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UNIVERSIDADE VEIGA DE ALMEIDA
CURSO DE DIREITO
CAMPUS BARRA DA TIJUCA
ISABELA DE MELO MATTOS
OS DIREITOS HUMANOS E O SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO
RIO DE JANEIRO
JUNHO/2019
ISABELA DE MELO MATTOS
OS DIREITOS HUMANOS E O SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO
Orientador: Prof.ª Rosemary Lopes Faria
Coorientador: Prof. Josemar Figueiredo Araújo
RIO DE JANEIRO
JUNHO/2019
UNIVERSIDADE VEIGA DE ALMEIDA
Trabalho de Conclusão de Curso
apresentado à Universidade Veiga
de Almeida como parte dos
requisitos necessários para a
aprovação no Curso de Direito.
Aprovado em_____de________________de______.
____________________________________________
Prof.ª Rosemary Lopes Faria
Presidente (orientador)
____________________________________________
Prof.
Examinador
____________________________________________
Prof.
Examinador
AGRADECIMENTOS
Primeiramente, agradeço a Deus por ouvir minhas orações e confortar
o meu coração nos momentos difíceis.
Agradeço aos meus pais, Kacia e Jorge, pelas palavras de incentivo e
por fazerem o possível para me proporcionar as melhores oportunidades. Não
seria a pessoa que sou hoje se não fosse por eles.
Agradeço ao meu namorado, Pedro, que esteve ao meu lado durante
essa trajetória, por todo carinho e paciência. Quando eu achava que não seria
capaz, suas palavras de apoio me deram forças para continuar.
Agradeço aos meus avós maternos, principalmente a minha avó
Edicinha, que sempre foi exemplo de mulher forte e determinada, por sempre
me manter em suas preces e por mesmo com seus 75 anos, sempre estar
disposta a cuidar de mim.
Agradeço ao meu primo Bernardo, que é a minha maior inspiração, por
mesmo distante, assumir o papel de “mentor” na minha vida. Quando me senti
perdida, foram suas palavras que me ajudaram a me encontrar novamente.
Agradeço a todas as minhas amizades por toda compreensão em
momentos de “essa semana não posso, tenho que escrever o TCC”. Em
especial, agradeço a Débora, minha “mana”, que foi minha maior incentivadora
durante esse projeto, sempre me botando pra cima e me dizendo que tudo
daria certo. E também a minha amiga Beatriz, que mesmo na correria da vida,
topou driblar a falta de tempo para me ajudar a formatar esse trabalho.
Agradeço ao Cauê, meu “cãopanheiro”, que está comigo há 12 anos.
Durante a elaboração desse projeto, esteve sempre deitado ao meu lado e me
acompanhando pelos cômodos da casa, como sempre, demonstrando todo seu
amor e fidelidade.
Por fim, agradeço aos meus orientadores, Professora Rosemary e
Professor Josemar, por terem desempenhado um papel muito além do
esperado, tendo muita paciência e disposição para ajudar. Sem vocês, esse
trabalho não existiria.
RESUMO
A violação dos direitos dos presos dentro dos estabelecimentos
penitenciários brasileiros sempre foi um assunto polêmico quando discutido em
sua amplitude. Para além das questões sociológicas e opiniões pessoais é
preciso ter um olhar mais atento, crítico, no que tange ao respeito ou à falta
dele, perante a legislação brasileira e aos pactos dos quais o Brasil é
signatário. A Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984, denominada como Lei de
Execução Penal, prevê uma boa parte dos direitos e garantias conferidos aos
indivíduos que cumprem pena privativa de liberdade. Além da lei mencionada,
podemos contar também com o suporte do art. 5° da Constituição Federal de
1988, bem como alguns pactos nacionais e internacionais da Organização das
Nações Unidas – ONU. Ocorre que, embora tendo todo um rol de garantias
constitucionais previstas em lei, o preso ainda sofre agressivas violações a
seus direitos, necessitando de uma maior atenção das instituições
fiscalizadoras, como por exemplo, o Ministério Público e o Comitê de Direitos
Humanos, além das autoridades locais competentes. Atualmente se torna
imprescindível reforçar a prerrogativa de que os direitos humanos se aplicam a
todos os seres humanos, em todas as circunstâncias. Nada pode ferir a
dignidade da pessoa humana, nem mesmo uma sentença condenatória.
Palavras-Chave: Direitos Humanos, Penitenciárias Brasileiras, Lei de Execução
Penal.
ABSTRACT
The violation of prisoners' rights within Brazilian prisons has always
been a controversial subject when discussed in its amplitude. In addition to
sociological questions and personal opinions, it is necessary to have a closer,
critical look regarding the sense of respect or the lack of it, on the Brazilian
legislation and the pacts that Brazil is a signatory. The Law No. 7,210 of July
11, 1984, known as the Criminal Enforcement Law, provides a large number of
the rights and guarantees granted to individuals serving a custodial sentence.
Besides the mentioned law, we can also count on the support of art. 5 of the
Federal Constitution of 1988, as well as some national and international
agreements of the United Nations - UN. Occurs that, even having a whole range
of constitutional guarantees provided for by law, the prisoner still suffers
aggressive violations of his rights, requiring greater attention from the
supervisory institutions, such as the Public Ministry and the Human Rights
Committee, in addition to the local authorities. It is now imperative to strengthen
the prerogative that human rights apply to all human beings in all
circumstances. Nothing can harm the dignity of the human person, not even a
condemnatory sentence.
Keywords: Human Rights, Brazilian Prisons, Criminal Enforcement Law.
LISTA DE FIGURAS
Gráfico 1: Evolução das pessoas privadas de liberdade entre 1990 e 2016... 23
Gráfico 2: Pessoas com deficiência física por situação de acessibilidade da
unidade prisional em que se encontram .......................................................... 27
Gráfico 3: Evolução da população prisional, vagas e déficit de vagas entre
2000 e 2016. .................................................................................................... 29
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO............................................................................................................9
1 CAPÍTULO I .....................................................................................................12
1.1 A LIBERDADE ENQUANTO DIREITO HUMANO FUNDAMENTAL..................12
1.2 A PENA DE PRIVAÇÃO DE LIBERDADE – ASPECTOS HISTÓRICOS E
JURÍDICOS...............................................................................................................14
1.3 OS DIREITOS FUNDAMENTAIS DO ENCARCERADO ...................................17
1.4 OS DIREITOS PERDIDOS OU SUSPENSOS PELA CONDENAÇÃO..............17
1.5 OS DIREITOS MANTIDOS MESMO APÓS A CONDENAÇÃO.........................18
2 CAPÍTULO II ....................................................................................................21
2.1 O SISTEMA CARCERÁRIO BRASILEIRO E SUA FUNÇÃO SOCIAL ..............21
2.2 LIMITAÇÃO DAS PENAS .................................................................................24
2.3 OS REGIMES PENITENCIÁRIOS E OS TIPOS DE ESTABELECIMENTOS
PRISIONAIS..............................................................................................................24
2.4 O QUADRO ATUAL DO SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO.................28
3 CAPÍTULO III ...................................................................................................32
3.1 OS DIREITOS HUMANOS VIOLADOS JUNTAMENTE COM A PENA
PRIVATIVA DE LIBERDADE.....................................................................................32
4 CONCLUSÃO...................................................................................................39
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.........................................................................42
INTRODUÇÃO
Direitos humanos é o ramo dentro do Direito que cuida do conjunto de
prerrogativas que são indispensáveis a uma vida digna. Pelo fato das
necessidades humanas serem variadas de acordo com o momento histórico, os
direitos humanos não possuem um rol predeterminado, avançando conforme
as novas demandas de novas épocas. (RAMOS, 2017).
Quando uma pessoa é condenada a cumprir pena privativa de liberdade,
é necessário observar se os direitos humanos estão sendo respeitados, uma
vez que o que se perde, é o direito de ir e vir, e não o direito de ser tratado de
forma humanamente digna. Alguns estudiosos entendem que violando os
direitos humanos dos encarcerados o Estado o está condenando duplamente:
retirando sua liberdade e seus direitos básicos e indispensáveis. Por isso, os
direitos humanos têm como principais características a universalidade e
essencialidade.
O presente trabalho tem por objetivo promover uma análise acerca da
realidade do sistema penitenciário brasileiro, com enfoque à violação dos
direitos dos apenados. Visa também entender o papel da superlotação nesse
cenário, bem como descrever os direitos mantidos mesmo após a condenação
à pena privativa de liberdade, além dos direitos perdidos com a condenação e
dos direitos que estão sendo violados atualmente.
Nesse sentido, surgem os seguintes questionamentos: O que o
Estado está fazendo para cumprir seu papel ressocializador nas
penitenciárias? Qual a relação entre a violação dos direitos humanos com a
10
agravante da superlotação e o alto número de casos de reincidência? Como
assegurar os direitos humanos dentro desse sistema de forma digna e
igualitária?
O estudo do presente tema possui enorme relevância não só para a
comunidade jurídica, mas também para a sociedade de forma geral, uma vez
que eventualmente os presos voltarão a viver em sociedade, e é de extrema
importância que os mesmos voltem ressocializados e dispostos a seguirem as
leis, como prevê a Constituição Federal. Além disso, torna-se imprescindível
fomentar a discussão acerca de medidas preventivas, como por exemplo o
investimento em políticas sociais, e não somente a implementação paliativa,
como vem sido feito.
O método utilizado para a pesquisa é o exploratório, visando fornecer
informações para uma compreensão mais precisa e humanitária em relação ao
tema. Por sua vez, a abordagem se dará de forma qualitativa, procurando
compreender o que levou o Estado a atual crise penitenciária, e como a
violação dos direitos humanos contribuiu para a degradação do sistema.
A técnica a que se pretende aplicar na elaboração do trabalho está
relacionada a análise de documentos, tais como legislações pertinentes, livros,
pesquisas, reportagens jornalísticas e outros meios que se fizerem
necessários, com o intuito de facilitar a compreensão da problemática, fazendo
um estudo aprofundado.
O presente trabalho será dividido em três capítulos. O primeiro capítulo
discorrerá sobre os aspectos que tangem o conceito de liberdade, bem como
os direitos fundamentais da pessoa encarcerada, além de tratar sobre os
direitos perdidos e os mantidos após a sentença condenatória à pena privativa
de liberdade.
O segundo capítulo apresentará a função do sistema carcerário brasileiro
e a limitação das penas, além de descrever a classificação dos regimes
11
penitenciários, dos tipos de estabelecimentos prisionais e a real e atual
situação das penitenciárias.
O terceiro e último capítulo expõe os direitos que estão sendo violados
nos dias de hoje, em contraste com o que está previsto em lei.
Conclui-se que o presente estudo é de grande utilidade para contribuir
para o esclarecimento da problemática existente, no que diz respeito aos
direitos humanos no sistema penitenciário brasileiro.
1 CAPÍTULO I
1.1 A LIBERDADE ENQUANTO DIREITO HUMANO FUNDAMENTAL
Segundo Ramos (2017, p. 21), direitos humanos podem ser
conceituados como: “[...] um conjunto de direitos considerado indispensável
para uma vida humana pautada na liberdade, igualdade e dignidade. [...] São
os direitos essenciais e indispensáveis à vida digna.” São considerados
inalienáveis a qualquer pessoa, de qualquer povo, em qualquer lugar do
mundo.
Em paralelo, existem os direitos fundamentais. Seu conceito e suas
denominações se dão de maneira tão ampla, que se torna difícil fornecer uma
única definição sintética e precisa. Algumas das expressões utilizadas para
designar tais direitos são: direitos naturais, direitos humanos, direitos do
homem, direitos individuais, direitos públicos, direitos fundamentais do homem,
etc. (SILVA, 2017).
Visto isso, pode-se dizer que o conceito de direito fundamental está
diretamente ligado ao conceito de direitos humanos, tendo como diferença
apenas o plano em que estão consagrados. Os direitos humanos, por se
tratarem de um assunto em nível internacional, estão positivados em tratados
internacionais. Os direitos fundamentais são similares aos preceitos dos
direitos humanos, entretanto, por possuírem caráter nacional, estão expressos
na nossa Constituição Federal.
Em paralelo aos direitos fundamentais, existe também o direito à
liberdade, bem como algumas formas de conceitua-la. Segundo Diniz (2017, p.
388), liberdade no âmbito da filosofia do direito, consiste em “a) poder do
13
homem para agir numa sociedade político-organizada por determinação
própria, dentro dos limites legais e sem ofensa a direitos alheios; b) poder de
praticar qualquer ato não vedado por lei; c) estado ou condição de homem
livre.” Já em termos jurídicos, liberdade consiste na “possibilidade de
coordenação consciente dos meios necessários à realização da felicidade
pessoal. ” (SILVA, 2017, p. 235).
Sob a perspectiva de Passos (2003), a liberdade se encontra entre o
que não pode ser feito, pois é vedado por alguma norma regulamentadora, e o
que deve ser imposto pela mesma, ou seja, o que a norma nos manda fazer. O
que sobra, é o espaço de liberdade.
Enquanto direito fundamental, a liberdade é estabelecida por alguns
aspectos, como por exemplo, o conceito de liberdade de locomoção, que está
garantido pela Constituição Federal de 1988, a qual dispõe no art. 5º, XV que:
“[...] é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo
qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com
seus bens [...]” (BRASIL, 1988). Nesse sentido:
[...] Temos aí a noção essencial de liberdade de locomoção:
poder que todos têm de coordenar e „dirigir suas atividades e
de dispor de seu tempo, como bem lhes parecer, em princípio,
cumprindo-lhes, entretanto, respeitar as medidas impostas pela
lei, no interesse comum, e abster-se de atos lesivos dos
direitos de outrem‟[...]. (SILVA, 2017, p. 240 apud ESPÍNOLA,
1952)
Sob a perspectiva da liberdade de pensamento, Dória (1953, p. 263)
classifica como “[...] o direito de exprimir, por qualquer forma, o que se pense
em ciência, religião, arte, ou o que for”. Para Silva (2017, p. 243), a liberdade
de pensamento pode ser caracterizada como a “[...] exteriorização do
pensamento no seu sentido mais abrangente. [...] a liberdade de pensamento é
plenamente reconhecida, mas não cria problema maior”.
Isto porque a liberdade de pensamento, por mais que seja um aspecto
de liberdade, ainda se encontra somente na forma de consciência. Sua
exteriorização é expressa através da liberdade de opinião. “Trata-se da
liberdade de o indivíduo adotar a atitude intelectual de sua escolha: quer um
pensamento íntimo, quer seja a tomada de posição pública; liberdade de
14
pensar e dizer o que se crê verdadeiro.” (ROBERT, 1977, p. 302 apud SILVA,
2017, p. 243).
A liberdade em si e em suas diversas formas, que são conhecidas
como liberdades públicas, uma vez que são legitimadas e tuteladas pelo Direito
(AMARAL, 2009), é um valor caro ao ser humano. A retirada da liberdade como
forma de pena, é uma das sanções mais gravosas aplicadas pelo Estado.
Depois disso, existem as penas de castigos corporais e a pena de morte,
ambas vedadas constitucionalmente.
1.2 A PENA DE PRIVAÇÃO DE LIBERDADE – ASPECTOS HISTÓRICOS E
JURÍDICOS
A pena é a sanção que restringe a liberdade do indivíduo, podendo ser
também de caráter pecuniário, sendo sempre aplicada pelo Poder Judiciário
competente (DINIZ, 2017). Na história da humanidade como sociedade, a
figura da pena sempre esteve presente. Entretanto, para chegarmos ao tipo de
sistema que temos hoje, percorremos um longo caminho. Dias (2005, p. 01)
reforça tal concepção:
A forma prisão preexiste à sua utilização sistemática nas leis
penais. Ela se constitui fora do aparelho judiciário, quando se
elaboram, por todo o corpo social. O processo para repartir os
indivíduos, fixá-los e distribui-los espacialmente, classificá-los,
tirar deles o máximo de tempo, e o máximo de forças, treinar
seus corpos, codificar seu comportamento contínuo, mantê-los
numa visibilidade sem lacuna, formar em torno deles, um
aparelho completo, de observação, registro e notações,
constituir sobre eles um saber que se acumula e se centraliza.
Na idade antiga, havia o conceito de cárcere. Não existia como uma
forma de pena, mas sim de manter o indivíduo sob o domínio físico das
autoridades. No período medieval, o cárcere ainda existia, entretanto, era
15
apenas uma triagem até chegar a hora dos castigos corporais e em alguns
casos, até mesmo a pena de morte.1
A primeira Constituição brasileira surgiu em 1824, sendo outorgada por
D. Pedro I e dando fim a algumas penas violentas da época, como por
exemplo, as penas envolvendo tortura. Desde o momento de sua
independência, até chegar ao atual modelo de Constituição, o Brasil contou
com outras seis constituições2
, além das diversas modificações legislativas
realizadas ao longo dos anos.
Atualmente, o conceito de pena de privação de liberdade é regido pela
Constituição Federal de 1988, e também pelo Código Penal, Código de
Processo Penal, a Lei de Execução Penal, dentre alguns outros tratados de
direitos humanos dos quais o Brasil é signatário.
A pena deve ser aplicada de modo a preservar a dignidade do preso,
uma vez que é estabelecido na Constituição Federal de 1988, art. 1º, III, que
um dos elementos basilares do Estado Democrático de direito é a dignidade da
pessoa humana.
Torna-se mister salientar que a prisão, enquanto pena, tem como
objetivo a ressocialização do indivíduo. O Código Penal brasileiro e a Lei nº
7.210 – Lei de Execução Penal estabelecem em seus artigos 33, § 2º e artigo
112, respectivamente, que as penas privativas de liberdade serão fixadas em
caráter progressivo. Ou seja, o condenado deve iniciar o cumprimento de sua
sentença em um tipo determinado de regime, sendo posteriormente analisados
fatores específicos a cada encarcerado, que serão determinantes para que seja
concedida a progressão de sua pena, sempre indo do mais rigoroso ao mais
ameno e nunca pulando regimes.
