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2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Xanxerê
PROMOÇÃO DE ARQUIVAMENTO
Inquérito Civil Público nº 06.2014.00010980-9
"Criação de Saguis - Resolução nº 8/2012, Consema - Inconstitucionalidade"
O presente Inquérito Civil Público foi instaurado com o seguinte
objeto: "Criação de Saguis - Resolução nº 8/2012, Consema -
Inconstitucionalidade", a partir de representação da Associação Brasileira de
Criadores e Comerciantes de Animais Silvestres e Exóticos.
Em síntese, narrava a representação que a Resolução nº 8/2012,
do Consema, havia proibido de forma inconstitucional a criação comercial de
diversos animais silvestres em violação à livre iniciativa, à competência da
União, aos valores sociais do trabalho e à legislação pertinente.
A representação foi apresentada pessoalmente a mim no
atendimento ao público, pelo sr. Vilson Zarembski, criador de saguis e
macacos-prego no Criadouro Aves do Paraíso, interior de Município de
Xanxerê. Na oportunidade, além de argumentar contra a proibição, ressaltou
que vinha até então sendo reconhecido, inclusive em diversas matérias
jornalísticas, como exemplo de criador de macacos domesticados, por conta
da seriedade do trabalho realizado durante toda a sua vida.
Juntou diversos pareceres, requerimentos, jurisprudência notas
técnicas e estudos, sustentando a inadequação da proibição da Resolução
nº8/2012 em relação a três espécies de sagui: Callithrix geoffroy, Callithrix
jacchus e Callithrix penicilata.
Informou que a proibição decorre da aceitação, pelo Consema,
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2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Xanxerê
das seguintes premissas, todas equivocadas segundo a argumentação do
representante: a) saguis criados em ambiente domiciliar tornam-se ariscos e
são abandonados pelos proprietários; b) saguis abandonados no meio
ambiente se reproduzem com rapidez e se tornam invasores, ameaçando
aves, por se alimentarem de seus ovos; c) saguis criados em domicílio são
transmissores de diversas doenças; d) saguis criados em domicílio apresentam
problemas nutricionais e de comportamento, causando mal-estar animal.
Vilson Zarembski argumenta, em essência, que os saguis
tornaram-se invasoras pela forma como foram soltas irresponsavelmente
durante anos na Ilha de Santa Catarina e em outros ambientes litorâneos do
que pelas características da espécie em si. Corrobora seu argumento o parecer
de fl. 44, que declara que os saguis "foram de forma contumaz
comercializadas de forma ilegal, sem nenhuma submissão a regulamentos e
portanto, não havendo precauções para possíveis casos de fugas".
Historicamente, segundo o parecer, "as autoridades foram as maiores
dispersoras das espécies, uma vez que os exemplares frutos de apreensão
eram amplamente soltos como forma de demonstrar que os animais não eram
cativos e sim selvagens".
Por outro lado, o parecer reforça a informação de que, ao
contrário dos animais vítimas de contrabando, os animais domesticados são
vendidos licitamente com informações claras a respeito das normas de
segurança, por alto preço (o que os faz serem facilmente absorvidos por
outros criadores ou consumidores, em caso de desistência do adquirente),
além de, por conta da domesticação, não terem condições de vida autônoma
no meio ambiente (morrem em poucas semanas em caso de fuga).
Consultei na sequência o Centro de Apoio de Informações
Técnicas e Pesquisas, do Ministério Público do Estado de Santa Catarina, que
apresentou resposta à fl. 76. Foi relevante para a decisão final deste inquérito
civil público a informação de que, embora de fato tratem-se de espécies
exóticas com potencial invasor, "a castração dos animais é suficiente para
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impedir que populações desse animal na natureza surjam ou aumentem" (fl.
76v). Também foi relevante para a conclusão a que cheguei a informação de
que cães e gatos também são considerados espécies exóticas com potencial
invasor, mas apenas não têm a venda proibida por questões culturais
("consolidação do comércio").
Para maiores esclarecimentos, requisitei informações à
Secretária de Desenvolvimento Econômico e Sustentável do Estado de Santa
Catarina e fiz juntar aos autos notícias jornalísticas que tratavam do tema.
A primeira das matérias jornalísticas (fl. 83) registra que os
saguis sobrevivem no inverno da Região Sul (são endêmicos do Norte e
Nordeste do país) porque a população os mantém alimentados. A matéria, que
conta com a entrevista da bióloga Cristina Valéria Santos, qualificada por
quinze anos de estudos dos animais, "desfaz o mito de que os saguis comem
ovos de aves": "no cardápio apreciado pelo sagui estão insetos, pequenos
vertebrados e frutas" (fl. 83v).
A matéria também registra que a proliferação de saguis decorreu
de uma prática permitida nas décadas de 1950, 60 e 70. Os animais foram
trazidos por caminhoneiros do Nordeste e Sudeste como um mimo ou
mercadoria, e acabaram sendo soltos na natureza quando demonstravam
comportamento agressivo ao tentarem ser domesticados.
Na sequência, desenvolvi diversas reuniões com o sr. Vilson
Zarembski, que fez juntar aos autos os modelos do "Manual Técnico" que
fornece juntamente com os animais vendidos. Nestes documentos se lê
detalhes científicos dos animais e detalhadas informações sobre a reprodução,
alimentação, aleitamento, instalações e higiene, vacinas e controle de
doenças, obrigações e cuidados urgentes.
Apresentou também atestado médico veterinário que entrega
aos adquirentes. Nesse documento se observa que os animais são
identificados com microchip e que há registro de castração pelo veterinário.
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2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Xanxerê
Aportou aos autos a resposta da Secretária de Estado, que
trouxe interessantes relatórios dos seminários regionais de preparação para o
programa estadual de controle de espécies exóticas invasoras. Nas atas das
reuniões de Canoinhas, Blumenau, Chapecó, Lages, Criciúma, Florianópolis e
São José foram registradas as espécies invasoras relatadas pelos presentes.
Foi importante para a conclusão deste inquérito civil público o fato de
nenhuma das espécies de saguis terem sido referidas nas reuniões (fls. 171-
180).
