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Cássio Cornachi do Nascimento
O rádio na era da convergência digital:
um estudo de caso sobre a webrádio Canal Fluminense
Rio de Janeiro
2011
Cássio Cornachi do Nascimento
O rádio na era da convergência digital:
um estudo de caso sobre a webrádio Canal Fluminense
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à
Universidade Estácio de Sá como requisito
para obtenção do 3º grau no curso de
Comunicação Social – habilitação em
Jornalismo
Orientador: Prof. Marcio Gonçalves
Rio de Janeiro
2011
Cássio Cornachi do Nascimento
O rádio na era da convergência digital:
um estudo de caso sobre a webrádio Canal Fluminense
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à
Universidade Estácio de Sá como requisito
para obtenção do 3º grau no curso de
Comunicação Social – habilitação em
Jornalismo
BANCA EXAMINADORA
Prof. Marcio Gonçalves
Orientador
Universidade Estácio de Sá
Francisco Aiello
Universidade Estácio de Sá
Gabriela Toledo
Universidade Estácio de Sá
Rio de Janeiro, 08 de dezembro de 2011.
AGRADECIMENTOS
Aos meus pais, pelos ensinamentos que certamente vão além de qualquer aprendizado
universitário.
À minha avó, padrinho, madrinha e demais parentes próximos, pelo carinho e apoio.
À minha namorada Yasmin, pelo amor, ternura e companheirismo demonstrados diariamente.
Aos amigos Allan, Diego, Diogo e Tania, pelas incontáveis gargalhadas.
Aos amigos Gabriel Peres e Claudio Kote, pela primeira oportunidade profissional.
Aos professores Marcio Gonçalves e Rafael Rocha, pela orientação ao longo da pesquisa.
Aos professores Francisco Aiello, Patrícia Cupello e Ricardo Mazella, que sem meias
verdades contribuíram para minha formação.
Ao Fluminense Football Club. Você é a história.
“Quem olha o nosso passado, quem examina a
nossa história, tem que chegar honestamente a
uma conclusão fatal: o Fluminense deve ser o
primeiro em tudo, particularmente, no
futebol”.
Nelson Rodrigues
RESUMO
Esta monografia consiste em um estudo sobre as características e uma análise da
interatividade da webrádio Canal Fluminense, veículo segmentado de mídia de massa que
transmite todos os jogos do Fluminense Football Club através do site oficial do clube. Os
objetivos com este trabalho eram o de abordar a evolução histórica das mídias rádio e internet
e entender como elas funcionam no ambiente digital em que convergiram; apresentar o
funcionamento de uma webrádio com programação exclusiva para a internet e as questões
técnicas envolvidas no projeto da rádio online e digital; explicar a utilização de uma
linguagem deliberadamente parcial em transmissão de jogos de futebol com base nas
características éticas e comportamentais exigidas aos jornalistas em geral; demonstrar como
os profissionais da rádio interagem com os ouvintes e verificar se estes usuários se sentem
valorizados com a participação deles ao longo das transmissões; e apontar se o Fluminense,
por sua vez, foi privilegiado com a disseminação das notícias de interesse dele e se houve
algum benefício com a integração da rádio como veículo oficial. Desta forma, a conclusão
baseia-se na ascensão de um veículo segmentado que utiliza as novas tecnologias de
comunicação e cultura. A metodologia usada é a pesquisa bibliográfica e o estudo de caso. As
principais referências foram Cornu (1998), McCombs (2009), Magnoni e Carvalho (2010) e
Lanna Fernandez (2010).
Palavras-chave: webrádio, convergência, rádio e internet, Fluminense Football Club, Canal
Fluminense, jornalismo esportivo, interatividade, imparcialidade e emoção.
