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1
SARA MELISSA MÜLLER
OS ASPECTOS SUBLIMINARES DO ÁUDIO NA COMUNICAÇÃO –
UMA ABORDAGEM INTRODUTÓRIA
Trabalho de Conclusão de Curso Apresentado ao
Curso de Comunicação Social – Publicidade e
Propaganda, do Centro de Ciências Humanas e da
Comunicação da Universidade Regional de
Blumenau – FURB.
Orientadora: Profª Clara Maria Von Hohendorff
(MSc)
BLUMENAU
2000
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SARA MELISSA MÜLLER
OS ASPECTOS SUBLIMINARES DO ÁUDIO NA COMUNICAÇÃO –
UMA ABORDAGEM INTRODUTÓRIA
Trabalho de Conclusão de Curso Apresentado ao
Curso de Comunicação Social – Publicidade e
Propaganda, do Centro de Ciências Humanas e
da Comunicação da Universidade Regional de
Blumenau – FURB.
Orientadora: Profª Clara Maria Von Hohendorff
(MSc).
BLUMENAU
2000
3
OS ASPECTOS SUBLIMINARES DO ÁUDIO NA COMUNICAÇÃO –
UMA ABORDAGEM INTRODUTÓRIA
Por
SARA MELISSA MÜLLER
Monografia aprovada com “Conceito 10”, no Curso
de Comunicação Social em Nível de Graduação em
Publicidade e Propaganda, promovido pela
Universidade Regional de Blumenau – FURB.
______________________________________________________
Presidente: Profª. Clara Maria Von Hohendorff, MSc – Orientadora, FURB
______________________________________________________
Membro: Prof. Eusébio Nicolau Kohler, FURB
______________________________________________________
Membro: Profª. Anamaria Kovács, FURB
Blumenau, Junho de 2000.
4
“Assim eu compreendi que não há nada melhor do que a
gente ter prazer no trabalho. Essa é a nossa recompensa.”
(Ec 3:11)
5
AGRADECIMENTOS
Ao meu maior e melhor amigo Jesus, quem me deu paz, segurança e amparo,
enchendo-me de ânimo e coragem para enfrentar mais uma etapa, e que sempre me carregou
em seu colo.
A minha família que amo profundamente: ao pai, pelo apoio moral, digitação, e por
ter compreendido e adiado as viagens e as trilhas de Jeep para depois; a mãe, pelo seu amor e
carinho e por ser essa amiga de todas as horas; aos irmãos Tiago e Jessé, por terem liberado o
quarto, pelas digitações...
A Clara, pelo esforço e dedicação à orientadora, que não só orientou no sentido
próprio da palavra, como também confiou nesta pesquisa introdutória.
A Susan, estudiosa do assunto, pela força, sugestões, e idéias, e por ter
compartilhado sua experiência.
Aos chefes Romeu e Roberto, – ops! Quem tem chefe é índio –, e a todos da Free
pela compreensão e apoio à pesquisa.
Ao Calazans, cujo livro instigou-me num primeiro momento a eleger o tema deste
trabalho e por colocar-se permanentemente à disposição no auxílio de eventuais necessidades.
A todos que de uma maneira geral contribuíram para a obtenção de material para
minha pesquisa, como Eusébio, Leandro, Isildinha, Andrea, Miguel, Aline...
As amigas, pelo incentivo e entusiasmo e que de uma forma ou outra auxiliaram na
realização deste trabalho.
6
SUMÁRIO
CAPÍTULO I – INTRODUÇÃO.............................................................................................10
1.1 APRESENTAÇÃO DO TEMA E JUSTIFICATIVA..........................................................10
1.2 ABORDAGEM GERAL DO PROBLEMA ........................................................................11
1.3 QUESTÕES ESPECÍFICAS................................................................................................13
1.4 PRESSUPOSTOS.................................................................................................................13
1.5 OBJETIVOS DA PESQUISA..............................................................................................14
1.6 DEFINIÇÃO DE TERMOS.................................................................................................15
1.7 METODOLOGIA.................................................................................................................16
1.7.1 Tipo de pesquisa................................................................................................................16
1.7.2 Área de abrangência ..........................................................................................................16
1.7.3 Pesquisa teórica .................................................................................................................16
CAPÍTULO II – PERCEBENDO O SOM.............................................................................18
2.1 DURAÇÕES E ALTURAS DOS SONS .............................................................................19
2.2 COMPLEXIDADE DA ONDA SONORA E SUA PERCEPÇÃO .....................................20
2.3 SOM E AUDIÇÃO/SOM E RECEPÇÃO ...........................................................................21
2.4 RUÍDO .................................................................................................................................24
2.5 SILÊNCIO: SERÁ QUE SILÊNCIO É RUÍDO? ................................................................25
2.6 TIPOS DE SOM...................................................................................................................25
2.7 CONSONÂNCIA E DISSONÂNCIA .................................................................................26
2.8 MÚSICA: OUTRA MANEIRA DE FALAR.......................................................................27
2.9 O SOM NA CIVILIZAÇÃO................................................................................................30
2.10 O SOM E OS ELEMENTOS MUSICAIS .........................................................................30
CAPÍTULO III – A UTILIZAÇÃO DO SOM NA MÍDIA ..................................................36
3.1 RÁDIO, O PRÓPRIO SOM.................................................................................................36
3.2 O SOM NA TELEVISÃO....................................................................................................37
3.3 O SOM NO VÍDEO .............................................................................................................38
3.4 O SOM NO COMPUTADOR..............................................................................................39
3.5 O SOM NOS AUDIOVISUAIS...........................................................................................40
3.6 O SOM NA PUBLICIDADE ...............................................................................................40
7
CAPÍTULO IV – A UTILIZAÇÃO DO SOM NA COMUNICAÇÃO ...............................45
4.1 PUBLICIDADE ...................................................................................................................45
4.2 PUBLICIDADE: COMUNGAR PARA COMUNICAR.....................................................46
4.3 O SOM PUBLICITÁRIO EM BUSCA DA PERSUASÃO ................................................47
4.4 O SOM NA PUBLICIDADE ...............................................................................................48
4.5 O SOM NO CINEMA..........................................................................................................50
4.6 O SOM, SUA FONTE E A TRILHA SONORA .................................................................52
4.7 TRILHA SONORA..............................................................................................................53
4.8 TRILHA SONORA PUBLICITÁRIA .................................................................................54
4.9 A TRILHA SONORA NO CINEMA...................................................................................58
4.10 A EVOLUÇÃO DO MICKEYMOUSING........................................................................61
4.11 ANDAMENTOS DA MÚSICA DE CINEMA..................................................................62
4.12 DOIS MODOS DE OUVIR MÚSICA: ASPECTOS SENSORIAL E
ESTRUTURAL ..........................................................................................................................63
4.13 MÚSICA E PERSONAGEM NO FILME .........................................................................64
4.14 O USO DRAMÁTICO DO SILÊNCIO.............................................................................65
4.15 MAX STEINER DIVIDE OS PRINCÍPIOS DE COMPOSIÇÃO, MIXAGEM E
EDIÇÃO.....................................................................................................................................66
4.16 MARCEL MARTIN: OS VÁRIOS PAPÉIS .....................................................................67
4.17 ALGUNS INSTRUMENTOS DE MANIPULAÇÃO DO SOM.......................................67
4.18 ARREBATAMENTO DO EXPECTADOR ......................................................................68
CAPÍTULO V – A UTILIZAÇÃO DO SUBLIMINAR NA COMUNICAÇÃO................70
5.1 O SOM NO SILÊNCIO........................................................................................................72
5.2 JINGLES SUBLIMINARES................................................................................................76
5.3 CATEGORIAS DE ESTRATÉGIAS SUBLIMINARES, POR KEY.................................77
5.3.1 Inversão de figura/fundo....................................................................................................77
5.3.1.1 Inversões auditivas de figura/fundo................................................................................77
5.3.1.2 Percepções de gênios, conforme exemplo de Key (1996)..............................................78
5.3.2 O método de embutir imagens...........................................................................................80
5.3.3 Duplo sentido.....................................................................................................................80
5.3.4 Projeção taquiscoscópica...................................................................................................82
5.3.5 Luz de baixa intensidade e som de baixo volume .............................................................82
8
5.3.5.1 Segurança por meio de subliminares..............................................................................84
5.3.6 Luz e som de fundo ...........................................................................................................84
5.4 MENSAGENS SECRETAS EM DISCOS ..........................................................................85
5.5 PERCEPÇÃO NA COMUNICAÇÃO.................................................................................89
CAPÍTULO VI – COMO PERCEBER E RESISTIR AO SUBLIMINAR.........................92
6.1 MEMÓRIA E ESTÍMULOS SUBLIMINARES .................................................................93
6.2 LIMITE PERCEPTIVO .......................................................................................................93
6.3 MÍDIA: CATIVEIRO DE MENTES? .................................................................................94
6.4 KEY E OS PASSOS PARA A RESISTÊNCIA...................................................................97
CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................................................99
REFERÊNCIAS .....................................................................................................................103
9
“A palavra certa na hora certa é como maçãs de
ouro com enfeites de prata”.
Pv. 25.11
10
CAPÍTULO I
INTRODUÇÃO
1.1 APRESENTAÇÃO DO TEMA E JUSTIFICATIVA
O tema deste trabalho visa estudar a existência de mensagens subliminares no
áudio, uma vez que é grande a falta de conhecimento na história do uso dos sons na
comunicação pela maioria dos indivíduos. A importância da percepção subliminar na música é
uma reflexão relevante para os dias atuais. É um tema tão explorado em telenovelas, cenário de
filmes, teatros, comerciais e ao mesmo tempo desconhecido em nossa sociedade de maneira
geral. Cerca de 90% dos estudos e pesquisas realizados na área de percepção subliminar
referem-se à comunicação visual e 87% da nossa arquitetura cerebral destina-se ao
processamento de informação visual (CALAZANS, 1992). O questionamento desse trabalho é
na área dos sons. São eles menos eficazes na comunicação que as imagens, ou mais difíceis de
serem detectados ou mesmo analisados?
Não foi apenas o enorme déficit bibliográfico que existe na propaganda subliminar
no áudio que levou-nos a buscar, através da investigação, mas também, entender as reações
pessoais que sempre indicavam respostas em nosso íntimo, como a intuição, o sentido e os
sonhos, por exemplo. O conteúdo de nossos sonhos é composto de informações subliminares
conforme a “Lei de Exclusão” de Poetzle (POETZLE apud CALAZANS, 1992). Alguma coisa
há por trás de tudo isto, pois até a própria intuição é algo subliminar como nos ensina a
psicanálise. As rápidas intuições que geram nossas decisões seriam fruto de conteúdos
subliminares.
Para que este trabalho surgisse enquanto proposta, foi indispensável a existência de
uma relação de amor pelo objeto de estudo, bem como tudo que o rodeia − a mente no tocante
ao inconsciente coletivo é um dos componentes que o formam, o som.
Ao se deparar com trilhas sonoras em filmes da Disney, por exemplo, um grande
impulso sobrevinha, provocando completa interação e levando a tal conexão com os mesmos
que assaltava a idéia de como eles seriam sem o áudio, visto que milhões de pessoas no mundo
vêem estes desenhos. Não só crianças, mas um público que abrange todas as faixas etárias e se
dissemina por todas as camadas sociais.
11
Verifica-se a importância do conhecimento técnico e dos inovadores recursos que
hoje temos disponíveis para que se alcance o objetivo mais eficazmente. Não se pode imaginar
um filme ou comercial sem som. Mesmo que seja mudo, tem um objetivo de ser. “Há sons no
silencio, dando ordens, sugestionando, manipulando” (CALAZANS, 1992, p. 54).
O presente estudo busca investigar os aspectos subliminares no áudio, haja visto
que existe um enorme déficit de material pertinente ao assunto. O objetivo é tentar obter o
conhecimento máximo deste tema, deslindá-lo em todos os seus aspectos, saber de que forma
ele interage com o público, e compartilhá-lo com os que estão anestesiados pelos seus efeitos
potencialmente deletérios, uma vez que o dia-a-dia testemunha um bombardeamento sensorial
tornando-se difícil conceber que todas as sensações, simultaneamente recebidas, sejam
conscientes. Este trabalho poderá contribuir para o despertar crítico dos profissionais da área
de comunicação, psicólogos e músicos.
1.2 ABORDAGEM GERAL DO PROBLEMA
A publicidade se utiliza de sinais na comunicação produzidos tecnicamente, sem
que o receptor o perceba, sendo então a mensagem enviada de forma disfarçada e oculta com o
objetivo de não ser percebida conscientemente.
“Estamos à mercê de influencias sobre as quais não temos conhecimento consciente
e, virtualmente, não temos nenhum controle consciente”. (ROSENTHAL apud KEY, 1996,
p. 27).
Conforme Calazans (1993) em sua tese de doutorado, a exposição repetida ao
estímulo subliminar influencia as atitudes ou decisões posteriores, conforme provado
cientificamente por Poetzle, Key, Cuperfain e Clarke, entre outros cientistas da
Neurofisiologia, Gestalt e Psicologia Experimental. Os princípios científicos de percepção são
empregados na Propaganda por publicitários com o objetivo de influenciar a atividade psíquica
do público-alvo, procurando forçar inconscientemente a decisão de compra ou mudança de
comportamento.
“Nada é eliminado do inconsciente, nada é superado ou esquecido”. (FREUD apud
KEY, 1996, p. 27).
Calazans (1993), louvando-se no artigo “Subliminal Messages” – publicado na
edição n. 40, de novembro de 1985 da revista American Psychologist – diz que os efeitos da
estratégia subliminar podem se fazer tardios, ou seja, não imediatos, o que significa que neste
12
período gestacional o desejo de aquisição do produto oferecido pode ainda não estar manifesto,
impondo-se o transcurso do tempo de que se fala até que os resultados sejam alcançados.
Key (1977) também explica em “Media Sexploitation” que Freud, provou
cientificamente, empregando o taquicoscópio e a hipnose, que as percepções subliminares
podem evocar sonhos e mesmo ações, atos de escolha, dias, até mesmo semanas, após a
exposição ao subliminar.
Isto significa que a exposição a qualquer uma das técnicas subliminares pode
motivar a qualquer momento atos do sujeito exposto, desde imediatamente após receber o
sinal, ou até dias ou semanas após.
Calazans (1992) diz que os limites das aplicações subliminares nas mídias,
aparentemente, são limites da criatividade humana, haja visto que são empregados os
subliminares em cinemas, televisão, outdoors, rádios, revistas, sinais olfativos, entre outros.
Pode-se então aplicar os cinco sentidos subliminarmente como olfato, visão, paladar, tato e
audição.
Afirma também que:
Uma população exposta a subliminares, teleguiada, que se veste, comporta-se,
consome produtos, serviços, crenças, religiões, ideologias e vota em eleições levada
por sugestões externas, subliminares, não pode ser considerada uma forma de vida
inteligente, adaptada, autônoma [...]. A omissão e a passividade configuram isto,
sendo possível pecar por omissão. (CALAZANS, 1992, p. 96).
As técnicas subliminares multimídias estão sendo desenvolvidas e aperfeiçoadas a
cada dia, combinando tecnologias sinestesicamente, em infinitas possibilidades em áudio,
vídeo e outros sentidos. A tendência das novas tecnologias de comunicação que se encontram
emergentes é explorar mais e mais os limites e fronteiras, os limiares da percepção e de
processamento sinestésico de informação do cérebro.
Diversos teóricos da comunicação afirmam estarmos na era da imagem, desde os
anos 50, privilegiando assim a área da comunicação visual. Todavia, Key apud Calazans
(1992) em seu primeiro livro “Subliminal Seduction” afirma que os subliminares são
relativamente fáceis de plantar em ambas as áreas, de imagens ou de sons, em baixo volume
em diversas faixas de som e velocidade inaudíveis pelo ouvido humano no nível consciente,
causando reações subliminares facilmente comprováveis. Pode-se pegar como exemplo que o
coração humano bate a 72 pulsações por minuto e musicas ou vozes neste ritmo afetam o
comportamento humano. Ou seja, a Gestalt pode servir de exemplo para o presente caso, sendo
classificada como fundo subliminar inaudível.
13
No Brasil, não existe lei alguma proibindo expressamente qualquer modalidade de
propaganda subliminar. Nem a projeção taquicoscópica, nem os iconesos ou os sons
subliminares são proibidos, quanto mais as variações sutis de engenharia emocional ou o
envolvimento na narrativa que manipula crenças e cognições.
1.3 QUESTÕES ESPECÍFICAS
1) qual o poder subliminar do áudio nos indivíduos?
2) quais sons são utilizados para se comunicar de forma subliminar?
3) quais são os passos que podem diminuir a vulnerabilidade humana à
manipulação da mídia?
1.4 PRESSUPOSTOS
O subliminar no áudio atua em vários aspectos nos indivíduos fazendo com que os
mesmos consumam determinados produtos, idéias e muitas vezes manipulando suas formas de
pensar e agir sem que os mesmos o percebam. Sempre que a luz ou o som de fundo invadem
nossa percepção consciente, eles tornam-se distrações e prejudicam a percepção do todo
diminuindo o senso crítico do ouvinte e aumentando sua suscetibilidade à manipulação. A
música pode ser acrescentada para dar a ênfase dramática, criar suspense ou expectativa no
público para a ação seguinte a uma cena, por exemplo.
Vários sons podem ser utilizados para se comunicar de forma subliminar variando
de acordo com o contexto em que é inserido e embutido. Todos os sons podem ter uma razão
de ser, até mesmo o silêncio. Os silêncios também são uma dimensão de som. Há dúzias de
silêncios eletrônicos diferentes, cada um deles produzindo uma reação definida no receptor.
Sons e silêncios podem ser alternados, criando um pelotão de efeitos para o público. Estes sons
e silêncios, quando bem combinados não são percebidos conscientemente.
Em uma propaganda para a televisão tomando como exemplo, o receptor percebe
antes a imagem, e o áudio neste contexto seria classificado como “música de fundo” pois há
muitas informações sendo transmitidas em um pequeno espaço de tempo. Esses elementos que
ficam em segundo plano seriam um fundo subliminar. O som mais baixo e menos detectável é
o que influência subliminarmente o comportamento de forma mais eficaz. Ou melhor, todos os
sons que não são percebidos conscientemente, atuam de forma subliminar.
14
Uma forma de “fugir” da manipulação, ou diminuir a vulnerabilidade humana, seria
procurar analisar cada aspecto individualmente sobre determinada trilha ou som; treinar e
praticar, ver, ouvir e sentir de diversos ângulos o que provém da mídia; estar alerta e desconfiar
de toda e qualquer forma de comunicação; observar as atitudes internas dos indivíduos e os
porquês que os levam a consumir; ler, investigar e obter uma análise crítica do material
pertinente ao assunto.
Frente a uma propaganda publicitária e a qualquer som suspeito de apresentar no
seu conteúdo mensagens subliminares, deve-se tentar primeiramente buscar um relaxamento
seguido de uma análise global e genérica. Ato contínuo, buscando nenhuma área de interesse
específica em particular, deve-se prestar atenção não só na imagem mas também no áudio,
tantas vezes quantas se fizerem necessárias, observando cada linha melódica, cada som,
checando todos os mínimos detalhes, cuja desordem aparente possa servir de camuflagem e
disfarce para uma mensagem subliminar. Deve-se, portanto, prestar a máxima atenção aos
fundos e a tudo o que possa parecer sem nenhum relevo em primeira instância.
A suscetibilidade aos estímulos subliminares geralmente depende da tensão,
ansiedade ou preocupação de um indivíduo ou grupo. Deve-se tentar descobrir o que não é
discutido, estudado e examinado criticamente ignorando o que está na superfície, que todos
percebem, discutem e acham ameaçador.
Uma técnica produtiva para descobrir algo de novo é justamente não procurar nada
de novo. Ao contrário, procurar algo que está por aí faz tempo, que é tido como certo, que é tão
óbvio que permanece sem ser visto ou descoberto, reprimido ou escondido do público,
intencionalmente ou não.
1.5 OBJETIVOS DA PESQUISA
O objetivo geral da pesquisa é construir um estudo exploratório à cerca do
subliminar do áudio na comunicação.
Os objetivos específicos são:
1) mostrar a existência da mensagem subliminar sonora e suas conseqüências para
o receptor;
2) analisar como os sons são utilizados para se comunicar de forma subliminar;
3) estudar o poder de manipulação que as músicas exercem sobre os indivíduos;
15
4) buscar alternativas para diminuir e prevenir a vulnerabilidade humana à
manipulação da mídia.
1.6 DEFINIÇÃO DE TERMOS
Iconesos: neologismo composto pelas palavras gregas icone – imagem – e eso –
dentro. Refere-se a técnica de embutir imagens dentro da imagem, obtendo efeitos, reações
involuntárias e inconscientes no consumidor/cidadão, conforme Calazans (1993).
Percepção: (segundo Dic. Aurélio) ato, efeito ou faculdade de perceber.
Perceber: (segundo Dic. Aurélio)
1. Adquirir conhecimento de, por meio dos sentidos.
2. Formar idéia de; abranger com inteligência, entender, compreender.
3. Conhecer, distinguir, notar.
4. Ouvir
5. Ver bem
6. Ver ao longe, divisar, enxergar.
Subliminar: qualquer estímulo abaixo do limiar da consciência. Calazans (1992)
também propõe uma fórmula esquemática para explicar o subliminar:
SUBLIMINAR: > QUANTIDADE DE INFORMAÇÃO
< TEMPO DE EXPOSIÇÃO
Taquicoscópio: tipo de projetor de slides em alta velocidade. O taquicoscópio
chega a projetar um único slide na velocidade de 1/3000 de segundo. No cinema, é colocado ao
lado do projetor do filme – cuja projeção é ao ritmo de 24 fotogramas por segundo – e fica
repetindo a imagem sobreposta ao filme – a cada cinco segundos para dar a ilusão de
movimento (CALAZANS, 1992).
16
1.7 METODOLOGIA
1.7.1 Tipo de pesquisa
Após delimitar o tema, buscou-se embasamento teórico através de pesquisa
bibliográfica tendo como finalidade conhecer as diferentes formas de contribuição científica
que se realizaram sobre o assunto delimitado. Procurou-se identificar os autores que tenham
algum trabalho consistente acerca deste tema, haja visto que o material disponível sobre o
assunto é limitado e na maioria em outra língua.
1.7.2 Área de abrangência
A pesquisa abrangerá a área de Comunicação Social e a área de Psicologia em
Comunicação.
1.7.3 Pesquisa teórica
Conforme objetivo proposto, serão pesquisados livros de especialistas da área,
consultas a sites de internet, pesquisa de estudos científicos, revistas abordando o assunto. Os
dados serão analisados e organizados, concretizando o corpo de texto teórico da pesquisa. Será
feito um levantamento bibliográfico realizado pelo COMUT – Programa de Comutação
Bibliográfica – possibilitando a obtenção de cópias de documentos existentes em bibliografias
brasileiras integradas ao programa.
17
“O som é um objeto subjetivo, que está dentro e fora, não
pode ser tocado diretamente, mas nos toca com uma enorme
precisão”.
