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Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna
1
SergeKahiliKing
MAGIA E CURA
KAHUNA
Saúde Holística e Práticas de
Cura da Polinésia
Tradução:
Marcos Malvezzi Leal
MADRAS
Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna
2
Publicado originalmente em inglês sob o título Kahuna Healing — Holistic health
and healing practices of Polynesia, em Theosophical Publishing House, 306 Wes
Geneva Road Wheaton, Illinois 60187 USA © 1983, Serge King Tradução
autorizada do inglês
Direitos de edição para todos os países de língua portuguesa © 2004, Madras
Editora Ltda.
Editor:
Wagner Veneziani Costa
Produção e Capa: Equipe Técnica Madras
Tradução:
Marcos Malvezzi Leal Revisão:
Augusto do Nascimento Ana Maria Balboni Palma
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE ________ SINDICATO
NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ. ____________________
K64m King, Serge
Magia e Cura Kahuna: Saúde Holística e Práticas de cura da Polinésia/Serge Hahili
King;
tradução Marcos Malvezzi Leal. - São Paulo: Madras, 2004
Tradução de: Kahuna healing
Apêndice
Inclui bibliografia
ISBN 85-7374-812-5
1. Cura pela mente. 2. Cura - Havaí. 3. Havaianos - Medicina. 4. Kahuna. I. Título.
04-0798. CDD 615.851
CDU 615.85
23.03.04 __________________24.03.04________________________005926
Proibida a reprodução total ou parcia desta obra, de qualquer forma ou por
qualquer meio eletrônico, mecânico, inclusive por meio de processos xerográ-
ficos, sem permissão expressa do editor (Lei n? 9.610, de 19.2.1998)
Todos os direitos desta edição, em língua portuguesa, são reservados pela
MADRAS EDITORA LTDA. [
Rua Paulo Gonçalves, 88 — Santana
02403-020 —São Paulo —SP
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Tel.: (0 11) 6959.1127 — Fax: (0_ _11) 6959.3090
www.madras.com.br
Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna
3
Dedicatória
Este livro é dedicado a Harry L. King, meu pai e
meu primeiro professor Huna; a O., que manteve o
Huna vivo em mim, enquanto eu crescia e me tornava
adulto; a M'Bala, que me ensinou tanto sobre energia
psíquica; e especialmente a Wana Kahili, cujo profundo
conhecimento da filosofia e das tradições Huna
tornaram possível esta apresentação.
Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna
4
Índice
Prefácio................... ............................................................................................ 06
Capítulo 1
Os Kahunas .......................................................................................................... 14
O Povo da Polinésia................................................................................... 14
O Sistema Kapu........................................................................................... 15
Os Kahunas do Havaí................................................................................ 16
As Ordens Kahunas................................................................................... 20
A Ordem de Ku.................................. ................... . ......................... ........ 21
A Ordem de Lono .................................... .................................................. 21
A Ordem de Kane ....................................................................................... 21
Os Renegados .............................................................................................. 22
Os Kahunas Hoje ................................. ................... ......... ........................ 22
Capítulo 2
A Tradição Interior........................................................................................... 23
A "Bíblia" Kahuna....................................................................................... 23
O Conceito de Deus.................................................................................... 25
Kane................................................................................................................. 25
Ku ..................................................................................................................... 26
Lono................................................................................................................. 26
Kanaloa........................................................................................................... 26
Homem Trino ..............................................................................................27
A Divindade..................................................................................................27
Espíritos.........................................................................................................27
Crenças e Realidade..................................................................................28
Vida e Morte.................................................................................................29
Bem e Mal......................................................................................................30
Amor e Emoções.........................................................................................31
Relatividade .................................................................................................32
Capítulo 3
Práticas Psíquicas .........................................................................................34
Níveis de Consciência...............................................................................34
Primeiro Nível: Físico (Ike Papakahi) ...............................34
Segundo Nível: Psíquico (Ike Papalua) .............................34
Terceiro Nível: Relacionai (Ike Papakolu).......................35
Quarto Nível: Místico (Ike Papakauna) ............................35
Mente, Energia e Matéria............................................................... .......35
Simbologia ....................................................................................................36
Categorias de Poderes Psíquicos............................... ........................37
Telepatia (Una).............................................................................37
Clarividência (Kilo/Nana Ao)................................................38
Pré-cognição (Wanana) ...........................................................38
Psicocinesia (Kalakupua)........................................................40
Destruição Psicocinética (Ana-ana)....................................40
Contrafeitiçaria...........................................................................................42
Habilidades Psíquicas são Neutras.....................................................43
Capítulo 4
Abordagem Mente/Corpo ..........................................................................44
Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna
5
O Eu Superior (Kane/Aumakua).......................................................44
Mente Consciente (Lono)......................................................................47
O Subconsciente (Ku) ................................................................... 47
O Corpo (Kino) ........................................ .................................................48
Fluxo Biológico de Energia ...................................................................49
Emoções.........................................................................................................51
A Natureza e a Formação de Complexos..........................................52
Pressuposições (Paulele)......................................................................53
Atitudes (Kuana) ......................................................................................54
Complexos (Hilina'i)..................................................................... ..........55
Feedback Ecológico.............................................................. ....................56
Capítulo 5
Métodos de Cura............................................................................................59
"Terapia Estratégica".............................................................................. 59
A Abordagem Material ........................................................................... 60
Remédios ..................................................................................................... 60
Dieta............................................................................................................... 62
Ritual ............................................................................................................. 63
Objetos Energizados................................................................................ 63
A Abordagem Energética....................................................................... 64
Manipulação Física .................................................................................. 64
O Corpo (Kino).......................................................................................... 65
Manipulação de Campo................................................ .......................... 65
A Abordagem Mental .............................................................................. 66
Percepção dos Pensamentos (Ike) ................................................... 67
Estabelecer Metas (Makiá) ......... . ..................................................... 67
Mudar (Kala)............................................................................................. 68
Direcionar Energia (Manawa)........................................................... 68
Falha no Tratamento......................................... ....... —....................... 69
Cura Divina.................... ............................................................................ 70
Encerramento (Panina) ....................................................................... 71
Epílogo............................................................................................. 72
Apêndice
O Código Kahuna ........................................................................................... 75
Regras do Código....................................................................................... 76
Exemplos....................................................................................................... 76
Bibliografia Comentada sobre Huna e os Kahunas............ 80
Outras Referências..................................., ............................................... 86
Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna
6
Prefácio
'Tempestade de areia!" Camelos grunhindo, cavalos relinchando, e o pequeno grupo
de homens corria para proteger as cabeças de seus animais da poeira cortante, antes de
cobrir os próprios rostos com cachecóis de lã. Como era típico em Gobi, a tempestade caíra
sobre eles quase sem avisar. Os homens tossiam e praguejavam em mongol e inglês,
aglomerando-se e cambaleando passos à frente. Um dos guias havia notado alguns montes
de areia à esquerda, antes da tempestade, e era para lá que ele guiava o grupo, na
esperança de encontrar alguma pequena proteção contra o vento e a areia. Minutos
depois, ele deparou com o que sobrara de um muro de tijolos de barro, remanescente dos
antigos vilarejos em ruínas que ainda pontilham o deserto. "Abrigo! Abrigo aqui!", gritou.
Sua voz era abafada pelo vento e por seu cachecol, mas a mensagem foi ouvida e passada
adiante. Homens e animais marchavam adiante com esforço e dificuldade, na tentativa de
se esconder entre os recessos protetores de muros caídos e pilhas de entulho.
Aparentemente, o acaso sorrira para eles.
Um dos homens, o mais jovem dos estrangeiros naquela expedição científica e
política, abrigou-se na junção de dois muros, a alguma distância dos outros. Lá,
agachou-se ao lado do cavalo para esperar que a tempestade passasse. A expedição
da qual fazia parte era uma dentre muitas, enviadas pela Inglaterra no começo do
século XX, quando a Ásia ainda era um joguete nas lutas por poder entre os impérios
britânico, russo e chinês. O jovem refletia sobre tudo isso quando subitamente o solo na
frente de seus pés pareceu partir-se, abrindo um buraco diante dele. Em meio à claridade
da luz do sol, ofuscada péla cortina de areia, ele viu degraus que conduziam para o fundo
escuro. Percebeu que devia estar em cima do telhado de um velho edifício, e seus passos
até provavelmente tinham enfraquecido a sustentação. Extremamente curioso e ignorando
qualquer perigo, o jovem deixou o cavalo e desceu pelos degraus.
Pela abertura, entrava luz suficiente para lhe permitir enxergar de forma difusa o
ambiente; e o que viu fê-lo suspirar, surpreso. Estava numa sala de mais ou menos 9
metros de comprimento por 4,5 metros de largura. As paredes de ambos os lados
mostravam o que pareciam ser afrescos, mas a iluminação filtrada através da abertura em
cima não possibilitava distinguir detalhes das imagens. Deu mais alguns passos e viu uma
mesa na extremidade oposta. Ao se aproximar dela, percebeu que parecia mais um altar de
pedra. Bem no centro desse altar, encontrava-se uma jóia, um bracelete. Ao pegá-lo, ouviu
um ruído atrás de si, e se voltou. Começava a cair areia pela abertura, ameaçando
enterrá-lo vivo. Enfiando o bracelete num bolso, correu de volta aos degraus e quase
rastejou para sair. O cavalo não estava mais lá e a tempestade estava piorando. A única
coisa que podia fazer agora era encolher-se no canto entre os escombros e esperar.
Finalmente, a tempestade acabou. O rapaz, quase totalmente coberto de areia, tirou o
pano que lhe cobria a cabeça e apertou os olhos, observando um mundo diferente. O sol
brilhava através de um ar limpo e não havia mais nenhum traço do buraco por onde ele se
havia espremido para entrar. A areia encobrira tudo, inclusive os pedaços do muro que
serviam de abrigo. Foi então que ouviu vozes. "Harry! Harry, onde está você?" "Aqui", ele
gritou, e abriu caminho entre a areia, saindo do ninho protetor. Os outros tinham
encontrado o seu cavalo, e ficaram muito aliviados ao ver que ele também estava inteiro.
Ninguém se interessou por sua história sobre uma sala com afrescos e um altar. Estavam
Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna
7
ansiosos para sair daquela zona de areia e alcançar as estepes. Após ouvir brincadeiras
sobre ter sofrido uma insolação, ele não mencionou mais sua aventura, e a expedição
prosseguiu.
Alguns meses depois, Harry estava de volta a Londres, reportando-se ao seu superior
no departamento do governo onde trabalhava. Quase no fim de seu recital sobre sua
participação na expedição, enfiou a mão no bolso e tirou o bracelete. "O que o senhor acha
que é isto?", perguntou, colocando o objeto sobre a mesa. "Parece um mapa do sistema
solar, não parece?" Harry esperava uma ligeira curiosidade, talvez alguma admiração, mas
o homem do outro lado da mesa parecia totalmente perplexo. Hesitante, ele apanhou o
bracelete e o examinou com cuidado. No centro, havia uma pedra amarela, como topázio,
ao redor da qual e aleatoriamente em círculos concêntricos se encontravam outras pedras
menores, em número total de nove. O homem dirigiu um olhar profundo a Harry e disse:
"Onde conseguiu isso?" Harry lhe contou a história da tempestade e da sala que descobrira
por acaso. "Posso ficar com ele esta noite?", o homem perguntou. "Garanto-lhe que estará
em segurança." Embora surpreso, Harry concordou.
E o dia seguinte seria o início da mais estranha aventura na vida de Harry. No
decorrer do mês seguinte, ele foi apresentado a um grupo de pessoas que não acreditava
no acaso, e para as quais a descoberta do bracelete tinha um significado especial. Por fim,
acabaria conhecendo' também ensinamentos que, para ele, apresentariam um novo modo
de ver e lidar com a realidade. E, finalmente, Harry foi adotado/iniciado pelo grupo ao qual
ele sempre chamou de A Organização.
O jovem mencionado nessa narrativa era Harry Leland Loring King, meu pai, e foi
assim que ele me contou a história. Por intermédio dele, também me associei à
Organização, embora a chame por outro nome. Sinto que o conhecimento obtido por meio
dessa afiliação é tão importante para a saúde e felicidade, tanto em escala individual
quanto mundial, que quero partilhá-lo com você de uma forma que o torne uma realidade
viva em sua vida cotidiana.
Mas, antes, gostaria de lhe falar um pouco sobre mim e o grupo. Alguns dos leitores
podem achar difícil acreditar naquilo que vou dizer, e se quiserem ouvir-me com um pé
atrás, não me incomodo. O verdadeiro prato servido pelo livro começa no capítulo 2, e
quem quiser poderá ir direto para ele. Outros, porém, talvez se beneficiem ao
compreender que há visões do mundo e algumas coisas acontecendo na vida muito
diferentes daquilo que a maioria de nós, no Ocidente, é levada a acreditar.
Minha primeira lembrança de algo relacionado ao grupo de que estou falando é de
quando eu tinha 7 anos, e meu pai me leu uma carta de um homem que, segundo ele,
"observava o meu desenvolvimento". Nunca conheci tal homem, mas, mais ou menos
naquela época, comecei a cultivar um intenso interesse por astronomia, que nunca
diminuiu. De meu pai, herdei uma profunda paixão por ciência e pela natureza, e aprendi
muitas lições práticas sobre o poder da mente. Quando estava com 14 anos, meu pai me
iniciou no grupo e disse que eu seria procurado por outros professores, com o passar do
tempo. Um ano após a morte dele, enquanto eu fazia o primeiro ano de faculdade, fui
contatado por um homem do grupo que me disse que, por algum tempo, eu seria mais
tutorado através de meus sonhos. Na época, eu estava mais interessado na sobrevivência
física, por isso não dei muita importância à informação. Em vez de fazer o segundo ano da
faculdade, alistei-me na Marinha e mudei-me para a Califórnia. Poucos meses depois, fui
procurado por outra pessoa do grupo, e passamos a nos encontrar regularmente durante
todo tempo que durara meu alistamento. Entre outras coisas, fui orientado para um estudo
de arqueologia e técnicas de examinar o passado distante. Pouco antes de terminar meu
período militar, fui ordenado kahuna da Ordem de Kane, tema ao qual voltarei mais
adiante. Nos cinco anos seguintes, meus estudos "extracurriculares" se centralizaram em
antropologia, filosofia e religião.
Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna
8
Em 1964, já tinha constituído família, e trabalhava para uma Agência Voluntária
Americana, administrando programas de assistência e desenvolvimento no oeste da
África. Lá, fui contatado por um membro africano do grupo, e com sua ajuda vivi alguns
dos anos mais aventurosos de minha vida. Na África, envolvi-me profundamente com as
técnicas de mudança social e a natureza da força vital, particularmente em sua
aplicabilidade à cura. Enquanto trabalhava com os aldeãos e os burocratas do governo,
promovendo o desenvolvimento socioeconômico, comecei a ver como as abordagens mais
ortodoxas eram ineficazes para induzir qualquer tipo de mudança duradoura. O jeito
ortodoxo — e isso se aplica à medicina, psicoterapia e educação, bem como às questões
socioeconômicas — é estabelecer um método garantido, certo, lógico e inflexível de
operação, e aplicá-lo como lei.
Isso ficou maravilhosamente explícito numa experiência que observei em um
encontro entre militantes do Corpo de Paz e uma repartição governamental local para o
desenvolvimento comunitário. Os membros do Corpo de Paz estavam muito desgostosos
com o modo como o governo local estava lidando com o programa de desenvolvimento,
pois este não funcionava naquele campo. Em outras palavras, o método não estava
resultando nas mudanças desejadas, e a visão do Corpo de Paz era de que o governo não
levava em conta o que os aldeãos sentiam. Um porta-voz do governo ficou muito irritado e
disse: "Não há nada errado com o método. Ele foi elaborado com muita reflexão e é
perfeitamente apropriado para a situação. Não há nada errado com o método. São as
pessoas que devem mudar!" Ele bem podia falar em nome de todos os ortodoxos, de qual-
quer lugar e época.
Mas, um sistema assim não funciona muito bem por muito tempo, principalmente
porque as pessoas mudam continuamente. Pode parecer um paradoxo à primeira vista,
mas um sistema rígido imposto de fora realmente pressupõe que as pessoas não mudam, e
que há menos variedade em suas necessidades do que de fato há. Trabalhando
diretamente com as necessidades sentidas pelas pessoas, no contexto de suas situações,
pude apresentar uma abordagem flexível de desenvolvimento que teve grande sucesso.
Realizei coisas que o governo local, o governo federal norte-americano, e às vezes até o
Corpo de Paz e os próprios aldeãos achavam, a princípio, impossíveis. E o fiz com poucos
recursos e alguns simples e básicos conceitos. O que descobri em meus anos de
treinamento individual é que os mesmos princípios básicos se aplicam ao
desenvolvimento pessoal bem como ao desenvolvimento social e econômico.
No que diz respeito à cura, tive o privilégio na África de estabelecer uma profunda
interação com vários curandeiros tradicionais que realmente conheciam seu ofício. Eles
me ensinaram algumas coisas fascinantes sobre o que os pesquisadores modernos
chamam de campos e correntes de bioenergia, e também sobre as relações entre mente e
corpo, e entre corpo e desenvolvimento. Aprendi que é possível para qualquer um
tornar-se consciente da fonte de energia emocional, aumentá-la, direcioná-la e usá-la para
curar a si próprio ou outras pessoas. O que mais me impressionou foi o conhecimento de
que as emoções podem curar ou ferir. Comecei a usar essa ideia em minha família, depois
ensinei a eles como aplicá-la livremente sozinhos. Agora, ensinamos os outros.
Ao voltar para os Estados Unidos, em 1971, fiz contato com um homem a quem
chamarei de WK, o qual eu conhecera numa viagem anterior. WK é um kahuna havaiano, e
o que ele me ensinou nos três anos seguintes mudou profundamente a minha vida e me
permitiu ajudar muitas outras pessoas a conseguir melhoras duradouras em todo aspecto
de suas vidas. Os temas eram suficientemente simples: amor, imaginação, crenças e a
natureza do sucesso. Mas a compreensão que WK tinha deles era diferente de tudo o que
normalmente é ensinado nesta sociedade. Comecei a ver que sua visão se refletia em
minha experiência pessoal. Percebi que havia nela algo a ser compartilhado. O jeito como
eu queria fazer isso, porém, causou uma calorosa discussão. Por vários motivos, há muito
tempo os kahunas de minha ordem fazem seu trabalho de maneira privada, longe do olhar
Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna
9
do público. Minha noção era incomum, mas finalmente foi concordado que eu deveria
fundar uma nova ordem para o propósito de ensinar publicamente o conhecimento Huna.
O resultado foi a Order of Huna International (Ordem de Huna Internacional), fundada em
1973 e registrada pelo estado da Califórnia como uma ordem religiosa não-sectária e sem
fins lucrativos.
Entretanto, Huna — o nome comum dado ao conhecimento kahuna — não é uma
religião. É uma filosofia de realizações que pode ser aplicada em qualquer contexto:
religioso, científico, social ou pessoal. Os próprios membros da Huna International não
precisam abandonar sua fé tradicional para entrar na ordem, e isso inclui os kahunas.
Temos cristãos Huna, judeus Huna, budistas Huna, muçulmanos Huna e assim por diante, e
todos chegando à conclusão de que Huna aumenta a apreciação de suas origens religiosas.
Qualquer que seja a sua religião, você é afetado pela gravidade. O conhecimento Huna é
essa base. O motivo pelo qual as pessoas entram para a ordem é participar de um
empreendimento mutuamente cooperativo e benéfico, pois estamos tornando esse
conhecimento acessível a todos. Nosso lema é tirado de uma antiga aclamação que os
kahunas havaianos faziam do alto de uma torre, e que era um oráculo: Que aquilo que é
desconhecido se torne conhecido!
Entre 1973 e 1992, a Huna International se desenvolveu numa organização mundial
de pessoas praticando e partilhando conhecimento Huna, e sua base de operações mudou
para uma antiga sede de sabedoria — a ilha de Kauai, no estado do Havaí. A partir de lá,
grande variedade de projetos foi iniciada:
Aloha International— educação e contatos.
Hawaiian Shaman Training — cursos e aulas (treinamento xa-
manista).
Kino Mana — cursos de trabalhos corporais havaianos.
Kauai Village Museum — exibições e exposições culturais havaianas.
Finding Each Other International — contatos para desenvolver relacionamentos.
Voices ofthe Earth — um fórum para povos nativos.
Além desses, existem agora novos capítulos, professores e conselheiros em todo o
mundo.
Talvez você esteja pensando agora: "Afinal, o que é esse Huna e o que é um kahuna?"
Huna é uma palavra havaiana que significa "aquilo que é oculto, ou não óbvio". As vezes,
nós chamamos a isso de Conhecimento Oculto, ou a Realidade Secreta. A ideia não é que
alguém propositalmente a esconda, mas apenas que ela é difícil de ver. O termo kahuna
pode ser traduzido como "um transmissor do segredo" e era usado originalmente para
designar aqueles que pertenciam a uma ordem que praticava e ensinava o conhecimento.
No Havaí moderno, porém, a palavra é usada para tudo, desde um sacerdote ou ministro
ocidental até curandeiros e paranormais comuns, e também para charlatões que exploram
os crédulos. Aqui, nós o usamos em seu sentido original.
Entre as pessoas que conhecem Huna atualmente, a maioria só tem conhecimento das
obras de Max Freedom Long sobre o tema. Max Long foi um estudante de psicologia,
religião e ciência psíquica que fez um brilhante trabalho de desvendar boa parte do
conhecimento Huna codificado na língua havaiana. Os poucos erros e distorções que
aparecem em seu trabalho inicial são compreensíveis, considerando que ele nunca teve
uma oportunidade de discutir suas descobertas com um kahuna. Na época em que ele vivia
no Havaí, no início do século XX, era contra a lei ser ou afirmar ser um kahuna, e isso
perdurou até tempos relativamente recentes. É admirável que Long tenha realizado tanto,
baseando-se apenas em histórias, superstições e conhecimento distorcido. Felizmente, ele
Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna
10
tinha o tipo de raciocínio excelente em fazer correlações com conhecimentos de outras
áreas e culturas, e foi capaz de enxergar através da distorção em sua maior parte.
Para expandir um pouco mais a sua mente, gostaria de lhe passar um pouco da
história da filosofia Huna. Dizem que a história é mais um reflexo do presente que do
passado, porque os historiadores tendem a escrever sobre o passado em termos do que a
atual geração está disposta a aceitar. O que as pessoas não aceitam não será escrito, ou
pelo menos não publicado. À medida que a sociedade muda, também mudam os livros de
história. Um exemplo menor é a história dos negros nos Estados Unidos. Antes do
movimento pelos direitos civis, a história deles era inexistente. Nada era ensinado nas
escolas, ninguém estudava a respeito, e para todos os efeitos não existia tal coisa na mente
das pessoas, mesmo as negras. Hoje se sabe que houve muitos negros americanos heroicos
e importantes, e os livros de história estão sendo reescritos; mas somente porque a
sociedade está disposta a olhar nessa direção.
