homossexuais não pode levar de forma alguma à aprovação do comportamento homossexual ou ao reconhecimento legal das uniões homossexuais”. (Papa defende união civil gay: o que Francisco já disse sobre homossexualidade. In: Portal G1 de 22.10.2020)
  • 23. 21 LGBTQIA+ Segundo Astrid Prange em sua análise publicada na página do DW em 23.10.2020 intitulado: Homossexualidade, um ponto crucial para o catolicismo. Muito embora, o Papa defenda a união civil entre homossexuais, por outro lado rejeita o seu casamento religioso e expulsa da igreja os padres gays. Essa controvérsia é resultado da pressão dos novos fiéis oriundos da África e Ásia. Explica: Quase a metade dos 1,3 bilhão de católicos do mundo inteiro vive no continente americano, em especial na América Latina. Na Europa, cerca de 20% da população professa a fé cató- lica. No entanto, enquanto no Velho Mundo eles são cada vez menos, seu número cresce fortemente na Ásia e África, segundo o serviço de imprensa do Vaticano, Fides. Atualmen- te, 18% da população da África é católica. (PRANGE, 2020). Recentemente, o Papa Francisco adotou uma postura contraditória. Matéria do jornal O Globo informou em 15.03.2021 que: Com aval do Papa, Vaticano proíbe bênção à união gay e classifica homossexualidade como pecado. Uma vitória da ala conservadora da Igreja Católica. Afirma ainda a matéria: O Vaticano anunciou, nesta segunda-feira, que padres e outros ministros não podem abençoar uniões entre pessoas do mesmo sexo. Segundo nota oficial divulgada pela Congregação para a Doutrina da Fé, um dos órgãos responsáveis por esta- belecer diretrizes para os católicos, “Deus não pode abençoar o pecado”.
  • 24. 22 OS DIREITOS LGBTQIA+ E A ONU Foi em julho de 2013 que o do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos – ACNUDH – lançou a iniciativa ONU Livres & Iguais. Uma campanha de informação pública das Nações Unidas, global e sem precedentes, com o obje- tivo de promover direitos iguais e tratamento justo para pessoas LGBTI. Esta campanha contou com versões nacionais, ou seja, foi organizado em mais de trinta países. Consistiu na geração de materiais compartilhados com imagens impactantes sobre atos discriminatórios e vídeos de conscientização, incluindo o popular clipe no estilo Bollywood “The Welcome”. (ONU LIVRES & IGUAIS. Disponível em: https://www. unfe.org/pt-pt/about/ Extraído em 17.03.2021). Em 2020, a Organização das Nações Unidas – ONU - produziu um relató- rio onde alerta que terapias de conversão de gays e transgêneros causam riscos de tortura, assim solicita aos governos do mundo que inibam esta prática. Tais terapias, segundo a ONU, são baseadas “na noção incorreta e prejudicial de que a diversidade sexual e de gênero são distúrbios a serem corrigidos”. Portanto, diz o texto, tais práticas “são de natureza discriminatória”. “Além disso, ações para submeter pessoas lésbicas, gays, bissexuais, trans ou de gênero à práticas de “terapia de conversão” são consideradas degradantes à condição humana. Este documento ainda aponta que esta prática em tese de “cura gay” incluem prestadores de serviços públicos e privados, lideres religiosos e curandeiros, dentre outros como membros de famílias e autoridades políticas e alerta que estas terapias podem levar à responsabilização internacional do Estado que adotar oficialmente estas práticas, pois causam danos psicológicos e físicos profundos.. (CHADE, 2020). Mundialmente, desde os anos 80, a ONU tem fomentado o debate e pro- movido ações em assuntos relativos à orientação sexual dissidente, tal como o UNAIDS, ou seja, seu programa sobre o HIV-AIDS. Essas ações ocorrem sobre o resguardo do Alto Comissariado para Direitos Humanos. As demandas relacio- nadas à questão da orientação sexual somente passaram a ser incorporadas ao Di- reito Internacional a partir do caso Toonen v. Australia. Trata-se de uma queixa histórica levada ao Comitê de Direitos Humanos da ONU – UNHRC – em 1994
  • 25. 23 Os dIReITOs LGBTQIA+ e A ONU por Nicholas Toonen que se queixou das leis da Tasmania que criminalizavam o sexo consensual entre homens adultos em local privado. Sobretudo, alegou que era uma violação de seu direito à privacidade que está expresso no artigo 17 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (PIDCP) e também a violação do Artigo 26 em o qual prevê que homens gays são iguais perante a lei. Sua quei- xa fez com que perdesse o cargo de Diretor Geral do Conselho Tasmaniano de AIDS. O Comité concordou que, devido a lei tasmaniana, a Austrália violava as obri- gações sob o tratado. Em resposta, o Governo da Commonwealth aprovou uma lei que sobrepunha a criminalização de sexo gay da Tasmânia, as últimas leis da sodomia da Austrália. Este caso abriu um vasto precedente na legislação internacional. Esta decisão tem sido frequentemente referida pelo Comitê de Direitos Humanos, dentre outros órgãos. O Comitê de Direitos Humanos que aplica a normativa sobre os Direitos Civis e Políticos entende que discriminações por sexo são proi- bidas. (NAGAMINE, 2019) Os direitos LGBT foram, nas últimas décadas, objeto de disputas no in- terior de diferentes países, por exemplo; na República Sul-Africana, na França, no Canadá, na Dinamarca, na Bélgica, na Holanda e nos Estados Unidos até a metade dos anos 2000, a discussão girou em torno da legalização da sodomia, casamento gay e parentalidade. No caso do Brasil são discutidos os direitos su- cessórios e direitos de guarda. Destaca-se que a descriminalização da sodomia nos Estados Unidos data de 2003 e a instituição do casamento entre pessoas do mesmo sexo na Holanda só ocorreu em 2001, na Espanha em 2005 e na França em 2006. (NAGAMINE, 2019). No Relatório do Conselho de Direitos Humanos na Organização das Nações Uni- das: Discriminação e violência contra indivíduos Com base em sua orientação sexual e identidade de gênero. Está expresso: Em 1 de junho de 2015, o Alto Comissário das Nações Uni- das para os Direitos Humanos emitiu um relatório sobre viola- ções de direitos humanos contra indivíduos com base em sua orientação sexual e identidade de gênero. O relatório - apenas o segundo relatório oficial da ONU sobre o assunto - foi soli- citado pelo Conselho de Direitos Humanos em uma resolução adotada em setembro de 2014. O primeiro relatório, também preparado por o Alto Comissário a pedido do Conselho, foi liberado em dezembro de 2011. O novo relatório baseia-se em descobertas recentes sobre direitos humanos da ONU órgãos,
  • 26. 24 INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO organizações regionais e não governamentais organizações, bem como informações enviadas por Governos. Ele detalha alguns avanços recentes importantes na proteção dos direitos de lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros (LGBT) e pessoas intersex - incluindo a introdução de novas leis contra a discri- minação e crimes de ódio, reconhecimento legal de relações do mesmo sexo, proteção de crianças intersex, e mudanças que tornam mais fácil para pessoas transexuais ter sua identidade de gênero legalmente reconhecida. Mesmo assim, o relatório observações, pessoas LGBT e intersex em todas as regiões enfrentam “Abuso contínuo, generalizado e violento, assédio e discriminação.”. (“Relatório do Conselho de Direitos Hu- manos na Organização das Nações Unidas: Discriminação e violência contra indivíduos Com base em sua orientação sexual e identidade de gênero”) Os casos mencionados neste texto como o massacre de Orlando e as leis que condenam a homossexualidade como no caso da Nigéria e Uganda. Principais conclusões · A violência motivada pelo ódio contra pes- soas LGBT é generalizada, brutal e muitas vezes perpetrada com impunidade. Pessoas LGBT e intersex também são vítimas de tor- tura e maus tratos, inclusive sob custódia e em clínicas e hospitais. • Em muitos países, a lei é usada para punir indivíduos com base em sua orientação sexual e gênero identidade, e para restringir os direitos à liberdade de expressão, associação e assembleia: 76 países criminalizam relações consensuais entre pessoas do mesmo sexo; em sete a morte penalidade pode ser aplicada. • “Discriminação diária”, alimentada por entrincheirados atitu- des discriminatórias e facilitadas pela falta de leis antidiscrimi- nação eficazes, afetam LGBT e pessoas intersex em todos os lugares - inclusive na educação, saúde, emprego, habitação e dentro das famílias. • Os Estados estão legalmente vinculados aos direitos humanos internacionais lei para respeitar, proteger e cumprir os direitos humanos de todos pessoas dentro de sua jurisdição - incluindo aqueles que são LGBT e intersex. (“Relatório do Conselho de Direitos Humanos na Organização das Nações Unidas: Discriminação e violência contra indivíduos Com base em sua orientação sexual e identidade de gênero”) O relatório afirma que as pessoas de orientação homossexual enfrentam atitudes discriminatórias diariamente e detecta que isto ocorre devido á ausência