Entre esses requisitos específicos a progressão do regime, está o fator
do bom comportamento do preso. Entretanto, o legislador deixou essa questão
em aberto, pois não estabeleceu na norma o que poderia ser considerado
1
ESCOLA DE FORMAÇÃO E APERFEIÇOAMENTO PENITENCIÁRIO [ESPEN] (Paraná). A
história das prisões e dos sistemas de punições. Disponível em:
http://www.espen.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=102. Acesso em: 30 de mar.
2019.
2
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. As Constituições do Brasil. Brasília, 2008. Disponível em
http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=97174. Acesso em 22 de abr. 2019.
16
como um bom ou mau comportamento. Visto isso, a definição acerca do termo
pode ser compreendida nos termos seguintes: “Bom comportamento carcerário
é comportamento daquele que se põe de forma ajustada aos regramentos de
disciplina do estabelecimento prisional”. (MARCÃO, 2009, p. 17).
Outrossim, para além do quesito de bom comportamento carcerário, a
Lei nº 7.210 – Lei de Execução Penal fixou em seu art. 8° o seguinte:
Art. 8º. O condenado ao cumprimento de pena privativa de
liberdade, em regime fechado, será submetido a exame
criminológico para a obtenção dos elementos necessários a
uma adequada classificação e com vistas à individualização da
execução. (BRASIL, 1984, on-line)
O exame criminológico consiste em uma análise de informações
jurídicas do apenado, além de questões psicológicas e psiquiátricas. Contudo,
a Lei nº 10.792 de 2003 alterou de maneira significativa o artigo citado da Lei
de Execução Penal, pois retirou a obrigatoriedade do exame criminológico, que
foi substituído pela avaliação de bom comportamento carcerário. Atualmente,
fica a critério da autoridade judiciária competente solicitar ou não o exame.
Torna-se indispensável falar sobre a diferença entre o que a pena
privativa de liberdade deveria ser, de acordo com toda teoria, doutrinas e leis, e
o que ela realmente é para o cidadão encarcerado. Para Lourenço Filho (2018),
a pena de reclusão não possui caráter ressocializador, e sim vingativo. “Para
alguns, a vingança pela morte é a anulação da outra vida” (LOURENÇO
FILHO, 2018, p.28).
A ressocialização é uma realidade distante para a maioria dos
encarcerados. Na prática, faltam palavras para descrever a real situação do
ambiente carcerário. O poder punitivo do Estado funciona na hora da sentença,
entretanto, no que diz respeito a cumprir seu objetivo ressocializador, muito se
falta. É o que nos mostra Lourenço Filho (2018, p. 61-62):
A tal Justiça se preocupou em me manter preso, e só. [...] E de
que maneira podem ser Justos? Afinal, com a sentença não
houve Justiça, com a prisão muito menos. O que rolou ali, e
rola, é vingança! Está na hora de pensar em Justiça
Restaurativa, está na hora de pensar numa Justiça que não
anule o outro nem ninguém.
17
1.3 OS DIREITOS FUNDAMENTAIS DO ENCARCERADO
A Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988) consagrou os direitos
fundamentais do indivíduo de uma forma que nenhuma outra Constituição
havia feito anteriormente; incluindo os direitos sociais ao rol de direitos
garantidos em norma, em conjunto com direitos e deveres políticos e civis.
O artigo 5° da Constituição Federal, em alguns de seus diversos
incisos, garante aos encarcerados o respeito às suas integridades físicas e
morais (art. 5°, XLIX, CF), além de vedar penas de morte, cruéis, de trabalho
forçado (art. 5°, XLVII, CF), etc. Ademais, também assegura em seu inciso III
que “ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou
degradante” (BRASIL, 1988, on-line).
Existem ainda, os direitos garantidos pela Lei nº 7.210/1984, também
conhecida como Lei de Execução Penal. É necessária a compreensão de que
a pena privativa de liberdade enquanto sanção retira além da liberdade, alguns
direitos do indivíduo encarcerado, entretanto, assegura a garantia de outros
direitos, como os que foram citados anteriormente. Dito isso, torna-se mister
salientar no presente trabalho, os direitos perdidos no momento da
condenação, bem como os novos direitos como preso, e os direitos que foram
mantidos.
1.4 OS DIREITOS PERDIDOS OU SUSPENSOS PELA CONDENAÇÃO
Já sabemos que a liberdade é o principal direito perdido no ato da
condenação do indivíduo à pena privativa de liberdade. Entretanto, não é o
único. A Constituição, apesar de garantir direitos ao cidadão encarcerado,
direitos que serão discutidos posteriormente, também prevê a suspensão de
alguns direitos, entre eles, os direitos políticos.
Para Silva (2017), os direitos políticos representam a disciplina dos
meios necessários ao exercício da soberania popular. A base desses direitos
se dá pelo direito eleitoral de votar, bem como o de ser votado.
18
De acordo com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que em
seu artigo XXI prevê que “todo ser humano tem o direito de fazer parte no
governo de seu país diretamente ou por intermédio de representantes
livremente escolhidos” (ONU, 2009), pode-se dizer que ter o direito eleitoral de
votar e ser votado, garante ao cidadão pleno gozo de seus direitos políticos.
Sendo assim, entende-se que a regra geral no sistema constitucional
brasileiro garante proteção aos direitos políticos dos indivíduos. Todavia, para
toda regra há uma exceção. Nesse caso, a exceção é expressa no artigo 15 da
Constituição Federal de 1988, que prevê em seu inciso III que o indivíduo terá
seus direitos políticos suspensos no ato de sua condenação criminal, que tenha
transitado em julgado.
1.5 OS DIREITOS MANTIDOS MESMO APÓS A CONDENAÇÃO
Cumpre salientar que mesmo sob pena restritiva de liberdade, o
indivíduo ainda conserva os direitos que não foram afetados no ato de sua
condenação, sendo as autoridades obrigadas a respeitá-los e garantir o
cumprimento deles em sua totalidade, conforme expresso nos seguintes
artigos: art. 3°, art. 40 e art. 41 da Lei de Execução Penal – Lei 7.210/84.
Além disso, ao sistema prisional também são atribuídas algumas
condições para que o preso cumpra a sua pena de forma humanamente digna.
É o que prevê a Lei de Execução Penal – Lei 7.210/84. Como por exemplo, o
disposto no art. 88, que estabelece que na penitenciária o preso será alojado
em uma cela individual, contendo local para dormir, sanitário e lavatório.
Estabelece também como requisitos básicos a uma unidade prisional: a)
salubridade do ambiente, de forma adequada à existência humana; e b) uma
área mínima de seis metros quadrados.
Ainda se tratando das condições básicas para o preso cumprir a pena
na penitenciária, o art. 89 da mesma Lei mencionada anteriormente, estipula o
seguinte, in verbis:
Art. 89 – Além dos requisitos referidos no art. 88, a
penitenciária de mulheres será dotada de seção para gestante
19
e parturiente e de creche para abrigar crianças maiores de 6
(seis) meses e menores de 7 (sete) anos, com a finalidade de
assistir a criança desamparada cuja responsável estiver presa.
(Redação dada pela Lei nº 11.942, de 2009)
Parágrafo único. São requisitos básicos da seção e da creche
referidas neste artigo: (Incluído pela Lei nº 11.942, de 2009)
I – atendimento por pessoal qualificado, de acordo com as
diretrizes adotadas pela legislação educacional e em unidades
autônomas; e
II – horário de funcionamento que garanta a melhor assistência
à criança e à sua responsável. (BRASIL, 1984, on-line)
A importância dos direitos mantidos pelo preso se dá devido ao
respeito ao princípio da dignidade da pessoa humana, um dos princípios
basilares de toda a Constituição. De acordo com Barroso (2010, p.37):
A dignidade da pessoa humana é um valor moral que,
absorvido pela política, tornou-se um valor fundamental dos
Estados democráticos em geral. Na sequência histórica, tal
valor foi progressivamente absorvido pelo Direito, até passar a
ser reconhecido como um princípio jurídico.
Entende-se que tal princípio tem como função principal garantir que os
direitos de todo cidadão sejam devidamente respeitados pelo Estado, garantir
que todos tenham o direito de ter uma vida digna. Por se tratar de um princípio
basilar, fundamental ao Estado, o mesmo tem a obrigação de cumpri-lo.
Em sentido contrário ao pensamento de grande parte da população, os
cidadãos encarcerados também se encontram abrangidos por este princípio.
Como mencionado anteriormente, o preso mantém os direitos que não lhes
foram retirados no ato de sua condenação. Visto isso, o direito a um tratamento
digno, sem sofrer qualquer tipo de violência, deve, obrigatoriamente, ser
garantido pelo Estado.
A própria Lei de Execução Penal assegura alguns direitos ao cidadão
encarcerado, considerados como direitos básicos. Foram estabelecidos a fim
de que se fizesse respeitar o princípio da dignidade da pessoa humana. São
eles3
:
a) Direito à alimentação e vestimenta fornecidos pelo Estado.
b) Direito a uma ala arejada e higiênica;
3
PEREIRA, Ângela Miranda. Os direitos do preso à luz do princípio da dignidade da pessoa humana.
Âmbito Jurídico, Rio Grande, XVI, n. 116, set 2013. Disponível em: http://www.ambito-
juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=13682. Acesso em 25 de abr. 2019.
20
c) Direito à visita da família e amigos;
d) Direito de escrever e receber cartas;
e) Direito a ser chamado pelo nome, sem nenhuma
discriminação;
f) Direito ao trabalho remunerado em, no mínimo, 3/4 do salário
mínimo;
g) Direito à assistência médica;
h) Direito à assistência educacional: estudos de 1º grau e
cursos técnicos;
i) Direito à assistência social: para propor atividades recreativas
e de integração no presídio, fazendo ligação com a família e
amigos do preso;
j) Direito à assistência religiosa: todo preso, se quiser, pode
seguir a religião que preferir, e o presídio deve propiciar locais
adequados aos cultos;
k) Direito à assistência judiciária e contato com advogado: todo
preso pode conversar em particular com seu advogado e se
não puder contratar um o Estado tem o dever de lhe fornecer
gratuitamente.
Em contrapartida aos direitos que supostamente deveriam ser
preservados no ato da condenação, é de conhecimento geral que inúmeros
deles não são respeitados na prática. Teoricamente, a pena privativa de
liberdade tem como função principal a ressocialização do indivíduo, de maneira
a prevenir futuras criminalidades. Atualmente, o desrespeito às normas
previstas pela legislação mostra-se indo no sentido contrário ao objetivo
principal. (PEREIRA, 2019). É o que será abordado a seguir.
2 CAPÍTULO II
2.1 O SISTEMA CARCERÁRIO BRASILEIRO E SUA FUNÇÃO SOCIAL
Em 11 de julho de 1984, a Lei de Execução Penal foi criada, com o
objetivo de estruturar os estabelecimentos prisionais e tudo o que lhes diz
respeito. O Código Penal, elaborado em 7 de dezembro de 1940, definiu quais
atos praticados pelo cidadão podem ser configurados como crime ou infração
penal, e quais seriam as sanções a serem aplicadas em cada caso. Logo, a
penitenciária surge como o local onde o indivíduo sentenciado a pena privativa
de liberdade deve ficar encarcerado, sob custódia do Estado. (ESTEFAM,
2012).
Como mencionado anteriormente, a função social da prisão, em teoria,
deveria ser de ressocializar, deixar o preso apto a viver em sociedade
novamente, de forma a reconhecer seus erros, pagar pelos mesmos e seguir
em frente sem novas infrações. Entretanto, a realidade do sistema carcerário
brasileiro é outra. De acordo com o Levantamento Nacional de Informações
Penitenciárias (INFOPEN) de 2016, o Brasil ocupa o terceiro lugar no ranking
dos países com as maiores populações carcerárias do mundo. (O GLOBO,
2017).
Não há como cumprir seu papel ressocializador quando se tem um
ambiente defasado; o número de celas e presídios não corresponde ao número
de presos, que cresce a cada dia mais. Os direitos garantidos
constitucionalmente ao encarcerado e as condições estabelecidas pela Lei de
Execução Penal para que o egresso cumpra sua pena com dignidade,
nitidamente não são respeitadas.
22
Segundo dados do Conselho Nacional do Ministério Público4
, o que se
tem atualmente são presídios cuja taxa de ocupação corresponde a 175%, o
que claramente configura em superlotação. Na região Norte do país, os
estabelecimentos prisionais recebem o equivalente a quase três vezes mais do
que poderiam de fato comportar.
Diversos juristas e pesquisadores já defendem a ideia de cultura do
encarceramento no Brasil. O encarceramento em massa é o que gera a
superlotação dos presídios. Atualmente, a impressão é que o país apostou no
encarceramento como “solução” para os problemas de violência. Segundo
Claudio Amaral (2017), a cultura do encarceramento poderia ser resolvida com
investimentos na educação5
.
Entretanto, a cultura do encarceramento ao invés de ser resolvida e
mudada na concepção das autoridades, é perpetuada devido ao modo como a
sociedade enxerga sua população carcerária. A violência diária e a sensação
de que nada está sendo feito a respeito disso, gerou no cidadão um sentimento
de repulsa e ódio. Pouco se fala sobre ressocializar, pois muitos ainda
acreditam que “bandido bom, é bandido morto”.
É o que mostra o 10º Anuário Brasileiro de Segurança Pública,
realizado em 2016 pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). A
pesquisa feita pelo Datafolha concluiu que 57% da população brasileira
acredita na polêmica frase6
.
O gráfico abaixo, retirado do relatório do INFOPEN (2016), demonstra
o constante crescimento no número de presos no Brasil ao longo dos anos,
reforçando a ideia da existência da cultura do encarceramento no país.
4
BRASIL, Conselho Nacional do Ministério Público. Taxa de ocupação dos presídios brasileiros é de
175%, mostra relatório dinâmico "Sistema Prisional em números”. Brasília, 2018. Disponível em:
http://www.cnmp.mp.br/portal/todas-as-noticias/11314-taxa-de-ocupacao-dos-presidios-brasileiros-e-de-
175-mostra-relatorio-dinamico-sistema-prisional-em-numeros. Acesso em: 28 de abr. 2019.
5
CRUZ, Elaine Patrícia. Existe cultura jurídica de encarceramento no Brasil. Agência Brasil. São Paulo,
2017. Disponível em: http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2017-02/existe-cultura-juridica-de-
encarceramento-no-brasil-diz-juiz-paulista. Acesso em 28 de abr. 2019.
6
FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA (FBSP). Anuário Brasileiro de Segurança
Pública. São Paulo, 2016. Disponível em:
http://www.forumseguranca.org.br/storage/10_anuario_site_18-11-2016-retificado.pdf. Acesso em: 29 de
abr. 2019.
23
Gráfico 1: Evolução das pessoas privadas de liberdade entre 1990 e 2016.
Fonte: Ministério da Justiça. A partir de 2005, dados do INFOPEN. Disponível em: <
http://depen.gov.br/DEPEN/noticias-1/noticias/infopen-levantamento-nacional-de-informacoes-penitenciarias-
2016/relatorio_2016_22111.pdf>. Acesso em: 28 de abr. 2019.
Como se pode observar no gráfico, em 2016 o número de pessoas
privadas de liberdade ultrapassou a marca dos 700 mil. Ou seja, desde a
década de 90, a população prisional brasileira teve um aumento de 707%. Os
dados são alarmantes por se tratar de uma diferença de menos de 30 anos
desde a data do primeiro levantamento feito pelo INFOPEN.
Portanto, é notório que a perpetuação da cultura do encarceramento no
Brasil influencia no crescente número de presos no país. Discute-se: “bandido
bom, é bandido morto”, ou bandido bom, é bandido ressocializado e reinserido
na sociedade?
Nesse sentido, analisa Ciconello (2014, on-line):
A punição ainda é vista pela sociedade brasileira como uma
espécie de vingança. A indiferença, a omissão ou mesmo o
consentimento da sociedade e dos agentes públicos com a
barbárie existente no sistema penitenciário é a principal
barreira para a sua transformação.
Assim, superlotação, torturas, precárias condições de higiene,
revistas vexatórias em familiares, incluindo crianças, e toda a
sorte de punições para quem cometeu delitos são, infelizmente,
legitimados, ainda que de forma velada, por uma parte da
sociedade.
24
2.2 LIMITAÇÃO DAS PENAS
Apesar de ser uma sanção, a pena privativa de liberdade possui
diversas limitações à sua ação, a fim de impedir qualquer tipo de
arbitrariedade, abuso de poder ou violação de direitos. Tais limites visam
garantir a integridade do preso, respeitando o princípio da dignidade da pessoa
humana.
O art. 5° da Constituição Federal estabelece em seu inciso III que
“ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante”
(BRASIL, 1988, on-line). No Brasil, a lei 9.455 de 1997 definiu tortura como
crime, sendo sua punição a pena privativa de liberdade, podendo o indivíduo
ser condenado de dois a oito anos de prisão.
Ainda no art. 5º, mas em seu inciso XLVII, há também a vedação aos
seguintes tipos de pena: “a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos
termos do art. 84, XIX; b) de caráter perpétuo; c) de trabalhos forçados; d) de
banimento; e) cruéis”.
Além disso, o art. 75 do Código Penal prevê que o tempo de
cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a trinta
anos. Em casos onde a sentença do condenado estabeleça tempo superior ao
citado, o inciso 1° diz que as penas devem ser unificadas para atender ao limite
máximo de trinta anos. Em seu inciso 2°, o artigo veda também a possibilidade
de condenar o indivíduo por um fato que ocorreu posteriormente ao início do
cumprimento da pena, devendo ser feita uma nova unificação, desprezando o
período de pena já cumprido pelo preso.