Apresentou também a Secretária de Estado cópia de um e-mail
subscrito por Gabriela Breda, do Ibama, informando que "inexistem criadores
legalizados no Estado" e que os fundamentos para a proibição seriam: os
saguis são "altamente predatórios de ninhos de aves nativas"; "nenhum
estabelecimento seria prejudicado" com a proibição; os "saguis não se
adaptam ao cativeiro domiciliar" (fl. 251).
Tais dados contrariam os demais pareceres até então existentes
nos autos, notadamente quanto à predação de ninhos, o que é negado pelo
documento de fl. 83.
Nos documentos enviados também se observa a existência de
um parecer da Abrase (representante), subscrito por Geógrafo, Médico
Veterinário e Advogado, que conclui que os fundamentos da proibição de
saguis seriam igualmente aplicáveis a cães e gatos, que, contraditoriamente,
contudo, não foram igualmente proibidos: "a existência das três espécies de
primatas [saguis] na norma ora comentada carece de fundamentação técnica
sustentável e aplicável sem que na mesma norma apareçam os animais
domésticos citados [cães e gatos]" (fl. 268).
Outro estudo, desta feita subscrito por três analistas ambientais
do Ibama, ressalta que os primatas podem transmitir protozoários devido à
falta de higiene satisfatória dos locais em que são criados (fl. 276). O mesmo
estudo aponta ainda problemas comportamentais pela falta de contato com o
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2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Xanxerê
ambiente natural, além de solturas e entregas voluntárias e da alimentação
inadequada em cativeiro. Foi relevante para as conclusões deste inquérito civil
público a constatação de que os estudos que serviram de base para as
conclusões terem tido como base de dados somente animais cativos em
zoológicos e instituições, o que demonstra que as conclusões podem não se
aplicar a animais domésticos.
Em resposta ao meu ofício requisitando informações sobre
eventual diminuição de riscos em caso de castração dos animais a serem
comercializados, sobreveio também aos autos e-mail subscirto por Beloni
Terezinha Marterer informando que em caso de castração, ainda assim há
possibilidade de transmissão de doenças para a fauna silvestre e para
pessoas, como por exemplo as ameaças ao mico-leão dourado. Informou o e-
mail também que os saguis domesticados tornam-se agressivos com a
puberdade.
Aportou também aos autos relatório científico (fl. 295) da lavra
de Luciana Zago que informa que em 506 horas de observação foi registrada
"baixa taxa de predação aos ovos de aves", o que contraria a informação do e-
mail de fl. 251, de Gabriela Breda, do Ibama.
Artigo intitulado O problema dos saguis introduzidos no Rio de
Janeiro também refere como causas da abundância dos animais o "tráfico
ilegal de animais selvagens" e "três grandes solturas", com 80 animais ou
mais cada uma, ocorridas há 20 anos.
Também foi importante para as conclusões deste inquérito civil
público a informação do estudo denominado Clinical Care and Diseases of the
Common Marmoset. A pesquisadora Elisabeth Ludlage, da Universidade de
Medicina de Harvard concluiu que "estes animais [saguis] são facilmente
mantidos em cativeiro, e a saúde do grupo pode ser mantida em nível alto
através de um rigoroso programa de prevenção, detecção precoce de doenças
e através de cuidados veterinários" (fl. 357, traduzi livremente). Neste ponto
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2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Xanxerê
também parece haver contradição, embora não muito explícita, entre a
informação de que os saguis têm saúde debilitada em cativeiro e não são
facilmente domesticados.
Outro estudo levado em consideração foi O Efeito do Sagui sobre
a Taxa de Predação de Ninhos na Ilha Grande, RJ, de Souza W.S. O
pesquisador reportou grande taxa de ataques de saguis a ninhos artificiais,
instalados com ovos de codorna (fl. 360). Este estudo contém conclusão
diversa do estudo da fl. 295, em que Luciana Zago, em observação natural,
não identificou o mesmo fenômeno. A divergência pode decorrer da falta de
proteção que os ninhos artificiais têm em relação aos ninhos naturais (não há
aves para afugentar os predadores).
Seguiram-se ainda diversas notícias jornalísticas demonstrando
interações entre saguis e humanos, como a de uma criança vitimada por raiva
humana transmitida por sagui (fl. 379) ou de apreensões urbanas de saguis
ilegalmente inseridos no meio ambiente urbano (fl. 376).
Dando sequência à instrução do inquérito civil, conferiu-se
oportunidade ao interessado Vilson Carlos Zarembski para demonstrar suas
ponderações a respeito dos pareceres, estudos e demais documentos
apresentados pela Secretária de Desenvolvimento.
Por intermédio de advogado, o interessado informou que os
animais são nascidos em cativeiro e domesticados desde cedo, de modo a se
adaptarem ao meio humano sem rejeição. Cita diversos adquirentes e a
inexistência de reclamações. Sobre as doenças antrópicas, argumenta que já
são parte do meio humanizado e que não são exclusivos dos primatas, mas
também de outras espécies domesticadas. Afirma ainda que os saguis criados
em cativeiro que vende não sobrevivem fora do ambiente domiciliar e que os
indivíduos agressivos são geralmente oriundos do tráfico ilegal e da falta de
orientação para cuidados. Questiona a posição dos órgãos ambientais
argumentando que os adquirentes dos saguis criados em cativeiro jamais
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2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Xanxerê
foram ouvidos, o que faria derruir as premissas dos estudos. Informa também
que na alimentação dos saguis são incluídos elementos típicos de sua dieta,
tais como goma de árvore, frutas silvestres e insetos. Cita, por fim,
jurisprudência em que maçados-prego foram devolvidos aos seus donos por
considerarem os tribunais que a domesticação, ainda que irregular, tornou
impossível ao animal viver livre no meio ambiente (fl. 391).
Apresentou juntamente com a petição extenso parecer técnico,
subscrito pelo médico veterinário Marcus Vinícius Cândido. O parecer critica
veementemente as premissas e conclusões da nota técnica que embasou a
resolução citada. Informa que o documento "apresenta uma série de
inconsistências técnicas" e que "um argumento notavelmente falacioso refere-
se ao potencial invasivo de primatas nascidos em cativeiro" (fl. 410).