  • 27. 25 Os dIReITOs LGBTQIA+ e A ONU de uma legislação antidiscriminação nos Estados vinculados aos direitos humanos. O relatório da ONU recomenda a revogação das leis discriminatórias aplicadas à comunidade LGBT adotados por países como a Nigéria, dentre outros: Recomendações principais • Revogar as leis usadas para punir as pessoas com base em sua orientação sexual e identidade e expressão de gênero - incluin- do leis que criminalizam relações consensuais entre pessoas do mesmo sexo e as chamadas “anti-propaganda” leis. • Promulgar leis anti-discriminação eficazes que protegem Pes- soas LGBT e intersexo da discriminação, e trabalhar para aca- bar com os estereótipos negativos, inclusive por meio campa- nhas de educação pública. • Investigar alegado ódio homofóbico e transfóbico crimes, tor- tura e abusos relacionados. Promulgar crime de ódio leis que impõem penas mais duras a criminosos que visar as vítimas por causa de sua orientação sexual ou identidade de gênero. Torne ilegal incitar ao ódio e violência contra pessoas LGBT. • Proibir tratamentos forçados e involuntários e médicos pro- cedimentos em pessoas LGBT e intersex. · Fornecer reco- nhecimento legal para casais do mesmo sexo e proteger os direitos de seus filhos. • Certifique-se de que todos tenham acesso à identidade legal documentos que refletem seu gênero autoidentificado, sem requisitos abusivos, como esterilização, tratamento forçado ou divórcio. • Certifique-se de que ninguém sofra perseguição porque eles são LGBT ou intersexuais são devolvidos a um território onde sua vida ou liberdade seriam ameaçadas. • Consultar LGBT e pessoas intersex e a sociedade civil ao fa- zer leis e políticas que afetam seus direitos. (“Relatório do Conselho de Direitos Humanos na Organi- zação das Nações Unidas: Discriminação e violência contra indivíduos Com base em sua orientação sexual e identidade de gênero”) O relatório destaca medidas positivas que são adotadas em muitos países. Destaca o caso de países que introduziram o casamento ou união estável entre pessoas do mesmo sexo a adoção de leis que tornam mais fácil o reconhecimento de gênero no âmbito legal.
  • 28. 26 INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO Maré de Progresso O relatório destaca muitos exemplos de ini- ciativas positivas tomadas por governos nacionais, provinciais e locais - incluindo medidas para combater crimes de ódio, lidar com o bullying de crianças e garantir um tratamento justo para pessoas LGBT e intersex no local de trabalho e no acesso à ha- bitação, saúde e público Serviços. Desde 2011, quando o Alto Comissário foi convidado pela última vez para relatório sobre este assunto ao Conselho de Direitos Humanos da ONU: • 3 países descriminalizaram consensualmente o mesmo sexo relacionamentos; • 14 adotaram ou fortaleceram a antidiscriminação ou leis con- tra crimes de ódio, estendendo a proteção para LGBT e pes- soas intersex; • 12 introduziram casamento ou união civil para casais do mes- mo sexo que oferecem benefícios equivalentes e direitos; • 10 mudaram as leis de reconhecimento de gênero para torná-lo mais fácil para pessoas transexuais obterem legalmente docu- mentos de identificação que refletem seu gênero identidade; • 1 país introduziu proteção legal para a integridade física de crianças intersex; e · Em dezenas de países, equipes médicas, professores, polícia, juízes e guardas prisionais agora estão re- cebendo gênero e HTS. (“Relatório do Conselho de Direitos Humanos na Organi- zação das Nações Unidas: Discriminação e violência contra indivíduos Com base em sua orientação sexual e identidade de gênero”) Alguns exemplos se encontram nos Estados Unidos e na índia. No caso dos Estados Unidos a tribo dos Apaches Chiricahua possuem identidades de gênero sagradas, tais como gênero o masculino-masculino/feminino-masculino/femini- no-feminino. Gerônimo Francisco que vive na reserva Navajo afirma que o gênero feminino-masculino é algo que está mais próximo dela, a designação é Nádleehí, ou seja, alguém que possui o corpo masculino e uma natureza feminina, ou que performa o papel de homem e mulher e que pode se vestir de maneira feminina ou masculina. Em Nova Dhelí os gêneros vão para além do feminino-masculino, ou seja, legalmente existem três gêneros. Em 2014, a Suprema Corte da Índia reconheceu legalmente a existência de um terceiro gênero, mas para além do aspecto legal existem, apro- ximadamente, vinte a vinte e oito gêneros diferentes. A indiana Leher de 23 anos, afirma que não é transgênero, pois na índia existe um terceiro gênero também cha- mado de “gênero sagrado” que possui o poder de abençoar ou amaldiçoar. Afirma também que o gênero binário nunca existiu ali. Tanto Leher quanto Gerônimo
  • 29. 27 TemAs TABUs NAs escOLAs BRAsILeIRAs: A dIveRsIdAde sexUAL afirmam que a ideia de múltiplos gêneros se perdeu após o colonialismo europeu, sobretudo os ingleses e espanhóis que assassinaram as pessoas que não eram bi- nárias e movidos por suas concepções religiosas, pela fé católica ou protestante, segundo a indiana Leher a colonização corrompeu a mentalidade da população indiana que hoje talvez seja transfobica ou homofóbica. (“Os povos em que o gênero vão para além de masculino e feminino há séculos”. In: BBC News Brasil. 02.08.2020). Na índia as consideradas no ocidente, transgêneros, possuem como divindade as Deusas Bahuchara Mata e Yellama Devi. Acreditam que o Ser Supremo ao criar o homem e mulher também criou a pessoa transgênero. Muitos acreditam que as pessoas trans são enviadas/enviados de Deus, assim as pessoas as procuram para receber sua benção, acreditam que suas preces chegarão mais rápidas aos Deuses. (“A mais antiga comunidade transgênero da Índia ainda luta para ser aceita.” In: BBC News Brasil: 25.12.2020). TEMAS TABUS NAS ESCOLAS BRASILEIRAS: A DIVERSIDADE SEXUAL Independente do fato de ser adequado ou inadequado, o chamado jocosa- mente de kit gay levantou a polêmica. Esse foi o material informativo que seria distribuído às escolas do Brasil pelo Ministério da Educação para informar sobre a homossexualidade com o objetivo de combater o preconceito. A bancada religiosa do Congresso Nacional do Brasil pressionou o governo da então presidenta Dilma Rousseff que cedeu e suspendeu sua distribuição. Naquele momento, a presidenta teve receio de perder o apoio da bancada religiosa no Congresso Nacional, ou seja, o caso ganhou contornos políticos. Foi como se estivéssemos em um sistema de governo teocrático (governo que une política e religião) e não republicano. Na es- cola, os educadores, trabalham com jovens que possuem individualidades as mais variadas, são evangélicos, católicos, umbandistas, espíritas. Gostam de rap, funk, rock e axé. São negros, brancos e de origem oriental e em muitos casos possuem diferentes orientações sexuais. Na escola brasileira, questões como a homossexua- lidade são veladas, assim como; outros grupos negligenciados pela escola brasileira como os negros e a questão do preconceito racial, as mulheres e a questão de gê- nero, ou seja, o papel da mulher na sociedade e os soropositivos, esses são os mais invisíveis de toda a escola brasileira, pois não se ouve falar deles.