2.3 OS REGIMES PENITENCIÁRIOS E OS TIPOS DE
ESTABELECIMENTOS PRISIONAIS
O Código Penal, em seu art. 33, prevê os tipos de regime em que a
pena de reclusão será cumprida. São eles o regime fechado, o regime
semiaberto e o regime aberto. No regime fechado, a pena deve ser cumprida
25
em um estabelecimento prisional de segurança máxima ou média. No início do
cumprimento da pena, o indivíduo será submetido ao exame criminológico,
além de precisar trabalhar durante a manhã, voltando ao isolamento no período
da noite, sendo admitidos alguns tipos de trabalhos externos. (JESUS, 2010).
No regime semiaberto, a pena será cumprida em colônia agrícola,
industrial ou em um estabelecimento similar. No início, bem como no regime
explicado anteriormente, o condenado também poderá ser submetido ao
exame criminológico, sendo de simples faculdade do juiz a necessidade ou não
do exame. Fica sujeito a trabalho no mesmo estabelecimento onde a pena é
cumprida, também sendo admitidos trabalhos externos e periodicidade em
cursos supletivos profissionalizantes, de instrução de segundo grau ou curso
superior. (JESUS, 2010).
O regime aberto por sua vez tem o indivíduo cumprindo sua pena em
casa do albergado ou estabelecimento adequado. Como será esclarecido nos
parágrafos a seguir, na casa do albergado o que prevalece é a autodisciplina
do preso, bem como seu senso de responsabilidade. Caso o preso cometa algo
que possa ser definido como crime doloso nesse tipo de regime, ele será
transferido para outro tipo de regime, mais rigoroso. (JESUS, 2010).
Em paralelo aos regimes, a Lei de Execução Penal estabeleceu em
seus artigos os tipos de estabelecimentos prisionais. O primeiro
estabelecimento, consagrado do art. 87 ao art. 90, é a penitenciária. Na teoria,
a penitenciária destina-se ao indivíduo condenado a pena de reclusão em
regime fechado. Consiste em uma cela individual com dormitório, sanitário e
lavabo, em uma área mínima de seis metros quadrados.
Na prática, as celas são superlotadas. Segundo o INFOPEN (2016), o
déficit de vagas nos presídios chega a quase 360 mil. Em 2018, como já
mencionado, o estudo feito pelo Conselho Nacional do Ministério Público
concluiu que as penitenciárias brasileiras se encontram 175% superlotadas, ou
seja, as celas estão com sua ocupação muito além do que suportam, e o que é
estabelecido pela Lei de Execução Penal não está sendo respeitado.
O segundo tipo de estabelecimento, previsto nos artigos 91 e 92, é a
colônia agrícola, industrial ou similar. É destinado ao indivíduo que cumprirá a
26
pena em regime semiaberto. O condenado é alojado em um compartimento
coletivo, sempre observando em teoria os requisitos básicos a uma unidade
celular.
Os artigos 93, 94 e 95 tratam do terceiro tipo de estabelecimento
prisional, a casa do albergado. É destinada ao cumprimento de pena privativa
de liberdade em regime aberto, e da pena de limitação de fim de semana. A
casa do albergado precisa ser situada em um centro urbano, separado dos
demais estabelecimentos prisionais, além de ser caracterizado pela ausência
de obstáculos físicos contra a fuga. Aqui, o que predomina é a autodisciplina do
preso. O mesmo passa a parte do dia “livre”, seja para estudar ou trabalhar,
devendo retornar à noite e aos finais de semana.
O quarto estabelecimento é o centro de observação, que está
disciplinado nos artigos 96, 97 e 98, o centro de observação consiste no local
onde os exames gerais e criminológicos são realizados. Pode ser construído
em um local a parte, ou dentro do próprio estabelecimento prisional.
O hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, presente nos artigos
99, 100 e 101, é destinado as pessoas que cometeram algum crime, mas que
são inimputáveis ou semi-imputáveis. Geralmente são pessoas com algum tipo
de doença mental. O último tipo de estabelecimento prisional estabelecido pela
Lei de Execução Penal é a cadeia pública (artigos 102, 103 e 104), que é
destinada aos presos provisórios, devendo ser instalada em centros urbanos.
Em paralelo, importante falar sobre a situação dos presos com algum
tipo de deficiência, seja física ou mental. Tais indivíduos devem ser tratados de
formas diferentes, de maneira a respeitar as condições e limitações de cada
um. É um direito constitucional a ser respeitado.
O decreto nº 3.298, de 20 de dezembro de 1999 dispõe em seus
artigos 3° e 4° respectivamente, as diferenças entre deficiência, deficiência
permanente e incapacidade, além de definir quais pessoas podem ser
consideradas como portadoras de deficiência, seguindo as categorias
estabelecidas pela norma.
O relatório divulgado pelo INFOPEN em 2016 revelou que existem
4.350 pessoas privadas de liberdade que possuem algum tipo de deficiência,
27
sendo 4.130 homens e 220 mulheres. Entre os egressos com deficiência física,
64% estão alocados em unidades prisionais que não foram adaptadas às suas
condições de acessibilidade. É o que expõe o gráfico abaixo.
Gráfico 2: Pessoas com deficiência física por situação de acessibilidade da
unidade prisional em que se encontram
Fonte: Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias – INFOPEN, Junho/2016. Disponível em: <
http://depen.gov.br/DEPEN/noticias-1/noticias/infopen-levantamento-nacional-de-informacoes-penitenciarias-
2016/relatorio_2016_22111.pdf>. Acesso em: 28 de abr. 2019.
É possível entender a partir dessa análise que no que tange aos
estabelecimentos prisionais, o que está previsto na constituição não é seguido
como deveria ser. Do número total de presos com deficiência, apenas 11% se
encontram em unidades adaptadas as suas limitações.
A falta de ambientes adaptados torna-se por diversas vezes um fator
determinante a evolução ou não do indivíduo, sob uma perspectiva
ressocializadora, pois o que determina sua capacidade de se integrar ao
ambiente, aos outros indivíduos privados de liberdade, e principalmente, a
capacidade se locomover com segurança pela unidade, de forma a cumprir sua
pena de forma humanamente digna, é a acessibilidade.
Para além da questão crucial da acessibilidade, existe também outra
dura realidade para as pessoas com deficiência: a falta de preparo dos
agentes, dos outros encarcerados e a violência com que são tratados os
deficientes mentais toda vez que cometem algum tipo de infração. Lourenço
28
Filho (2018, p. 71), narra um episódio específico que aconteceu em uma
penitenciária no Rio de Janeiro, quando um preso com algum tipo de transtorno
mental se envolveu em problemas com outros presos e os agentes:
O guarda decidiu tirar Luiz, mas o pior estava por vir. Luiz, ao
sair, resolveu cuspir no guarda, estava evidente sua
insanidade. Ao cuspir estava, ali, sendo disparado o “primeiro
tiro” contra o guarda. [...]. Em frações de segundos, chegou
aquela turma de funcionários, uns 5, já chegaram batendo e
batendo muito! [...] Não demorou muito e ouvimos o estrondo.
Era Luiz na cela do castigo e sozinho. E para sua companhia
os guardas lançaram na cela uma bomba de pimenta.
É nítido que devido a vulnerabilidade psiquiátrica de Luiz, o mesmo
deveria ser condenado a cumprir sua pena em outro tipo de estabelecimento,
um hospital psiquiátrico. Mais uma vez, é notório que os estabelecimentos
prisionais brasileiros não respeitam o disposto em lei e tampouco se
preocupam em garantir a dignidade do preso. Surge o questionamento: como
cumprir o propósito ressocializador se nem o mínimo para a sobrevivência dos
indivíduos encarcerados é garantido?
2.4 O QUADRO ATUAL DO SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO
De acordo com dados do INFOPEN de 2016, existem mais de 700 mil
pessoas presas no Brasil. O cálculo foi feito levando em consideração a soma
das pessoas privadas de liberdade no sistema prisional estadual e nas
carceragens das delegacias. O estado com a maior quantidade de pessoas
encarceradas é São Paulo, que conta com pouco mais de 240 mil presos.
Ainda de acordo com o relatório mais recente, entre os anos de 2000 a
2016, houve um aumento de 157% na taxa de aprisionamento no país. Em
2000 existiam 137 pessoas presas para cada grupo de 100 mil habitantes. No
ano de 2016, esse número aumentou, e passou a ser de 352,6 pessoas presas
para cada 100 mil habitantes (INFOPEN, 2016).
Do número total de pessoas encarceradas no país, o número de
pessoas sentenciadas a cumprir a pena em regime aberto corresponde a 6%,
29
regime semiaberto 15%, regime fechado 38%, e o maior percentual equivale
aos indivíduos que estão presos, mas ainda sem sequer julgamento e
condenação em definitivo que estabeleça o tipo de regime, equivalendo a 40%
do número total. As pessoas sentenciadas a medida de segurança tanto
internadas, quanto em tratamento ambulatorial, não chegam a 1%.
Os dados explicitados anteriormente são no mínimo alarmantes. A
superlotação dos presídios é um problema real e crescente, as taxas de
ocupação só aumentam a cada dia. Em sua obra, Lourenço Filho (2018) relata
com detalhes o que passou enquanto cumpria sua pena privativa de liberdade
em uma penitenciária no Rio de Janeiro. As celas com ocupação além da sua
capacidade máxima, o calor insuportável, as feridas na pele, as doenças e a
violência são questões que essas pessoas lidam diariamente.
Em 2009, foi realizada pela Câmara dos Deputados a Comissão
Parlamentar de Inquérito – CPI do Sistema Carcerário Brasileiro. Foram oito
meses de atividade e dezoito estados diligenciados. No Rio de Janeiro, a
diligência ocorreu em maio de 2008 e foi concluído que havia um déficit de 5
mil vagas nos presídios cariocas naquele ano (BRASIL, 2009).
O gráfico abaixo, disponibilizado pelo INFOPEN, mostra o crescimento
no déficit de vagas nos presídios brasileiros ao longo dos anos, em paralelo
com a evolução da população prisional.
Gráfico 3: Evolução da população prisional, vagas e déficit de vagas entre 2000 e
2016.
Fonte: Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias – INFOPEN (2016) Disponível em: <
http://depen.gov.br/DEPEN/noticias-1/noticias/infopen-levantamento-nacional-de-informacoes-penitenciarias-
2016/relatorio_2016_22111.pdf>. Acesso em: 28 de abr. 2019.
30
Ainda de acordo com o relatório do INFOPEN, jovens com idade entre
18 e 29 anos são mais da metade da população carcerária brasileira,
representando um total de 55%. Além disso, foi constatado que 64% dos
presos são negros. Quanto ao grau de escolaridade, 51% não concluíram o
ensino fundamental. Os indivíduos com ensino superior completo não chegam
nem a 1%. O crime de tráfico de drogas, previsto na Lei nº 11.343, de 23 de
agosto de 2006, corresponde a 26% das condenações masculinas e a 62% das
condenações femininas.
Em conformidade com os dados, fica fácil perceber que a maiorias das
pessoas presas são jovens, negras e com escolaridade baixa. Para
compreender melhor o motivo de apenas um grupo tão específico estar
liderando as ocupações prisionais, precisamos voltar um pouco no tempo para
entender a história do negro no Brasil. É o que explica FERNANDES (2008, p.
29 apud LEMOS, 2018, p. 38):
A inserção do negro se deu de forma abrupta. Ele foi
transformado “em senhor de si mesmo, tornando-se
responsável por sua pessoa e por seus dependentes, embora
não dispusesse de meios materiais e morais para realizar essa
proeza no quadro de uma economia competitiva”. Assim, a
abolição teve “um caráter de espoliação extrema e cruel”. Aos
senhores, o direito a indenizações pela perda de propriedade,
aos negros, o caminho da rua, do desespero e das ocupações
laborais mais degradantes.
É historicamente comprovado que o negro por muitos anos ficou à
margem da sociedade, sua imagem sendo até hoje relacionada a “cara de
bandido”, e sendo a população negra a que mais é assassinada atualmente no
Brasil. É o que revela o Atlas da Violência 2018, estudo elaborado pelo Instituto
de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança
Pública. A taxa de homicídios pessoas negras no país foi de 40,2, enquanto a
de não negros ficou em 16,0%7
.
A falta de políticas sociais efetivas cede espaço para o fortalecimento
de políticas penais, e o fortalecimento de políticas penais resulta no nosso atual
7
BRASIL, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA. Atlas da Violência 2018. Brasilia, 2018.
Disponível em:
http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=33410&Itemid=432.
Acesso em 7 de mai. 2019.
31
cenário penitenciário: caótico e desumano. Estudos feitos pelo Tribunal de
Contas do Estado do Rio Grande do Sul em conjunto com Daniel Cerqueira,
pesquisador no Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas – IPEA
confirmam a importância do investimento em políticas sociais, principalmente
no que tange a educação. O resultado aponta que quanto maior a taxa de
escolarização, menores são os registros de violência. (GALLISA, 2010).
3 CAPÍTULO III
3.1 OS DIREITOS HUMANOS VIOLADOS JUNTAMENTE COM A PENA
PRIVATIVA DE LIBERDADE
O Brasil conta com uma ampla legislação no que diz respeito ao direito
do encarcerado e a estrutura dos estabelecimentos prisionais, mas como visto
anteriormente, as normas dificilmente são respeitadas e os presos em sua
maioria recebem um tratamento abominável.
Os direitos violados estão muito bem explicitados na CPI do Sistema
Carcerário Brasileiro (BRASIL, 2009). Nesse capítulo, os principais direitos
violados serão abordados. Entre eles, o direito a acomodações higiênicas. O
art. 13 da Lei de Execução Penal prevê que o estabelecimento prisional deve
dispor de instalações e serviços que atendam as necessidades do preso,
entretanto, de acordo com as diligências feitas pela CPI, foi constatado que a
maioria das penitenciárias não possuía instalações apropriadas à alocação
individual do preso, e que quando eram alojados de forma coletiva, não eram
fornecidas as mínimas condições de acomodação digna. Por fim, foi constatado
que os presídios brasileiros estão longe de cumprir o que estabelece a
legislação, como por exemplo o art. 88 da Lei de Execução Penal, já
mencionado anteriormente, que estabelece as condições de acomodação nas
penitenciárias, bem como o espaço (seis metros quadrados, no mínimo).
Outra garantia não respeitada, é o direito à higiene. As Regras Mínimas
das Nações Unidas para o Tratamento de Reclusos, também conhecidas como
“Regras de Nelson Mandela” (UNODC, 2015), estabelecem que as instalações
33
sanitárias devem ser adequadas para que os reclusos possam realizar suas
necessidades quando for necessário, de maneira limpa e decente, estabelece
que as instalações próprias para o banho devem ser suficientes, de maneira a
permitir que os presos tomem banho em uma temperatura adequada ao clima
também determina que cabe ao Estado prover meios necessários ao cuidado
da higiene nos reclusos, para que possam se apresentar corretamente e
preservar o respeito por si próprios. Porém, o que a CPI encontrou nos
estabelecimentos que fiscalizou, foram locais onde os presos por muitas vezes
não tinham nem acesso à água corrente, tratada. Foi relatado que em diversos
estabelecimentos, os presos improvisavam um cano sujo para poder beber
água, e que em outros presídios, com celas superlotadas, os presos passavam
dias sem tomar banho, devido a falta de água.
Há ainda casos onde as celas são desprovidas de banheiro e pias, e
quando os agentes da CPI encontravam tais instalações, eram tão precárias
que comprometiam a privacidade do preso. Em outros casos, as instalações
destinadas à higiene são localizadas em outras áreas, áreas essas que o preso
não tem acesso, logo, não podem utiliza-las com frequência. O que deveria ser
fornecido pelo Estado, como os itens necessários à higiene pessoal, também
não é cumprido. Produtos como escovas de dente e sabonete ficam em falta,
tendo o preso que compra-los no próprio estabelecimento penal, ou no
mercado paralelo existente e explorado de forma clandestina.
Grande parte dos presídios foi caracterizada como insalubre, com
esgoto correndo pelos pátios, restos de comida e lixo por toda parte, o que
causa a proliferação de insetos e ratos. Devido a esses fatores, o ambiente
exala um odor que foi classificado como “insuportável”.
Na cidade de Formosa, em Goiás, em uma cela da Cadeia Pública há
70 homens e apenas um banheiro, o que fez os presos chegarem a uma
situação degradante: usar garrafas de plástico (PET) de dois litros para urinar
quando o banheiro está ocupado.
Em Minas Gerais, a CPI encontrou o denominado “banheiro vitrine”,
que ganhou esse nome, pois os presos são obrigados a fazerem suas
necessidades na frente de todos os outros companheiros de cela e também à
34
vista de quem estiver passando pelo corredor no momento. O motivo da falta
de sanitários decentes na Cadeira Pública é a superlotação. A cela, de
medidas 5x5, o que já está descumprindo o estabelecido na Lei de Execução
Penal, precisou ser “reformada” a fim de abrigar mais presos. As paredes do
banheiro foram derrubadas, deixando o vaso sanitário exposto no meio da cela.
No momento da CPI, foram identificados pouco menos de 70 homens dentro da
mesma cela. Além disso, como muitas vezes falta água os presos não têm
como lavar as mãos, o que resulta em mau cheiro na cela, além de moscas,
baratas e outros insetos.