Boa parte do que é escrito como história não passa de palpite, com o historiador
desempenhando o papel de um detetive que viaja no tempo e cujas pistas são esparsas.
Quanto mais distante você mergulha no passado, mais esparsas são essas pistas. Se há
registros históricos, eles ajudam, como os hieróglifos no Egito; mas muitos povos têm
histórias orais que indicam o início de suas civilizações num passado muito mais remoto
do que os historiadores modernos gostariam de admitir. Essas histórias geralmente são
consideradas mitos ou lendas, com a implicação de que provavelmente não são
verdadeiras.
A história que vou contar é parcialmente oral e parcialmente registrada. Mas a parte
registrada não existe de uma forma escrita que você entenderia. Você talvez se surpreenda
ao saber que algumas pessoas podem "ler" figuras pintadas em sequência e desenhos
entalhados em cavernas com a mesma facilidade com que você lê esta página. De qualquer
modo, esta é a história de uma filosofia que me foi contada por WK. Se você a achar
inaceitável como fato, pense nela como uma tradição. Isto não afetará a sua habilidade
para usar o conhecimento Huna.
*******
"Em algum lugar no passado, muito tempo antes da ascensão de Atlântida, uma raça
de homens chegou a este sistema solar, vinda de um grupo de estrelas conhecido como as
Plêiades. Alguns aterrissaram na Terra e outros em outro planeta que não existe mais.
Naquela época, a Terra ficava mais próxima do Sol e a duração do ano era de exatamente
360 dias. Os homens que vieram das estrelas fugiam de uma catástrofe, e tinham a
intenção de encontrar paz na Terra. O processo foi lento, porém, pois encontraram aqui
outros homens, remanescentes de uma civilização anterior que se havia dizimado. Tam-
bém encontraram dinossauros inteligentes, e surgiram muitas batalhas por controle
territorial.
Finalmente, a maior parte dos homens das estrelas se estabeleceu num continente no
Pacífico, conhecido hoje em lendas como Mu. Eles chamavam a si próprios de Povo de Mu,
mas outros os chamavam de Manahuna ou Menehune, 'o povo do poder secreto', por causa
de sua tecnologia avançada e de seus poderes psíquicos. Eram indivíduos pequenos, com
aspecto de pigmeus pelos padrões modernos, e muito laboriosos. Ó conhecimento deles
era Huna, uma filosofia para se viver com sucesso. Quando perceberam estar assentados
em segurança, começaram a ensinar esse .conhecimento aos homens da Terra. Como
muitas línguas eram faladas e a língua deles era parcialmente telepática e difícil de
aprender, os professores de Mu criaram uma nova língua, bem mais fácil. Esse idioma era
estruturado para conter o conhecimento Huna de forma a garantir sua sobrevivência
enquanto a língua permanecesse em uso. Hoje, conhecemos essa língua como polinésia, e
traços dela são encontrados no mundo todo.
Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna
11
Vinham homens ao continente de Mu para aprender, e Mu também enviava missões
de professores a outras partes do mundo para montar escolas de vários tipos. Um bom
número de casamentos interraciais ocorreu entre o povo de Mu e seus vizinhos,
resultando em crianças possuidoras de habilidades genéticas e memórias de seus pais
nascidos nas estrelas.
Gradualmente, aqueles que estudavam com o povo de Mu foram sendo organizados
em três ordens diferentes, cada uma praticando o conhecimento Huna com ênfase um
pouco diferente. Usando termos em inglês, as ordens poderiam ser chamadas de
Intuitionists (Intuitivos), lntellectuals (Intelectuais) e Emotionals (Emocionais).
De modo geral, os Intuitivos se desenvolveram no que chamaríamos de místicos,
metafísicos e psicólogos ou psicoterapeutas. Os Intelectuais se tornaram o equivalente dos
cientistas, técnicos e engenheiros. Os Emocionais eram mais interessados em atividades
políticas, econômicas e atléticas. Os três tipos utilizavam em seu trabalho habilidades
psíquicas treinadas, e cada grupo ensinava e praticava várias formas de cura física.
A parte básica da filosofia Huna é que todo ser humano tem habilidades psíquicas. As
ordens treinavam as pessoas em seu uso consciente e disciplinado. No entanto, havia
pessoas na Terra antes da chegada do povo de Mu que sabiam usar esse poder à vontade; e
ainda hoje existem indivíduos sem a menor ligação com as ordens que podem usar esses
poderes psíquicos da mesma maneira.
Por muitos séculos, as coisas estavam indo bem na Terra e uma civilização mundial
estava sendo formada, quando o povo de Mu cometeu um erro fatal. Eles vinham
mantendo contatos regula- res com seus irmãos que se haviam instalado no outro planeta
deste sistema solar, mas, com o passar do tempo, viraram as costas para eles,
concentrando-se somente na Terra. Chegou um momento em que o planeta irmão
começou a enviar desesperados pedidos de ajuda. O povo de lá estava à beira da
autodestruição, e havia a necessidade de uma rápida intervenção. Infelizmente, o povo de
Mu, na Terra, ficara complacente e não queria que nada perturbasse sua paz; por isso, não
deram ouvidos aos apelos e tentaram fingir que não lhes diziam respeito. Tal ato era
contrário à sua própria filosofia.
Sem que nada pudesse impedi-las, as pessoas do outro planeta criavam cada vez mais
terríveis armas de destruição para usar contra os outros até o momento horrível e
derradeiro. Chegaram a um ponto em que destruíram todo o planeta, num enorme
cataclismo que abalou o sistema solar. O completo desaparecimento de um planeta inteiro
causou imenso desequilíbrio, mas as forças da natureza tentaram corrigi-lo. Com isso, as
órbitas dos planetas remanescentes foram perturbadas e o efeito sobre a Terra, foi
devastador. Nosso planeta foi arremessado para uma nova órbita, um pouco mais distante
do sol, e a força da mudança acarretou intensa atividade vulcânica e sísmica. Velhas terras
afundaram no mar em alguns lugares, e novas terras subiram em outros. O nível de morte
e destruição era indescritível.
Com o retorno de uma pequena estabilidade, os sobreviventes observavam uma nova
Terra. O continente de Mu não existia mais. Apenas algumas ilhas espalhadas ainda
permaneciam intactas, num oceano imenso e vazio. Em todo o mundo, as pessoas
revertiam a uma sobrevivência primitiva e iniciavam a árdua escalada de volta à
civilização. Em muitos lugares, o povo de Mu era responsabilizado pelo que acontecera, e
tinha de se esconder para não ser perseguido. Esses grupos esparsos e solitários deram
origem às histórias dos mágicos "pequeninos" (little people) encontradas em quase todas
as culturas. As ordens que tinham criado continuaram sem eles, exceto por um raro
contato com um número muito limitado de adeptos.
Outras civilizações se desenvolveram e caíram. Entre elas, os brilhantes atlantes, que
quase alcançaram o domínio do mundo, numa imitação menor de Mu, mas que acabaram
aniquilando-se numa guerra que os enviou para o fundo do oceano. Enquanto isso, a
Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna
12
tradição de Huna era mantida viva por pequenos grupos que inseriam o ensinamento na
cultura do lugar onde se instalavam. A maioria deles perdeu o contato entre si, mas todos
continuavam a ensinar, curar e treinar. Em alguns casos, foram capazes çlè manter intacta
a simplicidade de Huna, mas em outros houve tamanhas distorções que o conhecimento
fundamental foi praticamente perdido, e boas práticas eram realizadas com uma falsa
compreensão de sua natureza.
Após a perturbação causada pela queda de Mu, sobreviventes na Bacia do Pacífico,
aos quais hoje chamamos de polinésios, aos quais reuniram-se em dois lugares para
reconstruir suas cidades — Samoa e as Ilhas Sociedade. Entre eles, havia membros das
três ordens que atuavam como sacerdotes, curandeiros e especialistas técnicos. Só os
Intuitivos mantinham contato com seus colegas no resto do mundo. Lentamente,
desenvolveram sua tecnologia até o ponto de poderem construir grandes embarcações a
vela, capazes de transportar cem pessoas ou mais, e partiram para explorar o que sobrara
de Mu. A maioria permaneceu dentro dos toscos limites do velho continente, só
ocasionalmente se aventurando nas terras fronteiriças.
O grupo que conseguiu ir mais longe, fora das fronteiras continentais, foi o dos
maoris, que se assentaram na Nova Zelândia. O nome maori significa "o povo verdadeiro"
ou os habitantes originais, referindo-se tanto à origem do velho continente de Mu (como
descendentes mistos da raça estelar) quanto ao fato de serem os primeiros a se
estabelecer nas novas terras descobertas. Em pouco tempo, eles perderam contato com os
outros polinésios e, exceto pela lembrança em velhos cânticos e entoações, os dois grupos
foram esquecendo-se entre si, até que os exploradores ocidentais os unissem novamente.
Outro grupo, seguindo antigas informações navegacionais contidas em antigos
cânticos tradicionais, se fez ao norte a partir do Taiti e das Marquesas para aportar e se
assentar nas ilhas havaianas. A primeira ilha onde aportaram foi Kauai, a mais antiga das
ilhas principais, e lá eles descobriram alguns dos habitantes Menehune originais, aos quais
também chamavam de Mu. Esse povo Mu era muito tímido, mas não belicoso, e às vezes
ajudava os recém-chegados. Eles tinham templos de pedra e aquedutos, e eram
especialistas em irrigação e construção de lagoas para peixes. Por muitos anos, os dois
povos conviveram muito bem, e houve um bom número de casamentos inter-raciais. Foi
essa última questão, porém, que levou o rei de Mu a tomar uma decisão dura. Ele percebeu
que, se o casamento inter-racial continuasse, o povo de Mu deixaria de existir como grupo
separado, por isso resolveu que deveriam ir embora. Diz a tradição que numa noite todo o
povo de Mu partiu do extremo norte de Kauai, mas ninguém sabe como ou para onde foi.
A princípio, as três ordens de kahunas no Havaí viviam em base de igualdade, e o
comércio continuava entre o Havaí, Samoa e Taiti. No século XIII d.C., porém, um kahuna
sedento de poder, da ordem dos Emocionais, veio de Samoa para ajudar ostensivamente
na reorganização dos Emocionais do Havaí. Em pouco tempo, ele conseguiu o controle
religioso e político das ilhas, o que resultou na perda de contato entre o Havaí e o resto da
Polinésia; a construção dos grandes veleiros marítimos foi interrompida, as escolas de
navegação e astronomia foram abandonadas e as pessoas se tornaram sujeitas a uma
religião de superstição e restrição. A ordem dos Intelectuais foi a que mais sofreu, e muito
conhecimento foi perdido. Os Intuitivos, na maioria, foram obrigados a se esconder, e um
número cada vez maior de Emocionais recorria a práticas distorcidas. Por seiscentos anos,
o povo do Havaí sofreu a repressão de um governo autoritário, do terrorismo psíquico e da
desordem social. Na época da chegada do capitão Cook, todas as ilhas estavam em guerra.
A natureza idílica da vida polinésia era, na verdade, um grande mito perpetuado por
estrangeiros que não enxergavam além da superfície.
Enquanto tudo isso acontecia, um pequeno grupo de Intuitivos mantinha contato
telepático com o resto de sua ordem espalhada pelo mundo, e se satisfazia em trabalhar
nos bastidores do cenário mundial para a paz da humanidade. Agora os tempos mudaram,
Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna
13
e, por causa da rapidez de comunicação, da expansão da consciência em boa parte do
mundo, e do crescente entendimento das realidades alternativas, começa-se a sentir que o
conhecimento de Huna precisa ser difundido ao máximo e à maior distância possível."
Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna
14
CAPÍTULO 1
Os Kahunas
Desde os tempos das primeiras explorações europeias no Oceano Pacífico, o mundo
ocidental acalenta uma imagem romântica dos Mares do Sul, baseada no conceito de uma
sociedade primitiva simples, livre de preocupações. Tem sido o sonho de muitos homens
abandonar o fardo do trabalho e da família e fugir para uma ilha tropical onde só o que
você tem a fazer é deitar-se numa rede, bebendo ponche de frutas, enquanto os nativos de
aparência infantil cuidam de todas as suas necessidades. Outra atitude ocidental, menos
romântica, é que antes das bênçãos da civilização, os habitantes das ilhas eram selvagens
ignorantes, dominados por medos supersticiosos e por uma sensualidade indisciplinada.
Paralela a essa atitude é a ideia de que essas pessoas não tinham um pensamento filosófico
nem conceitos abstratos, não conheciam a arte, exceto para decoração, não possuíam
livros e certamente não dispunham de nenhum tipo de ciência ou tecnologia que valesse a
pena mencionar.
A verdade, porém, estabelecida por pesquisa científica em muitas áreas, é que as
sociedades da Polinésia eram tão complexas quanto a nossa: seus códigos morais, éticos e
legais eram igualmente estritos; sua arte e literatura tão ricas quanto as nossas; e sua ciên-
cia, igualmente especializada. Entretanto, a orientação na qual tinham desenvolvido esses
aspectos era muito diferente. Como indicam os modernos psicólogos sociais, se tentarmos
julgar as realizações de outras culturas usando a nossa como padrão, arriscaremos
distorcer esse julgamento e limitar severamente qualquer benefício que poderíamos
receber do contato com a cultura em questão. E a cultura da Polinésia tem aspectos que
nos podem beneficiar em todas as esferas da vida.
O Povo da Polinésia
Polinésia é um termo aplicado igualmente a uma área geográfica e a um povo que
partilha da mesma origem histórica, linguística, cultural e física. A área geralmente é
definida como um triângulo que se estende da Nova Zelândia no sudoeste do Pacífico ao
Havaí, no norte, descendo até a Ilha de Páscoa, sudeste, e de volta à Nova Zelândia. E uma
área imensa, maior que o continente sul-americano, e salpicada de ilhas vulcânicas e de
corais, geralmente separadas a uma distância de 3,2 quilômetros entre si. O mais notável é
que toda essa área fora explorada e colonizada, e havia comércio regular entre as ilhas por
centenas, talvez milhares, de anos antes de Colombo atravessar o Atlântico.
O povo dessa área, os polinésios, inclui os maoris, samoanos, tonganeses, taitianos,
marquesanos, havaianos, pascoenses e outros, cujos nomes nos tempos modernos se
baseiam em suas regiões. Embora esses grupos sejam separados por vastas distâncias, e
em alguns casos não mantenham contato entre si há séculos, há menos diferenças entre
eles do que entre vizinhos próximos como os franceses e alemães. Um Maori de nariz fino
Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna
15
e um havaiano de nariz grosso podem não parecer irmãos, e seus estilos de vida moldados
ao ambiente podem variar muito, mas eles compartilham da mesma língua básica, dos
heróis culturais, das lendas e do conhecimento interior. E aceitam uns aos outros como
descendentes da mesma raça original, como descobriu Peter Buck, um explorador mestiço
maori, viajando para outras ilhas que não tinham sequer na memória o registro de contato
com um "polinésio" de fora.
Uma questão ainda não resolvida pelos antropólogos é qual seria a terra natal dos
polinésios, além da questão da rota por eles tomada para chegar ao seu atual lar. A teoria
moderna mais aceita é que eles vieram da Indonésia, ou possivelmente da índia, e
passaram pelos grupos de ilhas da Melanésia e Micronésia, no oeste do Pacífico, no
caminho. Essa teoria se baseia em parte em algumas semelhanças linguísticas menores, na
suposta origem de muitas plantas usadas pelos polinésios, em algumas similaridades
tecnológicas e na noção de que, como tinham de vir de algum lugar, a origem mais
provável seria a Ásia.
Max Freedom Long e outros propuseram que a terra natal dos polinésios ficaria no
Oriente Próximo. Long baseou sua idéia numa história sem comprovações contada por um
inglês que vivera com uma tribo berbere no Saara. Essa tribo afirmava ter pertencido a um
grupo que tinha construído as pirâmides do Egito; eles se haviam separado do resto do
grupo que buscava uma nova terra no Pacífico. Eu passei, porém, quatro anos e meio, inciò
é vindo, com os berberes, e não fui capaz de verificar tal tradição. Mais importante ainda,
Long usou, de maneira impressionante, estudos linguísticos para mostrar que o
conhecimento kahuna foi incorporado em partes do Antigo e do Novo Testamento da
Bíblia. Ele foi mais longe ainda e traçou uma rota dos grupos com destino ao Pacífico,
descendo até o Mar Vermelho, ao longo da costa da África até Madagascar (cuja língua tem
afinidades com o polinésio), atravessando o oceano e até a índia e de lá através da
Indonésia até o Pacífico, usando semelhanças filosóficas como seu principal argumento.
Entretanto, outra terra nativa para os polinésios foi proposta por Thor Heyerdahl, de
renome Kon Tiki, que tentou provar de uma maneira prática que os polinésios poderiam
ter vindo da América do Sul.
Como observamos no prólogo, meu mentor kahuna, WK, tem uma versão bastante
diferente, apoiada por pesquisadores como James Churchward, autor de vários livros
sobre o continente de Mu, e Leinani Melville, autor de Children ofthe Rainbow (Filhos do
Arco- íris). Segundo essa versão, a Polinésia seria a fonte de semelhanças culturais em
outro lugar e não o recipiente final. Obvio que pode haver dúvida tanto com relação a essa
teoria quanto a qualquer outra, mas esta tem a virtude de ser uma versão polinésia e
responder a muitas perguntas. Ela explica, por exemplo, por que os navegadores
polinésios, extremamente habilidosos, nunca colonizaram nenhuma área fora do triângulo
mencionado aqui, e de que forma os subgrupos como os maoris na Nova Zelândia podiam
ter antigos cânticos de navegação com instruções para viagens de barco até o Havaí.
Também explica por que os grupos como os maoris, havaianos e pascoenses falam em suas
lendas sobre pessoas que já viviam nas ilhas quando eles lá chegaram. Na língua havaiana,
essas pessoas eram até chamadas de Mu, e há muitas histórias sobre conflitos e
cooperação com eles. Na ilha de Kauai, no arquipélago havaiano, vi pisos em templos e
trabalhos de alvenaria que se assemelham muito mais aos estilos de construção pré-incas
do que a qualquer outra coisa construída pelos primeiros colonizadores polinésios. Eles
teriam sido construídos pelo povo de Mu, também conhecido como os Menehune.
O Sistema Kapu
A questão da origem talvez nunca seja satisfatoriamente resolvida para todos, mas é
um fato que os polinésios já estavam lá quando os europeus chegaram na Polinésia. Entre
outras coisas, os primeiros exploradores ocidentais encontraram um poderoso grupo de
indivíduos conhecidos como kahunas, que eram os líderes religiosos, mestres artistas e
Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna
16
artesãos, médicos, advogados, professores e conselheiros políticos da sociedade. Eles e as
famílias dos chefes governavam o povo através de um sistema que seria chamado de kapu,
embora a maioria dos ocidentais esteja mais acostumada com a forma tongonesa da
palavra, tabu ou taboo.
O sistema kapu tem sido muito difamado, porque nunca foi bem compreendido. À
palavra kapu foi associado o significado de "proibido" e ela passou a ser interpretada como
um misterioso alerta a respeito de coisas que escapam ao domínio da razão. Uma com-
preensão mais completa da palavra, porém, incluiria também os sentidos de "sagrado,
santo ou consagrado". O sistema kapu era na verdade um código de leis, necessário para
que qualquer sociedade funcione de maneira ordenada. Um certo bosque ou um local de
pesca especial podia ser declarado kapu durante uma ou mais temporadas, para não ser
superexplorado, por exemplo. Não seria diferente de nossas atuais temporadas
regulamentadas de caça e pesca, mas essa visão ambiental era totalmente desconhecida
pelos primeiros visitantes europeus à Polinésia, os quais não entendiam por que uma
árvore ou local era kapu e outro não era. Certas partes de um templo ou pedaços de terra
também podiam ser declarados kapu porque~eram reservados para uso sacerdotal ou dos
chefes. O caminho até esses lugares era marcado por um par de varetas cruzadas,
encimadas por uma bola de pano branco, e os nativos se recusavam a transpor esses
indicadores porque a quebra de um kapu era severamente punida. Entretanto, o mesmo
europeu que hesitaria muito antes de violar um sinal da Coroa em seu país, como "Não se
aproximar" ou "Proibida a entrada", achava que o nativo da ilha agia apenas por
superstição.
Os kapus mais difíceis de entender para o estrangeiro eram, lógico, aqueles
relacionados aos costumes. Em algumas partes da Polinésia, havia um kapu punível com
morte que proibia que a sombra de uma pessoa comum se projetasse sobre um chefe. A
princípio, tal coisa parece a mais absurda superstição, mas o estrangeiro provavelmente
não saberia que a palavra para sombra também significava "riso", e que o evento acima
mencionado podiãser interpretado como desrespeito ou lese majeste. Outro kapu proibia
que as mulheres comessem bananas, porque a palavra para banana é parecida com o
termo para genitais, e o ato seria tão ofensivo quanto o uso de palavrões de conotação
sexual em público nos Estados Unidos.
O kapu, portanto, formava a base para o sistema legal polinésio. Em sua melhor
aplicação, ele reforçava a coesão e a produtividade da sociedade, mas o sistema podia ser
— e freqüentemente era — usado por chefes e sacerdotes gananciosos para exploração
política e econômica. Não raro, as rebeliões sociais e/ou emigrações eram inspiradas por
kapus exageradamente restritivos impostos ao povo pelos líderes. A severidade dos kapus
empregada por Kamehameha, o Grande, a exploração desmedida desses kapus por parte
de certos sacerdotes kahuna e a má interpretação psíquica de um líder kahuna oportunista
foram alguns dos principais motivos pelos quais todo o sistema kapu no Havaí foi tão
facilmente derrubado na época do filho de Kamehameha.
Os Kahunas do Havaí
Como tenho mais experiência com os kahunas havaianos do que com os tahunas
taitianos ou os tohungas dos maoris, a seção seguinte tratará do sistema havaiano, com
base no registro histórico e nas discussões com WK.
