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Hallyu Wave: K-pop
Uma análise sobre o grupo BTS e seu poder de afetação
1
Ariadne Lopes SANTOS2
Fernanda MEDEIROS3
Resumo: O presente trabalho visa compreender o fenômeno do K-pop a partir do poder
de afetação (SIMÕES, 2014) que é desempenhado pelos integrantes dos grupos
musicais que movimentam grande parte da onda hallyu. Para tanto, analisamos, como
objeto empírico, a formação e a atuação do BTS, um dos principais grupos da
atualidade, e realizamos, ainda, uma breve pesquisa de recepção com integrantes do
fandom do Brasil, na intenção de apreendermos alguns valores que são negociados na
relação entre ídolos e público. Ao final, apresentamos os resultados obtidos,
demonstrando como o consumo cultural e a publicidade são fundamentais para o
sucesso desse estilo musical.
Palavras-chave: K-pop. Fandom. Poder de afetação.
Introdução
A música pop sul coreana chegou timidamente no Brasil, em 2011, chamando
atenção apenas daqueles que já tinham alguma afinidade com a cultura asiática.
Somente entre os anos 2014 e 2015 é que o estilo virou uma febre entre os jovens
brasileiros. Totalmente curiosa, comecei a mergulhar nesse mundo querendo aprender
mais sobre a música pop coreana e compreender os motivos daquilo causar tanta euforia
nas pessoas que viviam desse estilo musical.
Quanto mais pesquisava, mais aumentava a vontade de saber como algumas
empresas sul coreanas, com ajuda da publicidade, construíram grupos da música pop e
fizeram com que eles atingissem um nível global, em um curto espaço de tempo.
1
Trabalho apresentado no Centro Universitário Estácio de Belo Horizonte como requisito parcial para
obtenção do título de Bacharel em Comunicação Social/ Publicidade e Propaganda
2
Estudante de Graduação do 7º semestre do Curso de Publicidade e Propaganda do Centro Universitário
Estácio de Belo Horizonte, e-mail: ariadne.lsantos93@gmail.com
3
Mestre orientadora do trabalho. Professora do Curso de Publicidade no Centro Universitário Estácio de
Belo Horizonte, e-mail: medfernanda@gmail.com
A cultura musical sul coreana se tornou presente na minha vida há pouco tempo,
tanto na vida pessoal como na profissional, e, por isso, escolhi o tema para minha
pesquisa de conclusão da graduação. Como futura comunicóloga e trabalhando
diretamente com eventos que envolvem o gênero musical pop sul coreano, é de suma
importância o entendimento acerca dos grupos que compõem o estilo e do envolvimento
do público que consome e vive esse cenário.
Nesse sentido, na intenção de alcançar o contexto que circunda o
desenvolvimento do k-pop, o trabalho começa observando a formação da música pop
sul coreana; como surgiu o termo hallyu wave e como ele foi desenvolvido em
ambientes locais e globais. Posteriormente, busca-se entender o poder de afetação que o
estilo musical tem na vida das pessoas que consomem esse amplo universo, e, por fim,
apresentamos uma análise sobre a carreira de um dos maiores grupos de k-pop dos
últimos anos, o BTS (Bangtan Sonyeondan), que tem atingido marcas globais
impressionantes e que afeta, de forma positiva, a vida de fãs de quase todo o mundo.
1. A formação da música popular na Coreia
Em meados dos anos 1950, a Coreia, que antes era um país só, sofreu uma ocupação
japonesa, tanto territorial quanto cultural. Naquele tempo de luta contra a ocupação, os
soldados norte americanos que estavam em terras coreanas na guerra ensinaram
melodias ao povo coreano, que se tornaram populares e de alguma forma uma fonte de
resistência contra a ocupação nipônica. De acordo com Rousee-Marquet (2012),
Huimangga, ou Song Of Hope, a música da esperança, pode ser considerada a primeira
música popular coreana. Por ser um tipo de manifesto e uma fonte de resistência contra
a ocupação, os oficiais japoneses acabaram tirando a música de circulação,
estabelecendo novamente suas próprias músicas ao povo coreano. Porém, os japoneses
não contavam que os coreanos viessem a traduzir suas músicas e passassem a interpretá-
las em seu próprio idioma.
Contudo, um compositor japonês é que foi o responsável pelo trot, um estilo de
música presente até hoje na Coreia do Sul . O trot misturava música coreana com estilo
de músicas evangélicas americanas, e acabou por se tornar popular como um recurso de
expressar os traumas da guerra. Com o tempo, o estilo também passou a falar sobre
política, cotidiano e amor. Conforme afirma Bernicker,
“trot ou teuroteu é um gênero de música pop coreana e é conhecido como
antecessor do K-pop. O trot surgiu durante o domínio japonês por volta de
1900, tendo influência de elementos musicais japoneses, ocidentais e
coreanos”. (BERNICKER, 2015)
Com a divisão das Coreias no pós guerra, em 1953, as tropas americanas
permaneceram em território sul coreano para manter a segurança. Isso acabou abrindo
as portas do ocidente para o oriente, pois, com a chegada dos LP’s, as tropas americanas
escutavam bastante country, blues, jazz e rock & roll e isso foi algo que os coreanos
passaram a ouvir. Assim, música trot começou a se tornar ocidentalizada por conta das
influências musicais que passaram a fazer parte do dia-a-dia da população sul coreana.
2. O termo “korean popular music”
K-pop, termo de abreviação para Korean pop music, ou música popular coreana,
um gênero originado na Coreia do Sul, é caracterizado pela variedade de elementos
audiovisuais, utilização conjunta de componentes visuais e sonoros. Apesar de abranger
todos os gêneros da música popular sul coreana, k-pop é mais usado para se referir ao
estilo de música pop. Para entender o termo, é importante compreender como os grupos
musicais começaram a se formar e a chamar a atenção do público.
Em 1992 a emissora MBC, hoje uma das quatro grandes redes nacionais de
televisão sul coreana, estreou com o grupo SeoTaiji & Boys, e isso fez todo o contexto
da música sul coreana mudar. Antes do grupo, Seo Tai-ji (líder do grupo) tinha uma
banda de haevy metal. Como o fim da banda, ele mudou totalmente seus rumos
musicais, se juntando com Lee Ju-no e Yang Hyun-suk, que tinham deslumbre com as
músicas feitas por Seo ainda na sua época de banda.
Além do estilo musical, tinha também o visual, que era algo totalmente novo
para o público: SeoTaiji & Boys vieram com brincos, jeans rasgados e dreadlocks4
.
Depois de quatro álbuns o grupo chegou ao fim, em 1997, mas deixou um legado para
as próximas gerações da música sul coreana que viriam após isso, pelo fato de o grupo
ter trazido fortes influências americanizadas, que moldaram o que hoje é um fenômeno
em termos de estilo musical.
Contextualizando o Seo Taiji & Boys como uma grande referência do gênero, a
revista Koreain publicou uma matéria em 20165
em que afirmava que “o grande sucesso
de suas músicas foi atribuído às influências do estilo swingbeat¹, com letras inovadoras,
que tratavam dos problemas da sociedade coreana e estimulavam o pensamento
individual dos jovens”. O grupo foi importante para desenvolver um aspecto novo entre
o público sul coreano, que não estava muito acostumado com o estilo rebelde e meio
4
Dreadlocks : Penteado na forma de mechas emaranhadas, ou uma forma de se manter os cabelos que se tornou
famosa com o movimento rastafári.
5
http://revistakoreain.com.br/2016/09/kpop-uma-historia-seotaiji-and-boys
americanizado que era apresentado pelo trio. Inclusive eles chegaram a ser censurados
pelo visual “descolado”. Mas, mesmo com essas turbulências, o legado permaneceu.
Juntamente com o trio e os grupos que sugiram posteriormente, inventou-se a
“fórmula para criação de ídolos”, que foi tão bem sucedida a ponto de
influenciar os grupos de k-pop mesmo agora, mais de 20 anos depois. A
estratégia de promoção, que passou de geração a geração, baseava-se em
músicas com uma base de hip hop e uma dança divertida. Esse método ainda
é seguido, além de se provar ser eficaz não apenas na Coreia do Sul, como
em todo mundo. (revistakoreain, 2016).
Dessa nova geração do pop sul coreano, surgiu o grupo H.O.T, criado por Lee
Soo Man, fundador da SM Entertainment. Temos uma dimensão de que dali para frente
o pop sul coreano seria grande, ao assistirmos o drama “1997”, que conta a história e
examina a cultura dos fãs extremistas que surgiram nos anos 1990, quando grupos de
ídolos começaram a dominar os palcos e o K-pop estava nascendo, como citado
anteriormente.
A criação do k-pop deu tão certo que, após a SM, surgiram outras agências no
mercado, como, por exemplo, a JYP Entertainment, Big Hit Entertainment e YG
Entertainment.
2.1. A hallyu wave e seu viés k-pop
Quando falamos hoje da cultura da Coreia do Sul nos referimos a ela como
hallyu wave, ou a onda coreana. Hallyu significa “fluxo da Coreia”; o termo se refere à
grande popularização da cultura sul coreana, e foi criado por jornalistas chineses que se
surpreenderam com a popularidade da cultura sul coreana, que estava em pleno
crescimento. A onda hallyu engloba diferentes aspectos culturais ligados à culinária
local, à moda sul coreana, aos filmes e, especialmente, à música popular, que é o K-pop.
Apesar de ter sido criada no início da década de 1990, junto com o surgimento
do K-pop, só começamos a ouvir mais sobre esse termo a partir de 2009, quando o
hallyu, em questão musical, ultrapassou a barreira asiática com a música Nobody, do
grupo feminino Wonder Girls, que foi da JYP Entertainment, e emplacou na Hot 100 da
Billboard.