A alimentação também se tornou um problema. Mesmo sendo uma
prerrogativa prevista nas Regras Mínimas da ONU como função do Estado, e
na Lei de Execução Penal como parte da assistência material ao preso, a
realidade encontrada pela CPI foi outra. No Ceará, a comida é fornecida em
sacos plásticos. Os talheres não são fornecidos, então os detentos comem com
as próprias mãos, as mesmas mãos que por diversas vezes não conseguem
ser lavadas depois de ir ao banheiro.
A falta de qualidade da comida fornecida foi quase unanimidade de
reclamações nos estabelecimentos prisionais. Os presos relatam já ter
encontrado fios de cabelo, baratas e objetos estranhos dentro das comidas,
além de denunciarem comida azeda e estragada. Do lado de fora das celas,
foram encontradas quentinhas amontoadas, que seriam jogadas no lixo, pois
foram recusadas pelos presos, devido à péssima qualidade do alimento.
Lourenço Filho (2018, p. 49) faz um relato similar:
As refeições na prisão são de uma qualidade questionável, e
por ser comida para preso, poucos questionam [...] As moscas
passam a passar de bondão, o cheiro é nojento, e aquela
tonelada de comida é descartada.
Para os relatores da CPI, os detentos também denunciaram o uso de
uma substância chamada “salitre” nas comidas. Tal fato posteriormente foi
confirmado pelo diretor da Penitenciária de Urso Branco, em Rondônia. A
substância estaria sendo usada com o objetivo de inibir o apetite e diminuir os
desejos sexuais dos presos.
35
Prevista na Lei de Execução Penal e nas Regras Mínimas da ONU, a
assistência médica também é um direito violado dos reclusos. Os
estabelecimentos prisionais em tese deveriam disponibilizar serviços médicos,
incluindo serviço psiquiátrico. O Estado também deveria ser o responsável pela
observância dessa assistência. A CPI constatou que da quantidade total de
presos existentes no país, apenas 20% tinham acesso às equipes de saúde.
A assistência psicológica não tem previsão legal, o que torna mais
difícil sua garantia. De acordo com a CPI, o ambiente carcerário além de ser
propagador de doenças, também transmite entre seus detentos a psicose
carcerária, que surge devido ao ambiente hostil, opressor e insalubre onde
esses indivíduos cumprem a pena. A CPI entende que é essencial submeter os
presos a exames médicos, onde possam ser avaliados por profissionais
especializados, individualmente e regularmente, para que um
acompanhamento desde o início seja possível. Além disso, foi constatado que
cerca de 20% da população carcerária possui o vírus HIV, sendo primordial o
incentivo a testes voluntários para detectar o vírus e controla-lo o quanto antes.
No que tange à assistência jurídica, a CPI verificou que há uma
deficiência desde o momento da prisão. Como consta no relatório do
INFOPEN, a maioria dos presos são jovens, negros, de baixa renda e baixa
escolaridade. “No ato da prisão, o aparelho policial age sempre com
prepotência, abuso de poder, sonegação de direitos e, não raro, com violência.”
(BRASIL, 2009, p.214). Foram denunciados à CPI inúmeros casos de
flagrantes forjados e de maus tratos praticados pelos policiais.
A deficiência jurídica piora, pois a maioria esmagadora dos reclusos
não tem condições de pagar um advogado particular, e mesmo sendo
determinado por lei que seja concedida assistência jurídica aos presos de baixa
renda, não há defensores públicos o suficiente para atender toda a demanda.
Nesses casos, o juiz do processo nomeia um defensor dativo. De acordo com a
definição usada no relatório da CPI:
O defensor dativo é um advogado que o Juiz dá, como se fosse
uma esmola, ao réu pobre e sem advogado. Quase sempre o
Juiz implora a um advogado conhecido, ou que se encontra em
uma audiência ou que vai passando pelos corredores do fórum,
para que faça o favor de fazer a defesa do réu pobre. Na
36
maioria das comarcas em que não há nem “cheiro” de
Defensor Público e onde a pobreza é acentuada, em especial
entre a ação parlamentar 216 Relatório Final população rural, a
única alternativa do Juiz é também pedir uma esmola aos raros
advogados que por ali militam. (BRASIL, 2009, p. 215-216).
Ainda, em outro trecho, foi relatado que:
O advogado “doado” pelo Juiz faz de conta que faz defesa. A
defesa prévia se resume a poucas linhas. Não promove a
produção de provas e não requer diligências. Nas audiências
não faz qualquer intervenção. As alegações finais são quase
inexistentes e, não raro, deixa de recorrer de decisões
condenatórias. Essa carência real, que acaba se
transformando em piedade, em muitos casos, e promiscuidade,
em outros, tem como consequência imediata a falta de defesa
efetiva, real e eficiente em favor do réu, com resultado negativo
ao réu no final do processo. (BRASIL, 2009, p. 216)
A CPI deixa claro que há casos onde o defensor dativo de fato faz um
bom trabalho, mas de acordo com as diligências que realizou, é notório que
não se trata da maioria.
Importante salientar que o direito à assistência jurídica é previsto na Lei
de Execução Penal em seu art. 15, na Constituição Federal em seu art. 5°,
LXXIV, bem como no art. 17 dos Princípios para a Proteção de Todas as
Pessoas Sujeitas a Qualquer forma de Detenção ou Prisão (ONU,1988).
A CPI também constatou em suas diligências uma total falta de
assistência social aos presos, e caracteriza essa deficiência como um fator
agravante da crise do sistema prisional brasileiro, além de ser uma barreira a
mais no processo de ressocialização dos indivíduos encarcerados. Nesse
sentido, entende que:
Os egressos, após anos em estabelecimentos deformados e
corrompidos, são colocados no olho da rua, literalmente sem
lenço, sem documento, sem destino, sem rumo. A falta e
insuficiência dos serviços de assistência social nos
estabelecimentos penais contrariam a legislação nacional e
internacional. (BRASIL 2009, p. 235).
Os artigos 25, 26 e 27 da Lei de Execução Penal versam sobre a
assistência que deve ser fornecida ao egresso. Menciona o apoio e orientação
que devem ser dados à ele, para que o mesmo possa reingressar à sociedade,
além de prever a colaboração do serviço de assistência social ao preso para
que ele obtenha trabalho. Ainda de acordo com a Lei de Execução Penal,
37
agora em seu art. 78, tal assistência social é de responsabilidade do patronato
público ou particular. O patronato consiste em um tipo de instituição que atua
para auxiliar no exercício da execução penal, fornecendo assistência a
egressos e albergados.
“O estabelecimento penal deverá ter lotação compatível com a sua
estrutura e finalidade.” É o que estabelece o art. 85 da Lei de Execução Penal.
Entretanto, como já foi mencionado ao longo deste trabalho, sabemos que não
é isso que ocorre.
De acordo com a CPI, as unidades prisionais que respeitam a lotação
máxima de cada cela são raras. Além disso, foi identificada uma quantidade
significativa de pessoas cumprindo pena em cadeias públicas, que por sua vez
não apresenta o mínimo de estrutura adequada ao cumprimento de pena em
longo prazo. O art. 102 da Lei de Execução Penal faz a clara distinção desses
tipos de estabelecimentos penais.
A superlotação é um problema que atinge as penitenciarias brasileiras
desde 1976, e até hoje nada foi feito a respeito. Apontado como um dos fatores
principais de violação de direitos, as celas superlotadas contribuem para a
geração de novos problemas, pois acarretam em condições insalubres de
permanência, higiene, além de ser um ambiente mais propício a propagação de
doenças e de estimular motins, rebeliões e episódios de violência, tanto entre
presos quanto entre alguns presos e um agente penitenciário.
Foram identificados nas diligências realizadas casos onde os presos
estavam nus dentro da cela, em um calor insuportável. Redes substituindo
camas, uma em cima da outra para ter mais espaço, mulheres com crianças
recém-nascidas dentro de uma cela minúscula com outras tantas mulheres,
celas sem luz, celas onde os presos faziam suas necessidades em garrafas ou
em buracos no chão. Essa foi a realidade encontrada.
A CPI identificou algumas possíveis causas da superlotação nas
unidades penais brasileiras, entre elas: a fúria condenatória do poder judiciário,
a constante preferência pelo encarceramento como forma de pena, ao invés de
buscar medidas alternativas, o mecanismo legal que é voltado para o
enrijecimento das penas e a falta de construções de estabelecimentos
38
prisionais, não só de penitenciárias, mas também de outros tipos de
estabelecimentos.
É importante compreender que resolver o problema da superlotação
representaria um grande passo em direção ao avanço, à caminho da
humanização do sistema carcerário, respeitando os direitos e deveres dos
presos e garantindo que seja cumprido o que é estabelecido por lei.
Após a realização das diligências, o relator da CPI afirma com
segurança que o sistema penitenciário brasileiro é um campo de tortura, sejam
elas físicas ou psicológicas. Analisa:
Do ponto de vista psicológico, a tortura é ampla, de massa e
quase irrestrita. Para comprovação das torturas psicológicas e
o desrespeito à integridade moral dos presos, basta a
existência de celas superlotadas; a falta de espaço físico; a
inexistência de água, luz, material higiênico, banho de sol; a
constatação de lixo, esgotos, ratos, baratas e porcos
misturados com os encarcerados; presos doentes, sem
atendimento médico, amontoados em celas imundas, e outras
situações descritas nas diligências, fotografadas e filmadas.
(BRASIL, 2009, p. 270).
Samuel Lourenço Filho também fala sobre o tema. Relata os dias onde
os agentes penitenciários anunciavam que iriam conferir as celas. Eram gritos,
barulhos de barra de ferro batendo nas paredes e pavor geral. Os detentos
eram retirados das celas e enfileirados, submetidos a situações extremas de
estresse, onde um simples bocejar poderia desencadear uma reação violenta
por parte do agente. Qualquer movimento brusco, até mesmo um espirro,
poderia ser considerado como “falta de respeito”, e se isso acontecesse, a
violência e humilhação como formas de punição eram dadas como certas.
(LOURENÇO FILHO, 2018).
4 CONCLUSÃO
O objetivo do presente trabalho foi abordar dois temas paralelos, isto é, o
que a lei prevê como garantia do indivíduo encarcerado e o que o Estado
deveria garantir a esse indivíduo, mas não o faz, para que no último capítulo o
leitor pudesse fazer uma análise conjunta destes. Além disso, o trabalho
também buscou verificar se o Brasil está cumprindo o seu papel no que tange à
proteção dos direitos humanos, em especial no sistema carcerário brasileiro.
Através das apresentações de pesquisas reais, como o relatório do
INFOPEN e os resultados obtidos na CPI do Sistema carcerário brasileiro, ficou
explicitada a realidade dos presos e constatada as diversas formas de violação
aos seus direitos. Pode-se concluir que o Estado não tem cumprido o seu papel
garantidor e fiscalizador de direitos.
A perpetuação da cultura do encarceramento do país teve como resultado
o aumento de 700% da população carcerária total em um intervalo de menos
de trinta anos, e junto com esse pensamento de que para tirar o crime das
ruas, o jeito é apenas aplicar a pena privativa de liberdade, o que se tem
atualmente é o que muitos estudiosos chamam de crise penitenciária, sendo a
superlotação um dos principais e mais graves problemas. Fica claro que a atual
solução paliativa não é eficaz.
O processo de execução penal é de responsabilidade do Estado, que em
tese tem como objetivo principal a ressocialização do indivíduo. Entretanto, da
40
maneira como os presos vêm sendo tratados, conclui-se que o Estado além de
não estar cumprindo o seu papel, está permitindo a violação de direitos.
De acordo com os dados do INFOPEN, concluiu-se que a maioria dos
presos hoje são jovens, negros, de baixa renda e baixa escolaridade. Isso
mostra que a falta de politicas sociais efetivas reflete diretamente no futuro
dessas pessoas. Não obstante, tornou-se necessário também falar sobre a
quantidade de pessoas negras nas penitenciárias. Por serem estigmatizados
com a falácia da “cara de bandido”, acabam sofrendo mais as consequências
sociais e econômicas do que a população não negra.
Foram apontadas como as principais violações: falta de acomodações
decentes, falta de ambientes para preservação da higiene dos presos, como
por exemplo chuveiros e sanitários, falta de assistência médica, psicológica e
jurídica, déficit na implementação de politicas eficazes de assistência ao
egresso, constantes torturas e maus tratos, além da superlotação mencionada
anteriormente. Entende-se que se trata de um ambiente caótico de degradante,
que vai para o lado oposto do que prega o princípio da dignidade da pessoa
humana.
Faz-se extremamente necessário e urgente a tomada de decisões
práticas e de implementação de politicas de assistência na vida dos reclusos,
para que seja possível mudar o atual quadro. Ainda que cumprindo pena,
tratam-se de pessoas, que não podem ser jogadas à margem da sociedade
como lixo, como algo indigno. Há uma preocupação com a integridade física,
moral e mental desses indivíduos.
Conclui-se que infringir os direitos humanos do condenado não vai fazer
com que ele aprenda algum tipo de “lição”, tampouco garante que o mesmo
não vai voltar a cometer crimes. Tal pensamento agressivo e vingativo que
ainda paira sobre uma parte da sociedade parece não levar em consideração
que cedo ou tarde, a maioria dos egressos vai ser reinserido na sociedade, e
trata-los de maneira desumana e vexatória só prejudica o processo de
ressocialização dos mesmos.
41
Investimentos em educação, saúde e politicas sociais no geral são
soluções preventivas a esse problema. A educação é o caminho. Por ora, é
preciso do apoio das autoridades competentes, para garantir que o condenado
cumpra sim pelo crime que cometeu, mas em condições adequadas e previstas
em lei.
Por fim, ressalta-se a importância de políticas ressocializadoras, e a
expectativa é de que as autoridades competentes e o ordenamento jurídico
comecem a se manifestar perante a barbárie. Além disso, espera-se que os
direitos humanos sejam mais respeitados, e que parem de ser associados a
“direito de bandido”. Antes de ser apenas mais um número no imenso sistema
de execuções penais, o preso é humano, e merece ser tratado com a mesma
dignidade do que os outros.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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43
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http://bd.camara.leg.br/bd/handle/bdcamara/2701. Acesso em 7 de mai. 2019.
BRASIL, Decreto Nº 3.298/99, Regulamenta a Lei no 7.853, de 24 de outubro
de 1989, dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa
Portadora de Deficiência, consolida as normas de proteção, e dá outras
providências. Disponível em:
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outras providências. Disponível em:
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dependentes de drogas; estabelece normas para repressão à produção não
autorizada e ao tráfico ilícito de drogas; define crimes e dá outras providências.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-
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44
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  • 1. UNIVERSIDADE VEIGA DE ALMEIDA CURSO DE DIREITO CAMPUS BARRA DA TIJUCA ISABELA DE MELO MATTOS OS DIREITOS HUMANOS E O SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO RIO DE JANEIRO JUNHO/2019
  • 2. ISABELA DE MELO MATTOS OS DIREITOS HUMANOS E O SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO Orientador: Prof.ª Rosemary Lopes Faria Coorientador: Prof. Josemar Figueiredo Araújo RIO DE JANEIRO JUNHO/2019
  • 3. UNIVERSIDADE VEIGA DE ALMEIDA Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Universidade Veiga de Almeida como parte dos requisitos necessários para a aprovação no Curso de Direito. Aprovado em_____de________________de______. ____________________________________________ Prof.ª Rosemary Lopes Faria Presidente (orientador) ____________________________________________ Prof. Examinador ____________________________________________ Prof. Examinador
  • 4. AGRADECIMENTOS Primeiramente, agradeço a Deus por ouvir minhas orações e confortar o meu coração nos momentos difíceis. Agradeço aos meus pais, Kacia e Jorge, pelas palavras de incentivo e por fazerem o possível para me proporcionar as melhores oportunidades. Não seria a pessoa que sou hoje se não fosse por eles. Agradeço ao meu namorado, Pedro, que esteve ao meu lado durante essa trajetória, por todo carinho e paciência. Quando eu achava que não seria capaz, suas palavras de apoio me deram forças para continuar. Agradeço aos meus avós maternos, principalmente a minha avó Edicinha, que sempre foi exemplo de mulher forte e determinada, por sempre me manter em suas preces e por mesmo com seus 75 anos, sempre estar disposta a cuidar de mim. Agradeço ao meu primo Bernardo, que é a minha maior inspiração, por mesmo distante, assumir o papel de “mentor” na minha vida. Quando me senti perdida, foram suas palavras que me ajudaram a me encontrar novamente. Agradeço a todas as minhas amizades por toda compreensão em momentos de “essa semana não posso, tenho que escrever o TCC”. Em especial, agradeço a Débora, minha “mana”, que foi minha maior incentivadora durante esse projeto, sempre me botando pra cima e me dizendo que tudo daria certo. E também a minha amiga Beatriz, que mesmo na correria da vida, topou driblar a falta de tempo para me ajudar a formatar esse trabalho. Agradeço ao Cauê, meu “cãopanheiro”, que está comigo há 12 anos. Durante a elaboração desse projeto, esteve sempre deitado ao meu lado e me acompanhando pelos cômodos da casa, como sempre, demonstrando todo seu amor e fidelidade. Por fim, agradeço aos meus orientadores, Professora Rosemary e Professor Josemar, por terem desempenhado um papel muito além do esperado, tendo muita paciência e disposição para ajudar. Sem vocês, esse trabalho não existiria.