ABSTRACT
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Quadro 1 – Súmula de Fluminense Football Club 8 x 0 Rio Football Club 50
Quadro 2 – Fred recebendo o troféu Guerreiro da Galera 58
Quadro 3 – Enquete no Facebook do Canal Fluminense 62
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ......................................................................................................................10
1 DO DESENVOLVIMENTO DO RÁDIO ATÉ A ERA DA INTERNET ......................12
1.1 RÁDIO: O PONTO A PONTO PELO AR ............................................................12
1.2 INTERNET: COMUNICAÇÃO EM ESCALA GLOBAL ...................................16
1.3 CONVERGÊNCIA: O RÁDIO NA WEBEMERGÊNCIA ...................................21
2 FILTROS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO .....................................................26
2.1 TEORIA DO AGENDAMENTO E GATEKEEPING: OS PRESSUPOSTOS DA
NOTÍCIA .................................................................................................................................26
2.2 ÉTICA NO JORNALISMO: OS DOIS LADOS DE UMA MESMA MOEDA
...................................................................................................................................................32
2.3 O RECEPTOR NO RÁDIO: NOVOS PÚBLICOS NO AR ..................................37
3 HISTÓRIAS QUE SE CONFUNDEM .............................................................................41
3.1 ESTRANGEIRICES ENTRAM, SIM, NA TERRA DO ESPINHO .....................41
3.2 IMPARCIALIDADE E EMOÇÃO: OS ASPECTOS COMPORTAMENTAIS
DOS PROFISSIONAIS ...........................................................................................................46
3.3 FLUMINENSE FOOTBALL CLUB: RETUMBANTE DE GLÓRIAS ...............49
3.4 RÁDIO CANAL FLUMINENSE: A PROPOSTA DA SEGMENTAÇÃO ..........55
3.5 ANÁLISE QUALITATIVA DA INTERATIVIDADE E DA VALORIZAÇÃO
DO USUÁRIO DA RÁDIO CANAL FLUMINENSE ............................................................60
CONCLUSÃO ........................................................................................................................63
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................65
INTRODUÇÃO
No século XXI, com a popularização dos computadores e, consequentemente, da
internet, ficou cada vez mais intensa a demanda por notícias em “tempo real”, tendo em vista
suprir mais uma parcela que se abria no mercado da comunicação. Neste período, alguns
veículos radiofônicos já consolidados passaram a produzir notícias exclusivas para a internet,
enquanto outros ainda embrionários vislumbraram neste cenário a chance perfeita para
crescer.
Com o desenvolvimento da tecnologia streaming, tornou-se possível a distribuição de
conteúdo multimídia sem a necessidade de se descarregar o arquivo para o computador, ou
seja, a mídia passa a ser reproduzida à medida que os pacotes de informações são salvos no
buffer, região da memória do computador utilizada para a retenção temporária de dados.
Embora algumas emissoras apenas reproduzam na web o conteúdo das transmissões
realizadas no dial, existem as webrádios que funcionam exclusivamente para o público da
grande rede, aproveitando as diversas características oferecidas por este novo meio. Uma das
ferramentas que é mais bem utilizada na web do que em rádios AM e FM é a interatividade,
mais aguçada no público da internet. Além disso, é mais barato levar uma webrádio ao ar do
que administrar uma emissora convencional.
Com a meta de explorar este novo mercado, cheio de novas possibilidades e um tanto
quanto ‘desconhecido’ do grande público – inclusive de grandes veículos –, a empresa Canal
Fluminense lançou, em 2007, a primeira rádio online dedicada exclusivamente às
transmissões de jogos de um clube de futebol: o Fluminense Football Club.
A proposta do veículo era de permitir que torcedores em todo o lugar do mundo
pudessem acompanhar o clube do coração – através de uma emissora parcial, em que todos os
profissionais torciam deliberadamente pelo Fluminense ao longo das transmissões –
utilizando apenas um computador conectado à internet, sem que a qualidade da transmissão
fosse afetada pelas interferências de sinal.
Para explorar a interatividade, um profissional se dedicava apenas a conversar com os
torcedores-ouvintes por programas de mensagem instantânea, reproduzindo no ar a opinião de
alguns torcedores. Em 2011, a Rádio Canal Fluminense foi agregada ao site oficial do
Fluminense < www.fluminense.com.br > e tornou-se a rádio oficial do clube.