Argumenta que os saguis soltos em áreas urbanas são descendentes de
adultos provenientes do tráfico ilegal ocorrido na década de 1980. "Seus
contrapartes nascidos em cativeiro, no entanto, tendem a procurar contato
com humanos, não conseguem sequer se deslocar nas árvores [...] tendem a
ficar imóveis e amedrontados até serem finalmente predados". E afirma que a
castração "anula completamente o risco de dano relacionado à sua
proliferação" (fl. 411).
Esclarece também que "o texto [da nota técnica do Consema]
deixa transparecer desconcertante falta de conhecimento quanto aos parasitas
abordados", discorrendo longamente sobre as características das doenças que
acometem os animais para concluir que "não há razão para crer que a
probabilidade de contrair esses parasitas ou doenças de animais de estimação
seja maior que ao andar de ônibus ou ir à escola" e que "quase todos os
mamíferos podem ser portadores de Giardia, e especialmente os cães e
gatos". "O contágio da raiva é praticamente nulo", lembrando ainda que os
principais transmissores são o cão e o gato. O herpes-vírus simiae só tem
como portadores, segundo o parecer, macacos do Velho Mundo. As
necessidades nutricionais são bem conhecidas, também de acordo com o
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médico veterinário, e há rações fabricadas a anos no território nacional para
tais espécies. Os problemas odontológicos são os mesmos que atingem cães e
gatos submetidos a dietas inadequadas.
Sobrevieram novos documentos e estudos científicos acerca dos
benefícios da criação dos saguis com fins comerciais, sempre enfatizando o
efeito dissuasório da criação comercial frente ao tráfico ilegal. Juntaram-se aos
autos fotografias e relatos de proprietários narrando adequado
comportamento dos animais e gozo de excelente saúde.
Foram ainda juntadas aos autos declarações do gerente regional
da Fatma, Rafael Gasparini, e do presidente da Cidasc, Enori Barbieri,
abonando o Criadouro Aves do Paraíso, Vilson Zarembski.
Por fim, para melhor subsidiar a decisão a ser tomada neste
inquérito civil público, vistoriei pessoalmente a família de Paulo Marco de
Bastiani, subscritor do documento de fl. 421, no último dia 20 de fevereiro,
conforme ata de vistoria juntada aos autos.
É o relato de todas as diligências, documentos e constatações
deste inquérito civil público.
1) Inicialmente cumpre observar que não vejo elementos
suficientes para postular a declaração de inconstitucionalidade da Resolução
nº 8/2012 do Consema.
Embora se trate de ato normativo com graves reflexos
patrimoniais, como se viu no curso deste inquérito civil público, o Consema
tem legitimidade para disciplinar normativamente o controle de espécies
exóticas invasoras, de acordo com a Lei nº 14.675/2009.
Não se há de confundir aqui a competência legislativa para
comércio, da União, com a competência legislativa em matéria ambiental, que
é de competência concorrente (art. 24, VI, da Constituição da República).
Também não parece haver ofensa ao princípio da livre iniciativa,
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que evidentemente tem de se coadunar com princípios de proteção ambiental,
além, é claro de todos os outros princípios insertos na Constituição da
República.
2) Todavia, a questão posta no caso dos autos, que se revela de
grande dificuldade técnica e prática, é outra e completamente diversa. Trata-
se aqui de identificar se, no específico caso concreto do Criadouro Aves do
Paraíso, os riscos ambientais a que busca a Resolução 8/2012 do Consema
minimizar, estão de fato presentes ou não.
Depois de longamente refletir e de uma atenta leitura de todos
os pareceres, estudos, documentos e relatos dos autos, não vejo outra
conclusão que não a de que, com pequenos ajustes na conduta do Criadouro
Aves do Paraíso, os riscos ambientais são totalmente eliminados, tornando a
criação comercial segura e até mesmo aconselhável.
Para chegar a tal conclusão, inicialmente realizei uma análise
crítica dos documentos e estudos apresentados pela Secretaria de Estado.
Segui os links dos artigos indicados, que também foram lidos, e neles não
consegui identificar qualquer elemento que permitisse a conclusão de que os
saguis criados em cativeiro são ameaça ao ecossistema por procriação
indevida, ataques a ovos de aves, transmissão de doenças ou mesmo mal
estar animal.
Ao contrário, todavia, dos estudos que constam neste inquérito
civil público chamou a atenção, quer pela segurança e propriedade, quer pelo
currículo do autor, o parecer técnico de 27 de janeiro de 2015, subscrito pelo
médico veterinário Marcus Vinícius Cândido. O autor, além de ter estagiado no
centro de pesquisas de primatas da Universidade da Califórnia, foi médico
responsável pelos primatas do Beto Carrero World, professor de Anatomia
Veterinária de animais selvagens da Furb, membro da Comissão de Animais
Silvestres do Conselho Regional de Medicina e co-autor do Tratado de animais
Selvagens.
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2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Xanxerê
Todas as informações que foram por mim pessoalmente colhidas
durante o curso do inquérito civil público, quer seja pessoalmente, quer seja
nas reuniões e vistorias ou mesmo na leitura dos estudos que embasaram a
Resolução nº 8/2012 foram confirmadas, naturalmente com muito maior
aprofundamento técnico, por este parecer.
Como já mencionado acima, o parecer deixa absolutamente claro
que é nula a possibilidade de proliferação de saguis castrados e que as
doenças que os atingem são doenças típicas de mamíferos em geral, tais
como cães e gatos. Também conclui o parecer que os animais nascidos e
criados em cativeiro são incapazes de viver livres na natureza e são
rapidamente predados. E quanto à alimentação e bem estar animal, lembra o
parecer que há nutrição específica, com rações industrializadas próprias para
primatas, além de ser importante, como para qualquer animal, os cuidados do
dono.
Os saguis soltos na natureza fora de seu habitat atualmente
existentes em SC e na Região Sul, confirmou o parecer, são decorrentes de
tráfico ilegal ocorrido na década de 1980 e até hoje ainda existente, mas não
de criadores particulares legalizados.
Um ponto que não foi objeto de consideração neste parecer foi a
questão dos ataques a ninhos e ovos, o que provelmente ocorre pela premissa
demonstrada no parecer de que os saguis criados em cativeiro não vivem na
natureza. Mas, de qualquer modo, como se viu nas páginas anteriores, esta
questão não é pacífica. Estudo com observação em habitat natural não
identificou grande ocorrência, ao passo que estudo com ninhos artificiais (sem
aves a protegê-lo) apresentou 48% de incidência de ataques por saguis soltos
na natureza.