  • 30. 28 INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO Esses são temas tabus nas escolas brasileiras. O mundo nos últimos anos passa por mudanças onde os grupos sociais, considerados excluídos, estão se organizando e reivindicando o direito à sua individualidade. Movimentos que protestam contra as violências cometidas às mulheres, violências físicas e ver- bais, assédios morais, sexuais e assassinatos. Elas estão indo as ruas com carta- zes chamando a atenção para a sua causa, movimento como a parada gay que reúne a cada ano um número cada vez maior de adeptos. Os soropositivos fa- zem campanhas e contam ainda com o dia internacional de combate a AIDS. A escola brasileira passa ao largo dessas questões que o mundo está discutindo e há enormes resistências. Esses temas que chamo de temas tabu para a escola brasileira. Essa visão dos gestores educacionais resulta no aumento vertiginoso de casos de bullying: agressões verbais e físicas, assédio moral, constrangimentos ilegais. A escola brasileira faz a opção por silenciar frente a estas questões. Muitos educadores, desde os gestores, até mesmo os professores, tem sérias limitações em lidar com tais temas. Muitos professores são conservadores e na maioria dos casos, não agem como um agente público de um estado laico, mas educam baseados em seus pressupostos religiosos (como se vivessem em uma teocra- cia), assim repelem qualquer discussão referente à homoafetividade, pois segun- do eles; Deus desaprova tal orientação sexual. Em outros casos o machismo de professores leva a um preconceito velado, seus comentários e comportamentos são homofóbicos. Na maioria dos casos o silêncio e a invisibilidade são, de lon- ge, as medidas mais adotadas entre os educadores e a escola contra a discussão sobre a homossexualidade. O polêmico kit escolar, embora constrangedor para um mundo predominantemente heterossexual, fora importante, pois iniciou uma discussão sobre o tema. Hoje há consenso de que ninguém se torna homosse- xual, assim o tal kit não irá incentivar os jovens a aderirem à homossexualidade, mas conscientizá-los sobre o preconceito. A escola jamais deverá incentivar a homossexualidade e de tal modo não deverá também incentivar igualmente seus alunos a heterossexualidade.
  • 31. 29 TemAs TABUs NAs escOLAs BRAsILeIRAs: A dIveRsIdAde sexUAL
  • 32. 30 O ATLAS DA VIOLÊNCIA NO BRASIL 2020 O documento Atlas da violência de 2020 aponta que a grande dificuldade é a escassez de indicadores de violência contra pessoas da comunidade LGBTQIA+. Indica que um grande passo seria a inclusão de questões de identidade de gênero e orientação sexual no próximo recenseamento de 2021 e também estejam presentes nos Boletins de Ocorrência e nas estatísticas geradas através do sistema de segu- rança pública. As informações do Atlas da violência 2020 foram obtidas a partir do trabalho desenvolvido pelo Grupo Gay da Bahia – GGB - Associação Nacional de Travestis e Transexuais – ANTRA, ou seja, dados recolhidos pela sociedade oriundos de denúncias registradas pelo Disque 100, do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos – MMFDH - e dos registros do Sistema de Informação de Agravos de Notificação – SINAN - e Ministério da Saúde. A tabela dos dados obtidos a partir do Disque 100 que recebe denúncias de violações dos direitos humanos. As denúncias totais de violências cometidas contra a população LGBTQIA+ tiveram seu pico em 2012. Os anos seguintes demonstram que embora os números ainda sejam altos, ocorreu uma redução. Destacamos que os números de 2018 são ainda superiores aos do ano de 2011, assim como pode ser observado na tabela abaixo. GRÁFICO 21 Número de denúncias de homicídio e de tentativa de homicídio contra pessoas LGBTQI+, segundo o Disque 100 – Brasil (2011-2018) 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 5 19 26 35 28 85 193 138 30 41 28 15 22 17 26 49 0 50 100 150 200 250 Homicídios Tentativas de homicídio FONTE: atlas Da ViolêNCia 2020: httPs://www.iPea.goV.Br/atlasVioleNCia/DowNloaD/24/atlas-Da-VioleNCia-2020 (PágiNa 56)
  • 33. 31 O ATLAs dA vIOLêNcIA NO BRAsIL 2020 O Sistema de Informação de Agravos de Notificação – SINAN – reúne os da- dos de violência nos serviços de saúde do Brasil notificados compulsoriamente. O SINAN classifica como violência: a violência física; violência psicológica; tráfi- co humano; trabalho infantil; tortura; violência sexual; violência financeira; negli- gência ou abandono; intervenção legal, etc. Categoriza somente orientação sexual, conforme as categorias heterossexual, homossexual ou bissexual, não categoriza identidade de gênero, o que nos impossibilita obter dados sobre a violência come- tida contra pessoas trans. GRÁFICO 23 Número total de casos de violência contra homossexuais e bissexuais (2017-2018) 23A – Homossexuais 0 1.000 2.000 3.000 4.000 5.000 6.000 7.000 8.000 Δ= 24,5% Δ= 25,6% Δ= -12,7% Bruto Mesmo município Mesmas unidades 2017 2018 FONTE: atlas Da ViolêNCia 2020: httPs://www.iPea.goV.Br/atlasVioleNCia/DowNloaD/24/atlas-Da-VioleNCia-2020 (PágiNa 63) O gráfico acima descreve registros de violência cometida contra os homos- sexuais e bissexuais ocorridos entre 2017 e 2018. O procedimento é o mesmo do Atlas da violência de 2019, ou seja, é realizada em etapas; primeiro, a comparação do número bruto entre 2017 e 2018; segundo: o tratamento isolado os municípios que já possuíam o serviço especializado de atendimento a homossexuais e bisse- xuais em 2017, assim isolando possíveis aumentos no número de casos devidos ao incremento da rede de serviços especializados. Os dados mostram uma redução no número de violência contra a população LGBTQIA+. Tanto no Atlas da Violência de 2019 quanto à edição de 2020 nota-se que as vítimas são em sua maioria negras habitantes da área urbana e solteiras, com exceção das vítimas bissexuais em 2017 e mulheres são mais vitimadas que os homens, estes são majoritariamente os que cometeram as agressões. Carecemos de ampliação dos registros sobre a popula- ção LGBTQIA+ e fazer uma conexão com a dimensão racial considerando a Lei de Racismo (Lei no 7.716/1989). Em 13.06.2019 O Supremo Tribunal Federal do Brasil enquadrou a homofobia e da transfobia como tipo penal definido na Lei do Racismo (Lei 7.716/1989). Assim como a comunidade LGBTQIA+ as mulheres
  • 34. 32 INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO também fazem parte de um grupo que possui grandes vulnerabilidades impostas pelo machismo e misoginia que agride, restringe, persegue, discrimina as mulheres. Um caso explicito que diz respeito à condição feminina e também à homofobia, lesbofobia na considerada civilização ocidental, mas especificamente a Rússia é o Caso do grupo punk chamado Pussy Riot. PUSSY RIOT É um grupo de punk rock formado em 2011 que transforma seus shows em manifestação política. Suas influências feministas são Simone de Beauvoir, Andrea Dworkin, Emmeline Pankhurst, Shulamith Firestone, Kate Millett, Rosi Braidotti e Judith Butler. É formado por 10 artistas, 15 assistentes técnicos que filmam e editam seus vídeos postados e difundidos na internet. Dentre seus temas, o prin- cipal; os direitos das mulheres na Rússia. As posições políticas dos grupos vão do liberalismo ao anarquismo defendem a união do feminismo e o anti-autoritarismo, sobretudo oposição ao presidente Vladmir Putin, segundo elas: “o continuador da política imperial agressiva da antiga União Soviética”. São também contra a desigual- dade econômica que é uma característica comum entre Rússia e Estados Unidos e, sobretudo contra as políticas discriminatórias das mulheres como o aborto. Em 21.11.2012 o grupo promoveu na Catedral Cristo Salvador em Moscou um protesto contra o apoio da Igreja Ortodoxa à candidatura de Vladimir Putin e, sobretudo à sua lei discriminatória à propaganda gay. Neste protesto cantam uma música cuja letra narra um pedido do grupo à Virgem Maria para tirar Putin do poder e questio- na como o Patriarca da Igreja Ortodoxa Kirril I pode acreditar em Putin e não em Deus. A manifestação foi considerada sacrilégio pela Igreja Ortodoxa. Membros do P. R. foram presas sem direito à fiança. Maria Alyokhina, Na- dezhda Tolokonnikova e Yekaterina Samutsevich foram condenadas por “hooliga- nismo motivado pelo ódio religioso”. As duas últimas foram para as prisões russas incomunicáveis e submetidas a trabalhos forçados. A prisão teve repercussão inter- nacional, pois organizações como a Anistia Internacional, inclusive artistas como Madonna, Paul McCartney, U2, Adele e Yoko Ono se manifestaram em solidarieda- de ao Pussy Riot e denunciaram o caso. Tolokonnikova foi encarcerada no IK-14 na Mordóvia mesmo local onde existiam os campos de trabalho dos lendários Gulags da época do stalinismo. No mês de setembro de 2013, Tolokonnikova começou a