1 DO DESENVOLVIMENTO DO RÁDIO ATÉ A ERA DA INTERNET
1.1 RÁDIO: O PONTO A PONTO PELO AR
O rádio é o meio de comunicação que funciona através da propagação de ondas
eletromagnéticas no espaço. Estas ondas podem ser curtas com alta frequência ou longas de
baixa frequência. O rádio atingiu seu auge entre os anos de 1919 e 1951. No Brasil, o
aparelho foi apresentado ao público apenas na década de 20, mais precisamente no ano de
1922, como parte dos festejos do centenário da independência política do país em relação a
Portugal.
Segundo Straubhaar e LaRose (2004, p. 56), no final da década de 1890 e início da
década de 1900, o italiano Guglielmo Marconi, que “[...] ajudou a inventar o rádio, com
patentes na Grã-Bretanha, em 1896. [...] tentou empurrar o rádio para o uso militar e em
negócios em sua Itália nativa, mas o governo não estava interessado”. Entretanto, a oferta de
Marconi foi aceita pela Inglaterra e, mais tarde, pelos Estados Unidos.
O rádio, utilizado como equipamento militar, teve importância evidenciada durante a
Primeira Guerra Mundial, que durou de 1914 a 1918. Para Straubhaar e LaRose (2004, p. 56),
neste período “[...] o rádio era visto como um telégrafo de duas mãos ou ponto a ponto pelo
ar”. Já na opinião de Worts (1915, p. 647-650), a razão pelo rádio ter se destacado foi que
“[...] no início das hostilidades, os principais cabos de comunicação da Alemanha haviam sido
cortados ou desligados, de modo que seu contato com o exterior dependia essencialmente da
comunicação sem fio”.
O equipamento sem fio que o General Joffre usava para manter contato com
as linhas de frente dos aliados era portátil e tinha um alcance de 320 km.
Não eram precisos mais do que 15 minutos para montar esta estação e torná-
la operante. Na linha de frente eram utilizados equipamentos menores e mais
leves, conhecidos como "knapsack". Podiam ser divididos de modo que
quatro homens pudessem transportá-los - cada parte pesava menos de 10 kg -
e eram preparados para entrar em operação em menos de 5 minutos
(WORTS, 1915, p. 647-650).
Marconi ainda “[...] tentou comprar as patentes dos Estados Unidos para consolidar o
monopólio de comunicações entre esse país e a Europa, mas o governo dos Estados Unidos se
opôs ao controle estrangeiro” (STRAUBHAAR E LAROSE, 2004, p. 57). Em face desta
recusa, “[...] um acordo negociado forçou Marconi a vender seu patrimônio americano para a
General Electric. Em conjunto com a AT&T e a Westinghouse, a GE montou uma nova
empresa, a Radio Corporation of America” (STRAUBHAAR E LAROSE, 2004, p. 57).
Com o fim da Primeira Guerra, os aparelhos de rádio fabricados para a utilização dos
militares estadunidenses ficaram em estoque e, por conta disso, uma das opções encontradas
para minimizar o prejuízo foi instalar uma antena no pátio da empresa Westinghouse, a
fabricante dos aparelhos, e transmitir música para as pessoas da vizinhança, que puderam
comprar os rádios estocados. Foi então que o engenheiro Frank Conrad deu início a uma
estação regular de transmissão na Companhia.
Uma loja de departamentos de Pittsburgh decidiu tentar vender rádios para
sintonizar as transmissões de Conrad. Não demorou muito para que a
Westinghouse descobrisse que a transmissão regular de rádio poderia ajudar
a vender rádios, e ela logo abriu a estação KDKA em Pittsburgh, em 1920.
[...] Foram 100 mil em 1922 e mais de 500 mil em 1923 (STRAUBHAAR E
LAROSE, 2004, p. 58).
A popularização do rádio foi tanta que, em pouco mais de um ano, o número de
emissoras de rádio dos Estados Unidos passou de quatro para 382. E esse novo conceito de
utilização do rádio se estendeu mundo a fora, sendo “[...] particularmente importante por
alcançar com muito mais facilidade as áreas rurais”. (STRAUBHAAR E LAROSE, 2003, p.
34) Nas palavras de McLuhan, (1977, p. 192) “[...] nossa própria ‘turbulenta década de vinte’
foi a primeira a sentir o meio quente do filme e também o não menos quente do rádio. Foi a
primeira grande era de consumo”.