Logo se vê, portanto, que não há elementos mínimos a permitir
concluir que o Criadouro Aves do Paraíso encontre-se naquela situação
hipotética que serviu de fundamento para a Resolução nº 8/2012 do
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fls. 582
2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Xanxerê
Consema, ou seja, que com sua atividade colabore de qualquer forma para a
introdução de espécies exóticas invasoras na natureza. Ao contrário, a
possibilidade de aquisição legal dos saguis reduz os riscos de tráfico ilegal,
que é sim, sem dúvida, a causa dos danos ambientais identificados nos
diversos estudos.
Por outro lado, para extirpar qualquer risco ambiental, por
menor que fosse, garantindo o respeito ao princípio da precaução (apesar de
aparentemente haver segurança científica para permitir a criação em cativeiro
com fins comerciais) e da prevenção, optei por concluir este inquérito civil
público celebrando compromisso de ajustamento de condutas com o sr. Vilson
Zarembski.
Pelo TAC, convencionou-se que o Criadouro somente venderá
animais (machos e fêmeas) devidamente castrados, desvermifugados e
microchipados para identificação. Até então, apenas machos eram castrados.
Os animais serão vendidos com manual técnico de cuidados e em qualquer
hipótese de desistência pelo adquirente, o Criadouro receberá o animal de
volta, arcando com os custos da logística reversa (da devolução), obrigação
esta que não era exercida pelo compromissário (alegou que jamais houve
desistência).
Além disso, o proprietário instalará corredores antifuga para a
contenção dos animais ainda não castrados do plantel, minimizando por
completo o risco ambiental.
Como se sabe, qualquer restrição a direitos fundamentais deve
sempre ser a menor possível. No conflito entre princípios, deve-se identificar o
de maior peso, equacionando o direito de forma prudente. No caso dos autos,
com as medidas adotadas, mitigou-se o risco ambiental de tal modo que o
princípio da livre iniciativa tornou-se mais forte na relação de ponderação. A
proibição total de criação dos animais, portanto, tornou-se antijurídica no caso
concreto, embora não se possa negar ser de todo pertinentes as discussões e
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fls. 583
2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Xanxerê
estudos a respeito.
Observa-se, com isso, que o inquérito civil público atingiu seus
objetivos. Esclareceu de forma aprofundada todos os pontos nebulosos, com
provas robustas e científicas, deixando claro que, pelo menos no caso do
Criadouro Aves do Paraíso, com o TAC celebrado, não estão presentes riscos
ambientais na criação e venda de saguis das espécies arroladas na Resolução
nº8/2012 do Consema.
Desta forma, com a celebração do termo de ajustamento de
conduta, e pela ausência de interesse jurídico a ensejar a adoção de outras
medidas, o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA
promove o ARQUIVAMENTO do Inquérito Civil Público nº 06.2014.00010980-
9, da 2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Xanxerê.
Cientifiquem-se os interessados (Abase, Vilson Zarembski,
Fatma, Cidasc, Secretaria de Estado do Desenvolvimento Sustentável) para
conhecimento desta Promoção. Cópia eletrônica ao Centro de Apoio do Meio
Ambiente.
Autuar cópia desta promoção de arquivamento e do TAC como
procedimento administrativo para acompanhar o TAC firmado. Designo desde
já Luis Henrique Kohl Camargo para secretariar o procedimento de
acompanhamento. Como providência inicial, determino que se cadastre o
prazo de cumprimento das obrigações para acompanhamento.
Após a comprovação da efetiva ciência dos interessados acerca
da presente promoção, remetam-se os autos ao Conselho Superior do
Ministério Público.
Xanxerê, 24 de fevereiro de 2015
Eduardo Sens dos Santos
Promotor de Justiça
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2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Xanxerê
EXTRATO DE CONCLUSÃO DO INQUÉRITO CIVIL nº
06.2014.00010980-9
COMARCA: Xanxerê
ÓRGÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO: 2ª Promotoria de Justiça da Comarca de
Xanxerê
Data da Instauração: 12/11/2014 16:23:30
Data da Conclusão: 24/02/2015
Partes: Conselho Estadual do Meio Ambiente - CONSEMA/SC
Conclusão: Criadouro de saguis. Atividade regulada pela Resolução nº 8/2012.
Espécies exóticas consideradas invasoras. Criadouro que só fornece animais
castrados, desvermifugados e com orientações detalhadas. Divergência
científica sanada pelo cotejamento de diversos estudos, pareceres, relatos e
por vistoria pessoal. TAC celebrado para ampliar as garantias ambientais,
permitindo a criação comercial em respeito ao princípio da livre iniciativa e ao
direito adquirido. Arquivamento.