A onda hallyu atingiu de fato a marca global em 2012 com a música Gangman
Style, do rapper PSY, que ficou por semanas no topo das paradas de músicas americanas
e bateu recorde de visualizações no Youtube. O sucesso dessa canção agiu como um
catalisador para a cultura hallyu, especialmente em questão musical, pois foi de fato
uma contribuição para que novas pessoas descobrissem mais sobre o universo pop sul
coreano.
Aqui no Brasil, o primeiro show em grande escala do kpop foi concretizado com
o festival United Cube - Fantasy Land, que contou com a presença dos grupos 4minute,
B2ST e a cantora G.NA. Logo depois o país recebeu os shows dos grupos Super Junior e
Nu’Est, no Music Bank Brasil, que foi um festival que reuniu seis grupos e uma cantora
coreana. O Music Bank Brasil, realizado pela KBS 2014, que tem como uma das suas
formas de entretenimento o programa musical Music Back lá na Coreia do Sul, trouxe
SHINee, B.A.P., MBLAQ, INFINITE, CNBLUE, M.I.B e Ailee. De 2014 para cá, a
vinda de grupos de k-pop tem aumentado, tendo em média três shows por ano de grupos
coreanos no Brasil.
Mas, ainda assim, a hallyu é tímida no nosso país. A concentração maior das
atividades consta em São Paulo, onde são realizados de dois a cinco shows de grupos
sul coreanos por ano e que ainda conta com o Centro Cultural Coreano, onde são
realizadas atividades voltadas à cultura, como, por exemplo, aulas de k-pop com as
coreografias dos grupos.
3. Publicidade e poder de afetação: a onda hallyu na vida do consumidor
Nos últimos anos o k-pop tem se tornado algo tão grande, que empresas têm
usado isso a seu favor em venda de produtos e até para promover um determinado estilo
de vida. Isso se deve à influência e ao poder de afetação que os integrantes dos grupos
de K-pop têm na vida do seus fãs e até entre simpatizantes do estilo.
Os grupos carismáticos formados por ídolos, como são chamados, possuem uma
legião de fãs que mobilizam um verdadeiro comércio em torno de diversas ações
promocionais que são desenvolvidas a partir do universo musical. Cheios de estilo e
esbanjando simpatia, os ídolos tendem a ser atenciosos com o público.
Para Simões (2014, p. 213), “o carisma não deve ser visto apenas como dons
singulares que as celebridades apresentam, mas como construído em sintonia com as
esferas de poder com as quais dialogam”. Pensando no poder de afetação e nos valores
que são encarnados por algumas figuras famosas, a autora reflete sobre a potência do
carisma na atualidade, que transforma determinadas celebridades em verdadeiros
exemplos de vida, orienta comportamentos e tradições; exatamente como acontece com
os personagens do K-pop que são adorados pelo público.
Nesse sentido, Simões (2014) observa a mídia como um dos principais centros
ativos de poder, no que se refere à influência sob a construção de valores do senso
comum e ao seu papel de formar e orientar comportamentos. As qualidades atribuídas
ao “carisma” da pessoa famosa são colocadas na centralidade desse espaço de poder
dominante, na condição de satisfazerem aos anseios da opinião pública, que, por sua
vez, também já sofreram a interferência da mídia. A publicidade atua como uma
ferramenta poderosa nesse processo de afetação, pois amplia a visibilidade dos famosos
através da comercialização de uma grande diversidade de itens que são associados aos
ídolos.
As empresas investem nas ações promocionais que vinculam os grupos a
algumas marcas. Afinal, esse é um jeito de atingir um público fiel de fãs, pré-disposto a
consumir tudo (ou quase tudo) o que é vendável sobre o que diz respeito aos ícones
idolatrados.
Uma ação que exemplifica bem essa dinâmica de vinculação da marca com o
grupo de K-pop foi o lançamento do Samsung Galaxy A70, edição especial do grupo
feminino BLACKPINK6
, que teve sua edição lançada apenas na Tailândia, Vietnã,
Indonésia e Malásia. O aparelho smartphone apresentava o diferencial de ser todo
personalizado com itens das integrantes do grupo, e isso fez com que os fãs se sentissem
mais próximos e íntimos das artistas por meio do aparelho (e, ao mesmo tempo, mais
conectados com o produto por causa da chancela das integrantes do BLACKPINK).
Percebemos que o consumo, nesse caso, também se relaciona com uma forma de
pertencimento entre os fãs mais assíduos: como as integrantes da BLACKPINK têm um
contrato com a Samsung, elas não podem ser vistas usando e nem pegando celulares de
outras marcas, e isso fez com que uma fã, recentemente, comprasse um aparelho da
Samsung, apenas para tirar foto com as integrantes7
. Algumas outras marcas globais,
como Adidas, Nike e a coreana Tony Moly, utilizam da imagem de outros grupos e
ídolos, para estampar as suas campanhas de novos produtos.
Além disso, outros itens, como maquiagens, máscara facial, e até roupas
similares ou iguais as que os ídolos usam são comercializadas e chegam a ter um valor
6
O grupo Blackpink existe desde 2016, é composto por quatro integrantes, com idades que variam entre 22 e 24 anos.
Elas são o grupo de kpop feminino com maior ascensão internacional no último ano.
7
Foi feita uma thread, um linha de discussão em tópicos no twitter, mostrando a reação das integrantes do grupo, ao
se depararem com um situação em que o celular não é da marca Samsung e uma fã que adquiriu o aparelho da marca,
apenas pra ter a oportunidade te tirar foto com as meninas do grupo no aeroporto
https://twitter.com/erivaldoff/status/1124022527041339399
alto8
. Tem caso de fãs que gastam tanto com produtos referentes ao grupo de kpop
preferido, que, contabilizando, no final é uma coleção até valiosa9
.
Considerando a perspectiva de Featherstone (1995, p. 122), que afirma que o
consumo “não deve ser compreendido apenas como consumo de valores de uso, de
utilidades materiais, mas primordialmente como um consumo de signos”, é possível
observar o papel da publicidade no universo Kpop como um aspecto fundamental do
poder de afetação dos grupos e para a conquista de todo seu sucesso mundial.
Por meio da noção de consumo cultural, de Canclini (2005), admitimos o
consumo, ou o ato de consumir alguma coisa, como uma forma que auxilia o indivíduo
a conquistar um lugar na sociedade e, no caso do consumo da cultura hallyu, os
produtos associados aos grupos de k-pop podem ser uma maneira de estabelecer
vínculos afetivos e pertencimento entre os consumidores. Para o autor, a concepção de
consumo cultural corresponde a um “o conjunto de processos de apropriação e usos de
produtos nos quais o valor simbólico prevalece sobre os valores de uso e de troca, ou
onde ao menos estes últimos se configuram subordinados à dimensão simbólica”
(CANCLINI, 1993, p. 34). O valor simbólico ajuda a construir um conceito sobre o
material consumido, que no final terá uma parcela de incentivo na construção do caráter
do indivíduo consumidor, bem como no seu capital cultural. O consumo serve como um
elemento de aproximação, e a publicidade, junto com suas ferramentas, atua exatamente
nesse terreno.
Várias marcas têm se aproveitado dessa forte influência da onda hallyu para
alavancar vendas e atrair esse público em específico, buscando oferecer produtos e
serviços associados aos grupos de k-pop, na intenção de fazer o fã se sentir ainda mais
próximo do seu ídolo preferido. Esse poder de afetação é tão grande que a indústria
musical do país cresceu 17,9%10
. Só o k-pop rende US$ 4,7 bilhões ao ano para o país,
assim fazendo o ministério da cultura ter verba reforçada e um departamento dedicado à cultura
popular, simplesmente apelidado de “Departamento de K-pop”.
Essa euforia toda do k-pop refletiu também em outras formas de economia e fez o
turismo triplicar no país nos últimos 15 anos, pois um a cada 13 turistas cita o k-pop como
motivo para visitar o país.
8
Marcas como a OFF White, que são vistas sendo usada por ídolos, chegam a bater o valor de R$1.851,64 a
R$7.313,20 reais por uma jaqueta ou uma calça, já algo similar como jaquetas e moletons aos que eles costumam usar
chega a variar entre R$ 154,67 e R$ 193,35
9
Conheço pessoa que a somatória total do que ela tem hoje em posse de itens de kpop, como álbuns e dvds, chega a
somatória de R$ 4.360,00 já gastos.
10
https://g1.globo.com/pop-arte/musica/noticia/2019/05/23/k-pop-e-poder-como-coreia-do-sul-investiu-em-cultura-
e-colhe-lucro-e-prestigio-de-idolos-como-bts.ghtml.
4. Bangtan Boys
Formado por sete jovens (sendo eles RM, Jin, Suga, J-Hope, Jimin, V e
Jungkook), o Bangtan Sonyeondan ou, como é conhecido internacionalmente, o BTS,
foi criado em 2013, em Seoul, capital da Coreia do Sul.
O grupo inicialmente seria de hip-hop, seu EP (que é uma gravação em formato
digital ou cd de uma música que é longa demais para ser considerada um single e muito
curta para ser classificada como um álbum musical), de estreia 2 Cool 4 Sckoll e o
segundo EP O!RUL8,2? tinham a sonoridade do hip-hop da velha escola, com pegadas
dos anos 80 e 90. Já no EP Skool Luv Affair e no primeiro álbum de estúdio Dark &
Wild), o grupo explorou mais as influências de R&B, assim como no álbum The Most
Beautiful Moment in Life: Young Forever .
Porém, o grupo só começou a ganhar mais atenção no mundo em 2016, com o
álbum WINGS, que foi um trabalho em que eles experimentaram outros estilos, como o
pop e dance, mas ainda mantiveram sua base de hip-hop e R&B. No mesmo ano o BTS
foi indicado em sete categorias do MAMA 201611
, e ganhou dois grandes prêmios:
“Artista do Ano” e “Melhor Performance de Dança - Grupo Masculino ” devido à
grande popularidade que o grupo ganhou naquele ano junto ao crescimento do fandom.
Daí para frente todas as portas pareceram se abrir. Turnês mundiais com
performances impecáveis, shows lotados, ingressos esgotados em minutos, parcerias
com artistas internacionais12
, aparições e comeback13
em programas internacionais.