A primeira emissora de rádio brasileira foi a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro – hoje
Rádio MEC –, com finalidade cultural e educativa. Contudo, além da qualidade ruim das
transmissões, tanto no que se refere ao profissionalismo quanto às dificuldades técnicas para
minimizar os ruídos, as taxas cobradas pelas rádios sociedades afastaram parte do público
ouvinte da rádio, que só recebiam a transmissão mediante o pagamento pelo serviço.
A fórmula utilizada, então, para a criação de uma nova emissora era a da
formação de uma rádio-sociedade, que previa em seus estatutos a existência
de associados com obrigação de colaborar com uma determinada quantia
mensal. A verba arrecadada dessa forma era a principal, senão a única, fonte
de renda das emissoras. Muitas pessoas se associavam, mas poucas se
mantinham pagando regularmente as mensalidades. Eram tempos difíceis
para as rádio-sociedades (CALABRE, 2004, p. 12).
Anos depois, o rádio de galena foi substituído pelo de válvula. Essa substituição
barateou o custo de fabricação dos aparelhos, culminando na popularização do rádio e no
maior alcance da população. Em face disso, o rádio rapidamente consolidou-se como o
principal meio de comunicação brasileiro e viveu seu auge até a década de 50, tendo
crescimento freado pelo aparecimento de um novo meio de comunicação: a televisão.
O rádio criou modas, inovou estilos, inventou práticas cotidianas, estimulou
novos tipos de sociabilidade. Ícone de modernidade até a década de 1950,
ele cumpriu um destacado papel social tanto na vida privada como na vida
pública, promovendo um processo de integração que suplantava os limites
físicos e os altos índices de analfabetismo no país (CALABRE, 2004, p. 7).
Situação semelhante aconteceu nos Estados Unidos, segundo Straubhaar e LaRose
(2004, p. 63), que citaram a utilização do rádio na Segunda Guerra (1939–1945) e, assim
como a autora Lia Calabre, ligaram a queda do número de emissoras de rádio à ascensão da
televisão.
As redes de rádio continuaram fortes ao longo da Segunda Guerra Mundial,
o que em muitos casos representou um pico na importância do rádio quando
comparado a outras formas de mídia. [...] As redes de rádio desenvolveram-
se altamente até 1947, o mesmo ano em que a audiência dos cinemas chegou
ao pico, mas, à medida que a televisão cresceu em proeminência, tornando-
se a principal fonte nacional de entretenimento de massa, a rede de rádio
começou a ter seu progresso restringido. O número de redes afiliadas caiu de
97%, em 1947, para 50% em 1955 (STRAUBHAAR E LAROSE, 2004, p.
63).
Em paralelo à ascensão da televisão, que foi tomando o espaço ocupado pela rádio por
unir som e imagem, iniciou-se a Guerra Fria, que durou de 1945 a 1989, ano em que o
socialismo já estava praticamente suprimido na extinta União Soviética. Foi neste período
histórico, em que os Estados Unidos e a União Soviética travaram uma corrida armamentista,
que a internet se desenvolveu.
1.2 INTERNET: COMUNICAÇÃO EM ESCALA GLOBAL
A internet, segundo Castells (2003, p. 8), foi o meio de comunicação que permitiu
“[...] pela primeira vez, a comunicação de muitos-com-muitos, num momento escolhido, em
escala global”, aspecto aguçado pela criação recente das redes sociais. No entanto, esta forma
de comunicação era diferente do conceito de comunicação de massa que classificava o rádio,
a televisão e as demais mídias existentes, em que a comunicação era de um-para-muitos.
Comunicação de massa é geralmente definida como um-para-muitos ou
ponto a multiponto. Nesse caso, uma mensagem é comunicada de uma única
fonte para centenas ou milhares de receptores, com relativamente poucas
oportunidades para a audiência comunicar-se de volta com a fonte
(STRAUBHAAR E LAROSE, 2004, p. 9).