  • 35. 33 PUssy RIOT fazer greve de fome para denunciar as condições desumanas desta prisão. Cumpri- ram 21 meses de pena sendo libertadas em 23.12.2013 após a anistia concedida pelo parlamento russo. No momento em que saiu da prisão Maria Alyokhina afirmou que a libertação do grupo era propaganda do governo e que continuariam sua lu- tam em defesa do feminismo e da causa LGBT PROTESTO DA PUSSY RIOT NA CATEDRAL CRISTO SALVADOR EM MOSCOU NO DIA 21.11.2012 FONTE: mazsol: httPs://maszol.ro/kUlfolD/5778-a-moszkVai-Birosag-Betiltotta-a-PUssy-riot-kliPjeit TOLOKONNIKOVA NA CELA DURANTE SEU JULGAMENTO FONTE: CryPtome.org/getty images httPs://CryPtome.org/2012-iNfo/PUssy-riot/PUssy-riot.htm
  • 36. 34 INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO MARIA ALYOKHINA, NADEZHDA TOLOKONNIKOVA E YEKATERINA SAMUTSEVICH FOTO: Dw/aP: httPs://www.Dw.Com/eN/PUssy-riot-trial-BegiNs/a-16114145 Na Copa do Mundo 2018 no jogo final entre França e Croácia, aos 52 minu- tos da partida, membros do Pussy Riot disfarçados de policiais, invadiram o grama- do protestando contra o presidente russo Vladimir Putin. Outro protesto ocorreu no dia 13 de novembro de 2019, em Brasília, no Festival Bravas Brasil3 - em defesa da vida das mulheres. Na ocasião a cidade recebia também o encontro dos pre- sidentes do BRICS – grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Nadya Riot afirmou: “O BRICS não é nada além de um grupo de criminosos, que praticam o autoritarismo, violência baseada em gênero, racismo e neoliberalismo. Tudo o que a gente odeia. As mulheres precisam reagir!”, a vocalista Nadya Tolokno também se expressou ao dizer que os BRICS eram “Um grupo de criminosos que se juntaram em uma gangue para aprimorarem sua criminalidade. Nada bom virá deles. Mudança sempre terá de vir de você. Fora Bolsonaro! Fora Putin! Eles nunca!”. 3 BRAVAS mulheres que unem forças, expertises e talentos, na captação de parcerias para a realização de ações que visam por meio da expressão artística, chamar a atenção da sociedade para os graves problemas: importunação sexual, violência online, estupro, feminicídio e violência doméstica.
  • 37. 35 PUssy RIOT FOTO: C. hartmaNN / reUters liNk Da foto. httPs://ogloBo.gloBo.Com/esPortes/grUPo-femiNista-PUssy-riot-assUme- aUtoria-De-iNVasao-Na-fiNal-Da-CoPa-22888286 O caso dos membros da banda Pussy Riot revela a repressão do ocidente às questões de gênero. Em se falando em feminismo, é correto, antes, perguntarmos; qual feminismo? As respostas poderão ser as mais variadas, dentre eles poderíamos responder, por exemplo; o feminismo negro. O Feminismo negro ganhou impulso somente após 1960, sobretudo após a fundação do National Black Feminist em 1973, nos Estados Unidos. A partir da NBF surgiu a partir do que podemos chamar de literatura feminista negra. No Brasil, a origem do movimento feminista negro data de 1985 com a realização do III Encontro Feminista Latino-Americano. Este evento influenciará a criação dos pri- meiros coletivos de mulheres negras e também encontros regionais e nacionais. O Encontro de Bertioga em 1995 foi também muito importante, pois foi a partir dele que as mulheres negras aderiram completamente ao feminismo. Para Djamila Ri- beiro é preciso que as mulheres feministas brancas reconheçam as particularidades do movimento feminista negro, sobretudo reconhecer seus privilégios em relação em relação às mulheres negras. (RIBEIRO, 2018) Djamila Ribeiro (2018) relata que a primeira onda do feminismo ocorreu no início do século XX com a criação da Federação Brasileira pelo Progresso Fe- minino cujas reivindicações eram a igualdade na vida pública como o direito ao voto (sufrágio feminino) e o direito ao trabalho sem a necessidade de autorização do marido. A terceira onda corresponde aos anos 90 tendo como sua principal
  • 38. 36 INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO expoente Judith Butler que colocou em discussão no âmbito da micropolítica, so- bretudo o fato de que as mulheres não são oprimidas da mesma forma e assim é preciso rejeitar o discurso universal sobre a mulher por ter no caráter excludente, assim necessitamos de um recorte de classe e raça. Menciona Simone de Beauvoir e sua afirmação sobre a desnaturalização do ser mulher descrita em seu livro, intitulado: “O Segundo Sexo”. Conhecida no Brasil pela afirmação: “Ninguém nasce mulher, torna-se mulher”. Distingue a construção de “gênero” e “sexo dado”, assim demonstrando que não é possível atribuir às mulheres certos valores e comportamentos biológicos determinados, ou seja, a divisão entre sexo e gênero torna-se o sustentáculo da política feminista, pois o sexo é natural, mas o gênero é social ou socialmente construído e imposto. É a partir desta constatação que Butler questiona o conceito de mulheres como sujeito do feminismo, rejeita o modelo binário: “homem” e “mulher” e desnaturaliza o gênero. Este movimen- to permite a incorporação das mulheres trans ao gênero feminino, ou seja, uma rejeição à biologização da mulher (destino biológico). (RIBEIRO, 2018). Estas questões colocam em evidência o que é gênero e exigem uma reconceitualização sobre o feminino. A luta das mulheres passa pelo aspecto conceitual, sobretudo nos espaços acadêmicos, na universidade, no entanto o próprio espaço universi- tário revela sua misoginia. Este também é um espaço de luta contra a heteronor- matividade e o machismo. Os abusos cometidos contra as mulheres poderão ser observados, no caso dos protestos da chamada “Marcha das Vadias”. A Marcha das Vadias ocorreu no dia 3 de abril de 2011 em Toronto, no Canadá, um protesto contra a afirmação de que as mulheres vitimadas por estu- pro são responsáveis por esta violência devido a um comportamento considerado “inapropriado”. No protesto elas contaram as violências sexuais que sofreram e usaram roupas provocantes: blusinhas transparentes, lingerie, saias, salto alto ou apenas o sutiã. No dia 11 de janeiro de 2011 ocorreram casos de abuso sexual na Universidade de Toronto no Canadá. O policial responsável por apurar os casos fez uma observação misógina ao dizer que “as mulheres evitassem se vestir como vadias, para não serem vítimas”. Os protestos se espalharam pelo mundo em Los Angeles, Chicago, Buenos Aires e Amsterdã e no Brasil: São Paulo, Rio de Janeiro, Vitória, Recife, Fortaleza, Salvador, Itabuna, Goiânia, Belo Horizonte, Brasília, Curitiba, Ponta Grossa, Pelotas, Florianópolis, Porto Alegre, João Pessoa, Campina Grande, Santa Maria, Londrina, São José do Rio Preto, Cuiabá e Maceió, além de outras. A antropóloga Julia Zamboni afirma que “Ser chamada de vadia é uma condição machis- ta. Os homens dizem que a gente é vadia quando dizemos sim para eles e também quando dizemos não” (...) A gente é vadia porque a gente é livre”, destacou.