Em 2017 o BTS começou a ganhar os holofotes do mundo inteiro e foi o
primeiro grupo de kpop a participar de uma premiação americana, a Billboard Music
Awards, onde o grupo concorreu na categoria de “Top Social Artist”, levou o prêmio
nas edições de 2017, 2018 e 2019, e ainda se apresentou nas edições de 2018 com a
música “Fake Love” e 2019 com Boy With Luv. Ainda em 2019 foram convidados para
comparecer ao Grammy Awards apenas para apresentar a categoria de “Melhor Álbum
de R&B”.
No mesmo ano em que começou a experimentar a fama mundial, em 2017, o
BTS lançou Love Yourself: Her, o primeiro do álbum da trilogia Love Yourself, que
conta com mais dois títulos, o Love Yourself: Tear e o Love Yourself: Answer. Em
11
MAMA 2016: Mnet Asian Music Awards é uma das principais premiações da Coreia do Sul . É realizada
anualmente pela CJ E&M através do seu canal Mnet na Coreia do Sul.
12
O grupo já fez parceria com artistas como o Dj Steve Aoki, o duo eletrônico The Chainsmokers, a cantatora
americana Halsey, a cantora britânica Charli XCX e Ed Sheeran
13
Comeback: quando um grupo volta para se promover nos programas musicais, com uma nova música.
novembro desse mesmo ano o grupo oficializou a campanha “Love Myself”, uma
iniciativa financeira em parceira com o comitê coreano para a UNICEF, dedicada a
programas sociais que previnem a violência contra crianças e adolescentes. Nessa etapa
do grupo, 3% de cada renda da trilogia de “Love Yourself” foram revertidos em
doações para a causa.
Na verdade, essas ações humanitárias do grupo começaram em setembro de
2018, quando o BTS participou da 73ª Assembleia Geral das Nações Unidas, no
lançamento do projeto “Juventude 2030: A Estratégia da Juventude da ONU”, que
procura preparar todos os jovens 15 e 24 anos para um futuro emprego até 2030. Essa
ação também corresponde à campanha da UNICEF “Geração Ilimitada”, uma iniciativa
global que visa gerar o aumento de oportunidades e investimentos que proporcionem
educação e formação de qualidade aos jovens. O BTS foi selecionado para participar da
conferência devido ao grande impacto e popularidade na cultura jovem, através de suas
mensagens sociais em suas músicas e esforços anteriores14
.
O grupo tem uma base de músicas que trata de assuntos que ainda são
considerados tabu (especialmente dentro do país), como, por exemplo, ansiedade,
depressão, problemas sociais e auto aceitação. Assuntos como esses não são tratados
com frequência no kpop, e, portanto, podemos considerar que esse posicionamento é um
dos diferenciais do grupo. O fato do grupo ser aberto a esses assuntos, sentimentos e
dificuldades, amplia a admiração do público e faz com que os fãs se sintam próximos (e
mais devotos).
Eles também realizam streamings, transmissão através da internet, em que os
membros do grupo transmitem sua rotina pela plataforma V’live e aparecem
normalmente fazendo coisas mundanas e mostrando alguns “bastidores” do grupo que o
público adora conferir (por exemplo: reunidos em um quarto de hotel, após o show, eles
transmitem a “cena íntima” nas mídias sociais, na intenção de estimular a conversa com
os fãs e contar como foi o dia de interação com admiradores de várias partes do mundo).
O BTS se tornou algo tão grande que os integrantes foram nomeados como
algumas das pessoas mais influentes pela revista Times 100’s em 2019, e comparados
com a febre beatlemania15
. O grupo foi o primeiro desde os Beatles a conseguir
emplacar três álbuns em primeiro lugar na Billboard em menos de um ano.
14
Ainda no início da carreira, o grupo fez doação de sete toneladas de arroz para a caridade na cerimônia de abertura
do K-Star Road. Em 2017 cada membro doou dezmilhões de wons (que equivalem a R$ 32.531,93) para a Truth and
A Safer Society, para as famílias do náufrago do MV Sewol de 2014. (https://en.wikipedia.org/wiki/BTS_(band) |
https://www.love-myself.org/eng/home )
15
Beatlemania : Termo criado originalmente para descrever o intenso frenesi dos fãs da rock britânica Beatles.
Hoje, o BTS tem uma linha de mascotes, o BT21, em parceria com empresa sul
coreana Line; nome no Guinness Book por causa do vídeo mais visto do mundo em 24
horas e bonecos próprios lançados pela empresa Matel. Os integrantes do grupo também
foram embaixadores globais da marca LG Electronics, para promover o telefone LG G7
ThinQ, e foram contratados pela Puma e pela Hyundai Motor para participarem das
promoções das empresas para o SUV carro-chefe de 2019.
O BTS também conta com dois programas transmitidos pela plataforma V’live,
o RUN BT! e o Bon Voyage, que estabelecem mais uma forma de interação importante,
mesmo que indireta, pois apesar de não serem interativos como a lives, onde a interação
é simultânea. No RUN BTS! os garotos recebem missões que devem ser completadas e
se completadas podem ganhar prêmios ou punições, já o BTS: Bon Voyage é o programa
de férias, onde mostra a viagem dos setes pra algum destino que a empresa decide.
O grupo ainda ajuda na movimentação de lucros e turismo da Coreia do Sul direta
e indiretamente: segundo a Hyundai Institute o impacto econômico que o grupo tem no país é
de US$ 4,6 billhões anual ,em torno de R$18 bilhões por ano na economia. Estima-se que
grande parte dos 800 mil turistas que visitam o pais anualmente é influenciada pelo BTS.16
O grupo chega a fazer por volta de quatro a oito shows por mês, com uma média
de 27 shows por ano, em que os preços variam entre R$145 a R$750. Em alguns casos,
como o da turnê LOVE YOURSELF: SPEAK YOURSELF, as pessoas tinham a opção de
comprar o soundcheck package, em tradução livre pacote de passagem de som, que
dava o direito de entrada antecipada e lugar especial dentro da pista premium ,
passagem de som e cordão personalizado do grupo no valor de R$975.
Apesar de serem atarefados como a mídia mostra, o grupo se comunica via redes
sociais com o fãs e sempre se mostram atenciosos de algumas forma. Os integrantes
geralmente encontram alguma forma de retribuir o carinho e dedicação proporcionados
pelos fãs, seja postando algumas mensagens genérica, destinada a todo o fandom online,
ou até mesmo descendo do palco para agradecer uma fã cadeirante.
5. Fandom
Fandom é um termo utilizado para se referir à subcultura dos fãs em geral que,
segundo Jenkins (2009, p.39) “é caracterizada por um sentimento de camaradagem e
solidariedade com outros que compartilham os mesmos interesses”. O autor explica que
16
https://www.allkpop.com/article/2019/06/bts-estimated-to-have-a-46-billion-impact-on-koreas-economy-annually
¹7
https://capricho.abril.com.br/famosos/show-do-bts-tem-confusao-depois-que-jk-tenta-dar-oi-para-fa-
cadeirante/
fãs antigamente eram vistos como pessoas que cultivavam algum tipo de devoção.
Atualmente, na visão de Jenkins, os fãs saíram de uma margem da cultura popular e
viraram centro das reflexões relacionadas à produção e ao consumo das mídias.
Harrington, Gray e Sandvoss (2017) apontam a importância de se estudar os fãs
e como isso tem mudado no decorrer dos anos, pois a representação de conteúdo
midiático tem sido alterada da maneira positiva como decorrência da cultura de
convergência. Esse é um termo desenvolvido por Jenkins (2009), que observa como a
tecnologia vem influenciando as dinâmicas sociais. De acordo com a perspectiva do
autor17
, a convergência e a digitalização têm tido enorme impacto em como a mídia tem
sido utilizada e os fandoms são um exemplo concreto de como as pessoas podem se
apropriar de tecnologias para produzir e colocar em circulação determinados materiais
que configuram a experiência de um grupo bem delimitado. Quando se fala de interação
online, onde há a troca de informação, como acontece com fandoms, estamos falando da
cultura participativa, um termo desenvolvido por Jenkins para tratar das mudanças
sociais que ocorreram a partir da comunicação interativa possibilitada pelo surgimento e
popularização da internet. A cultura participativa tende a enxergar o consumidores de
mídia como um provável participante ativo, que interage não apenas no consumo, mas
também para a formação de novos conteúdos.
Sob essa perspectiva, o fandom pode ser observado como um espaço onde
pessoas aprendem a viver e a colaborar umas com as outras, como uma comunidade de
conhecimento. Fãs gerenciam páginas em plataformas como Facebook e Twitter, em
que a troca de informação e interação são constantes.
“... os fãs devem ser vistos como participantes ativos e sujeitos fortemente
responsáveis pelo processo de transformação, vivido, atualmente, pela mídia.
Ao decidir participar ativamente do processo de consumo, opinando e
interagindo com a indústria midiática, ou, ainda, apropriando-se e
ressignificando os produtos culturais, o fã modifica a lógica tradicional da
circulação midiática e cultural.” (SILVEIRA, 2010, p. 68-69).
Jenkins (2006, p. 41) ainda entende que o ambiente online é propício para a
interação social e declara que o consumidor midiático tem “habilidade de transformar
uma reação pessoal em uma interação social, cultura de espectador em cultura
participativa”. Algumas pessoas afirmam que ser integrante de um fandom é fazer parte
de uma família que não carrega o mesmo sangue, mas tem todo um instinto de
17
Cultura de Convergência segundo Henry Jenkins, são mudanças tecnológicas, industriais, culturais e sociais no
modo como as mídias circulam em nossa cultura.
cumplicidade e amizade, mesmo que nem todos os integrantes se conheçam
pessoalmente.