Embora existam divergências entre autores quanto ao conceito de comunicação de
massa e quais mídias se encaixam neste modelo, fator que vai ser esclarecido no capítulo
‘Convergência: o rádio na webemergência’, neste será abordado o surgimento e
desenvolvimento da internet, que, assim como o rádio, foi utilizada com objetivos militares.
O intuito dos estadunidenses, que travava corrida armamentista contra a União
Soviética, era desenvolver a possibilidade de manter comunicação com as bases militares
mesmo que o Pentágono e os meios convencionais de comunicação da época fossem atingidos
em um ataque inimigo durante a Guerra Fria.
Um grupo de programadores e engenheiros eletrônicos, contratados pelo
Departamento de Defesa dos Estados Unidos, desenvolveu o conceito de
uma rede sem nenhum controle central, por onde as mensagens passariam
divididas em pequenas partes [...] Assim, as informações seriam transmitidas
com rapidez, flexibilidade e tolerância a erros, em uma rede onde cada
computador seria apenas um ponto (ou “nó”) que, se impossibilitado de
operar, não interromperia o fluxo das informações (MONTEIRO, 2001, p.
28).
Com esta proposta surgiu a Arpanet, precursora da internet, que foi “[...] uma rede de
computadores montada pela Advanced Research Projects Agency (ARPA) em setembro de
1969” (CASTELLS, 2003, p. 13). Entretanto, o projeto foi usado pelo cientista da
computação J.C.R. Licklider, contratado pela ARPA para liderar o IPTO (Information
Processing Techniques Office), para realizar um sonho pessoal dele, o da criação de “[...] uma
rede de computadores que permitisse o trabalho cooperativo em grupos, mesmo que fossem
integrados por pessoas geograficamente distantes” (IMRE, 1997).
Para montar uma rede interativa de computadores, o IPTO valeu-se de uma
tecnologia revolucionária de transmissão de telecomunicações, a comutação
por pacote, desenvolvida independentemente por Paul Baran na Rand
Corporation e por Donald Davies no British National Physical Laboratory. O
projeto de Baran de uma rede de comunicação descentralizada, flexível, foi
uma proposta que a Rand Corporation fez ao Departamento de Defesa para a
construção de um sistema militar de comunicações capaz de sobreviver a um
ataque nuclear, embora esse nunca tenha sido o objetivo por trás do
desenvolvimento da Arpanet (grifo nosso). O IPTO usou essa tecnologia
de comutação por pacote no projeto da Arpanet (CASTELLS, 2003, p. 14).
“O passo seguinte foi tornar possível a conexão da Arpanet com outras redes de
computadores, a começar pelas redes de comunicação que a ARPA estava administrando, a
PRNET e a SATNET” (CASTELLS, 2003, p.14). A possibilidade de conexão entre diferentes
redes foi alcançada apenas no fim da década de 1970, com “o desenvolvimento e utilização do
TCP/IP (Transmission Control Protocol/Internet Protocol) como protocolo para a troca de
informações na ARPAnet” (MONTEIRO, 2001, p. 28).
Para que pudessem falar umas com as outras, as redes de computadores
precisavam de protocolos de comunicação padronizados. Isso foi conseguido
em parte em 1973, num seminário em Stanford, por um grupo liderado por
Cerf, Gerard Lelann (do grupo de pesquisa francês Cyclades), e Robert
Metcalfe [então no Xerox PARC], com o projeto do protocolo de controle de
transmissão [TCP]. Em 1978 Cerf, Postel e Crocker, trabalhando na
Universidade da Califórnia do Sul, dividiram o TCP em duas partes,
acrescentando um protocolo intra-rede [IP], o que gerou o protocolo TCP/IP,
o padrão segundo o qual a Internet continua operando até hoje (CASTELLS,
2003: p. 14-15).
Por mais que a abrangência da rede tenha aumentado enormemente após a criação do
protocolo TCP/IP, a internet se popularizou apenas após o desenvolvimento do WWW
(World Wide Web), “[...] aplicação de compartilhamento de informação desenvolvida em
1990 por um programador inglês, Tim Berners-Lee, que trabalhava no CERN, o Laboratório
Europeu para Física de Partículas baseado em Genebra” (CASTELLS, 2003, p. 17).