Quando ancorou na costa a sotavento de Kauai em 19 de janeiro de 1778,o capitão
James Cook rompeu um isolamento de seiscentos anos das ilhas havaianas do resto do
mundo. Ao contrário da crença popular, porém, o capitão Cook e os que vieram depois não
invadiram uma simples ilha paradisíaca. A beleza dessas ilhas vulcânicas era, de fato,
espantosa, e quando os habitantes eram amistosos, o eram de verdade. Mas os havaianos
não eram inocentes incorruptos nem selvagens ignorantes. A sociedade deles era estru-
Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna
17
turada como um pleno sistema feudal, e Cook chegou em meio a um violento tumulto
social e político. Após o breve choque inicial do contato, os europeus e sua superior
tecnologia foram rapidamente explorados, com propósitos políticos, pelos pragmáticos
líderes havaianos, incluindo os kahunas.
Nos livros de história, muito se fala do capitão Cook, e de como pensaram ser ele o
deus Lono, retornando às ilhas. De acordo com o historiador havaiano Kamakau, o povo de
Kauai ficou surpreso e assustado diante da visão inédita dos navios britânicos
desembarcando na costa. As pessoas não tinham idéia de quem estava nos navios. Foi um
kahuna, Kuohu, que chegou à conclusão de que os barcos deviam ser o templo e os altares
de Lono porque os mastros e as velas pareciam a haste e as flâmulas usadas numa
cerimônia anual dedicada àquele deus. Cook e seus homens desceram na praia para uma
curta visita e depois partiram para a América. A notícia se espalhou rapidamente pelas
ilhas, e quando Cook retornou e parou na baía de Kealakekua, na Ilha Grande do Havaí, o
palco estava montado para uma manobra política incrivelmente astuta, que teria dado
certo se Cook não tivesse ficado lá muito tempo.
A segunda chegada de Cook ocorreu numa área consagrada a Lono, e foi perto do fim
do festival anual dedicado a ele. Não há registros do que vou sugerir e WK diz que não
conhece nenhuma tradição que confirme ou negue, mas a coincidência do momento e local
onde Cook aportou, na segunda vez, é tão grande que, desconfio, houve a mão dos kahunas
por trás. Como veremos mais adiante, eles sem dúvida tinham a capacidade de saber, por
clarividência, onde Cook estava e de enviar a ele mensagens telepáticas para guiá-lo até a
baía onde milhares de pessoas se reuniam para o festival de Lono. Em seu diário, Cook
escreveu que nunca tinha visto tanta gente reunida, em nenhuma das ilhas. Uma vez que o
rei da ilha do Havaí estava no processo de consolidar seu poder sobre o povo, como parte
de sua campanha de guerra contra Maui, fora provavelmente por sugestão de seus
conselheiros kahunas que Cook foi aclamado como o próprio deus Lono, vindo para
emprestar seu mana (poder divino) ao lado que obviamente estava certo. Os chefes e os
kahunas não eram tolos. Podiam reconhecer uma tecnologia superior, por mais estranha
que fosse; conheciam um homem quando o viam; e também sabiam como aproveitar uma
oportunidade. Infelizmente, quanto mais tempo Cook se demorava na ilha, mais difícil
ficava manter a farsa de que ele era um deus. Quando finalmente partiu, depois de algumas
semanas, não disfarçaram o alívio. Infelizmente, porém, Cook teve de voltar uma semana
depois para consertar um mastro quebrado. O festival já tinha acabado, o povo estava
disperso, e a recepção a Cook foi fria. As relações entre os havaianos e europeus se
deterioraram rapidamente nas duas semanas seguintes, até que Cook resolveu fazer de
refém a altamente sagrada pessoa do rei por causa de um pequeno roubo por parte de um
de seus súditos. Uma batalha eclodiu na praia e Cook foi morto. A questão aqui é que a
designação de Cook como o deus Lono foi apenas uma farsa politicamente inspirada para
favorecer o regime do. rei Kalaniopuu. Os chefes e kahunas sabiam o que estavam fazendo,
mas àquela altura da história havaiana a "religião estatal" era apenas uma ferramenta
política usada para aumentar o poder dos chefes e certos sacerdotes, e explorar as massas.
A medida que mais europeus começavam a visitar as ilhas, ouviam histórias sobre os
estranhos poderes exercidos por determinados indivíduos conhecidos como kahunas.
Histórias de telepatia, clarividência, cura pelo toque, provocar morte a distância e
caminhar sobre lava incandescente se misturavam a observações de cerimônias exóticas e
cânticos, à prática de massagem e medicina de ervas, e à aparente veneração de ídolos
grotescos. Era fácil rotular essas histórias como pura superstição, até alguém ficar
diretamente envolvido, numa experiência pessoal. Então, tornava-se óbvio para o indi-
víduo inteligente que algo de fato acontecia por trás da fachada religiosa. Não havia dúvida
de que pelo menos alguns kahunas eram capazes de coisas que pareciam desafiar as leis
físicas. Quanto mais tempo se vivia nas ilhas, mais se aprendia a aceitar esse fato.
Entretanto, por causa de quatro fatores principais, não era fácil descobrir o que
realmente estava acontecendo. O primeiro era a relutância natural do cidadão ocidental,
treinado em ciência, em aceitar tais habilidades como algo possível. Se fizesse isso, ele
Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna
18
estaria regressando à Idade das Trevas da magia e superstição que o mundo ocidental se
esforçava em deixar para trás. O segundo era a tendência natural dos visitantes de
formação cristã para atribuir todas essas coisas à obra do diabo, pois de que outra maneira
os pagãos ignorantes poderiam ter esses poderes?
O terceiro fator era que, na época da chegada dos primeiros europeus, as principais
práticas kahunas eram muito corruptas, e a maior parte do antigo conhecimento fora
perdida. Enquanto um pequeno grupo mantinha praticamente intactos os antigos
ensinamentos, a maioria dos kahunas — especialmente aqueles envolvidos em política —
tinha se degenerado a um mero sacerdócio cerimonial, com pouquíssimos membros que
ainda sabiam os rudimentos de coisas como telepatia e clarividência. Isso se torna
evidente na história de Hewahewa, sumo sacerdote de Kamahmeha II. Em 1819, pouco
depois da morte de Kamehameha I, esse proeminente kahuna, responsável pela imagem
do deus da guerra do rei, teve uma visão na qual distinguira representantes do que parecia
ser um deus muito mais poderoso aportando nas praias do Havaí. Sem dúvida influenciado
por sua familiaridade com a superior tecnologia européia e as histórias cristãs, Hewahewa
acabou conquistando o apoio de colegas kahunas, chefes ambiciosos e esposas de reis
insatisfeitas para obter a abolição do sistema kapu e depor os velhos deuses. Com isso, ele
esperava conseguir as graças dos representantes do novo deus e ao mesmo tempo
subjugar o poder de qualquer kahuna rival. Kamehameha II, diferentemente de seu pai, era
homem de vontade fraca e, em novembro de 1819, cedeu às pressões de Hewahewa e seus
seguidores. Com o ato aparentemente simples de se sentar para fazer uma refeição com as
mulheres, Kamehameha II quebrou um sério kapu e abriu um precedente para chefes e
cidadãos comuns. A notícia se espalhou por todo o arquipélago de ilhas, agora unido, e as
pessoas, há muito oprimidas por kapus exageradamente estritos, começaram a dar vazão
aos sentimentos, queimando e destruindo templos e estátuas. Um kahuna rival de
Hewahewa tentou impedir isso, mas ele e seus seguidores foram massacrados em batalha.
Por seis meses, depois disso, o Havaí foi uma terra sem religião e sem leis. Foi uma época
de grande confusão, porque sem os kapus e sem os deuses, não havia diretrizes firmes
para conduzir um governo nem segurança psicológica.
Finalmente, em 1820, os primeiros missionários cristãos de Boston aportaram onde
Hewahewa disse que os tinha visto. Ele e seus colegas kahunas tinham trazido muitas
pessoas aleijadas e doentes para o novo deus curar. Eles cantaram uma canção de boas
vindas e pediram aos missionários que mostrassem o poder do novo deus, curando os
necessitados. Obvio que os missionários não podiam fazer isso, e, depois de muita
confusão de ambos os lados, Hewahewa foi obrigado a compreender que tinha
interpretado erroneamente sua visão e destruído toda a estrutura formal religiosa e legal
de sua nação por nada. Ele é conhecido nos livros de história como Hewahewa, mas esse
pode não ter sido seu nome verdadeiro. Os havaianos sempre tiveram muito cuidado com
a escolha de nomes baseada nos significados. Parece óbvio que o infeliz sumo sacerdote
recebeu o nome de Hewahewa depois desse terrível engano, pois significa "o louco que
não reconheceu o significado".
O quarto fator que interferiu na compreensão inicial do conhecimento kahuna foi a
proibição de todas as práticas kahuna por parte dos missionários cristãos convertidos em
políticos, tão logo tiveram o poder de fazer isso. De acordo com Max Long, que viveu nas
ilhas enquanto essa lei era válida, a lei do Havaí sobre o uso de magia para cura
determinava o seguinte:
''Seção 1034. Feitiçaria – penalidade. Qualquer pessoa que tente a cura de outra
através da prática de feitiçaria, bruxaria, ana-ana, hoopiopio, hoounauna, ou
hoomanamana (termos que descrevem práticas psíquicas), ou outras superstições ou
métodos enganadores, deverá, quando acusada, pagar multa de uma quantia não inferior a
cem dólares ou ser preso por no máximo seis meses, cumprindo trabalhos forçados." Há
outra seção da lei que classifica o kahuna junto com os buncos e o define como alguém que
se apresenta como kahuna, aceita dinheiro sob a alegação de ter poderes mágicos, ou
Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna
19
admite que é um kahuna. Para tal coisa, a multa sobe para mil dólares ou um ano de
aprisionamento.1
Desnecessário dizer que isso era suficiente para levar todos os verdadeiros kahunas
a se esconder, o que tornava extremamente difícil para um não-havaiano ter acesso ao
conhecimento kahuna. Apesar da lei, porém, tanto os havaianos quanto os não-havaianos
livres de preconceitos continuavam a procurar e receber ajuda de kahunas cuja
identidade era bem protegida, e os pseudo-kahunas eram freqüentemente exibidos em
cerimônias e para fins turísticos. Só recentemente a lei foi mudada, de modo que embora
ainda preveja salvaguarda contra fraude, já não é mais crime ser ou afirmar ser um
kahuna.
A autodestruição de suas tradições religiosas e o poderoso impacto do Cristianismo
e da tecnologia ocidental fizeram a maioria dos havaianos rejeitar a influência e os
ensinamentos kahunas. O conhecimento kahuna era tradicionalmente passado para um fi-
lho natural ou adotado, cautelosamente; mas os fatores citados, além dos casamentos
inter-raciais e a dizimação da população através de doenças introduzidas, deixaram um
número muito pequeno de indivíduos ainda dispostos ou capazes de continuar com os
passos de seus pais.
No entanto, em meio a toda dificuldade, continuou existindo um núcleo de kahunas
ativos que continuava a praticar cura mental, emocional e física; a ajudar as pessoas a
mudar o futuro; e até a praticar a grandemente temida "oração de morte". Nada menos
que o curador do Museu Bishop em Honolulu, William Tufts Brigham, dedicou-se durante
anos a tentar desvendar o segredo daquelas que ele sabia ser práticas kahunas válidas.
Ele teve experiências pessoais de caminhar sobre o fogo, cura e oração de morte
telepática, e se convencer, sem a menor dúvida, de que algum conhecimento altamente
importante para a humanidade ainda esperava ser dominado. Sua busca nunca teve
sucesso, mas, antes de morrer, ele deixou para Max Long um legado do que tinha
aprendido, que pode ser assim resumido:
"Sou capaz de provar que nenhuma das explicações populares da magia kahuna tem
fundamento. Não é sugestão, nem qualquer outra coisa conhecida na psicologia. Eles usam
algo que nós ainda temos de descobrir, e é uma coisa de importância inestimável. Sim-
plesmente, temos de descobrir. Revolucionará o mundo, se o fizermos. Mudará todo o
conceito da ciência. É algo que traria ordem às crenças religiosas conflitantes...
Observe sempre três coisas no estudo dessa magia. Deve haver alguma forma de
consciência por trás dela, dirigindo seus processos. Controle de calor ao caminhar sobre o
fogo, por exemplo. Deve.haver também alguma forma de força usada em exercer esse
controle, se ao menos pudermos reconhecê-la. E, finalmente, deve haver alguma forma de
substância, visível ou invisível, através da qual a força pode agir. Observe sempre essas
coisas e, se puder encontrar pelo menos uma, ela guiará até as outras".2
Long continuou a busca com base nessas orientações e, embora nunca tenha
estudado com um kahuna, por um período de muitos anos ele descobriu os três elementos
especificados por Brigham, conduziu experimentos para comprovar a existência deles,
encontrou correlações com as descobertas de outros, em outros lugares, e descobriu ainda
que o sistema kahuna de conhecimento não era limitado à Polinésia, mas espalhava-se por
todo o mundo. Foi um feito notável, tornando os principais elementos desse
conhecimento acessíveis ao público pela primeira vez.
As coisas com que os kahunas lidam regularmente se tornaram hoje o tema de uma
investigação científica cada vez mais difundida bem como de um crescente interesse
popular. Há laboratórios estudando a comunicação telepática, o fenômeno de estados
1 Max Fredom Long, The Secret Science Behind Miracles (Los Angeles: De Vorss & Co., 1954)
2 Ib.
Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna
20
alterados de consciência, e a influência psicocinética sobre a matéria, enquanto um
número cada-vez maior de corajosos médicos e psicoterapeutas vem experimentando
métodos de cura não usuais, tais como imagem guiada, terapia de pressão e a
transferência de energia de uma pessoa para outra. Além da resistência conservadora a
tudo isso, as investigações são atrapalhadas pela falta de uma teoria coerente e unificada
que explique como essas práticas funcionam. O sistema kahuna oferece tanto a prática
funcional quanto uma boa teoria de fácil aplicação.
As Ordens Kahunas
Kahuna é uma palavra que foi distorcida nos tempos modernos. Originalmente
usada para definir um adepto treinado, um guardião e transmissor especializado em
conhecimento e poder, ela passou a ser aplicada mais recentemente aos sacerdotes e
ministros de religiões ocidentais, paranormais, curandeiros e até líderes de clubes de
surfe. Embora isso seja compreensível, pois tais pessoas devem ser especialistas naquilo
que sabem, WK afirma que um verdadeiro kahuna é aquele que foi iniciado por um pai
natural ou adotivo e treinado era conhecimento esotérico organizado, como parte de um
grupo identificável. O uso do termo com o significado de "sacerdotes, ministro ou líder" é
uma extensão moderna baseada num erro de interpretação. O mesmo acontece com seu
uso para designar para- normais naturais e curandeiros, que podem ou não ter recebido
conhecimento dos pais. Os havaianos tinham muitos nomes para indivíduos que usam
habilidades psíquicas. Eis alguns:
kaula — profeta ou mágico
po'ko'i — feiticeiro ho'ola — curandeiro
mo'okiko —feiticeiro mau
ho'okalakupua — mágico ou adepto
kilo'uhane — espiritualista
ho 'ike papulua — paranormal
Os termos eram aplicados a pessoas que exerciam tais pode- res sem ser kahunas. Os
kahunas podiam fazer as mesmas coisas, mas como especialistas treinados pertencentes a
uma ordem tradicional. Nesse caso, o indivíduo seria chamado de kahuna kaula, kahuna
ho'ola, etc. Além disso, vários tipos de kahunas eram treinados para ser especialistas em
coisas que não consideraríamos esotéricas hoje, tais como navegação, medicina,
engenharia e meteorologia. Os kahunas eram os cientistas e especialistas técnicos de sua
época, mas seu conhecimento se estendia a campos que mal começam a ser explorados no
mundo ocidental em ampla escala. Por exemplo, um navegador seria não apenas
tecnicamente habilitado, mas também treinado para se comunicar com o vento e as ondas.
Originalmente, não havia uma hierarquia estruturada entre os kahunas, o que ainda
se observa em duas das ordens descritas a seguir. Na verdade, as ordens eram e são mais
parecidas com as guildas medievais do que com ordens religiosas na tradição ocidental.
Um kahuna alcança a proeminência, não por promoção, herança ou eleição, mas sim
através do respeito por suas habilidades e conhecimento. A mais alta "posição" a que um
kahuna pode aspirar é puhi okaoka, que se refere a um indivíduo bem versado em todos os
ramos de conhecimento. Como não possuem autoridade estruturada uns sobre os outros,
os kahunas são procurados e seguidos por causa do que são capazes de fazer e do que
sabem.
Em determinado momento da história, os kahunas se dividiram em três ordens
amplamente definidas, como explicado por WK no prólogo. Cada uma delas enfatizava
uma abordagem específica de conhecimento e prática, mas a diferença tem menos a ver
com função do que com técnica. As três utilizavam os elementos de magia descobertos por
Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna
21
Max Long, e suas áreas de perícia se sobrepunham consideravelmente. Com isso em
mente, examinemos agora cada uma dessas ordens.
A Ordem de Ku
Essa ordem era chamada de "os Emocionais" por WK e enfatiza uma abordagem
sensual/emocional da vida. Em termos de cura, os kahunas dessa ordem são mais
propensos a usar exercício, massagem e imposição das mãos como métodos de
tratamento. Assim como a psicoterapia, essas técnicas trabalham a liberação de emoções
reprimidas e a descoberta de eventos passados que desencadearam os problemas atuais.
Quanto ao ambiente, a abordagem consiste particularmente em tentar o controle direto de
eventos e circunstâncias com a força de vontade e influenciar as emoções das outras
pessoas. Esportes, política, comércio e guerra, bem como religião organizada e cerimonial,
são os interesses naturais dos kahunas desta ordem. Foi ela que dominou o Havaí após a
chegada do poderoso kahuna Paao Samoa, por volta de 1275 d.C. Ele instituiu uma
hierarquia estrita na ordem de Ku e introduziu o sacrifício humano, uma prática que
decididamente não faz parte da tradição kahuna. Depois da chegada de Paao e do chefe por
ele instalado, todo o tráfico entre o Havaí e o mundo exterior cessou, até a vinda do capitão
Cook.
A Ordem de Lono
A abordagem desta ordem, os "Intelectuais" de WK, é intelectual/mecânica. No
Havaí, ela gerou os médicos e cirurgiões, os agricultores, navegadores, astrônomos e
astrólogos, os meteorologistas e os projetistas de navios, que orientavam a construção das
grandes canoas oceânicas. Na cura e na psicoterapia, esses kahunas enfatizam o uso de
ervas e drogas, dieta e fontes naturais de energia curativa, tais como a luz do sol, sal
marinho, cristais e locais especiais descobertos da geomancia (uma forma de adivinhação
usando supostas correntes de energia na terra). Eles vêem o ambiente como algo a ser
manipulado por meio da compreensão da mecânica de sua operação. No Havaí, essa ordem
sofreu muito sob o domínio da Ordem de Ku, e quando os europeus chegaram, boa parte
de suas artes já estava perdida.
A Ordem de Kane
Esses "Intuitivos" possuem uma abordagem espiritual/ integrativa. As técnicas
usadas pelas outras duas ordens são consideradas ferramentas de uso temporário até se
alcançar a compreensão básica de que o mundo exterior é apenas uma reflexão do
pensamento. A ênfase é a unificação ou integração de espírito, mente e corpo com o
propósito do autocontrole, sendo ele a chave para o domínio da vida. Na cura, a
importância básica é dada aos efeitos do pensamento sobre o corpo, e as crenças atuais
são consideradas mais influentes do que as experiências passadas. O ambiente é visto
como uma extensão do corpo, igualmente influenciado por pensamentos e crenças. A
imaginação é a ferramenta mais importante dessa ordem, e boa parte do treinamento diz
respeito ao uso disciplinado dela. Esses kahunas trabalham com estados alterados de
consciência e o uso refinado das habilidades psíquicas, mais do que as outras ordens. Eles
poderiam ser considerados filósofos pragmáticos e, em termos de números, sempre foram
menores que os kahunas de Ku e Lono. Na época do domínio de Ku no Havaí, sofreram
pouco, pois trabalhavam, por assim dizer, "debaixo da terra". De acordo com WK, eles
mantinham contato com o resto do mundo por telepatia. Esta é a ordem na qual meu pai
foi iniciado e onde eu recebi meu treinamento.
Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna
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Os Renegados
O fenômeno mais temido no Havaí era a "oração de morte", uma forma de telepatia
emocional destrutiva, freqüentemente combinada com sugestão negativa. Quase todos os
kahunas que a praticavam eram renegados da ordem de Ku, embora houvesse também
feiticeiros não-kahuna que a usavam também. O epíteto mais comum aplicado a eles era
kahuna'ai pilau (kahunas que comem imundície). Fosse para ganhar poder sobre outros
ou apenas por ganho financeiro, eles usavam seu conhecimento de psiquismo, psicologia e
energia emocional para ferir ou matar. Como bem sabia William Brigham, usava-se muito
mais do que simples sugestão. A oração de morte podia funcionar mesmo que não
houvesse o conhecimento consciente do que estava acontecendo; mas essa prática exigia
considerável habilidade por parte do praticante, e sempre que possível a sugestão era
usada para facilitá-la. Felizmente, cada ordem tinha um número de kahunas especializados
em oki ou kala, formas de magia contrária que anulavam a oração de morte, tornando-a
inofensiva. .
Os Kahunas hoje
WK supõe não haver no Havaí atualmente mais que vinte e cinco kahunas genuínos,
dos quais apenas meia dúzia seria da ordem de Kane. O resto está dividido quase de
maneira regular entre Ku e Lono. No entanto, muitos daqueles que se dizem kahunas são
apenas paranormais e curandeiros individuais, ou pessoas que dão um show aos turistas.
Com poucas exceções, os genuínos kahunas, ou se retiraram totalmente da sociedade ou a
ela se integraram, de modo que ninguém sabe quem são ou o que podem fazer. O
conhecimento está vivo e operante, mas não é ostensivo. E, ao contrário do que muitos
turistas parecem pensar, a ancestralidade havaiana não confere conhecimento kahuna.
Mesmo Leinani Melville escreve que praticamente nenhum havaiano ou mestiço havaiano
tem a menor compreensão do que é Huna, o conhecimento kahuna. Fora do Havaí, os
kahunas também são raros ou se escondem muito bem. Conheci um kahuna maori que me
disse que o conhecimento interior praticamente não existe mais entre o seu povo, e meu
professor kahuna na África teve só três aprendizes durante os quase sete anos que o
conheci. Minhas tentativas de contatar os kahunas que meu pai conheceu na Inglaterra
não foram bem-sucedidas.
Alguns havaianos se irritam por eu chamar a mim mesmo de kahuna, pois não tenho
uma gota de sangue havaiano, embora haja precedentes suficientes nas lendas e histórias
do Havaí para pessoas não-polinésias se tomar em kahunas. Lógico que qualquer um pode
alegar ser kahuna, mas muito tempo atrás alguém que WK e eu consideramos um grande
kahuna nos mandou aplicar este teste: "Pelos seus frutos os conhecereis".
Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna
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CAPÍTULO 2
A Tradição Interior
A filosofia kahuna pode ser resumida em quatro afirmações, cada uma representada
por uma única palavra-chave havaiana:
1. "Você cria a sua realidade (Ike)." Isso significa a sua experiência pessoal
da realidade, cada parte dela. Você a cria através de suas crenças, expectativas, atitudes,
desejos, medos, julgamentos, interpretações, sentimentos, intenções e pensamentos
constantes e persistentes.
2. "Você recebe aquilo em que você se concentra (Makia)." Os pensamentos
e sentimentos que você nutre, ciente ou não deles, formam o molde para trazer à sua vida
a experiência mais equivalente possível àqueles pensamentos e sentimentos.
3. "Você é ilimitado (Kala)." Não há limites para o seu eu, não há limites
entre você e seu corpo, você e o mundo, ou você e Deus. Quaisquer divisões usadas para
discussão são termos de função e/ ou conveniência, pois o isolamento é apenas uma útil
ilusão.
"O seu momento de poder é agora (Manawa)." Você não está preso a nenhuma
experiência do passado nem a qualquer percepção do futuro, pois o passado é apenas uma
memória e o futuro uma mera possibilidade. Você tem o poder no momento presente de
mudar as crenças limitantes e, conscientemente, plantar as sementes para um futuro de
sua escolha. Se você muda o pensamento, muda a experiência.
Essas ideias não são exclusivas dos kahunas. Na verdade, tomei as frases
emprestadas de Seth/Jane Roberts para traduzir os conceitos Huna porque elas se
encaixam muito bem; mas as ideias transmitidas pelas palavras podem ser encontradas
em muitas fontes, nos escritos de várias épocas. Entretanto, elas nunca foram muito
populares porque declaram que, sem exceção, todo indivíduo é responsável por sua
experiência pessoal, e isso pode ser visto como uma coisa subversiva pelos governantes e
intolerável pelos governados. Curiosamente, o mal-estar produzido pela implicação de res-
ponsabilidade costuma cegar as pessoas para a tremenda liberdade inerente que essa
filosofia também contém.
Nas seções a seguir, abordarei outros aspectos da filosofia kahuna que estão ligados
aos anteriormente mencionados. Para esse material, bem como o dos capítulos seguintes,
conto com meu treinamento como kahuna da Ordem de Kane, com a área pessoal e a
pesquisa literária, além das discussões com WK.
A "Bíblia" Kahuna
Boa parte da filosofia kahuna está incorporada na assim chamada "Canção da
Criação", também conhecida como Kumulipo, que é o termo mais próximo de uma "bíblia"
kahuna que conhecemos hoje. Originalmente parte de uma tradição oral passada aos
kahunas treinados em memória perfeita, ela provavelmente foi compilada mais ou menos
Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna
24
na forma atual em 1700, pelo kahuna Keaulumoku. Todas as traduções já feitas (não
muitas) são de um manuscrito que fora propriedade do rei Kalakaua, o qual tinha grande
interesse em preservar as tradições havaianas, incluindo os segredos de Huna e a função
dos kahunas como curandeiros.
Na filosofia kahuna, tanto o mundo espiritual quanto o material ganham forma graças
a uma interação entre forças relativas, freqüentemente representadas por um homem e
uma mulher. Para cada "deus" no panteão havaiano, com poucas exceções, há um equiva-
lente feminino para ajudar com a criação. Muitos são mencionados nas sete primeiras
seções do Kumulipo, junto a versos que parecem contar a formação da vida animal e
vegetal na Terra. As entoações ou seções oitava e nona aparentemente falam do
nascimento do homem para a percepção consciente e de sua multiplicação sobre a Terra.
O resto do total de 16 seções na versão Kalakaua parece ser basicamente genealogias,
exceto pelo relato do herói cultural, Maui.
Um problema que os estudiosos têm com o Kumulipo, porém, é que eles não
conseguem chegar a um acordo quanto à forma de traduzir. Numa tradição oral com uma
língua como a havaiana, muita coisa depende de sutilezas de pronúncia e contexto que não
podem ser adequadamente transmitidas por palavras escritas. Para dificultar ainda mais
as coisas, os kahunas tinham o hábito de incorporar várias nuanças de significado em suas
entoações, algo que os chefes faziam mesmo em suas canções de amor. Durante uma visita
feita a amigos kahunas no Havaí, disseram-me que o Kumulipo tinha sete nuanças de
significado, e eu tive acesso a uma chave para uma dessas nuanças, com a qual estou
trabalhando no momento. Quando perguntei por que eles mesmos não a traduziam,
disseram que não tinham tanta experiência com tradução quanto eu, não gostavam muito
desse tipo de trabalho e tinham coisas melhores para fazer.
Para dar um exemplo do que está envolvido, esta é a primeira linha do Kumulipo:
O ke au i kahuli wela ka honua
E estas são as várias maneiras como ela foi traduzida:
A roda do tempo se volta para os vestígios queimados do mundo.
Adolf Bastion
Na época que mudou o calor do mundo.
Rainha Liluokalani
A época em que a terra mudou em calor.
Kakahi
Na época em que a terra se tornou quente.
Martha Beckwith
Na época em que esta terra evoluiu como uma bola de fogo.
Leinani Melville
Sem negar que qualquer uma das traduções acima pode estar correta, eu fiz três
outras. A última é parte da tradução em que venho trabalhando atualmente:
Houve uma época em que a terra sofreu uma mudança violenta.
A semente ativa transformou a terra com paixão.
O pensamento muda as coisas terrestres.
Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna
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O Conceito de Deus
A religião popular do Havaí era repleta de deuses e deusas, fantasmas, fadas, elfos,
duendes e espíritos que mudavam de forma a seu bel-prazer e podiam ser amistosos ou
hostis com o homem, dependendo da maneira como fossem tratados. Entretanto, essa vi-
são popular era apenas uma distorção do conhecimento kahuna.
Quando os primeiros missionários no Havaí tentavam entender a língua dos
insulanos, depararam com conceitos tão estranhos ao pensamento deles que certas
palavras recebem definições completamente injustificadas. Uma dessas palavras era akua,
que foi traduzida como deus. Quando os missionários perguntaram aos havaianos qual
nome davam às grandes estátuas que pareciam objetos de veneração, os nativos lhes
disseram que o nome delas era akua. Quando perguntaram para quem eles rezavam
pedindo conselho, proteção ou a realização de alguma coisa, eles disseram akua. Mas os
missionários ficaram confusos quando perceberam que os havaianos usavam o mesmo
termo para coisas que não pareciam divinas, incluindo a casta muito desprezada dos
escravos. Como escreveu o missionário Lorrin Andrews em seu dicionário de havaiano em
1865, "quando da visita de estrangeiros, a palavra era aplicada a objetos artificiais, à
natureza ou propriedade de algo que os havaianos não compreendiam, como um relógio
de bolso, uma bússola ou o badalo de um relógio grande, etc." Baseando-se no fato de que
akua também era o nome para a noite da lua cheia, Andrews acrescentou: "Parece que a
antiga ideia de um akua incorporava algo incompreensível, poderoso e, no entanto,
completo".3 Andrews estava na pista certa, mas tanto ele quanto a maioria dos ocidentais
descartaram as aparentes anomalias e continuaram pensando que os havaianos e seus
kahunas simplesmente veneravam ídolos aos quais chamavam de deuses.
A verdade, de importância vital para compreendermos a filosofia e as práticas dos
kahunas, é que akua significa "uma ideia em ação plenamente formada". É uma idéia ativa
que manifesta efeitos. As raízes da palavra contêm significados que têm a ver com movi-
mento ou tendência de uma pessoa para fora de si, para uma transformação e uma ação
completada. Os kahunas sabiamente utilizavam algumas dessas estruturas idealizadas
para a cura. Os quatro maiores akua eram Kane, Ku, Lono e Kanaloa. Se pudermos
conceber que um tipo específico de ideia pode ser uma essência energética inteligente,
então essas ideias podem legitimamente ser chamadas de deuses; do contrário, não.
Kane
Externamente, Kane era considerado o deus superior e mais espiritual, nunca
representado por uma imagem esculpida. No máximo, ele seria representado por um
objeto natural, geralmente uma pedra ereta, sem ornamentos. Era tido como um deus de
paz e amor, e seu equivalente feminino era Wahine. Em diálogos banais, kane significa
"homem" e wahine "mulher". Kane e Wahine eram, portanto, símbolos equivalentes ao
conceito chinês de yin e yang. Para os kahunas, Kane e sua companheira representavam o
eu- deus de natureza dual presente em cada ser humano, semelhante ao "Cristo interior"
dos cristãos ou à mente do Buda dos budistas. Ele/ela é, em outras palavras, a essência
espiritual e a fonte do indivíduo, a alma, o Eu Superior ou Eu Maior. Outro termo para esse
"deus pessoal" é aumakua, que Long primorosamente traduziu como "espírito parental
totalmente fiel"; e dois outros termos para o mesmo conceito, kumupa'a e 'ao'ao, têm as
conotações de professor e guia. Quando os europeus chegaram ao Havaí, a maioria dos
3 Lorrin Andrews, A Dictionary of the Hawaiian Language (Rultand, Vermont, e Tóquio: Charles E. Tuttle
Co., Inc., 1974)
Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna
26
havaianos reverenciava esse espírito interior apenas como uma espécie de ancestral
guardião, porque as pessoas haviam misturado a fonte física de sua existência com a
espiritual. Falarei mais desse akua e dos dois seguintes no capítulo sobre o método de cura
mente/corpo dos kahunas.
Ku
Ku era externamente associado à fertilidade, chuva, feitiçaria e guerra. Como termo
comum, seus significados têm a ver com simbologia generativa; uma base ou estrutura
para algo; uma coisa que pode ser mudada ou transformada; e algo que pode ter
complexos emocionais. Psicologicamente, Ku representa o que pode ser chamado de
"corpo/mente"; a consciência organizadora do corpo, o recebedor de informações sobre o
mundo físico (visíveis e invisíveis), e o executor da ação. É tentador chamá-lo de
"subconsciente", como já fiz, mas, se não compreendida a associação integral com o corpo,
o termo pode ser mal entendido. Em quase toda loja para turistas no Havaí, você pôde
comprar uma estatueta de gesso de Ku, que é um lindo exemplo da "escrita" kahuna de
símbolos. A estatueta desse akua mostra um ser praticamente sem cocar (sua província é a
imaginação da memória), com serpentinas descendo até o chão (envolvimento primário
com o mundo físico), e os olhos fechados (percepção limitada).
Lono
Lono era o deus da agricultura, medicina e meteorologia na religião exterior. Na
psicologia kahuna, ele representa o intelecto, a porção da mente que percebe, interpreta e
dirige. Uma decodificação da raiz do nome revela os significados de receber informação e
agir de acordo com a informação recebida; cérebro, principalmente o cérebro anterior, e
inteligência; buscar metas; criar desejos; e pensamento imaginativo. A estatueta de Lono é
um ser com um cocar alto (imaginação criativa), serpentinas curtas que não chegam ao
chão (contato indireto com o físico), e sem olhos (dependente de outra fonte para ter
informações sobre o mundo).
Kanaloa
Nas lendas havaianas mais antigas, Kanaloa é sempre mencionado como o
companheiro de Kane, e os dois viajavam pelas ilhas em busca de fontes de água. Kanaloa
era conhecido como um deus de cura e dos oceanos, e costumava ser representado por um
polvo ou uma lula, bem como por uma figura esculpida específica. O uso do polvo/lula
como símbolo tem a ver com a significância sagrada do número 8 e o fato de que a palavra
para as duas criaturas, he'e, significa "fluir" (como no fluxo da força vital) e "livrar" (como
livrar-se de uma doença). Após a chegada do Cristianismo às ilhas, Kane, Ku e Lono foram
comparados à Trindade, enquanto Kanaloa assumiu o papel de satanás.
A palavra kanaloa significa "seguro, firme, inconquistável", e é usada como uma
referência poética para comida, um símbolo para poder. Na tradição kahuna interior,
Kanaloa representa o Homem Ideal — plenamente ciente, plenamente físico e ao mesmo
tempo totalmente espiritual, amando e sendo amado e vivendo em contato com sua fonte.
A figura esculpida mostra um ser com um cocar alto (o poder do pensamento criativo),
serpentinas chegando ao chão (envolvimento direto com o físico), e os olhos bem abertos
(percepção completa do mundo físico e do espiritual).
Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna
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Homem Trino
Na filosofia e psicologia kahuna, o homem é um ser espiritual com três aspectos
representados por Kane, Ku e Lono. No estado ideal, os três funcionam como um,
representado por Kanaloa, e nesse estado o homem também é capaz de expressar seu
pleno potencial. Por motivos que serão mencionados em capítulos posteriores, pode
ocorrer a desunião, causando uma quebra de comunicação entre os três aspectos e uma
diminuição da efetividade do homem na vida. Para reconquistar essa efetividade, os
kahunas devem primeiro ensinar como reunificar Lono e Ku, o intelecto e o corpo, ou o
consciente e subconsciente. Dependendo do sucesso dessa reunificação, a união com o
Kane também ocorre. Evidentemente, não falamos aqui de uma reunificação física, pois
não existe uma real separação, e sim da reunificação através da percepção aumentada.
Simbolicamente, quando as figuras esculpidas de Lono e Ku são combinadas, o resultado é
Kanaloa, o companheiro de Deus.
A Divindade
Quando Kane se refere a Deus, trata-se de uma referência ao eu-deus muito pessoal
do indivíduo. Os kahunas também reconhecem uma Divindade ou um Deus supremo,
infinito, e o termo que usam para isso é Kumulipo, a mesma palavra usada para a Canção
da Criação e que pode ser traduzida como "fonte de vida". Kumulipo é considerado
imanente na natureza, e a unicidade inerente de todas as coisas é aceita como uma
verdade básica. Como seres concentrados na realidade física, porém, os kahunas sentem
que este mundo é o objeto mais prático para estudo e desenvolvimento. A visão que eles
têm deste mundo é muito mais ampla do que a visão tradicional na cultura ocidental, e sua
percepção do mundo envolve pontos de vista de vários estados de consciência; por isso,
eles sentem que há muito campo para trabalho no "aqui-e-agora" sem especulações inúteis
sobre a natureza da Divindade. Huna é uma filosofia pragmática, e não existem teólogos
entre os kahunas. Kumulipo é tudo o que existe, infinito, inerentemente amando tudo. Não
há muito mais o que dizer sobre isso.
Espíritos
O deus pessoal, ou o eu-deus (Kane ou aumakua), não é limitado à humanidade, na
filosofia kahuna. Como Deus está em tudo (ou tudo está em Deus — os kahunas
concordam com as duas premissas), tudo tem uma forma própria de percepção. Num
sentido profundo, tudo é vivo, ciente e responsivo. E tudo, até mesmo aquilo que os
cientistas ocidentais consideram matéria "morta", tem um Eu Superior com o qual se pode
comunicar conscientemente. A comunicação inconsciente, ou a telepatia subconsciente,
está sempre ocorrendo entre nós e nosso ambiente, porque é a forma primária na qual o
mundo interage consigo mesmo. Um exemplo seria a maneira como as plantas reagem à
dor ou ao prazer de outros seres vivos nas proximidades. Como humanos, porém, temos o
potencial para a comunicação telepática consciente, deliberada, com qualquer coisa, e,
portanto, o potencial para influenciar propositalmente o ambiente através de meios não
físicos. Daí surge a ideia de que existem identidades-deus (aumakuas ou simplesmente
akuas) para grupos de coisas, assim como para os indivíduos, e de que a essência grupai é
mais do que a soma de suas partes. Assim, uma árvore tem seu próprio aumakua, e a
floresta — da qual ela faz parte — também, o mesmo acontecendo no resto do mundo, — e
além dele. Antigamente, um kahuna pedia permissão ao espírito de uma árvore antes de
cortá-la, ao espírito de um vale antes de atravessá-lo. Ele fazia isso por respeito pela fonte
que vivia em tudo, para garantir cooperação. Hoje, um kahuna pode falar com seu carro ou
sua casa da mesma maneira, e usar o mesmo conceito em seu trabalho de cura.
Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna
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Como já expliquei em outros textos, a palavra inglesa spirit (espírito), aborda grande
variedade de fenômenos que os kahunas reconhecem como muito diferentes. Para sermos
breves, dentro dessa vasta categoria, os kahunas reconhecem formas-pensamento,
manifestações de campos de energia, complexos aparecendo como personalidades
separadas, efeitos de extrema sensibilidade telepática ou clarividente, o equivalente dos
anjos, bem como "ideias em ação". Apesar dos contos e lendas populares, a filosofia
kahuna não inclui a ideia de verdadeiros diabos, demônios ou espíritos dos mortos
vagando. Estes são vistos como formas-pensamento criadas consciente ou
inconscientemente, ou manifestações de complexos negativos. Entretanto, um kahuna
pode agir como se essas coisas existissem caso esteja tratando de alguém que acredita
nelas.
Crenças e Realidade
Para os kahunas, a crença é a base para a experiência de qualquer realidade. A ideia é
que nossa experiência é condicionada pelo que acreditamos, e só podemos experimentar
aquilo que acreditamos ser possível em algum nível de consciência. Quanto mais
acreditarmos numa coisa, mais profundamente ela afeta nossa experiência. Obviamente,
uma das principais tarefas do curandeiro kahuna é ajudar as pessoas a mudar suas crenças
doentias em crenças saudáveis.
As crenças acalentadas pelas pessoas podem ser divididas em três tipos, todos
mantidos ao mesmo tempo. O primeiro tipo é a pressuposição (paulele), um estado de
crença no qual não há dúvida nenhuma e a experiência consiste no que se acredita. O
segundo é a atitude (kuana), ou as crenças que abrem margem para dúvidas, mas, por
serem tão habituais, continuam a influenciar a experiência. O terceiro tipo é a opinião
(mana 'o), uma crença facilmente mudada à luz de um novo conhecimento. Em contraste, o
novo conhecimento que contradiz pressuposições e atitudes, sozinho, raramente produz
mudança. Entrarei em pormenores sobre essas crenças e seus efeitos na saúde no capítulo
sobre mente/corpo.
Você cria a sua realidade por meio de suas crenças, dizem os kahunas, e as espécies
de realidades criadas também podem ser classificadas em três categorias. Os psicólogos
ocidentais estão familiarizados com as assim chamadas realidades subjetivas e objetivas. A
essas, os kahunas acrescentam uma terceira, que eu chamo de projetiva.
A realidade subjetiva é pono'i, uma palavra referente ao sentido que uma pessoa tem
do que é certo, apropriado, bom, moral, correto, bem- sucedido, útil, etc. É a realidade do
julgamento, e aquela que tem o maior efeito, na saúde e felicidade. Por exemplo, em minha
realidade pessoal, fazer caminhadas carregando minha mochila é uma atividade positiva e
benéfica, mas na realidade pessoal de minha mulher é negativa e dolorosa. Não se trata de
uma simples diferença de opinião; é uma diferença em experiência subjetiva.
Em seguida, vem a experiência objetiva, ou, como prefiro chamá-la, realidade
compartilhada. A palavra para isso é oia'i'o, que tem significados de substância e fatos, e se
refere ao modo como as coisas parecem ser, independentemente de atitudes e opiniões. É
a realidade da aparência e interpretação, da tecnologia e da lida prática com o mundo
material. Os "fatos" de seu ambiente imediato lhe permitem comer, respirar, trabalhar,
brincar e interagir com os outros, e essa é a realidade do oia'i'o. Essa realidade é mais
facilmente mudada por meio de uma nova interpretação dos fatos, como frequentemente
fazem os inventores.
O terceiro tipo de realidade é maoli, que significa "devido à vibração". Essa é a
realidade que começa como subjetiva e se torna objetivada por meio de contínua projeção
mental. E uma realidade que você cria ou partilha da criação propositalmente, levando o
seu desejo do nível de uma ideia ou imagem ao nível da experiência física. Não é uma coisa
estranha que só os adeptos podem fazer após muitos anos depois de prática disciplinada.
Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna
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Você faz isso sempre que planeja e executa um projeto. Praticamente o mesmo processo
pode ser usado para efetuar uma cura. Os kahunas não veem a realidade como algo
separado ou fora de nós mesmos, mas tratam-na como parte essencial de um estado
psicológico. O potencial que temos é enfatizado pelo fato de que maoli também pode ser
traduzido como "um estado de alegria".
Vida e Morte
A palavra havaiana para vida é ola, e a mesma palavra é usada para "um meio de
sustento ou renda, curar ou ser curado, bem-estar, bem, salvação, conceder vida", e outros
significados semelhantes. As raízes dão um significado básico de emitir ou encher-se de
luz, e os kahunas usam a luz como um símbolo de energia e também de perfeição. Uma
ideia fundamental por trás disso é que uma vida saudável, produtiva e satisfatória está
intimamente ligada a um contínuo aumento de percepção. Duas outras palavras que
significam luz, ea e ha, também têm o sentido de "respiração", o que exemplifica que o
duplo sentido era, aparentemente, comum em muitas filosofias antigas. Além disso, essas
duas palavras carregam significados associados ao movimento da água; e a própria água
(wai) também é usada como um símbolo da vida. Portanto, a vida é percebida pelos
kahunas como algo que flui e se move em ciclos, como a respiração e a água. De fato, uma
frase recorrente em lendas e orações do Havaí, wai ola, pode significar igualmente "a água
da vida" e "o fluxo da vida".
Do ponto de vista ocidental, parece natural olhar a morte como o oposto da vida, e
esperar que a palavra kahuna para ela se refira a uma parada do fluxo. Em vez disso,
porém, a filosofia kahuna trata a morte como continuação da vida numa direção ou estado
diferente. Isso fica evidente nos significados alternativos para os temas comuns e poéticos
para a morte, em havaiano, como vemos a seguir:
make loa — "forte desejo por algo "
hiamoe loa — "desejo de um longo sono "
ua makukoa'a'e'oia — "vida que se mantém fluindo "
ala ho'i ole mai — "o caminho sem volta"
waiho na iwi — "deixar para trás os ossos"
moe kau a ho'oilo — "tempo de sono para germinar (renascimento)"
a lele nui ka mauli — "o espírito (ou vida) fluiu "
lele ka hoaka — "o espírito (ou corpo astral) fluiu "
ha'ule — "começar a fazer algo "
Um problema importante para muitos filósofos não é apenas por que a morte ocorre,
mas por que naquele momento e daquela forma. Superficialmente, parece uma coisa
ilógica, sem padrão ou motivo, mas isso acontece porque a cultura ocidental tende a ver a
morte como o fim, algo imposto a nós contra a nossa vontade, e pela qual não temos
responsabilidade exceto em caso de suicídio. A visão kahuna é muito diferente. A morte é
vista como parte da vida, tão natural quanto a mudança das estações ou a metamorfose de
uma lagarta em borboleta. Ela ocorre porque faz parte do contínuo processo de vida. O
quando e o como são questões de crença pessoal e cultural. Por exemplo, se você
desenvolver a crença de que a velhice é uma coisa horrível, que preferiria morrer a ficar
velho, provavelmente morrerá, ainda que tenha de criar subconscientemente uma doença
ou um acidente como modo de partir. E, se você tem uma crença profundamente arraigada
de que, pode envelhecer com dignidade, de maneira agradável e com boa saúde,
provavelmente será um centenário ativo e a sua passagem será tranquila e pacífica quando
você sentir que sua vida já se cumpriu. E até o último momento da vida física, uma
mudança de crença pode mudar suas circunstâncias. Como frequentemente digo a meus
alunos, você tem um propósito e o seu Eu Superior providenciará para que esse propósito
Kahuna Healing: Holistic practices of Polynesia
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Kahuna Healing: Holistic practices of Polynesia

  • 1.