  • 5. RESUMO A violação dos direitos dos presos dentro dos estabelecimentos penitenciários brasileiros sempre foi um assunto polêmico quando discutido em sua amplitude. Para além das questões sociológicas e opiniões pessoais é preciso ter um olhar mais atento, crítico, no que tange ao respeito ou à falta dele, perante a legislação brasileira e aos pactos dos quais o Brasil é signatário. A Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984, denominada como Lei de Execução Penal, prevê uma boa parte dos direitos e garantias conferidos aos indivíduos que cumprem pena privativa de liberdade. Além da lei mencionada, podemos contar também com o suporte do art. 5° da Constituição Federal de 1988, bem como alguns pactos nacionais e internacionais da Organização das Nações Unidas – ONU. Ocorre que, embora tendo todo um rol de garantias constitucionais previstas em lei, o preso ainda sofre agressivas violações a seus direitos, necessitando de uma maior atenção das instituições fiscalizadoras, como por exemplo, o Ministério Público e o Comitê de Direitos Humanos, além das autoridades locais competentes. Atualmente se torna imprescindível reforçar a prerrogativa de que os direitos humanos se aplicam a todos os seres humanos, em todas as circunstâncias. Nada pode ferir a dignidade da pessoa humana, nem mesmo uma sentença condenatória. Palavras-Chave: Direitos Humanos, Penitenciárias Brasileiras, Lei de Execução Penal.
  • 6. ABSTRACT The violation of prisoners' rights within Brazilian prisons has always been a controversial subject when discussed in its amplitude. In addition to sociological questions and personal opinions, it is necessary to have a closer, critical look regarding the sense of respect or the lack of it, on the Brazilian legislation and the pacts that Brazil is a signatory. The Law No. 7,210 of July 11, 1984, known as the Criminal Enforcement Law, provides a large number of the rights and guarantees granted to individuals serving a custodial sentence. Besides the mentioned law, we can also count on the support of art. 5 of the Federal Constitution of 1988, as well as some national and international agreements of the United Nations - UN. Occurs that, even having a whole range of constitutional guarantees provided for by law, the prisoner still suffers aggressive violations of his rights, requiring greater attention from the supervisory institutions, such as the Public Ministry and the Human Rights Committee, in addition to the local authorities. It is now imperative to strengthen the prerogative that human rights apply to all human beings in all circumstances. Nothing can harm the dignity of the human person, not even a condemnatory sentence. Keywords: Human Rights, Brazilian Prisons, Criminal Enforcement Law.
  • 7. LISTA DE FIGURAS Gráfico 1: Evolução das pessoas privadas de liberdade entre 1990 e 2016... 23 Gráfico 2: Pessoas com deficiência física por situação de acessibilidade da unidade prisional em que se encontram .......................................................... 27 Gráfico 3: Evolução da população prisional, vagas e déficit de vagas entre 2000 e 2016. .................................................................................................... 29
  • 8. SUMÁRIO INTRODUÇÃO............................................................................................................9 1 CAPÍTULO I .....................................................................................................12 1.1 A LIBERDADE ENQUANTO DIREITO HUMANO FUNDAMENTAL..................12 1.2 A PENA DE PRIVAÇÃO DE LIBERDADE – ASPECTOS HISTÓRICOS E JURÍDICOS...............................................................................................................14 1.3 OS DIREITOS FUNDAMENTAIS DO ENCARCERADO ...................................17 1.4 OS DIREITOS PERDIDOS OU SUSPENSOS PELA CONDENAÇÃO..............17 1.5 OS DIREITOS MANTIDOS MESMO APÓS A CONDENAÇÃO.........................18 2 CAPÍTULO II ....................................................................................................21 2.1 O SISTEMA CARCERÁRIO BRASILEIRO E SUA FUNÇÃO SOCIAL ..............21 2.2 LIMITAÇÃO DAS PENAS .................................................................................24 2.3 OS REGIMES PENITENCIÁRIOS E OS TIPOS DE ESTABELECIMENTOS PRISIONAIS..............................................................................................................24 2.4 O QUADRO ATUAL DO SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO.................28 3 CAPÍTULO III ...................................................................................................32 3.1 OS DIREITOS HUMANOS VIOLADOS JUNTAMENTE COM A PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE.....................................................................................32 4 CONCLUSÃO...................................................................................................39 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.........................................................................42
  • 9. INTRODUÇÃO Direitos humanos é o ramo dentro do Direito que cuida do conjunto de prerrogativas que são indispensáveis a uma vida digna. Pelo fato das necessidades humanas serem variadas de acordo com o momento histórico, os direitos humanos não possuem um rol predeterminado, avançando conforme as novas demandas de novas épocas. (RAMOS, 2017). Quando uma pessoa é condenada a cumprir pena privativa de liberdade, é necessário observar se os direitos humanos estão sendo respeitados, uma vez que o que se perde, é o direito de ir e vir, e não o direito de ser tratado de forma humanamente digna. Alguns estudiosos entendem que violando os direitos humanos dos encarcerados o Estado o está condenando duplamente: retirando sua liberdade e seus direitos básicos e indispensáveis. Por isso, os direitos humanos têm como principais características a universalidade e essencialidade. O presente trabalho tem por objetivo promover uma análise acerca da realidade do sistema penitenciário brasileiro, com enfoque à violação dos direitos dos apenados. Visa também entender o papel da superlotação nesse cenário, bem como descrever os direitos mantidos mesmo após a condenação à pena privativa de liberdade, além dos direitos perdidos com a condenação e dos direitos que estão sendo violados atualmente. Nesse sentido, surgem os seguintes questionamentos: O que o Estado está fazendo para cumprir seu papel ressocializador nas penitenciárias? Qual a relação entre a violação dos direitos humanos com a
  • 10. 10 agravante da superlotação e o alto número de casos de reincidência? Como assegurar os direitos humanos dentro desse sistema de forma digna e igualitária? O estudo do presente tema possui enorme relevância não só para a comunidade jurídica, mas também para a sociedade de forma geral, uma vez que eventualmente os presos voltarão a viver em sociedade, e é de extrema importância que os mesmos voltem ressocializados e dispostos a seguirem as leis, como prevê a Constituição Federal. Além disso, torna-se imprescindível fomentar a discussão acerca de medidas preventivas, como por exemplo o investimento em políticas sociais, e não somente a implementação paliativa, como vem sido feito. O método utilizado para a pesquisa é o exploratório, visando fornecer informações para uma compreensão mais precisa e humanitária em relação ao tema. Por sua vez, a abordagem se dará de forma qualitativa, procurando compreender o que levou o Estado a atual crise penitenciária, e como a violação dos direitos humanos contribuiu para a degradação do sistema. A técnica a que se pretende aplicar na elaboração do trabalho está relacionada a análise de documentos, tais como legislações pertinentes, livros, pesquisas, reportagens jornalísticas e outros meios que se fizerem necessários, com o intuito de facilitar a compreensão da problemática, fazendo um estudo aprofundado. O presente trabalho será dividido em três capítulos. O primeiro capítulo discorrerá sobre os aspectos que tangem o conceito de liberdade, bem como os direitos fundamentais da pessoa encarcerada, além de tratar sobre os direitos perdidos e os mantidos após a sentença condenatória à pena privativa de liberdade. O segundo capítulo apresentará a função do sistema carcerário brasileiro e a limitação das penas, além de descrever a classificação dos regimes
  • 11. 11 penitenciários, dos tipos de estabelecimentos prisionais e a real e atual situação das penitenciárias. O terceiro e último capítulo expõe os direitos que estão sendo violados nos dias de hoje, em contraste com o que está previsto em lei. Conclui-se que o presente estudo é de grande utilidade para contribuir para o esclarecimento da problemática existente, no que diz respeito aos direitos humanos no sistema penitenciário brasileiro.
  • 12. 1 CAPÍTULO I 1.1 A LIBERDADE ENQUANTO DIREITO HUMANO FUNDAMENTAL Segundo Ramos (2017, p. 21), direitos humanos podem ser conceituados como: “[...] um conjunto de direitos considerado indispensável para uma vida humana pautada na liberdade, igualdade e dignidade. [...] São os direitos essenciais e indispensáveis à vida digna.” São considerados inalienáveis a qualquer pessoa, de qualquer povo, em qualquer lugar do mundo. Em paralelo, existem os direitos fundamentais. Seu conceito e suas denominações se dão de maneira tão ampla, que se torna difícil fornecer uma única definição sintética e precisa. Algumas das expressões utilizadas para designar tais direitos são: direitos naturais, direitos humanos, direitos do homem, direitos individuais, direitos públicos, direitos fundamentais do homem, etc. (SILVA, 2017). Visto isso, pode-se dizer que o conceito de direito fundamental está diretamente ligado ao conceito de direitos humanos, tendo como diferença apenas o plano em que estão consagrados. Os direitos humanos, por se tratarem de um assunto em nível internacional, estão positivados em tratados internacionais. Os direitos fundamentais são similares aos preceitos dos direitos humanos, entretanto, por possuírem caráter nacional, estão expressos na nossa Constituição Federal. Em paralelo aos direitos fundamentais, existe também o direito à liberdade, bem como algumas formas de conceitua-la. Segundo Diniz (2017, p. 388), liberdade no âmbito da filosofia do direito, consiste em “a) poder do
  • 13. 13 homem para agir numa sociedade político-organizada por determinação própria, dentro dos limites legais e sem ofensa a direitos alheios; b) poder de praticar qualquer ato não vedado por lei; c) estado ou condição de homem livre.” Já em termos jurídicos, liberdade consiste na “possibilidade de coordenação consciente dos meios necessários à realização da felicidade pessoal. ” (SILVA, 2017, p. 235). Sob a perspectiva de Passos (2003), a liberdade se encontra entre o que não pode ser feito, pois é vedado por alguma norma regulamentadora, e o que deve ser imposto pela mesma, ou seja, o que a norma nos manda fazer. O que sobra, é o espaço de liberdade. Enquanto direito fundamental, a liberdade é estabelecida por alguns aspectos, como por exemplo, o conceito de liberdade de locomoção, que está garantido pela Constituição Federal de 1988, a qual dispõe no art. 5º, XV que: “[...] é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens [...]” (BRASIL, 1988). Nesse sentido: [...] Temos aí a noção essencial de liberdade de locomoção: poder que todos têm de coordenar e „dirigir suas atividades e de dispor de seu tempo, como bem lhes parecer, em princípio, cumprindo-lhes, entretanto, respeitar as medidas impostas pela lei, no interesse comum, e abster-se de atos lesivos dos direitos de outrem‟[...]. (SILVA, 2017, p. 240 apud ESPÍNOLA, 1952) Sob a perspectiva da liberdade de pensamento, Dória (1953, p. 263) classifica como “[...] o direito de exprimir, por qualquer forma, o que se pense em ciência, religião, arte, ou o que for”. Para Silva (2017, p. 243), a liberdade de pensamento pode ser caracterizada como a “[...] exteriorização do pensamento no seu sentido mais abrangente. [...] a liberdade de pensamento é plenamente reconhecida, mas não cria problema maior”. Isto porque a liberdade de pensamento, por mais que seja um aspecto de liberdade, ainda se encontra somente na forma de consciência. Sua exteriorização é expressa através da liberdade de opinião. “Trata-se da liberdade de o indivíduo adotar a atitude intelectual de sua escolha: quer um pensamento íntimo, quer seja a tomada de posição pública; liberdade de
  • 14. 14 pensar e dizer o que se crê verdadeiro.” (ROBERT, 1977, p. 302 apud SILVA, 2017, p. 243). A liberdade em si e em suas diversas formas, que são conhecidas como liberdades públicas, uma vez que são legitimadas e tuteladas pelo Direito (AMARAL, 2009), é um valor caro ao ser humano. A retirada da liberdade como forma de pena, é uma das sanções mais gravosas aplicadas pelo Estado. Depois disso, existem as penas de castigos corporais e a pena de morte, ambas vedadas constitucionalmente. 1.2 A PENA DE PRIVAÇÃO DE LIBERDADE – ASPECTOS HISTÓRICOS E JURÍDICOS A pena é a sanção que restringe a liberdade do indivíduo, podendo ser também de caráter pecuniário, sendo sempre aplicada pelo Poder Judiciário competente (DINIZ, 2017). Na história da humanidade como sociedade, a figura da pena sempre esteve presente. Entretanto, para chegarmos ao tipo de sistema que temos hoje, percorremos um longo caminho. Dias (2005, p. 01) reforça tal concepção: A forma prisão preexiste à sua utilização sistemática nas leis penais. Ela se constitui fora do aparelho judiciário, quando se elaboram, por todo o corpo social. O processo para repartir os indivíduos, fixá-los e distribui-los espacialmente, classificá-los, tirar deles o máximo de tempo, e o máximo de forças, treinar seus corpos, codificar seu comportamento contínuo, mantê-los numa visibilidade sem lacuna, formar em torno deles, um aparelho completo, de observação, registro e notações, constituir sobre eles um saber que se acumula e se centraliza. Na idade antiga, havia o conceito de cárcere. Não existia como uma forma de pena, mas sim de manter o indivíduo sob o domínio físico das autoridades. No período medieval, o cárcere ainda existia, entretanto, era
  • 15. 15 apenas uma triagem até chegar a hora dos castigos corporais e em alguns casos, até mesmo a pena de morte.1 A primeira Constituição brasileira surgiu em 1824, sendo outorgada por D. Pedro I e dando fim a algumas penas violentas da época, como por exemplo, as penas envolvendo tortura. Desde o momento de sua independência, até chegar ao atual modelo de Constituição, o Brasil contou com outras seis constituições2 , além das diversas modificações legislativas realizadas ao longo dos anos. Atualmente, o conceito de pena de privação de liberdade é regido pela Constituição Federal de 1988, e também pelo Código Penal, Código de Processo Penal, a Lei de Execução Penal, dentre alguns outros tratados de direitos humanos dos quais o Brasil é signatário. A pena deve ser aplicada de modo a preservar a dignidade do preso, uma vez que é estabelecido na Constituição Federal de 1988, art. 1º, III, que um dos elementos basilares do Estado Democrático de direito é a dignidade da pessoa humana. Torna-se mister salientar que a prisão, enquanto pena, tem como objetivo a ressocialização do indivíduo. O Código Penal brasileiro e a Lei nº 7.210 – Lei de Execução Penal estabelecem em seus artigos 33, § 2º e artigo 112, respectivamente, que as penas privativas de liberdade serão fixadas em caráter progressivo. Ou seja, o condenado deve iniciar o cumprimento de sua sentença em um tipo determinado de regime, sendo posteriormente analisados fatores específicos a cada encarcerado, que serão determinantes para que seja concedida a progressão de sua pena, sempre indo do mais rigoroso ao mais ameno e nunca pulando regimes. Entre esses requisitos específicos a progressão do regime, está o fator do bom comportamento do preso. Entretanto, o legislador deixou essa questão em aberto, pois não estabeleceu na norma o que poderia ser considerado 1 ESCOLA DE FORMAÇÃO E APERFEIÇOAMENTO PENITENCIÁRIO [ESPEN] (Paraná). A história das prisões e dos sistemas de punições. Disponível em: http://www.espen.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=102. Acesso em: 30 de mar. 2019. 2 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. As Constituições do Brasil. Brasília, 2008. Disponível em http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=97174. Acesso em 22 de abr. 2019.
  • 16. 16 como um bom ou mau comportamento. Visto isso, a definição acerca do termo pode ser compreendida nos termos seguintes: “Bom comportamento carcerário é comportamento daquele que se põe de forma ajustada aos regramentos de disciplina do estabelecimento prisional”. (MARCÃO, 2009, p. 17). Outrossim, para além do quesito de bom comportamento carcerário, a Lei nº 7.210 – Lei de Execução Penal fixou em seu art. 8° o seguinte: Art. 8º. O condenado ao cumprimento de pena privativa de liberdade, em regime fechado, será submetido a exame criminológico para a obtenção dos elementos necessários a uma adequada classificação e com vistas à individualização da execução. (BRASIL, 1984, on-line) O exame criminológico consiste em uma análise de informações jurídicas do apenado, além de questões psicológicas e psiquiátricas. Contudo, a Lei nº 10.792 de 2003 alterou de maneira significativa o artigo citado da Lei de Execução Penal, pois retirou a obrigatoriedade do exame criminológico, que foi substituído pela avaliação de bom comportamento carcerário. Atualmente, fica a critério da autoridade judiciária competente solicitar ou não o exame. Torna-se indispensável falar sobre a diferença entre o que a pena privativa de liberdade deveria ser, de acordo com toda teoria, doutrinas e leis, e o que ela realmente é para o cidadão encarcerado. Para Lourenço Filho (2018), a pena de reclusão não possui caráter ressocializador, e sim vingativo. “Para alguns, a vingança pela morte é a anulação da outra vida” (LOURENÇO FILHO, 2018, p.28). A ressocialização é uma realidade distante para a maioria dos encarcerados. Na prática, faltam palavras para descrever a real situação do ambiente carcerário. O poder punitivo do Estado funciona na hora da sentença, entretanto, no que diz respeito a cumprir seu objetivo ressocializador, muito se falta. É o que nos mostra Lourenço Filho (2018, p. 61-62): A tal Justiça se preocupou em me manter preso, e só. [...] E de que maneira podem ser Justos? Afinal, com a sentença não houve Justiça, com a prisão muito menos. O que rolou ali, e rola, é vingança! Está na hora de pensar em Justiça Restaurativa, está na hora de pensar numa Justiça que não anule o outro nem ninguém.