6. BTS & Fandom ARMY
O sucesso do BTS vem crescendo muito nos últimos dois anos, e isso se deve
também à extrema contribuição, dedicação e organização dos fandoms, que contam com
pessoas de etnias, gêneros e idades diferentes. Como uma manifestação de carinho, o
próprio grupo escolheu nomear os fãs que fazem parte de fandoms de army,
denominação que representa bem a dinâmica que o público estabelece com os artistas
do K-pop.
Army traduzido do inglês significa exército, e é assim que os integrantes dos
fandoms se reconhecem: como um verdadeiro exército, pronto para lutar pelos seus
ídolos. Os army são a proteção dos BulletProof Boy Scouts (Garotos à prova de balas),
tradução do inglês para o nome coreano Bangtan Sonyeondan.
O que faz o fandom do BTS ser único e um dos considerados mais poderosos no
mundo, segundo a Mtv News18
, é essa completa devoção aos sete rapazes sul coreanos.
O fandom tem atuação mundial e, por isso, possui “bases” espalhadas em
alguns países. Através das atividades online podemos perceber que as maiores bases do
fandom são a brasileira e a australiana. A fã-base Bangtan Brasil, ativa desde junho de
2013 no Twitter, conta com 302 mil seguidores e tem uma presença online assídua. A
equipe faz atualizações com traduções de notícias, postagens realizadas pelo grupo e
tradução das lives. O fandom produz muitos conteúdos que, além de manterem os fãs
atualizados, acabam ampliando a visibilidade e a fama do BTS.
Além da admiração pelo trabalho musical desenvolvido,, a forma como o grupo
demonstra-se acessível ao público faz com que o fandom se sinta tão próximo dos
integrantes, que os usuários chegam ao ponto de compartilhar um sentimento de
intimidade, de que conhecem muito bem cada um dos sete integrantes, como se eles
fossem um parente, ou um amigo muito próximo.
As ações do fandom extrapolam a relação direta com os ídolos e, às vezes,
rendem até campanhas solidárias e projetos voltados para a preservação da natureza19
.
18
https://www.youtube.com/watch?v=ErsjsFpIz4s
19
Como exemplo, o fandom da Austrália chegou a adotar um coala no zoológico da Austrália e o nomeou de Koya,
em homenagem ao mascote da linha BT21, criado pelo líder do grupo, RM19
. Outro exemplo foi a campanha de
arrecadação de cobertores e alimentos enlatados para os desabrigados, que aconteceu com a passagem do grupo por
Nova Iorque, no concerto histórico no estádio Citi Field19
.
Essa é a ligação entre BTS e o army. Os sete sul coreanos afetam a vida do
fandom desse de inspiração, superação até a movimentos em prol de boas causas.
Na intenção de compreender melhor como os fãs entendem a própria relação
com o BTS, realizamos entrevistas em profundidade com quatro integrantes do fandom
(sendo três de Belo Horizonte e um de São Paulo) para buscar informações qualitativas,
que possam aprofundar mais as percepções sobre a afetação do k-pop e do BTS na vida
de algumas pessoas.
6.1. Entrevista com os fãs
Elaboramos um questionário com nove perguntas que buscaram contornar o tipo de
vínculo estabelecido entre os fãs e a forma como eles se reconhecem dentro da proposta
do fandom.
Percebemos que, independente do tempo que a pessoa se considera fã do BTS, todos
afirmam se identificar muito com a mensagem transmitida pelas músicas e também
pessoalmente, com os integrantes do grupo.
Eu me identifico muito com a mensagem que o BTS procura transmitir. A
forma como o grupo aborda temas como auto aceitação, amor próprio,
autocuidado e saúde mental, por exemplo, conversa muito comigo. Além
disso, acho incrivelmente especial a perspectiva deles sobre o amor. Não
existe aquela vibe “garoto conhece garota” que, normalmente, percebemos
em outras boybands/boygroups. O que existe é uma perspectiva única sobre
tal sentimento, tornando possível que nós, enquanto fãs, percebamos e
encontremos significados de diversas formas., (B., 22 anos)
Outros aspectos comuns entre os entrevistados foram quanto às mídias usadas
para acessar informações sobre o grupo e aos gastos financeiros com itens do BTS. O
Twitter é a mídia social mais utilizada, mas outros sites de fãs também foram citados. A
plataforma V’live também foi bastante citada, demonstrando que os canais de
comunicação do grupo possuem audiência garantida. Em relação aos gastos com
produtos do grupo, os entrevistados não medem esforços e contam esses gastos como
verdadeiros investimentos. Entre essas aplicações financeiras estão tatuagens feitas em
homenagem ao grupo, ida aos shows e compras de álbuns e dvd’s vindas do exterior.
Eles também apresentam o desejo de ter produtos especiais, como o BT21, mascotes
criados pelo grupo, citados durante a pesquisa.
Por se tratar de um grupo mundial e que tem uma legião de fãs, questionamos
sobre a sensação de pertencimento (como é estar dentro do fandom), e obtivemos visões
e vivências diferentes. Foram citados aspectos negativos em relação ao fandom, que
chegaram a nos surpreender. Também observamos posicionamentos e experiências
diferentes entre quem está no fandom há pouco tempo e quem está desde o início. Essas
visões diferentes podem acontecer em função de tempo de vivencia e percepção
individual que cada fã cria.
O fandom em si não me representa, visto que em seu todo, são pessoas sem
caráter formado aos quais, muitas vezes objetificam algo ou alguém.
(C.22 anos)
A parte do fandom com a qual eu tenho contato é composta de pessoas muito
talentosas, muito espirituosas e bastante generosas. Mas eu tenho mais
contato com o pessoal mais “antigo” no fandom ou pessoas que não são tão
novas (de idade mesmo), então são geralmente fãs mais sensatas e
controladas. Nada desse estereótipo adolescente que tentam mostrar por aí (e
que existe também). (J.27 anos)
Analisando as outras respostas referentes ao sentimento de estar em “família”
dentro do fandom, percebemos, com uma dimensão um pouco maior, de como esse
aspecto afeta a vida e até o caráter de alguém. Os entrevistados admitiram que existe um
sentimento de companheirismo e carinho ao próximo, que se tornam perceptíveis nas
formas de acolhimento e ajuda entre as pessoas que, além de não se conhecerem
pessoalmente, ainda moram longe umas das outras. E essas ações são destinadas tanto a
membros internos do fandom, quanto ações externas para ajudar o próximo.
A partir desses comentários, podemos entender como os fãs se relacionam entre
si e, ainda, como se sentem em relação ao grupo. Através de um contato virtual e
permanente, os fãs criaram a própria linguagem para interagirem entre eles; cheia de
piadas internas e memes relacionados ao grupo, frases que têm significados particulares
e símbolos que só quem faz parte do fandom é capaz de decodificar. Isso acaba fazendo
do fandom um lugar único que transmite ao fã a sensação de pertencer àquele lugar.
Considerações Finais
A pesquisa aqui apresentada teve como intuito mostrar como a cultura sul
coreana tem afetado e influenciado a vida de quem a consome. Foram abordados
conceitos importantes para compreender o fenômeno da hallyu wave, o surgimento do
k-pop, e, ainda, para alcançar a dinâmica de afetação que mobiliza o fandom ao redor do
mundo.
Passamos por uma breve explicação sobre a formação da música sul coreana,
que consiste em elementos herdados do Japão e da música americana, aspectos
essenciais para a sonoridade que se tem no país hoje. Em seguida, exploramos o
contexto dos pioneiros do gênero que deram o nome ao k-pop, de como eles foram
mostrados ao público e como foi a aceitação deles. No decorrer do trabalho, percebemos
que o consumo foi e continua sendo fundamental para alimentar o universo do K-pop,
movido principalmente pela comoção do público, que produz conteúdos diversos para
serem colocados em circulação midiática.
Analisando a atuação do BTS, juntamente com seu público, observamos que a
publicidade se apresenta como uma ferramenta primordial para aproximar o público de
seus ídolos. Afinal, é por meio dos diversos produtos vinculados aos integrantes do BTS
que os fãs conseguem se sentir íntimos (eles afirmam isso, inclusive). Percebemos
também que o consumo cultural, como explicamos anteriormente, age como um
estímulo que extrapola as noções de mercado e do próprio consumismo. No caso do K-
pop, o consumo chega a influenciar a convivência social e até as perspectivas de vida
dos integrantes do fandom.
Na verdade, o K-pop e a própria hallyu são objetos complexos e absolutamente
extensos. Compreendemos que o poder de afetação dos integrantes é muito grande e a
publicidade se aproveita desse poder para impulsionar vendas. Ao mesmo tempo, os
próprios integrantes também são beneficiados com a publicidade, pois, a partir dela, a
visibilidade deles cresce exponencialmente. Nessa dinâmica, o público acaba
supervalorizando as ações publicitárias, já que é através delas que a sensação de
intimidade com os ídolos aumenta. Nesse sentido, podemos afirmar que a publicidade é
um pilar para o sucesso do K-pop; sem ela dificilmente a magia aconteceria.
Referências
ROUSSE-MARQUET, Jennifer. K-pop : the story of the well-oiled industry of standardized catchy tunes.
Institut national de l'audiovisuel, 2012.
BERNICKER,Leslie. Trot. O ritmo que marcou a Coreia do Sul está de volta. BrazilKoreia, 2015.
http://www.brazilkorea.com.br/trot-o-ritmo-que-marcou-coreia-sul-esta-de-volta/
LAURENS HARTONG, Jan. Musical terms worldwide: a companion for the musical explorer. Simon
Mills,2006.
MITCHELL,Tony . Global Noise: Rap and Hip Hop Outside the USA. Paperback, 2002
RAVIANAR, Mark. Introduction: Conceptualizing the Korean Wave Vol.31. Southeast Review of Asian
Studies ,2009.
FEATHERSTONE, Mike. Cultura de consumo e pós-modernismo. São Paulo: Nobel, 1995.
CANCLINI, Néstor García. Consumidores e cidadãos: conflitos multiculturais da globalização. 5. ed. Rio
de Janeiro: UFRJ, 2005.