  • 2. Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna 1 SergeKahiliKing MAGIA E CURA KAHUNA Saúde Holística e Práticas de Cura da Polinésia Tradução: Marcos Malvezzi Leal MADRAS
  • 3. Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna 2 Publicado originalmente em inglês sob o título Kahuna Healing — Holistic health and healing practices of Polynesia, em Theosophical Publishing House, 306 Wes Geneva Road Wheaton, Illinois 60187 USA © 1983, Serge King Tradução autorizada do inglês Direitos de edição para todos os países de língua portuguesa © 2004, Madras Editora Ltda. Editor: Wagner Veneziani Costa Produção e Capa: Equipe Técnica Madras Tradução: Marcos Malvezzi Leal Revisão: Augusto do Nascimento Ana Maria Balboni Palma CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE ________ SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ. ____________________ K64m King, Serge Magia e Cura Kahuna: Saúde Holística e Práticas de cura da Polinésia/Serge Hahili King; tradução Marcos Malvezzi Leal. - São Paulo: Madras, 2004 Tradução de: Kahuna healing Apêndice Inclui bibliografia ISBN 85-7374-812-5 1. Cura pela mente. 2. Cura - Havaí. 3. Havaianos - Medicina. 4. Kahuna. I. Título. 04-0798. CDD 615.851 CDU 615.85 23.03.04 __________________24.03.04________________________005926 Proibida a reprodução total ou parcia desta obra, de qualquer forma ou por qualquer meio eletrônico, mecânico, inclusive por meio de processos xerográ- ficos, sem permissão expressa do editor (Lei n? 9.610, de 19.2.1998) Todos os direitos desta edição, em língua portuguesa, são reservados pela MADRAS EDITORA LTDA. [ Rua Paulo Gonçalves, 88 — Santana 02403-020 —São Paulo —SP Caixa Postal 12299 — CEP 02013-970 — SP Tel.: (0 11) 6959.1127 — Fax: (0_ _11) 6959.3090 www.madras.com.br
  • 4. Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna 3 Dedicatória Este livro é dedicado a Harry L. King, meu pai e meu primeiro professor Huna; a O., que manteve o Huna vivo em mim, enquanto eu crescia e me tornava adulto; a M'Bala, que me ensinou tanto sobre energia psíquica; e especialmente a Wana Kahili, cujo profundo conhecimento da filosofia e das tradições Huna tornaram possível esta apresentação.
  • 5. Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna 4 Índice Prefácio................... ............................................................................................ 06 Capítulo 1 Os Kahunas .......................................................................................................... 14 O Povo da Polinésia................................................................................... 14 O Sistema Kapu........................................................................................... 15 Os Kahunas do Havaí................................................................................ 16 As Ordens Kahunas................................................................................... 20 A Ordem de Ku.................................. ................... . ......................... ........ 21 A Ordem de Lono .................................... .................................................. 21 A Ordem de Kane ....................................................................................... 21 Os Renegados .............................................................................................. 22 Os Kahunas Hoje ................................. ................... ......... ........................ 22 Capítulo 2 A Tradição Interior........................................................................................... 23 A "Bíblia" Kahuna....................................................................................... 23 O Conceito de Deus.................................................................................... 25 Kane................................................................................................................. 25 Ku ..................................................................................................................... 26 Lono................................................................................................................. 26 Kanaloa........................................................................................................... 26 Homem Trino ..............................................................................................27 A Divindade..................................................................................................27 Espíritos.........................................................................................................27 Crenças e Realidade..................................................................................28 Vida e Morte.................................................................................................29 Bem e Mal......................................................................................................30 Amor e Emoções.........................................................................................31 Relatividade .................................................................................................32 Capítulo 3 Práticas Psíquicas .........................................................................................34 Níveis de Consciência...............................................................................34 Primeiro Nível: Físico (Ike Papakahi) ...............................34 Segundo Nível: Psíquico (Ike Papalua) .............................34 Terceiro Nível: Relacionai (Ike Papakolu).......................35 Quarto Nível: Místico (Ike Papakauna) ............................35 Mente, Energia e Matéria............................................................... .......35 Simbologia ....................................................................................................36 Categorias de Poderes Psíquicos............................... ........................37 Telepatia (Una).............................................................................37 Clarividência (Kilo/Nana Ao)................................................38 Pré-cognição (Wanana) ...........................................................38 Psicocinesia (Kalakupua)........................................................40 Destruição Psicocinética (Ana-ana)....................................40 Contrafeitiçaria...........................................................................................42 Habilidades Psíquicas são Neutras.....................................................43 Capítulo 4 Abordagem Mente/Corpo ..........................................................................44
  • 6. Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna 5 O Eu Superior (Kane/Aumakua).......................................................44 Mente Consciente (Lono)......................................................................47 O Subconsciente (Ku) ................................................................... 47 O Corpo (Kino) ........................................ .................................................48 Fluxo Biológico de Energia ...................................................................49 Emoções.........................................................................................................51 A Natureza e a Formação de Complexos..........................................52 Pressuposições (Paulele)......................................................................53 Atitudes (Kuana) ......................................................................................54 Complexos (Hilina'i)..................................................................... ..........55 Feedback Ecológico.............................................................. ....................56 Capítulo 5 Métodos de Cura............................................................................................59 "Terapia Estratégica".............................................................................. 59 A Abordagem Material ........................................................................... 60 Remédios ..................................................................................................... 60 Dieta............................................................................................................... 62 Ritual ............................................................................................................. 63 Objetos Energizados................................................................................ 63 A Abordagem Energética....................................................................... 64 Manipulação Física .................................................................................. 64 O Corpo (Kino).......................................................................................... 65 Manipulação de Campo................................................ .......................... 65 A Abordagem Mental .............................................................................. 66 Percepção dos Pensamentos (Ike) ................................................... 67 Estabelecer Metas (Makiá) ......... . ..................................................... 67 Mudar (Kala)............................................................................................. 68 Direcionar Energia (Manawa)........................................................... 68 Falha no Tratamento......................................... ....... —....................... 69 Cura Divina.................... ............................................................................ 70 Encerramento (Panina) ....................................................................... 71 Epílogo............................................................................................. 72 Apêndice O Código Kahuna ........................................................................................... 75 Regras do Código....................................................................................... 76 Exemplos....................................................................................................... 76 Bibliografia Comentada sobre Huna e os Kahunas............ 80 Outras Referências..................................., ............................................... 86
  • 7. Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna 6 Prefácio 'Tempestade de areia!" Camelos grunhindo, cavalos relinchando, e o pequeno grupo de homens corria para proteger as cabeças de seus animais da poeira cortante, antes de cobrir os próprios rostos com cachecóis de lã. Como era típico em Gobi, a tempestade caíra sobre eles quase sem avisar. Os homens tossiam e praguejavam em mongol e inglês, aglomerando-se e cambaleando passos à frente. Um dos guias havia notado alguns montes de areia à esquerda, antes da tempestade, e era para lá que ele guiava o grupo, na esperança de encontrar alguma pequena proteção contra o vento e a areia. Minutos depois, ele deparou com o que sobrara de um muro de tijolos de barro, remanescente dos antigos vilarejos em ruínas que ainda pontilham o deserto. "Abrigo! Abrigo aqui!", gritou. Sua voz era abafada pelo vento e por seu cachecol, mas a mensagem foi ouvida e passada adiante. Homens e animais marchavam adiante com esforço e dificuldade, na tentativa de se esconder entre os recessos protetores de muros caídos e pilhas de entulho. Aparentemente, o acaso sorrira para eles. Um dos homens, o mais jovem dos estrangeiros naquela expedição científica e política, abrigou-se na junção de dois muros, a alguma distância dos outros. Lá, agachou-se ao lado do cavalo para esperar que a tempestade passasse. A expedição da qual fazia parte era uma dentre muitas, enviadas pela Inglaterra no começo do século XX, quando a Ásia ainda era um joguete nas lutas por poder entre os impérios britânico, russo e chinês. O jovem refletia sobre tudo isso quando subitamente o solo na frente de seus pés pareceu partir-se, abrindo um buraco diante dele. Em meio à claridade da luz do sol, ofuscada péla cortina de areia, ele viu degraus que conduziam para o fundo escuro. Percebeu que devia estar em cima do telhado de um velho edifício, e seus passos até provavelmente tinham enfraquecido a sustentação. Extremamente curioso e ignorando qualquer perigo, o jovem deixou o cavalo e desceu pelos degraus. Pela abertura, entrava luz suficiente para lhe permitir enxergar de forma difusa o ambiente; e o que viu fê-lo suspirar, surpreso. Estava numa sala de mais ou menos 9 metros de comprimento por 4,5 metros de largura. As paredes de ambos os lados mostravam o que pareciam ser afrescos, mas a iluminação filtrada através da abertura em cima não possibilitava distinguir detalhes das imagens. Deu mais alguns passos e viu uma mesa na extremidade oposta. Ao se aproximar dela, percebeu que parecia mais um altar de pedra. Bem no centro desse altar, encontrava-se uma jóia, um bracelete. Ao pegá-lo, ouviu um ruído atrás de si, e se voltou. Começava a cair areia pela abertura, ameaçando enterrá-lo vivo. Enfiando o bracelete num bolso, correu de volta aos degraus e quase rastejou para sair. O cavalo não estava mais lá e a tempestade estava piorando. A única coisa que podia fazer agora era encolher-se no canto entre os escombros e esperar. Finalmente, a tempestade acabou. O rapaz, quase totalmente coberto de areia, tirou o pano que lhe cobria a cabeça e apertou os olhos, observando um mundo diferente. O sol brilhava através de um ar limpo e não havia mais nenhum traço do buraco por onde ele se havia espremido para entrar. A areia encobrira tudo, inclusive os pedaços do muro que serviam de abrigo. Foi então que ouviu vozes. "Harry! Harry, onde está você?" "Aqui", ele gritou, e abriu caminho entre a areia, saindo do ninho protetor. Os outros tinham encontrado o seu cavalo, e ficaram muito aliviados ao ver que ele também estava inteiro. Ninguém se interessou por sua história sobre uma sala com afrescos e um altar. Estavam
  • 8. Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna 7 ansiosos para sair daquela zona de areia e alcançar as estepes. Após ouvir brincadeiras sobre ter sofrido uma insolação, ele não mencionou mais sua aventura, e a expedição prosseguiu. Alguns meses depois, Harry estava de volta a Londres, reportando-se ao seu superior no departamento do governo onde trabalhava. Quase no fim de seu recital sobre sua participação na expedição, enfiou a mão no bolso e tirou o bracelete. "O que o senhor acha que é isto?", perguntou, colocando o objeto sobre a mesa. "Parece um mapa do sistema solar, não parece?" Harry esperava uma ligeira curiosidade, talvez alguma admiração, mas o homem do outro lado da mesa parecia totalmente perplexo. Hesitante, ele apanhou o bracelete e o examinou com cuidado. No centro, havia uma pedra amarela, como topázio, ao redor da qual e aleatoriamente em círculos concêntricos se encontravam outras pedras menores, em número total de nove. O homem dirigiu um olhar profundo a Harry e disse: "Onde conseguiu isso?" Harry lhe contou a história da tempestade e da sala que descobrira por acaso. "Posso ficar com ele esta noite?", o homem perguntou. "Garanto-lhe que estará em segurança." Embora surpreso, Harry concordou. E o dia seguinte seria o início da mais estranha aventura na vida de Harry. No decorrer do mês seguinte, ele foi apresentado a um grupo de pessoas que não acreditava no acaso, e para as quais a descoberta do bracelete tinha um significado especial. Por fim, acabaria conhecendo' também ensinamentos que, para ele, apresentariam um novo modo de ver e lidar com a realidade. E, finalmente, Harry foi adotado/iniciado pelo grupo ao qual ele sempre chamou de A Organização. O jovem mencionado nessa narrativa era Harry Leland Loring King, meu pai, e foi assim que ele me contou a história. Por intermédio dele, também me associei à Organização, embora a chame por outro nome. Sinto que o conhecimento obtido por meio dessa afiliação é tão importante para a saúde e felicidade, tanto em escala individual quanto mundial, que quero partilhá-lo com você de uma forma que o torne uma realidade viva em sua vida cotidiana. Mas, antes, gostaria de lhe falar um pouco sobre mim e o grupo. Alguns dos leitores podem achar difícil acreditar naquilo que vou dizer, e se quiserem ouvir-me com um pé atrás, não me incomodo. O verdadeiro prato servido pelo livro começa no capítulo 2, e quem quiser poderá ir direto para ele. Outros, porém, talvez se beneficiem ao compreender que há visões do mundo e algumas coisas acontecendo na vida muito diferentes daquilo que a maioria de nós, no Ocidente, é levada a acreditar. Minha primeira lembrança de algo relacionado ao grupo de que estou falando é de quando eu tinha 7 anos, e meu pai me leu uma carta de um homem que, segundo ele, "observava o meu desenvolvimento". Nunca conheci tal homem, mas, mais ou menos naquela época, comecei a cultivar um intenso interesse por astronomia, que nunca diminuiu. De meu pai, herdei uma profunda paixão por ciência e pela natureza, e aprendi muitas lições práticas sobre o poder da mente. Quando estava com 14 anos, meu pai me iniciou no grupo e disse que eu seria procurado por outros professores, com o passar do tempo. Um ano após a morte dele, enquanto eu fazia o primeiro ano de faculdade, fui contatado por um homem do grupo que me disse que, por algum tempo, eu seria mais tutorado através de meus sonhos. Na época, eu estava mais interessado na sobrevivência física, por isso não dei muita importância à informação. Em vez de fazer o segundo ano da faculdade, alistei-me na Marinha e mudei-me para a Califórnia. Poucos meses depois, fui procurado por outra pessoa do grupo, e passamos a nos encontrar regularmente durante todo tempo que durara meu alistamento. Entre outras coisas, fui orientado para um estudo de arqueologia e técnicas de examinar o passado distante. Pouco antes de terminar meu período militar, fui ordenado kahuna da Ordem de Kane, tema ao qual voltarei mais adiante. Nos cinco anos seguintes, meus estudos "extracurriculares" se centralizaram em antropologia, filosofia e religião.
  • 9. Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna 8 Em 1964, já tinha constituído família, e trabalhava para uma Agência Voluntária Americana, administrando programas de assistência e desenvolvimento no oeste da África. Lá, fui contatado por um membro africano do grupo, e com sua ajuda vivi alguns dos anos mais aventurosos de minha vida. Na África, envolvi-me profundamente com as técnicas de mudança social e a natureza da força vital, particularmente em sua aplicabilidade à cura. Enquanto trabalhava com os aldeãos e os burocratas do governo, promovendo o desenvolvimento socioeconômico, comecei a ver como as abordagens mais ortodoxas eram ineficazes para induzir qualquer tipo de mudança duradoura. O jeito ortodoxo — e isso se aplica à medicina, psicoterapia e educação, bem como às questões socioeconômicas — é estabelecer um método garantido, certo, lógico e inflexível de operação, e aplicá-lo como lei. Isso ficou maravilhosamente explícito numa experiência que observei em um encontro entre militantes do Corpo de Paz e uma repartição governamental local para o desenvolvimento comunitário. Os membros do Corpo de Paz estavam muito desgostosos com o modo como o governo local estava lidando com o programa de desenvolvimento, pois este não funcionava naquele campo. Em outras palavras, o método não estava resultando nas mudanças desejadas, e a visão do Corpo de Paz era de que o governo não levava em conta o que os aldeãos sentiam. Um porta-voz do governo ficou muito irritado e disse: "Não há nada errado com o método. Ele foi elaborado com muita reflexão e é perfeitamente apropriado para a situação. Não há nada errado com o método. São as pessoas que devem mudar!" Ele bem podia falar em nome de todos os ortodoxos, de qual- quer lugar e época. Mas, um sistema assim não funciona muito bem por muito tempo, principalmente porque as pessoas mudam continuamente. Pode parecer um paradoxo à primeira vista, mas um sistema rígido imposto de fora realmente pressupõe que as pessoas não mudam, e que há menos variedade em suas necessidades do que de fato há. Trabalhando diretamente com as necessidades sentidas pelas pessoas, no contexto de suas situações, pude apresentar uma abordagem flexível de desenvolvimento que teve grande sucesso. Realizei coisas que o governo local, o governo federal norte-americano, e às vezes até o Corpo de Paz e os próprios aldeãos achavam, a princípio, impossíveis. E o fiz com poucos recursos e alguns simples e básicos conceitos. O que descobri em meus anos de treinamento individual é que os mesmos princípios básicos se aplicam ao desenvolvimento pessoal bem como ao desenvolvimento social e econômico. No que diz respeito à cura, tive o privilégio na África de estabelecer uma profunda interação com vários curandeiros tradicionais que realmente conheciam seu ofício. Eles me ensinaram algumas coisas fascinantes sobre o que os pesquisadores modernos chamam de campos e correntes de bioenergia, e também sobre as relações entre mente e corpo, e entre corpo e desenvolvimento. Aprendi que é possível para qualquer um tornar-se consciente da fonte de energia emocional, aumentá-la, direcioná-la e usá-la para curar a si próprio ou outras pessoas. O que mais me impressionou foi o conhecimento de que as emoções podem curar ou ferir. Comecei a usar essa ideia em minha família, depois ensinei a eles como aplicá-la livremente sozinhos. Agora, ensinamos os outros. Ao voltar para os Estados Unidos, em 1971, fiz contato com um homem a quem chamarei de WK, o qual eu conhecera numa viagem anterior. WK é um kahuna havaiano, e o que ele me ensinou nos três anos seguintes mudou profundamente a minha vida e me permitiu ajudar muitas outras pessoas a conseguir melhoras duradouras em todo aspecto de suas vidas. Os temas eram suficientemente simples: amor, imaginação, crenças e a natureza do sucesso. Mas a compreensão que WK tinha deles era diferente de tudo o que normalmente é ensinado nesta sociedade. Comecei a ver que sua visão se refletia em minha experiência pessoal. Percebi que havia nela algo a ser compartilhado. O jeito como eu queria fazer isso, porém, causou uma calorosa discussão. Por vários motivos, há muito tempo os kahunas de minha ordem fazem seu trabalho de maneira privada, longe do olhar
  • 10. Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna 9 do público. Minha noção era incomum, mas finalmente foi concordado que eu deveria fundar uma nova ordem para o propósito de ensinar publicamente o conhecimento Huna. O resultado foi a Order of Huna International (Ordem de Huna Internacional), fundada em 1973 e registrada pelo estado da Califórnia como uma ordem religiosa não-sectária e sem fins lucrativos. Entretanto, Huna — o nome comum dado ao conhecimento kahuna — não é uma religião. É uma filosofia de realizações que pode ser aplicada em qualquer contexto: religioso, científico, social ou pessoal. Os próprios membros da Huna International não precisam abandonar sua fé tradicional para entrar na ordem, e isso inclui os kahunas. Temos cristãos Huna, judeus Huna, budistas Huna, muçulmanos Huna e assim por diante, e todos chegando à conclusão de que Huna aumenta a apreciação de suas origens religiosas. Qualquer que seja a sua religião, você é afetado pela gravidade. O conhecimento Huna é essa base. O motivo pelo qual as pessoas entram para a ordem é participar de um empreendimento mutuamente cooperativo e benéfico, pois estamos tornando esse conhecimento acessível a todos. Nosso lema é tirado de uma antiga aclamação que os kahunas havaianos faziam do alto de uma torre, e que era um oráculo: Que aquilo que é desconhecido se torne conhecido! Entre 1973 e 1992, a Huna International se desenvolveu numa organização mundial de pessoas praticando e partilhando conhecimento Huna, e sua base de operações mudou para uma antiga sede de sabedoria — a ilha de Kauai, no estado do Havaí. A partir de lá, grande variedade de projetos foi iniciada: Aloha International— educação e contatos. Hawaiian Shaman Training — cursos e aulas (treinamento xa- manista). Kino Mana — cursos de trabalhos corporais havaianos. Kauai Village Museum — exibições e exposições culturais havaianas. Finding Each Other International — contatos para desenvolver relacionamentos. Voices ofthe Earth — um fórum para povos nativos. Além desses, existem agora novos capítulos, professores e conselheiros em todo o mundo. Talvez você esteja pensando agora: "Afinal, o que é esse Huna e o que é um kahuna?" Huna é uma palavra havaiana que significa "aquilo que é oculto, ou não óbvio". As vezes, nós chamamos a isso de Conhecimento Oculto, ou a Realidade Secreta. A ideia não é que alguém propositalmente a esconda, mas apenas que ela é difícil de ver. O termo kahuna pode ser traduzido como "um transmissor do segredo" e era usado originalmente para designar aqueles que pertenciam a uma ordem que praticava e ensinava o conhecimento. No Havaí moderno, porém, a palavra é usada para tudo, desde um sacerdote ou ministro ocidental até curandeiros e paranormais comuns, e também para charlatões que exploram os crédulos. Aqui, nós o usamos em seu sentido original. Entre as pessoas que conhecem Huna atualmente, a maioria só tem conhecimento das obras de Max Freedom Long sobre o tema. Max Long foi um estudante de psicologia, religião e ciência psíquica que fez um brilhante trabalho de desvendar boa parte do conhecimento Huna codificado na língua havaiana. Os poucos erros e distorções que aparecem em seu trabalho inicial são compreensíveis, considerando que ele nunca teve uma oportunidade de discutir suas descobertas com um kahuna. Na época em que ele vivia no Havaí, no início do século XX, era contra a lei ser ou afirmar ser um kahuna, e isso perdurou até tempos relativamente recentes. É admirável que Long tenha realizado tanto, baseando-se apenas em histórias, superstições e conhecimento distorcido. Felizmente, ele
  • 11. Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna 10 tinha o tipo de raciocínio excelente em fazer correlações com conhecimentos de outras áreas e culturas, e foi capaz de enxergar através da distorção em sua maior parte. Para expandir um pouco mais a sua mente, gostaria de lhe passar um pouco da história da filosofia Huna. Dizem que a história é mais um reflexo do presente que do passado, porque os historiadores tendem a escrever sobre o passado em termos do que a atual geração está disposta a aceitar. O que as pessoas não aceitam não será escrito, ou pelo menos não publicado. À medida que a sociedade muda, também mudam os livros de história. Um exemplo menor é a história dos negros nos Estados Unidos. Antes do movimento pelos direitos civis, a história deles era inexistente. Nada era ensinado nas escolas, ninguém estudava a respeito, e para todos os efeitos não existia tal coisa na mente das pessoas, mesmo as negras. Hoje se sabe que houve muitos negros americanos heroicos e importantes, e os livros de história estão sendo reescritos; mas somente porque a sociedade está disposta a olhar nessa direção. Boa parte do que é escrito como história não passa de palpite, com o historiador desempenhando o papel de um detetive que viaja no tempo e cujas pistas são esparsas. Quanto mais distante você mergulha no passado, mais esparsas são essas pistas. Se há registros históricos, eles ajudam, como os hieróglifos no Egito; mas muitos povos têm histórias orais que indicam o início de suas civilizações num passado muito mais remoto do que os historiadores modernos gostariam de admitir. Essas histórias geralmente são consideradas mitos ou lendas, com a implicação de que provavelmente não são verdadeiras. A história que vou contar é parcialmente oral e parcialmente registrada. Mas a parte registrada não existe de uma forma escrita que você entenderia. Você talvez se surpreenda ao saber que algumas pessoas podem "ler" figuras pintadas em sequência e desenhos entalhados em cavernas com a mesma facilidade com que você lê esta página. De qualquer modo, esta é a história de uma filosofia que me foi contada por WK. Se você a achar inaceitável como fato, pense nela como uma tradição. Isto não afetará a sua habilidade para usar o conhecimento Huna. ******* "Em algum lugar no passado, muito tempo antes da ascensão de Atlântida, uma raça de homens chegou a este sistema solar, vinda de um grupo de estrelas conhecido como as Plêiades. Alguns aterrissaram na Terra e outros em outro planeta que não existe mais. Naquela época, a Terra ficava mais próxima do Sol e a duração do ano era de exatamente 360 dias. Os homens que vieram das estrelas fugiam de uma catástrofe, e tinham a intenção de encontrar paz na Terra. O processo foi lento, porém, pois encontraram aqui outros homens, remanescentes de uma civilização anterior que se havia dizimado. Tam- bém encontraram dinossauros inteligentes, e surgiram muitas batalhas por controle territorial. Finalmente, a maior parte dos homens das estrelas se estabeleceu num continente no Pacífico, conhecido hoje em lendas como Mu. Eles chamavam a si próprios de Povo de Mu, mas outros os chamavam de Manahuna ou Menehune, 'o povo do poder secreto', por causa de sua tecnologia avançada e de seus poderes psíquicos. Eram indivíduos pequenos, com aspecto de pigmeus pelos padrões modernos, e muito laboriosos. Ó conhecimento deles era Huna, uma filosofia para se viver com sucesso. Quando perceberam estar assentados em segurança, começaram a ensinar esse .conhecimento aos homens da Terra. Como muitas línguas eram faladas e a língua deles era parcialmente telepática e difícil de aprender, os professores de Mu criaram uma nova língua, bem mais fácil. Esse idioma era estruturado para conter o conhecimento Huna de forma a garantir sua sobrevivência enquanto a língua permanecesse em uso. Hoje, conhecemos essa língua como polinésia, e traços dela são encontrados no mundo todo.