A WWW permite a troca de conteúdos multimídias, como texto, imagens, sons e
vídeos, em um ambiente de interface mais agradável e o acesso a informações através de
navegadores. “[...] a WWW foi imediatamente adotada pela comunidade da internet, sendo
responsável [...] pelo grande crescimento da internet verificado na década de 1990, com um
aumento de 50% a cada ano em média (DIZARD, 2000, p. 24).
A Mosaic Communications, que mais tarde foi obrigada a mudar seu nome
para Netscape Communications [...] tornou disponível na Net o primeiro
navegador comercial, o Netscape Navigator em outubro de 1994, e
despachou o primeiro produto no dia 15 de dezembro de 1994. Em 1995,
lançaram o software Navigator através da Net, gratuitamente para fins
educacionais e ao custo de 39 dólares para uso comercial (CASTELLS,
2003, p. 18).
“Depois do sucesso do Navigator, a Microsoft finalmente descobriu a Internet e em 1995,
junto com seu software Windows 95, introduziu seu próprio navegador, o Internet Explorer”
(CASTELLS, 2003, p. 19). O surgimento cada vez mais acelerado de browsers, provedores de
acesso e possibilidades de websites, fizeram com que os usuários começassem a enxergar na
internet a chance de conhecer novas pessoas, expandir os negócios da empresa, entreter-se
com os mais diversos jogos e seguir buscando conhecimento tanto através de pesquisas como
com veículos online, que na década de 90 apenas reproduziam as notícias dos jornais
impressos.
Com o maior interesse das pessoas no universo online, a internet se desenvolveu e se
tornou mais colaborativa – conceito wiki –, além de favorecer a interação entre internautas em
fóruns específicos. Por conta disso, em 2004, Tim O’Reilly, fundador da O’Reilly Media,
classificou esta nova fase da internet de ‘Web 2.0’, em que a “nova versão” era referente às
formas de comunicação entre usuários e não às alterações técnicas.
A Web 2.0, termo criado por Tim O’Reilly, não traz quase nenhum
paradigma tecnológico novo, mas aponta para o conceito de ampla troca de
informações e colaboração dos usuários dos serviços, sem, contudo,
demandar uma infraestrutura proprietária para o fornecimento de conteúdo.1
De acordo com Hamadoun Toure (2011), responsável pela agência de comunicação da
ONU (Organização das Nações Unidas), em janeiro de 2011, 2,08 bilhões de pessoas no
mundo já haviam acessado a internet, quase 1/3 da população mundial, estimada em 6,8
bilhões. Em 2009, a quantidade de internautas era de 1,86 bilhão. Este aumento desenfreado
de usuários da internet é motivo de preocupação para Wolton (2010, p. 23), pois, segundo ele,
“[...] com a tecnologia, tudo se simplifica, com os homens e a sociedade, tudo se complica”.
Eis o desafio: perpetuar, num mundo saturado de informação, de
comunicação e de tecnologia, o valor da emancipação, que sempre as regeu
desde o século XVI. É preciso impedir que a informação e a comunicação,
até ontem fatores de aproximação, tornem-se aceleradores de incompreensão
e de ódio justamente por serem visíveis todas as diferenças e toda alteridade
(WOLTON, 2010, p. 14).
Entretanto, este crescente uso das redes sociais não pode ser encarado apenas por um
viés negativo no que se refere aos desentendimentos virtuais, ele também oferece um novo
espaço a ser explorado pelas companhias, ou seja, “[...] uma grande oportunidade de mercado
para as empresas sintonizadas com as novas tendências de mídias e canais”.2
A crescente adoção das mídias sociais nos ambientes corporativos se
evidencia como a migração bem sucedida de uma tendência que começou no
mundo individual e chegou ao organizacional. A compreensão e o
reconhecimento prático da sua utilidade com o meio e/ou estratégia para
melhorar os negócios, processos, relacionamentos e comunicações da
empresa – internas ou externas –, de forma a transformar sua prática diária
em um modelo mais participativo e interativo com os diversos públicos de
1
Disponível em: < http://www.ecnetwork.com.br/a-web-2-0-acelerando-e-desgovernando-a-
convergencia/ >. Acesso em: 21/09/2011.