  • 39. 37 PUssy RIOT FOTO: reDe Brasil atUal. DISPONÍVEL EM: ‘marCha Das VaDias’, em são PaUlo, CritiCa o maChismo - reDe Brasil atUal Segundo AZEVEDO JUNIOR, CASAREJOS & VIANA (2015) no texto intitu- lado: “A Marcha das Vadias: o corpo-signo da autonomia feminina na mídia”, a marcha é a declaração feminina de que toda mulher possui autonomia de decisão sobre seu corpo. A Marcha intenta construir uma subversão, propor um liberalismo além do político e cultural, valorizar o corpo-signo, também, como um corpo individual e não apenas coleti- vo, portanto, objeto de uma legislação cerceadora. A utilização do termo marcha permite compreender a cadencia deste movimento tal como um cortejo que ocupa o espaço público de forma caricata, divertida, combativa, explícita e ao mesmo tempo séria, fazendo uso de um intenso aparato midiático horizontal e descentralizado. Assim, ao ampliar o significado do termo ‘marcha’, teremos uma compreensão desse movimento que segue cadenciado, de- senvolve-se como expressão, em cortejo, marcando o desejo de possuir o corpo-suporte de sua individualidade. Como espa- ço feminista, a Marcha pode ser compreendida como releitura contemporânea de antigos happenings, como a queima de sutiãs ou os discursos exaltados nas universidades, no sentido de que ocupa espaços públicos de forma caricata, divertida, combativa, explícita e ao mesmo tempo séria, fazendo uso de um intenso aparato midiático horizontal e descentralizado. Desta forma, não há um site oficial do movimento, não há uma sede específica, ou algum coletivo que assume para si o direito autoral ou de ori- gem da Marcha. Como fenômeno e representação da realidade. (AZEVEDO JUNIOR, CASAREJOS & VIANA, 2015).
  • 40. 38 INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO Segundo a revista Carta Capital de 22.01.2017 a Marcha das Mulheres reúne milhares contra Trump em todo o mundo. Foi uma série de manifestações em favor dos direitos das mulheres e das minorias que começaram nos Estados Unidos, mas que ganhou a adesão em todo o mundo. Foram marcadas mais de 670 ma- nifestações em 20 países, como a Austrália e a Nova Zelândia. Em Washington, personalidades como as atrizes Scarlett Johansson, Ashley Judd e Julianne Moo- re, Alicia Keys, o documentarista Michael Moore compareceram. Madonna fez um discurso contra Trump. Um gorro cor de rosa com orelhas de gato se tornou um símbolo das mulheres que criticam Trump. O gorro é conhecido como pussy hat, um trocadilho com a palavra pussycat. Em inglês, pussy pode significar tanto gatinha ou gatinho como o órgão sexual feminino, em linguajar vulgar. A atriz America Ferrer, declarou; “Marchamos hoje pelo núcleo moral desta nação, contra o qual o novo presidente está entrando em guerra” (...) Nossa dignidade, nosso caráter, nossos direitos estão sob ataque, e a plataforma de ódio e divisão assumiu o poder ontem. Mas o presidente não é os Estados Unidos. Nós somos os Estados Unidos e estamos aqui para ficar. (Marcha das Mulheres reúne milhares contra Trump em todo o mundo. In: CARTA CAPITAL, 22/01/2017). Segundo a matéria da BBC DE 06.02.2013 assinada por Jill McGivering Mi- lhares de indianas teriam tido útero retirado sem necessidade tais procedimentos estariam sendo realizados por médicos inescrupulosos, motivados por dinheiro. A reportagem menciona o caso de uma mulher que se identifica por Sunita e que afirma morar na aldeia do Rajastão na Índia. Ela é uma jovem de 25 anos. Ela conta que foi à clinica após um sangramento durante a menstruação. Afirma: “Fui inter- nada no mesmo dia e a operação foi realizada no final da tarde (...) O médico fez uma ultrassonografia e disse que eu poderia desenvolver câncer. Ele me pressionou para que fizesse a histerectomia (operação de retirada do útero) no mesmo dia.” Sunita disse que não teve tempo para decidir se faria ou não a cirurgia, pois o mé- dico afirmou que deveria ser operada imediatamente, assim enviou-a para a mesa de cirurgia após algumas horas. Após esta cirurgia Sunita afirma que sua saúde não é mais a mesma, pois encontra dificuldades em realizar suas tarefas cotidianas. (SUNITA Apud MCGIVERING, 2013). Metade das vizinhas de Sunita afirmou ter sofrido uma histerectomia, ge- ralmente mulheres entre 20 e 30 anos. Os médicos cobram em torno de duzentos dólares pela cirurgia de retirada de útero. Nem todos possuem recursos e o que ocorre é que as famílias vendem seus pertences. Ao ser questionado sobre seu método de diagnóstico sobre a existência de células pré-cancerígenas o médico
  • 41. 39 cONfeRêNcIAs PeLOs dIReITOs hUmANOs dAs mULheRes admitiu que não faz biópsias antes da retirada do útero. Outras localidades como Bihar, Chhattisgarh e Andhra Pradesh estão ocorrendo isto. Em geral as mulheres dizem que se submetem à cirurgia ao serem alertadas pelos médicos de que, caso contrário, poderiam desenvolver câncer. A reportagem menciona que o ativista Narendra Gupta, da organização Prayas (parceira local da conhecida ONG Oxfam), está convicta de que são abusos cometidos por muitos médicos particulares, afir- ma; “As pessoas dizem que em alguns lugares há distritos inteiros sem útero (...) Parece que os médicos particulares veem isso (a operação) como uma oportunidade para fazer dinheiro rápido com doenças que poderiam ser tratadas de forma mais simples e menos invasiva.” (MCGIVERING, 2013). O relatório de Kundan Kumar, juiz em Samastipur, que convidou mulheres operadas a se submeteram a uma avaliação realizada por médicos independentes, indicou que das 2.606 mulheres examinadas, 12% ou 316 mulheres tiveram seus úteros removidos desnecessariamente. Foi verificado também que em alguns ca- sos, os médicos não realizaram as cirurgias, apenas fizeram uma incisão superficial para enganar sua paciente. Kumar acusa algumas clínicas privadas de cometerem “excessos” para obter “ganhos egoístas” e está preparando processos contra elas. (MCGIVERING, 2013). Casos como este revelam as violações dos direitos humanos aos quais as mulheres estão sendo submetidas em todo mundo. Um dos seus instrumentos de luta são as conferências mundiais que reúne mulheres de diferentes regiões do mundo, elas trocam experiências e estabelecem estratégias e diretrizes políticas co- muns a serem implementadas pelos Estados e governos sob o respaldo e chancela da ONU que incorpora suas diretrizes, denunciam e cobram seus países membros para a adoção de medidas que salvaguardem o direitos humanos das mulheres. CONFERÊNCIAS PELOS DIREITOS HUMANOS DAS MULHERES O marco da luta das mulheres por igualdade foi a Conferência sobre População e Desenvolvimento realizada em 1994 na cidade do Cairo Egito. Foram estabelecidas diretrizes de atuação e implantação de políticas públicas para o combate à violência
  • 42. 40 INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO contra as mulheres no mundo. Esta foi a quinta Conferência Mundial de População das Nações Unidas, antes tivemos as conferências de Roma, em 1954, em Belgrado, 1965, Bucareste, 1974 e, em 1984 na Cidade do México. Esta conferencia foi realizada pela Organização das Nações Unidas – ONU – no Cairo, Egito, entre os dias 05 e 13 de setembro de 1994. A conferência estabeleceu um Programa de Ação que é o documento orientador do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), reuniu 20.000 delegados representando governos, agências da ONU, ONGs e a mídia. Os te- mas em discussão envolveram questões populacionais. A conferência obteve consenso em relação, a) educação universal; b) Redução da mortalidade infantil; c) Redução da mortalidade materna; d) Acesso a serviços relativos à sexualidade, reprodução e plane- amento familiar. (Fonte: ONU MULHERES Brasil: Conferências Mundiais da Mulher). Outras conferências foram realizadas em todo o mundo deixando clara a disposição das mulheres em atuar mundialmente pela libertação feminina dos gri- lhões de uma sociedade com uma hegemonia cultural: machista e misógina. Des- tacamos na sequência outros eventos importantes que ocorreram em todo mundo segundo o site da ONU Mulheres. 1980 – II Conferência Mundial da Mulher sob o lema “Educação, Emprego e Saúde”, Copenhague: “a comunidade internacional tomou mais consciência sobre a falta de participação dos homens no processo de igualdade, vontade política insuficiente por parte dos Estados para o enfrentamento às desigualdades de gênero, escassez de mulheres nos postos de decisões, baixo investimento nos serviços sociais de apoio, entre outros fatores. O programa de ação da II Conferência Mundial sobre a Mulher demandou medidas nacio- nais mais fortes para garantir a propriedade e controle de propriedade das mulheres, bem como melhorias nos direitos das mulheres em relação à herança, guarda dos filhos e nacio- nalidade. No balanço do decênio chegou-se à constatação de que poucas metas tinham sido alcançadas, conduzindo a mais organização e pressão da sociedade civil. Houve cobrança de mais participação das mulheres na produção das riquezas das sociedades. Em razão disso, foram apontadas medidas de caráter jurídico, para alcançar a igualdade na participação social e na participação política e nos lugares de tomada de decisões. Dentre os compromissos, destacam-se: a igualdade no acesso à educação, oportunidades no trabalho e atenção à saúde das mulheres.” (Fonte: ONU MULHERES Brasil: Conferências Mundiais da Mulher). 1985 – III Conferência Mundial sobre a Mulher com tema central “Estraté- gias Orientadas ao Futuro, para o Desenvolvimento da Mulher até o Ano 2000”, Nairóbi. “No balanço do decênio chegou-se à constatação de que poucas metas tinham sido alcançadas, conduzindo a mais organização e pressão da sociedade civil. Houve co-