  • 17. 17 1.3 OS DIREITOS FUNDAMENTAIS DO ENCARCERADO A Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988) consagrou os direitos fundamentais do indivíduo de uma forma que nenhuma outra Constituição havia feito anteriormente; incluindo os direitos sociais ao rol de direitos garantidos em norma, em conjunto com direitos e deveres políticos e civis. O artigo 5° da Constituição Federal, em alguns de seus diversos incisos, garante aos encarcerados o respeito às suas integridades físicas e morais (art. 5°, XLIX, CF), além de vedar penas de morte, cruéis, de trabalho forçado (art. 5°, XLVII, CF), etc. Ademais, também assegura em seu inciso III que “ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante” (BRASIL, 1988, on-line). Existem ainda, os direitos garantidos pela Lei nº 7.210/1984, também conhecida como Lei de Execução Penal. É necessária a compreensão de que a pena privativa de liberdade enquanto sanção retira além da liberdade, alguns direitos do indivíduo encarcerado, entretanto, assegura a garantia de outros direitos, como os que foram citados anteriormente. Dito isso, torna-se mister salientar no presente trabalho, os direitos perdidos no momento da condenação, bem como os novos direitos como preso, e os direitos que foram mantidos. 1.4 OS DIREITOS PERDIDOS OU SUSPENSOS PELA CONDENAÇÃO Já sabemos que a liberdade é o principal direito perdido no ato da condenação do indivíduo à pena privativa de liberdade. Entretanto, não é o único. A Constituição, apesar de garantir direitos ao cidadão encarcerado, direitos que serão discutidos posteriormente, também prevê a suspensão de alguns direitos, entre eles, os direitos políticos. Para Silva (2017), os direitos políticos representam a disciplina dos meios necessários ao exercício da soberania popular. A base desses direitos se dá pelo direito eleitoral de votar, bem como o de ser votado.
  • 18. 18 De acordo com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que em seu artigo XXI prevê que “todo ser humano tem o direito de fazer parte no governo de seu país diretamente ou por intermédio de representantes livremente escolhidos” (ONU, 2009), pode-se dizer que ter o direito eleitoral de votar e ser votado, garante ao cidadão pleno gozo de seus direitos políticos. Sendo assim, entende-se que a regra geral no sistema constitucional brasileiro garante proteção aos direitos políticos dos indivíduos. Todavia, para toda regra há uma exceção. Nesse caso, a exceção é expressa no artigo 15 da Constituição Federal de 1988, que prevê em seu inciso III que o indivíduo terá seus direitos políticos suspensos no ato de sua condenação criminal, que tenha transitado em julgado. 1.5 OS DIREITOS MANTIDOS MESMO APÓS A CONDENAÇÃO Cumpre salientar que mesmo sob pena restritiva de liberdade, o indivíduo ainda conserva os direitos que não foram afetados no ato de sua condenação, sendo as autoridades obrigadas a respeitá-los e garantir o cumprimento deles em sua totalidade, conforme expresso nos seguintes artigos: art. 3°, art. 40 e art. 41 da Lei de Execução Penal – Lei 7.210/84. Além disso, ao sistema prisional também são atribuídas algumas condições para que o preso cumpra a sua pena de forma humanamente digna. É o que prevê a Lei de Execução Penal – Lei 7.210/84. Como por exemplo, o disposto no art. 88, que estabelece que na penitenciária o preso será alojado em uma cela individual, contendo local para dormir, sanitário e lavatório. Estabelece também como requisitos básicos a uma unidade prisional: a) salubridade do ambiente, de forma adequada à existência humana; e b) uma área mínima de seis metros quadrados. Ainda se tratando das condições básicas para o preso cumprir a pena na penitenciária, o art. 89 da mesma Lei mencionada anteriormente, estipula o seguinte, in verbis: Art. 89 – Além dos requisitos referidos no art. 88, a penitenciária de mulheres será dotada de seção para gestante
  • 19. 19 e parturiente e de creche para abrigar crianças maiores de 6 (seis) meses e menores de 7 (sete) anos, com a finalidade de assistir a criança desamparada cuja responsável estiver presa. (Redação dada pela Lei nº 11.942, de 2009) Parágrafo único. São requisitos básicos da seção e da creche referidas neste artigo: (Incluído pela Lei nº 11.942, de 2009) I – atendimento por pessoal qualificado, de acordo com as diretrizes adotadas pela legislação educacional e em unidades autônomas; e II – horário de funcionamento que garanta a melhor assistência à criança e à sua responsável. (BRASIL, 1984, on-line) A importância dos direitos mantidos pelo preso se dá devido ao respeito ao princípio da dignidade da pessoa humana, um dos princípios basilares de toda a Constituição. De acordo com Barroso (2010, p.37): A dignidade da pessoa humana é um valor moral que, absorvido pela política, tornou-se um valor fundamental dos Estados democráticos em geral. Na sequência histórica, tal valor foi progressivamente absorvido pelo Direito, até passar a ser reconhecido como um princípio jurídico. Entende-se que tal princípio tem como função principal garantir que os direitos de todo cidadão sejam devidamente respeitados pelo Estado, garantir que todos tenham o direito de ter uma vida digna. Por se tratar de um princípio basilar, fundamental ao Estado, o mesmo tem a obrigação de cumpri-lo. Em sentido contrário ao pensamento de grande parte da população, os cidadãos encarcerados também se encontram abrangidos por este princípio. Como mencionado anteriormente, o preso mantém os direitos que não lhes foram retirados no ato de sua condenação. Visto isso, o direito a um tratamento digno, sem sofrer qualquer tipo de violência, deve, obrigatoriamente, ser garantido pelo Estado. A própria Lei de Execução Penal assegura alguns direitos ao cidadão encarcerado, considerados como direitos básicos. Foram estabelecidos a fim de que se fizesse respeitar o princípio da dignidade da pessoa humana. São eles3 : a) Direito à alimentação e vestimenta fornecidos pelo Estado. b) Direito a uma ala arejada e higiênica; 3 PEREIRA, Ângela Miranda. Os direitos do preso à luz do princípio da dignidade da pessoa humana. Âmbito Jurídico, Rio Grande, XVI, n. 116, set 2013. Disponível em: http://www.ambito- juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=13682. Acesso em 25 de abr. 2019.
  • 20. 20 c) Direito à visita da família e amigos; d) Direito de escrever e receber cartas; e) Direito a ser chamado pelo nome, sem nenhuma discriminação; f) Direito ao trabalho remunerado em, no mínimo, 3/4 do salário mínimo; g) Direito à assistência médica; h) Direito à assistência educacional: estudos de 1º grau e cursos técnicos; i) Direito à assistência social: para propor atividades recreativas e de integração no presídio, fazendo ligação com a família e amigos do preso; j) Direito à assistência religiosa: todo preso, se quiser, pode seguir a religião que preferir, e o presídio deve propiciar locais adequados aos cultos; k) Direito à assistência judiciária e contato com advogado: todo preso pode conversar em particular com seu advogado e se não puder contratar um o Estado tem o dever de lhe fornecer gratuitamente. Em contrapartida aos direitos que supostamente deveriam ser preservados no ato da condenação, é de conhecimento geral que inúmeros deles não são respeitados na prática. Teoricamente, a pena privativa de liberdade tem como função principal a ressocialização do indivíduo, de maneira a prevenir futuras criminalidades. Atualmente, o desrespeito às normas previstas pela legislação mostra-se indo no sentido contrário ao objetivo principal. (PEREIRA, 2019). É o que será abordado a seguir.
  • 21. 2 CAPÍTULO II 2.1 O SISTEMA CARCERÁRIO BRASILEIRO E SUA FUNÇÃO SOCIAL Em 11 de julho de 1984, a Lei de Execução Penal foi criada, com o objetivo de estruturar os estabelecimentos prisionais e tudo o que lhes diz respeito. O Código Penal, elaborado em 7 de dezembro de 1940, definiu quais atos praticados pelo cidadão podem ser configurados como crime ou infração penal, e quais seriam as sanções a serem aplicadas em cada caso. Logo, a penitenciária surge como o local onde o indivíduo sentenciado a pena privativa de liberdade deve ficar encarcerado, sob custódia do Estado. (ESTEFAM, 2012). Como mencionado anteriormente, a função social da prisão, em teoria, deveria ser de ressocializar, deixar o preso apto a viver em sociedade novamente, de forma a reconhecer seus erros, pagar pelos mesmos e seguir em frente sem novas infrações. Entretanto, a realidade do sistema carcerário brasileiro é outra. De acordo com o Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (INFOPEN) de 2016, o Brasil ocupa o terceiro lugar no ranking dos países com as maiores populações carcerárias do mundo. (O GLOBO, 2017). Não há como cumprir seu papel ressocializador quando se tem um ambiente defasado; o número de celas e presídios não corresponde ao número de presos, que cresce a cada dia mais. Os direitos garantidos constitucionalmente ao encarcerado e as condições estabelecidas pela Lei de Execução Penal para que o egresso cumpra sua pena com dignidade, nitidamente não são respeitadas.
  • 22. 22 Segundo dados do Conselho Nacional do Ministério Público4 , o que se tem atualmente são presídios cuja taxa de ocupação corresponde a 175%, o que claramente configura em superlotação. Na região Norte do país, os estabelecimentos prisionais recebem o equivalente a quase três vezes mais do que poderiam de fato comportar. Diversos juristas e pesquisadores já defendem a ideia de cultura do encarceramento no Brasil. O encarceramento em massa é o que gera a superlotação dos presídios. Atualmente, a impressão é que o país apostou no encarceramento como “solução” para os problemas de violência. Segundo Claudio Amaral (2017), a cultura do encarceramento poderia ser resolvida com investimentos na educação5 . Entretanto, a cultura do encarceramento ao invés de ser resolvida e mudada na concepção das autoridades, é perpetuada devido ao modo como a sociedade enxerga sua população carcerária. A violência diária e a sensação de que nada está sendo feito a respeito disso, gerou no cidadão um sentimento de repulsa e ódio. Pouco se fala sobre ressocializar, pois muitos ainda acreditam que “bandido bom, é bandido morto”. É o que mostra o 10º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, realizado em 2016 pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). A pesquisa feita pelo Datafolha concluiu que 57% da população brasileira acredita na polêmica frase6 . O gráfico abaixo, retirado do relatório do INFOPEN (2016), demonstra o constante crescimento no número de presos no Brasil ao longo dos anos, reforçando a ideia da existência da cultura do encarceramento no país. 4 BRASIL, Conselho Nacional do Ministério Público. Taxa de ocupação dos presídios brasileiros é de 175%, mostra relatório dinâmico "Sistema Prisional em números”. Brasília, 2018. Disponível em: http://www.cnmp.mp.br/portal/todas-as-noticias/11314-taxa-de-ocupacao-dos-presidios-brasileiros-e-de- 175-mostra-relatorio-dinamico-sistema-prisional-em-numeros. Acesso em: 28 de abr. 2019. 5 CRUZ, Elaine Patrícia. Existe cultura jurídica de encarceramento no Brasil. Agência Brasil. São Paulo, 2017. Disponível em: http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2017-02/existe-cultura-juridica-de- encarceramento-no-brasil-diz-juiz-paulista. Acesso em 28 de abr. 2019. 6 FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA (FBSP). Anuário Brasileiro de Segurança Pública. São Paulo, 2016. Disponível em: http://www.forumseguranca.org.br/storage/10_anuario_site_18-11-2016-retificado.pdf. Acesso em: 29 de abr. 2019.
  • 23. 23 Gráfico 1: Evolução das pessoas privadas de liberdade entre 1990 e 2016. Fonte: Ministério da Justiça. A partir de 2005, dados do INFOPEN. Disponível em: < http://depen.gov.br/DEPEN/noticias-1/noticias/infopen-levantamento-nacional-de-informacoes-penitenciarias- 2016/relatorio_2016_22111.pdf>. Acesso em: 28 de abr. 2019. Como se pode observar no gráfico, em 2016 o número de pessoas privadas de liberdade ultrapassou a marca dos 700 mil. Ou seja, desde a década de 90, a população prisional brasileira teve um aumento de 707%. Os dados são alarmantes por se tratar de uma diferença de menos de 30 anos desde a data do primeiro levantamento feito pelo INFOPEN. Portanto, é notório que a perpetuação da cultura do encarceramento no Brasil influencia no crescente número de presos no país. Discute-se: “bandido bom, é bandido morto”, ou bandido bom, é bandido ressocializado e reinserido na sociedade? Nesse sentido, analisa Ciconello (2014, on-line): A punição ainda é vista pela sociedade brasileira como uma espécie de vingança. A indiferença, a omissão ou mesmo o consentimento da sociedade e dos agentes públicos com a barbárie existente no sistema penitenciário é a principal barreira para a sua transformação. Assim, superlotação, torturas, precárias condições de higiene, revistas vexatórias em familiares, incluindo crianças, e toda a sorte de punições para quem cometeu delitos são, infelizmente, legitimados, ainda que de forma velada, por uma parte da sociedade.
  • 24. 24 2.2 LIMITAÇÃO DAS PENAS Apesar de ser uma sanção, a pena privativa de liberdade possui diversas limitações à sua ação, a fim de impedir qualquer tipo de arbitrariedade, abuso de poder ou violação de direitos. Tais limites visam garantir a integridade do preso, respeitando o princípio da dignidade da pessoa humana. O art. 5° da Constituição Federal estabelece em seu inciso III que “ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante” (BRASIL, 1988, on-line). No Brasil, a lei 9.455 de 1997 definiu tortura como crime, sendo sua punição a pena privativa de liberdade, podendo o indivíduo ser condenado de dois a oito anos de prisão. Ainda no art. 5º, mas em seu inciso XLVII, há também a vedação aos seguintes tipos de pena: “a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX; b) de caráter perpétuo; c) de trabalhos forçados; d) de banimento; e) cruéis”. Além disso, o art. 75 do Código Penal prevê que o tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a trinta anos. Em casos onde a sentença do condenado estabeleça tempo superior ao citado, o inciso 1° diz que as penas devem ser unificadas para atender ao limite máximo de trinta anos. Em seu inciso 2°, o artigo veda também a possibilidade de condenar o indivíduo por um fato que ocorreu posteriormente ao início do cumprimento da pena, devendo ser feita uma nova unificação, desprezando o período de pena já cumprido pelo preso. 2.3 OS REGIMES PENITENCIÁRIOS E OS TIPOS DE ESTABELECIMENTOS PRISIONAIS O Código Penal, em seu art. 33, prevê os tipos de regime em que a pena de reclusão será cumprida. São eles o regime fechado, o regime semiaberto e o regime aberto. No regime fechado, a pena deve ser cumprida
  • 25. 25 em um estabelecimento prisional de segurança máxima ou média. No início do cumprimento da pena, o indivíduo será submetido ao exame criminológico, além de precisar trabalhar durante a manhã, voltando ao isolamento no período da noite, sendo admitidos alguns tipos de trabalhos externos. (JESUS, 2010). No regime semiaberto, a pena será cumprida em colônia agrícola, industrial ou em um estabelecimento similar. No início, bem como no regime explicado anteriormente, o condenado também poderá ser submetido ao exame criminológico, sendo de simples faculdade do juiz a necessidade ou não do exame. Fica sujeito a trabalho no mesmo estabelecimento onde a pena é cumprida, também sendo admitidos trabalhos externos e periodicidade em cursos supletivos profissionalizantes, de instrução de segundo grau ou curso superior. (JESUS, 2010). O regime aberto por sua vez tem o indivíduo cumprindo sua pena em casa do albergado ou estabelecimento adequado. Como será esclarecido nos parágrafos a seguir, na casa do albergado o que prevalece é a autodisciplina do preso, bem como seu senso de responsabilidade. Caso o preso cometa algo que possa ser definido como crime doloso nesse tipo de regime, ele será transferido para outro tipo de regime, mais rigoroso. (JESUS, 2010). Em paralelo aos regimes, a Lei de Execução Penal estabeleceu em seus artigos os tipos de estabelecimentos prisionais. O primeiro estabelecimento, consagrado do art. 87 ao art. 90, é a penitenciária. Na teoria, a penitenciária destina-se ao indivíduo condenado a pena de reclusão em regime fechado. Consiste em uma cela individual com dormitório, sanitário e lavabo, em uma área mínima de seis metros quadrados. Na prática, as celas são superlotadas. Segundo o INFOPEN (2016), o déficit de vagas nos presídios chega a quase 360 mil. Em 2018, como já mencionado, o estudo feito pelo Conselho Nacional do Ministério Público concluiu que as penitenciárias brasileiras se encontram 175% superlotadas, ou seja, as celas estão com sua ocupação muito além do que suportam, e o que é estabelecido pela Lei de Execução Penal não está sendo respeitado. O segundo tipo de estabelecimento, previsto nos artigos 91 e 92, é a colônia agrícola, industrial ou similar. É destinado ao indivíduo que cumprirá a