(J. Miguel Wisnik, 1999)
18
CAPÍTULO II
PERCEBENDO O SOM
A ciência nos ensina que o som é onda, que os corpos vibram, que essa vibração se
transmite para a atmosfera sob a forma de uma propagação ondulatória, que o nosso ouvido é
capaz de captá-la e que o cérebro a interpreta, dando-lhe configurações e sentidos. Representar
o som como uma onda significa que ele ocorre no tempo sob a forma de uma periodicidade, ou
seja, uma ocorrência repetida dentro de uma certa freqüência.
“O som é um objeto subjetivo, que está dentro e fora, não pode ser tocado
diretamente, mas nos toca com uma enorme precisão” (HEGEL apud WISNIK, 1999, p. 29).
Para Wisnik (1999), as propriedades ditas dinamogênicas do som tornam-se, assim,
demoníacas, o seu poder, invasivo e às vezes incontrolável, é envolvente, apaixonante e
aterrorizante. Entre os objetos físicos, o som é o que mais se presta à criação de metafísicas. As
mais diferentes concepções do mundo, do cosmos, da harmonia entre o visível e o invisível,
entre o que se apresenta e o que permanece oculto, se constituem e se organizam através da
música.
O som é o produto de uma seqüência rapidíssima e geralmente imperceptível de
impulsões e repousos, de impulsos que se representam pela ascensão da onda e de
quedas cíclicas desses impulsos, seguidas de sua reiteração. A onda sonora, vista como
um microcosmo, contém sempre a partida e a contrapartida do movimento, num campo
praticamente sincrônico já que o ataque e o refluxo sucessivos da onda são a própria
densificação de um certo padrão do movimento, que se dá a ouvir através das camadas
de ar. Não é a matéria do ar que caminha levando o som, mas sim um sinal de
movimento que passa através de matéria, modificando-a e inscrevendo nela, de forma
fugaz, o seu desenho. (WISNIK, 1999, p. 18).
Em termos mais digitais do que analógicos, pode-se dizer que a onda sonora é
formada de um sinal que se apresenta e de uma ausência que pontua desde dentro, ou desde
sempre, a apresentação do sinal. O tímpano auditivo registra essa oscilação como uma série de
compressões e descompressões. Sem este lapso, o som não pode durar, nem sequer começar.
Não há som sem pausa. O tímpano auditivo entraria em espasmo. O som é presença e ausência,
e está, por menos que isso apareça, permeado de silencio. Há tantos ou mais silêncios quantos
sons no som, e isso se pode dizer, com John Cage, que “nenhum som teme o silêncio que o
extingue”. (CAGE apud WISNIK, 1999, p. 18).
19
Mas também, de maneira reversa, há sempre som dentro do silêncio: mesmo
quando não ouve-se os barulhos do mundo, fechados numa cabine à prova de som por
exemplo, ouve-se o barulhismo do próprio corpo produtor/receptor de ruídos. Refere-se aqui à
experiência de John Cage, que se tornou a seu modo um marco na música contemporânea, e
que diz que, isolados experimentalmente de todo ruído externo, escuta-se no mínimo o som
grave da nossa pulsação sanguínea e o agudo do sistema nervoso. Será vista em seguida esta
questão com maior detalhe.
Para o mesmo autor, os sons podem também ser considerados emissões pulsantes,
que são, por sua vez, interpretadas segundo os pulsos corporais, somáticos e psíquicos. As
músicas se fazem nesse ligamento em que diferentes freqüências se combinam e se interpretam
porque se interpenetram.
A terminologia tradicional associa o ritmo à categoria do andamento, que tem sua
medida média no andante, sua forma mais lenta no largo, e as indicações mais rápidas
associadas já à corrida afetiva do “allegro” e do “vivace”, os andamentos se incluem um
gradiente de disposições físicas e psicológicas. Assim, também, um teórico do século XVIII
sugeria que a unidade prática do ritmo musical, o padrão regular de todos os andamentos, seria
o “pulso de uma pessoa de bom humor, fogosa e leve, à tarde!” (QUANTZ apud WISNIK,
1999, p. 19).
2.1 DURAÇÕES E ALTURAS DOS SONS
De acordo com Wisnik (1999) o som grave, como o próprio nome sugere, tende a
ser associado ao peso da matéria, com os objetos mais presos à terra pela lei da gravidade, e
que emitem vibrações mais lentas, em oposição à ligeireza leve e lépida do agudo. O ligeiro,
como no francês léger, está associado à leveza. Este dado é relevante ao publicitário no
momento de criação e composição de um comercial para algum produto ou serviço específico,
onde é importante a escolha correta da altura da música na trilha sonora de um comercial.
Quando, por exemplo, se quer transmitir leveza a algum produto em que se esteja divulgando,
poderá ser utilizado sons e instrumentos agudos, associando assim ao peso da matéria,
conforme Wisnik comenta em seu livro.
No entanto, é preciso lembrar que, em música, ritmo e melodia, durações e alturas
se apresentam ao mesmo tempo, um nível dependendo necessariamente do outro, um
funcionando como o portador do outro. É impossível a um som se apresentar sem durar,
minimamente que seja, assim como é impossível que uma duração sonora se apresente
20
concretamente sem se encontrar numa faixa qualquer de altura, por mais indefinida e próxima
do ruído que essa altura possa ser. Serão vistas as propriedades do som com maior detalhe.
2.2 COMPLEXIDADE DA ONDA SONORA E SUA PERCEPÇÃO
Há mais essa peculiaridade que interessa ao entendimento dos sentidos culturais do
som: ele é um objeto diferenciado entre os objetos concretos que povoam o nosso imaginário
porque, por mais nítido que possa ser, é invisível e impalpável. O senso comum identifica a
materialidade dos corpos físicos pela visão e pelo tato. Estamos acostumados a basear a
realidade nesses sentidos. A música, sendo uma ordem que se constrói de sons, em perpétua
aparição e desaparição, escapa à esfera tangível e se presta à identificação com uma outra
ordem do real: isso faz com que se tenha atribuído a ela, nas mais diferentes culturas, as
próprias propriedades do espírito. O som, para Wisnik (1999), tem um poder mediador,
hermético: é o elo comunicante do mundo material com o mundo espiritual e invisível. O seu
valor de uso mágico reside exatamente nisto: os sons organizados nos informam sobre a
estrutura oculta da matéria no que ela tem de animado. Não há como negar que há nisso um
modo de conhecimento e de sondagem de camadas sutis da realidade. Assim, os instrumentos
musicais são vistos como objetos mágicos, fetichizados, tratados como talismãs, e a música é
cultivada com o maior cuidado.
Mexendo nessas dimensões, a música não refere nem nomeia coisas visíveis, como
a linguagem verbal faz, mas aponta com uma força toda sua para o não-verbalizavel; atravessa
certas redes defensivas que a consciência e a linguagem cristalizada opõem à sua ação e toca
em pontos de ligação efetivos do mental e do corporal, do intelectual e do afetivo. Por isso
mesmo é capaz de provocar as mais apaixonantes adesões e as mais violentas recusas. Todos
esses fatores devem ser levados em conta na hora de se compor uma trilha musical.
Para Avron apud Wisnik (1999), o ritmo está na base de todas as percepções,
pontuadas sempre por um ataque, um modo de entrada e saída, um fluxo de tensão/distensão,
de carga e descarga. O feto cresce no útero ao som do coração da mãe, e as sensações rítmicas
de tensão e repouso, de contração e distensão vêm a ser, antes de qualquer objeto, o traço de
inscrição das percepções. Por isso, pode-se também dizer que a música, linguagem não
referencial que não designa objetos, não tem a capacidade de provocar medo, mas sim a de
provocar angústia ligada, segundo Freud, a um estado de expectação indeterminada, que se dá
na ausência do objeto. O texto de Freud a que o autor se refere é “Inhibition, symptôme et
angoisse” (Paris, PUF, p. 94). “Isso dá a música um grande poder de atuação sobre o corpo e a
21
mente, sobre a consciência e o inconsciente, numa espécie de eficácia simbólica”. (LÉVI-
STRAUSS apud WISNIK, 1999, p. 30).
Para Chnaiderman apud Wisnik (1999), quando a criança ainda não aprendeu a falar
mas já percebeu que a linguagem significa a voz da mãe, com suas melodias e seus toques, é
pura música, ou é aquilo que depois continuaremos para sempre a ouvir na música: uma
linguagem em que se percebe o horizonte de um sentido que, no entanto, não se discrimina em
signos isolados, mas que só se intui uma globalidade em perpétuo recuo, não verbal,
intraduzível, mas, à sua maneira, transparente. A publicidade aproveita do recurso da pulsação
para comunicar e transmitir segurança como será visto no capítulo V, que aborda a
comunicação subliminar.
A música, em sua história, é uma longa conversa entre o som, enquanto recorrência
periódica, produção de constância, e o ruído, enquanto perturbação relativa da estabilidade,
superposição de pulsos complexos, irracionais, defasados. Som e ruído não se opõem
absolutamente na natureza: trata-se de um continuum, uma passagem gradativa que as culturas
irão administrar, definindo no interior de cada uma, qual a margem de separação entre as duas
categorias.
2.3 SOM E AUDIÇÃO/SOM E RECEPÇÃO
Para Schafer (1991), ao contrário de outros órgãos dos sentidos, os ouvidos são
expostos e vulneráveis. Os olhos podem ser fechados, se quisermos; os ouvidos não, estão
sempre abertos. Os olhos podem focalizar e apontar nossa vontade, enquanto os ouvidos
captam todos os sons do horizonte acústico, em todas as direções.
De acordo com o texto de Salinas (1994), a audição em si é uma forma de recepção.
O ato de ouvir limita-se a receber um sinal sonoro e determinar a ele um sentido. O ouvido não
emite nenhum sinal. Quando ouvimos algo e queremos dar uma resposta devemos utilizar
outros caminhos de comunicação: falar, escrever ou gesticular. Ouvir é um estado passivo e de
contemplação, porém, no âmbito da percepção, a audição é fundamental no contato com o
mundo. É pelo ouvido que se percebem os sons da natureza, do homem e das máquinas. Ao
ouvir, também memorizamos e reconhecemos os objetivos e os seres que nos rodeiam. Todos
os espaços possuem um contexto sonoro; a realidade sonora é registrada já desde o ventre
materno, de onde o feto ouve os sons internos do corpo da mãe e os sons externos que pela
força de seu volume, conseguem chegar até seus ouvidos. A forma de comunicação mais
utilizada pelo homem, a língua falada, só é possível pela participação passiva do ouvir.
22
Igualmente, a música só existe quando é escutada por alguém. Na audição esconde-se uma
essência do perceber para poder agir: ouvir é uma passividade aparente em função da
percepção e atenção que o receptor deve dispender no processo de audição.
“Sabemos que o som é onda , que os corpos vibram, que essa vibração se transmite
para a atmosfera sob a forma de uma propagação ondulatória que nosso ouvido é capaz de
captá-la e que o cérebro a interpreta, dando-lhe configurações e sentidos”. (WISNIK, 1999, p.
15). Para Russo apud Salinas (1994), uma pessoa que pessoa que possua sua capacidade
normal de ouvir focaliza sua atenção, discrimina, memoriza e analisa os sons ao seu redor. E é
o que situaremos a seguir.
“A atenção auditiva é a capacidade do indivíduo de apresentar uma resposta
voluntária a um estímulo sonoro” (RUSSO apud SALINAS, 1994, p. 20). Todos os sons
provocam uma resposta, seja ela de passividade ou de atividade. O ouvido, diferentemente dos
olhos, está aberto de forma constante aos estímulos sonoros; não existe, como nos olhos, nada
semelhante a uma pálpebra que impeça a entrada do som no ouvido. Na mais completa
escuridão, o ouvido e o tato tornam-se chaves na orientação espacial. Mesmo quando se dorme
o ouvido continua registrando e estimulando atividades cerebrais. Ambientes com máquinas
possuem uma ampla gama de sons programados os quais indicam a seu operador diversos
estágios de funcionamento: uma operação, próxima fase, espera, erro, perigo, etc. Em um
diálogo, a atenção auditiva permite a interação pergunta-resposta entre os interlocutores.
“A figura/fundo auditiva é a capacidade de selecionar um estímulo sonoro
significativo dentro de uma gama de sons apresentados simultaneamente” (RUSSO apud
SALINAS, 1994, p. 20). A simultaneidade e a quantidade de estímulos sonoros registrados
pode chegar a milhares, o que obriga a mente a gerar uma seleção auditiva. Murray Schafer
(1991) chama de paisagem sonora “O ambiente acústico [...] o campo sonoro total dentro do
qual estamos”. Essa paisagem sonora contrapõe-se tanto dos sons internos e externos do local
onde nos encontramos, quanto aos sons internos do nosso próprio corpo. Nessa paisagem
sonora o ouvinte apresenta duas formas de audição, a audição focalizada (figura) e a audição
periférica (fundo). A primeira refere-se aos sons aos quais se presta atenção e, a segunda,
corresponde aos sons que continuam sendo ouvidos mas com uma atenção passageira.
“A discriminação auditiva é o processo de detectar diferenças e semelhanças nos
sons que percebemos” (RUSSO apud SALINAS, 1994, p. 21). A capacidade de discriminação
do ouvido é a forma mais sofisticada dos órgãos dos sentidos. Além de ser o sentido mais
rápido na reação estímulo-resposta, a audição reconhece uma gama quase infinita de
combinações harmônicas. Na música encontra-se um exemplo claro de discriminação no
23
reconhecimento das notas, no seu balé de alturas graves, médias e agudas, bem como na
distinção de um instrumento pelo timbre. Na vida, a discriminação auditiva está ligada à
cotidianidade e ao próprio conhecimento e reconhecimento das pessoas e dos objetos.
“A memória auditiva envolve a habilidade de armazenar e de evocar o material
auditivo” (RUSSO apud SALINAS, 1994, p. 22). O processo de memorização sonora
manifesta-se ao longo de toda a vida de um indivíduo. No ventre materno o feto ouve os sons
do coração, da respiração, da digestão da mãe. Essa paisagem sonora permanece tão gravada
como um estado de bem-estar e segurança intra-uterina, que um eficiente travesseiro que
reproduz sons similares aos do ventre, poderia ser utilizado para acalmar os bebês no berço. O
desenvolvimento da fala depende da memória para o reconhecimento e a reprodução das
palavras. A memória sonora também está ligada aos lugares, aos objetos e aos períodos da
vida. A cada ocorrência sonora não somente grava-se a relação som-fonte como também o
contexto, a paisagem sonora. Assim, a cada nova ocorrência do mesmo som-fonte, a memória
recuperará todo um conjunto de experiências acumuladas para dar um novo sentido ao que está
sendo ouvido.
“A análise auditiva é a operação que decompõe as informações sonoras recebidas.
Já a síntese auditiva é a operação que une as partes para compor uma informação sonora”
(RUSSO apud SALINAS, 1994, p. 22). Assim, na síntese, reconhecemos a paisagem sonora
como um todo, como uma unidade (na análise procuramos reconhecer os elementos que
compõem a paisagem sonora). Ao ouvir os acordes sucessivos de uma peça musical, realiza-se
uma síntese auditiva; já a análise ocorre quando se ouve a peça reconhecendo a participação de
cada instrumento. A audição focalizada é uma operação de análise que contrapõe a audição
periférica que é uma operação de síntese.
“A seqüenciação auditiva é a função que depende da memória, uma vez que é a
capacidade de lembrar a ordem dos itens em seqüência” (RUSSO apud SALINAS, 1994, p.
22). Dois aspectos sonoros dependem na base dessa capacidade: a audição e emissão de falas,
e a criação, interpretação e a apreciação da música. As seqüências de fonemas nas palavras e
de notas nas melodias somente ganham sentido quando memorizadas para serem repetidas e
novamente ouvidas. No cotidiano, também, múltiplas seqüências sonoras interferem na vida
das pessoas. Para Salinas (1994), por exemplo, o canto do galo seguido do canto dos
passarinhos é uma das seqüências sonoras mais bucólicas que a natureza fornece para anunciar
o amanhecer. Vale destacar que essas múltiplas seqüências sonoras podem ser consideradas
subliminares.
24
Outro elemento do processo auditivo é a “localização sonora” (RUSSO apud
SALINAS, 1994, p. 22) – estratégico posicionamento das orelhas que permite ao cérebro o
reconhecimento imediato da direção onde a fonte sonora está localizada, acrescentando o
cálculo aproximado da distância da fonte. “Ouvir”, configura-se em um sentido unidirecional
com o qual o indivíduo se orienta no espaço, onde a grande maioria dos acontecimentos são
primeiro ouvidos, antes de serem vistos, tocados, cheirados ou degustados.
Cada um destes tópicos sobre a audição sugere questionamentos sobre a relação
entre o som na publicidade e seu vídeo-ouvinte. Como já anotamos, o processo de ouvir além
de seus elementos auditivos naturais está vinculado a um processo histórico, cultural e social.
Um grupo social ouve de acordo com aspectos espaciais, temporais, políticos, religiosos,
familiares e de lazer. A fala e a música são os únicos legados sonoros da história que
possuímos, seu conhecimento representa uma aproximação sobre como o mundo era ouvido
nas diferentes épocas. Somente a partir do final do século passado, o homem conseguiu
registrar e reproduzir tecnicamente os sons. Assim a memória técnico-sonora do mundo limita-
se quando que exclusivamente a nosso século.
A publicidade é uma das formas de expressão em que a possibilidade de registro e
reprodução do som é empregada. E é evidente que o som dos comerciais está constantemente
chamando a atenção auditiva, brincando com as relações de figura e fundo, aproveitando a
discriminação, a memória e a seqüenciação auditivas, cutucando a análise e a síntese auditiva,
e denunciando a localização sonora das fontes. Porém, a capacidade auditiva é um dom do
receptor, a publicidade só pode instigar esse dom.
2.4 RUÍDO
Segundo Schafer (1991), o negativo do som musical é o ruído. Ruído é o som
indesejável, o que fomos treinados a ignorar. É a estática no telefone ou o desembrulhar balas
do celofane durante Beethoven. Ruído é qualquer som que interfere. É o destruidor do que
queremos ouvir.
Não há outro meio para defini-lo. Às vezes, a dissonância é chamada de ruído; e
para os ouvidos tímidos até pode ser isso. Porém, consonância e dissonância são termos
relativos e subjetivos. Uma dissonância para uma época, geração e/ou indivíduo pode ser uma
consonância para outra época, geração e/ou indivíduo. A dissonância mais antiga na história da
música foi a Terça Maior (dó-mi). A última consonância na história da música foi a Terça
Maior (dó-mi).
25
2.5 SILÊNCIO: SERÁ QUE SILÊNCIO É RUÍDO?
Silêncio é a característica mais cheia de possibilidades da música. Mesmo quando
cai depois de um som, reverbera com o que foi esse som e essa reverberação continua até que
outro som o desaloje ou ele se perca na memória. Logo, mesmo indistintamente, o silêncio soa.
O homem gosta de fazer sons e rodear-se com eles. Silêncio é o resultado da rejeição da
personalidade humana. O homem teme a ausência de som como teme a ausência de vida, como
podemos ver na frase “o silêncio é de ouro”.
Na realidade: silêncio – ausência de som – é negro. Na ótica, o branco é a cor que
contém todas as outras. Emprestamos daí o termo “ruído branco”, a presença de todas as
freqüências audíveis em um som complexo. Se filtrarmos o ruído branco, eliminando
progressivamente as faixas maiores de freqüências mais altas e/ou mais baixas, eventualmente
vamos chegar ao som puro – o som sinoidal. Filtrando-o, também, teremos silêncio – total
escuridão auditiva.
Como já citado anteriormente, John Cage diz: “O silêncio, não existe isso”. Quando
John Cage entrou numa câmara aneóica, ou seja, à prova de som, ele ouviu dois sons, um
agudo e um grave. “Quando eu os descrevi para o engenheiro responsável, ele me informou
que o agudo era meu próprio sistema nervoso em funcionamento, e o grave era meu sangue
circulando”. Concluiu então que: “O silêncio não existe. Sempre está acontecendo alguma
coisa que produz som” (CAGE apud SCHAFER, 1991, p. 71). Não significará silêncio
absoluto ou físico, mas meramente a ausência de sons musicais tradicionais. O emprego do
silêncio na publicidade veremos melhor no capítulo IV.
2.6 TIPOS DE SOM
Qualquer coisa que se mova, em nosso mundo, vibra o ar. Caso ela se mova de modo
a oscilar mais que dezesseis vezes por segundo, esse movimento é ouvido como som.
O mundo, então, está cheio de sons. Ouça. Abertamente atento a tudo que estiver
vibrando, ouça. Sente-se em silêncio por um momento e receba os sons. (SCHAFER,
1991, p. 124).
Os sons ouvidos podem ser divididos em sons produzidos pela natureza por seres
humanos e por engenhocas elétricas ou mecânicas. Schafer (1991) descobriu que quando
haviam poucas pessoas e elas levavam uma existência pastoril, os sons da natureza pareciam
predominar: ventos, água, aves, animais, trovões. As pessoas usavam seus ouvidos para
decifrar os presságios sonoros da natureza. Mais tarde, na paisagem urbana, as vozes das
26
pessoas, seu riso e o som de suas atividades artesanais pareceram assumir o primeiro plano.
Ainda mais tarde, depois da Revolução Industrial, os sons mecânicos abafaram tanto os sons
humanos quanto os naturais, com seu onipresente zunido.
Abaixo, apresentamos uma abordagem da pesquisa realizada por Schafer em 1991:
SONS SONS OS SONS DE UTENSÍLIOS
NATURAIS HUMANOS E TECNOLOGIA
Culturas Primitivas 69% 26% 5%
Culturas Medievais, Renascentista 34% 53% 14%
e Pré-Industriais
Culturas Pós-Industriais 9% 25% 66%
Hoje 6% 26% 68%
Figura 1 – Ambiente Sônico.
Fonte: SCHAFER (1991, p. 128).
2.7 CONSONÂNCIA E DISSONÂNCIA
Toda dissonância exigia sua resolução numa consonância. Toda consonância exigia
uma dissonância para perturbar sua vida enfadonha. As duas eram inimigas íntimas na música
erudita ocidental.
Nos primórdios da música atonal, pensava-se que a dissonância tivesse assassinado
a consonância e se imposto domo déspota absoluta da música. Agora nos apercebemos de que
isso era uma ilusão e que os sons são consonantes ou dissonantes apenas relativamente,
dependendo do seu contexto.
Conforme Schafer (1991), dissonância é tensão, e consonância é relaxamento. Do
mesmo modo que a musculatura humana se tensiona e relaxa alternadamente, não se pode ter
uma dessas atividades sem a outra. Assim, nenhum dos dois termos tem significado absoluto;
um define o outro. Qualquer pessoa que não compreenda isso, deveria tentar ficar com o punho
fechado e bem apertado pelo resto da vida.
Consonância e dissonância são como dois elásticos, um mais esticado que o outro.
Sua relatividade é esclarecida pela adição de um terceiro elástico, mais esticado que os dois
primeiros.
Qualquer complexo sonoro pode ser analisado em termos de sua consonância e
dissonância relativos, dentro de sua vizinhança acústica. ‘Consonância’ e
27
‘dissonância’ referem-se a variações em intensidade, altura, duração ou timbre,
dentro dos perímetros do audivelmente possível. (SCHAFER, 1991, p. 156).