Membro do Ministério Público: Eduardo Sens dos Santos
Criação comercial de saguis - Vilson Zarembski - Relatório final do Inquérito Civil

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Criação comercial de saguis - Vilson Zarembski - Relatório final do Inquérito Civil

  • 1. EstedocumentoécópiadooriginalassinadodigitalmenteporEDUARDOSENSDOSSANTOS.Paraconferirooriginal,acesseositehttp://www.mp.sc.gov.br,informeoprocesso06.2014.00010980-9eo código5E2E09. fls. 572 2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Xanxerê PROMOÇÃO DE ARQUIVAMENTO Inquérito Civil Público nº 06.2014.00010980-9 "Criação de Saguis - Resolução nº 8/2012, Consema - Inconstitucionalidade" O presente Inquérito Civil Público foi instaurado com o seguinte objeto: "Criação de Saguis - Resolução nº 8/2012, Consema - Inconstitucionalidade", a partir de representação da Associação Brasileira de Criadores e Comerciantes de Animais Silvestres e Exóticos. Em síntese, narrava a representação que a Resolução nº 8/2012, do Consema, havia proibido de forma inconstitucional a criação comercial de diversos animais silvestres em violação à livre iniciativa, à competência da União, aos valores sociais do trabalho e à legislação pertinente. A representação foi apresentada pessoalmente a mim no atendimento ao público, pelo sr. Vilson Zarembski, criador de saguis e macacos-prego no Criadouro Aves do Paraíso, interior de Município de Xanxerê. Na oportunidade, além de argumentar contra a proibição, ressaltou que vinha até então sendo reconhecido, inclusive em diversas matérias jornalísticas, como exemplo de criador de macacos domesticados, por conta da seriedade do trabalho realizado durante toda a sua vida. Juntou diversos pareceres, requerimentos, jurisprudência notas técnicas e estudos, sustentando a inadequação da proibição da Resolução nº8/2012 em relação a três espécies de sagui: Callithrix geoffroy, Callithrix jacchus e Callithrix penicilata. Informou que a proibição decorre da aceitação, pelo Consema,
  • 2. EstedocumentoécópiadooriginalassinadodigitalmenteporEDUARDOSENSDOSSANTOS.Paraconferirooriginal,acesseositehttp://www.mp.sc.gov.br,informeoprocesso06.2014.00010980-9eo código5E2E09. fls. 573 2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Xanxerê das seguintes premissas, todas equivocadas segundo a argumentação do representante: a) saguis criados em ambiente domiciliar tornam-se ariscos e são abandonados pelos proprietários; b) saguis abandonados no meio ambiente se reproduzem com rapidez e se tornam invasores, ameaçando aves, por se alimentarem de seus ovos; c) saguis criados em domicílio são transmissores de diversas doenças; d) saguis criados em domicílio apresentam problemas nutricionais e de comportamento, causando mal-estar animal. Vilson Zarembski argumenta, em essência, que os saguis tornaram-se invasoras pela forma como foram soltas irresponsavelmente durante anos na Ilha de Santa Catarina e em outros ambientes litorâneos do que pelas características da espécie em si. Corrobora seu argumento o parecer de fl. 44, que declara que os saguis "foram de forma contumaz comercializadas de forma ilegal, sem nenhuma submissão a regulamentos e portanto, não havendo precauções para possíveis casos de fugas". Historicamente, segundo o parecer, "as autoridades foram as maiores dispersoras das espécies, uma vez que os exemplares frutos de apreensão eram amplamente soltos como forma de demonstrar que os animais não eram cativos e sim selvagens". Por outro lado, o parecer reforça a informação de que, ao contrário dos animais vítimas de contrabando, os animais domesticados são vendidos licitamente com informações claras a respeito das normas de segurança, por alto preço (o que os faz serem facilmente absorvidos por outros criadores ou consumidores, em caso de desistência do adquirente), além de, por conta da domesticação, não terem condições de vida autônoma no meio ambiente (morrem em poucas semanas em caso de fuga). Consultei na sequência o Centro de Apoio de Informações Técnicas e Pesquisas, do Ministério Público do Estado de Santa Catarina, que apresentou resposta à fl. 76. Foi relevante para a decisão final deste inquérito civil público a informação de que, embora de fato tratem-se de espécies exóticas com potencial invasor, "a castração dos animais é suficiente para
  • 3. EstedocumentoécópiadooriginalassinadodigitalmenteporEDUARDOSENSDOSSANTOS.Paraconferirooriginal,acesseositehttp://www.mp.sc.gov.br,informeoprocesso06.2014.00010980-9eo código5E2E09. fls. 574 2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Xanxerê impedir que populações desse animal na natureza surjam ou aumentem" (fl. 76v). Também foi relevante para a conclusão a que cheguei a informação de que cães e gatos também são considerados espécies exóticas com potencial invasor, mas apenas não têm a venda proibida por questões culturais ("consolidação do comércio"). Para maiores esclarecimentos, requisitei informações à Secretária de Desenvolvimento Econômico e Sustentável do Estado de Santa Catarina e fiz juntar aos autos notícias jornalísticas que tratavam do tema. A primeira das matérias jornalísticas (fl. 83) registra que os saguis sobrevivem no inverno da Região Sul (são endêmicos do Norte e Nordeste do país) porque a população os mantém alimentados. A matéria, que conta com a entrevista da bióloga Cristina Valéria Santos, qualificada por quinze anos de estudos dos animais, "desfaz o mito de que os saguis comem ovos de aves": "no cardápio apreciado pelo sagui estão insetos, pequenos vertebrados e frutas" (fl. 83v). A matéria também registra que a proliferação de saguis decorreu de uma prática permitida nas décadas de 1950, 60 e 70. Os animais foram trazidos por caminhoneiros do Nordeste e Sudeste como um mimo ou mercadoria, e acabaram sendo soltos na natureza quando demonstravam comportamento agressivo ao tentarem ser domesticados. Na sequência, desenvolvi diversas reuniões com o sr. Vilson Zarembski, que fez juntar aos autos os modelos do "Manual Técnico" que fornece juntamente com os animais vendidos. Nestes documentos se lê detalhes científicos dos animais e detalhadas informações sobre a reprodução, alimentação, aleitamento, instalações e higiene, vacinas e controle de doenças, obrigações e cuidados urgentes. Apresentou também atestado médico veterinário que entrega aos adquirentes. Nesse documento se observa que os animais são identificados com microchip e que há registro de castração pelo veterinário.