  • 12. Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna 11 Vinham homens ao continente de Mu para aprender, e Mu também enviava missões de professores a outras partes do mundo para montar escolas de vários tipos. Um bom número de casamentos interraciais ocorreu entre o povo de Mu e seus vizinhos, resultando em crianças possuidoras de habilidades genéticas e memórias de seus pais nascidos nas estrelas. Gradualmente, aqueles que estudavam com o povo de Mu foram sendo organizados em três ordens diferentes, cada uma praticando o conhecimento Huna com ênfase um pouco diferente. Usando termos em inglês, as ordens poderiam ser chamadas de Intuitionists (Intuitivos), lntellectuals (Intelectuais) e Emotionals (Emocionais). De modo geral, os Intuitivos se desenvolveram no que chamaríamos de místicos, metafísicos e psicólogos ou psicoterapeutas. Os Intelectuais se tornaram o equivalente dos cientistas, técnicos e engenheiros. Os Emocionais eram mais interessados em atividades políticas, econômicas e atléticas. Os três tipos utilizavam em seu trabalho habilidades psíquicas treinadas, e cada grupo ensinava e praticava várias formas de cura física. A parte básica da filosofia Huna é que todo ser humano tem habilidades psíquicas. As ordens treinavam as pessoas em seu uso consciente e disciplinado. No entanto, havia pessoas na Terra antes da chegada do povo de Mu que sabiam usar esse poder à vontade; e ainda hoje existem indivíduos sem a menor ligação com as ordens que podem usar esses poderes psíquicos da mesma maneira. Por muitos séculos, as coisas estavam indo bem na Terra e uma civilização mundial estava sendo formada, quando o povo de Mu cometeu um erro fatal. Eles vinham mantendo contatos regula- res com seus irmãos que se haviam instalado no outro planeta deste sistema solar, mas, com o passar do tempo, viraram as costas para eles, concentrando-se somente na Terra. Chegou um momento em que o planeta irmão começou a enviar desesperados pedidos de ajuda. O povo de lá estava à beira da autodestruição, e havia a necessidade de uma rápida intervenção. Infelizmente, o povo de Mu, na Terra, ficara complacente e não queria que nada perturbasse sua paz; por isso, não deram ouvidos aos apelos e tentaram fingir que não lhes diziam respeito. Tal ato era contrário à sua própria filosofia. Sem que nada pudesse impedi-las, as pessoas do outro planeta criavam cada vez mais terríveis armas de destruição para usar contra os outros até o momento horrível e derradeiro. Chegaram a um ponto em que destruíram todo o planeta, num enorme cataclismo que abalou o sistema solar. O completo desaparecimento de um planeta inteiro causou imenso desequilíbrio, mas as forças da natureza tentaram corrigi-lo. Com isso, as órbitas dos planetas remanescentes foram perturbadas e o efeito sobre a Terra, foi devastador. Nosso planeta foi arremessado para uma nova órbita, um pouco mais distante do sol, e a força da mudança acarretou intensa atividade vulcânica e sísmica. Velhas terras afundaram no mar em alguns lugares, e novas terras subiram em outros. O nível de morte e destruição era indescritível. Com o retorno de uma pequena estabilidade, os sobreviventes observavam uma nova Terra. O continente de Mu não existia mais. Apenas algumas ilhas espalhadas ainda permaneciam intactas, num oceano imenso e vazio. Em todo o mundo, as pessoas revertiam a uma sobrevivência primitiva e iniciavam a árdua escalada de volta à civilização. Em muitos lugares, o povo de Mu era responsabilizado pelo que acontecera, e tinha de se esconder para não ser perseguido. Esses grupos esparsos e solitários deram origem às histórias dos mágicos "pequeninos" (little people) encontradas em quase todas as culturas. As ordens que tinham criado continuaram sem eles, exceto por um raro contato com um número muito limitado de adeptos. Outras civilizações se desenvolveram e caíram. Entre elas, os brilhantes atlantes, que quase alcançaram o domínio do mundo, numa imitação menor de Mu, mas que acabaram aniquilando-se numa guerra que os enviou para o fundo do oceano. Enquanto isso, a
  • 13. Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna 12 tradição de Huna era mantida viva por pequenos grupos que inseriam o ensinamento na cultura do lugar onde se instalavam. A maioria deles perdeu o contato entre si, mas todos continuavam a ensinar, curar e treinar. Em alguns casos, foram capazes çlè manter intacta a simplicidade de Huna, mas em outros houve tamanhas distorções que o conhecimento fundamental foi praticamente perdido, e boas práticas eram realizadas com uma falsa compreensão de sua natureza. Após a perturbação causada pela queda de Mu, sobreviventes na Bacia do Pacífico, aos quais hoje chamamos de polinésios, aos quais reuniram-se em dois lugares para reconstruir suas cidades — Samoa e as Ilhas Sociedade. Entre eles, havia membros das três ordens que atuavam como sacerdotes, curandeiros e especialistas técnicos. Só os Intuitivos mantinham contato com seus colegas no resto do mundo. Lentamente, desenvolveram sua tecnologia até o ponto de poderem construir grandes embarcações a vela, capazes de transportar cem pessoas ou mais, e partiram para explorar o que sobrara de Mu. A maioria permaneceu dentro dos toscos limites do velho continente, só ocasionalmente se aventurando nas terras fronteiriças. O grupo que conseguiu ir mais longe, fora das fronteiras continentais, foi o dos maoris, que se assentaram na Nova Zelândia. O nome maori significa "o povo verdadeiro" ou os habitantes originais, referindo-se tanto à origem do velho continente de Mu (como descendentes mistos da raça estelar) quanto ao fato de serem os primeiros a se estabelecer nas novas terras descobertas. Em pouco tempo, eles perderam contato com os outros polinésios e, exceto pela lembrança em velhos cânticos e entoações, os dois grupos foram esquecendo-se entre si, até que os exploradores ocidentais os unissem novamente. Outro grupo, seguindo antigas informações navegacionais contidas em antigos cânticos tradicionais, se fez ao norte a partir do Taiti e das Marquesas para aportar e se assentar nas ilhas havaianas. A primeira ilha onde aportaram foi Kauai, a mais antiga das ilhas principais, e lá eles descobriram alguns dos habitantes Menehune originais, aos quais também chamavam de Mu. Esse povo Mu era muito tímido, mas não belicoso, e às vezes ajudava os recém-chegados. Eles tinham templos de pedra e aquedutos, e eram especialistas em irrigação e construção de lagoas para peixes. Por muitos anos, os dois povos conviveram muito bem, e houve um bom número de casamentos inter-raciais. Foi essa última questão, porém, que levou o rei de Mu a tomar uma decisão dura. Ele percebeu que, se o casamento inter-racial continuasse, o povo de Mu deixaria de existir como grupo separado, por isso resolveu que deveriam ir embora. Diz a tradição que numa noite todo o povo de Mu partiu do extremo norte de Kauai, mas ninguém sabe como ou para onde foi. A princípio, as três ordens de kahunas no Havaí viviam em base de igualdade, e o comércio continuava entre o Havaí, Samoa e Taiti. No século XIII d.C., porém, um kahuna sedento de poder, da ordem dos Emocionais, veio de Samoa para ajudar ostensivamente na reorganização dos Emocionais do Havaí. Em pouco tempo, ele conseguiu o controle religioso e político das ilhas, o que resultou na perda de contato entre o Havaí e o resto da Polinésia; a construção dos grandes veleiros marítimos foi interrompida, as escolas de navegação e astronomia foram abandonadas e as pessoas se tornaram sujeitas a uma religião de superstição e restrição. A ordem dos Intelectuais foi a que mais sofreu, e muito conhecimento foi perdido. Os Intuitivos, na maioria, foram obrigados a se esconder, e um número cada vez maior de Emocionais recorria a práticas distorcidas. Por seiscentos anos, o povo do Havaí sofreu a repressão de um governo autoritário, do terrorismo psíquico e da desordem social. Na época da chegada do capitão Cook, todas as ilhas estavam em guerra. A natureza idílica da vida polinésia era, na verdade, um grande mito perpetuado por estrangeiros que não enxergavam além da superfície. Enquanto tudo isso acontecia, um pequeno grupo de Intuitivos mantinha contato telepático com o resto de sua ordem espalhada pelo mundo, e se satisfazia em trabalhar nos bastidores do cenário mundial para a paz da humanidade. Agora os tempos mudaram,
  • 14. Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna 13 e, por causa da rapidez de comunicação, da expansão da consciência em boa parte do mundo, e do crescente entendimento das realidades alternativas, começa-se a sentir que o conhecimento de Huna precisa ser difundido ao máximo e à maior distância possível."
  • 15. Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna 14 CAPÍTULO 1 Os Kahunas Desde os tempos das primeiras explorações europeias no Oceano Pacífico, o mundo ocidental acalenta uma imagem romântica dos Mares do Sul, baseada no conceito de uma sociedade primitiva simples, livre de preocupações. Tem sido o sonho de muitos homens abandonar o fardo do trabalho e da família e fugir para uma ilha tropical onde só o que você tem a fazer é deitar-se numa rede, bebendo ponche de frutas, enquanto os nativos de aparência infantil cuidam de todas as suas necessidades. Outra atitude ocidental, menos romântica, é que antes das bênçãos da civilização, os habitantes das ilhas eram selvagens ignorantes, dominados por medos supersticiosos e por uma sensualidade indisciplinada. Paralela a essa atitude é a ideia de que essas pessoas não tinham um pensamento filosófico nem conceitos abstratos, não conheciam a arte, exceto para decoração, não possuíam livros e certamente não dispunham de nenhum tipo de ciência ou tecnologia que valesse a pena mencionar. A verdade, porém, estabelecida por pesquisa científica em muitas áreas, é que as sociedades da Polinésia eram tão complexas quanto a nossa: seus códigos morais, éticos e legais eram igualmente estritos; sua arte e literatura tão ricas quanto as nossas; e sua ciên- cia, igualmente especializada. Entretanto, a orientação na qual tinham desenvolvido esses aspectos era muito diferente. Como indicam os modernos psicólogos sociais, se tentarmos julgar as realizações de outras culturas usando a nossa como padrão, arriscaremos distorcer esse julgamento e limitar severamente qualquer benefício que poderíamos receber do contato com a cultura em questão. E a cultura da Polinésia tem aspectos que nos podem beneficiar em todas as esferas da vida. O Povo da Polinésia Polinésia é um termo aplicado igualmente a uma área geográfica e a um povo que partilha da mesma origem histórica, linguística, cultural e física. A área geralmente é definida como um triângulo que se estende da Nova Zelândia no sudoeste do Pacífico ao Havaí, no norte, descendo até a Ilha de Páscoa, sudeste, e de volta à Nova Zelândia. E uma área imensa, maior que o continente sul-americano, e salpicada de ilhas vulcânicas e de corais, geralmente separadas a uma distância de 3,2 quilômetros entre si. O mais notável é que toda essa área fora explorada e colonizada, e havia comércio regular entre as ilhas por centenas, talvez milhares, de anos antes de Colombo atravessar o Atlântico. O povo dessa área, os polinésios, inclui os maoris, samoanos, tonganeses, taitianos, marquesanos, havaianos, pascoenses e outros, cujos nomes nos tempos modernos se baseiam em suas regiões. Embora esses grupos sejam separados por vastas distâncias, e em alguns casos não mantenham contato entre si há séculos, há menos diferenças entre eles do que entre vizinhos próximos como os franceses e alemães. Um Maori de nariz fino
  • 16. Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna 15 e um havaiano de nariz grosso podem não parecer irmãos, e seus estilos de vida moldados ao ambiente podem variar muito, mas eles compartilham da mesma língua básica, dos heróis culturais, das lendas e do conhecimento interior. E aceitam uns aos outros como descendentes da mesma raça original, como descobriu Peter Buck, um explorador mestiço maori, viajando para outras ilhas que não tinham sequer na memória o registro de contato com um "polinésio" de fora. Uma questão ainda não resolvida pelos antropólogos é qual seria a terra natal dos polinésios, além da questão da rota por eles tomada para chegar ao seu atual lar. A teoria moderna mais aceita é que eles vieram da Indonésia, ou possivelmente da índia, e passaram pelos grupos de ilhas da Melanésia e Micronésia, no oeste do Pacífico, no caminho. Essa teoria se baseia em parte em algumas semelhanças linguísticas menores, na suposta origem de muitas plantas usadas pelos polinésios, em algumas similaridades tecnológicas e na noção de que, como tinham de vir de algum lugar, a origem mais provável seria a Ásia. Max Freedom Long e outros propuseram que a terra natal dos polinésios ficaria no Oriente Próximo. Long baseou sua idéia numa história sem comprovações contada por um inglês que vivera com uma tribo berbere no Saara. Essa tribo afirmava ter pertencido a um grupo que tinha construído as pirâmides do Egito; eles se haviam separado do resto do grupo que buscava uma nova terra no Pacífico. Eu passei, porém, quatro anos e meio, inciò é vindo, com os berberes, e não fui capaz de verificar tal tradição. Mais importante ainda, Long usou, de maneira impressionante, estudos linguísticos para mostrar que o conhecimento kahuna foi incorporado em partes do Antigo e do Novo Testamento da Bíblia. Ele foi mais longe ainda e traçou uma rota dos grupos com destino ao Pacífico, descendo até o Mar Vermelho, ao longo da costa da África até Madagascar (cuja língua tem afinidades com o polinésio), atravessando o oceano e até a índia e de lá através da Indonésia até o Pacífico, usando semelhanças filosóficas como seu principal argumento. Entretanto, outra terra nativa para os polinésios foi proposta por Thor Heyerdahl, de renome Kon Tiki, que tentou provar de uma maneira prática que os polinésios poderiam ter vindo da América do Sul. Como observamos no prólogo, meu mentor kahuna, WK, tem uma versão bastante diferente, apoiada por pesquisadores como James Churchward, autor de vários livros sobre o continente de Mu, e Leinani Melville, autor de Children ofthe Rainbow (Filhos do Arco- íris). Segundo essa versão, a Polinésia seria a fonte de semelhanças culturais em outro lugar e não o recipiente final. Obvio que pode haver dúvida tanto com relação a essa teoria quanto a qualquer outra, mas esta tem a virtude de ser uma versão polinésia e responder a muitas perguntas. Ela explica, por exemplo, por que os navegadores polinésios, extremamente habilidosos, nunca colonizaram nenhuma área fora do triângulo mencionado aqui, e de que forma os subgrupos como os maoris na Nova Zelândia podiam ter antigos cânticos de navegação com instruções para viagens de barco até o Havaí. Também explica por que os grupos como os maoris, havaianos e pascoenses falam em suas lendas sobre pessoas que já viviam nas ilhas quando eles lá chegaram. Na língua havaiana, essas pessoas eram até chamadas de Mu, e há muitas histórias sobre conflitos e cooperação com eles. Na ilha de Kauai, no arquipélago havaiano, vi pisos em templos e trabalhos de alvenaria que se assemelham muito mais aos estilos de construção pré-incas do que a qualquer outra coisa construída pelos primeiros colonizadores polinésios. Eles teriam sido construídos pelo povo de Mu, também conhecido como os Menehune. O Sistema Kapu A questão da origem talvez nunca seja satisfatoriamente resolvida para todos, mas é um fato que os polinésios já estavam lá quando os europeus chegaram na Polinésia. Entre outras coisas, os primeiros exploradores ocidentais encontraram um poderoso grupo de indivíduos conhecidos como kahunas, que eram os líderes religiosos, mestres artistas e
  • 17. Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna 16 artesãos, médicos, advogados, professores e conselheiros políticos da sociedade. Eles e as famílias dos chefes governavam o povo através de um sistema que seria chamado de kapu, embora a maioria dos ocidentais esteja mais acostumada com a forma tongonesa da palavra, tabu ou taboo. O sistema kapu tem sido muito difamado, porque nunca foi bem compreendido. À palavra kapu foi associado o significado de "proibido" e ela passou a ser interpretada como um misterioso alerta a respeito de coisas que escapam ao domínio da razão. Uma com- preensão mais completa da palavra, porém, incluiria também os sentidos de "sagrado, santo ou consagrado". O sistema kapu era na verdade um código de leis, necessário para que qualquer sociedade funcione de maneira ordenada. Um certo bosque ou um local de pesca especial podia ser declarado kapu durante uma ou mais temporadas, para não ser superexplorado, por exemplo. Não seria diferente de nossas atuais temporadas regulamentadas de caça e pesca, mas essa visão ambiental era totalmente desconhecida pelos primeiros visitantes europeus à Polinésia, os quais não entendiam por que uma árvore ou local era kapu e outro não era. Certas partes de um templo ou pedaços de terra também podiam ser declarados kapu porque~eram reservados para uso sacerdotal ou dos chefes. O caminho até esses lugares era marcado por um par de varetas cruzadas, encimadas por uma bola de pano branco, e os nativos se recusavam a transpor esses indicadores porque a quebra de um kapu era severamente punida. Entretanto, o mesmo europeu que hesitaria muito antes de violar um sinal da Coroa em seu país, como "Não se aproximar" ou "Proibida a entrada", achava que o nativo da ilha agia apenas por superstição. Os kapus mais difíceis de entender para o estrangeiro eram, lógico, aqueles relacionados aos costumes. Em algumas partes da Polinésia, havia um kapu punível com morte que proibia que a sombra de uma pessoa comum se projetasse sobre um chefe. A princípio, tal coisa parece a mais absurda superstição, mas o estrangeiro provavelmente não saberia que a palavra para sombra também significava "riso", e que o evento acima mencionado podiãser interpretado como desrespeito ou lese majeste. Outro kapu proibia que as mulheres comessem bananas, porque a palavra para banana é parecida com o termo para genitais, e o ato seria tão ofensivo quanto o uso de palavrões de conotação sexual em público nos Estados Unidos. O kapu, portanto, formava a base para o sistema legal polinésio. Em sua melhor aplicação, ele reforçava a coesão e a produtividade da sociedade, mas o sistema podia ser — e freqüentemente era — usado por chefes e sacerdotes gananciosos para exploração política e econômica. Não raro, as rebeliões sociais e/ou emigrações eram inspiradas por kapus exageradamente restritivos impostos ao povo pelos líderes. A severidade dos kapus empregada por Kamehameha, o Grande, a exploração desmedida desses kapus por parte de certos sacerdotes kahuna e a má interpretação psíquica de um líder kahuna oportunista foram alguns dos principais motivos pelos quais todo o sistema kapu no Havaí foi tão facilmente derrubado na época do filho de Kamehameha. Os Kahunas do Havaí Como tenho mais experiência com os kahunas havaianos do que com os tahunas taitianos ou os tohungas dos maoris, a seção seguinte tratará do sistema havaiano, com base no registro histórico e nas discussões com WK. Quando ancorou na costa a sotavento de Kauai em 19 de janeiro de 1778,o capitão James Cook rompeu um isolamento de seiscentos anos das ilhas havaianas do resto do mundo. Ao contrário da crença popular, porém, o capitão Cook e os que vieram depois não invadiram uma simples ilha paradisíaca. A beleza dessas ilhas vulcânicas era, de fato, espantosa, e quando os habitantes eram amistosos, o eram de verdade. Mas os havaianos não eram inocentes incorruptos nem selvagens ignorantes. A sociedade deles era estru-
