O autor pede presentes para o Brasil no Natal que promovam a educação, como 200 mil escolas bem equipadas e 2 milhões de bons professores bem remunerados. Ele reconhece que esses presentes não podem vir de fora, mas dependem dos próprios brasileiros, principalmente de novos líderes comprometidos com a educação e eleitos pelo voto popular.
1. A Bicicleta e o Voto
Cristovam Buarque
Há muitos anos, escrevi uma carta ao Papai Noel pedindo uma bicicleta. E ganhei. Miro, que morava num
casebre ao lado da minha casa, não recebeu. Escrevi outra carta ao Papai Noel, pedindo uma bicicleta
para ele. Hoje, não pediria uma bicicleta, pediria uma boa escola. Seria um presente para ele, para seus
filhos e o Brasil inteiro.
Tantos anos depois, este é o pedido que faria ao Papai Noel dos adultos, caso ele existisse: que, no dia 25
de dezembro, nossa população acordasse educada, com um imenso conhecimento coletivo de geografia,
matemática, filosofia, história; sabendo usar computadores, lendo e escrevendo bom português, falando
idiomas estrangeiros, conversando sobre literatura, conhecendo arte, tendo dezenas de milhares de
doutores e cientistas. Acordasse com tanto conhecimento coletivo quanto temos de habilidade para o
futebol.
Com a soma desse conhecimento, a população educada faria uma economia potente e moderna, por
causa do alto conteúdo de inteligência em cada produto da ciência e da tecnologia. A riqueza seria mais
bem distribuída entre as pessoas e regiões, as cidades seriam pacíficas; o meio ambiente, equilibrado.
Mas esse conhecimento não chega de repente, no dia de Natal. Nem é transportável no saco vermelho de
um velhinho que carrega presentes.
Por isso, desejo 200 mil escolas bonitas, com espaço suficiente para todos os alunos. Todas com os
equipamentos necessários, laboratórios, computadores, televisões, DVDs, antenas parabólicas, quadras
esportivas, bibliotecas, teatros e cinemas. Sem isso, os prédios não seriam considerados escolas, e o
conhecimento não seria criado ou espalhado. Desejo que nenhuma criança saia da escola antes de
completar o ensino médio. E que sejam alfabetizados os 15 milhões de adultos que ainda não sabem ler.
O Brasil seria um celeiro de cientistas, escritores, filósofos, intelectuais, doutores, engenheiros,
professores, como somos o celeiro dos melhores futebolistas do mundo.
Sobretudo, se tivesse a quem pedir, escreveria solicitando que o Brasil recebesse, de presente, dois
milhões de professores, todos eles muito bem preparados, com muitos anos de estudos, dedicação,
vontade de trabalhar, amor à profissão e aos alunos. Porque são eles que constroem o conhecimento.
Mas para isso, é preciso que esses professores – bem preparados e dedicados – sejam também muito,
muito bem remunerados, queridos e respeitados pela população.
Pode parecer que a idade me deixou ambicioso: em vez de uma bicicleta para o vizinho, peço um presente
complicado para o Brasil todo. Mas Papai Noel vem da Finlândia. Naquele país – eu tive a chance de ver –
foi possível fazer a revolução educacional, garantir a qualidade de suas escolas, tratar bem os
professores, aprimorar o cuidado com as crianças. Descobri que, na terra do Papai Noel, a educação
construiu um país rico em cultura, ciência, tecnologia e economia. Por isso, sinto-me no direito de desejar
o mesmo para meu País.
Mas sei que não é possível receber conhecimento coletivo – nem escolas com seus equipamentos e
professores – do exterior. A revolução educacional só pode ser feita pelo próprio povo e por seus líderes.
Por isso, neste Natal, gostaria de pedir uma nova geração de líderes, como o melhor presente para o
Brasil. Líderes que tenham o compromisso de transformar o País, educando nosso povo. Mas isso
tampouco vai nos chegar sob a forma de presente. Não há presentes na política e na condução dos
países. Ainda menos vindos do exterior. A cada povo cabe encontrar seu próprio caminho, definir que
futuro deseja, decidir como usar seus recursos. E os líderes são eleitos pelo povo.
Portanto, desejo que cada brasileiro seja o Papai Noel do Brasil, elegendo os líderes de que o País precisa
para fazer a revolução educacional que mudará o Brasil. Que, graças ao voto, não seja mais preciso que
uma criança peça uma bicicleta para o vizinho pobre.
2. O presente que peço é que a lucidez e o patriotismo tomem conta do eleitorado