GRAY,Jonathan,; SANDVOSS,Cornel; LEE HARRINGTO, C. Fandom, Identities and Communities in a
Mediated Worl. 2. Ed. Nova Iorque: New York University Press, 2007
JENKINS, Henry. Cultura da Convergência. 1. ed. Editora Aleph, 2009.
LEWIS,Lisa A. The Adoring Audience: Fan Culture and Popular Media. Londes, Routledge,1992.

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Hallyu Wave: K-pop Uma análise sobre o grupo BTS e seu poder de afetação

  • 1. Hallyu Wave: K-pop Uma análise sobre o grupo BTS e seu poder de afetação 1 Ariadne Lopes SANTOS2 Fernanda MEDEIROS3 Resumo: O presente trabalho visa compreender o fenômeno do K-pop a partir do poder de afetação (SIMÕES, 2014) que é desempenhado pelos integrantes dos grupos musicais que movimentam grande parte da onda hallyu. Para tanto, analisamos, como objeto empírico, a formação e a atuação do BTS, um dos principais grupos da atualidade, e realizamos, ainda, uma breve pesquisa de recepção com integrantes do fandom do Brasil, na intenção de apreendermos alguns valores que são negociados na relação entre ídolos e público. Ao final, apresentamos os resultados obtidos, demonstrando como o consumo cultural e a publicidade são fundamentais para o sucesso desse estilo musical. Palavras-chave: K-pop. Fandom. Poder de afetação. Introdução A música pop sul coreana chegou timidamente no Brasil, em 2011, chamando atenção apenas daqueles que já tinham alguma afinidade com a cultura asiática. Somente entre os anos 2014 e 2015 é que o estilo virou uma febre entre os jovens brasileiros. Totalmente curiosa, comecei a mergulhar nesse mundo querendo aprender mais sobre a música pop coreana e compreender os motivos daquilo causar tanta euforia nas pessoas que viviam desse estilo musical. Quanto mais pesquisava, mais aumentava a vontade de saber como algumas empresas sul coreanas, com ajuda da publicidade, construíram grupos da música pop e fizeram com que eles atingissem um nível global, em um curto espaço de tempo. 1 Trabalho apresentado no Centro Universitário Estácio de Belo Horizonte como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Comunicação Social/ Publicidade e Propaganda 2 Estudante de Graduação do 7º semestre do Curso de Publicidade e Propaganda do Centro Universitário Estácio de Belo Horizonte, e-mail: ariadne.lsantos93@gmail.com 3 Mestre orientadora do trabalho. Professora do Curso de Publicidade no Centro Universitário Estácio de Belo Horizonte, e-mail: medfernanda@gmail.com
  • 2. A cultura musical sul coreana se tornou presente na minha vida há pouco tempo, tanto na vida pessoal como na profissional, e, por isso, escolhi o tema para minha pesquisa de conclusão da graduação. Como futura comunicóloga e trabalhando diretamente com eventos que envolvem o gênero musical pop sul coreano, é de suma importância o entendimento acerca dos grupos que compõem o estilo e do envolvimento do público que consome e vive esse cenário. Nesse sentido, na intenção de alcançar o contexto que circunda o desenvolvimento do k-pop, o trabalho começa observando a formação da música pop sul coreana; como surgiu o termo hallyu wave e como ele foi desenvolvido em ambientes locais e globais. Posteriormente, busca-se entender o poder de afetação que o estilo musical tem na vida das pessoas que consomem esse amplo universo, e, por fim, apresentamos uma análise sobre a carreira de um dos maiores grupos de k-pop dos últimos anos, o BTS (Bangtan Sonyeondan), que tem atingido marcas globais impressionantes e que afeta, de forma positiva, a vida de fãs de quase todo o mundo. 1. A formação da música popular na Coreia Em meados dos anos 1950, a Coreia, que antes era um país só, sofreu uma ocupação japonesa, tanto territorial quanto cultural. Naquele tempo de luta contra a ocupação, os soldados norte americanos que estavam em terras coreanas na guerra ensinaram melodias ao povo coreano, que se tornaram populares e de alguma forma uma fonte de resistência contra a ocupação nipônica. De acordo com Rousee-Marquet (2012), Huimangga, ou Song Of Hope, a música da esperança, pode ser considerada a primeira música popular coreana. Por ser um tipo de manifesto e uma fonte de resistência contra a ocupação, os oficiais japoneses acabaram tirando a música de circulação, estabelecendo novamente suas próprias músicas ao povo coreano. Porém, os japoneses não contavam que os coreanos viessem a traduzir suas músicas e passassem a interpretá- las em seu próprio idioma. Contudo, um compositor japonês é que foi o responsável pelo trot, um estilo de música presente até hoje na Coreia do Sul . O trot misturava música coreana com estilo de músicas evangélicas americanas, e acabou por se tornar popular como um recurso de expressar os traumas da guerra. Com o tempo, o estilo também passou a falar sobre política, cotidiano e amor. Conforme afirma Bernicker, “trot ou teuroteu é um gênero de música pop coreana e é conhecido como antecessor do K-pop. O trot surgiu durante o domínio japonês por volta de 1900, tendo influência de elementos musicais japoneses, ocidentais e coreanos”. (BERNICKER, 2015)
  • 3. Com a divisão das Coreias no pós guerra, em 1953, as tropas americanas permaneceram em território sul coreano para manter a segurança. Isso acabou abrindo as portas do ocidente para o oriente, pois, com a chegada dos LP’s, as tropas americanas escutavam bastante country, blues, jazz e rock & roll e isso foi algo que os coreanos passaram a ouvir. Assim, música trot começou a se tornar ocidentalizada por conta das influências musicais que passaram a fazer parte do dia-a-dia da população sul coreana. 2. O termo “korean popular music” K-pop, termo de abreviação para Korean pop music, ou música popular coreana, um gênero originado na Coreia do Sul, é caracterizado pela variedade de elementos audiovisuais, utilização conjunta de componentes visuais e sonoros. Apesar de abranger todos os gêneros da música popular sul coreana, k-pop é mais usado para se referir ao estilo de música pop. Para entender o termo, é importante compreender como os grupos musicais começaram a se formar e a chamar a atenção do público. Em 1992 a emissora MBC, hoje uma das quatro grandes redes nacionais de televisão sul coreana, estreou com o grupo SeoTaiji & Boys, e isso fez todo o contexto da música sul coreana mudar. Antes do grupo, Seo Tai-ji (líder do grupo) tinha uma banda de haevy metal. Como o fim da banda, ele mudou totalmente seus rumos musicais, se juntando com Lee Ju-no e Yang Hyun-suk, que tinham deslumbre com as músicas feitas por Seo ainda na sua época de banda. Além do estilo musical, tinha também o visual, que era algo totalmente novo para o público: SeoTaiji & Boys vieram com brincos, jeans rasgados e dreadlocks4 . Depois de quatro álbuns o grupo chegou ao fim, em 1997, mas deixou um legado para as próximas gerações da música sul coreana que viriam após isso, pelo fato de o grupo ter trazido fortes influências americanizadas, que moldaram o que hoje é um fenômeno em termos de estilo musical. Contextualizando o Seo Taiji & Boys como uma grande referência do gênero, a revista Koreain publicou uma matéria em 20165 em que afirmava que “o grande sucesso de suas músicas foi atribuído às influências do estilo swingbeat¹, com letras inovadoras, que tratavam dos problemas da sociedade coreana e estimulavam o pensamento individual dos jovens”. O grupo foi importante para desenvolver um aspecto novo entre o público sul coreano, que não estava muito acostumado com o estilo rebelde e meio 4 Dreadlocks : Penteado na forma de mechas emaranhadas, ou uma forma de se manter os cabelos que se tornou famosa com o movimento rastafári. 5 http://revistakoreain.com.br/2016/09/kpop-uma-historia-seotaiji-and-boys
  • 4. americanizado que era apresentado pelo trio. Inclusive eles chegaram a ser censurados pelo visual “descolado”. Mas, mesmo com essas turbulências, o legado permaneceu. Juntamente com o trio e os grupos que sugiram posteriormente, inventou-se a “fórmula para criação de ídolos”, que foi tão bem sucedida a ponto de influenciar os grupos de k-pop mesmo agora, mais de 20 anos depois. A estratégia de promoção, que passou de geração a geração, baseava-se em músicas com uma base de hip hop e uma dança divertida. Esse método ainda é seguido, além de se provar ser eficaz não apenas na Coreia do Sul, como em todo mundo. (revistakoreain, 2016). Dessa nova geração do pop sul coreano, surgiu o grupo H.O.T, criado por Lee Soo Man, fundador da SM Entertainment. Temos uma dimensão de que dali para frente o pop sul coreano seria grande, ao assistirmos o drama “1997”, que conta a história e examina a cultura dos fãs extremistas que surgiram nos anos 1990, quando grupos de ídolos começaram a dominar os palcos e o K-pop estava nascendo, como citado anteriormente. A criação do k-pop deu tão certo que, após a SM, surgiram outras agências no mercado, como, por exemplo, a JYP Entertainment, Big Hit Entertainment e YG Entertainment. 2.1. A hallyu wave e seu viés k-pop Quando falamos hoje da cultura da Coreia do Sul nos referimos a ela como hallyu wave, ou a onda coreana. Hallyu significa “fluxo da Coreia”; o termo se refere à grande popularização da cultura sul coreana, e foi criado por jornalistas chineses que se surpreenderam com a popularidade da cultura sul coreana, que estava em pleno crescimento. A onda hallyu engloba diferentes aspectos culturais ligados à culinária local, à moda sul coreana, aos filmes e, especialmente, à música popular, que é o K-pop. Apesar de ter sido criada no início da década de 1990, junto com o surgimento do K-pop, só começamos a ouvir mais sobre esse termo a partir de 2009, quando o hallyu, em questão musical, ultrapassou a barreira asiática com a música Nobody, do grupo feminino Wonder Girls, que foi da JYP Entertainment, e emplacou na Hot 100 da Billboard. A onda hallyu atingiu de fato a marca global em 2012 com a música Gangman Style, do rapper PSY, que ficou por semanas no topo das paradas de músicas americanas e bateu recorde de visualizações no Youtube. O sucesso dessa canção agiu como um catalisador para a cultura hallyu, especialmente em questão musical, pois foi de fato
  • 5. uma contribuição para que novas pessoas descobrissem mais sobre o universo pop sul coreano. Aqui no Brasil, o primeiro show em grande escala do kpop foi concretizado com o festival United Cube - Fantasy Land, que contou com a presença dos grupos 4minute, B2ST e a cantora G.NA. Logo depois o país recebeu os shows dos grupos Super Junior e Nu’Est, no Music Bank Brasil, que foi um festival que reuniu seis grupos e uma cantora coreana. O Music Bank Brasil, realizado pela KBS 2014, que tem como uma das suas formas de entretenimento o programa musical Music Back lá na Coreia do Sul, trouxe SHINee, B.A.P., MBLAQ, INFINITE, CNBLUE, M.I.B e Ailee. De 2014 para cá, a vinda de grupos de k-pop tem aumentado, tendo em média três shows por ano de grupos coreanos no Brasil. Mas, ainda assim, a hallyu é tímida no nosso país. A concentração maior das atividades consta em São Paulo, onde são realizados de dois a cinco shows de grupos sul coreanos por ano e que ainda conta com o Centro Cultural Coreano, onde são realizadas atividades voltadas à cultura, como, por exemplo, aulas de k-pop com as coreografias dos grupos. 3. Publicidade e poder de afetação: a onda hallyu na vida do consumidor Nos últimos anos o k-pop tem se tornado algo tão grande, que empresas têm usado isso a seu favor em venda de produtos e até para promover um determinado estilo de vida. Isso se deve à influência e ao poder de afetação que os integrantes dos grupos de K-pop têm na vida do seus fãs e até entre simpatizantes do estilo. Os grupos carismáticos formados por ídolos, como são chamados, possuem uma legião de fãs que mobilizam um verdadeiro comércio em torno de diversas ações promocionais que são desenvolvidas a partir do universo musical. Cheios de estilo e esbanjando simpatia, os ídolos tendem a ser atenciosos com o público. Para Simões (2014, p. 213), “o carisma não deve ser visto apenas como dons singulares que as celebridades apresentam, mas como construído em sintonia com as esferas de poder com as quais dialogam”. Pensando no poder de afetação e nos valores que são encarnados por algumas figuras famosas, a autora reflete sobre a potência do carisma na atualidade, que transforma determinadas celebridades em verdadeiros exemplos de vida, orienta comportamentos e tradições; exatamente como acontece com os personagens do K-pop que são adorados pelo público.