  • 43. 41 cONfeRêNcIAs PeLOs dIReITOs hUmANOs dAs mULheRes brança de mais participação das mulheres na produção das riquezas das sociedades. Em razão disso, foram apontadas medidas de caráter jurídico, para alcançar a igualdade na participação social e na participação política e nos lugares de tomada de decisões. Dentre os compromissos, destacam-se: a igualdade no acesso à educação, oportunidades no trabalho e atenção à saúde das mulheres. O programa de ação da Segunda Conferência Mundial sobre a Mulher demandou medidas nacionais mais fortes para garantir a propriedade e controle de propriedade das mulheres, bem como melhorias nos direitos das mulheres em relação à herança, guarda dos filhos e nacionalidade. A comunidade internacional tomou mais consciência sobre a falta de participação dos homens no processo de igualdade, von- tade política insuficiente por parte dos Estados para o enfrentamento às desigualdades de gênero, escassez de mulheres nos postos de decisões, baixo investimento nos serviços sociais de apoio, entre outros fatores. Dentre os compromissos, destacam-se: a igualdade no acesso à educação, oportunidades no trabalho e atenção à saúde das mulheres. O programa de ação da Segunda Conferência Mundial sobre a Mulher demandou medidas nacionais mais fortes para garantir a propriedade e controle de propriedade das mulheres, bem como me- lhorias nos direitos das mulheres em relação à herança, guarda dos filhos e nacionalidade.” (Fonte: ONU MULHERES Brasil: Conferências Mundiais da Mulher). 1995 – IV Conferência Mundial sobre a Mulher com tema central “Ação para a Igualdade, o Desenvolvimento e a Paz”, China. “A Plataforma de Ação de Pequim afirma os direitos das mulheres como direitos humanos e comprometidos com ações específicas para garantir o respeito a esses direitos. Define o conceito de gênero para a agenda internacional, empoderamento das mulheres e transversalidade das políticas públicas com a perspectiva de gênero. Para a ONU, “a transformação fundamental em Pequim foi o reconhecimento da necessidade de mudar o foco da mulher para o conceito de gênero, reconhecendo que toda a estrutura da sociedade, e todas as relações entre ho- mens e mulheres dentro dela, tiveram que ser reavaliados. Só por essa fundamental rees- truturação da sociedade e suas instituições poderiam as mulheres ter plenos poderes para tomar o seu lugar de direito como parceiros iguais aos dos homens em todos os aspectos da vida. Essa mudança representou uma reafirmação de que os direitos das mulheres são direitos humanos e que a igualdade de gênero era uma questão de interesse universal, beneficiando a todos”. São estabelecidas 12 áreas de preocupação sobre os direitos de mulheres e meninas: 1. Mulheres e pobreza; 2. Educação e Capacitação de Mulheres; 3. Mulheres e Saúde; 4. Violência contra a Mulher; 5. Mulheres e Conflitos Armados; 6. Mulheres e Economia; 7. Mulheres no Poder e na liderança; 8. Mecanismos institucio- nais para o Avanço das Mulheres; 9. Direitos Humanos das Mulheres; 10. Mulheres e a mídia; 11. Mulheres e Meio Ambiente; 12. Direitos das Meninas.” (Fonte: ONU MULHERES Brasil: Conferências Mundiais da Mulher).
  • 44. 42 ONU MULHER Foi apenas em 2010 que a Organização das Nações Unidas criou a ONU Mu- lheres criada com o objetivo de unir, fortalecer e ampliar os esforços mundiais em defesa dos direitos humanos das mulheres. No âmbito da ONU, o primeiro gesto foi o Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher (UNIFEM) criado em defesa dos direitos humanos das mulheres, sobretudo pelo apoio em relação às articulações do movimento de mulheres e feministas: mulheres negras, indígenas, jovens, trabalhadoras domésticas e trabalhadoras rurais. Reúne seis áreas prioritárias para atuação: 01. Liderança e participação política das mulheres. 02. Empoderamento econômico. 03. Fim da violência contra mulheres e meninas. 04. Paz e segurança e emergências humanitárias. 05. Governança e planejamento. 6. Normas globais e regionais. A sede da ONU Mulheres é Nova Iorque, nos Estados Unidos e escritórios regionais na África, Américas, Ásia e Europa. Faz parte do secretariado da Comissão da Organização sobre a Situação das Mulheres (CSW), responsável pela negociação e de monitoramento de compromissos internacionais sobre direitos humanos das mulheres. (Fonte: ONU MULHERES Brasil: Sobre a ONU Mulheres Disponível em: https://www.onumulheres.org.br/onu-mulheres/ sobre-a-onu-mulheres/. Extraído em: 15.03.2021). IDEALISMO, REALISMO E PLURALISMO Qual o lugar da luta das mulheres e da comunidade LGBTQIA+ na teoria das relações internacionais ? O realismo não admitiria a atuação internacional, pois entende que somente o Estado é o legitimo ator político internacional, assim o realismo apresenta uma fórmula estadocêntrica para o estudo das relações interna- cionais. Segundo Hans Morgenthau - considerado um dos fundadores do realismo nas relações internacionais, a atuação do Estado é baseado na demonstração de poder. As correntes liberais embora tenham vertentes diferentes, historicamente contestaram a presença do Estado na economia como sendo um desvio. Por outro lado, o Estado tem sido chamado para corrigir os defeitos do sistema e propiciar
  • 45. 43 IdeALIsmO, ReALIsmO e PLURALIsmO a contínua reprodução ampliada do capital, por exemplo, na criação de créditos diversos, socorro às empresas privadas e bancos. A insurgência das mulheres po- deria encontrar abrigo nas teorias pluralistas liberais de J. Nye e R. Keohane. Eles observam que os Estados nacionais estão perdendo sua importância e que está nascendo uma nova ordem política e econômica mundial regulada por regimes supranacionais, legítimos, capazes de funcionar com eficácia mesmo na ausência de potências hegemônicas. Verdadeiras redes de regras, normas e procedimentos que regularizem os comportamentos e controlem seus efeitos, e que uma vez estabele- cidos é muito difícil erradicá-los ou mudá-las. (KEOHANE & NYE, 1977). A partir destes pressupostos consideramos que os estudos tradicionalmente desenvolvidos nos cursos de Relações Internacionais seguem o viés realista, pois o objeto de suas pesquisas consideram os atores estatais, por exemplo, as relações en- tre países, a política exterior de determinado Estado, nação ou governo em relação aos seus pares. Desenvolvem uma análise política institucional. Para além dos estu- dos das relações internacionais que compreendem que o único ator internacional é o Estado, é preciso dizer sobre a frequência cada vez mais frequente da atuação no plano internacional instituições não-estatais como organizações, associações, mo- vimentos, ligas, etc que atuam mundialmente como, por exemplo, os Médicos Sem Fronteiras, O Greenpeace, Anistia Internacional ou a Transparência Internacional que são organizações cuja atuação global em defesa do meio-ambiente, assistência mé- dica, combate à corrupção e de direitos civis. Ou empresas privadas ou os fundos e bancos como o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional ou até mesmo empresas que investem na exploração espacial fomentando o desenvolvimento de tecnologias aeroespaciais e de pesquisas nesta área. Se pensarmos que se o mercado realmente se converteu em um ator global que subordina a esfera pública aos seus interesses e que impõe a sua política empresarial em detrimento da política pública, isto como um fenômeno da globalização. Para quem considera como objeto de estudos das relações internacionais apenas temas ligados à política institucional, governamental e não-governamental, do direito, economia e meio ambiente se surpreenderá ao observar o surgimento de temas no âmbito da política internacional relacionada às questões de gênero: mulheres, LGBTs, indígenas, racismo, entre outros. Dimensões da identidade e cul- tura estão cada vez mais presentes. Tal recorte demonstra a democratização dos estudos das relações internacionais que não é mais visto de cima, mas dos de baixo, aqueles chamados de excluídos. Cresce em todo mundo a organização de mulheres e LGBTs por igualdade que se insere nas discussões relativas aos direitos humanos.