2
Disponível em: < http://www.publicidadedigital.com/index.php/publicidade-online/ > Acesso em:
21/09/2011.
relacionamento [stakeholders] é fator essencial para que as empresas 1.0 se
redefinam, de fato, como organizações 2.0.3
Além da ampliação do mercado comercial, a internet também propiciou novas
possibilidades de comunicação, muito em virtude da multimidialidade, ou seja, a
convergência, que “[...] consiste na união de todos os meios de comunicação em um único”
(MAGNONI E CARVALHO, 2010, p. 274).
3
Disponível em: < http://www.e-consultingcorp.com.br/midia/ultimos-artigos/Redes-Sociais-S.A-1 >.
Acesso em: 21/09/2011.
1.3 CONVERGÊNCIA: O RÁDIO NA WEBEMERGÊNCIA
A internet tem a capacidade de absorver os mais diversos meios de comunicação e
fazer com que eles funcionem juntos, a chamada convergência digital. A multimídia, na
opinião de Straubhaar e LaRose (2004, p. 23), “[...] está apagando as antigas distinções
rígidas entre os meios de comunicação”. Segundo Fidler (1998, p. 57), a convergência é uma
“[...] metamorfose dos meios antigos. E quando emergem novas formas de meios de
comunicação, as antigas geralmente não deixam de existir, mas continuam evoluindo e se
adaptando”.
Foi o caso do rádio. De acordo com Castells (2003, p. 157), “[...] a radiotransmissão
está vivendo um renascimento, tornando-se de fato o meio de comunicação de maior
penetração no mundo”, sendo considerado por Magnoni e Carvalho (2010, p. 7) como “[...] a
maior prova da capacidade de convivência dos diferentes meios de comunicação”.
A audição de rádio está florescendo na Internet, tanto a partir de estações de
transmissão aberta quanto de transmissões radiofônicas feitas pela Internet.
A relação de rádios feita pelo MIT nos EUA mostra mais de 10.000 estações
transmitindo na Internet (CASTELLS, 2003, p.162).
Quantidade superior à de rádios analógicas encontradas no Brasil, que “[...]
ultrapassou a marca de nove mil estações de rádio em 2010. No final do ano, eram 2.602 FMs,
1.784 Mas, 4.193 comunitárias, 465 FMs educativas, 74 OTs e 66 OCs, totalizando 9.184
emissoras” (Sandra Regina da Silva, 2011, p. 24). Estes números mostram que a opinião de
Barbeiro e Lima (2003) é mais do que correta.
É preciso separar a idéia de rádio como aquele aparelhinho quadrado, com
botões, e que retransmite emissoras de áudio. O rádio, comunicação auditiva,
eletrônica à distância, pode se materializar no computador, basta que este
tenha instalado um programa de áudio (BARBEIRO E LIMA, 2003, p. 45).
Para Jung (2011, p. 21), a “[...] internet deu um novo fôlego para o rádio. É o meio em
que ele vai navegar. Mais do que o próprio rádio digital, que até agora não conseguiu se
estabelecer no Brasil. [...] rádio é internet, é lá que as pessoas vão nos ouvir cada vez mais”.
Com o surgimento da internet, o fazer radiofônico se digitalizou e surgiram as webrádios:
rádios com veiculação exclusiva na rede (PRATA, 2008). Uma característica importante de
uma webrádio é a junção de linguagens sonoras, imagéticas e textuais, que se encontram
através de um endereço na URL (BRAZ E MEIRELES, 2011, p. 1).
São veículos complementares. Não tenho dúvida de que a internet valorizou
o rádio. Primeiro, porque é o único veículo que opera em conjunto com a
internet. E segundo, por ser o único realmente real time. Internet e rádio
trabalhando em conjunto geram resultados, inclusive para anunciantes,
excepcionais (CALAINHO, 2011, p. 33).
Entretanto, para o rádio “navegar” na internet, é necessário se adaptar a este novo
ambiente. Apenas retransmitir a programação do analógico não basta, pois os usuários estão
cada vez mais exigentes. É necessário, então, criar um portal mais personalizado, mais
agradável, com constante atualização de conteúdos interessantes, de forma a não perder
audiência.