  • 6. Nesse sentido, Simões (2014) observa a mídia como um dos principais centros ativos de poder, no que se refere à influência sob a construção de valores do senso comum e ao seu papel de formar e orientar comportamentos. As qualidades atribuídas ao “carisma” da pessoa famosa são colocadas na centralidade desse espaço de poder dominante, na condição de satisfazerem aos anseios da opinião pública, que, por sua vez, também já sofreram a interferência da mídia. A publicidade atua como uma ferramenta poderosa nesse processo de afetação, pois amplia a visibilidade dos famosos através da comercialização de uma grande diversidade de itens que são associados aos ídolos. As empresas investem nas ações promocionais que vinculam os grupos a algumas marcas. Afinal, esse é um jeito de atingir um público fiel de fãs, pré-disposto a consumir tudo (ou quase tudo) o que é vendável sobre o que diz respeito aos ícones idolatrados. Uma ação que exemplifica bem essa dinâmica de vinculação da marca com o grupo de K-pop foi o lançamento do Samsung Galaxy A70, edição especial do grupo feminino BLACKPINK6 , que teve sua edição lançada apenas na Tailândia, Vietnã, Indonésia e Malásia. O aparelho smartphone apresentava o diferencial de ser todo personalizado com itens das integrantes do grupo, e isso fez com que os fãs se sentissem mais próximos e íntimos das artistas por meio do aparelho (e, ao mesmo tempo, mais conectados com o produto por causa da chancela das integrantes do BLACKPINK). Percebemos que o consumo, nesse caso, também se relaciona com uma forma de pertencimento entre os fãs mais assíduos: como as integrantes da BLACKPINK têm um contrato com a Samsung, elas não podem ser vistas usando e nem pegando celulares de outras marcas, e isso fez com que uma fã, recentemente, comprasse um aparelho da Samsung, apenas para tirar foto com as integrantes7 . Algumas outras marcas globais, como Adidas, Nike e a coreana Tony Moly, utilizam da imagem de outros grupos e ídolos, para estampar as suas campanhas de novos produtos. Além disso, outros itens, como maquiagens, máscara facial, e até roupas similares ou iguais as que os ídolos usam são comercializadas e chegam a ter um valor 6 O grupo Blackpink existe desde 2016, é composto por quatro integrantes, com idades que variam entre 22 e 24 anos. Elas são o grupo de kpop feminino com maior ascensão internacional no último ano. 7 Foi feita uma thread, um linha de discussão em tópicos no twitter, mostrando a reação das integrantes do grupo, ao se depararem com um situação em que o celular não é da marca Samsung e uma fã que adquiriu o aparelho da marca, apenas pra ter a oportunidade te tirar foto com as meninas do grupo no aeroporto https://twitter.com/erivaldoff/status/1124022527041339399
  • 7. alto8 . Tem caso de fãs que gastam tanto com produtos referentes ao grupo de kpop preferido, que, contabilizando, no final é uma coleção até valiosa9 . Considerando a perspectiva de Featherstone (1995, p. 122), que afirma que o consumo “não deve ser compreendido apenas como consumo de valores de uso, de utilidades materiais, mas primordialmente como um consumo de signos”, é possível observar o papel da publicidade no universo Kpop como um aspecto fundamental do poder de afetação dos grupos e para a conquista de todo seu sucesso mundial. Por meio da noção de consumo cultural, de Canclini (2005), admitimos o consumo, ou o ato de consumir alguma coisa, como uma forma que auxilia o indivíduo a conquistar um lugar na sociedade e, no caso do consumo da cultura hallyu, os produtos associados aos grupos de k-pop podem ser uma maneira de estabelecer vínculos afetivos e pertencimento entre os consumidores. Para o autor, a concepção de consumo cultural corresponde a um “o conjunto de processos de apropriação e usos de produtos nos quais o valor simbólico prevalece sobre os valores de uso e de troca, ou onde ao menos estes últimos se configuram subordinados à dimensão simbólica” (CANCLINI, 1993, p. 34). O valor simbólico ajuda a construir um conceito sobre o material consumido, que no final terá uma parcela de incentivo na construção do caráter do indivíduo consumidor, bem como no seu capital cultural. O consumo serve como um elemento de aproximação, e a publicidade, junto com suas ferramentas, atua exatamente nesse terreno. Várias marcas têm se aproveitado dessa forte influência da onda hallyu para alavancar vendas e atrair esse público em específico, buscando oferecer produtos e serviços associados aos grupos de k-pop, na intenção de fazer o fã se sentir ainda mais próximo do seu ídolo preferido. Esse poder de afetação é tão grande que a indústria musical do país cresceu 17,9%10 . Só o k-pop rende US$ 4,7 bilhões ao ano para o país, assim fazendo o ministério da cultura ter verba reforçada e um departamento dedicado à cultura popular, simplesmente apelidado de “Departamento de K-pop”. Essa euforia toda do k-pop refletiu também em outras formas de economia e fez o turismo triplicar no país nos últimos 15 anos, pois um a cada 13 turistas cita o k-pop como motivo para visitar o país. 8 Marcas como a OFF White, que são vistas sendo usada por ídolos, chegam a bater o valor de R$1.851,64 a R$7.313,20 reais por uma jaqueta ou uma calça, já algo similar como jaquetas e moletons aos que eles costumam usar chega a variar entre R$ 154,67 e R$ 193,35 9 Conheço pessoa que a somatória total do que ela tem hoje em posse de itens de kpop, como álbuns e dvds, chega a somatória de R$ 4.360,00 já gastos. 10 https://g1.globo.com/pop-arte/musica/noticia/2019/05/23/k-pop-e-poder-como-coreia-do-sul-investiu-em-cultura- e-colhe-lucro-e-prestigio-de-idolos-como-bts.ghtml.
  • 8. 4. Bangtan Boys Formado por sete jovens (sendo eles RM, Jin, Suga, J-Hope, Jimin, V e Jungkook), o Bangtan Sonyeondan ou, como é conhecido internacionalmente, o BTS, foi criado em 2013, em Seoul, capital da Coreia do Sul. O grupo inicialmente seria de hip-hop, seu EP (que é uma gravação em formato digital ou cd de uma música que é longa demais para ser considerada um single e muito curta para ser classificada como um álbum musical), de estreia 2 Cool 4 Sckoll e o segundo EP O!RUL8,2? tinham a sonoridade do hip-hop da velha escola, com pegadas dos anos 80 e 90. Já no EP Skool Luv Affair e no primeiro álbum de estúdio Dark & Wild), o grupo explorou mais as influências de R&B, assim como no álbum The Most Beautiful Moment in Life: Young Forever . Porém, o grupo só começou a ganhar mais atenção no mundo em 2016, com o álbum WINGS, que foi um trabalho em que eles experimentaram outros estilos, como o pop e dance, mas ainda mantiveram sua base de hip-hop e R&B. No mesmo ano o BTS foi indicado em sete categorias do MAMA 201611 , e ganhou dois grandes prêmios: “Artista do Ano” e “Melhor Performance de Dança - Grupo Masculino ” devido à grande popularidade que o grupo ganhou naquele ano junto ao crescimento do fandom. Daí para frente todas as portas pareceram se abrir. Turnês mundiais com performances impecáveis, shows lotados, ingressos esgotados em minutos, parcerias com artistas internacionais12 , aparições e comeback13 em programas internacionais. Em 2017 o BTS começou a ganhar os holofotes do mundo inteiro e foi o primeiro grupo de kpop a participar de uma premiação americana, a Billboard Music Awards, onde o grupo concorreu na categoria de “Top Social Artist”, levou o prêmio nas edições de 2017, 2018 e 2019, e ainda se apresentou nas edições de 2018 com a música “Fake Love” e 2019 com Boy With Luv. Ainda em 2019 foram convidados para comparecer ao Grammy Awards apenas para apresentar a categoria de “Melhor Álbum de R&B”. No mesmo ano em que começou a experimentar a fama mundial, em 2017, o BTS lançou Love Yourself: Her, o primeiro do álbum da trilogia Love Yourself, que conta com mais dois títulos, o Love Yourself: Tear e o Love Yourself: Answer. Em 11 MAMA 2016: Mnet Asian Music Awards é uma das principais premiações da Coreia do Sul . É realizada anualmente pela CJ E&M através do seu canal Mnet na Coreia do Sul. 12 O grupo já fez parceria com artistas como o Dj Steve Aoki, o duo eletrônico The Chainsmokers, a cantatora americana Halsey, a cantora britânica Charli XCX e Ed Sheeran 13 Comeback: quando um grupo volta para se promover nos programas musicais, com uma nova música.