  • 46. 44 INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO São movimentos que viralizam nas redes sociais e ocorrem em todo mundo. Lu- tam para garantirem o poder aos seus corpos, assim lutam contra o feminicídio, a misoginia e a homofobia. Reivindicam a construção de sua identidade, o direito de escolha e o poder de decisão. Lutam contra os fatores de exclusão como a pobre- za, o abandono e demais fatores de vulnerabilidade. No âmbito da Organização das Nações Unidas, sobretudo a Organização dos Direitos Humanos existe uma atuação que exerce pressão sobre os Estados e seus respectivos governos contra os abusos e violência contra mulheres e a comunidade LGBTs. Promove fóruns internacionais que além de promoverem o intercâmbio com mulheres e membros da comunidade LGBT do mundo inteiro e como resultado do encontro o estabele- cimento de diretrizes a serem adotadas pelos países membros da ONU. O Relatório da ONU publicado em 2019 intitulado: “formas contemporâneas de racismo, discriminação racial, xenofobia e intolerância”, de autoria da Sra. E. Tendayi Achiume, relata que o populismo nacionalista ou também conhecido como gover- nos de extrema-direita avança heteronormativamente impondo os valores conside- rados tradicionais, o que acaba por resultar em sérias violações mulheres, negros e membros da comunidade LGBTQIA+, também minorias religiosas. Afirma: 13. O populismo nacionalista muitas vezes avança com sucesso heteronormativo, patriarcal visões da nação, e uma versão dos “valores tradicionais” que leva a sérias violações contra grupos sociais marginalizados (incluindo mulheres, gênero e sexual mi- norias e pessoas com deficiência), especialmente quando aque- les que são socialmente marginalizados também são minorias raciais, étnicas ou religiosas. Ela reforça o domínio dos homens e impõe rígidos papéis de gênero, negando às mulheres e a ou- tros plena agência, especialmente sobre seus direitos reproduti- vos e sexuais. Mulheres inconformadas tornam-se um alvo para nacionalistas populistas, que em alguns casos praticam misógi- nos online e outros ataques contra essas mulheres. Fervor po- pulista nacionalista em algumas partes do mundo também avan- çou contra a igualdade de direitos para lésbicas, gays, bissexuais, pessoas transgênero, queer e intersex (LGBTQIA+) de manei- ras que negam suas características inerentes dignidade humana e direito ao pleno gozo dos direitos humanos. Um abrangente a análise da igualdade racial do populismo nacionalista deve man- ter de vista as formas que múltiplas identidades sociais que se cruzam transformam a experiência racial discriminação neste contexto, como fazem em outros. Ele também deve manter de vista os caminhos que os Estados usem leis patriarcais e dis-
  • 47. 45 IdeALIsmO, ReALIsmO e PLURALIsmO criminatórias de gênero para alcançar objetivos raciais, étnicos e exclusão religiosa, conforme apresentado no relatório mais recente deste mandato para o Humano Conselho de Direitos. (Contemporary forms of racism, racial discrimination, xe- nophobia and related intolerance ONU, 2018, p. 7) O presente relatório apresenta um renascimento das ideologias totalitárias do período anterior a Segunda Grande Guerra ocorrida entre 1939 a 1945, agora; presente em grupos supremacistas como é o caso ocorrido em Charlottesville no primeiro ano da Administração Trump em 2017. O grupo de supremacistas, nacio- nalistas, neo-confederados, neonazistas, milícias marcharam rumo à Charlottesville portando rifles, suásticas, bandeiras confederadas, antissemitas e de apoio à chapa “Trump-Pence” que se tornou vitoriosa nas eleições presidenciais de 2016 nos Es- tados Unidos. Esta manifestação foi chamada de “Unite the Right” ou “unir a direi- ta”. Seu objetivo era impedir a remoção do monumento do General Confederado Robert E. Lee, ídolo da extrema direita por supostamente simbolizar o passado escravista, pois era proprietário de pessoas feitas escravas e também por simbolizar à resistência do sul dos Estados Unidos frente ao norte liberal. Após o poder local decidir remover a estátua por simbolizar a divisão social na cidade, movimentos su- premacistas e neonazistas tentaram impedir. Imediatamente os grupos antifascistas e o movimento negro reagiram e isto deu início à Batalha de Charlottesville. Os dois grupos entraram em choque. O governador da Virginia chegou a declarar estado de emergência para solicitar forças adicionais com o objetivo de acabar com os con- frontos. Este ato resultou no incidente em que um supremacista James Alex Fields Jr. avançou com seu carro sobre um grupo de manifestantes antifascistas, matou Heather Heyer e feriu outras 20 pessoas. Foi condenado à prisão perpétua. O atro- pelamento foi interpretado como um ato de terrorismo doméstico. O ocorrido em Charlottesville gerou outras manifestações pelo país, tanto de grupos anti-ódio quanto de grupos supremacistas, ou seja, a sociedade estadunidense dividiu-se e manteve-se polarizada nos anos seguintes. O então presidente Donald Trump foi acusado de não condenar de forma veemente os grupos supremacistas brancos e os grupos neonazistas. Ao afirmar em sua declaração que existiam “muitos lados” em relação ao conflito. O Congres- so considerou ambíguo e insuficiente esta declaração já que nela Trump não con- denou, de fato, a ação dos grupos de extrema-direita e também não considerou que os grupos antifascistas e o movimento negro foram vitimados fatalmente. Disse Trump em 12 de agosto de 2017 que ocorreu uma “exibição flagrante de ódio, fanatismo e violência em muitos lados, em muitos lados”. Sua Porta Voz pos-
  • 48. 46 INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO teriormente tentou enfatizar que Trump condenava os supremacistas. Disse: “O Presidente disse veementemente em sua declaração ontem de que ele condena todas as formas de violência, intolerância e ódio. Claro que isto inclui supremacistas brancos, KKK, neonazistas e todos os grupos extremistas. Ele pediu a união nacional a todos os americanos”. Esta declaração não aplacou o efeito negativo do termo utilizado pelo então presidente na primeira declaração de que o conflito teve “muitos la- dos”. Quatro anos depois nas eleições presidenciais de 2020, seu oponente, Joe Biden, lembrará deste termo nos debates contra Trump para tentar demonstrar que ele apoiava grupos de extrema direita e apostava na divisão do país pelo ódio. JOSHUA ROBERTS REUTERS LINK PARA A FOTO: httPs://Brasil.elPais.Com/Brasil/2017/08/12/alBUm/1502552919_477485. html#foto_gal_18 A eleição de Donald Trump encorajou os movimentos de extrema-direita, antes na administração Obama estavam ativos, porém não se sentiam tão à vonta- de para promover uma marcha, na luz do dia, sem vergonha alguma de defender seu credo racista. É fato que Trump se elegeu com os votos dos supremacistas, em estados conservadores como a Virginia, Mississippi, Texas, Novo México, dentre outros. Estados com tradição em movimentos white power. Charlottesville foi chocante, pois fazia muito tempo não víamos movimentos tão repugnantes à luz do dia e parece que eles reacenderam, encontraram permissão para agir não