  • 4. EstedocumentoécópiadooriginalassinadodigitalmenteporEDUARDOSENSDOSSANTOS.Paraconferirooriginal,acesseositehttp://www.mp.sc.gov.br,informeoprocesso06.2014.00010980-9eo código5E2E09. fls. 575 2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Xanxerê Aportou aos autos a resposta da Secretária de Estado, que trouxe interessantes relatórios dos seminários regionais de preparação para o programa estadual de controle de espécies exóticas invasoras. Nas atas das reuniões de Canoinhas, Blumenau, Chapecó, Lages, Criciúma, Florianópolis e São José foram registradas as espécies invasoras relatadas pelos presentes. Foi importante para a conclusão deste inquérito civil público o fato de nenhuma das espécies de saguis terem sido referidas nas reuniões (fls. 171- 180). Apresentou também a Secretária de Estado cópia de um e-mail subscrito por Gabriela Breda, do Ibama, informando que "inexistem criadores legalizados no Estado" e que os fundamentos para a proibição seriam: os saguis são "altamente predatórios de ninhos de aves nativas"; "nenhum estabelecimento seria prejudicado" com a proibição; os "saguis não se adaptam ao cativeiro domiciliar" (fl. 251). Tais dados contrariam os demais pareceres até então existentes nos autos, notadamente quanto à predação de ninhos, o que é negado pelo documento de fl. 83. Nos documentos enviados também se observa a existência de um parecer da Abrase (representante), subscrito por Geógrafo, Médico Veterinário e Advogado, que conclui que os fundamentos da proibição de saguis seriam igualmente aplicáveis a cães e gatos, que, contraditoriamente, contudo, não foram igualmente proibidos: "a existência das três espécies de primatas [saguis] na norma ora comentada carece de fundamentação técnica sustentável e aplicável sem que na mesma norma apareçam os animais domésticos citados [cães e gatos]" (fl. 268). Outro estudo, desta feita subscrito por três analistas ambientais do Ibama, ressalta que os primatas podem transmitir protozoários devido à falta de higiene satisfatória dos locais em que são criados (fl. 276). O mesmo estudo aponta ainda problemas comportamentais pela falta de contato com o
  • 5. EstedocumentoécópiadooriginalassinadodigitalmenteporEDUARDOSENSDOSSANTOS.Paraconferirooriginal,acesseositehttp://www.mp.sc.gov.br,informeoprocesso06.2014.00010980-9eo código5E2E09. fls. 576 2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Xanxerê ambiente natural, além de solturas e entregas voluntárias e da alimentação inadequada em cativeiro. Foi relevante para as conclusões deste inquérito civil público a constatação de que os estudos que serviram de base para as conclusões terem tido como base de dados somente animais cativos em zoológicos e instituições, o que demonstra que as conclusões podem não se aplicar a animais domésticos. Em resposta ao meu ofício requisitando informações sobre eventual diminuição de riscos em caso de castração dos animais a serem comercializados, sobreveio também aos autos e-mail subscirto por Beloni Terezinha Marterer informando que em caso de castração, ainda assim há possibilidade de transmissão de doenças para a fauna silvestre e para pessoas, como por exemplo as ameaças ao mico-leão dourado. Informou o e- mail também que os saguis domesticados tornam-se agressivos com a puberdade. Aportou também aos autos relatório científico (fl. 295) da lavra de Luciana Zago que informa que em 506 horas de observação foi registrada "baixa taxa de predação aos ovos de aves", o que contraria a informação do e- mail de fl. 251, de Gabriela Breda, do Ibama. Artigo intitulado O problema dos saguis introduzidos no Rio de Janeiro também refere como causas da abundância dos animais o "tráfico ilegal de animais selvagens" e "três grandes solturas", com 80 animais ou mais cada uma, ocorridas há 20 anos. Também foi importante para as conclusões deste inquérito civil público a informação do estudo denominado Clinical Care and Diseases of the Common Marmoset. A pesquisadora Elisabeth Ludlage, da Universidade de Medicina de Harvard concluiu que "estes animais [saguis] são facilmente mantidos em cativeiro, e a saúde do grupo pode ser mantida em nível alto através de um rigoroso programa de prevenção, detecção precoce de doenças e através de cuidados veterinários" (fl. 357, traduzi livremente). Neste ponto
  • 6. EstedocumentoécópiadooriginalassinadodigitalmenteporEDUARDOSENSDOSSANTOS.Paraconferirooriginal,acesseositehttp://www.mp.sc.gov.br,informeoprocesso06.2014.00010980-9eo código5E2E09. fls. 577 2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Xanxerê também parece haver contradição, embora não muito explícita, entre a informação de que os saguis têm saúde debilitada em cativeiro e não são facilmente domesticados. Outro estudo levado em consideração foi O Efeito do Sagui sobre a Taxa de Predação de Ninhos na Ilha Grande, RJ, de Souza W.S. O pesquisador reportou grande taxa de ataques de saguis a ninhos artificiais, instalados com ovos de codorna (fl. 360). Este estudo contém conclusão diversa do estudo da fl. 295, em que Luciana Zago, em observação natural, não identificou o mesmo fenômeno. A divergência pode decorrer da falta de proteção que os ninhos artificiais têm em relação aos ninhos naturais (não há aves para afugentar os predadores). Seguiram-se ainda diversas notícias jornalísticas demonstrando interações entre saguis e humanos, como a de uma criança vitimada por raiva humana transmitida por sagui (fl. 379) ou de apreensões urbanas de saguis ilegalmente inseridos no meio ambiente urbano (fl. 376). Dando sequência à instrução do inquérito civil, conferiu-se oportunidade ao interessado Vilson Carlos Zarembski para demonstrar suas ponderações a respeito dos pareceres, estudos e demais documentos apresentados pela Secretária de Desenvolvimento. Por intermédio de advogado, o interessado informou que os animais são nascidos em cativeiro e domesticados desde cedo, de modo a se adaptarem ao meio humano sem rejeição. Cita diversos adquirentes e a inexistência de reclamações. Sobre as doenças antrópicas, argumenta que já são parte do meio humanizado e que não são exclusivos dos primatas, mas também de outras espécies domesticadas. Afirma ainda que os saguis criados em cativeiro que vende não sobrevivem fora do ambiente domiciliar e que os indivíduos agressivos são geralmente oriundos do tráfico ilegal e da falta de orientação para cuidados. Questiona a posição dos órgãos ambientais argumentando que os adquirentes dos saguis criados em cativeiro jamais