  • 9. novembro desse mesmo ano o grupo oficializou a campanha “Love Myself”, uma iniciativa financeira em parceira com o comitê coreano para a UNICEF, dedicada a programas sociais que previnem a violência contra crianças e adolescentes. Nessa etapa do grupo, 3% de cada renda da trilogia de “Love Yourself” foram revertidos em doações para a causa. Na verdade, essas ações humanitárias do grupo começaram em setembro de 2018, quando o BTS participou da 73ª Assembleia Geral das Nações Unidas, no lançamento do projeto “Juventude 2030: A Estratégia da Juventude da ONU”, que procura preparar todos os jovens 15 e 24 anos para um futuro emprego até 2030. Essa ação também corresponde à campanha da UNICEF “Geração Ilimitada”, uma iniciativa global que visa gerar o aumento de oportunidades e investimentos que proporcionem educação e formação de qualidade aos jovens. O BTS foi selecionado para participar da conferência devido ao grande impacto e popularidade na cultura jovem, através de suas mensagens sociais em suas músicas e esforços anteriores14 . O grupo tem uma base de músicas que trata de assuntos que ainda são considerados tabu (especialmente dentro do país), como, por exemplo, ansiedade, depressão, problemas sociais e auto aceitação. Assuntos como esses não são tratados com frequência no kpop, e, portanto, podemos considerar que esse posicionamento é um dos diferenciais do grupo. O fato do grupo ser aberto a esses assuntos, sentimentos e dificuldades, amplia a admiração do público e faz com que os fãs se sintam próximos (e mais devotos). Eles também realizam streamings, transmissão através da internet, em que os membros do grupo transmitem sua rotina pela plataforma V’live e aparecem normalmente fazendo coisas mundanas e mostrando alguns “bastidores” do grupo que o público adora conferir (por exemplo: reunidos em um quarto de hotel, após o show, eles transmitem a “cena íntima” nas mídias sociais, na intenção de estimular a conversa com os fãs e contar como foi o dia de interação com admiradores de várias partes do mundo). O BTS se tornou algo tão grande que os integrantes foram nomeados como algumas das pessoas mais influentes pela revista Times 100’s em 2019, e comparados com a febre beatlemania15 . O grupo foi o primeiro desde os Beatles a conseguir emplacar três álbuns em primeiro lugar na Billboard em menos de um ano. 14 Ainda no início da carreira, o grupo fez doação de sete toneladas de arroz para a caridade na cerimônia de abertura do K-Star Road. Em 2017 cada membro doou dezmilhões de wons (que equivalem a R$ 32.531,93) para a Truth and A Safer Society, para as famílias do náufrago do MV Sewol de 2014. (https://en.wikipedia.org/wiki/BTS_(band) | https://www.love-myself.org/eng/home ) 15 Beatlemania : Termo criado originalmente para descrever o intenso frenesi dos fãs da rock britânica Beatles.
  • 10. Hoje, o BTS tem uma linha de mascotes, o BT21, em parceria com empresa sul coreana Line; nome no Guinness Book por causa do vídeo mais visto do mundo em 24 horas e bonecos próprios lançados pela empresa Matel. Os integrantes do grupo também foram embaixadores globais da marca LG Electronics, para promover o telefone LG G7 ThinQ, e foram contratados pela Puma e pela Hyundai Motor para participarem das promoções das empresas para o SUV carro-chefe de 2019. O BTS também conta com dois programas transmitidos pela plataforma V’live, o RUN BT! e o Bon Voyage, que estabelecem mais uma forma de interação importante, mesmo que indireta, pois apesar de não serem interativos como a lives, onde a interação é simultânea. No RUN BTS! os garotos recebem missões que devem ser completadas e se completadas podem ganhar prêmios ou punições, já o BTS: Bon Voyage é o programa de férias, onde mostra a viagem dos setes pra algum destino que a empresa decide. O grupo ainda ajuda na movimentação de lucros e turismo da Coreia do Sul direta e indiretamente: segundo a Hyundai Institute o impacto econômico que o grupo tem no país é de US$ 4,6 billhões anual ,em torno de R$18 bilhões por ano na economia. Estima-se que grande parte dos 800 mil turistas que visitam o pais anualmente é influenciada pelo BTS.16 O grupo chega a fazer por volta de quatro a oito shows por mês, com uma média de 27 shows por ano, em que os preços variam entre R$145 a R$750. Em alguns casos, como o da turnê LOVE YOURSELF: SPEAK YOURSELF, as pessoas tinham a opção de comprar o soundcheck package, em tradução livre pacote de passagem de som, que dava o direito de entrada antecipada e lugar especial dentro da pista premium , passagem de som e cordão personalizado do grupo no valor de R$975. Apesar de serem atarefados como a mídia mostra, o grupo se comunica via redes sociais com o fãs e sempre se mostram atenciosos de algumas forma. Os integrantes geralmente encontram alguma forma de retribuir o carinho e dedicação proporcionados pelos fãs, seja postando algumas mensagens genérica, destinada a todo o fandom online, ou até mesmo descendo do palco para agradecer uma fã cadeirante. 5. Fandom Fandom é um termo utilizado para se referir à subcultura dos fãs em geral que, segundo Jenkins (2009, p.39) “é caracterizada por um sentimento de camaradagem e solidariedade com outros que compartilham os mesmos interesses”. O autor explica que 16 https://www.allkpop.com/article/2019/06/bts-estimated-to-have-a-46-billion-impact-on-koreas-economy-annually ¹7 https://capricho.abril.com.br/famosos/show-do-bts-tem-confusao-depois-que-jk-tenta-dar-oi-para-fa- cadeirante/
  • 11. fãs antigamente eram vistos como pessoas que cultivavam algum tipo de devoção. Atualmente, na visão de Jenkins, os fãs saíram de uma margem da cultura popular e viraram centro das reflexões relacionadas à produção e ao consumo das mídias. Harrington, Gray e Sandvoss (2017) apontam a importância de se estudar os fãs e como isso tem mudado no decorrer dos anos, pois a representação de conteúdo midiático tem sido alterada da maneira positiva como decorrência da cultura de convergência. Esse é um termo desenvolvido por Jenkins (2009), que observa como a tecnologia vem influenciando as dinâmicas sociais. De acordo com a perspectiva do autor17 , a convergência e a digitalização têm tido enorme impacto em como a mídia tem sido utilizada e os fandoms são um exemplo concreto de como as pessoas podem se apropriar de tecnologias para produzir e colocar em circulação determinados materiais que configuram a experiência de um grupo bem delimitado. Quando se fala de interação online, onde há a troca de informação, como acontece com fandoms, estamos falando da cultura participativa, um termo desenvolvido por Jenkins para tratar das mudanças sociais que ocorreram a partir da comunicação interativa possibilitada pelo surgimento e popularização da internet. A cultura participativa tende a enxergar o consumidores de mídia como um provável participante ativo, que interage não apenas no consumo, mas também para a formação de novos conteúdos. Sob essa perspectiva, o fandom pode ser observado como um espaço onde pessoas aprendem a viver e a colaborar umas com as outras, como uma comunidade de conhecimento. Fãs gerenciam páginas em plataformas como Facebook e Twitter, em que a troca de informação e interação são constantes. “... os fãs devem ser vistos como participantes ativos e sujeitos fortemente responsáveis pelo processo de transformação, vivido, atualmente, pela mídia. Ao decidir participar ativamente do processo de consumo, opinando e interagindo com a indústria midiática, ou, ainda, apropriando-se e ressignificando os produtos culturais, o fã modifica a lógica tradicional da circulação midiática e cultural.” (SILVEIRA, 2010, p. 68-69). Jenkins (2006, p. 41) ainda entende que o ambiente online é propício para a interação social e declara que o consumidor midiático tem “habilidade de transformar uma reação pessoal em uma interação social, cultura de espectador em cultura participativa”. Algumas pessoas afirmam que ser integrante de um fandom é fazer parte de uma família que não carrega o mesmo sangue, mas tem todo um instinto de 17 Cultura de Convergência segundo Henry Jenkins, são mudanças tecnológicas, industriais, culturais e sociais no modo como as mídias circulam em nossa cultura.