  • 49. 47 GeORGe fLOyd e JAcOB BLAke mais à sombra da noite profunda. Segundo reportagem da Revista Exame intitu- lada: Crimes de supremacistas brancos crescem nos EUA informa que entre 2016 para 2017, casos de violência cometidos por grupos de extrema direita e supremacistas brancos saltaram de 20% para 59% do total de ataques. A chamada Liga Anti-Difamação informa que no ano de 2017 aumentaram os casos de violência perpetrados por grupos de extrema direita e supremacistas brancos na casa dos 59% dos ata- ques cometidos pelos extremistas nos EUA. Os dados anteriores à administração Trump, ou seja, no ano de 2016 esta porcentagem se encontrava em 20%. Este aumento também é corroborado por outras instituições como o Centro para Es- tudos Internacionais e Estratégicos (CSIS). (Crimes de supremacistas brancos crescem nos EUA. In: Estadão conteúdo: 12.05.2019). GEORGE FLOYD E JACOB BLAKE É possível dizer que Charlottesville gestou a morte covarde do Sr. George Floyd por estrangulamento, assassinato cometido à luz do dia e gravado por ce- lular de forma impiedosa em Minneapolis no ano de 2020, em plena pandemia. Floyd foi colocado deitado de bruços no chão e imobilizado por três policiais, um deles, o policial Derek Chauvin, (do Departamento de Polícia de Minneapo- lis) passou cruelmente a estrangulá-lo com o joelho colocado em seu pescoço. O Sr. George Floyd, de 46 anos agonizava dizendo: ‘não consigo respirar’. Sua triste morte ocasionou uma avalanche de indignação, sobretudo após a divulgação do vídeo mostrando como Floyd foi morto. O episódio é muito parecido ao que ocorreu com o Sr. Eric Garner, que faleceu após ser preso em Nova York no ano de 2014. Igualmente Garner repetiu a frase: “Não consigo respirar” por onze vezes. Esta frase foi dita por Eric Garner em 2014 e George Floyd em 2020. Aproxi- madamente dois meses após a morte de George Floyd outro caso envolvendo a violência policial contra afrodescendentes chocou os Estados Unidos. No dia 23 de agosto de 2020, Jacob S. Blake de 29 anos foi baleado pelo policial Rusten Sheskey na cidade de Kenosha no Estado de Wisconsin. O policial atirou nele pelas costas, efetuou sete disparos. Os filhos de Blake se encontravam no banco de trás de seu carro e testemunharam tudo que ocorreu. Estes atos violentos mobilizaram os ativistas antirracistas como #BlackLivesMatter (Vidas Negras Im- portam). A morte de George Floyd e o caso de Jacob Blake geraram semanas de protestos violentos e seria junto à pandemia um dos fatores que influenciariam
  • 50. 48 INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO na derrota da candidatura à reeleição de Donald Trump. Estes protestos virali- zaram nas redes e ganharam as ruas, em plena pandemia, geraram uma onda de protestos em todo mundo. FONTE WIKIPEDIA: httPs://Pt.wikiPeDia.org/wiki/assassiNato_De_george_floyD#/meDia/ fiCheiro:george_floyD_imoBilizaDo.jPg THE HILL: GETTY IMAGES: httPs://thehill.Com/homeNews/CamPaigN/514150-harris-DeliVers- VirtUal-Call-to-aCtioN-to-Protestors-at-New-marCh-oN
  • 51. 49 #BLAckLIvemATTeRs AGENCIA FRANCE PRESSE: httPs://www.CorreioBrazilieNse.Com.Br/aPP/NotiCia/mUNDo/2020/ 06/06/iNterNa_mUNDo,861644/oNDa-De-Protesto-CoNtra-morte-De-george-floyD-se- esPalha-Pelo-mUNDo.shtml #BLACKLIVEMATTERS Estes grandes movimentos de protesto que emergem das redes sociais são um novo elemento que os estudos sobre a política internacional devem considerar. A reação à morte de George Floyd e o atentado à Jacob Blake enceta a viralização do movimento ativista internacional #BlackLiveMatters que se originou na socie- dade afrodescendente estadunidense contra as violências cometidas às pessoas ne- gras. O grupo é responsável por organizar protestos contra a violência policial e a desigualdade do sistema judicial à comunidade negra nos EUA. Começou em 2013 a partir da absolvição de George Zimmerman acusado de matar a tiros um jovem negro chamado Trayvon Martin. Indignados com a absolvição, protestaram nas redes utilizando a hashtag #BlackLivesMatter. Este foi o impulso inicial para a cria- ção de um movimento ativista e que ganhou reconhecimento após o movimento sair das redes e ganhar as ruas em 2014, após o assassinato de dois afro-americanos: Michael Brown e Eric Garner na cidade de Nova York. Desde então o movimento tem protestado contra a morte da população negra, em casos, tais como: Tamir Rice, Eric Harris, Walter Scott, Jonathan Ferrell, Sandra Branda, Samuel DuBose,
  • 52. 50 INSURGÊNCIAS NA GLOBALIZAÇÃO e Freddie Gray. É um movimento que não possui uma sede, célula ou liderança, é viral, ou seja, #BlackLiveMatters é o que se escreve nas fotos ou reportagens após a divulgação de violências policiais cometidas contra os afrodescendentes nas redes sociais em forma de denúncia. Este conteúdo viraliza nas redes com a hash- tag #BlackLiveMatters e toma as ruas em forma de protesto, mas não existe uma cadeia de comando, pois os movimentos de rua surgem a partir de uma viralização nas redes sociais. Os protestos contra a morte de George Floyd foram iniciados na Região Metropolitana de Minneapolis-Saint Paul e se espalhou por mais de 2.000 ci- dades em mais de 60 países, estima-se que até o dia 03 de julho entre 15 e 26 milhões de pessoas já tinham participado dos protestos nos Estados Unidos. Tumultos, pi- lhagens, e confrontos com a polícia. Em mais de 200 cidades estadunidenses foram decretados o Toque de Recolher, mobilizado mais de 62 mil efetivos da Guarda Nacional e foram detidas mais de 14.000 pessoas. O então presidente Donald Trump ordenou a repressão aos manifestantes e logo em seguida foi à uma igreja Saint John com a Bíblia nas mãos, assim tentando cativar setores da população como os conservadores, brancos e supremacistas. O gesto foi duramente criticado pelos líderes religiosos, inclusive a Episcopisa Ma- riann Budde da diocese de Washington afirmou: “Foi traumático e profundamente ofensivo no sentido de que algo sagrado foi mal utilizado para um gesto político”. O arce- bispo de Washington, Wilton Gregory também reprovou seu gesto ao dizer: “Acho desconcertante e reprovável que um lugar católico possa ser usado e manipulado de maneira a violar os princípios religiosos mais básicos” (Líderes religiosos reagem indignados a gesto de Trump com a Bíblia. In: G1/France Presse: 02.06.2020) FOTO: reUters/tom BreNNer