2.8 MÚSICA: OUTRA MANEIRA DE FALAR
“Música é a arte de combinar sons visando a beleza da forma e a expressão das
emoções; os sons assim produzidos; som agradável, por exemplo, o canto de um pássaro, o
murmúrio de um riacho, o latido de cães” (The Concise Oxford English Dictionary, apud
SCHAFER, 1991, p. 119). “Música é sons, sons à nossa volta, quer estejamos dentro ou fora de
salas de concerto” (THOREAU apud SCHAFER, 1991, p. 120). Definir música meramente
como “sons” teria sido impensável há poucos anos atrás, mas hoje são as definições mais
restritas que estão se revelando inaceitáveis. Pouco a pouco, no decorrer do século XX, todas
as definições convencionais de música vêm sendo desacreditadas pelas abundantes atividades
dos próprios músicos conforme Schafer (1991).
Para Said (1992, p. 43-44), em “Elaborações Musicais”, a música seria executada e
ouvida como uma outra maneira de falar. Talvez mais lenta em seus efeitos, talvez mais
digressiva e reiterativa, mas nascida de decisão em concentrar-se no seu tempo, internamente,
numa experimentação conjunta com outras experiências e com outras músicas.
Outro problema, seria o fato de que tudo o que se ouve e se assimila é a combinação
de certo número de notas em forma de melodia. Precisamente dos olhos, no estilo Gestalt,
olham para a forma e o sentido totais de um desenho, e raro focalizam, com exclusividade,
linhas ou marcas individuais, com exclusão de todas as outras. Assim, os ouvidos se
acostumaram a organizar notas musicais em padrões e formas globais. Pouca atenção se
dispensa às qualidades de cada som.
O tema da música e de suas possíveis influências psicológicas e societárias, para
Tame (1987), não é um tema abstrato, teórico, porque só neste século é que se abandonou e
perdeu quase de todo a crença na música como força capaz de mudar o indivíduo e a
sociedade.
Nunca a música foi tão facilmente acessível, tão diversa, tão continuamente
despejada nas ruas da cidade e nas ondas do ar e, não obstante, nunca a teorização ou
conhecimento real, prático, da natureza e dos efeitos da música se achou em tão
acentuado declínio. (TAME apud BATAN, 1992, p. 27).
Para todos estes estudiosos, existe a convicção da capacidade transgressora da
música sobre outros domínios como família, escola, relações de classe e sexo e nacionalismo.
28
O médico e músico Wilson Luiz Sanvito (1992, p. 4) condena os vários estudos
sobre a capacidade da música em influenciar o cérebro, o corpo físico e as emoções. Para ele, a
música afeta fisicamente por possuir um ritmo (pulsações) e um tempo (compasso), como as
funções biológicas. O cérebro parece analisar os estímulos sonoros através de padrões de
referencia tendo como modelo freqüências harmônicas, no caso da música.
Por experiências realizadas com anestesia dos hemisférios cerebrais, ficou
demonstrado que, enquanto o hemisfério direito controla os sons sem conteúdos lingüísticos, a
altura do som e a identificação dos acordes musicais, o lado esquerdo controla o ritmo musical.
Este fato contradiz o que se acreditava até há pouco tempo, que os sons musicais fossem
inteiramente controlados pelo hemisfério não dominante para a linguagem, geralmente o
direito. Sanvito (1992, p. 4) faz a seguinte observação:
O ritmo pode ser concebido como uma organização temporal de uma seqüência de
estímulos e este tipo de processamento é uma especialidade do cérebro esquerdo.
Então o cérebro direito é essencial para a apreciação da tonalidade musical, da
expressão melódica, do timbre dos instrumentos e de sua reprodução, enquanto do
cérebro esquerdo depende a leitura da escrita musical, o ritmo e o reconhecimento
das palavras de uma canção [...] se a criatividade musical tem domicílio no lado
direito do cérebro, a linguagem musical, ou seja a capacidade de articular numa
seqüência, uma nota após a outra, compete ao lado esquerdo.
Portanto, de uma certa hegemonia do cérebro direito para lidar com estímulos
sonoro-musicais, o processamento completo deles depende de uma integração dos hemisférios
cerebrais. Dessa forma, os sons captados por sensores periféricos, que são órgãos receptores
localizados nos ouvidos, segundo o autor, são veiculados por nervos até certas áreas cerebrais,
onde são analisados e adquirem significado. O desenvolvimento deste sistema acústico-
neurologico exige uma maturação, que ocorre desde a vida intra-uterina quando o feto está
submetido a um ambiente sonoro. Como a máxima intensidade sonora a que alguém pode se
expor num período de oito horas, sem sofrer dano de audição, é de 75 decibéis – vale lembrar
que um concerto de rock tipo “heavy metal”, pode ultrapassar 90 decibéis –, o corpo para
proteger-se, precisaria filtrar uma ampla faixa de sons incidentes e agir como um
transformador vibratório.
Por vezes, isto pode ser extremamente esgotante. Se uma música de determinada
freqüência, ritmo e tonalidade influência os ritmos elétricos do cérebro provocando
relaxamento (ondas alfa) ou sonolência (ondas delta), outro tipo de música pode
provocar hiperexcitabilidade do cérebro traduzida por alerta, excitação dos nervos e
mesmo um ataque epilético. (SANVITO, 1992, p. 4).
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Ainda de acordo com o autor, os sons seguem dois caminhos para chegar ao
cérebro:
Um chega ao centro auditivo do cérebro no 1º lobo temporal, onde são captados e
interpretados. Este mesmo lobo cerebral alberga boa parte do sistema límbico, que
lida com as emoções, principalmente ao lado direito do cérebro, e participa na
memorização dos eventos no dia a dia. A outra vertente conecta-se com o cérebro
vegetativo, que controla funções com a respiração, circulação, digestão, hormonal e
outras. Isto posto, fica mais fácil entender como as qualidades da música podem nos
afetar tanto física como psicologicamente. No caso da freqüência que é o número de
ciclos por segundo de um determinado som, sabemos que as vibrações rápidas
provocam tensão nervosa enquanto as lentas tendem a relaxar. Já com a intensidade,
que se relaciona à amplitude das vibrações, observa-se que a música alta pode levar
ao arrebatamento e chega a ser opressiva. A música suave, além de intimista, produz
serenidade. O ritmo é a qualidade dinâmica da música e o seu padrão marcante entre
ritmo e emoções. Além da pulsação cardíaca, o ritmo é fundamental em outras
funções orgânicas: respirar, falar, andar, etc. (SANVITO, 1992, p. 4).
A música, sendo uma forma de expressão e comunicação não-verbal, ao ser
canalizada para o cérebro estimula a imaginação, a fantasia evoca recordações, enfim dispara
gatilhos emocionais. E Manfred Clynes, que é músico e doutor em neurologia/engenharia pela
Universidade de Melbourne, citado por Sanvito (1992, p. 4), postula que:
[...] as emoções existem por si mesmas como padrões potenciais do sistema nervoso
e podem ser desencadeadas pela música, independentemente de associações
específicas com pessoas ou eventos. Isto significa que certas passagens musicais, de
acordo com sua forma ou estrutura, podem gerar respostas tais como alegria, amor
ou reverência.
Esta padronização é capaz de descrever certos estados afetivo-emocionais
caracterizados pelas músicas na TV:
Terror, medo, pânico: notas graves e com instrumentos que produzam registros
graves (trombones, contrabaixo, saxofone e instrumentos de percussão);
Tristeza: som de oboés, flautas, violinos ou clarinetes, que emitem movimentos
lentos e tempos longos;
Alegria: músicas ‘brilhantes’, de júbilo, às vezes com movimentos rápidos;
Raiva: escalas musicais rápidas, sons fortes, graves ou agudos e com ocorrências
surpreendedoras;
Momentos românticos: similares às da tristeza;
Violência: movimentos rápidos, de caráter forte e sonoridade ‘brilhante’, similares à
raiva;
Suspense: instrumentos de registro baixo ou com notas agudas intermitentes.
(SALINAS apud BATAN, 1992, p. 31).
Salinas apud Batan (1992, p. 32) ressalta que, como são raros os estudos sobre a
reação do espectador a determinadas músicas, torna-se difícil a confirmação da “sabedoria
empírica dos emissores ao utilizar uma ou outra música, padronizada ou não, para obter uma
ou outra sensação da platéia, quanto aos seus produtos fílmicos”.
30
2.9 O SOM NA CIVILIZAÇÃO
Uma trilha sonora ecoa para cada povo, para cada época e para cada indivíduo, de
maneira particular. A paisagem sonora adere profundamente à paisagem sensorial total. Na
denominada civilização da imagem, porém, o som apresenta-se como complemento, como ator
coadjuvante. Nesta civilização, aquilo que não é feito para ser visto, para aparecer na imagem,
simplesmente não existe, mas na própria radicalização saturada da imagem, a imagem deixa de
existir. E o som urbano do mundo civilizado também entra nesse jogo de inexistência, de
saturação. Quando o caos sonoro da floresta apresenta-se para um índio como um concerto de
sinais carregados de sentidos, o caos sonoro urbano apresenta-se para o cidadão como uma
rotina atordoante de sinais sem sentido.
Estudos de Antropologia apontam que a música e o canto podem ter surgido meio
milhão de anos antes que a fala. Além disso, a Antropologia constata que não há cultura, por
mais primitiva que seja, que não possua música ou língua falada. A escrita, representação
gráfica da palavra, foi utilizada somente há dez mil anos, sendo que ainda hoje existem povos
que não possuem escrita. Nos países do chamado Terceiro Mundo, os índices de analfabetismo
são tão altos que a tradição oral e musical encarrega-se de transmitir a cultura entre as diversas
gerações. E nos países ditos de Primeiro Mundo, são preocupantes os baixos percentuais de
leitura da população. A milenar música, então, representa a expressão humana mais antiga na
busca da organização espaço-temporal. A música, e depois a fala, são formas de arquitetar o
caos sonoro da natureza.
As sociedades existem na medida em que possam fazer música, ou seja, travar um
acordo mínimo sobre a constituição de uma ordem entre as violências que possam
atingi-la do exterior e as violências que as dividem a partir do interior. Assim a
música se oferece tradicionalmente como o mais intenso modelo utópico da
sociedade harmonizada e/ou, ao mesmo tempo, acabada representação ideológica
(simulação interessada) de que ela não tem conflitos. (WISNIK, 1999, p. 30).
2.10 O SOM E OS ELEMENTOS MUSICAIS
Se assumimos a trilha sonora como uma forma da música concreta, devemos, então,
considerar alguns elementos básicos da música para sua análise. Todo som tem como
propriedades uma altura, uma duração, um timbre e uma intensidade. A sucessão organizada de
sons denomina-se melodia, e a combinação simultânea de dois ou mais sons chama-se
31
harmonia. Resguardando a distância estética com a música, a trilha sonora, com toda sua
particularidade, também está composta com base nestes elementos.
O maior ou menor número de vibrações por segundo determinam a altura de um
som; estas vibrações por segundo são chamadas hertz. O ouvido humano tem capacidade de
perceber freqüências que variam entre 20 e 20.000 hertz. Um som é considerado baixo ou
grave quando sua freqüência é baixa e, na medida em que sua freqüência aumenta, o som é
considerado alto ou agudo: “[...] som grave, como o próprio nome sugere, tende a ser associado
ao peso da matéria, com objetos mais presos à terra pela lei da gravidade, e que emite
vibrações mais lentas, em oposição à ligeireza leve e lépida do agudo” (WISNIK, 1999, p. 19).
A música organiza os sons em uma seqüência de freqüências determinadas chamadas de notas
musicais (dó, ré, mi, fá, sol, lá e si); a freqüência mais utilizada pela música ocidental nos
últimos dois séculos chama-se “gama cromática bem temperada”.
Nas ocorrências sonoras dos audiovisuais as alturas ganham importância de acordo
com as associações físicas e culturais dos sons. As vozes graves possuem um ar de respeito e
poder superior ao das vozes agudas. O tom grave, e na grande maioria das vezes uma voz
masculina, das narrações esportivas, de documentários, de apresentadores de noticias, de
comerciais, etc., revelam de acordo as associações físicas das fontes sonoras, como já assinalou
Wisnik (1999), os objetos grandes e pesados geram sons graves, enquanto os pequenos e leves
geram sons agudos. Podemos citar um exemplo deste gênero que está padronizado ao extremo
máximo do associativo: toques graves para acompanhar o andar do elefante e toques agudos no
andar da formiga.
A duração corresponde ao tempo de prolongação de um som. Uma fonte sonora
pode gerar um som contínuo que varia de frações de segundo até um determinado número de
horas. Os súbitos impulsos sonoros, de durações curtas, geram surpresa e chamam a atenção; as
ocorrências longas e contínuas são colocadas rapidamente pelo cérebro na audição periférica.
A duração dos sons está ligada também à velocidade, isto é, quanto mais curto, maior a
sensação de rapidez, quanto mais longa, mais lenta. No mundo urbano moderno os tempos
curtos determinam o sucesso das coisas, os sons curtos apresentam-se num estado de agitação.
Já no mundo da meditação, da reflexão, os tempos longos são os que levam os estados ideais
de calma e tranqüilidade.
Nos audiovisuais, as falas com durações fonéticas curtas denunciam temperamentos
ou estados de animo: agitação, ação, tensão, perturbação, etc. Falas lentas e pausadas em
durações longas simbolizam tranqüilidade, sabedoria, racionalidade, controle, preguiça,
novamente, para o andar do elefante os sons graves e longos, para o da formiga os sons agudos
32
e curtos. Na música, cada nota tem uma duração específica ao ponto que na escritura musical
os símbolos de representação estão codificados de acordo com o tempo de execução da nota:
uma semibreve corresponde ao tempo mais longo, e uma semifusa corresponde ao tempo mais
curto. O silêncio, por sua vez, que representa a ausência de alturas, ganha valores significativos
em suas durações. As pausas silenciosas podem trazer as sensações de medo, dúvida, espera e
angústia, por exemplo.
O timbre, por sua vez, determina a possibilidade de identificação e discriminação
auditiva das diversas fontes sonoras. Uma mesma nota, altura, emitida por instrumentos
diferentes, apresenta-se na mesma freqüência fundamental acompanhada de uma série de
outras freqüências mais agudas e determinam a também chamada cor ou timbre de cada
instrumento. O timbre, ou a cor, denuncia o tipo de fonte sonora. A capacidade de
discriminação aliada à memória auditiva nos permite reconhecer milhares de fontes sonoras
somente pelo timbre, sem necessidade de estar vendo a fonte. Quando a ligação fonte-som é
alterada, as coisas que vemos ficam falsas, mentirosas, há um estranhamento sonoro. Por isso,
é que nos audiovisuais existe um cuidado especial na criação e reprodução dos sons de uma
paisagem sonora, já que uma cor dissonante de suas fontes prejudica a veracidade do
audiovisual.
Reconhecemos as pessoas pela singularidade no timbre de sua voz. A relação entre
um corpo que fala e o som de sua fala está determinada pelo timbre. Uma mesma pessoa muda
a cor de sua voz nas passagens da infância para o mundo adulto e para a velhice. Quando
ouvimos uma pessoa falar reconhecemos se é homem ou mulher, jovem ou velho, sem
necessidade de compreender uma palavra da língua em que fala. Nos audiovisuais, o timbre
desempenha um papel primordial no reconhecimento das fontes e nas associações espaço-
tempo culturais que um som pode carregar. O timbre de um instrumento ou da voz de uma
pessoa pode remontar instantaneamente o receptor a lugares e épocas determinadas.
A intensidade refere-se ao grau de energia de um som. Independentemente da
altura, duração ou timbre, um som pode possuir intensidades fortes ou fracas. O impacto do
som em intensidades fortes para danificar o ouvido provocando perdas irreparáveis na
Audição. Um som grave contínuo com uma alta intensidade pode derrubar um prédio pelas
fortes vibrações provocadas nas colunas e paredes. Nos anos 70, o cinema realizou, no filme
Terremoto (1974), uma experiência na qual o público sentia os tremores de terra através de um
som grave de baixa freqüência e forte intensidade. Esta propriedade, então, reveste o som de
uma dinâmica pontual com relação ao receptor. A intensidade prende a atenção com suas
33
diversas variações, moldando momentos de ação e repouso. Em uma fala, por exemplo, as
mudanças de intensidade podem ser tão ou mais significativas que o que está sendo dito.
Um som com amplitude constante gera um grau de tensão suspenso na dúvida de se
vai terminar, diminuir ou aumentar.
O som que decresce em intensidade pode remeter tanto à fraqueza e à debilitação,
que teria o silêncio como morte, ou à extrema sutileza do extremamente vivo,
podendo sugerir justamente o ponto de colamento e descolamento desses sentidos, o
ponto diferencial entre a vida e a morte, aí potencializados. O crescendo e o
fortíssimo pode mandar, por sua vez, um jorro de explosão proteínica e vital
emanando da fonte, ou a explosão mortífera do ruído como destruição, como
desmanche de informações vitais. (WISNIK, 1999, p. 23).
O som audiovisual aproveita-se desta riqueza para criar figuras auditivas, às vezes,
concordantes com a imagem e, às vezes, dissonantes desta. No adequado controle das
intensidades, reside um dos segredos de uma mixagem sonora e talvez do encantamento do
receptor ao assistir um audiovisual.
Os sons, com suas alturas, durações, timbres e intensidades, não se apresentam de
forma individual; ouvimos nas paisagens sonoras físicas e fílmicas conglomerados dos sons
sucessivos e simultâneos a sucessão de notas variando em suas alturas criando a melodia. Em
uma peça musical, ela pode ser interpretada por um ou vários instrumentos, ou pela voz
humana. No âmbito do audiovisual falar de melodia torna-se um pouco mais complicado, pois
como determinar uma linha melódica em um trilha composta por tantos elementos
diferenciados? A princípio podemos dizer que, a partir do cinema sonoro, as falas assumem o
papel de melodia. Não é necessário realizar uma pesquisa para concluir que as falas nos
audiovisuais transportam para si a missão do encadeamento narrativo. O intuito dos
realizadores é que a audição focalizada concentre-se nas falas, naquilo que é dito. Seria, então,
uma melodia que em sua organização lingüística estaria direcionada à sua compreensão
racional. Porém, esse valor de melodia dilui-se ao notar que os outros elementos sonoros,
inclusive os não lingüísticos das próprias falas, devem ser ouvidos com a audição periférica,
provocando respostas emocionais. Nesta relação de figura-fundo, a figura dirige-se ao racional
e o fundo ao emocional do receptor. Apresenta-se, então, uma articulação na qual a trilha
sonora detém não uma linha melódica, mas sim um jogo de várias linhas melódicas
simultâneas. A trilha sonora define-se, dessa forma, como uma polifonia sonora estimulando
ininterruptamente, e por várias frentes, a atenção auditiva do receptor.
Na combinação simultânea dos sons, ou seja, na harmonia, a polifonia da trilha
sonora encontra seu papel de ação vertical. Na música, entende-se por acorde o momento em
34
que duas ou mais notas são ouvidas ao mesmo tempo. Um acorde em uma trilha sonora pode
acontecer na simultaneidade de fala, música, sons e/ou silêncio, e as possibilidades de
significado projetam-se às múltiplas combináveis realizáveis. Quiçá, um dos maiores atributos
estéticos das manifestações audiovisuais reside nos bons aproveitamentos das articulações
harmônicas tanto no interior da imagem, como nos acordes sonoros e nas articulações de som e
imagem.
A manipulação ilimitada de intervenção linear horizontal e vertical dotam o som de
várias possibilidades na somatória de sentidos propostos pelo realizador e apropriados e
reelaborados pelo receptor. A composição melódica e harmônica das falas, dos sons, das
músicas e dos silêncios, constrói uma paisagem sonora exclusiva do universo do audiovisual,
composição esta desconhecida pelo homem até a aparição do cinema sonoro. Embora o teatro
pudesse realizar jogos sonoros similares muito antes do cinema, ele não contava com os
recursos tecnológicos trazidos pelas novas formas de relacionamento das manifestações
sonoras como a imagem, o espaço e o tempo.
No próximo capítulo será abordado a utilização do som nas mídias.
35
“O papel natural do homem no século vinte é a ansiedade”.
(Norman Mailer).
36
CAPÍTULO III
A UTILIZAÇÃO DO SOM NA MÍDIA
É no século XX que se desenvolvem os meios de comunicação. O cinema, o rádio,
a televisão, o vídeo, a Internet, o computador utilizam em sua expressão o som e, com exceção
do rádio, que é substancialmente sonoro, os outros são audiovisuais. Mas sua “força divina” é a
imagem, e o som, seu companheiro fiel. Todos estes meios, cada um ao seu modo, atingem as
diversas culturas sem discriminação alguma. No transcorrer do século, os meios audiovisuais
foram usados ativamente em diversos acontecimentos sociais, políticos, religiosos, esportivos,
culturais, etc., e em alguns momentos, seu papel foi primordial no desenrolar dos fatos.
(SALINAS, 1994, p. 28).
3.1 RÁDIO, O PRÓPRIO SOM
O rádio é o único meio de comunicação de massas que se utiliza apenas do som em
sua expressão. O rádio possui a exclusividade da magia sagrada do som.atribui-se seu poder
justamente à ausência da imagem, poder este que reside na sua capacidade de ativar a
imaginação visual, onde nada é visto, somente ouvido, e a mente de cada um encarrega-se de
criar as imagens que correspondem ao som. Enquanto o cinema sofreu o trauma do sonoro, o
rádio não sofreu nada parecido, ele é “só” rádio. Na civilização da imagem ele é um
transgressor, um intruso, algo difícil de ser entendido e apreciado dignamente. Ao ponto que,
no universo acadêmico, o rádio é tido como um meio “menor”, algo “simples” e “popular”.
Basta conferir o espaço para o rádio nos currículos de Comunicação Social.
O rádio é um meio de e para o público. O realizador elabora os programas
pensando essencialmente nos receptores. O rádio, então, é um bem de todos. Sua força e
popularidade são difíceis de serem mensuradas dada a sua diversidade, complexidade e
simplicidade. Os custos de instalação e manutenção fazem com que dificilmente uma cidade,
por menor que seja, não possua uma emissora e, mas difícil ainda, é encontrar uma pessoa que
não tenha como usufruir de um radinho de pilhas. Sua diversidade pode ser constatada em uma
grande cidade onde um ouvinte pode sintonizar centenas de emissoras entre as ondas curtas,
médias e longas. Ao movimentar o “dial” entra-se em contato com quase todos os estilos
musicais; passa-se pelas informações que vão desde seu bairro até o que acontece em qualquer
37
lugar do planeta. A valorizada segmentação em públicos específicos dos meios atuais já era
uma realidade do rádio após a Segunda Guerra Mundial.
A complexidade do rádio evidencia-se ao serem analisados os conceitos modernos
de velocidade e fragmentação. A velocidade perceber-se a capacidade de modificar-se
acompanhando as mudanças históricas e na agilidade para renovar e conservar as informações.
A fragmentação encontra-se na já anotada segmentação das emissoras, cada uma
especializando-se em públicos diferenciados. Outra característica de sua complexidade reside
em sua indeterminada capacidade de emocionar uma ou milhares de pessoas de maneira
simultânea. O rádio guarda em sua história duas passagens da mobilização da população de um
país que sempre são destacadas quando se quer demonstrar o poder avassalador dos meios: a
primeira, sua utilização como arma de propaganda nazista durante o governo de Adolf Hitler
na Alemanha, e a Segunda o programa de ficção A Guerra dos Mundos com que Orson Welles
aterrorizou os Estados Unidos em 1938. Destaca-se nestes dois fatos que a televisão ainda não
era um meio popular e o rádio desempenhava o papel de lazer noturno da população.