  • 18. Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna 17 turada como um pleno sistema feudal, e Cook chegou em meio a um violento tumulto social e político. Após o breve choque inicial do contato, os europeus e sua superior tecnologia foram rapidamente explorados, com propósitos políticos, pelos pragmáticos líderes havaianos, incluindo os kahunas. Nos livros de história, muito se fala do capitão Cook, e de como pensaram ser ele o deus Lono, retornando às ilhas. De acordo com o historiador havaiano Kamakau, o povo de Kauai ficou surpreso e assustado diante da visão inédita dos navios britânicos desembarcando na costa. As pessoas não tinham idéia de quem estava nos navios. Foi um kahuna, Kuohu, que chegou à conclusão de que os barcos deviam ser o templo e os altares de Lono porque os mastros e as velas pareciam a haste e as flâmulas usadas numa cerimônia anual dedicada àquele deus. Cook e seus homens desceram na praia para uma curta visita e depois partiram para a América. A notícia se espalhou rapidamente pelas ilhas, e quando Cook retornou e parou na baía de Kealakekua, na Ilha Grande do Havaí, o palco estava montado para uma manobra política incrivelmente astuta, que teria dado certo se Cook não tivesse ficado lá muito tempo. A segunda chegada de Cook ocorreu numa área consagrada a Lono, e foi perto do fim do festival anual dedicado a ele. Não há registros do que vou sugerir e WK diz que não conhece nenhuma tradição que confirme ou negue, mas a coincidência do momento e local onde Cook aportou, na segunda vez, é tão grande que, desconfio, houve a mão dos kahunas por trás. Como veremos mais adiante, eles sem dúvida tinham a capacidade de saber, por clarividência, onde Cook estava e de enviar a ele mensagens telepáticas para guiá-lo até a baía onde milhares de pessoas se reuniam para o festival de Lono. Em seu diário, Cook escreveu que nunca tinha visto tanta gente reunida, em nenhuma das ilhas. Uma vez que o rei da ilha do Havaí estava no processo de consolidar seu poder sobre o povo, como parte de sua campanha de guerra contra Maui, fora provavelmente por sugestão de seus conselheiros kahunas que Cook foi aclamado como o próprio deus Lono, vindo para emprestar seu mana (poder divino) ao lado que obviamente estava certo. Os chefes e os kahunas não eram tolos. Podiam reconhecer uma tecnologia superior, por mais estranha que fosse; conheciam um homem quando o viam; e também sabiam como aproveitar uma oportunidade. Infelizmente, quanto mais tempo Cook se demorava na ilha, mais difícil ficava manter a farsa de que ele era um deus. Quando finalmente partiu, depois de algumas semanas, não disfarçaram o alívio. Infelizmente, porém, Cook teve de voltar uma semana depois para consertar um mastro quebrado. O festival já tinha acabado, o povo estava disperso, e a recepção a Cook foi fria. As relações entre os havaianos e europeus se deterioraram rapidamente nas duas semanas seguintes, até que Cook resolveu fazer de refém a altamente sagrada pessoa do rei por causa de um pequeno roubo por parte de um de seus súditos. Uma batalha eclodiu na praia e Cook foi morto. A questão aqui é que a designação de Cook como o deus Lono foi apenas uma farsa politicamente inspirada para favorecer o regime do. rei Kalaniopuu. Os chefes e kahunas sabiam o que estavam fazendo, mas àquela altura da história havaiana a "religião estatal" era apenas uma ferramenta política usada para aumentar o poder dos chefes e certos sacerdotes, e explorar as massas. A medida que mais europeus começavam a visitar as ilhas, ouviam histórias sobre os estranhos poderes exercidos por determinados indivíduos conhecidos como kahunas. Histórias de telepatia, clarividência, cura pelo toque, provocar morte a distância e caminhar sobre lava incandescente se misturavam a observações de cerimônias exóticas e cânticos, à prática de massagem e medicina de ervas, e à aparente veneração de ídolos grotescos. Era fácil rotular essas histórias como pura superstição, até alguém ficar diretamente envolvido, numa experiência pessoal. Então, tornava-se óbvio para o indi- víduo inteligente que algo de fato acontecia por trás da fachada religiosa. Não havia dúvida de que pelo menos alguns kahunas eram capazes de coisas que pareciam desafiar as leis físicas. Quanto mais tempo se vivia nas ilhas, mais se aprendia a aceitar esse fato. Entretanto, por causa de quatro fatores principais, não era fácil descobrir o que realmente estava acontecendo. O primeiro era a relutância natural do cidadão ocidental, treinado em ciência, em aceitar tais habilidades como algo possível. Se fizesse isso, ele
  • 19. Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna 18 estaria regressando à Idade das Trevas da magia e superstição que o mundo ocidental se esforçava em deixar para trás. O segundo era a tendência natural dos visitantes de formação cristã para atribuir todas essas coisas à obra do diabo, pois de que outra maneira os pagãos ignorantes poderiam ter esses poderes? O terceiro fator era que, na época da chegada dos primeiros europeus, as principais práticas kahunas eram muito corruptas, e a maior parte do antigo conhecimento fora perdida. Enquanto um pequeno grupo mantinha praticamente intactos os antigos ensinamentos, a maioria dos kahunas — especialmente aqueles envolvidos em política — tinha se degenerado a um mero sacerdócio cerimonial, com pouquíssimos membros que ainda sabiam os rudimentos de coisas como telepatia e clarividência. Isso se torna evidente na história de Hewahewa, sumo sacerdote de Kamahmeha II. Em 1819, pouco depois da morte de Kamehameha I, esse proeminente kahuna, responsável pela imagem do deus da guerra do rei, teve uma visão na qual distinguira representantes do que parecia ser um deus muito mais poderoso aportando nas praias do Havaí. Sem dúvida influenciado por sua familiaridade com a superior tecnologia européia e as histórias cristãs, Hewahewa acabou conquistando o apoio de colegas kahunas, chefes ambiciosos e esposas de reis insatisfeitas para obter a abolição do sistema kapu e depor os velhos deuses. Com isso, ele esperava conseguir as graças dos representantes do novo deus e ao mesmo tempo subjugar o poder de qualquer kahuna rival. Kamehameha II, diferentemente de seu pai, era homem de vontade fraca e, em novembro de 1819, cedeu às pressões de Hewahewa e seus seguidores. Com o ato aparentemente simples de se sentar para fazer uma refeição com as mulheres, Kamehameha II quebrou um sério kapu e abriu um precedente para chefes e cidadãos comuns. A notícia se espalhou por todo o arquipélago de ilhas, agora unido, e as pessoas, há muito oprimidas por kapus exageradamente estritos, começaram a dar vazão aos sentimentos, queimando e destruindo templos e estátuas. Um kahuna rival de Hewahewa tentou impedir isso, mas ele e seus seguidores foram massacrados em batalha. Por seis meses, depois disso, o Havaí foi uma terra sem religião e sem leis. Foi uma época de grande confusão, porque sem os kapus e sem os deuses, não havia diretrizes firmes para conduzir um governo nem segurança psicológica. Finalmente, em 1820, os primeiros missionários cristãos de Boston aportaram onde Hewahewa disse que os tinha visto. Ele e seus colegas kahunas tinham trazido muitas pessoas aleijadas e doentes para o novo deus curar. Eles cantaram uma canção de boas vindas e pediram aos missionários que mostrassem o poder do novo deus, curando os necessitados. Obvio que os missionários não podiam fazer isso, e, depois de muita confusão de ambos os lados, Hewahewa foi obrigado a compreender que tinha interpretado erroneamente sua visão e destruído toda a estrutura formal religiosa e legal de sua nação por nada. Ele é conhecido nos livros de história como Hewahewa, mas esse pode não ter sido seu nome verdadeiro. Os havaianos sempre tiveram muito cuidado com a escolha de nomes baseada nos significados. Parece óbvio que o infeliz sumo sacerdote recebeu o nome de Hewahewa depois desse terrível engano, pois significa "o louco que não reconheceu o significado". O quarto fator que interferiu na compreensão inicial do conhecimento kahuna foi a proibição de todas as práticas kahuna por parte dos missionários cristãos convertidos em políticos, tão logo tiveram o poder de fazer isso. De acordo com Max Long, que viveu nas ilhas enquanto essa lei era válida, a lei do Havaí sobre o uso de magia para cura determinava o seguinte: ''Seção 1034. Feitiçaria – penalidade. Qualquer pessoa que tente a cura de outra através da prática de feitiçaria, bruxaria, ana-ana, hoopiopio, hoounauna, ou hoomanamana (termos que descrevem práticas psíquicas), ou outras superstições ou métodos enganadores, deverá, quando acusada, pagar multa de uma quantia não inferior a cem dólares ou ser preso por no máximo seis meses, cumprindo trabalhos forçados." Há outra seção da lei que classifica o kahuna junto com os buncos e o define como alguém que se apresenta como kahuna, aceita dinheiro sob a alegação de ter poderes mágicos, ou
  • 20. Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna 19 admite que é um kahuna. Para tal coisa, a multa sobe para mil dólares ou um ano de aprisionamento.1 Desnecessário dizer que isso era suficiente para levar todos os verdadeiros kahunas a se esconder, o que tornava extremamente difícil para um não-havaiano ter acesso ao conhecimento kahuna. Apesar da lei, porém, tanto os havaianos quanto os não-havaianos livres de preconceitos continuavam a procurar e receber ajuda de kahunas cuja identidade era bem protegida, e os pseudo-kahunas eram freqüentemente exibidos em cerimônias e para fins turísticos. Só recentemente a lei foi mudada, de modo que embora ainda preveja salvaguarda contra fraude, já não é mais crime ser ou afirmar ser um kahuna. A autodestruição de suas tradições religiosas e o poderoso impacto do Cristianismo e da tecnologia ocidental fizeram a maioria dos havaianos rejeitar a influência e os ensinamentos kahunas. O conhecimento kahuna era tradicionalmente passado para um fi- lho natural ou adotado, cautelosamente; mas os fatores citados, além dos casamentos inter-raciais e a dizimação da população através de doenças introduzidas, deixaram um número muito pequeno de indivíduos ainda dispostos ou capazes de continuar com os passos de seus pais. No entanto, em meio a toda dificuldade, continuou existindo um núcleo de kahunas ativos que continuava a praticar cura mental, emocional e física; a ajudar as pessoas a mudar o futuro; e até a praticar a grandemente temida "oração de morte". Nada menos que o curador do Museu Bishop em Honolulu, William Tufts Brigham, dedicou-se durante anos a tentar desvendar o segredo daquelas que ele sabia ser práticas kahunas válidas. Ele teve experiências pessoais de caminhar sobre o fogo, cura e oração de morte telepática, e se convencer, sem a menor dúvida, de que algum conhecimento altamente importante para a humanidade ainda esperava ser dominado. Sua busca nunca teve sucesso, mas, antes de morrer, ele deixou para Max Long um legado do que tinha aprendido, que pode ser assim resumido: "Sou capaz de provar que nenhuma das explicações populares da magia kahuna tem fundamento. Não é sugestão, nem qualquer outra coisa conhecida na psicologia. Eles usam algo que nós ainda temos de descobrir, e é uma coisa de importância inestimável. Sim- plesmente, temos de descobrir. Revolucionará o mundo, se o fizermos. Mudará todo o conceito da ciência. É algo que traria ordem às crenças religiosas conflitantes... Observe sempre três coisas no estudo dessa magia. Deve haver alguma forma de consciência por trás dela, dirigindo seus processos. Controle de calor ao caminhar sobre o fogo, por exemplo. Deve.haver também alguma forma de força usada em exercer esse controle, se ao menos pudermos reconhecê-la. E, finalmente, deve haver alguma forma de substância, visível ou invisível, através da qual a força pode agir. Observe sempre essas coisas e, se puder encontrar pelo menos uma, ela guiará até as outras".2 Long continuou a busca com base nessas orientações e, embora nunca tenha estudado com um kahuna, por um período de muitos anos ele descobriu os três elementos especificados por Brigham, conduziu experimentos para comprovar a existência deles, encontrou correlações com as descobertas de outros, em outros lugares, e descobriu ainda que o sistema kahuna de conhecimento não era limitado à Polinésia, mas espalhava-se por todo o mundo. Foi um feito notável, tornando os principais elementos desse conhecimento acessíveis ao público pela primeira vez. As coisas com que os kahunas lidam regularmente se tornaram hoje o tema de uma investigação científica cada vez mais difundida bem como de um crescente interesse popular. Há laboratórios estudando a comunicação telepática, o fenômeno de estados 1 Max Fredom Long, The Secret Science Behind Miracles (Los Angeles: De Vorss & Co., 1954) 2 Ib.
  • 21. Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna 20 alterados de consciência, e a influência psicocinética sobre a matéria, enquanto um número cada-vez maior de corajosos médicos e psicoterapeutas vem experimentando métodos de cura não usuais, tais como imagem guiada, terapia de pressão e a transferência de energia de uma pessoa para outra. Além da resistência conservadora a tudo isso, as investigações são atrapalhadas pela falta de uma teoria coerente e unificada que explique como essas práticas funcionam. O sistema kahuna oferece tanto a prática funcional quanto uma boa teoria de fácil aplicação. As Ordens Kahunas Kahuna é uma palavra que foi distorcida nos tempos modernos. Originalmente usada para definir um adepto treinado, um guardião e transmissor especializado em conhecimento e poder, ela passou a ser aplicada mais recentemente aos sacerdotes e ministros de religiões ocidentais, paranormais, curandeiros e até líderes de clubes de surfe. Embora isso seja compreensível, pois tais pessoas devem ser especialistas naquilo que sabem, WK afirma que um verdadeiro kahuna é aquele que foi iniciado por um pai natural ou adotivo e treinado era conhecimento esotérico organizado, como parte de um grupo identificável. O uso do termo com o significado de "sacerdotes, ministro ou líder" é uma extensão moderna baseada num erro de interpretação. O mesmo acontece com seu uso para designar para- normais naturais e curandeiros, que podem ou não ter recebido conhecimento dos pais. Os havaianos tinham muitos nomes para indivíduos que usam habilidades psíquicas. Eis alguns: kaula — profeta ou mágico po'ko'i — feiticeiro ho'ola — curandeiro mo'okiko —feiticeiro mau ho'okalakupua — mágico ou adepto kilo'uhane — espiritualista ho 'ike papulua — paranormal Os termos eram aplicados a pessoas que exerciam tais pode- res sem ser kahunas. Os kahunas podiam fazer as mesmas coisas, mas como especialistas treinados pertencentes a uma ordem tradicional. Nesse caso, o indivíduo seria chamado de kahuna kaula, kahuna ho'ola, etc. Além disso, vários tipos de kahunas eram treinados para ser especialistas em coisas que não consideraríamos esotéricas hoje, tais como navegação, medicina, engenharia e meteorologia. Os kahunas eram os cientistas e especialistas técnicos de sua época, mas seu conhecimento se estendia a campos que mal começam a ser explorados no mundo ocidental em ampla escala. Por exemplo, um navegador seria não apenas tecnicamente habilitado, mas também treinado para se comunicar com o vento e as ondas. Originalmente, não havia uma hierarquia estruturada entre os kahunas, o que ainda se observa em duas das ordens descritas a seguir. Na verdade, as ordens eram e são mais parecidas com as guildas medievais do que com ordens religiosas na tradição ocidental. Um kahuna alcança a proeminência, não por promoção, herança ou eleição, mas sim através do respeito por suas habilidades e conhecimento. A mais alta "posição" a que um kahuna pode aspirar é puhi okaoka, que se refere a um indivíduo bem versado em todos os ramos de conhecimento. Como não possuem autoridade estruturada uns sobre os outros, os kahunas são procurados e seguidos por causa do que são capazes de fazer e do que sabem. Em determinado momento da história, os kahunas se dividiram em três ordens amplamente definidas, como explicado por WK no prólogo. Cada uma delas enfatizava uma abordagem específica de conhecimento e prática, mas a diferença tem menos a ver com função do que com técnica. As três utilizavam os elementos de magia descobertos por
  • 22. Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna 21 Max Long, e suas áreas de perícia se sobrepunham consideravelmente. Com isso em mente, examinemos agora cada uma dessas ordens. A Ordem de Ku Essa ordem era chamada de "os Emocionais" por WK e enfatiza uma abordagem sensual/emocional da vida. Em termos de cura, os kahunas dessa ordem são mais propensos a usar exercício, massagem e imposição das mãos como métodos de tratamento. Assim como a psicoterapia, essas técnicas trabalham a liberação de emoções reprimidas e a descoberta de eventos passados que desencadearam os problemas atuais. Quanto ao ambiente, a abordagem consiste particularmente em tentar o controle direto de eventos e circunstâncias com a força de vontade e influenciar as emoções das outras pessoas. Esportes, política, comércio e guerra, bem como religião organizada e cerimonial, são os interesses naturais dos kahunas desta ordem. Foi ela que dominou o Havaí após a chegada do poderoso kahuna Paao Samoa, por volta de 1275 d.C. Ele instituiu uma hierarquia estrita na ordem de Ku e introduziu o sacrifício humano, uma prática que decididamente não faz parte da tradição kahuna. Depois da chegada de Paao e do chefe por ele instalado, todo o tráfico entre o Havaí e o mundo exterior cessou, até a vinda do capitão Cook. A Ordem de Lono A abordagem desta ordem, os "Intelectuais" de WK, é intelectual/mecânica. No Havaí, ela gerou os médicos e cirurgiões, os agricultores, navegadores, astrônomos e astrólogos, os meteorologistas e os projetistas de navios, que orientavam a construção das grandes canoas oceânicas. Na cura e na psicoterapia, esses kahunas enfatizam o uso de ervas e drogas, dieta e fontes naturais de energia curativa, tais como a luz do sol, sal marinho, cristais e locais especiais descobertos da geomancia (uma forma de adivinhação usando supostas correntes de energia na terra). Eles vêem o ambiente como algo a ser manipulado por meio da compreensão da mecânica de sua operação. No Havaí, essa ordem sofreu muito sob o domínio da Ordem de Ku, e quando os europeus chegaram, boa parte de suas artes já estava perdida. A Ordem de Kane Esses "Intuitivos" possuem uma abordagem espiritual/ integrativa. As técnicas usadas pelas outras duas ordens são consideradas ferramentas de uso temporário até se alcançar a compreensão básica de que o mundo exterior é apenas uma reflexão do pensamento. A ênfase é a unificação ou integração de espírito, mente e corpo com o propósito do autocontrole, sendo ele a chave para o domínio da vida. Na cura, a importância básica é dada aos efeitos do pensamento sobre o corpo, e as crenças atuais são consideradas mais influentes do que as experiências passadas. O ambiente é visto como uma extensão do corpo, igualmente influenciado por pensamentos e crenças. A imaginação é a ferramenta mais importante dessa ordem, e boa parte do treinamento diz respeito ao uso disciplinado dela. Esses kahunas trabalham com estados alterados de consciência e o uso refinado das habilidades psíquicas, mais do que as outras ordens. Eles poderiam ser considerados filósofos pragmáticos e, em termos de números, sempre foram menores que os kahunas de Ku e Lono. Na época do domínio de Ku no Havaí, sofreram pouco, pois trabalhavam, por assim dizer, "debaixo da terra". De acordo com WK, eles mantinham contato com o resto do mundo por telepatia. Esta é a ordem na qual meu pai foi iniciado e onde eu recebi meu treinamento.
  • 23. Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna 22 Os Renegados O fenômeno mais temido no Havaí era a "oração de morte", uma forma de telepatia emocional destrutiva, freqüentemente combinada com sugestão negativa. Quase todos os kahunas que a praticavam eram renegados da ordem de Ku, embora houvesse também feiticeiros não-kahuna que a usavam também. O epíteto mais comum aplicado a eles era kahuna'ai pilau (kahunas que comem imundície). Fosse para ganhar poder sobre outros ou apenas por ganho financeiro, eles usavam seu conhecimento de psiquismo, psicologia e energia emocional para ferir ou matar. Como bem sabia William Brigham, usava-se muito mais do que simples sugestão. A oração de morte podia funcionar mesmo que não houvesse o conhecimento consciente do que estava acontecendo; mas essa prática exigia considerável habilidade por parte do praticante, e sempre que possível a sugestão era usada para facilitá-la. Felizmente, cada ordem tinha um número de kahunas especializados em oki ou kala, formas de magia contrária que anulavam a oração de morte, tornando-a inofensiva. . Os Kahunas hoje WK supõe não haver no Havaí atualmente mais que vinte e cinco kahunas genuínos, dos quais apenas meia dúzia seria da ordem de Kane. O resto está dividido quase de maneira regular entre Ku e Lono. No entanto, muitos daqueles que se dizem kahunas são apenas paranormais e curandeiros individuais, ou pessoas que dão um show aos turistas. Com poucas exceções, os genuínos kahunas, ou se retiraram totalmente da sociedade ou a ela se integraram, de modo que ninguém sabe quem são ou o que podem fazer. O conhecimento está vivo e operante, mas não é ostensivo. E, ao contrário do que muitos turistas parecem pensar, a ancestralidade havaiana não confere conhecimento kahuna. Mesmo Leinani Melville escreve que praticamente nenhum havaiano ou mestiço havaiano tem a menor compreensão do que é Huna, o conhecimento kahuna. Fora do Havaí, os kahunas também são raros ou se escondem muito bem. Conheci um kahuna maori que me disse que o conhecimento interior praticamente não existe mais entre o seu povo, e meu professor kahuna na África teve só três aprendizes durante os quase sete anos que o conheci. Minhas tentativas de contatar os kahunas que meu pai conheceu na Inglaterra não foram bem-sucedidas. Alguns havaianos se irritam por eu chamar a mim mesmo de kahuna, pois não tenho uma gota de sangue havaiano, embora haja precedentes suficientes nas lendas e histórias do Havaí para pessoas não-polinésias se tomar em kahunas. Lógico que qualquer um pode alegar ser kahuna, mas muito tempo atrás alguém que WK e eu consideramos um grande kahuna nos mandou aplicar este teste: "Pelos seus frutos os conhecereis".