  • 7. EstedocumentoécópiadooriginalassinadodigitalmenteporEDUARDOSENSDOSSANTOS.Paraconferirooriginal,acesseositehttp://www.mp.sc.gov.br,informeoprocesso06.2014.00010980-9eo código5E2E09. fls. 578 2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Xanxerê foram ouvidos, o que faria derruir as premissas dos estudos. Informa também que na alimentação dos saguis são incluídos elementos típicos de sua dieta, tais como goma de árvore, frutas silvestres e insetos. Cita, por fim, jurisprudência em que maçados-prego foram devolvidos aos seus donos por considerarem os tribunais que a domesticação, ainda que irregular, tornou impossível ao animal viver livre no meio ambiente (fl. 391). Apresentou juntamente com a petição extenso parecer técnico, subscrito pelo médico veterinário Marcus Vinícius Cândido. O parecer critica veementemente as premissas e conclusões da nota técnica que embasou a resolução citada. Informa que o documento "apresenta uma série de inconsistências técnicas" e que "um argumento notavelmente falacioso refere- se ao potencial invasivo de primatas nascidos em cativeiro" (fl. 410). Argumenta que os saguis soltos em áreas urbanas são descendentes de adultos provenientes do tráfico ilegal ocorrido na década de 1980. "Seus contrapartes nascidos em cativeiro, no entanto, tendem a procurar contato com humanos, não conseguem sequer se deslocar nas árvores [...] tendem a ficar imóveis e amedrontados até serem finalmente predados". E afirma que a castração "anula completamente o risco de dano relacionado à sua proliferação" (fl. 411). Esclarece também que "o texto [da nota técnica do Consema] deixa transparecer desconcertante falta de conhecimento quanto aos parasitas abordados", discorrendo longamente sobre as características das doenças que acometem os animais para concluir que "não há razão para crer que a probabilidade de contrair esses parasitas ou doenças de animais de estimação seja maior que ao andar de ônibus ou ir à escola" e que "quase todos os mamíferos podem ser portadores de Giardia, e especialmente os cães e gatos". "O contágio da raiva é praticamente nulo", lembrando ainda que os principais transmissores são o cão e o gato. O herpes-vírus simiae só tem como portadores, segundo o parecer, macacos do Velho Mundo. As necessidades nutricionais são bem conhecidas, também de acordo com o
  • 8. EstedocumentoécópiadooriginalassinadodigitalmenteporEDUARDOSENSDOSSANTOS.Paraconferirooriginal,acesseositehttp://www.mp.sc.gov.br,informeoprocesso06.2014.00010980-9eo código5E2E09. fls. 579 2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Xanxerê médico veterinário, e há rações fabricadas a anos no território nacional para tais espécies. Os problemas odontológicos são os mesmos que atingem cães e gatos submetidos a dietas inadequadas. Sobrevieram novos documentos e estudos científicos acerca dos benefícios da criação dos saguis com fins comerciais, sempre enfatizando o efeito dissuasório da criação comercial frente ao tráfico ilegal. Juntaram-se aos autos fotografias e relatos de proprietários narrando adequado comportamento dos animais e gozo de excelente saúde. Foram ainda juntadas aos autos declarações do gerente regional da Fatma, Rafael Gasparini, e do presidente da Cidasc, Enori Barbieri, abonando o Criadouro Aves do Paraíso, Vilson Zarembski. Por fim, para melhor subsidiar a decisão a ser tomada neste inquérito civil público, vistoriei pessoalmente a família de Paulo Marco de Bastiani, subscritor do documento de fl. 421, no último dia 20 de fevereiro, conforme ata de vistoria juntada aos autos. É o relato de todas as diligências, documentos e constatações deste inquérito civil público. 1) Inicialmente cumpre observar que não vejo elementos suficientes para postular a declaração de inconstitucionalidade da Resolução nº 8/2012 do Consema. Embora se trate de ato normativo com graves reflexos patrimoniais, como se viu no curso deste inquérito civil público, o Consema tem legitimidade para disciplinar normativamente o controle de espécies exóticas invasoras, de acordo com a Lei nº 14.675/2009. Não se há de confundir aqui a competência legislativa para comércio, da União, com a competência legislativa em matéria ambiental, que é de competência concorrente (art. 24, VI, da Constituição da República). Também não parece haver ofensa ao princípio da livre iniciativa,
  • 9. EstedocumentoécópiadooriginalassinadodigitalmenteporEDUARDOSENSDOSSANTOS.Paraconferirooriginal,acesseositehttp://www.mp.sc.gov.br,informeoprocesso06.2014.00010980-9eo código5E2E09. fls. 580 2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Xanxerê que evidentemente tem de se coadunar com princípios de proteção ambiental, além, é claro de todos os outros princípios insertos na Constituição da República. 2) Todavia, a questão posta no caso dos autos, que se revela de grande dificuldade técnica e prática, é outra e completamente diversa. Trata- se aqui de identificar se, no específico caso concreto do Criadouro Aves do Paraíso, os riscos ambientais a que busca a Resolução 8/2012 do Consema minimizar, estão de fato presentes ou não. Depois de longamente refletir e de uma atenta leitura de todos os pareceres, estudos, documentos e relatos dos autos, não vejo outra conclusão que não a de que, com pequenos ajustes na conduta do Criadouro Aves do Paraíso, os riscos ambientais são totalmente eliminados, tornando a criação comercial segura e até mesmo aconselhável. Para chegar a tal conclusão, inicialmente realizei uma análise crítica dos documentos e estudos apresentados pela Secretaria de Estado. Segui os links dos artigos indicados, que também foram lidos, e neles não consegui identificar qualquer elemento que permitisse a conclusão de que os saguis criados em cativeiro são ameaça ao ecossistema por procriação indevida, ataques a ovos de aves, transmissão de doenças ou mesmo mal estar animal. Ao contrário, todavia, dos estudos que constam neste inquérito civil público chamou a atenção, quer pela segurança e propriedade, quer pelo currículo do autor, o parecer técnico de 27 de janeiro de 2015, subscrito pelo médico veterinário Marcus Vinícius Cândido. O autor, além de ter estagiado no centro de pesquisas de primatas da Universidade da Califórnia, foi médico responsável pelos primatas do Beto Carrero World, professor de Anatomia Veterinária de animais selvagens da Furb, membro da Comissão de Animais Silvestres do Conselho Regional de Medicina e co-autor do Tratado de animais Selvagens.