A simplicidade do rádio está resguardada nos elementos de sua expressão em sua
relação com os receptores. Com uma combinação “somente” de falas, efeitos sonoros e
músicas, realizada com baixo custo em um número reduzido de profissionais, o rádio ainda é,
entre todos os meios de comunicação, a melhor companhia cotidiana das pessoas. A
passividade aparente do ouvir deixa livre o resto do corpo para exercer outras atividades da
vida: cozinhar, dirigir um carro, correr, tomar banho, escrever, etc. Contudo, o rádio também é
utilizado como um escudo sonoro que protege e isola da confusão sonora da cidade ou do
inquietante silêncio esmagador. Para o receptor, o som do rádio é um ponto significante da
audição no domínio da imagem.
3.2 O SOM NA TELEVISÃO
Quando têm início suas transmissões regulares, a televisão emite seus sinais com
imagens e som e, diferente do cinema, ela já nasce audiovisual. Como o rádio, a televisão
instala-se no cotidiano das pessoas, mas traz consigo o poder da imagem aliado ao som. A
civilização da imagem parecia ter encontrado o meio de comunicação ideal para levar todas as
imagens do mundo até a casa de todos e cada um, e até o final dos anos oitenta cumpriu esse
papel. Na atualidade, o computador está tomando seu lugar de meio ideal. Entretanto, ela não
se limitou a cumprir esse papel, a televisão é também considerada o mais influente meio da
história. Seu funcionamento é rigorosamente legislado pelo Estado dos mais diversos países e o
38
controle de cada canal é disputado por todas as formas de poder, desde os inúmeros ideais
políticos até os diversos grupos religiosos.
A televisão, assim como rádio, deve sua popularidade à diversidade de canais,
programas, gêneros, realizadores, públicos, etc.; à sua complexidade de fragmentação e
velocidade de adequação às mudanças históricas; a sua virtude de transmitir um evento ao
vivo, podendo aglomerar diante de si milhões de espectadores que, na individualidade de suas
residências, têm consciência de estar participando de uma imensa coletividade. Porém, não há
simplicidade nos elementos audiovisuais de expressão, nem nas relações com o receptor. O
domínio profissional do audiovisual na televisão requer altos investimentos econômicos com a
participação de um grande número de profissionais com equipamentos caros e sofisticados.
O receptor, por sua vez, não está liberado em sua cotidianidade. Realizar uma
atividade qualquer e assistir simultaneamente televisão obrigam o receptor a participar de um
jogo mediado pelo próprio aparelho, jogo no qual o receptor pode ouvir sem ver, mas deverá
deter sua atividade quando for incitado a olhar a tela. No som, o domínio da fala é evidente.
Com exceção de alguns programas musicais, a fala coordena todo o áudio da televisão.
3.3 O SOM NO VÍDEO
O vídeo nasce da evolução da televisão. A gravação simultânea de imagem e som
em uma fita magnética tornou-se realidade em meados dos anos cinqüenta, com o videotape.
Para a televisão, esta foi talvez a invenção mais revolucionária. Até a chegada do videotape,
quase todos os programas eram realizados ao vivo. O filme era utilizado no registro dos fatos
que não eram transmitidos ao vivo: porém, a utilização do filme era limitada pelos altos custos
e pelo tempo gasto entre a filmagem, a revelação do material, a montagem e finalmente a sua
emissão. Com as fitas de vídeo, a televisão pôde começar a gravar quase todos seus programas.
Em conseqüência disso, houve uma melhoria na qualidade dos programas, já que todos os erros
cometidos ao vivo podiam ser corrigidos.
O videotape trouxe, enfim, a modernidade tecnologia deixando para trás o
romantismo do “ao vivo”. As próprias transmissões que continuam sendo apresentadas ao vivo
foram afetadas pelo vídeo. Em um jogo de futebol, por exemplo, a fugacidade duvidosa de uma
jogada em tempo presente desaparece diante da presença infalível das câmaras ligadas a um
videotape. A repetição (ou replay), muitas vezes, ganha mais significado que o próprio fato. Na
pós-modernidade isto é associado à desreferencialização do real, na qual a representação, o
signo (neste caso, a repetição da jogada) é mais importante que a própria realidade, o referente.
39
O videotape então, não só mudou a técnica do fazer, como também a forma de ver e ouvir o
mundo através da televisão.
No final dos anos 60, com a miniaturização dos componentes eletrônicos, são
construídos os primeiros aparelhos de VHS (video home system). O videocassete, já adaptado à
televisão, configura-se em uma forma de comunicação audiovisual, afirmando-se no cotidiano
das pessoas. O vídeo começa sua corrida de sucesso nos anos 70 e já nos anos 80 está presente
na maioria dos lares, sendo também utilizado por todas as áreas do conhecimento como uma
ferramenta de grande valor.
O som (e a imagem) no vídeo herdam as características básicas da televisão e do
cinema, mas ganham uma nova dimensão na possibilidade do ouvir outra vez. A fugacidade no
ouvir dos outros meios deixa de existir no uso do vídeo. Ao assistir, pode-se voltar inúmeras
vezes a fita para ouvir e ver algo que não foi entendido ou que se quer ouvir de novo. O
receptor ganha um recurso inédito no relacionamento com o audiovisual: sua presença no ato
de assistir torna-se mais dinâmica podendo interferir à vontade na linearidade do que ouve, ou
vê.
3.4 O SOM NO COMPUTADOR
O processamento de informação digital tem seu grande desenvolvimento nos anos
80 com a geração dos PC (personal computer). O computador deixa de ser uma exclusividade
dos laboratórios de pesquisa, tornando-se parte integrante de todos os espaços da vida. Assim,
dos jogos eletrônicos às pesquisas da física nuclear, a informática eletrônica possibilitou um
avanço frenético; hoje, o que não está digitalizado não existe. A imagem e som dos meios
audiovisuais também foram afetados pela presença do computador. As modificações possíveis
na imagem e no som são quase infinitas como a tecnologia digital empregada no cinema e na
televisão. Controla-se na imagem as linhas, as cores, as formas, as superposições, etc. No som,
manipulam-se os tons, os timbres, a intensidade, as harmonias, as durações, etc. A realidade
representada pode ser totalmente alterada e/ou virtualmente recriada. Assim, não só tudo o que
existe está digitalizado na memória dos computadores, como também se cria um novo universo
virtual dentro do digitalizado.
O computador está absorvendo todos os meios de comunicação. Em um futuro
próximo, o receptor poderá ter em sua casa não um simples aparelho de HDTV, mas sim, um
sofisticado terminal de computador através do qual poderá assistir um programa de televisão,
sintonizar uma emissora de rádio, escrever uma carta, ler um artigo de jornal, vigiar o sono do
40
bebê, fazer uma ligação videofônica, etc. O relacionamento do receptor com os audiovisuais
passará por uma completa modificação: alterando-se as formas de ver e ouvir, o receptor
poderá controlar como e quando assistir um produto audiovisual digitalizado. O receptor de
hoje, no entanto, aparentemente não percebe as grandes modificações introduzidas pelo
computador nos audiovisuais. A diferença encontra-se onde imagem e som possuem maior
definição em sua tarefa de representar. Em uma telenovela, por exemplo, a iluminação, os
cenários, as roupas, os roteiros, as músicas, os sons, etc., passam pelo planejamento e
realização através do computador.
É evidente que esta tecnologia levará algum tempo até chegar aos países do
“Terceiro Mundo”, e tardará ainda mais para que as classes sociais com menor poder aquisitivo
possam comprar e usufruir essa tecnologia. A marginalização do digital está se tornando um
dos problemas chaves nas relações sociais do mundo contemporâneo: o poder concentra-se nas
mãos daqueles que têm acesso ao digital.
3.5 O SOM NOS AUDIOVISUAIS
Cada meio audiovisual possui suas particularidades de linguagem e de
relacionamento com o receptor. Entretanto, o som e a imagem possuem características que são
idênticas para todos os audiovisuais, há uma linguagem básica que é válida para todos. Para a
imagem existe uma classificação fundamental de planos, ângulos, movimentos de câmara,
composição, etc. Nessa classificação um plano geral, por exemplo, é sempre um plano geral,
não importa se ele é visto em uma gigantesca tela de cinema ou em uma pequena janela de um
monitor de computador. No som também podemos apontar algumas características básicas
válidas para todos os meios audiovisuais. Encontramos esses elementos do som no que se
refere a sua fonte, suas propriedades, sua localização com relação à imagem, ao espaço e ao
tempo.
3.6 O SOM NA PUBLICIDADE
A extensa literatura sobre televisão, disponível no Brasil, apesar de tratar de um
fenômeno áudio-visual, privilegia sempre a imagem, entendida como estímulos visuais. Esta
abordagem restrita do binômio imagem/som em movimento deriva, sem dúvida, da postura dos
críticos de cinema, desde o final da década de vinte, quando do aparecimento do cinema
41
sonoro, convencidos que estavam de que a cor, o diálogo e a música eram acessórios não
admitidos na arte cinematográfica.
Hoje, a produção do filme publicitário para televisão, passível que é da mesma
visão generalizante, tem objetivo pragmático e busca a persuasão não impondo qualquer
restrição ao uso da palavra. A comunicação verbal no comercial de TV, mesmo quando
redundante, é entendida como reforço da imagem, como na época das garotas propaganda. A
mesma sorte não teve o som enquanto música.
Os livros e manuais sobre publicidade, assim como os currículos dos cursos de
publicidade, em qualquer nível, abordam pouquíssimo a utilização dos recursos sonoros nas
mensagens publicitárias. Quando muito, a música é tratada como apêndice ou elemento
decorativo complementar da comunicação visual e da comunicação verbal, mesmo assim
perfeitamente descartável ao primeiro sinal de restrição de verbal. Isto quer dizer que apesar de
algumas trilhas serem especialmente compostas para comerciais, elas não são merecedoras de
estudos sobre a sua efetiva participação na mensagem.
Os críticos e estudiosos de música, apesar de reconhecerem na própria música a
falta de teorização ou conhecimento real, prático, da natureza e dos efeitos desta, acreditam que
“a trilha sonora dos comerciais de televisão é utilizada com cuidado microscópico, com a
finalidade de extrair, em reais, o máximo efeito dos poucos segundos de tempo pagos à
emissora de televisão pelo anunciante” (TAME, 1987, p. 28). Dessa forma, a música é
colocada no mesmo nível dos outros componentes da mensagem comercial, porquanto “sons,
música, gestos, palavras, imagens, figuras, movimentos circunscrevem o envolvimento do
consumidor no mundo dentro do anúncio” (ROCHA, 1985, p. 146). Esta sabedoria empírica
dos publicitários, gradativamente acumulada, sobre os efeitos da música é construída, segundo
os críticos, através da experimentação do método de tentativa e erro.
A psicologia demonstra que a sensibilidade do olho é muito maior que a do ouvido,
que as imagens se impõem sobre os sons com uma evidência e um poder de sugestão
muito maior, que finalmente todos os fenômenos secundários – memória,
concentração de atenção, poder discriminador do órgão sensorial, etc., e sobretudo a
velocidade psicológica das sensações subseqüentes – são extraordinariamente mais
relevantes (como intensidade e como ritmo) no caso das imagens, comparados com
mundo dos sons. (MAY apud BATAN, 1992, p. 42).
Com o assincronismo técnico nasce a possibilidade, segundo May apud Batan
(1992, p. 43), de representar realisticamente imagens e sons, segundo ritmos distintos. O sons
psicologicamente selecionados são representados ora em coincidência com a representação
ótica da fonte sonora do quadro, ora como relativos a fontes sonoras não diretamente
42
representadas neste, mas supostamente presentes na cena. Assim, de um trecho de diálogo, por
exemplo, uma parte será percebida à fonte sonora (o ator que fala) e a outra será percebida
pondo-se fora de campo – mediante o corpo e montagem – a fonte sonora, sobre o ator que
escuta. O emprego de um tal assincronismo técnico reconduz o realizador à liberdade de corte
da imagem e a um reforçamento da própria expressão cinematográfica, a que se acrescentam
novas possibilidades de linguagem. Estas possibilidades, a que se refere MAY, são a
associação e dissociação a partir da relação de causalidade entre imagens e sons: o som
causado de um efeito visual, e a visão causadora de um efeito sonoro.
No cinema, o ritmo dos sons é condicionado pelas imagens, e, portanto, pelo ritmo
da montagem ótica. Na televisão, ao contrário, é o ritmo da imagem que é condicionado por
exigências no som. A conseqüência deste fato é a de que a liberdade de corte no cinema
implica montar o som para não renunciar a idealidade fundamental de tempo e espaço, que
decorre da seqüência e ritmo das imagens na expressão cinematográfica.
Conforme quadro descrito na tese Propaganda: domínio através do som sobre o
“Resumo de diferenças técnicas e psicológicas da expressão por imagens e sons, no cinema e
na televisão, de interesse para a publicidade”, descreve-se abaixo apenas duas relações:
RELAÇÕES CINEMA TELEVISÃO
Ritmo imagem-som Imagem condiciona ritma do Som condiciona ritmo da
Som. imagem.
Ponto de vista do espectador Objetividade das imagens. (O Subjetividade das imagens. (O
espectador ignora a existência protagonista fala diretamente
da câmera e microfone). com o espectador). O olho
do espectador é a câmera.
Figura 2 – Resumo de diferenças técnicas e psicológicas da expressão por imagens
e sons, no cinema e na televisão, de interesse para a publicidade.
Fonte: BATAN (1992, p. 53).
Para Batan (1992) o comercial de televisão ou filme publicitário para a televisão,
por ser uma combinação de elementos capazes de, mesmo isolados, transmitirem uma
mensagem, assim, como, dadas as características diferenciadoras da forma de expressão em
dois meios de comunicação distintos, apresenta-se como a síntese da dificuldade de adaptação
para transmitir uma mensagem utilitária através de sons e imagens. Ao mesmo tempo que o
filme publicitário parece, pelo menos em parte, aproveitar a linguagem do cinema – escrever
43
por imagens –, precisa respeitar as convenções estabelecidas entre o meio televisão e o
telespectador – falar por imagens.
No próximo capítulo aprofundaremos a questão da utilização do som na
publicidade.
44
“As pessoas querem ser enganadas, deixe-as serem
enganadas”.
(Cardeal Carlo Carafe ao Papa Paulo IV)
45
CAPÍTULO IV
A UTILIZAÇÃO DO SOM NA COMUNICAÇÃO
4.1 PUBLICIDADE
A publicidade tem dois objetivos simples e mensuráveis – aumentar o número de
consumidores e a quantidade que eles consomem. O sucesso ou o fracasso geralmente são
medidos em relação a estes dois critérios. (KEY, 1996, p. 76).
Fundada sobre a égide do verbo imperativo, a publicidade pode ser entendida como
um ato de comunicação cujos signos estão organizados de maneira a produzir um semantema
específico: a crença no consumo. Em outras palavras:
1) conforme citado por Bigal (1993) a publicidade torna pública a existência de
determinados produtos, marcas e serviços;
2) a publicidade desperta o desejo pela coisa anunciada, ao levar ao
conhecimento público tais fatos mercadológicos;
3) a publicidade é de massa;
4) a publicidade é não apenas discurso sobre o objeto anunciado (produtos,
marcas, serviços) mas também o próprio objeto e, portanto “duplo objeto”.
As relações associativas entre esses elementos podem ser verificadas em duas
situações: primeiro, quando o imperativo, isto é, o discurso lógico-linear e simbólico estrutura
a peça publicitária; segundo, quando a própria mensagem é o fator de predominância da peça.
A seguir procuraremos explanar a citação de Bigal (1993).
Uma seleção de signos realizada por um emissor dentro de um repertório de público
receptor determinado, é o instrumento do qual a publicidade se utilizada para tornar pública a
existência de determinados produtos, marcas ou serviços.
A publicidade desperta o desejo pela coisa anunciada, gerando o descompasso entre
as reais necessidades do sujeito e aquilo que ele passa e deseja ter e aquilo que passa e deseja
ser. O instrumento dessa força de atração, gerada pelo consumo é chamada de desejo pela
psicanálise, é a fantasia, que se materializa em signos na peça publicitária.
46
A mira da publicidade é direcionada a um determinado segmento de público no
target. Em um país como o Brasil, por exemplo, essa contradição acentua-se na medida em que
aquele que produz nem sempre é consumidor de sua própria produção. As mercadorias são
produzidas para pequenos grupos que, somados, podem ou não garantir essa produção, o que
vale dizer: a massa consome mais simbólica do que efetivamente. A linha demarcatória que
distingue a noção de público da noção de massa se mostra aqui bastante clara: a ação integrada
e a unidade compactuada, fundadas na formação de opinião, que desenham o percurso social
do público, sequer rascunham o percurso social da massa.
A publicidade não é apenas discurso sobre objetos (produtos, marcas e serviços),
mas também o próprio objeto de consumo, e, portanto, um duplo objeto. Isto quer dizer que, ao
expor produtos, marcas e serviços, a publicidade também se expõe como um sistema de crença
bastante definida: a crença no consumo. O objeto de consumo não é um fim em si mesmo, mas
do consumo – desejo de consumir – que revela-se interesse subjacente muito mais importante
que o próprio objeto.
4.2 PUBLICIDADE: COMUNGAR PARA COMUNICAR
O filme publicitário é resultado da combinação de recursos técnicos e artísticos, de
imagem em movimento e som, sintetizados em trinta segundos, com o objetivo de persuadir
um público específico, através de mensagem comercial. A exibição deste filme tem como
finalidade obter, deste público, uma mudança de atitude propícia a criar nele comportamento
que o predisponha à compra. (BATAN, 1992, p. 71).
Para conseguir seu intento, de alguma forma, é necessário comungar para
comunicar. Para fazer passar uma mensagem entre o emissor e o receptor é necessário um
código, reconhecido por ambos. E para convencer é preciso ser compreendido, o que supõe um
mínimo de cumplicidade cultural com o público visado.
Para alcançar seus propósitos, a publicidade se utiliza de uma forma própria de
aliança entre a imagem e o som, numa mensagem de dupla leitura. Uma leitura convencional,
pelos escritos e falas utilizados, e outra natural, pelas representações. As duas leituras,
heterogêneas entre si, mas integradas, remetem necessariamente uma à outra: “a seqüência
figurativa só toma um sentido em relação à cadeia sintagmática, que, em retorno, naturaliza seu
arbítrio cultural por uma mediação imaginativa”. (LAGNEAU, 1974, p. 119).
47
4.3 O SOM PUBLICITÁRIO EM BUSCA DA PERSUASÃO
Esse é exatamente o caso dos filmes publicitários que, para conseguir a persuasão
do receptor, se apóiam no que Leduc apud Batan (1992) chama de “mecanismo de sugestão”.
Esse mecanismo está em contraposição ao “mecanismo de racionalização”, que é construído
sobre uma linha de raciocínio, e mesmo ao “mecanismo automático”, que se baseia na
repetição da marca buscando um reflexo mental.
O mecanismo de sugestão parte do princípio de que a persuasão pode ser obtida por
meios que façam apelo aos sentidos.
A mensagem verbal, que se alimenta de símbolos, é, em certos casos, mais eficaz do
que a que se inspira em palavras e na lógica. Ela substitui o pensamento lógico,
mantido e provocado pela linguagem, por um pensamento sensível, capaz de fazer
sentido com intensidade e no momento exato com a nuança mais sutil. (LEDUC,
1972, p. 58).
A comunicação do filme publicitário, a exemplo do que acontece com a televisão, é
oral-auditiva-visual. E a beleza de um texto não entra pelos olhos, entra pelos ouvidos,
portanto, o que importa são suas qualidades sonoras (PLAZA apud BATAN, 1992, p. 82).
Além disso, a possibilidade que existe da imagem evocar sons e da mesma forma dos sons
evocarem imagens, abre, neste mecanismo de sugestão, múltiplos recursos que propiciam à
mensagem publicitária passar um conceito de produto para o receptor, prescindindo da
linguagem verbal.
Ver com os olhos como ver com os ouvidos sugere uma diferença fundamental
entre o canal visual e o acústico, como nos demonstra Júlio Plaza apud Batan (1992, p. 82):
O primeiro, pode escolher e selecionar a informação, isto é, pode eliminar a
informação de seu campo de amostragem. Já o canal acústico é obrigado a percebe
em simultaneidade várias sucessividades. Outra diferença: o canal visual pode
escolher a sua fonte de informação, o canal auditivo tem mais dificuldade em
localizar sua fonte. A univocidade do canal visual opõe-se à ambigüidade do canal
áudio. O que se vê em oposição ao que se sabe e sente. Daí a fotografia como
documento, em oposição ao mundo oral, ao mito. Ver para crer é o lema ocidental.
O publicitário considera o audiovisual publicitário muito mais visual do que áudio.
Ele considera “a possibilidade de concentrar o vídeo, fixar o vídeo no produto, num objeto, ou
numa série de objetos e desenvolver a argumentação pelo áudio. Deixar ao áudio a persuasão, o
arremate, a moral da história” (BARRETO, 1978, p. 247). Num outro discurso, no mesmo
sentido, Barreto afirma que “quem compra e compreende não é o ouvido, mas a vista. A
conseqüência direta será que nós vamos tentar vender apelando para a vista, tendo mais
48
confiança naquilo que mostramos do que naquilo que dizemos”. (JOANNIS apud BATAN,
1992, p. 82).
Este posicionamento privilegiando a imagem em detrimento do som deriva do fato
de estar associando som com fala, linguagem verbal portanto, e não com a música ou ruídos,
que também estão fora do conceito de expressão, assim, da mesma forma que a imagem, estão
destinados aos sentidos e não à razão.
Neste sentido, o mesmo discurso utilizado para a imagem poderia ser utilizado para
o som, entendido como música. E adaptando-se o que afirma Artur da Távola, sobre a televisão
para o comercial de televisão, tem-se que ambos são constituídos por palavra, música, ruídos e
imagens. Enquanto a palavra tem um caráter racionalista, pragmático, lógico, os demais têm
caráter desestruturador. Enquanto a palavra, por ser originária da razão, estrutura, convence e
persuade, a imagem e a música, por suas naturezas poetizante, dramatizante e
surrealistizante, falam um idioma independente. Natureza dramatizante enquanto traz, sem
necessidade de conceitos, a vida e o ser humano em si. Poetizante no sentido de inventar um
caminho novo e surrealistizante por poder ultrapassar as barreiras do chamado real concreto.
(TÁVOLA apud BATAN, 1992, p. 83).