  • 24. Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna 23 CAPÍTULO 2 A Tradição Interior A filosofia kahuna pode ser resumida em quatro afirmações, cada uma representada por uma única palavra-chave havaiana: 1. "Você cria a sua realidade (Ike)." Isso significa a sua experiência pessoal da realidade, cada parte dela. Você a cria através de suas crenças, expectativas, atitudes, desejos, medos, julgamentos, interpretações, sentimentos, intenções e pensamentos constantes e persistentes. 2. "Você recebe aquilo em que você se concentra (Makia)." Os pensamentos e sentimentos que você nutre, ciente ou não deles, formam o molde para trazer à sua vida a experiência mais equivalente possível àqueles pensamentos e sentimentos. 3. "Você é ilimitado (Kala)." Não há limites para o seu eu, não há limites entre você e seu corpo, você e o mundo, ou você e Deus. Quaisquer divisões usadas para discussão são termos de função e/ ou conveniência, pois o isolamento é apenas uma útil ilusão. "O seu momento de poder é agora (Manawa)." Você não está preso a nenhuma experiência do passado nem a qualquer percepção do futuro, pois o passado é apenas uma memória e o futuro uma mera possibilidade. Você tem o poder no momento presente de mudar as crenças limitantes e, conscientemente, plantar as sementes para um futuro de sua escolha. Se você muda o pensamento, muda a experiência. Essas ideias não são exclusivas dos kahunas. Na verdade, tomei as frases emprestadas de Seth/Jane Roberts para traduzir os conceitos Huna porque elas se encaixam muito bem; mas as ideias transmitidas pelas palavras podem ser encontradas em muitas fontes, nos escritos de várias épocas. Entretanto, elas nunca foram muito populares porque declaram que, sem exceção, todo indivíduo é responsável por sua experiência pessoal, e isso pode ser visto como uma coisa subversiva pelos governantes e intolerável pelos governados. Curiosamente, o mal-estar produzido pela implicação de res- ponsabilidade costuma cegar as pessoas para a tremenda liberdade inerente que essa filosofia também contém. Nas seções a seguir, abordarei outros aspectos da filosofia kahuna que estão ligados aos anteriormente mencionados. Para esse material, bem como o dos capítulos seguintes, conto com meu treinamento como kahuna da Ordem de Kane, com a área pessoal e a pesquisa literária, além das discussões com WK. A "Bíblia" Kahuna Boa parte da filosofia kahuna está incorporada na assim chamada "Canção da Criação", também conhecida como Kumulipo, que é o termo mais próximo de uma "bíblia" kahuna que conhecemos hoje. Originalmente parte de uma tradição oral passada aos kahunas treinados em memória perfeita, ela provavelmente foi compilada mais ou menos
  • 25. Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna 24 na forma atual em 1700, pelo kahuna Keaulumoku. Todas as traduções já feitas (não muitas) são de um manuscrito que fora propriedade do rei Kalakaua, o qual tinha grande interesse em preservar as tradições havaianas, incluindo os segredos de Huna e a função dos kahunas como curandeiros. Na filosofia kahuna, tanto o mundo espiritual quanto o material ganham forma graças a uma interação entre forças relativas, freqüentemente representadas por um homem e uma mulher. Para cada "deus" no panteão havaiano, com poucas exceções, há um equiva- lente feminino para ajudar com a criação. Muitos são mencionados nas sete primeiras seções do Kumulipo, junto a versos que parecem contar a formação da vida animal e vegetal na Terra. As entoações ou seções oitava e nona aparentemente falam do nascimento do homem para a percepção consciente e de sua multiplicação sobre a Terra. O resto do total de 16 seções na versão Kalakaua parece ser basicamente genealogias, exceto pelo relato do herói cultural, Maui. Um problema que os estudiosos têm com o Kumulipo, porém, é que eles não conseguem chegar a um acordo quanto à forma de traduzir. Numa tradição oral com uma língua como a havaiana, muita coisa depende de sutilezas de pronúncia e contexto que não podem ser adequadamente transmitidas por palavras escritas. Para dificultar ainda mais as coisas, os kahunas tinham o hábito de incorporar várias nuanças de significado em suas entoações, algo que os chefes faziam mesmo em suas canções de amor. Durante uma visita feita a amigos kahunas no Havaí, disseram-me que o Kumulipo tinha sete nuanças de significado, e eu tive acesso a uma chave para uma dessas nuanças, com a qual estou trabalhando no momento. Quando perguntei por que eles mesmos não a traduziam, disseram que não tinham tanta experiência com tradução quanto eu, não gostavam muito desse tipo de trabalho e tinham coisas melhores para fazer. Para dar um exemplo do que está envolvido, esta é a primeira linha do Kumulipo: O ke au i kahuli wela ka honua E estas são as várias maneiras como ela foi traduzida: A roda do tempo se volta para os vestígios queimados do mundo. Adolf Bastion Na época que mudou o calor do mundo. Rainha Liluokalani A época em que a terra mudou em calor. Kakahi Na época em que a terra se tornou quente. Martha Beckwith Na época em que esta terra evoluiu como uma bola de fogo. Leinani Melville Sem negar que qualquer uma das traduções acima pode estar correta, eu fiz três outras. A última é parte da tradução em que venho trabalhando atualmente: Houve uma época em que a terra sofreu uma mudança violenta. A semente ativa transformou a terra com paixão. O pensamento muda as coisas terrestres.
  • 26. Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna 25 O Conceito de Deus A religião popular do Havaí era repleta de deuses e deusas, fantasmas, fadas, elfos, duendes e espíritos que mudavam de forma a seu bel-prazer e podiam ser amistosos ou hostis com o homem, dependendo da maneira como fossem tratados. Entretanto, essa vi- são popular era apenas uma distorção do conhecimento kahuna. Quando os primeiros missionários no Havaí tentavam entender a língua dos insulanos, depararam com conceitos tão estranhos ao pensamento deles que certas palavras recebem definições completamente injustificadas. Uma dessas palavras era akua, que foi traduzida como deus. Quando os missionários perguntaram aos havaianos qual nome davam às grandes estátuas que pareciam objetos de veneração, os nativos lhes disseram que o nome delas era akua. Quando perguntaram para quem eles rezavam pedindo conselho, proteção ou a realização de alguma coisa, eles disseram akua. Mas os missionários ficaram confusos quando perceberam que os havaianos usavam o mesmo termo para coisas que não pareciam divinas, incluindo a casta muito desprezada dos escravos. Como escreveu o missionário Lorrin Andrews em seu dicionário de havaiano em 1865, "quando da visita de estrangeiros, a palavra era aplicada a objetos artificiais, à natureza ou propriedade de algo que os havaianos não compreendiam, como um relógio de bolso, uma bússola ou o badalo de um relógio grande, etc." Baseando-se no fato de que akua também era o nome para a noite da lua cheia, Andrews acrescentou: "Parece que a antiga ideia de um akua incorporava algo incompreensível, poderoso e, no entanto, completo".3 Andrews estava na pista certa, mas tanto ele quanto a maioria dos ocidentais descartaram as aparentes anomalias e continuaram pensando que os havaianos e seus kahunas simplesmente veneravam ídolos aos quais chamavam de deuses. A verdade, de importância vital para compreendermos a filosofia e as práticas dos kahunas, é que akua significa "uma ideia em ação plenamente formada". É uma idéia ativa que manifesta efeitos. As raízes da palavra contêm significados que têm a ver com movi- mento ou tendência de uma pessoa para fora de si, para uma transformação e uma ação completada. Os kahunas sabiamente utilizavam algumas dessas estruturas idealizadas para a cura. Os quatro maiores akua eram Kane, Ku, Lono e Kanaloa. Se pudermos conceber que um tipo específico de ideia pode ser uma essência energética inteligente, então essas ideias podem legitimamente ser chamadas de deuses; do contrário, não. Kane Externamente, Kane era considerado o deus superior e mais espiritual, nunca representado por uma imagem esculpida. No máximo, ele seria representado por um objeto natural, geralmente uma pedra ereta, sem ornamentos. Era tido como um deus de paz e amor, e seu equivalente feminino era Wahine. Em diálogos banais, kane significa "homem" e wahine "mulher". Kane e Wahine eram, portanto, símbolos equivalentes ao conceito chinês de yin e yang. Para os kahunas, Kane e sua companheira representavam o eu- deus de natureza dual presente em cada ser humano, semelhante ao "Cristo interior" dos cristãos ou à mente do Buda dos budistas. Ele/ela é, em outras palavras, a essência espiritual e a fonte do indivíduo, a alma, o Eu Superior ou Eu Maior. Outro termo para esse "deus pessoal" é aumakua, que Long primorosamente traduziu como "espírito parental totalmente fiel"; e dois outros termos para o mesmo conceito, kumupa'a e 'ao'ao, têm as conotações de professor e guia. Quando os europeus chegaram ao Havaí, a maioria dos 3 Lorrin Andrews, A Dictionary of the Hawaiian Language (Rultand, Vermont, e Tóquio: Charles E. Tuttle Co., Inc., 1974)
  • 27. Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna 26 havaianos reverenciava esse espírito interior apenas como uma espécie de ancestral guardião, porque as pessoas haviam misturado a fonte física de sua existência com a espiritual. Falarei mais desse akua e dos dois seguintes no capítulo sobre o método de cura mente/corpo dos kahunas. Ku Ku era externamente associado à fertilidade, chuva, feitiçaria e guerra. Como termo comum, seus significados têm a ver com simbologia generativa; uma base ou estrutura para algo; uma coisa que pode ser mudada ou transformada; e algo que pode ter complexos emocionais. Psicologicamente, Ku representa o que pode ser chamado de "corpo/mente"; a consciência organizadora do corpo, o recebedor de informações sobre o mundo físico (visíveis e invisíveis), e o executor da ação. É tentador chamá-lo de "subconsciente", como já fiz, mas, se não compreendida a associação integral com o corpo, o termo pode ser mal entendido. Em quase toda loja para turistas no Havaí, você pôde comprar uma estatueta de gesso de Ku, que é um lindo exemplo da "escrita" kahuna de símbolos. A estatueta desse akua mostra um ser praticamente sem cocar (sua província é a imaginação da memória), com serpentinas descendo até o chão (envolvimento primário com o mundo físico), e os olhos fechados (percepção limitada). Lono Lono era o deus da agricultura, medicina e meteorologia na religião exterior. Na psicologia kahuna, ele representa o intelecto, a porção da mente que percebe, interpreta e dirige. Uma decodificação da raiz do nome revela os significados de receber informação e agir de acordo com a informação recebida; cérebro, principalmente o cérebro anterior, e inteligência; buscar metas; criar desejos; e pensamento imaginativo. A estatueta de Lono é um ser com um cocar alto (imaginação criativa), serpentinas curtas que não chegam ao chão (contato indireto com o físico), e sem olhos (dependente de outra fonte para ter informações sobre o mundo). Kanaloa Nas lendas havaianas mais antigas, Kanaloa é sempre mencionado como o companheiro de Kane, e os dois viajavam pelas ilhas em busca de fontes de água. Kanaloa era conhecido como um deus de cura e dos oceanos, e costumava ser representado por um polvo ou uma lula, bem como por uma figura esculpida específica. O uso do polvo/lula como símbolo tem a ver com a significância sagrada do número 8 e o fato de que a palavra para as duas criaturas, he'e, significa "fluir" (como no fluxo da força vital) e "livrar" (como livrar-se de uma doença). Após a chegada do Cristianismo às ilhas, Kane, Ku e Lono foram comparados à Trindade, enquanto Kanaloa assumiu o papel de satanás. A palavra kanaloa significa "seguro, firme, inconquistável", e é usada como uma referência poética para comida, um símbolo para poder. Na tradição kahuna interior, Kanaloa representa o Homem Ideal — plenamente ciente, plenamente físico e ao mesmo tempo totalmente espiritual, amando e sendo amado e vivendo em contato com sua fonte. A figura esculpida mostra um ser com um cocar alto (o poder do pensamento criativo), serpentinas chegando ao chão (envolvimento direto com o físico), e os olhos bem abertos (percepção completa do mundo físico e do espiritual).
  • 28. Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna 27 Homem Trino Na filosofia e psicologia kahuna, o homem é um ser espiritual com três aspectos representados por Kane, Ku e Lono. No estado ideal, os três funcionam como um, representado por Kanaloa, e nesse estado o homem também é capaz de expressar seu pleno potencial. Por motivos que serão mencionados em capítulos posteriores, pode ocorrer a desunião, causando uma quebra de comunicação entre os três aspectos e uma diminuição da efetividade do homem na vida. Para reconquistar essa efetividade, os kahunas devem primeiro ensinar como reunificar Lono e Ku, o intelecto e o corpo, ou o consciente e subconsciente. Dependendo do sucesso dessa reunificação, a união com o Kane também ocorre. Evidentemente, não falamos aqui de uma reunificação física, pois não existe uma real separação, e sim da reunificação através da percepção aumentada. Simbolicamente, quando as figuras esculpidas de Lono e Ku são combinadas, o resultado é Kanaloa, o companheiro de Deus. A Divindade Quando Kane se refere a Deus, trata-se de uma referência ao eu-deus muito pessoal do indivíduo. Os kahunas também reconhecem uma Divindade ou um Deus supremo, infinito, e o termo que usam para isso é Kumulipo, a mesma palavra usada para a Canção da Criação e que pode ser traduzida como "fonte de vida". Kumulipo é considerado imanente na natureza, e a unicidade inerente de todas as coisas é aceita como uma verdade básica. Como seres concentrados na realidade física, porém, os kahunas sentem que este mundo é o objeto mais prático para estudo e desenvolvimento. A visão que eles têm deste mundo é muito mais ampla do que a visão tradicional na cultura ocidental, e sua percepção do mundo envolve pontos de vista de vários estados de consciência; por isso, eles sentem que há muito campo para trabalho no "aqui-e-agora" sem especulações inúteis sobre a natureza da Divindade. Huna é uma filosofia pragmática, e não existem teólogos entre os kahunas. Kumulipo é tudo o que existe, infinito, inerentemente amando tudo. Não há muito mais o que dizer sobre isso. Espíritos O deus pessoal, ou o eu-deus (Kane ou aumakua), não é limitado à humanidade, na filosofia kahuna. Como Deus está em tudo (ou tudo está em Deus — os kahunas concordam com as duas premissas), tudo tem uma forma própria de percepção. Num sentido profundo, tudo é vivo, ciente e responsivo. E tudo, até mesmo aquilo que os cientistas ocidentais consideram matéria "morta", tem um Eu Superior com o qual se pode comunicar conscientemente. A comunicação inconsciente, ou a telepatia subconsciente, está sempre ocorrendo entre nós e nosso ambiente, porque é a forma primária na qual o mundo interage consigo mesmo. Um exemplo seria a maneira como as plantas reagem à dor ou ao prazer de outros seres vivos nas proximidades. Como humanos, porém, temos o potencial para a comunicação telepática consciente, deliberada, com qualquer coisa, e, portanto, o potencial para influenciar propositalmente o ambiente através de meios não físicos. Daí surge a ideia de que existem identidades-deus (aumakuas ou simplesmente akuas) para grupos de coisas, assim como para os indivíduos, e de que a essência grupai é mais do que a soma de suas partes. Assim, uma árvore tem seu próprio aumakua, e a floresta — da qual ela faz parte — também, o mesmo acontecendo no resto do mundo, — e além dele. Antigamente, um kahuna pedia permissão ao espírito de uma árvore antes de cortá-la, ao espírito de um vale antes de atravessá-lo. Ele fazia isso por respeito pela fonte que vivia em tudo, para garantir cooperação. Hoje, um kahuna pode falar com seu carro ou sua casa da mesma maneira, e usar o mesmo conceito em seu trabalho de cura.
  • 29. Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna 28 Como já expliquei em outros textos, a palavra inglesa spirit (espírito), aborda grande variedade de fenômenos que os kahunas reconhecem como muito diferentes. Para sermos breves, dentro dessa vasta categoria, os kahunas reconhecem formas-pensamento, manifestações de campos de energia, complexos aparecendo como personalidades separadas, efeitos de extrema sensibilidade telepática ou clarividente, o equivalente dos anjos, bem como "ideias em ação". Apesar dos contos e lendas populares, a filosofia kahuna não inclui a ideia de verdadeiros diabos, demônios ou espíritos dos mortos vagando. Estes são vistos como formas-pensamento criadas consciente ou inconscientemente, ou manifestações de complexos negativos. Entretanto, um kahuna pode agir como se essas coisas existissem caso esteja tratando de alguém que acredita nelas. Crenças e Realidade Para os kahunas, a crença é a base para a experiência de qualquer realidade. A ideia é que nossa experiência é condicionada pelo que acreditamos, e só podemos experimentar aquilo que acreditamos ser possível em algum nível de consciência. Quanto mais acreditarmos numa coisa, mais profundamente ela afeta nossa experiência. Obviamente, uma das principais tarefas do curandeiro kahuna é ajudar as pessoas a mudar suas crenças doentias em crenças saudáveis. As crenças acalentadas pelas pessoas podem ser divididas em três tipos, todos mantidos ao mesmo tempo. O primeiro tipo é a pressuposição (paulele), um estado de crença no qual não há dúvida nenhuma e a experiência consiste no que se acredita. O segundo é a atitude (kuana), ou as crenças que abrem margem para dúvidas, mas, por serem tão habituais, continuam a influenciar a experiência. O terceiro tipo é a opinião (mana 'o), uma crença facilmente mudada à luz de um novo conhecimento. Em contraste, o novo conhecimento que contradiz pressuposições e atitudes, sozinho, raramente produz mudança. Entrarei em pormenores sobre essas crenças e seus efeitos na saúde no capítulo sobre mente/corpo. Você cria a sua realidade por meio de suas crenças, dizem os kahunas, e as espécies de realidades criadas também podem ser classificadas em três categorias. Os psicólogos ocidentais estão familiarizados com as assim chamadas realidades subjetivas e objetivas. A essas, os kahunas acrescentam uma terceira, que eu chamo de projetiva. A realidade subjetiva é pono'i, uma palavra referente ao sentido que uma pessoa tem do que é certo, apropriado, bom, moral, correto, bem- sucedido, útil, etc. É a realidade do julgamento, e aquela que tem o maior efeito, na saúde e felicidade. Por exemplo, em minha realidade pessoal, fazer caminhadas carregando minha mochila é uma atividade positiva e benéfica, mas na realidade pessoal de minha mulher é negativa e dolorosa. Não se trata de uma simples diferença de opinião; é uma diferença em experiência subjetiva. Em seguida, vem a experiência objetiva, ou, como prefiro chamá-la, realidade compartilhada. A palavra para isso é oia'i'o, que tem significados de substância e fatos, e se refere ao modo como as coisas parecem ser, independentemente de atitudes e opiniões. É a realidade da aparência e interpretação, da tecnologia e da lida prática com o mundo material. Os "fatos" de seu ambiente imediato lhe permitem comer, respirar, trabalhar, brincar e interagir com os outros, e essa é a realidade do oia'i'o. Essa realidade é mais facilmente mudada por meio de uma nova interpretação dos fatos, como frequentemente fazem os inventores. O terceiro tipo de realidade é maoli, que significa "devido à vibração". Essa é a realidade que começa como subjetiva e se torna objetivada por meio de contínua projeção mental. E uma realidade que você cria ou partilha da criação propositalmente, levando o seu desejo do nível de uma ideia ou imagem ao nível da experiência física. Não é uma coisa estranha que só os adeptos podem fazer após muitos anos depois de prática disciplinada.
  • 30. Serge Kahili King – Magia e Cura Kahuna 29 Você faz isso sempre que planeja e executa um projeto. Praticamente o mesmo processo pode ser usado para efetuar uma cura. Os kahunas não veem a realidade como algo separado ou fora de nós mesmos, mas tratam-na como parte essencial de um estado psicológico. O potencial que temos é enfatizado pelo fato de que maoli também pode ser traduzido como "um estado de alegria". Vida e Morte A palavra havaiana para vida é ola, e a mesma palavra é usada para "um meio de sustento ou renda, curar ou ser curado, bem-estar, bem, salvação, conceder vida", e outros significados semelhantes. As raízes dão um significado básico de emitir ou encher-se de luz, e os kahunas usam a luz como um símbolo de energia e também de perfeição. Uma ideia fundamental por trás disso é que uma vida saudável, produtiva e satisfatória está intimamente ligada a um contínuo aumento de percepção. Duas outras palavras que significam luz, ea e ha, também têm o sentido de "respiração", o que exemplifica que o duplo sentido era, aparentemente, comum em muitas filosofias antigas. Além disso, essas duas palavras carregam significados associados ao movimento da água; e a própria água (wai) também é usada como um símbolo da vida. Portanto, a vida é percebida pelos kahunas como algo que flui e se move em ciclos, como a respiração e a água. De fato, uma frase recorrente em lendas e orações do Havaí, wai ola, pode significar igualmente "a água da vida" e "o fluxo da vida". Do ponto de vista ocidental, parece natural olhar a morte como o oposto da vida, e esperar que a palavra kahuna para ela se refira a uma parada do fluxo. Em vez disso, porém, a filosofia kahuna trata a morte como continuação da vida numa direção ou estado diferente. Isso fica evidente nos significados alternativos para os temas comuns e poéticos para a morte, em havaiano, como vemos a seguir: make loa — "forte desejo por algo " hiamoe loa — "desejo de um longo sono " ua makukoa'a'e'oia — "vida que se mantém fluindo " ala ho'i ole mai — "o caminho sem volta" waiho na iwi — "deixar para trás os ossos" moe kau a ho'oilo — "tempo de sono para germinar (renascimento)" a lele nui ka mauli — "o espírito (ou vida) fluiu " lele ka hoaka — "o espírito (ou corpo astral) fluiu " ha'ule — "começar a fazer algo " Um problema importante para muitos filósofos não é apenas por que a morte ocorre, mas por que naquele momento e daquela forma. Superficialmente, parece uma coisa ilógica, sem padrão ou motivo, mas isso acontece porque a cultura ocidental tende a ver a morte como o fim, algo imposto a nós contra a nossa vontade, e pela qual não temos responsabilidade exceto em caso de suicídio. A visão kahuna é muito diferente. A morte é vista como parte da vida, tão natural quanto a mudança das estações ou a metamorfose de uma lagarta em borboleta. Ela ocorre porque faz parte do contínuo processo de vida. O quando e o como são questões de crença pessoal e cultural. Por exemplo, se você desenvolver a crença de que a velhice é uma coisa horrível, que preferiria morrer a ficar velho, provavelmente morrerá, ainda que tenha de criar subconscientemente uma doença ou um acidente como modo de partir. E, se você tem uma crença profundamente arraigada de que, pode envelhecer com dignidade, de maneira agradável e com boa saúde, provavelmente será um centenário ativo e a sua passagem será tranquila e pacífica quando você sentir que sua vida já se cumpriu. E até o último momento da vida física, uma mudança de crença pode mudar suas circunstâncias. Como frequentemente digo a meus alunos, você tem um propósito e o seu Eu Superior providenciará para que esse propósito