  • 12. cumplicidade e amizade, mesmo que nem todos os integrantes se conheçam pessoalmente. 6. BTS & Fandom ARMY O sucesso do BTS vem crescendo muito nos últimos dois anos, e isso se deve também à extrema contribuição, dedicação e organização dos fandoms, que contam com pessoas de etnias, gêneros e idades diferentes. Como uma manifestação de carinho, o próprio grupo escolheu nomear os fãs que fazem parte de fandoms de army, denominação que representa bem a dinâmica que o público estabelece com os artistas do K-pop. Army traduzido do inglês significa exército, e é assim que os integrantes dos fandoms se reconhecem: como um verdadeiro exército, pronto para lutar pelos seus ídolos. Os army são a proteção dos BulletProof Boy Scouts (Garotos à prova de balas), tradução do inglês para o nome coreano Bangtan Sonyeondan. O que faz o fandom do BTS ser único e um dos considerados mais poderosos no mundo, segundo a Mtv News18 , é essa completa devoção aos sete rapazes sul coreanos. O fandom tem atuação mundial e, por isso, possui “bases” espalhadas em alguns países. Através das atividades online podemos perceber que as maiores bases do fandom são a brasileira e a australiana. A fã-base Bangtan Brasil, ativa desde junho de 2013 no Twitter, conta com 302 mil seguidores e tem uma presença online assídua. A equipe faz atualizações com traduções de notícias, postagens realizadas pelo grupo e tradução das lives. O fandom produz muitos conteúdos que, além de manterem os fãs atualizados, acabam ampliando a visibilidade e a fama do BTS. Além da admiração pelo trabalho musical desenvolvido,, a forma como o grupo demonstra-se acessível ao público faz com que o fandom se sinta tão próximo dos integrantes, que os usuários chegam ao ponto de compartilhar um sentimento de intimidade, de que conhecem muito bem cada um dos sete integrantes, como se eles fossem um parente, ou um amigo muito próximo. As ações do fandom extrapolam a relação direta com os ídolos e, às vezes, rendem até campanhas solidárias e projetos voltados para a preservação da natureza19 . 18 https://www.youtube.com/watch?v=ErsjsFpIz4s 19 Como exemplo, o fandom da Austrália chegou a adotar um coala no zoológico da Austrália e o nomeou de Koya, em homenagem ao mascote da linha BT21, criado pelo líder do grupo, RM19 . Outro exemplo foi a campanha de arrecadação de cobertores e alimentos enlatados para os desabrigados, que aconteceu com a passagem do grupo por Nova Iorque, no concerto histórico no estádio Citi Field19 .
  • 13. Essa é a ligação entre BTS e o army. Os sete sul coreanos afetam a vida do fandom desse de inspiração, superação até a movimentos em prol de boas causas. Na intenção de compreender melhor como os fãs entendem a própria relação com o BTS, realizamos entrevistas em profundidade com quatro integrantes do fandom (sendo três de Belo Horizonte e um de São Paulo) para buscar informações qualitativas, que possam aprofundar mais as percepções sobre a afetação do k-pop e do BTS na vida de algumas pessoas. 6.1. Entrevista com os fãs Elaboramos um questionário com nove perguntas que buscaram contornar o tipo de vínculo estabelecido entre os fãs e a forma como eles se reconhecem dentro da proposta do fandom. Percebemos que, independente do tempo que a pessoa se considera fã do BTS, todos afirmam se identificar muito com a mensagem transmitida pelas músicas e também pessoalmente, com os integrantes do grupo. Eu me identifico muito com a mensagem que o BTS procura transmitir. A forma como o grupo aborda temas como auto aceitação, amor próprio, autocuidado e saúde mental, por exemplo, conversa muito comigo. Além disso, acho incrivelmente especial a perspectiva deles sobre o amor. Não existe aquela vibe “garoto conhece garota” que, normalmente, percebemos em outras boybands/boygroups. O que existe é uma perspectiva única sobre tal sentimento, tornando possível que nós, enquanto fãs, percebamos e encontremos significados de diversas formas., (B., 22 anos) Outros aspectos comuns entre os entrevistados foram quanto às mídias usadas para acessar informações sobre o grupo e aos gastos financeiros com itens do BTS. O Twitter é a mídia social mais utilizada, mas outros sites de fãs também foram citados. A plataforma V’live também foi bastante citada, demonstrando que os canais de comunicação do grupo possuem audiência garantida. Em relação aos gastos com produtos do grupo, os entrevistados não medem esforços e contam esses gastos como verdadeiros investimentos. Entre essas aplicações financeiras estão tatuagens feitas em homenagem ao grupo, ida aos shows e compras de álbuns e dvd’s vindas do exterior. Eles também apresentam o desejo de ter produtos especiais, como o BT21, mascotes criados pelo grupo, citados durante a pesquisa. Por se tratar de um grupo mundial e que tem uma legião de fãs, questionamos sobre a sensação de pertencimento (como é estar dentro do fandom), e obtivemos visões e vivências diferentes. Foram citados aspectos negativos em relação ao fandom, que chegaram a nos surpreender. Também observamos posicionamentos e experiências diferentes entre quem está no fandom há pouco tempo e quem está desde o início. Essas
  • 14. visões diferentes podem acontecer em função de tempo de vivencia e percepção individual que cada fã cria. O fandom em si não me representa, visto que em seu todo, são pessoas sem caráter formado aos quais, muitas vezes objetificam algo ou alguém. (C.22 anos) A parte do fandom com a qual eu tenho contato é composta de pessoas muito talentosas, muito espirituosas e bastante generosas. Mas eu tenho mais contato com o pessoal mais “antigo” no fandom ou pessoas que não são tão novas (de idade mesmo), então são geralmente fãs mais sensatas e controladas. Nada desse estereótipo adolescente que tentam mostrar por aí (e que existe também). (J.27 anos) Analisando as outras respostas referentes ao sentimento de estar em “família” dentro do fandom, percebemos, com uma dimensão um pouco maior, de como esse aspecto afeta a vida e até o caráter de alguém. Os entrevistados admitiram que existe um sentimento de companheirismo e carinho ao próximo, que se tornam perceptíveis nas formas de acolhimento e ajuda entre as pessoas que, além de não se conhecerem pessoalmente, ainda moram longe umas das outras. E essas ações são destinadas tanto a membros internos do fandom, quanto ações externas para ajudar o próximo. A partir desses comentários, podemos entender como os fãs se relacionam entre si e, ainda, como se sentem em relação ao grupo. Através de um contato virtual e permanente, os fãs criaram a própria linguagem para interagirem entre eles; cheia de piadas internas e memes relacionados ao grupo, frases que têm significados particulares e símbolos que só quem faz parte do fandom é capaz de decodificar. Isso acaba fazendo do fandom um lugar único que transmite ao fã a sensação de pertencer àquele lugar. Considerações Finais A pesquisa aqui apresentada teve como intuito mostrar como a cultura sul coreana tem afetado e influenciado a vida de quem a consome. Foram abordados conceitos importantes para compreender o fenômeno da hallyu wave, o surgimento do k-pop, e, ainda, para alcançar a dinâmica de afetação que mobiliza o fandom ao redor do mundo. Passamos por uma breve explicação sobre a formação da música sul coreana, que consiste em elementos herdados do Japão e da música americana, aspectos essenciais para a sonoridade que se tem no país hoje. Em seguida, exploramos o contexto dos pioneiros do gênero que deram o nome ao k-pop, de como eles foram mostrados ao público e como foi a aceitação deles. No decorrer do trabalho, percebemos
  • 15. que o consumo foi e continua sendo fundamental para alimentar o universo do K-pop, movido principalmente pela comoção do público, que produz conteúdos diversos para serem colocados em circulação midiática. Analisando a atuação do BTS, juntamente com seu público, observamos que a publicidade se apresenta como uma ferramenta primordial para aproximar o público de seus ídolos. Afinal, é por meio dos diversos produtos vinculados aos integrantes do BTS que os fãs conseguem se sentir íntimos (eles afirmam isso, inclusive). Percebemos também que o consumo cultural, como explicamos anteriormente, age como um estímulo que extrapola as noções de mercado e do próprio consumismo. No caso do K- pop, o consumo chega a influenciar a convivência social e até as perspectivas de vida dos integrantes do fandom. Na verdade, o K-pop e a própria hallyu são objetos complexos e absolutamente extensos. Compreendemos que o poder de afetação dos integrantes é muito grande e a publicidade se aproveita desse poder para impulsionar vendas. Ao mesmo tempo, os próprios integrantes também são beneficiados com a publicidade, pois, a partir dela, a visibilidade deles cresce exponencialmente. Nessa dinâmica, o público acaba supervalorizando as ações publicitárias, já que é através delas que a sensação de intimidade com os ídolos aumenta. Nesse sentido, podemos afirmar que a publicidade é um pilar para o sucesso do K-pop; sem ela dificilmente a magia aconteceria. Referências ROUSSE-MARQUET, Jennifer. K-pop : the story of the well-oiled industry of standardized catchy tunes. Institut national de l'audiovisuel, 2012. BERNICKER,Leslie. Trot. O ritmo que marcou a Coreia do Sul está de volta. BrazilKoreia, 2015. http://www.brazilkorea.com.br/trot-o-ritmo-que-marcou-coreia-sul-esta-de-volta/ LAURENS HARTONG, Jan. Musical terms worldwide: a companion for the musical explorer. Simon Mills,2006. MITCHELL,Tony . Global Noise: Rap and Hip Hop Outside the USA. Paperback, 2002 RAVIANAR, Mark. Introduction: Conceptualizing the Korean Wave Vol.31. Southeast Review of Asian Studies ,2009. FEATHERSTONE, Mike. Cultura de consumo e pós-modernismo. São Paulo: Nobel, 1995. CANCLINI, Néstor García. Consumidores e cidadãos: conflitos multiculturais da globalização. 5. ed. Rio de Janeiro: UFRJ, 2005. GRAY,Jonathan,; SANDVOSS,Cornel; LEE HARRINGTO, C. Fandom, Identities and Communities in a Mediated Worl. 2. Ed. Nova Iorque: New York University Press, 2007 JENKINS, Henry. Cultura da Convergência. 1. ed. Editora Aleph, 2009. LEWIS,Lisa A. The Adoring Audience: Fan Culture and Popular Media. Londes, Routledge,1992.