4.4 O SOM NA PUBLICIDADE
Conforme discurso dos produtores de áudio citado na tese de Batan (1992, p. 96) o
Brasil, com exceções, está fazendo jingles. O som é um tanto antigo e não é a tecnologia que
vai resolver. O som não passou pela mesma evolução que a imagem. Com o tempo, a pesquisa
e o conhecimento dos músicos foi permeando a propaganda. A criatividade na música de
trilhas é maior do que na música comercial feita atualmente, pois a indústria do disco impõe
padrões rígidos. Os profissionais estrangeiros concordam que os filmes brasileiros são
superiores e estão além das trilhas. Oitenta por cento dos comerciais veiculados no Brasil são
um jingle-clip, ou jingles filmados. Em 80% dos casos o diretor de cinema solicita ao músico
apenas sublinhar a imagem, cometendo assim um sério equivoco. Uma cena romântica, por
exemplo, não exige necessariamente uma música romântica. O profissional do som deve criar,
junto com a imagem, um terceiro elemento. Esse é o elemento mágico. Quando essa magia não
ocorre é porque uma das duas coisas está errada: ou a imagem ou o som. Músico e diretor do
filme devem caminhar juntos na mesma direção. O papel do maestro é descobrir qual a música
que o filme quer ter. Não é atribuir som à imagem, mas descobrir. Pois, o filme, a partir de
dado momento, deixa de pertencer ao criador ou ao diretor: ele pertence a si mesmo. Neste
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  • 1. 1 SARA MELISSA MÜLLER OS ASPECTOS SUBLIMINARES DO ÁUDIO NA COMUNICAÇÃO – UMA ABORDAGEM INTRODUTÓRIA Trabalho de Conclusão de Curso Apresentado ao Curso de Comunicação Social – Publicidade e Propaganda, do Centro de Ciências Humanas e da Comunicação da Universidade Regional de Blumenau – FURB. Orientadora: Profª Clara Maria Von Hohendorff (MSc) BLUMENAU 2000
  • 2. 2 SARA MELISSA MÜLLER OS ASPECTOS SUBLIMINARES DO ÁUDIO NA COMUNICAÇÃO – UMA ABORDAGEM INTRODUTÓRIA Trabalho de Conclusão de Curso Apresentado ao Curso de Comunicação Social – Publicidade e Propaganda, do Centro de Ciências Humanas e da Comunicação da Universidade Regional de Blumenau – FURB. Orientadora: Profª Clara Maria Von Hohendorff (MSc). BLUMENAU 2000
  • 3. 3 OS ASPECTOS SUBLIMINARES DO ÁUDIO NA COMUNICAÇÃO – UMA ABORDAGEM INTRODUTÓRIA Por SARA MELISSA MÜLLER Monografia aprovada com “Conceito 10”, no Curso de Comunicação Social em Nível de Graduação em Publicidade e Propaganda, promovido pela Universidade Regional de Blumenau – FURB. ______________________________________________________ Presidente: Profª. Clara Maria Von Hohendorff, MSc – Orientadora, FURB ______________________________________________________ Membro: Prof. Eusébio Nicolau Kohler, FURB ______________________________________________________ Membro: Profª. Anamaria Kovács, FURB Blumenau, Junho de 2000.
  • 4. 4 “Assim eu compreendi que não há nada melhor do que a gente ter prazer no trabalho. Essa é a nossa recompensa.” (Ec 3:11)
  • 5. 5 AGRADECIMENTOS Ao meu maior e melhor amigo Jesus, quem me deu paz, segurança e amparo, enchendo-me de ânimo e coragem para enfrentar mais uma etapa, e que sempre me carregou em seu colo. A minha família que amo profundamente: ao pai, pelo apoio moral, digitação, e por ter compreendido e adiado as viagens e as trilhas de Jeep para depois; a mãe, pelo seu amor e carinho e por ser essa amiga de todas as horas; aos irmãos Tiago e Jessé, por terem liberado o quarto, pelas digitações... A Clara, pelo esforço e dedicação à orientadora, que não só orientou no sentido próprio da palavra, como também confiou nesta pesquisa introdutória. A Susan, estudiosa do assunto, pela força, sugestões, e idéias, e por ter compartilhado sua experiência. Aos chefes Romeu e Roberto, – ops! Quem tem chefe é índio –, e a todos da Free pela compreensão e apoio à pesquisa. Ao Calazans, cujo livro instigou-me num primeiro momento a eleger o tema deste trabalho e por colocar-se permanentemente à disposição no auxílio de eventuais necessidades. A todos que de uma maneira geral contribuíram para a obtenção de material para minha pesquisa, como Eusébio, Leandro, Isildinha, Andrea, Miguel, Aline... As amigas, pelo incentivo e entusiasmo e que de uma forma ou outra auxiliaram na realização deste trabalho.
  • 6. 6 SUMÁRIO CAPÍTULO I – INTRODUÇÃO.............................................................................................10 1.1 APRESENTAÇÃO DO TEMA E JUSTIFICATIVA..........................................................10 1.2 ABORDAGEM GERAL DO PROBLEMA ........................................................................11 1.3 QUESTÕES ESPECÍFICAS................................................................................................13 1.4 PRESSUPOSTOS.................................................................................................................13 1.5 OBJETIVOS DA PESQUISA..............................................................................................14 1.6 DEFINIÇÃO DE TERMOS.................................................................................................15 1.7 METODOLOGIA.................................................................................................................16 1.7.1 Tipo de pesquisa................................................................................................................16 1.7.2 Área de abrangência ..........................................................................................................16 1.7.3 Pesquisa teórica .................................................................................................................16 CAPÍTULO II – PERCEBENDO O SOM.............................................................................18 2.1 DURAÇÕES E ALTURAS DOS SONS .............................................................................19 2.2 COMPLEXIDADE DA ONDA SONORA E SUA PERCEPÇÃO .....................................20 2.3 SOM E AUDIÇÃO/SOM E RECEPÇÃO ...........................................................................21 2.4 RUÍDO .................................................................................................................................24 2.5 SILÊNCIO: SERÁ QUE SILÊNCIO É RUÍDO? ................................................................25 2.6 TIPOS DE SOM...................................................................................................................25 2.7 CONSONÂNCIA E DISSONÂNCIA .................................................................................26 2.8 MÚSICA: OUTRA MANEIRA DE FALAR.......................................................................27 2.9 O SOM NA CIVILIZAÇÃO................................................................................................30 2.10 O SOM E OS ELEMENTOS MUSICAIS .........................................................................30 CAPÍTULO III – A UTILIZAÇÃO DO SOM NA MÍDIA ..................................................36 3.1 RÁDIO, O PRÓPRIO SOM.................................................................................................36 3.2 O SOM NA TELEVISÃO....................................................................................................37 3.3 O SOM NO VÍDEO .............................................................................................................38 3.4 O SOM NO COMPUTADOR..............................................................................................39 3.5 O SOM NOS AUDIOVISUAIS...........................................................................................40 3.6 O SOM NA PUBLICIDADE ...............................................................................................40
  • 7. 7 CAPÍTULO IV – A UTILIZAÇÃO DO SOM NA COMUNICAÇÃO ...............................45 4.1 PUBLICIDADE ...................................................................................................................45 4.2 PUBLICIDADE: COMUNGAR PARA COMUNICAR.....................................................46 4.3 O SOM PUBLICITÁRIO EM BUSCA DA PERSUASÃO ................................................47 4.4 O SOM NA PUBLICIDADE ...............................................................................................48 4.5 O SOM NO CINEMA..........................................................................................................50 4.6 O SOM, SUA FONTE E A TRILHA SONORA .................................................................52 4.7 TRILHA SONORA..............................................................................................................53 4.8 TRILHA SONORA PUBLICITÁRIA .................................................................................54 4.9 A TRILHA SONORA NO CINEMA...................................................................................58 4.10 A EVOLUÇÃO DO MICKEYMOUSING........................................................................61 4.11 ANDAMENTOS DA MÚSICA DE CINEMA..................................................................62 4.12 DOIS MODOS DE OUVIR MÚSICA: ASPECTOS SENSORIAL E ESTRUTURAL ..........................................................................................................................63 4.13 MÚSICA E PERSONAGEM NO FILME .........................................................................64 4.14 O USO DRAMÁTICO DO SILÊNCIO.............................................................................65 4.15 MAX STEINER DIVIDE OS PRINCÍPIOS DE COMPOSIÇÃO, MIXAGEM E EDIÇÃO.....................................................................................................................................66 4.16 MARCEL MARTIN: OS VÁRIOS PAPÉIS .....................................................................67 4.17 ALGUNS INSTRUMENTOS DE MANIPULAÇÃO DO SOM.......................................67 4.18 ARREBATAMENTO DO EXPECTADOR ......................................................................68 CAPÍTULO V – A UTILIZAÇÃO DO SUBLIMINAR NA COMUNICAÇÃO................70 5.1 O SOM NO SILÊNCIO........................................................................................................72 5.2 JINGLES SUBLIMINARES................................................................................................76 5.3 CATEGORIAS DE ESTRATÉGIAS SUBLIMINARES, POR KEY.................................77 5.3.1 Inversão de figura/fundo....................................................................................................77 5.3.1.1 Inversões auditivas de figura/fundo................................................................................77 5.3.1.2 Percepções de gênios, conforme exemplo de Key (1996)..............................................78 5.3.2 O método de embutir imagens...........................................................................................80 5.3.3 Duplo sentido.....................................................................................................................80 5.3.4 Projeção taquiscoscópica...................................................................................................82 5.3.5 Luz de baixa intensidade e som de baixo volume .............................................................82
  • 8. 8 5.3.5.1 Segurança por meio de subliminares..............................................................................84 5.3.6 Luz e som de fundo ...........................................................................................................84 5.4 MENSAGENS SECRETAS EM DISCOS ..........................................................................85 5.5 PERCEPÇÃO NA COMUNICAÇÃO.................................................................................89 CAPÍTULO VI – COMO PERCEBER E RESISTIR AO SUBLIMINAR.........................92 6.1 MEMÓRIA E ESTÍMULOS SUBLIMINARES .................................................................93 6.2 LIMITE PERCEPTIVO .......................................................................................................93 6.3 MÍDIA: CATIVEIRO DE MENTES? .................................................................................94 6.4 KEY E OS PASSOS PARA A RESISTÊNCIA...................................................................97 CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................................................99 REFERÊNCIAS .....................................................................................................................103
  • 9. 9 “A palavra certa na hora certa é como maçãs de ouro com enfeites de prata”. Pv. 25.11
  • 10. 10 CAPÍTULO I INTRODUÇÃO 1.1 APRESENTAÇÃO DO TEMA E JUSTIFICATIVA O tema deste trabalho visa estudar a existência de mensagens subliminares no áudio, uma vez que é grande a falta de conhecimento na história do uso dos sons na comunicação pela maioria dos indivíduos. A importância da percepção subliminar na música é uma reflexão relevante para os dias atuais. É um tema tão explorado em telenovelas, cenário de filmes, teatros, comerciais e ao mesmo tempo desconhecido em nossa sociedade de maneira geral. Cerca de 90% dos estudos e pesquisas realizados na área de percepção subliminar referem-se à comunicação visual e 87% da nossa arquitetura cerebral destina-se ao processamento de informação visual (CALAZANS, 1992). O questionamento desse trabalho é na área dos sons. São eles menos eficazes na comunicação que as imagens, ou mais difíceis de serem detectados ou mesmo analisados? Não foi apenas o enorme déficit bibliográfico que existe na propaganda subliminar no áudio que levou-nos a buscar, através da investigação, mas também, entender as reações pessoais que sempre indicavam respostas em nosso íntimo, como a intuição, o sentido e os sonhos, por exemplo. O conteúdo de nossos sonhos é composto de informações subliminares conforme a “Lei de Exclusão” de Poetzle (POETZLE apud CALAZANS, 1992). Alguma coisa há por trás de tudo isto, pois até a própria intuição é algo subliminar como nos ensina a psicanálise. As rápidas intuições que geram nossas decisões seriam fruto de conteúdos subliminares. Para que este trabalho surgisse enquanto proposta, foi indispensável a existência de uma relação de amor pelo objeto de estudo, bem como tudo que o rodeia − a mente no tocante ao inconsciente coletivo é um dos componentes que o formam, o som. Ao se deparar com trilhas sonoras em filmes da Disney, por exemplo, um grande impulso sobrevinha, provocando completa interação e levando a tal conexão com os mesmos que assaltava a idéia de como eles seriam sem o áudio, visto que milhões de pessoas no mundo vêem estes desenhos. Não só crianças, mas um público que abrange todas as faixas etárias e se dissemina por todas as camadas sociais.
  • 11. 11 Verifica-se a importância do conhecimento técnico e dos inovadores recursos que hoje temos disponíveis para que se alcance o objetivo mais eficazmente. Não se pode imaginar um filme ou comercial sem som. Mesmo que seja mudo, tem um objetivo de ser. “Há sons no silencio, dando ordens, sugestionando, manipulando” (CALAZANS, 1992, p. 54). O presente estudo busca investigar os aspectos subliminares no áudio, haja visto que existe um enorme déficit de material pertinente ao assunto. O objetivo é tentar obter o conhecimento máximo deste tema, deslindá-lo em todos os seus aspectos, saber de que forma ele interage com o público, e compartilhá-lo com os que estão anestesiados pelos seus efeitos potencialmente deletérios, uma vez que o dia-a-dia testemunha um bombardeamento sensorial tornando-se difícil conceber que todas as sensações, simultaneamente recebidas, sejam conscientes. Este trabalho poderá contribuir para o despertar crítico dos profissionais da área de comunicação, psicólogos e músicos. 1.2 ABORDAGEM GERAL DO PROBLEMA A publicidade se utiliza de sinais na comunicação produzidos tecnicamente, sem que o receptor o perceba, sendo então a mensagem enviada de forma disfarçada e oculta com o objetivo de não ser percebida conscientemente. “Estamos à mercê de influencias sobre as quais não temos conhecimento consciente e, virtualmente, não temos nenhum controle consciente”. (ROSENTHAL apud KEY, 1996, p. 27). Conforme Calazans (1993) em sua tese de doutorado, a exposição repetida ao estímulo subliminar influencia as atitudes ou decisões posteriores, conforme provado cientificamente por Poetzle, Key, Cuperfain e Clarke, entre outros cientistas da Neurofisiologia, Gestalt e Psicologia Experimental. Os princípios científicos de percepção são empregados na Propaganda por publicitários com o objetivo de influenciar a atividade psíquica do público-alvo, procurando forçar inconscientemente a decisão de compra ou mudança de comportamento. “Nada é eliminado do inconsciente, nada é superado ou esquecido”. (FREUD apud KEY, 1996, p. 27). Calazans (1993), louvando-se no artigo “Subliminal Messages” – publicado na edição n. 40, de novembro de 1985 da revista American Psychologist – diz que os efeitos da estratégia subliminar podem se fazer tardios, ou seja, não imediatos, o que significa que neste
  • 12. 12 período gestacional o desejo de aquisição do produto oferecido pode ainda não estar manifesto, impondo-se o transcurso do tempo de que se fala até que os resultados sejam alcançados. Key (1977) também explica em “Media Sexploitation” que Freud, provou cientificamente, empregando o taquicoscópio e a hipnose, que as percepções subliminares podem evocar sonhos e mesmo ações, atos de escolha, dias, até mesmo semanas, após a exposição ao subliminar. Isto significa que a exposição a qualquer uma das técnicas subliminares pode motivar a qualquer momento atos do sujeito exposto, desde imediatamente após receber o sinal, ou até dias ou semanas após. Calazans (1992) diz que os limites das aplicações subliminares nas mídias, aparentemente, são limites da criatividade humana, haja visto que são empregados os subliminares em cinemas, televisão, outdoors, rádios, revistas, sinais olfativos, entre outros. Pode-se então aplicar os cinco sentidos subliminarmente como olfato, visão, paladar, tato e audição. Afirma também que: Uma população exposta a subliminares, teleguiada, que se veste, comporta-se, consome produtos, serviços, crenças, religiões, ideologias e vota em eleições levada por sugestões externas, subliminares, não pode ser considerada uma forma de vida inteligente, adaptada, autônoma [...]. A omissão e a passividade configuram isto, sendo possível pecar por omissão. (CALAZANS, 1992, p. 96). As técnicas subliminares multimídias estão sendo desenvolvidas e aperfeiçoadas a cada dia, combinando tecnologias sinestesicamente, em infinitas possibilidades em áudio, vídeo e outros sentidos. A tendência das novas tecnologias de comunicação que se encontram emergentes é explorar mais e mais os limites e fronteiras, os limiares da percepção e de processamento sinestésico de informação do cérebro. Diversos teóricos da comunicação afirmam estarmos na era da imagem, desde os anos 50, privilegiando assim a área da comunicação visual. Todavia, Key apud Calazans (1992) em seu primeiro livro “Subliminal Seduction” afirma que os subliminares são relativamente fáceis de plantar em ambas as áreas, de imagens ou de sons, em baixo volume em diversas faixas de som e velocidade inaudíveis pelo ouvido humano no nível consciente, causando reações subliminares facilmente comprováveis. Pode-se pegar como exemplo que o coração humano bate a 72 pulsações por minuto e musicas ou vozes neste ritmo afetam o comportamento humano. Ou seja, a Gestalt pode servir de exemplo para o presente caso, sendo classificada como fundo subliminar inaudível.
  • 13. 13 No Brasil, não existe lei alguma proibindo expressamente qualquer modalidade de propaganda subliminar. Nem a projeção taquicoscópica, nem os iconesos ou os sons subliminares são proibidos, quanto mais as variações sutis de engenharia emocional ou o envolvimento na narrativa que manipula crenças e cognições. 1.3 QUESTÕES ESPECÍFICAS 1) qual o poder subliminar do áudio nos indivíduos? 2) quais sons são utilizados para se comunicar de forma subliminar? 3) quais são os passos que podem diminuir a vulnerabilidade humana à manipulação da mídia? 1.4 PRESSUPOSTOS O subliminar no áudio atua em vários aspectos nos indivíduos fazendo com que os mesmos consumam determinados produtos, idéias e muitas vezes manipulando suas formas de pensar e agir sem que os mesmos o percebam. Sempre que a luz ou o som de fundo invadem nossa percepção consciente, eles tornam-se distrações e prejudicam a percepção do todo diminuindo o senso crítico do ouvinte e aumentando sua suscetibilidade à manipulação. A música pode ser acrescentada para dar a ênfase dramática, criar suspense ou expectativa no público para a ação seguinte a uma cena, por exemplo. Vários sons podem ser utilizados para se comunicar de forma subliminar variando de acordo com o contexto em que é inserido e embutido. Todos os sons podem ter uma razão de ser, até mesmo o silêncio. Os silêncios também são uma dimensão de som. Há dúzias de silêncios eletrônicos diferentes, cada um deles produzindo uma reação definida no receptor. Sons e silêncios podem ser alternados, criando um pelotão de efeitos para o público. Estes sons e silêncios, quando bem combinados não são percebidos conscientemente. Em uma propaganda para a televisão tomando como exemplo, o receptor percebe antes a imagem, e o áudio neste contexto seria classificado como “música de fundo” pois há muitas informações sendo transmitidas em um pequeno espaço de tempo. Esses elementos que ficam em segundo plano seriam um fundo subliminar. O som mais baixo e menos detectável é o que influência subliminarmente o comportamento de forma mais eficaz. Ou melhor, todos os sons que não são percebidos conscientemente, atuam de forma subliminar.
  • 14. 14 Uma forma de “fugir” da manipulação, ou diminuir a vulnerabilidade humana, seria procurar analisar cada aspecto individualmente sobre determinada trilha ou som; treinar e praticar, ver, ouvir e sentir de diversos ângulos o que provém da mídia; estar alerta e desconfiar de toda e qualquer forma de comunicação; observar as atitudes internas dos indivíduos e os porquês que os levam a consumir; ler, investigar e obter uma análise crítica do material pertinente ao assunto. Frente a uma propaganda publicitária e a qualquer som suspeito de apresentar no seu conteúdo mensagens subliminares, deve-se tentar primeiramente buscar um relaxamento seguido de uma análise global e genérica. Ato contínuo, buscando nenhuma área de interesse específica em particular, deve-se prestar atenção não só na imagem mas também no áudio, tantas vezes quantas se fizerem necessárias, observando cada linha melódica, cada som, checando todos os mínimos detalhes, cuja desordem aparente possa servir de camuflagem e disfarce para uma mensagem subliminar. Deve-se, portanto, prestar a máxima atenção aos fundos e a tudo o que possa parecer sem nenhum relevo em primeira instância. A suscetibilidade aos estímulos subliminares geralmente depende da tensão, ansiedade ou preocupação de um indivíduo ou grupo. Deve-se tentar descobrir o que não é discutido, estudado e examinado criticamente ignorando o que está na superfície, que todos percebem, discutem e acham ameaçador. Uma técnica produtiva para descobrir algo de novo é justamente não procurar nada de novo. Ao contrário, procurar algo que está por aí faz tempo, que é tido como certo, que é tão óbvio que permanece sem ser visto ou descoberto, reprimido ou escondido do público, intencionalmente ou não. 1.5 OBJETIVOS DA PESQUISA O objetivo geral da pesquisa é construir um estudo exploratório à cerca do subliminar do áudio na comunicação. Os objetivos específicos são: 1) mostrar a existência da mensagem subliminar sonora e suas conseqüências para o receptor; 2) analisar como os sons são utilizados para se comunicar de forma subliminar; 3) estudar o poder de manipulação que as músicas exercem sobre os indivíduos;
  • 15. 15 4) buscar alternativas para diminuir e prevenir a vulnerabilidade humana à manipulação da mídia. 1.6 DEFINIÇÃO DE TERMOS Iconesos: neologismo composto pelas palavras gregas icone – imagem – e eso – dentro. Refere-se a técnica de embutir imagens dentro da imagem, obtendo efeitos, reações involuntárias e inconscientes no consumidor/cidadão, conforme Calazans (1993). Percepção: (segundo Dic. Aurélio) ato, efeito ou faculdade de perceber. Perceber: (segundo Dic. Aurélio) 1. Adquirir conhecimento de, por meio dos sentidos. 2. Formar idéia de; abranger com inteligência, entender, compreender. 3. Conhecer, distinguir, notar. 4. Ouvir 5. Ver bem 6. Ver ao longe, divisar, enxergar. Subliminar: qualquer estímulo abaixo do limiar da consciência. Calazans (1992) também propõe uma fórmula esquemática para explicar o subliminar: SUBLIMINAR: > QUANTIDADE DE INFORMAÇÃO < TEMPO DE EXPOSIÇÃO Taquicoscópio: tipo de projetor de slides em alta velocidade. O taquicoscópio chega a projetar um único slide na velocidade de 1/3000 de segundo. No cinema, é colocado ao lado do projetor do filme – cuja projeção é ao ritmo de 24 fotogramas por segundo – e fica repetindo a imagem sobreposta ao filme – a cada cinco segundos para dar a ilusão de movimento (CALAZANS, 1992).
  • 16. 16 1.7 METODOLOGIA 1.7.1 Tipo de pesquisa Após delimitar o tema, buscou-se embasamento teórico através de pesquisa bibliográfica tendo como finalidade conhecer as diferentes formas de contribuição científica que se realizaram sobre o assunto delimitado. Procurou-se identificar os autores que tenham algum trabalho consistente acerca deste tema, haja visto que o material disponível sobre o assunto é limitado e na maioria em outra língua. 1.7.2 Área de abrangência A pesquisa abrangerá a área de Comunicação Social e a área de Psicologia em Comunicação. 1.7.3 Pesquisa teórica Conforme objetivo proposto, serão pesquisados livros de especialistas da área, consultas a sites de internet, pesquisa de estudos científicos, revistas abordando o assunto. Os dados serão analisados e organizados, concretizando o corpo de texto teórico da pesquisa. Será feito um levantamento bibliográfico realizado pelo COMUT – Programa de Comutação Bibliográfica – possibilitando a obtenção de cópias de documentos existentes em bibliografias brasileiras integradas ao programa.