  • 10. EstedocumentoécópiadooriginalassinadodigitalmenteporEDUARDOSENSDOSSANTOS.Paraconferirooriginal,acesseositehttp://www.mp.sc.gov.br,informeoprocesso06.2014.00010980-9eo código5E2E09. fls. 581 2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Xanxerê Todas as informações que foram por mim pessoalmente colhidas durante o curso do inquérito civil público, quer seja pessoalmente, quer seja nas reuniões e vistorias ou mesmo na leitura dos estudos que embasaram a Resolução nº 8/2012 foram confirmadas, naturalmente com muito maior aprofundamento técnico, por este parecer. Como já mencionado acima, o parecer deixa absolutamente claro que é nula a possibilidade de proliferação de saguis castrados e que as doenças que os atingem são doenças típicas de mamíferos em geral, tais como cães e gatos. Também conclui o parecer que os animais nascidos e criados em cativeiro são incapazes de viver livres na natureza e são rapidamente predados. E quanto à alimentação e bem estar animal, lembra o parecer que há nutrição específica, com rações industrializadas próprias para primatas, além de ser importante, como para qualquer animal, os cuidados do dono. Os saguis soltos na natureza fora de seu habitat atualmente existentes em SC e na Região Sul, confirmou o parecer, são decorrentes de tráfico ilegal ocorrido na década de 1980 e até hoje ainda existente, mas não de criadores particulares legalizados. Um ponto que não foi objeto de consideração neste parecer foi a questão dos ataques a ninhos e ovos, o que provelmente ocorre pela premissa demonstrada no parecer de que os saguis criados em cativeiro não vivem na natureza. Mas, de qualquer modo, como se viu nas páginas anteriores, esta questão não é pacífica. Estudo com observação em habitat natural não identificou grande ocorrência, ao passo que estudo com ninhos artificiais (sem aves a protegê-lo) apresentou 48% de incidência de ataques por saguis soltos na natureza. Logo se vê, portanto, que não há elementos mínimos a permitir concluir que o Criadouro Aves do Paraíso encontre-se naquela situação hipotética que serviu de fundamento para a Resolução nº 8/2012 do
  • 11. EstedocumentoécópiadooriginalassinadodigitalmenteporEDUARDOSENSDOSSANTOS.Paraconferirooriginal,acesseositehttp://www.mp.sc.gov.br,informeoprocesso06.2014.00010980-9eo código5E2E09. fls. 582 2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Xanxerê Consema, ou seja, que com sua atividade colabore de qualquer forma para a introdução de espécies exóticas invasoras na natureza. Ao contrário, a possibilidade de aquisição legal dos saguis reduz os riscos de tráfico ilegal, que é sim, sem dúvida, a causa dos danos ambientais identificados nos diversos estudos. Por outro lado, para extirpar qualquer risco ambiental, por menor que fosse, garantindo o respeito ao princípio da precaução (apesar de aparentemente haver segurança científica para permitir a criação em cativeiro com fins comerciais) e da prevenção, optei por concluir este inquérito civil público celebrando compromisso de ajustamento de condutas com o sr. Vilson Zarembski. Pelo TAC, convencionou-se que o Criadouro somente venderá animais (machos e fêmeas) devidamente castrados, desvermifugados e microchipados para identificação. Até então, apenas machos eram castrados. Os animais serão vendidos com manual técnico de cuidados e em qualquer hipótese de desistência pelo adquirente, o Criadouro receberá o animal de volta, arcando com os custos da logística reversa (da devolução), obrigação esta que não era exercida pelo compromissário (alegou que jamais houve desistência). Além disso, o proprietário instalará corredores antifuga para a contenção dos animais ainda não castrados do plantel, minimizando por completo o risco ambiental. Como se sabe, qualquer restrição a direitos fundamentais deve sempre ser a menor possível. No conflito entre princípios, deve-se identificar o de maior peso, equacionando o direito de forma prudente. No caso dos autos, com as medidas adotadas, mitigou-se o risco ambiental de tal modo que o princípio da livre iniciativa tornou-se mais forte na relação de ponderação. A proibição total de criação dos animais, portanto, tornou-se antijurídica no caso concreto, embora não se possa negar ser de todo pertinentes as discussões e
  • 12. EstedocumentoécópiadooriginalassinadodigitalmenteporEDUARDOSENSDOSSANTOS.Paraconferirooriginal,acesseositehttp://www.mp.sc.gov.br,informeoprocesso06.2014.00010980-9eo código5E2E09. fls. 583 2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Xanxerê estudos a respeito. Observa-se, com isso, que o inquérito civil público atingiu seus objetivos. Esclareceu de forma aprofundada todos os pontos nebulosos, com provas robustas e científicas, deixando claro que, pelo menos no caso do Criadouro Aves do Paraíso, com o TAC celebrado, não estão presentes riscos ambientais na criação e venda de saguis das espécies arroladas na Resolução nº8/2012 do Consema. Desta forma, com a celebração do termo de ajustamento de conduta, e pela ausência de interesse jurídico a ensejar a adoção de outras medidas, o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA promove o ARQUIVAMENTO do Inquérito Civil Público nº 06.2014.00010980- 9, da 2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Xanxerê. Cientifiquem-se os interessados (Abase, Vilson Zarembski, Fatma, Cidasc, Secretaria de Estado do Desenvolvimento Sustentável) para conhecimento desta Promoção. Cópia eletrônica ao Centro de Apoio do Meio Ambiente. Autuar cópia desta promoção de arquivamento e do TAC como procedimento administrativo para acompanhar o TAC firmado. Designo desde já Luis Henrique Kohl Camargo para secretariar o procedimento de acompanhamento. Como providência inicial, determino que se cadastre o prazo de cumprimento das obrigações para acompanhamento. Após a comprovação da efetiva ciência dos interessados acerca da presente promoção, remetam-se os autos ao Conselho Superior do Ministério Público. Xanxerê, 24 de fevereiro de 2015 Eduardo Sens dos Santos Promotor de Justiça
  • 13. EstedocumentoécópiadooriginalassinadodigitalmenteporEDUARDOSENSDOSSANTOS.Paraconferirooriginal,acesseositehttp://www.mp.sc.gov.br,informeoprocesso06.2014.00010980-9eo código5E2E09. fls. 584 2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Xanxerê EXTRATO DE CONCLUSÃO DO INQUÉRITO CIVIL nº 06.2014.00010980-9 COMARCA: Xanxerê ÓRGÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO: 2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Xanxerê Data da Instauração: 12/11/2014 16:23:30 Data da Conclusão: 24/02/2015 Partes: Conselho Estadual do Meio Ambiente - CONSEMA/SC Conclusão: Criadouro de saguis. Atividade regulada pela Resolução nº 8/2012. Espécies exóticas consideradas invasoras. Criadouro que só fornece animais castrados, desvermifugados e com orientações detalhadas. Divergência científica sanada pelo cotejamento de diversos estudos, pareceres, relatos e por vistoria pessoal. TAC celebrado para ampliar as garantias ambientais, permitindo a criação comercial em respeito ao princípio da livre iniciativa e ao direito adquirido. Arquivamento. Membro do Ministério Público: Eduardo Sens dos Santos