  • 26. 26 pena em regime semiaberto. O condenado é alojado em um compartimento coletivo, sempre observando em teoria os requisitos básicos a uma unidade celular. Os artigos 93, 94 e 95 tratam do terceiro tipo de estabelecimento prisional, a casa do albergado. É destinada ao cumprimento de pena privativa de liberdade em regime aberto, e da pena de limitação de fim de semana. A casa do albergado precisa ser situada em um centro urbano, separado dos demais estabelecimentos prisionais, além de ser caracterizado pela ausência de obstáculos físicos contra a fuga. Aqui, o que predomina é a autodisciplina do preso. O mesmo passa a parte do dia “livre”, seja para estudar ou trabalhar, devendo retornar à noite e aos finais de semana. O quarto estabelecimento é o centro de observação, que está disciplinado nos artigos 96, 97 e 98, o centro de observação consiste no local onde os exames gerais e criminológicos são realizados. Pode ser construído em um local a parte, ou dentro do próprio estabelecimento prisional. O hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, presente nos artigos 99, 100 e 101, é destinado as pessoas que cometeram algum crime, mas que são inimputáveis ou semi-imputáveis. Geralmente são pessoas com algum tipo de doença mental. O último tipo de estabelecimento prisional estabelecido pela Lei de Execução Penal é a cadeia pública (artigos 102, 103 e 104), que é destinada aos presos provisórios, devendo ser instalada em centros urbanos. Em paralelo, importante falar sobre a situação dos presos com algum tipo de deficiência, seja física ou mental. Tais indivíduos devem ser tratados de formas diferentes, de maneira a respeitar as condições e limitações de cada um. É um direito constitucional a ser respeitado. O decreto nº 3.298, de 20 de dezembro de 1999 dispõe em seus artigos 3° e 4° respectivamente, as diferenças entre deficiência, deficiência permanente e incapacidade, além de definir quais pessoas podem ser consideradas como portadoras de deficiência, seguindo as categorias estabelecidas pela norma. O relatório divulgado pelo INFOPEN em 2016 revelou que existem 4.350 pessoas privadas de liberdade que possuem algum tipo de deficiência,
  • 27. 27 sendo 4.130 homens e 220 mulheres. Entre os egressos com deficiência física, 64% estão alocados em unidades prisionais que não foram adaptadas às suas condições de acessibilidade. É o que expõe o gráfico abaixo. Gráfico 2: Pessoas com deficiência física por situação de acessibilidade da unidade prisional em que se encontram Fonte: Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias – INFOPEN, Junho/2016. Disponível em: < http://depen.gov.br/DEPEN/noticias-1/noticias/infopen-levantamento-nacional-de-informacoes-penitenciarias- 2016/relatorio_2016_22111.pdf>. Acesso em: 28 de abr. 2019. É possível entender a partir dessa análise que no que tange aos estabelecimentos prisionais, o que está previsto na constituição não é seguido como deveria ser. Do número total de presos com deficiência, apenas 11% se encontram em unidades adaptadas as suas limitações. A falta de ambientes adaptados torna-se por diversas vezes um fator determinante a evolução ou não do indivíduo, sob uma perspectiva ressocializadora, pois o que determina sua capacidade de se integrar ao ambiente, aos outros indivíduos privados de liberdade, e principalmente, a capacidade se locomover com segurança pela unidade, de forma a cumprir sua pena de forma humanamente digna, é a acessibilidade. Para além da questão crucial da acessibilidade, existe também outra dura realidade para as pessoas com deficiência: a falta de preparo dos agentes, dos outros encarcerados e a violência com que são tratados os deficientes mentais toda vez que cometem algum tipo de infração. Lourenço
  • 28. 28 Filho (2018, p. 71), narra um episódio específico que aconteceu em uma penitenciária no Rio de Janeiro, quando um preso com algum tipo de transtorno mental se envolveu em problemas com outros presos e os agentes: O guarda decidiu tirar Luiz, mas o pior estava por vir. Luiz, ao sair, resolveu cuspir no guarda, estava evidente sua insanidade. Ao cuspir estava, ali, sendo disparado o “primeiro tiro” contra o guarda. [...]. Em frações de segundos, chegou aquela turma de funcionários, uns 5, já chegaram batendo e batendo muito! [...] Não demorou muito e ouvimos o estrondo. Era Luiz na cela do castigo e sozinho. E para sua companhia os guardas lançaram na cela uma bomba de pimenta. É nítido que devido a vulnerabilidade psiquiátrica de Luiz, o mesmo deveria ser condenado a cumprir sua pena em outro tipo de estabelecimento, um hospital psiquiátrico. Mais uma vez, é notório que os estabelecimentos prisionais brasileiros não respeitam o disposto em lei e tampouco se preocupam em garantir a dignidade do preso. Surge o questionamento: como cumprir o propósito ressocializador se nem o mínimo para a sobrevivência dos indivíduos encarcerados é garantido? 2.4 O QUADRO ATUAL DO SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO De acordo com dados do INFOPEN de 2016, existem mais de 700 mil pessoas presas no Brasil. O cálculo foi feito levando em consideração a soma das pessoas privadas de liberdade no sistema prisional estadual e nas carceragens das delegacias. O estado com a maior quantidade de pessoas encarceradas é São Paulo, que conta com pouco mais de 240 mil presos. Ainda de acordo com o relatório mais recente, entre os anos de 2000 a 2016, houve um aumento de 157% na taxa de aprisionamento no país. Em 2000 existiam 137 pessoas presas para cada grupo de 100 mil habitantes. No ano de 2016, esse número aumentou, e passou a ser de 352,6 pessoas presas para cada 100 mil habitantes (INFOPEN, 2016). Do número total de pessoas encarceradas no país, o número de pessoas sentenciadas a cumprir a pena em regime aberto corresponde a 6%,
  • 29. 29 regime semiaberto 15%, regime fechado 38%, e o maior percentual equivale aos indivíduos que estão presos, mas ainda sem sequer julgamento e condenação em definitivo que estabeleça o tipo de regime, equivalendo a 40% do número total. As pessoas sentenciadas a medida de segurança tanto internadas, quanto em tratamento ambulatorial, não chegam a 1%. Os dados explicitados anteriormente são no mínimo alarmantes. A superlotação dos presídios é um problema real e crescente, as taxas de ocupação só aumentam a cada dia. Em sua obra, Lourenço Filho (2018) relata com detalhes o que passou enquanto cumpria sua pena privativa de liberdade em uma penitenciária no Rio de Janeiro. As celas com ocupação além da sua capacidade máxima, o calor insuportável, as feridas na pele, as doenças e a violência são questões que essas pessoas lidam diariamente. Em 2009, foi realizada pela Câmara dos Deputados a Comissão Parlamentar de Inquérito – CPI do Sistema Carcerário Brasileiro. Foram oito meses de atividade e dezoito estados diligenciados. No Rio de Janeiro, a diligência ocorreu em maio de 2008 e foi concluído que havia um déficit de 5 mil vagas nos presídios cariocas naquele ano (BRASIL, 2009). O gráfico abaixo, disponibilizado pelo INFOPEN, mostra o crescimento no déficit de vagas nos presídios brasileiros ao longo dos anos, em paralelo com a evolução da população prisional. Gráfico 3: Evolução da população prisional, vagas e déficit de vagas entre 2000 e 2016. Fonte: Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias – INFOPEN (2016) Disponível em: < http://depen.gov.br/DEPEN/noticias-1/noticias/infopen-levantamento-nacional-de-informacoes-penitenciarias- 2016/relatorio_2016_22111.pdf>. Acesso em: 28 de abr. 2019.
  • 30. 30 Ainda de acordo com o relatório do INFOPEN, jovens com idade entre 18 e 29 anos são mais da metade da população carcerária brasileira, representando um total de 55%. Além disso, foi constatado que 64% dos presos são negros. Quanto ao grau de escolaridade, 51% não concluíram o ensino fundamental. Os indivíduos com ensino superior completo não chegam nem a 1%. O crime de tráfico de drogas, previsto na Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006, corresponde a 26% das condenações masculinas e a 62% das condenações femininas. Em conformidade com os dados, fica fácil perceber que a maiorias das pessoas presas são jovens, negras e com escolaridade baixa. Para compreender melhor o motivo de apenas um grupo tão específico estar liderando as ocupações prisionais, precisamos voltar um pouco no tempo para entender a história do negro no Brasil. É o que explica FERNANDES (2008, p. 29 apud LEMOS, 2018, p. 38): A inserção do negro se deu de forma abrupta. Ele foi transformado “em senhor de si mesmo, tornando-se responsável por sua pessoa e por seus dependentes, embora não dispusesse de meios materiais e morais para realizar essa proeza no quadro de uma economia competitiva”. Assim, a abolição teve “um caráter de espoliação extrema e cruel”. Aos senhores, o direito a indenizações pela perda de propriedade, aos negros, o caminho da rua, do desespero e das ocupações laborais mais degradantes. É historicamente comprovado que o negro por muitos anos ficou à margem da sociedade, sua imagem sendo até hoje relacionada a “cara de bandido”, e sendo a população negra a que mais é assassinada atualmente no Brasil. É o que revela o Atlas da Violência 2018, estudo elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública. A taxa de homicídios pessoas negras no país foi de 40,2, enquanto a de não negros ficou em 16,0%7 . A falta de políticas sociais efetivas cede espaço para o fortalecimento de políticas penais, e o fortalecimento de políticas penais resulta no nosso atual 7 BRASIL, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA. Atlas da Violência 2018. Brasilia, 2018. Disponível em: http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=33410&Itemid=432. Acesso em 7 de mai. 2019.
  • 31. 31 cenário penitenciário: caótico e desumano. Estudos feitos pelo Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul em conjunto com Daniel Cerqueira, pesquisador no Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas – IPEA confirmam a importância do investimento em políticas sociais, principalmente no que tange a educação. O resultado aponta que quanto maior a taxa de escolarização, menores são os registros de violência. (GALLISA, 2010).
  • 32. 3 CAPÍTULO III 3.1 OS DIREITOS HUMANOS VIOLADOS JUNTAMENTE COM A PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE O Brasil conta com uma ampla legislação no que diz respeito ao direito do encarcerado e a estrutura dos estabelecimentos prisionais, mas como visto anteriormente, as normas dificilmente são respeitadas e os presos em sua maioria recebem um tratamento abominável. Os direitos violados estão muito bem explicitados na CPI do Sistema Carcerário Brasileiro (BRASIL, 2009). Nesse capítulo, os principais direitos violados serão abordados. Entre eles, o direito a acomodações higiênicas. O art. 13 da Lei de Execução Penal prevê que o estabelecimento prisional deve dispor de instalações e serviços que atendam as necessidades do preso, entretanto, de acordo com as diligências feitas pela CPI, foi constatado que a maioria das penitenciárias não possuía instalações apropriadas à alocação individual do preso, e que quando eram alojados de forma coletiva, não eram fornecidas as mínimas condições de acomodação digna. Por fim, foi constatado que os presídios brasileiros estão longe de cumprir o que estabelece a legislação, como por exemplo o art. 88 da Lei de Execução Penal, já mencionado anteriormente, que estabelece as condições de acomodação nas penitenciárias, bem como o espaço (seis metros quadrados, no mínimo). Outra garantia não respeitada, é o direito à higiene. As Regras Mínimas das Nações Unidas para o Tratamento de Reclusos, também conhecidas como “Regras de Nelson Mandela” (UNODC, 2015), estabelecem que as instalações
  • 33. 33 sanitárias devem ser adequadas para que os reclusos possam realizar suas necessidades quando for necessário, de maneira limpa e decente, estabelece que as instalações próprias para o banho devem ser suficientes, de maneira a permitir que os presos tomem banho em uma temperatura adequada ao clima também determina que cabe ao Estado prover meios necessários ao cuidado da higiene nos reclusos, para que possam se apresentar corretamente e preservar o respeito por si próprios. Porém, o que a CPI encontrou nos estabelecimentos que fiscalizou, foram locais onde os presos por muitas vezes não tinham nem acesso à água corrente, tratada. Foi relatado que em diversos estabelecimentos, os presos improvisavam um cano sujo para poder beber água, e que em outros presídios, com celas superlotadas, os presos passavam dias sem tomar banho, devido a falta de água. Há ainda casos onde as celas são desprovidas de banheiro e pias, e quando os agentes da CPI encontravam tais instalações, eram tão precárias que comprometiam a privacidade do preso. Em outros casos, as instalações destinadas à higiene são localizadas em outras áreas, áreas essas que o preso não tem acesso, logo, não podem utiliza-las com frequência. O que deveria ser fornecido pelo Estado, como os itens necessários à higiene pessoal, também não é cumprido. Produtos como escovas de dente e sabonete ficam em falta, tendo o preso que compra-los no próprio estabelecimento penal, ou no mercado paralelo existente e explorado de forma clandestina. Grande parte dos presídios foi caracterizada como insalubre, com esgoto correndo pelos pátios, restos de comida e lixo por toda parte, o que causa a proliferação de insetos e ratos. Devido a esses fatores, o ambiente exala um odor que foi classificado como “insuportável”. Na cidade de Formosa, em Goiás, em uma cela da Cadeia Pública há 70 homens e apenas um banheiro, o que fez os presos chegarem a uma situação degradante: usar garrafas de plástico (PET) de dois litros para urinar quando o banheiro está ocupado. Em Minas Gerais, a CPI encontrou o denominado “banheiro vitrine”, que ganhou esse nome, pois os presos são obrigados a fazerem suas necessidades na frente de todos os outros companheiros de cela e também à
  • 34. 34 vista de quem estiver passando pelo corredor no momento. O motivo da falta de sanitários decentes na Cadeira Pública é a superlotação. A cela, de medidas 5x5, o que já está descumprindo o estabelecido na Lei de Execução Penal, precisou ser “reformada” a fim de abrigar mais presos. As paredes do banheiro foram derrubadas, deixando o vaso sanitário exposto no meio da cela. No momento da CPI, foram identificados pouco menos de 70 homens dentro da mesma cela. Além disso, como muitas vezes falta água os presos não têm como lavar as mãos, o que resulta em mau cheiro na cela, além de moscas, baratas e outros insetos. A alimentação também se tornou um problema. Mesmo sendo uma prerrogativa prevista nas Regras Mínimas da ONU como função do Estado, e na Lei de Execução Penal como parte da assistência material ao preso, a realidade encontrada pela CPI foi outra. No Ceará, a comida é fornecida em sacos plásticos. Os talheres não são fornecidos, então os detentos comem com as próprias mãos, as mesmas mãos que por diversas vezes não conseguem ser lavadas depois de ir ao banheiro. A falta de qualidade da comida fornecida foi quase unanimidade de reclamações nos estabelecimentos prisionais. Os presos relatam já ter encontrado fios de cabelo, baratas e objetos estranhos dentro das comidas, além de denunciarem comida azeda e estragada. Do lado de fora das celas, foram encontradas quentinhas amontoadas, que seriam jogadas no lixo, pois foram recusadas pelos presos, devido à péssima qualidade do alimento. Lourenço Filho (2018, p. 49) faz um relato similar: As refeições na prisão são de uma qualidade questionável, e por ser comida para preso, poucos questionam [...] As moscas passam a passar de bondão, o cheiro é nojento, e aquela tonelada de comida é descartada. Para os relatores da CPI, os detentos também denunciaram o uso de uma substância chamada “salitre” nas comidas. Tal fato posteriormente foi confirmado pelo diretor da Penitenciária de Urso Branco, em Rondônia. A substância estaria sendo usada com o objetivo de inibir o apetite e diminuir os desejos sexuais dos presos.