  • 17. 17 “O som é um objeto subjetivo, que está dentro e fora, não pode ser tocado diretamente, mas nos toca com uma enorme precisão”. (J. Miguel Wisnik, 1999)
  • 18. 18 CAPÍTULO II PERCEBENDO O SOM A ciência nos ensina que o som é onda, que os corpos vibram, que essa vibração se transmite para a atmosfera sob a forma de uma propagação ondulatória, que o nosso ouvido é capaz de captá-la e que o cérebro a interpreta, dando-lhe configurações e sentidos. Representar o som como uma onda significa que ele ocorre no tempo sob a forma de uma periodicidade, ou seja, uma ocorrência repetida dentro de uma certa freqüência. “O som é um objeto subjetivo, que está dentro e fora, não pode ser tocado diretamente, mas nos toca com uma enorme precisão” (HEGEL apud WISNIK, 1999, p. 29). Para Wisnik (1999), as propriedades ditas dinamogênicas do som tornam-se, assim, demoníacas, o seu poder, invasivo e às vezes incontrolável, é envolvente, apaixonante e aterrorizante. Entre os objetos físicos, o som é o que mais se presta à criação de metafísicas. As mais diferentes concepções do mundo, do cosmos, da harmonia entre o visível e o invisível, entre o que se apresenta e o que permanece oculto, se constituem e se organizam através da música. O som é o produto de uma seqüência rapidíssima e geralmente imperceptível de impulsões e repousos, de impulsos que se representam pela ascensão da onda e de quedas cíclicas desses impulsos, seguidas de sua reiteração. A onda sonora, vista como um microcosmo, contém sempre a partida e a contrapartida do movimento, num campo praticamente sincrônico já que o ataque e o refluxo sucessivos da onda são a própria densificação de um certo padrão do movimento, que se dá a ouvir através das camadas de ar. Não é a matéria do ar que caminha levando o som, mas sim um sinal de movimento que passa através de matéria, modificando-a e inscrevendo nela, de forma fugaz, o seu desenho. (WISNIK, 1999, p. 18). Em termos mais digitais do que analógicos, pode-se dizer que a onda sonora é formada de um sinal que se apresenta e de uma ausência que pontua desde dentro, ou desde sempre, a apresentação do sinal. O tímpano auditivo registra essa oscilação como uma série de compressões e descompressões. Sem este lapso, o som não pode durar, nem sequer começar. Não há som sem pausa. O tímpano auditivo entraria em espasmo. O som é presença e ausência, e está, por menos que isso apareça, permeado de silencio. Há tantos ou mais silêncios quantos sons no som, e isso se pode dizer, com John Cage, que “nenhum som teme o silêncio que o extingue”. (CAGE apud WISNIK, 1999, p. 18).
  • 19. 19 Mas também, de maneira reversa, há sempre som dentro do silêncio: mesmo quando não ouve-se os barulhos do mundo, fechados numa cabine à prova de som por exemplo, ouve-se o barulhismo do próprio corpo produtor/receptor de ruídos. Refere-se aqui à experiência de John Cage, que se tornou a seu modo um marco na música contemporânea, e que diz que, isolados experimentalmente de todo ruído externo, escuta-se no mínimo o som grave da nossa pulsação sanguínea e o agudo do sistema nervoso. Será vista em seguida esta questão com maior detalhe. Para o mesmo autor, os sons podem também ser considerados emissões pulsantes, que são, por sua vez, interpretadas segundo os pulsos corporais, somáticos e psíquicos. As músicas se fazem nesse ligamento em que diferentes freqüências se combinam e se interpretam porque se interpenetram. A terminologia tradicional associa o ritmo à categoria do andamento, que tem sua medida média no andante, sua forma mais lenta no largo, e as indicações mais rápidas associadas já à corrida afetiva do “allegro” e do “vivace”, os andamentos se incluem um gradiente de disposições físicas e psicológicas. Assim, também, um teórico do século XVIII sugeria que a unidade prática do ritmo musical, o padrão regular de todos os andamentos, seria o “pulso de uma pessoa de bom humor, fogosa e leve, à tarde!” (QUANTZ apud WISNIK, 1999, p. 19). 2.1 DURAÇÕES E ALTURAS DOS SONS De acordo com Wisnik (1999) o som grave, como o próprio nome sugere, tende a ser associado ao peso da matéria, com os objetos mais presos à terra pela lei da gravidade, e que emitem vibrações mais lentas, em oposição à ligeireza leve e lépida do agudo. O ligeiro, como no francês léger, está associado à leveza. Este dado é relevante ao publicitário no momento de criação e composição de um comercial para algum produto ou serviço específico, onde é importante a escolha correta da altura da música na trilha sonora de um comercial. Quando, por exemplo, se quer transmitir leveza a algum produto em que se esteja divulgando, poderá ser utilizado sons e instrumentos agudos, associando assim ao peso da matéria, conforme Wisnik comenta em seu livro. No entanto, é preciso lembrar que, em música, ritmo e melodia, durações e alturas se apresentam ao mesmo tempo, um nível dependendo necessariamente do outro, um funcionando como o portador do outro. É impossível a um som se apresentar sem durar, minimamente que seja, assim como é impossível que uma duração sonora se apresente
  • 20. 20 concretamente sem se encontrar numa faixa qualquer de altura, por mais indefinida e próxima do ruído que essa altura possa ser. Serão vistas as propriedades do som com maior detalhe. 2.2 COMPLEXIDADE DA ONDA SONORA E SUA PERCEPÇÃO Há mais essa peculiaridade que interessa ao entendimento dos sentidos culturais do som: ele é um objeto diferenciado entre os objetos concretos que povoam o nosso imaginário porque, por mais nítido que possa ser, é invisível e impalpável. O senso comum identifica a materialidade dos corpos físicos pela visão e pelo tato. Estamos acostumados a basear a realidade nesses sentidos. A música, sendo uma ordem que se constrói de sons, em perpétua aparição e desaparição, escapa à esfera tangível e se presta à identificação com uma outra ordem do real: isso faz com que se tenha atribuído a ela, nas mais diferentes culturas, as próprias propriedades do espírito. O som, para Wisnik (1999), tem um poder mediador, hermético: é o elo comunicante do mundo material com o mundo espiritual e invisível. O seu valor de uso mágico reside exatamente nisto: os sons organizados nos informam sobre a estrutura oculta da matéria no que ela tem de animado. Não há como negar que há nisso um modo de conhecimento e de sondagem de camadas sutis da realidade. Assim, os instrumentos musicais são vistos como objetos mágicos, fetichizados, tratados como talismãs, e a música é cultivada com o maior cuidado. Mexendo nessas dimensões, a música não refere nem nomeia coisas visíveis, como a linguagem verbal faz, mas aponta com uma força toda sua para o não-verbalizavel; atravessa certas redes defensivas que a consciência e a linguagem cristalizada opõem à sua ação e toca em pontos de ligação efetivos do mental e do corporal, do intelectual e do afetivo. Por isso mesmo é capaz de provocar as mais apaixonantes adesões e as mais violentas recusas. Todos esses fatores devem ser levados em conta na hora de se compor uma trilha musical. Para Avron apud Wisnik (1999), o ritmo está na base de todas as percepções, pontuadas sempre por um ataque, um modo de entrada e saída, um fluxo de tensão/distensão, de carga e descarga. O feto cresce no útero ao som do coração da mãe, e as sensações rítmicas de tensão e repouso, de contração e distensão vêm a ser, antes de qualquer objeto, o traço de inscrição das percepções. Por isso, pode-se também dizer que a música, linguagem não referencial que não designa objetos, não tem a capacidade de provocar medo, mas sim a de provocar angústia ligada, segundo Freud, a um estado de expectação indeterminada, que se dá na ausência do objeto. O texto de Freud a que o autor se refere é “Inhibition, symptôme et angoisse” (Paris, PUF, p. 94). “Isso dá a música um grande poder de atuação sobre o corpo e a
  • 21. 21 mente, sobre a consciência e o inconsciente, numa espécie de eficácia simbólica”. (LÉVI- STRAUSS apud WISNIK, 1999, p. 30). Para Chnaiderman apud Wisnik (1999), quando a criança ainda não aprendeu a falar mas já percebeu que a linguagem significa a voz da mãe, com suas melodias e seus toques, é pura música, ou é aquilo que depois continuaremos para sempre a ouvir na música: uma linguagem em que se percebe o horizonte de um sentido que, no entanto, não se discrimina em signos isolados, mas que só se intui uma globalidade em perpétuo recuo, não verbal, intraduzível, mas, à sua maneira, transparente. A publicidade aproveita do recurso da pulsação para comunicar e transmitir segurança como será visto no capítulo V, que aborda a comunicação subliminar. A música, em sua história, é uma longa conversa entre o som, enquanto recorrência periódica, produção de constância, e o ruído, enquanto perturbação relativa da estabilidade, superposição de pulsos complexos, irracionais, defasados. Som e ruído não se opõem absolutamente na natureza: trata-se de um continuum, uma passagem gradativa que as culturas irão administrar, definindo no interior de cada uma, qual a margem de separação entre as duas categorias. 2.3 SOM E AUDIÇÃO/SOM E RECEPÇÃO Para Schafer (1991), ao contrário de outros órgãos dos sentidos, os ouvidos são expostos e vulneráveis. Os olhos podem ser fechados, se quisermos; os ouvidos não, estão sempre abertos. Os olhos podem focalizar e apontar nossa vontade, enquanto os ouvidos captam todos os sons do horizonte acústico, em todas as direções. De acordo com o texto de Salinas (1994), a audição em si é uma forma de recepção. O ato de ouvir limita-se a receber um sinal sonoro e determinar a ele um sentido. O ouvido não emite nenhum sinal. Quando ouvimos algo e queremos dar uma resposta devemos utilizar outros caminhos de comunicação: falar, escrever ou gesticular. Ouvir é um estado passivo e de contemplação, porém, no âmbito da percepção, a audição é fundamental no contato com o mundo. É pelo ouvido que se percebem os sons da natureza, do homem e das máquinas. Ao ouvir, também memorizamos e reconhecemos os objetivos e os seres que nos rodeiam. Todos os espaços possuem um contexto sonoro; a realidade sonora é registrada já desde o ventre materno, de onde o feto ouve os sons internos do corpo da mãe e os sons externos que pela força de seu volume, conseguem chegar até seus ouvidos. A forma de comunicação mais utilizada pelo homem, a língua falada, só é possível pela participação passiva do ouvir.
  • 22. 22 Igualmente, a música só existe quando é escutada por alguém. Na audição esconde-se uma essência do perceber para poder agir: ouvir é uma passividade aparente em função da percepção e atenção que o receptor deve dispender no processo de audição. “Sabemos que o som é onda , que os corpos vibram, que essa vibração se transmite para a atmosfera sob a forma de uma propagação ondulatória que nosso ouvido é capaz de captá-la e que o cérebro a interpreta, dando-lhe configurações e sentidos”. (WISNIK, 1999, p. 15). Para Russo apud Salinas (1994), uma pessoa que pessoa que possua sua capacidade normal de ouvir focaliza sua atenção, discrimina, memoriza e analisa os sons ao seu redor. E é o que situaremos a seguir. “A atenção auditiva é a capacidade do indivíduo de apresentar uma resposta voluntária a um estímulo sonoro” (RUSSO apud SALINAS, 1994, p. 20). Todos os sons provocam uma resposta, seja ela de passividade ou de atividade. O ouvido, diferentemente dos olhos, está aberto de forma constante aos estímulos sonoros; não existe, como nos olhos, nada semelhante a uma pálpebra que impeça a entrada do som no ouvido. Na mais completa escuridão, o ouvido e o tato tornam-se chaves na orientação espacial. Mesmo quando se dorme o ouvido continua registrando e estimulando atividades cerebrais. Ambientes com máquinas possuem uma ampla gama de sons programados os quais indicam a seu operador diversos estágios de funcionamento: uma operação, próxima fase, espera, erro, perigo, etc. Em um diálogo, a atenção auditiva permite a interação pergunta-resposta entre os interlocutores. “A figura/fundo auditiva é a capacidade de selecionar um estímulo sonoro significativo dentro de uma gama de sons apresentados simultaneamente” (RUSSO apud SALINAS, 1994, p. 20). A simultaneidade e a quantidade de estímulos sonoros registrados pode chegar a milhares, o que obriga a mente a gerar uma seleção auditiva. Murray Schafer (1991) chama de paisagem sonora “O ambiente acústico [...] o campo sonoro total dentro do qual estamos”. Essa paisagem sonora contrapõe-se tanto dos sons internos e externos do local onde nos encontramos, quanto aos sons internos do nosso próprio corpo. Nessa paisagem sonora o ouvinte apresenta duas formas de audição, a audição focalizada (figura) e a audição periférica (fundo). A primeira refere-se aos sons aos quais se presta atenção e, a segunda, corresponde aos sons que continuam sendo ouvidos mas com uma atenção passageira. “A discriminação auditiva é o processo de detectar diferenças e semelhanças nos sons que percebemos” (RUSSO apud SALINAS, 1994, p. 21). A capacidade de discriminação do ouvido é a forma mais sofisticada dos órgãos dos sentidos. Além de ser o sentido mais rápido na reação estímulo-resposta, a audição reconhece uma gama quase infinita de combinações harmônicas. Na música encontra-se um exemplo claro de discriminação no
  • 23. 23 reconhecimento das notas, no seu balé de alturas graves, médias e agudas, bem como na distinção de um instrumento pelo timbre. Na vida, a discriminação auditiva está ligada à cotidianidade e ao próprio conhecimento e reconhecimento das pessoas e dos objetos. “A memória auditiva envolve a habilidade de armazenar e de evocar o material auditivo” (RUSSO apud SALINAS, 1994, p. 22). O processo de memorização sonora manifesta-se ao longo de toda a vida de um indivíduo. No ventre materno o feto ouve os sons do coração, da respiração, da digestão da mãe. Essa paisagem sonora permanece tão gravada como um estado de bem-estar e segurança intra-uterina, que um eficiente travesseiro que reproduz sons similares aos do ventre, poderia ser utilizado para acalmar os bebês no berço. O desenvolvimento da fala depende da memória para o reconhecimento e a reprodução das palavras. A memória sonora também está ligada aos lugares, aos objetos e aos períodos da vida. A cada ocorrência sonora não somente grava-se a relação som-fonte como também o contexto, a paisagem sonora. Assim, a cada nova ocorrência do mesmo som-fonte, a memória recuperará todo um conjunto de experiências acumuladas para dar um novo sentido ao que está sendo ouvido. “A análise auditiva é a operação que decompõe as informações sonoras recebidas. Já a síntese auditiva é a operação que une as partes para compor uma informação sonora” (RUSSO apud SALINAS, 1994, p. 22). Assim, na síntese, reconhecemos a paisagem sonora como um todo, como uma unidade (na análise procuramos reconhecer os elementos que compõem a paisagem sonora). Ao ouvir os acordes sucessivos de uma peça musical, realiza-se uma síntese auditiva; já a análise ocorre quando se ouve a peça reconhecendo a participação de cada instrumento. A audição focalizada é uma operação de análise que contrapõe a audição periférica que é uma operação de síntese. “A seqüenciação auditiva é a função que depende da memória, uma vez que é a capacidade de lembrar a ordem dos itens em seqüência” (RUSSO apud SALINAS, 1994, p. 22). Dois aspectos sonoros dependem na base dessa capacidade: a audição e emissão de falas, e a criação, interpretação e a apreciação da música. As seqüências de fonemas nas palavras e de notas nas melodias somente ganham sentido quando memorizadas para serem repetidas e novamente ouvidas. No cotidiano, também, múltiplas seqüências sonoras interferem na vida das pessoas. Para Salinas (1994), por exemplo, o canto do galo seguido do canto dos passarinhos é uma das seqüências sonoras mais bucólicas que a natureza fornece para anunciar o amanhecer. Vale destacar que essas múltiplas seqüências sonoras podem ser consideradas subliminares.
  • 24. 24 Outro elemento do processo auditivo é a “localização sonora” (RUSSO apud SALINAS, 1994, p. 22) – estratégico posicionamento das orelhas que permite ao cérebro o reconhecimento imediato da direção onde a fonte sonora está localizada, acrescentando o cálculo aproximado da distância da fonte. “Ouvir”, configura-se em um sentido unidirecional com o qual o indivíduo se orienta no espaço, onde a grande maioria dos acontecimentos são primeiro ouvidos, antes de serem vistos, tocados, cheirados ou degustados. Cada um destes tópicos sobre a audição sugere questionamentos sobre a relação entre o som na publicidade e seu vídeo-ouvinte. Como já anotamos, o processo de ouvir além de seus elementos auditivos naturais está vinculado a um processo histórico, cultural e social. Um grupo social ouve de acordo com aspectos espaciais, temporais, políticos, religiosos, familiares e de lazer. A fala e a música são os únicos legados sonoros da história que possuímos, seu conhecimento representa uma aproximação sobre como o mundo era ouvido nas diferentes épocas. Somente a partir do final do século passado, o homem conseguiu registrar e reproduzir tecnicamente os sons. Assim a memória técnico-sonora do mundo limita- se quando que exclusivamente a nosso século. A publicidade é uma das formas de expressão em que a possibilidade de registro e reprodução do som é empregada. E é evidente que o som dos comerciais está constantemente chamando a atenção auditiva, brincando com as relações de figura e fundo, aproveitando a discriminação, a memória e a seqüenciação auditivas, cutucando a análise e a síntese auditiva, e denunciando a localização sonora das fontes. Porém, a capacidade auditiva é um dom do receptor, a publicidade só pode instigar esse dom. 2.4 RUÍDO Segundo Schafer (1991), o negativo do som musical é o ruído. Ruído é o som indesejável, o que fomos treinados a ignorar. É a estática no telefone ou o desembrulhar balas do celofane durante Beethoven. Ruído é qualquer som que interfere. É o destruidor do que queremos ouvir. Não há outro meio para defini-lo. Às vezes, a dissonância é chamada de ruído; e para os ouvidos tímidos até pode ser isso. Porém, consonância e dissonância são termos relativos e subjetivos. Uma dissonância para uma época, geração e/ou indivíduo pode ser uma consonância para outra época, geração e/ou indivíduo. A dissonância mais antiga na história da música foi a Terça Maior (dó-mi). A última consonância na história da música foi a Terça Maior (dó-mi).
  • 25. 25 2.5 SILÊNCIO: SERÁ QUE SILÊNCIO É RUÍDO? Silêncio é a característica mais cheia de possibilidades da música. Mesmo quando cai depois de um som, reverbera com o que foi esse som e essa reverberação continua até que outro som o desaloje ou ele se perca na memória. Logo, mesmo indistintamente, o silêncio soa. O homem gosta de fazer sons e rodear-se com eles. Silêncio é o resultado da rejeição da personalidade humana. O homem teme a ausência de som como teme a ausência de vida, como podemos ver na frase “o silêncio é de ouro”. Na realidade: silêncio – ausência de som – é negro. Na ótica, o branco é a cor que contém todas as outras. Emprestamos daí o termo “ruído branco”, a presença de todas as freqüências audíveis em um som complexo. Se filtrarmos o ruído branco, eliminando progressivamente as faixas maiores de freqüências mais altas e/ou mais baixas, eventualmente vamos chegar ao som puro – o som sinoidal. Filtrando-o, também, teremos silêncio – total escuridão auditiva. Como já citado anteriormente, John Cage diz: “O silêncio, não existe isso”. Quando John Cage entrou numa câmara aneóica, ou seja, à prova de som, ele ouviu dois sons, um agudo e um grave. “Quando eu os descrevi para o engenheiro responsável, ele me informou que o agudo era meu próprio sistema nervoso em funcionamento, e o grave era meu sangue circulando”. Concluiu então que: “O silêncio não existe. Sempre está acontecendo alguma coisa que produz som” (CAGE apud SCHAFER, 1991, p. 71). Não significará silêncio absoluto ou físico, mas meramente a ausência de sons musicais tradicionais. O emprego do silêncio na publicidade veremos melhor no capítulo IV. 2.6 TIPOS DE SOM Qualquer coisa que se mova, em nosso mundo, vibra o ar. Caso ela se mova de modo a oscilar mais que dezesseis vezes por segundo, esse movimento é ouvido como som. O mundo, então, está cheio de sons. Ouça. Abertamente atento a tudo que estiver vibrando, ouça. Sente-se em silêncio por um momento e receba os sons. (SCHAFER, 1991, p. 124). Os sons ouvidos podem ser divididos em sons produzidos pela natureza por seres humanos e por engenhocas elétricas ou mecânicas. Schafer (1991) descobriu que quando haviam poucas pessoas e elas levavam uma existência pastoril, os sons da natureza pareciam predominar: ventos, água, aves, animais, trovões. As pessoas usavam seus ouvidos para decifrar os presságios sonoros da natureza. Mais tarde, na paisagem urbana, as vozes das
  • 26. 26 pessoas, seu riso e o som de suas atividades artesanais pareceram assumir o primeiro plano. Ainda mais tarde, depois da Revolução Industrial, os sons mecânicos abafaram tanto os sons humanos quanto os naturais, com seu onipresente zunido. Abaixo, apresentamos uma abordagem da pesquisa realizada por Schafer em 1991: SONS SONS OS SONS DE UTENSÍLIOS NATURAIS HUMANOS E TECNOLOGIA Culturas Primitivas 69% 26% 5% Culturas Medievais, Renascentista 34% 53% 14% e Pré-Industriais Culturas Pós-Industriais 9% 25% 66% Hoje 6% 26% 68% Figura 1 – Ambiente Sônico. Fonte: SCHAFER (1991, p. 128). 2.7 CONSONÂNCIA E DISSONÂNCIA Toda dissonância exigia sua resolução numa consonância. Toda consonância exigia uma dissonância para perturbar sua vida enfadonha. As duas eram inimigas íntimas na música erudita ocidental. Nos primórdios da música atonal, pensava-se que a dissonância tivesse assassinado a consonância e se imposto domo déspota absoluta da música. Agora nos apercebemos de que isso era uma ilusão e que os sons são consonantes ou dissonantes apenas relativamente, dependendo do seu contexto. Conforme Schafer (1991), dissonância é tensão, e consonância é relaxamento. Do mesmo modo que a musculatura humana se tensiona e relaxa alternadamente, não se pode ter uma dessas atividades sem a outra. Assim, nenhum dos dois termos tem significado absoluto; um define o outro. Qualquer pessoa que não compreenda isso, deveria tentar ficar com o punho fechado e bem apertado pelo resto da vida. Consonância e dissonância são como dois elásticos, um mais esticado que o outro. Sua relatividade é esclarecida pela adição de um terceiro elástico, mais esticado que os dois primeiros. Qualquer complexo sonoro pode ser analisado em termos de sua consonância e dissonância relativos, dentro de sua vizinhança acústica. ‘Consonância’ e
  • 27. 27 ‘dissonância’ referem-se a variações em intensidade, altura, duração ou timbre, dentro dos perímetros do audivelmente possível. (SCHAFER, 1991, p. 156). 2.8 MÚSICA: OUTRA MANEIRA DE FALAR “Música é a arte de combinar sons visando a beleza da forma e a expressão das emoções; os sons assim produzidos; som agradável, por exemplo, o canto de um pássaro, o murmúrio de um riacho, o latido de cães” (The Concise Oxford English Dictionary, apud SCHAFER, 1991, p. 119). “Música é sons, sons à nossa volta, quer estejamos dentro ou fora de salas de concerto” (THOREAU apud SCHAFER, 1991, p. 120). Definir música meramente como “sons” teria sido impensável há poucos anos atrás, mas hoje são as definições mais restritas que estão se revelando inaceitáveis. Pouco a pouco, no decorrer do século XX, todas as definições convencionais de música vêm sendo desacreditadas pelas abundantes atividades dos próprios músicos conforme Schafer (1991). Para Said (1992, p. 43-44), em “Elaborações Musicais”, a música seria executada e ouvida como uma outra maneira de falar. Talvez mais lenta em seus efeitos, talvez mais digressiva e reiterativa, mas nascida de decisão em concentrar-se no seu tempo, internamente, numa experimentação conjunta com outras experiências e com outras músicas. Outro problema, seria o fato de que tudo o que se ouve e se assimila é a combinação de certo número de notas em forma de melodia. Precisamente dos olhos, no estilo Gestalt, olham para a forma e o sentido totais de um desenho, e raro focalizam, com exclusividade, linhas ou marcas individuais, com exclusão de todas as outras. Assim, os ouvidos se acostumaram a organizar notas musicais em padrões e formas globais. Pouca atenção se dispensa às qualidades de cada som. O tema da música e de suas possíveis influências psicológicas e societárias, para Tame (1987), não é um tema abstrato, teórico, porque só neste século é que se abandonou e perdeu quase de todo a crença na música como força capaz de mudar o indivíduo e a sociedade. Nunca a música foi tão facilmente acessível, tão diversa, tão continuamente despejada nas ruas da cidade e nas ondas do ar e, não obstante, nunca a teorização ou conhecimento real, prático, da natureza e dos efeitos da música se achou em tão acentuado declínio. (TAME apud BATAN, 1992, p. 27). Para todos estes estudiosos, existe a convicção da capacidade transgressora da música sobre outros domínios como família, escola, relações de classe e sexo e nacionalismo.
