O padre Moisés Ribeiro é abordado e baleado por um homem armado na igreja São Francisco, onde trabalhava há mais de dez anos. O agressor cita versículos bíblicos enquanto ataca o padre, que reconhece o homem mas não consegue se lembrar de onde. O padre é baleado nas pernas e nos testículos, e o agressor deixa claro que não pretende matá-lo rapidamente, fazendo-o sofrer pela dor.
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O eco do machado.prólogo
1. O ECO DO MACHADO
Prólogo
Eram duas horas da tarde em Brasília. O
padre
Moisés Ribeiro,
50
anos,
caminhava
lentamente pelo extenso corredor da igreja São
Francisco, onde já atuava por mais de dez anos.
Tinha na face uma expressão tranquila.
As feições do seu rosto, no entanto,
começaram a mudar no momento em que um
homem alto e corpulento, de cabelos ondulados,
cintilando nos olhos uma luz fria e maldosa,
interrompendo seu caminho, surgiu à sua frente
com uma arma na mão.
Encaminhava-se
o
reverendo
para
a
sacristia, onde completaria os últimos preparativos
para a missa do dia. Parado o padre ficou ao avistar
a ameaça, internamente rezando para que alguém
surgisse, mas todas as entradas e saídas estavam
2. O ECO DO MACHADO
fechadas. Seu corpo começava a tremer e suas
mãos a suar; estava sozinho e sem escapatória.
O homem então, interrompendo a visão que
o padre teria do altar-mor, falou com uma voz que
o padre assustadoramente parecia reconhecer.
— Quando eu era menino, falava como
menino, sentia como menino, discorria como
menino, mas, logo que cheguei a ser homem,
acabei com as coisas de menino. Primeiro
Coríntios, capítulo 13, versículo 11.
Paralisado, o padre o encarava, tentando
recordar de onde o conhecia.
Sem demonstrar pressa, o agressor que tinha
os olhos azuis e cabelos louros, além dos ombros
largos, aproximava-se o espreitando com olhares
atentos e frios. Com a pistola apontada para o
padre, ele continuava sua fala:
3. O ECO DO MACHADO
— A falsa testemunha não ficará impune e o
que respira mentiras não escapará. Provérbios,
capítulo 19, versículo 5 — a voz era suave,
harmônica. — Diga-me, não era isso que nos
ensinava?
— Precisamos conversar, baixe a arma —
tremulou o padre, imóvel e sem defesa, pregado no
amplo corredor da igreja. — Não faça isso, Deus
jamais vai lhe perdoar.
— As mesmas mentiras de sempre — o
homem estava sereno, não demonstrava qualquer
alteração no rosto. — O que guardar o mandamento
guardará a sua alma; porém, o que desprezar os
seus caminhos morrerá. Provérbios, capítulo 19,
versículo 16.
O padre sentia o peito querendo sair de seu
corpo,
os
batimentos
do
seu
coração
só
aumentavam. Ele reconhecia o agressor, mas não
conseguia se lembrar de onde nem de quando.
4. O ECO DO MACHADO
— Talvez não se lembre de mim, mas não
importa. Hoje o mundo se tornará um mundo
melhor e mais justo. Não importa o que você diga,
a sua vida não será poupada — o homem
continuava com a arma firmemente apontada para o
padre. — O senhor já causou desgraça demais a
esse mundo.
Ribeiro continuava parado, sentindo a
adrenalina nas veias, sem conseguir se mover. Até
que conseguiu movimentar um pé para trás e
começar a falar.
— Espere, filho — disse, desesperado. —
Deus age de forma que não podemos entender — o
padre sentia a morte se aproximar; em desespero,
falava sem pensar e não conseguia ouvir direito o
som da própria voz.
O atacante continuava não demonstrando
qualquer mudança no semblante.
5. O ECO DO MACHADO
— O senhor devia me agradecer pelo que
vou fazer.
Ribeiro encolhia-se de medo.
— Afinal vou lhe proporcionar uma viagem
à vida eterna, ao lado de seu amado Pai — disse o
musculoso homem, irônico. — O senhor passou a
vida toda se preparando para essa viagem.
O padre já podia sentir o cheiro pungente da
própria morte, com os olhos vidrados na enorme
figura à sua frente, ele sabia que o fim se
aproximava.
— O senhor é o primeiro, mas com certeza
não será o último a pagar por seus pecados — falou
o atacante.
Um dos tiros, silenciosamente, acertou a
perna direita, e o outro os seus testículos. A
primeira bala explodiu o joelho do padre que
pendeu vagarosamente até cair de vez.
6. O ECO DO MACHADO
— Morrer não é fácil, não ache que morrerá
tão depressa. Se fosse fácil morrer, hoje eu não
estaria aqui — disse o homem armado.
Ribeiro gritava, mas a dor era inevitável. E
o outro gostaria de sorrir ao ver o sofrimento do
padre, mas suas emoções estavam esgotadas, e as
feições de sua face há quatro anos estavam mortas.
— Sua morte, por mais lenta que seja,
nunca poderá ser comparada ao sofrimento que
causara em toda a sua vida... Logo o senhor sentirá
sede.
Ainda vivo, Moisés Ribeiro, outra vez
encarou com um olhar mais assustado o forte
homem e conseguiu se lembrar de onde e de
quando o conhecia. Pensou nas crianças que
frequentavam todos os dias a igreja e chorou. As
lágrimas desciam e ele soluçava. Sabia que havia
falhado em sua missão.
Quantas vidas eu destruí, meu Deus!
7. O ECO DO MACHADO
A dor o fazia tremer, mas já não a sentia
mais, a culpa que sentia era a maior das suas
aflições. Estava pronto, reuniu todas as suas forças
e torceu para que os últimos minutos de vida que
ainda lhe restavam, evaporassem o mais rápido
possível.
***