  • 35. 35 Prevista na Lei de Execução Penal e nas Regras Mínimas da ONU, a assistência médica também é um direito violado dos reclusos. Os estabelecimentos prisionais em tese deveriam disponibilizar serviços médicos, incluindo serviço psiquiátrico. O Estado também deveria ser o responsável pela observância dessa assistência. A CPI constatou que da quantidade total de presos existentes no país, apenas 20% tinham acesso às equipes de saúde. A assistência psicológica não tem previsão legal, o que torna mais difícil sua garantia. De acordo com a CPI, o ambiente carcerário além de ser propagador de doenças, também transmite entre seus detentos a psicose carcerária, que surge devido ao ambiente hostil, opressor e insalubre onde esses indivíduos cumprem a pena. A CPI entende que é essencial submeter os presos a exames médicos, onde possam ser avaliados por profissionais especializados, individualmente e regularmente, para que um acompanhamento desde o início seja possível. Além disso, foi constatado que cerca de 20% da população carcerária possui o vírus HIV, sendo primordial o incentivo a testes voluntários para detectar o vírus e controla-lo o quanto antes. No que tange à assistência jurídica, a CPI verificou que há uma deficiência desde o momento da prisão. Como consta no relatório do INFOPEN, a maioria dos presos são jovens, negros, de baixa renda e baixa escolaridade. “No ato da prisão, o aparelho policial age sempre com prepotência, abuso de poder, sonegação de direitos e, não raro, com violência.” (BRASIL, 2009, p.214). Foram denunciados à CPI inúmeros casos de flagrantes forjados e de maus tratos praticados pelos policiais. A deficiência jurídica piora, pois a maioria esmagadora dos reclusos não tem condições de pagar um advogado particular, e mesmo sendo determinado por lei que seja concedida assistência jurídica aos presos de baixa renda, não há defensores públicos o suficiente para atender toda a demanda. Nesses casos, o juiz do processo nomeia um defensor dativo. De acordo com a definição usada no relatório da CPI: O defensor dativo é um advogado que o Juiz dá, como se fosse uma esmola, ao réu pobre e sem advogado. Quase sempre o Juiz implora a um advogado conhecido, ou que se encontra em uma audiência ou que vai passando pelos corredores do fórum, para que faça o favor de fazer a defesa do réu pobre. Na
  • 36. 36 maioria das comarcas em que não há nem “cheiro” de Defensor Público e onde a pobreza é acentuada, em especial entre a ação parlamentar 216 Relatório Final população rural, a única alternativa do Juiz é também pedir uma esmola aos raros advogados que por ali militam. (BRASIL, 2009, p. 215-216). Ainda, em outro trecho, foi relatado que: O advogado “doado” pelo Juiz faz de conta que faz defesa. A defesa prévia se resume a poucas linhas. Não promove a produção de provas e não requer diligências. Nas audiências não faz qualquer intervenção. As alegações finais são quase inexistentes e, não raro, deixa de recorrer de decisões condenatórias. Essa carência real, que acaba se transformando em piedade, em muitos casos, e promiscuidade, em outros, tem como consequência imediata a falta de defesa efetiva, real e eficiente em favor do réu, com resultado negativo ao réu no final do processo. (BRASIL, 2009, p. 216) A CPI deixa claro que há casos onde o defensor dativo de fato faz um bom trabalho, mas de acordo com as diligências que realizou, é notório que não se trata da maioria. Importante salientar que o direito à assistência jurídica é previsto na Lei de Execução Penal em seu art. 15, na Constituição Federal em seu art. 5°, LXXIV, bem como no art. 17 dos Princípios para a Proteção de Todas as Pessoas Sujeitas a Qualquer forma de Detenção ou Prisão (ONU,1988). A CPI também constatou em suas diligências uma total falta de assistência social aos presos, e caracteriza essa deficiência como um fator agravante da crise do sistema prisional brasileiro, além de ser uma barreira a mais no processo de ressocialização dos indivíduos encarcerados. Nesse sentido, entende que: Os egressos, após anos em estabelecimentos deformados e corrompidos, são colocados no olho da rua, literalmente sem lenço, sem documento, sem destino, sem rumo. A falta e insuficiência dos serviços de assistência social nos estabelecimentos penais contrariam a legislação nacional e internacional. (BRASIL 2009, p. 235). Os artigos 25, 26 e 27 da Lei de Execução Penal versam sobre a assistência que deve ser fornecida ao egresso. Menciona o apoio e orientação que devem ser dados à ele, para que o mesmo possa reingressar à sociedade, além de prever a colaboração do serviço de assistência social ao preso para que ele obtenha trabalho. Ainda de acordo com a Lei de Execução Penal,
  • 37. 37 agora em seu art. 78, tal assistência social é de responsabilidade do patronato público ou particular. O patronato consiste em um tipo de instituição que atua para auxiliar no exercício da execução penal, fornecendo assistência a egressos e albergados. “O estabelecimento penal deverá ter lotação compatível com a sua estrutura e finalidade.” É o que estabelece o art. 85 da Lei de Execução Penal. Entretanto, como já foi mencionado ao longo deste trabalho, sabemos que não é isso que ocorre. De acordo com a CPI, as unidades prisionais que respeitam a lotação máxima de cada cela são raras. Além disso, foi identificada uma quantidade significativa de pessoas cumprindo pena em cadeias públicas, que por sua vez não apresenta o mínimo de estrutura adequada ao cumprimento de pena em longo prazo. O art. 102 da Lei de Execução Penal faz a clara distinção desses tipos de estabelecimentos penais. A superlotação é um problema que atinge as penitenciarias brasileiras desde 1976, e até hoje nada foi feito a respeito. Apontado como um dos fatores principais de violação de direitos, as celas superlotadas contribuem para a geração de novos problemas, pois acarretam em condições insalubres de permanência, higiene, além de ser um ambiente mais propício a propagação de doenças e de estimular motins, rebeliões e episódios de violência, tanto entre presos quanto entre alguns presos e um agente penitenciário. Foram identificados nas diligências realizadas casos onde os presos estavam nus dentro da cela, em um calor insuportável. Redes substituindo camas, uma em cima da outra para ter mais espaço, mulheres com crianças recém-nascidas dentro de uma cela minúscula com outras tantas mulheres, celas sem luz, celas onde os presos faziam suas necessidades em garrafas ou em buracos no chão. Essa foi a realidade encontrada. A CPI identificou algumas possíveis causas da superlotação nas unidades penais brasileiras, entre elas: a fúria condenatória do poder judiciário, a constante preferência pelo encarceramento como forma de pena, ao invés de buscar medidas alternativas, o mecanismo legal que é voltado para o enrijecimento das penas e a falta de construções de estabelecimentos
  • 38. 38 prisionais, não só de penitenciárias, mas também de outros tipos de estabelecimentos. É importante compreender que resolver o problema da superlotação representaria um grande passo em direção ao avanço, à caminho da humanização do sistema carcerário, respeitando os direitos e deveres dos presos e garantindo que seja cumprido o que é estabelecido por lei. Após a realização das diligências, o relator da CPI afirma com segurança que o sistema penitenciário brasileiro é um campo de tortura, sejam elas físicas ou psicológicas. Analisa: Do ponto de vista psicológico, a tortura é ampla, de massa e quase irrestrita. Para comprovação das torturas psicológicas e o desrespeito à integridade moral dos presos, basta a existência de celas superlotadas; a falta de espaço físico; a inexistência de água, luz, material higiênico, banho de sol; a constatação de lixo, esgotos, ratos, baratas e porcos misturados com os encarcerados; presos doentes, sem atendimento médico, amontoados em celas imundas, e outras situações descritas nas diligências, fotografadas e filmadas. (BRASIL, 2009, p. 270). Samuel Lourenço Filho também fala sobre o tema. Relata os dias onde os agentes penitenciários anunciavam que iriam conferir as celas. Eram gritos, barulhos de barra de ferro batendo nas paredes e pavor geral. Os detentos eram retirados das celas e enfileirados, submetidos a situações extremas de estresse, onde um simples bocejar poderia desencadear uma reação violenta por parte do agente. Qualquer movimento brusco, até mesmo um espirro, poderia ser considerado como “falta de respeito”, e se isso acontecesse, a violência e humilhação como formas de punição eram dadas como certas. (LOURENÇO FILHO, 2018).
  • 39. 4 CONCLUSÃO O objetivo do presente trabalho foi abordar dois temas paralelos, isto é, o que a lei prevê como garantia do indivíduo encarcerado e o que o Estado deveria garantir a esse indivíduo, mas não o faz, para que no último capítulo o leitor pudesse fazer uma análise conjunta destes. Além disso, o trabalho também buscou verificar se o Brasil está cumprindo o seu papel no que tange à proteção dos direitos humanos, em especial no sistema carcerário brasileiro. Através das apresentações de pesquisas reais, como o relatório do INFOPEN e os resultados obtidos na CPI do Sistema carcerário brasileiro, ficou explicitada a realidade dos presos e constatada as diversas formas de violação aos seus direitos. Pode-se concluir que o Estado não tem cumprido o seu papel garantidor e fiscalizador de direitos. A perpetuação da cultura do encarceramento do país teve como resultado o aumento de 700% da população carcerária total em um intervalo de menos de trinta anos, e junto com esse pensamento de que para tirar o crime das ruas, o jeito é apenas aplicar a pena privativa de liberdade, o que se tem atualmente é o que muitos estudiosos chamam de crise penitenciária, sendo a superlotação um dos principais e mais graves problemas. Fica claro que a atual solução paliativa não é eficaz. O processo de execução penal é de responsabilidade do Estado, que em tese tem como objetivo principal a ressocialização do indivíduo. Entretanto, da
  • 40. 40 maneira como os presos vêm sendo tratados, conclui-se que o Estado além de não estar cumprindo o seu papel, está permitindo a violação de direitos. De acordo com os dados do INFOPEN, concluiu-se que a maioria dos presos hoje são jovens, negros, de baixa renda e baixa escolaridade. Isso mostra que a falta de politicas sociais efetivas reflete diretamente no futuro dessas pessoas. Não obstante, tornou-se necessário também falar sobre a quantidade de pessoas negras nas penitenciárias. Por serem estigmatizados com a falácia da “cara de bandido”, acabam sofrendo mais as consequências sociais e econômicas do que a população não negra. Foram apontadas como as principais violações: falta de acomodações decentes, falta de ambientes para preservação da higiene dos presos, como por exemplo chuveiros e sanitários, falta de assistência médica, psicológica e jurídica, déficit na implementação de politicas eficazes de assistência ao egresso, constantes torturas e maus tratos, além da superlotação mencionada anteriormente. Entende-se que se trata de um ambiente caótico de degradante, que vai para o lado oposto do que prega o princípio da dignidade da pessoa humana. Faz-se extremamente necessário e urgente a tomada de decisões práticas e de implementação de politicas de assistência na vida dos reclusos, para que seja possível mudar o atual quadro. Ainda que cumprindo pena, tratam-se de pessoas, que não podem ser jogadas à margem da sociedade como lixo, como algo indigno. Há uma preocupação com a integridade física, moral e mental desses indivíduos. Conclui-se que infringir os direitos humanos do condenado não vai fazer com que ele aprenda algum tipo de “lição”, tampouco garante que o mesmo não vai voltar a cometer crimes. Tal pensamento agressivo e vingativo que ainda paira sobre uma parte da sociedade parece não levar em consideração que cedo ou tarde, a maioria dos egressos vai ser reinserido na sociedade, e trata-los de maneira desumana e vexatória só prejudica o processo de ressocialização dos mesmos.
  • 41. 41 Investimentos em educação, saúde e politicas sociais no geral são soluções preventivas a esse problema. A educação é o caminho. Por ora, é preciso do apoio das autoridades competentes, para garantir que o condenado cumpra sim pelo crime que cometeu, mas em condições adequadas e previstas em lei. Por fim, ressalta-se a importância de políticas ressocializadoras, e a expectativa é de que as autoridades competentes e o ordenamento jurídico comecem a se manifestar perante a barbárie. Além disso, espera-se que os direitos humanos sejam mais respeitados, e que parem de ser associados a “direito de bandido”. Antes de ser apenas mais um número no imenso sistema de execuções penais, o preso é humano, e merece ser tratado com a mesma dignidade do que os outros.
  • 42. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AMARAL, Luciana Maria Oliveira do. Liberdades Públicas: Conceito, Proteção e Limites dentro da perspectiva do constitucionalismo aplicada no Brasil. Jornal Jurid 2009. Disponível em: https://www.jornaljurid.com.br/noticias/liberdades-publicas-conceito-protecao-e- limites-dentro-da-perspectiva-do-constitucionalismo-aplicada-no-brasil. Acesso em: 30 de mar. 2019. BARRETO, Eduardo. O Globo: Brasil é o terceiro país com mais presos no mundo, diz levantamento. 2017. Disponível em: https://oglobo.globo.com/brasil/brasil-o-terceiro-pais-com-mais-presos-no- mundo-diz-levantamento-22166270. Acesso em 28 de abr. 2019. BARROSO, Luís Roberto. A Dignidade da Pessoa Humana no Direito Constitucional Contemporâneo: Natureza Jurídica, Conteúdos Mínimos e Critérios de Aplicação. Versão provisória para debate público. Mimeografado, dezembro de 2010. Disponível em http://luisrobertobarroso.com.br/wp- content/uploads/2016/06/Dignidade_texto-base_11dez2010.pdf. Acesso em 24 de abr. 2019. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. As Constituições do Brasil. Brasília, 2008. Disponível em http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=97174. Acesso em 22 de abr. 2019. BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil: Texto Constitucional Promulgado em 5 de outubro de 1988. Brasília, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm. Acesso em: 01 de abr. 2019. BRASIL, Conselho Nacional do Ministério Público. Taxa de ocupação dos presídios brasileiros é de 175%, mostra relatório dinâmico "Sistema Prisional em números”. Brasília, 2018. Disponível em: http://www.cnmp.mp.br/portal/todas-as-noticias/11314-taxa-de-ocupacao-dos- presidios-brasileiros-e-de-175-mostra-relatorio-dinamico-sistema-prisional-em- numeros. Acesso em: 28 de abr. 2019.
  • 43. 43 BRASIL, Câmara dos Deputados, Comissão Parlamentar de Inquérito – CPI do Sistema Carcerário Brasileiro. Brasília : Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2009. 620 p. – (Série ação parlamentar; n. 384). Disponível em: http://bd.camara.leg.br/bd/handle/bdcamara/2701. Acesso em 7 de mai. 2019. BRASIL, Decreto Nº 3.298/99, Regulamenta a Lei no 7.853, de 24 de outubro de 1989, dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, consolida as normas de proteção, e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d3298.htm. Acesso em 7 de mai. 2019. BRASIL, Lei Nº 7.210, de 11 de julho de 1984 – Lei de Execução Penal. Estabelece os direitos e deveres do indivíduo encarcerado nas penitenciárias brasileiras. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L7210.htm Acesso em: 02 de abr. 2019. BRASIL, Lei N° 9.455, de 7 de abril de 1997. Define os crimes de tortura e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9455.htm. Acesso em: 27 de abr. 2019. BRASIL, Lei Nº 11.343, de 23 de agosto de 2006. Institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas - Sisnad; prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas; estabelece normas para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas; define crimes e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004- 2006/2006/lei/l11343.htm. Acesso em 7 de mai. 2019. BRASIL, Ministério da Justiça e Segurança Pública, Departamento Penitenciário Nacional – DEPEN. Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias – INFOPEN, Atualização de Junho de 2016. Disponível em: http://depen.gov.br/DEPEN/noticias-1/noticias/infopen-levantamento-nacional- de-informacoes-penitenciarias-2016/relatorio_2016_22111.pdf. Acesso em: 28 de abr. 2019. BRASIL, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA. Atlas da Violência 2018. Brasilia, 2018. Disponível em: http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=3 3410&Itemid=432. Acesso em 7 de mai. 2019. CAMARA DOS DEPUTADOS, Comissão de Direitos Humanos e Minorias. Conjunto de Princípios para a Proteção de Todas as Pessoas Sujeitas a Qualquer Forma de Detenção ou Prisão. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/comissoes/comissoes- permanentes/cdhm/comite-brasileiro-de-direitos-humanos-e-politica- externa/ConjPrinProtPesSujQuaForDetPri.html?fbclid=IwAR36Kd- 3j_ZxSYdpKHbV5tWEIFsysYmmo4yWkR_gVPCBLhg1FxiLYfx8bYE. Acesso em 11 de mai. 2019.
  • 44. 44 CICONELLO, Alexandre. Presídios: Omissão do Estado, indiferença da sociedade. Disponível em: https://www.revistaforum.com.br/digital/131/presidios-omissao-estado- indiferenca-da-sociedade/. Acesso em: 30 de abr. 2019. CRUZ, Elaine Patrícia. Existe cultura jurídica de encarceramento no Brasil. Agência Brasil. São Paulo, 2017. Disponível em: http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2017-02/existe-cultura-juridica-de- encarceramento-no-brasil-diz-juiz-paulista. Acesso em 28 de abr. 2019. DIAS, Diomar Cândida Pereira. Teoria da Pena – Evolução Histórica da Pena Como Vingança. Revista Jus Vigilantibus, 2005. Disponível em: www.jusvi.com/artigos/16962. Acesso em: 30 de mar. 2019. DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico Universitário. 3º ed. São José dos Campos: Ed. Saraiva, 2017. DÓRIA, Antônio Sampaio. Direito Constitucional. 3º ed. São Paulo: Cia. Ed. Nacional, 1953. ESCOLA DE FORMAÇÃO E APERFEIÇOAMENTO PENITENCIÁRIO - ESPEN (Paraná). A história das prisões e dos sistemas de punições. Disponível em: http://www.espen.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=102. Acesso em: 30 de mar. 2019. ESTEFAM, André. Direito penal, 1: parte geral. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA (FBSP). Anuário Brasileiro de Segurança Pública. São Paulo, 2016. Disponível em: http://www.forumseguranca.org.br/storage/10_anuario_site_18-11-2016- retificado.pdf. Acesso em: 29 de abr. 2019. GALLISA, Cristine. G1: Pesquisas apontam educação como 'escudo' contra criminalidade. 2017. Disponível em: https://g1.globo.com/rs/rio-grande-do- sul/noticia/pesquisas-apontam-educacao-como-escudo-contra- criminalidade.ghtml. Acesso em 7 de mai. 2019. JESUS, Damásio E. de. Direito penal, volume 1: parte geral. 31. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. LEMOS, Carolyne dos Santos. Dissertação Mestrado: A prisão no capitalismo dependente: encarceramento massivo de negros no Brasil. Espírito Santo, 2018. Disponível em: http://repositorio.ufes.br/jspui/bitstream/10/10859/1/tese_12764_Carolyne%20L emos.pdf. Acesso em 7 de mai. 2019. LEVANTAMENTO NACIONAL DE INFORMAÇÕES PENITENCIÁRIAS: INFOPEN. Atualização – jun. de 2016. Brasília: Ministério da Justiça e
  • 45. 45 Segurança Pública. Departamento Penitenciário Nacional, 2017. Disponível em: http://depen.gov.br/DEPEN/noticias-1/noticias/infopen-levantamento- nacional-de-informacoes-penitenciarias-2016/relatorio_2016_22111.pdf. Acesso em: 28 de abr. 2019. LOURENÇO FILHO, Samuel. Além das Grades. 1° ed. Rio de Janeiro: NotaTerapia, 2018. MARCÃO, Renato. Curso de execução Penal. 8. ed. São Paulo, Saraiva, 2010. MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 33. ed. São Paulo: Atlas, 2016. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS – ONU. Declaração Universal dos Direitos Humanos. Brasil, 2009. Disponível em: https://nacoesunidas.org/wp- content/uploads/2018/10/DUDH.pdf. Acesso em 05 de abr. 2019. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS – ONU. Conjunto de Princípios para a Proteção de Todas as Pessoas Sujeitas a Qualquer Forma de Detenção ou Prisão. Brasil, 1988. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/comissoes/comissoes- permanentes/cdhm/comite-brasileiro-de-direitos-humanos-e-politica- externa/ConjPrinProtPesSujQuaForDetPri.html. Acesso em 07 de abr. 2019. PASSOS, José Joaquim Calmon de. Direito, Poder, Justiça e Processo: julgando os que nos julgam. Rio de Janeiro: Forense, 2003. PEREIRA, Ângela Miranda. Os direitos do preso à luz do princípio da dignidade da pessoa humana. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XVI, n. 116, set 2013. Disponível em: http://www.ambito- juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=13682. Acesso em 25 de abr. 2019. RAMOS, André de Carvalho. Curso de Direitos Humanos. 4 ed. São Paulo: Saraiva, 2017. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 40. ed. São Paulo: Malheiros, 2017. UNODC – Escritório das Nações Unidas Sobre Drogas e Crime. Regras Mínimas das Nações Unidas para o Tratamento de Reclusos – Regras de Nelson Mandela. Brasil, 2015. Disponível em: https://www.unodc.org/documents/justice-and-prison- reform/Nelson_Mandela_Rules-P- ebook.pdf?fbclid=IwAR1ZBOfVtLs6MvtaEnPVGDQuJEt068zTYl849VNm54KQh OhXxHNfY850WsQ. Acesso em 11 de mai. 2019.