  • 28. 28 O médico e músico Wilson Luiz Sanvito (1992, p. 4) condena os vários estudos sobre a capacidade da música em influenciar o cérebro, o corpo físico e as emoções. Para ele, a música afeta fisicamente por possuir um ritmo (pulsações) e um tempo (compasso), como as funções biológicas. O cérebro parece analisar os estímulos sonoros através de padrões de referencia tendo como modelo freqüências harmônicas, no caso da música. Por experiências realizadas com anestesia dos hemisférios cerebrais, ficou demonstrado que, enquanto o hemisfério direito controla os sons sem conteúdos lingüísticos, a altura do som e a identificação dos acordes musicais, o lado esquerdo controla o ritmo musical. Este fato contradiz o que se acreditava até há pouco tempo, que os sons musicais fossem inteiramente controlados pelo hemisfério não dominante para a linguagem, geralmente o direito. Sanvito (1992, p. 4) faz a seguinte observação: O ritmo pode ser concebido como uma organização temporal de uma seqüência de estímulos e este tipo de processamento é uma especialidade do cérebro esquerdo. Então o cérebro direito é essencial para a apreciação da tonalidade musical, da expressão melódica, do timbre dos instrumentos e de sua reprodução, enquanto do cérebro esquerdo depende a leitura da escrita musical, o ritmo e o reconhecimento das palavras de uma canção [...] se a criatividade musical tem domicílio no lado direito do cérebro, a linguagem musical, ou seja a capacidade de articular numa seqüência, uma nota após a outra, compete ao lado esquerdo. Portanto, de uma certa hegemonia do cérebro direito para lidar com estímulos sonoro-musicais, o processamento completo deles depende de uma integração dos hemisférios cerebrais. Dessa forma, os sons captados por sensores periféricos, que são órgãos receptores localizados nos ouvidos, segundo o autor, são veiculados por nervos até certas áreas cerebrais, onde são analisados e adquirem significado. O desenvolvimento deste sistema acústico- neurologico exige uma maturação, que ocorre desde a vida intra-uterina quando o feto está submetido a um ambiente sonoro. Como a máxima intensidade sonora a que alguém pode se expor num período de oito horas, sem sofrer dano de audição, é de 75 decibéis – vale lembrar que um concerto de rock tipo “heavy metal”, pode ultrapassar 90 decibéis –, o corpo para proteger-se, precisaria filtrar uma ampla faixa de sons incidentes e agir como um transformador vibratório. Por vezes, isto pode ser extremamente esgotante. Se uma música de determinada freqüência, ritmo e tonalidade influência os ritmos elétricos do cérebro provocando relaxamento (ondas alfa) ou sonolência (ondas delta), outro tipo de música pode provocar hiperexcitabilidade do cérebro traduzida por alerta, excitação dos nervos e mesmo um ataque epilético. (SANVITO, 1992, p. 4).
  • 29. 29 Ainda de acordo com o autor, os sons seguem dois caminhos para chegar ao cérebro: Um chega ao centro auditivo do cérebro no 1º lobo temporal, onde são captados e interpretados. Este mesmo lobo cerebral alberga boa parte do sistema límbico, que lida com as emoções, principalmente ao lado direito do cérebro, e participa na memorização dos eventos no dia a dia. A outra vertente conecta-se com o cérebro vegetativo, que controla funções com a respiração, circulação, digestão, hormonal e outras. Isto posto, fica mais fácil entender como as qualidades da música podem nos afetar tanto física como psicologicamente. No caso da freqüência que é o número de ciclos por segundo de um determinado som, sabemos que as vibrações rápidas provocam tensão nervosa enquanto as lentas tendem a relaxar. Já com a intensidade, que se relaciona à amplitude das vibrações, observa-se que a música alta pode levar ao arrebatamento e chega a ser opressiva. A música suave, além de intimista, produz serenidade. O ritmo é a qualidade dinâmica da música e o seu padrão marcante entre ritmo e emoções. Além da pulsação cardíaca, o ritmo é fundamental em outras funções orgânicas: respirar, falar, andar, etc. (SANVITO, 1992, p. 4). A música, sendo uma forma de expressão e comunicação não-verbal, ao ser canalizada para o cérebro estimula a imaginação, a fantasia evoca recordações, enfim dispara gatilhos emocionais. E Manfred Clynes, que é músico e doutor em neurologia/engenharia pela Universidade de Melbourne, citado por Sanvito (1992, p. 4), postula que: [...] as emoções existem por si mesmas como padrões potenciais do sistema nervoso e podem ser desencadeadas pela música, independentemente de associações específicas com pessoas ou eventos. Isto significa que certas passagens musicais, de acordo com sua forma ou estrutura, podem gerar respostas tais como alegria, amor ou reverência. Esta padronização é capaz de descrever certos estados afetivo-emocionais caracterizados pelas músicas na TV: Terror, medo, pânico: notas graves e com instrumentos que produzam registros graves (trombones, contrabaixo, saxofone e instrumentos de percussão); Tristeza: som de oboés, flautas, violinos ou clarinetes, que emitem movimentos lentos e tempos longos; Alegria: músicas ‘brilhantes’, de júbilo, às vezes com movimentos rápidos; Raiva: escalas musicais rápidas, sons fortes, graves ou agudos e com ocorrências surpreendedoras; Momentos românticos: similares às da tristeza; Violência: movimentos rápidos, de caráter forte e sonoridade ‘brilhante’, similares à raiva; Suspense: instrumentos de registro baixo ou com notas agudas intermitentes. (SALINAS apud BATAN, 1992, p. 31). Salinas apud Batan (1992, p. 32) ressalta que, como são raros os estudos sobre a reação do espectador a determinadas músicas, torna-se difícil a confirmação da “sabedoria empírica dos emissores ao utilizar uma ou outra música, padronizada ou não, para obter uma ou outra sensação da platéia, quanto aos seus produtos fílmicos”.
  • 30. 30 2.9 O SOM NA CIVILIZAÇÃO Uma trilha sonora ecoa para cada povo, para cada época e para cada indivíduo, de maneira particular. A paisagem sonora adere profundamente à paisagem sensorial total. Na denominada civilização da imagem, porém, o som apresenta-se como complemento, como ator coadjuvante. Nesta civilização, aquilo que não é feito para ser visto, para aparecer na imagem, simplesmente não existe, mas na própria radicalização saturada da imagem, a imagem deixa de existir. E o som urbano do mundo civilizado também entra nesse jogo de inexistência, de saturação. Quando o caos sonoro da floresta apresenta-se para um índio como um concerto de sinais carregados de sentidos, o caos sonoro urbano apresenta-se para o cidadão como uma rotina atordoante de sinais sem sentido. Estudos de Antropologia apontam que a música e o canto podem ter surgido meio milhão de anos antes que a fala. Além disso, a Antropologia constata que não há cultura, por mais primitiva que seja, que não possua música ou língua falada. A escrita, representação gráfica da palavra, foi utilizada somente há dez mil anos, sendo que ainda hoje existem povos que não possuem escrita. Nos países do chamado Terceiro Mundo, os índices de analfabetismo são tão altos que a tradição oral e musical encarrega-se de transmitir a cultura entre as diversas gerações. E nos países ditos de Primeiro Mundo, são preocupantes os baixos percentuais de leitura da população. A milenar música, então, representa a expressão humana mais antiga na busca da organização espaço-temporal. A música, e depois a fala, são formas de arquitetar o caos sonoro da natureza. As sociedades existem na medida em que possam fazer música, ou seja, travar um acordo mínimo sobre a constituição de uma ordem entre as violências que possam atingi-la do exterior e as violências que as dividem a partir do interior. Assim a música se oferece tradicionalmente como o mais intenso modelo utópico da sociedade harmonizada e/ou, ao mesmo tempo, acabada representação ideológica (simulação interessada) de que ela não tem conflitos. (WISNIK, 1999, p. 30). 2.10 O SOM E OS ELEMENTOS MUSICAIS Se assumimos a trilha sonora como uma forma da música concreta, devemos, então, considerar alguns elementos básicos da música para sua análise. Todo som tem como propriedades uma altura, uma duração, um timbre e uma intensidade. A sucessão organizada de sons denomina-se melodia, e a combinação simultânea de dois ou mais sons chama-se
  • 31. 31 harmonia. Resguardando a distância estética com a música, a trilha sonora, com toda sua particularidade, também está composta com base nestes elementos. O maior ou menor número de vibrações por segundo determinam a altura de um som; estas vibrações por segundo são chamadas hertz. O ouvido humano tem capacidade de perceber freqüências que variam entre 20 e 20.000 hertz. Um som é considerado baixo ou grave quando sua freqüência é baixa e, na medida em que sua freqüência aumenta, o som é considerado alto ou agudo: “[...] som grave, como o próprio nome sugere, tende a ser associado ao peso da matéria, com objetos mais presos à terra pela lei da gravidade, e que emite vibrações mais lentas, em oposição à ligeireza leve e lépida do agudo” (WISNIK, 1999, p. 19). A música organiza os sons em uma seqüência de freqüências determinadas chamadas de notas musicais (dó, ré, mi, fá, sol, lá e si); a freqüência mais utilizada pela música ocidental nos últimos dois séculos chama-se “gama cromática bem temperada”. Nas ocorrências sonoras dos audiovisuais as alturas ganham importância de acordo com as associações físicas e culturais dos sons. As vozes graves possuem um ar de respeito e poder superior ao das vozes agudas. O tom grave, e na grande maioria das vezes uma voz masculina, das narrações esportivas, de documentários, de apresentadores de noticias, de comerciais, etc., revelam de acordo as associações físicas das fontes sonoras, como já assinalou Wisnik (1999), os objetos grandes e pesados geram sons graves, enquanto os pequenos e leves geram sons agudos. Podemos citar um exemplo deste gênero que está padronizado ao extremo máximo do associativo: toques graves para acompanhar o andar do elefante e toques agudos no andar da formiga. A duração corresponde ao tempo de prolongação de um som. Uma fonte sonora pode gerar um som contínuo que varia de frações de segundo até um determinado número de horas. Os súbitos impulsos sonoros, de durações curtas, geram surpresa e chamam a atenção; as ocorrências longas e contínuas são colocadas rapidamente pelo cérebro na audição periférica. A duração dos sons está ligada também à velocidade, isto é, quanto mais curto, maior a sensação de rapidez, quanto mais longa, mais lenta. No mundo urbano moderno os tempos curtos determinam o sucesso das coisas, os sons curtos apresentam-se num estado de agitação. Já no mundo da meditação, da reflexão, os tempos longos são os que levam os estados ideais de calma e tranqüilidade. Nos audiovisuais, as falas com durações fonéticas curtas denunciam temperamentos ou estados de animo: agitação, ação, tensão, perturbação, etc. Falas lentas e pausadas em durações longas simbolizam tranqüilidade, sabedoria, racionalidade, controle, preguiça, novamente, para o andar do elefante os sons graves e longos, para o da formiga os sons agudos
  • 32. 32 e curtos. Na música, cada nota tem uma duração específica ao ponto que na escritura musical os símbolos de representação estão codificados de acordo com o tempo de execução da nota: uma semibreve corresponde ao tempo mais longo, e uma semifusa corresponde ao tempo mais curto. O silêncio, por sua vez, que representa a ausência de alturas, ganha valores significativos em suas durações. As pausas silenciosas podem trazer as sensações de medo, dúvida, espera e angústia, por exemplo. O timbre, por sua vez, determina a possibilidade de identificação e discriminação auditiva das diversas fontes sonoras. Uma mesma nota, altura, emitida por instrumentos diferentes, apresenta-se na mesma freqüência fundamental acompanhada de uma série de outras freqüências mais agudas e determinam a também chamada cor ou timbre de cada instrumento. O timbre, ou a cor, denuncia o tipo de fonte sonora. A capacidade de discriminação aliada à memória auditiva nos permite reconhecer milhares de fontes sonoras somente pelo timbre, sem necessidade de estar vendo a fonte. Quando a ligação fonte-som é alterada, as coisas que vemos ficam falsas, mentirosas, há um estranhamento sonoro. Por isso, é que nos audiovisuais existe um cuidado especial na criação e reprodução dos sons de uma paisagem sonora, já que uma cor dissonante de suas fontes prejudica a veracidade do audiovisual. Reconhecemos as pessoas pela singularidade no timbre de sua voz. A relação entre um corpo que fala e o som de sua fala está determinada pelo timbre. Uma mesma pessoa muda a cor de sua voz nas passagens da infância para o mundo adulto e para a velhice. Quando ouvimos uma pessoa falar reconhecemos se é homem ou mulher, jovem ou velho, sem necessidade de compreender uma palavra da língua em que fala. Nos audiovisuais, o timbre desempenha um papel primordial no reconhecimento das fontes e nas associações espaço- tempo culturais que um som pode carregar. O timbre de um instrumento ou da voz de uma pessoa pode remontar instantaneamente o receptor a lugares e épocas determinadas. A intensidade refere-se ao grau de energia de um som. Independentemente da altura, duração ou timbre, um som pode possuir intensidades fortes ou fracas. O impacto do som em intensidades fortes para danificar o ouvido provocando perdas irreparáveis na Audição. Um som grave contínuo com uma alta intensidade pode derrubar um prédio pelas fortes vibrações provocadas nas colunas e paredes. Nos anos 70, o cinema realizou, no filme Terremoto (1974), uma experiência na qual o público sentia os tremores de terra através de um som grave de baixa freqüência e forte intensidade. Esta propriedade, então, reveste o som de uma dinâmica pontual com relação ao receptor. A intensidade prende a atenção com suas
  • 33. 33 diversas variações, moldando momentos de ação e repouso. Em uma fala, por exemplo, as mudanças de intensidade podem ser tão ou mais significativas que o que está sendo dito. Um som com amplitude constante gera um grau de tensão suspenso na dúvida de se vai terminar, diminuir ou aumentar. O som que decresce em intensidade pode remeter tanto à fraqueza e à debilitação, que teria o silêncio como morte, ou à extrema sutileza do extremamente vivo, podendo sugerir justamente o ponto de colamento e descolamento desses sentidos, o ponto diferencial entre a vida e a morte, aí potencializados. O crescendo e o fortíssimo pode mandar, por sua vez, um jorro de explosão proteínica e vital emanando da fonte, ou a explosão mortífera do ruído como destruição, como desmanche de informações vitais. (WISNIK, 1999, p. 23). O som audiovisual aproveita-se desta riqueza para criar figuras auditivas, às vezes, concordantes com a imagem e, às vezes, dissonantes desta. No adequado controle das intensidades, reside um dos segredos de uma mixagem sonora e talvez do encantamento do receptor ao assistir um audiovisual. Os sons, com suas alturas, durações, timbres e intensidades, não se apresentam de forma individual; ouvimos nas paisagens sonoras físicas e fílmicas conglomerados dos sons sucessivos e simultâneos a sucessão de notas variando em suas alturas criando a melodia. Em uma peça musical, ela pode ser interpretada por um ou vários instrumentos, ou pela voz humana. No âmbito do audiovisual falar de melodia torna-se um pouco mais complicado, pois como determinar uma linha melódica em um trilha composta por tantos elementos diferenciados? A princípio podemos dizer que, a partir do cinema sonoro, as falas assumem o papel de melodia. Não é necessário realizar uma pesquisa para concluir que as falas nos audiovisuais transportam para si a missão do encadeamento narrativo. O intuito dos realizadores é que a audição focalizada concentre-se nas falas, naquilo que é dito. Seria, então, uma melodia que em sua organização lingüística estaria direcionada à sua compreensão racional. Porém, esse valor de melodia dilui-se ao notar que os outros elementos sonoros, inclusive os não lingüísticos das próprias falas, devem ser ouvidos com a audição periférica, provocando respostas emocionais. Nesta relação de figura-fundo, a figura dirige-se ao racional e o fundo ao emocional do receptor. Apresenta-se, então, uma articulação na qual a trilha sonora detém não uma linha melódica, mas sim um jogo de várias linhas melódicas simultâneas. A trilha sonora define-se, dessa forma, como uma polifonia sonora estimulando ininterruptamente, e por várias frentes, a atenção auditiva do receptor. Na combinação simultânea dos sons, ou seja, na harmonia, a polifonia da trilha sonora encontra seu papel de ação vertical. Na música, entende-se por acorde o momento em
  • 34. 34 que duas ou mais notas são ouvidas ao mesmo tempo. Um acorde em uma trilha sonora pode acontecer na simultaneidade de fala, música, sons e/ou silêncio, e as possibilidades de significado projetam-se às múltiplas combináveis realizáveis. Quiçá, um dos maiores atributos estéticos das manifestações audiovisuais reside nos bons aproveitamentos das articulações harmônicas tanto no interior da imagem, como nos acordes sonoros e nas articulações de som e imagem. A manipulação ilimitada de intervenção linear horizontal e vertical dotam o som de várias possibilidades na somatória de sentidos propostos pelo realizador e apropriados e reelaborados pelo receptor. A composição melódica e harmônica das falas, dos sons, das músicas e dos silêncios, constrói uma paisagem sonora exclusiva do universo do audiovisual, composição esta desconhecida pelo homem até a aparição do cinema sonoro. Embora o teatro pudesse realizar jogos sonoros similares muito antes do cinema, ele não contava com os recursos tecnológicos trazidos pelas novas formas de relacionamento das manifestações sonoras como a imagem, o espaço e o tempo. No próximo capítulo será abordado a utilização do som nas mídias.
  • 35. 35 “O papel natural do homem no século vinte é a ansiedade”. (Norman Mailer).
  • 36. 36 CAPÍTULO III A UTILIZAÇÃO DO SOM NA MÍDIA É no século XX que se desenvolvem os meios de comunicação. O cinema, o rádio, a televisão, o vídeo, a Internet, o computador utilizam em sua expressão o som e, com exceção do rádio, que é substancialmente sonoro, os outros são audiovisuais. Mas sua “força divina” é a imagem, e o som, seu companheiro fiel. Todos estes meios, cada um ao seu modo, atingem as diversas culturas sem discriminação alguma. No transcorrer do século, os meios audiovisuais foram usados ativamente em diversos acontecimentos sociais, políticos, religiosos, esportivos, culturais, etc., e em alguns momentos, seu papel foi primordial no desenrolar dos fatos. (SALINAS, 1994, p. 28). 3.1 RÁDIO, O PRÓPRIO SOM O rádio é o único meio de comunicação de massas que se utiliza apenas do som em sua expressão. O rádio possui a exclusividade da magia sagrada do som.atribui-se seu poder justamente à ausência da imagem, poder este que reside na sua capacidade de ativar a imaginação visual, onde nada é visto, somente ouvido, e a mente de cada um encarrega-se de criar as imagens que correspondem ao som. Enquanto o cinema sofreu o trauma do sonoro, o rádio não sofreu nada parecido, ele é “só” rádio. Na civilização da imagem ele é um transgressor, um intruso, algo difícil de ser entendido e apreciado dignamente. Ao ponto que, no universo acadêmico, o rádio é tido como um meio “menor”, algo “simples” e “popular”. Basta conferir o espaço para o rádio nos currículos de Comunicação Social. O rádio é um meio de e para o público. O realizador elabora os programas pensando essencialmente nos receptores. O rádio, então, é um bem de todos. Sua força e popularidade são difíceis de serem mensuradas dada a sua diversidade, complexidade e simplicidade. Os custos de instalação e manutenção fazem com que dificilmente uma cidade, por menor que seja, não possua uma emissora e, mas difícil ainda, é encontrar uma pessoa que não tenha como usufruir de um radinho de pilhas. Sua diversidade pode ser constatada em uma grande cidade onde um ouvinte pode sintonizar centenas de emissoras entre as ondas curtas, médias e longas. Ao movimentar o “dial” entra-se em contato com quase todos os estilos musicais; passa-se pelas informações que vão desde seu bairro até o que acontece em qualquer
  • 37. 37 lugar do planeta. A valorizada segmentação em públicos específicos dos meios atuais já era uma realidade do rádio após a Segunda Guerra Mundial. A complexidade do rádio evidencia-se ao serem analisados os conceitos modernos de velocidade e fragmentação. A velocidade perceber-se a capacidade de modificar-se acompanhando as mudanças históricas e na agilidade para renovar e conservar as informações. A fragmentação encontra-se na já anotada segmentação das emissoras, cada uma especializando-se em públicos diferenciados. Outra característica de sua complexidade reside em sua indeterminada capacidade de emocionar uma ou milhares de pessoas de maneira simultânea. O rádio guarda em sua história duas passagens da mobilização da população de um país que sempre são destacadas quando se quer demonstrar o poder avassalador dos meios: a primeira, sua utilização como arma de propaganda nazista durante o governo de Adolf Hitler na Alemanha, e a Segunda o programa de ficção A Guerra dos Mundos com que Orson Welles aterrorizou os Estados Unidos em 1938. Destaca-se nestes dois fatos que a televisão ainda não era um meio popular e o rádio desempenhava o papel de lazer noturno da população. A simplicidade do rádio está resguardada nos elementos de sua expressão em sua relação com os receptores. Com uma combinação “somente” de falas, efeitos sonoros e músicas, realizada com baixo custo em um número reduzido de profissionais, o rádio ainda é, entre todos os meios de comunicação, a melhor companhia cotidiana das pessoas. A passividade aparente do ouvir deixa livre o resto do corpo para exercer outras atividades da vida: cozinhar, dirigir um carro, correr, tomar banho, escrever, etc. Contudo, o rádio também é utilizado como um escudo sonoro que protege e isola da confusão sonora da cidade ou do inquietante silêncio esmagador. Para o receptor, o som do rádio é um ponto significante da audição no domínio da imagem. 3.2 O SOM NA TELEVISÃO Quando têm início suas transmissões regulares, a televisão emite seus sinais com imagens e som e, diferente do cinema, ela já nasce audiovisual. Como o rádio, a televisão instala-se no cotidiano das pessoas, mas traz consigo o poder da imagem aliado ao som. A civilização da imagem parecia ter encontrado o meio de comunicação ideal para levar todas as imagens do mundo até a casa de todos e cada um, e até o final dos anos oitenta cumpriu esse papel. Na atualidade, o computador está tomando seu lugar de meio ideal. Entretanto, ela não se limitou a cumprir esse papel, a televisão é também considerada o mais influente meio da história. Seu funcionamento é rigorosamente legislado pelo Estado dos mais diversos países e o
  • 38. 38 controle de cada canal é disputado por todas as formas de poder, desde os inúmeros ideais políticos até os diversos grupos religiosos. A televisão, assim como rádio, deve sua popularidade à diversidade de canais, programas, gêneros, realizadores, públicos, etc.; à sua complexidade de fragmentação e velocidade de adequação às mudanças históricas; a sua virtude de transmitir um evento ao vivo, podendo aglomerar diante de si milhões de espectadores que, na individualidade de suas residências, têm consciência de estar participando de uma imensa coletividade. Porém, não há simplicidade nos elementos audiovisuais de expressão, nem nas relações com o receptor. O domínio profissional do audiovisual na televisão requer altos investimentos econômicos com a participação de um grande número de profissionais com equipamentos caros e sofisticados. O receptor, por sua vez, não está liberado em sua cotidianidade. Realizar uma atividade qualquer e assistir simultaneamente televisão obrigam o receptor a participar de um jogo mediado pelo próprio aparelho, jogo no qual o receptor pode ouvir sem ver, mas deverá deter sua atividade quando for incitado a olhar a tela. No som, o domínio da fala é evidente. Com exceção de alguns programas musicais, a fala coordena todo o áudio da televisão. 3.3 O SOM NO VÍDEO O vídeo nasce da evolução da televisão. A gravação simultânea de imagem e som em uma fita magnética tornou-se realidade em meados dos anos cinqüenta, com o videotape. Para a televisão, esta foi talvez a invenção mais revolucionária. Até a chegada do videotape, quase todos os programas eram realizados ao vivo. O filme era utilizado no registro dos fatos que não eram transmitidos ao vivo: porém, a utilização do filme era limitada pelos altos custos e pelo tempo gasto entre a filmagem, a revelação do material, a montagem e finalmente a sua emissão. Com as fitas de vídeo, a televisão pôde começar a gravar quase todos seus programas. Em conseqüência disso, houve uma melhoria na qualidade dos programas, já que todos os erros cometidos ao vivo podiam ser corrigidos. O videotape trouxe, enfim, a modernidade tecnologia deixando para trás o romantismo do “ao vivo”. As próprias transmissões que continuam sendo apresentadas ao vivo foram afetadas pelo vídeo. Em um jogo de futebol, por exemplo, a fugacidade duvidosa de uma jogada em tempo presente desaparece diante da presença infalível das câmaras ligadas a um videotape. A repetição (ou replay), muitas vezes, ganha mais significado que o próprio fato. Na pós-modernidade isto é associado à desreferencialização do real, na qual a representação, o signo (neste caso, a repetição da jogada) é mais importante que a própria realidade, o referente.
  • 39. 39 O videotape então, não só mudou a técnica do fazer, como também a forma de ver e ouvir o mundo através da televisão. No final dos anos 60, com a miniaturização dos componentes eletrônicos, são construídos os primeiros aparelhos de VHS (video home system). O videocassete, já adaptado à televisão, configura-se em uma forma de comunicação audiovisual, afirmando-se no cotidiano das pessoas. O vídeo começa sua corrida de sucesso nos anos 70 e já nos anos 80 está presente na maioria dos lares, sendo também utilizado por todas as áreas do conhecimento como uma ferramenta de grande valor. O som (e a imagem) no vídeo herdam as características básicas da televisão e do cinema, mas ganham uma nova dimensão na possibilidade do ouvir outra vez. A fugacidade no ouvir dos outros meios deixa de existir no uso do vídeo. Ao assistir, pode-se voltar inúmeras vezes a fita para ouvir e ver algo que não foi entendido ou que se quer ouvir de novo. O receptor ganha um recurso inédito no relacionamento com o audiovisual: sua presença no ato de assistir torna-se mais dinâmica podendo interferir à vontade na linearidade do que ouve, ou vê. 3.4 O SOM NO COMPUTADOR O processamento de informação digital tem seu grande desenvolvimento nos anos 80 com a geração dos PC (personal computer). O computador deixa de ser uma exclusividade dos laboratórios de pesquisa, tornando-se parte integrante de todos os espaços da vida. Assim, dos jogos eletrônicos às pesquisas da física nuclear, a informática eletrônica possibilitou um avanço frenético; hoje, o que não está digitalizado não existe. A imagem e som dos meios audiovisuais também foram afetados pela presença do computador. As modificações possíveis na imagem e no som são quase infinitas como a tecnologia digital empregada no cinema e na televisão. Controla-se na imagem as linhas, as cores, as formas, as superposições, etc. No som, manipulam-se os tons, os timbres, a intensidade, as harmonias, as durações, etc. A realidade representada pode ser totalmente alterada e/ou virtualmente recriada. Assim, não só tudo o que existe está digitalizado na memória dos computadores, como também se cria um novo universo virtual dentro do digitalizado. O computador está absorvendo todos os meios de comunicação. Em um futuro próximo, o receptor poderá ter em sua casa não um simples aparelho de HDTV, mas sim, um sofisticado terminal de computador através do qual poderá assistir um programa de televisão, sintonizar uma emissora de rádio, escrever uma carta, ler um artigo de jornal, vigiar o sono do
  • 40. 40 bebê, fazer uma ligação videofônica, etc. O relacionamento do receptor com os audiovisuais passará por uma completa modificação: alterando-se as formas de ver e ouvir, o receptor poderá controlar como e quando assistir um produto audiovisual digitalizado. O receptor de hoje, no entanto, aparentemente não percebe as grandes modificações introduzidas pelo computador nos audiovisuais. A diferença encontra-se onde imagem e som possuem maior definição em sua tarefa de representar. Em uma telenovela, por exemplo, a iluminação, os cenários, as roupas, os roteiros, as músicas, os sons, etc., passam pelo planejamento e realização através do computador. É evidente que esta tecnologia levará algum tempo até chegar aos países do “Terceiro Mundo”, e tardará ainda mais para que as classes sociais com menor poder aquisitivo possam comprar e usufruir essa tecnologia. A marginalização do digital está se tornando um dos problemas chaves nas relações sociais do mundo contemporâneo: o poder concentra-se nas mãos daqueles que têm acesso ao digital. 3.5 O SOM NOS AUDIOVISUAIS Cada meio audiovisual possui suas particularidades de linguagem e de relacionamento com o receptor. Entretanto, o som e a imagem possuem características que são idênticas para todos os audiovisuais, há uma linguagem básica que é válida para todos. Para a imagem existe uma classificação fundamental de planos, ângulos, movimentos de câmara, composição, etc. Nessa classificação um plano geral, por exemplo, é sempre um plano geral, não importa se ele é visto em uma gigantesca tela de cinema ou em uma pequena janela de um monitor de computador. No som também podemos apontar algumas características básicas válidas para todos os meios audiovisuais. Encontramos esses elementos do som no que se refere a sua fonte, suas propriedades, sua localização com relação à imagem, ao espaço e ao tempo. 3.6 O SOM NA PUBLICIDADE A extensa literatura sobre televisão, disponível no Brasil, apesar de tratar de um fenômeno áudio-visual, privilegia sempre a imagem, entendida como estímulos visuais. Esta abordagem restrita do binômio imagem/som em movimento deriva, sem dúvida, da postura dos críticos de cinema, desde o final da década de vinte, quando do aparecimento do cinema
  • 41. 41 sonoro, convencidos que estavam de que a cor, o diálogo e a música eram acessórios não admitidos na arte cinematográfica. Hoje, a produção do filme publicitário para televisão, passível que é da mesma visão generalizante, tem objetivo pragmático e busca a persuasão não impondo qualquer restrição ao uso da palavra. A comunicação verbal no comercial de TV, mesmo quando redundante, é entendida como reforço da imagem, como na época das garotas propaganda. A mesma sorte não teve o som enquanto música. Os livros e manuais sobre publicidade, assim como os currículos dos cursos de publicidade, em qualquer nível, abordam pouquíssimo a utilização dos recursos sonoros nas mensagens publicitárias. Quando muito, a música é tratada como apêndice ou elemento decorativo complementar da comunicação visual e da comunicação verbal, mesmo assim perfeitamente descartável ao primeiro sinal de restrição de verbal. Isto quer dizer que apesar de algumas trilhas serem especialmente compostas para comerciais, elas não são merecedoras de estudos sobre a sua efetiva participação na mensagem. Os críticos e estudiosos de música, apesar de reconhecerem na própria música a falta de teorização ou conhecimento real, prático, da natureza e dos efeitos desta, acreditam que “a trilha sonora dos comerciais de televisão é utilizada com cuidado microscópico, com a finalidade de extrair, em reais, o máximo efeito dos poucos segundos de tempo pagos à emissora de televisão pelo anunciante” (TAME, 1987, p. 28). Dessa forma, a música é colocada no mesmo nível dos outros componentes da mensagem comercial, porquanto “sons, música, gestos, palavras, imagens, figuras, movimentos circunscrevem o envolvimento do consumidor no mundo dentro do anúncio” (ROCHA, 1985, p. 146). Esta sabedoria empírica dos publicitários, gradativamente acumulada, sobre os efeitos da música é construída, segundo os críticos, através da experimentação do método de tentativa e erro. A psicologia demonstra que a sensibilidade do olho é muito maior que a do ouvido, que as imagens se impõem sobre os sons com uma evidência e um poder de sugestão muito maior, que finalmente todos os fenômenos secundários – memória, concentração de atenção, poder discriminador do órgão sensorial, etc., e sobretudo a velocidade psicológica das sensações subseqüentes – são extraordinariamente mais relevantes (como intensidade e como ritmo) no caso das imagens, comparados com mundo dos sons. (MAY apud BATAN, 1992, p. 42). Com o assincronismo técnico nasce a possibilidade, segundo May apud Batan (1992, p. 43), de representar realisticamente imagens e sons, segundo ritmos distintos. O sons psicologicamente selecionados são representados ora em coincidência com a representação ótica da fonte sonora do quadro, ora como relativos a fontes sonoras não diretamente
  • 42. 42 representadas neste, mas supostamente presentes na cena. Assim, de um trecho de diálogo, por exemplo, uma parte será percebida à fonte sonora (o ator que fala) e a outra será percebida pondo-se fora de campo – mediante o corpo e montagem – a fonte sonora, sobre o ator que escuta. O emprego de um tal assincronismo técnico reconduz o realizador à liberdade de corte da imagem e a um reforçamento da própria expressão cinematográfica, a que se acrescentam novas possibilidades de linguagem. Estas possibilidades, a que se refere MAY, são a associação e dissociação a partir da relação de causalidade entre imagens e sons: o som causado de um efeito visual, e a visão causadora de um efeito sonoro. No cinema, o ritmo dos sons é condicionado pelas imagens, e, portanto, pelo ritmo da montagem ótica. Na televisão, ao contrário, é o ritmo da imagem que é condicionado por exigências no som. A conseqüência deste fato é a de que a liberdade de corte no cinema implica montar o som para não renunciar a idealidade fundamental de tempo e espaço, que decorre da seqüência e ritmo das imagens na expressão cinematográfica. Conforme quadro descrito na tese Propaganda: domínio através do som sobre o “Resumo de diferenças técnicas e psicológicas da expressão por imagens e sons, no cinema e na televisão, de interesse para a publicidade”, descreve-se abaixo apenas duas relações: RELAÇÕES CINEMA TELEVISÃO Ritmo imagem-som Imagem condiciona ritma do Som condiciona ritmo da Som. imagem. Ponto de vista do espectador Objetividade das imagens. (O Subjetividade das imagens. (O espectador ignora a existência protagonista fala diretamente da câmera e microfone). com o espectador). O olho do espectador é a câmera. Figura 2 – Resumo de diferenças técnicas e psicológicas da expressão por imagens e sons, no cinema e na televisão, de interesse para a publicidade. Fonte: BATAN (1992, p. 53). Para Batan (1992) o comercial de televisão ou filme publicitário para a televisão, por ser uma combinação de elementos capazes de, mesmo isolados, transmitirem uma mensagem, assim, como, dadas as características diferenciadoras da forma de expressão em dois meios de comunicação distintos, apresenta-se como a síntese da dificuldade de adaptação para transmitir uma mensagem utilitária através de sons e imagens. Ao mesmo tempo que o filme publicitário parece, pelo menos em parte, aproveitar a linguagem do cinema – escrever
  • 43. 43 por imagens –, precisa respeitar as convenções estabelecidas entre o meio televisão e o telespectador – falar por imagens. No próximo capítulo aprofundaremos a questão da utilização do som na publicidade.
  • 44. 44 “As pessoas querem ser enganadas, deixe-as serem enganadas”. (Cardeal Carlo Carafe ao Papa Paulo IV)
  • 45. 45 CAPÍTULO IV A UTILIZAÇÃO DO SOM NA COMUNICAÇÃO 4.1 PUBLICIDADE A publicidade tem dois objetivos simples e mensuráveis – aumentar o número de consumidores e a quantidade que eles consomem. O sucesso ou o fracasso geralmente são medidos em relação a estes dois critérios. (KEY, 1996, p. 76). Fundada sobre a égide do verbo imperativo, a publicidade pode ser entendida como um ato de comunicação cujos signos estão organizados de maneira a produzir um semantema específico: a crença no consumo. Em outras palavras: 1) conforme citado por Bigal (1993) a publicidade torna pública a existência de determinados produtos, marcas e serviços; 2) a publicidade desperta o desejo pela coisa anunciada, ao levar ao conhecimento público tais fatos mercadológicos; 3) a publicidade é de massa; 4) a publicidade é não apenas discurso sobre o objeto anunciado (produtos, marcas, serviços) mas também o próprio objeto e, portanto “duplo objeto”. As relações associativas entre esses elementos podem ser verificadas em duas situações: primeiro, quando o imperativo, isto é, o discurso lógico-linear e simbólico estrutura a peça publicitária; segundo, quando a própria mensagem é o fator de predominância da peça. A seguir procuraremos explanar a citação de Bigal (1993). Uma seleção de signos realizada por um emissor dentro de um repertório de público receptor determinado, é o instrumento do qual a publicidade se utilizada para tornar pública a existência de determinados produtos, marcas ou serviços. A publicidade desperta o desejo pela coisa anunciada, gerando o descompasso entre as reais necessidades do sujeito e aquilo que ele passa e deseja ter e aquilo que passa e deseja ser. O instrumento dessa força de atração, gerada pelo consumo é chamada de desejo pela psicanálise, é a fantasia, que se materializa em signos na peça publicitária.
  • 46. 46 A mira da publicidade é direcionada a um determinado segmento de público no target. Em um país como o Brasil, por exemplo, essa contradição acentua-se na medida em que aquele que produz nem sempre é consumidor de sua própria produção. As mercadorias são produzidas para pequenos grupos que, somados, podem ou não garantir essa produção, o que vale dizer: a massa consome mais simbólica do que efetivamente. A linha demarcatória que distingue a noção de público da noção de massa se mostra aqui bastante clara: a ação integrada e a unidade compactuada, fundadas na formação de opinião, que desenham o percurso social do público, sequer rascunham o percurso social da massa. A publicidade não é apenas discurso sobre objetos (produtos, marcas e serviços), mas também o próprio objeto de consumo, e, portanto, um duplo objeto. Isto quer dizer que, ao expor produtos, marcas e serviços, a publicidade também se expõe como um sistema de crença bastante definida: a crença no consumo. O objeto de consumo não é um fim em si mesmo, mas do consumo – desejo de consumir – que revela-se interesse subjacente muito mais importante que o próprio objeto. 4.2 PUBLICIDADE: COMUNGAR PARA COMUNICAR O filme publicitário é resultado da combinação de recursos técnicos e artísticos, de imagem em movimento e som, sintetizados em trinta segundos, com o objetivo de persuadir um público específico, através de mensagem comercial. A exibição deste filme tem como finalidade obter, deste público, uma mudança de atitude propícia a criar nele comportamento que o predisponha à compra. (BATAN, 1992, p. 71). Para conseguir seu intento, de alguma forma, é necessário comungar para comunicar. Para fazer passar uma mensagem entre o emissor e o receptor é necessário um código, reconhecido por ambos. E para convencer é preciso ser compreendido, o que supõe um mínimo de cumplicidade cultural com o público visado. Para alcançar seus propósitos, a publicidade se utiliza de uma forma própria de aliança entre a imagem e o som, numa mensagem de dupla leitura. Uma leitura convencional, pelos escritos e falas utilizados, e outra natural, pelas representações. As duas leituras, heterogêneas entre si, mas integradas, remetem necessariamente uma à outra: “a seqüência figurativa só toma um sentido em relação à cadeia sintagmática, que, em retorno, naturaliza seu arbítrio cultural por uma mediação imaginativa”. (LAGNEAU, 1974, p. 119).
  • 47. 47 4.3 O SOM PUBLICITÁRIO EM BUSCA DA PERSUASÃO Esse é exatamente o caso dos filmes publicitários que, para conseguir a persuasão do receptor, se apóiam no que Leduc apud Batan (1992) chama de “mecanismo de sugestão”. Esse mecanismo está em contraposição ao “mecanismo de racionalização”, que é construído sobre uma linha de raciocínio, e mesmo ao “mecanismo automático”, que se baseia na repetição da marca buscando um reflexo mental. O mecanismo de sugestão parte do princípio de que a persuasão pode ser obtida por meios que façam apelo aos sentidos. A mensagem verbal, que se alimenta de símbolos, é, em certos casos, mais eficaz do que a que se inspira em palavras e na lógica. Ela substitui o pensamento lógico, mantido e provocado pela linguagem, por um pensamento sensível, capaz de fazer sentido com intensidade e no momento exato com a nuança mais sutil. (LEDUC, 1972, p. 58). A comunicação do filme publicitário, a exemplo do que acontece com a televisão, é oral-auditiva-visual. E a beleza de um texto não entra pelos olhos, entra pelos ouvidos, portanto, o que importa são suas qualidades sonoras (PLAZA apud BATAN, 1992, p. 82). Além disso, a possibilidade que existe da imagem evocar sons e da mesma forma dos sons evocarem imagens, abre, neste mecanismo de sugestão, múltiplos recursos que propiciam à mensagem publicitária passar um conceito de produto para o receptor, prescindindo da linguagem verbal. Ver com os olhos como ver com os ouvidos sugere uma diferença fundamental entre o canal visual e o acústico, como nos demonstra Júlio Plaza apud Batan (1992, p. 82): O primeiro, pode escolher e selecionar a informação, isto é, pode eliminar a informação de seu campo de amostragem. Já o canal acústico é obrigado a percebe em simultaneidade várias sucessividades. Outra diferença: o canal visual pode escolher a sua fonte de informação, o canal auditivo tem mais dificuldade em localizar sua fonte. A univocidade do canal visual opõe-se à ambigüidade do canal áudio. O que se vê em oposição ao que se sabe e sente. Daí a fotografia como documento, em oposição ao mundo oral, ao mito. Ver para crer é o lema ocidental. O publicitário considera o audiovisual publicitário muito mais visual do que áudio. Ele considera “a possibilidade de concentrar o vídeo, fixar o vídeo no produto, num objeto, ou numa série de objetos e desenvolver a argumentação pelo áudio. Deixar ao áudio a persuasão, o arremate, a moral da história” (BARRETO, 1978, p. 247). Num outro discurso, no mesmo sentido, Barreto afirma que “quem compra e compreende não é o ouvido, mas a vista. A conseqüência direta será que nós vamos tentar vender apelando para a vista, tendo mais
  • 48. 48 confiança naquilo que mostramos do que naquilo que dizemos”. (JOANNIS apud BATAN, 1992, p. 82). Este posicionamento privilegiando a imagem em detrimento do som deriva do fato de estar associando som com fala, linguagem verbal portanto, e não com a música ou ruídos, que também estão fora do conceito de expressão, assim, da mesma forma que a imagem, estão destinados aos sentidos e não à razão. Neste sentido, o mesmo discurso utilizado para a imagem poderia ser utilizado para o som, entendido como música. E adaptando-se o que afirma Artur da Távola, sobre a televisão para o comercial de televisão, tem-se que ambos são constituídos por palavra, música, ruídos e imagens. Enquanto a palavra tem um caráter racionalista, pragmático, lógico, os demais têm caráter desestruturador. Enquanto a palavra, por ser originária da razão, estrutura, convence e persuade, a imagem e a música, por suas naturezas poetizante, dramatizante e surrealistizante, falam um idioma independente. Natureza dramatizante enquanto traz, sem necessidade de conceitos, a vida e o ser humano em si. Poetizante no sentido de inventar um caminho novo e surrealistizante por poder ultrapassar as barreiras do chamado real concreto. (TÁVOLA apud BATAN, 1992, p. 83). 4.4 O SOM NA PUBLICIDADE Conforme discurso dos produtores de áudio citado na tese de Batan (1992, p. 96) o Brasil, com exceções, está fazendo jingles. O som é um tanto antigo e não é a tecnologia que vai resolver. O som não passou pela mesma evolução que a imagem. Com o tempo, a pesquisa e o conhecimento dos músicos foi permeando a propaganda. A criatividade na música de trilhas é maior do que na música comercial feita atualmente, pois a indústria do disco impõe padrões rígidos. Os profissionais estrangeiros concordam que os filmes brasileiros são superiores e estão além das trilhas. Oitenta por cento dos comerciais veiculados no Brasil são um jingle-clip, ou jingles filmados. Em 80% dos casos o diretor de cinema solicita ao músico apenas sublinhar a imagem, cometendo assim um sério equivoco. Uma cena romântica, por exemplo, não exige necessariamente uma música romântica. O profissional do som deve criar, junto com a imagem, um terceiro elemento. Esse é o elemento mágico. Quando essa magia não ocorre é porque uma das duas coisas está errada: ou a imagem ou o som. Músico e diretor do filme devem caminhar juntos na mesma direção. O papel do maestro é descobrir qual a música que o filme quer ter. Não é atribuir som à imagem, mas descobrir. Pois, o filme, a partir de dado momento, deixa de pertencer ao criador ou ao diretor: ele pertence a si mesmo. Neste