Quando um usuário acessa um portal, quer sentir-se único. Gosta de ser
ouvido e interage [seja conversando nas salas de bate-papo, mandando
mensagens nos fóruns ou respondendo pesquisas de opinião]. Essas
mudanças, ainda que em estágio inicial, delineiam o novo padrão de
informação e entretenimento de massa. É uma combinação da mídia antiga e
da nova, que se complementam e ao mesmo tempo competem entre si
(FERRARI, 2008, p. 38).
A programação também terá de ser alterada, pois os usuários de determinada rádio
querem a opção de ouvir o conteúdo em tempo não-linear, uma possibilidade oferecida pela
rádio digital, ou rádio na internet, que não é disponibilizada pela rádio de caráter analógico.
A grade de programação do rádio analógico é linear e cronológica. Prevê
antecipadamente todos os programas e intervalos para publicidade, serviços,
utilidade pública etc. A grade define o perfil ou segmento de mercado em
que a emissora vai atuar. No rádio digital, os programadores terão que criar
novas estratégias para suprir uma grade que não contará só com os ouvintes
em tempo real. Os recursos, os espaços e conteúdos para interatividade com
os ouvintes também será tarefa da programação (MAGNONI E
CARVALHO, 2010, p. 138).
Magnoni e Carvalho (2010) tratam com mais serenidade, sem exagero, as mudanças
pelos quais o rádio com tecnologia digital terá de passar. Assim como em outros momentos,
como no que precisou se adaptar à migração de seus profissionais para outros meios, o rádio
passará por nova mudança, porém não muito brusca.
É presumido que a digitalização não irá reescrever totalmente a cultura
radiofônica consolidada no trajeto social de um veículo que já resistiu e se
adaptou à concorrência do cinema sonoro, da televisão, do videocassete e da
informática, bem como de todas as suas ferramentas versáteis de
comunicação e entretenimento. De imediato, o novo processo apresentará
poucas rupturas e muitas readaptações em matrizes clássicas da programação
das emissoras, que foram desenvolvidas, copiadas, aperfeiçoadas ou
reinterpretadas desde meados dos anos 1930 (MAGNONI E CARVALHO,
2010, p. 119).
Para os autores (2010, p. 109), o “[...] rádio continuará sendo sonoro, porém com
funções multimídia, portanto terá de agregar uma linguagem flexível que possibilita
diversificar conteúdos, o que torna inevitável integrar sua programação a novos formatos de
distribuição”.
A digitalização também oferece um novo padrão de qualidade dos sons, sem os ruídos
da transmissão analógica. Este aspecto deve-se à programação dos computadores em código
binário, ou seja, zeros e uns, que garante mais estabilidade ao som durante a transmissão
digital.
Na transmissão analógica há a oscilação elétrica que provoca uma perda
natural de tensão: um sinal que é gerado com 1,0 volt pode cair para 0,8
volts na recepção. Uma perda de sinal que compromete a qualidade do som
recebido, principalmente em altas frequências. Essa perda de tensão não
ocorre com a digitalização se um sinal digital for gerado com a combinação
1001, o primeiro dígito corresponderia a 1 volt. Na transmissão analógica,
com a perda de percurso, ele chegaria ao receptor reduzido a 0,8 volts. Para a
lógica digital não existe 0,8 volts: ou é zero ou é um. Se há tensão maior do
que zero (0,8), ela terá de ser elevada para 1. Portanto, o sinal é regenerado
com sua tensão original na recepção. Para cada dígito ocorre o mesmo
processo de restauração da tensão de origem. (MOREIRA E DEL BIANCO,
1999, p. 48).
Para Magnoni e Carvalho (2010, p. 57), esta alteração traz também outros benefícios,
pois com ela “[...] consegue-se não apenas transmitir um som mais puro mas, além disso,
como bit é bit, pode-se transmitir qualquer coisa que seja digital – de pequenos vídeos a
programas de computador”. Os autores, contudo, manifestam um pouco de receio acerca desta
possibilidade.
Com isso, o rádio poderá deixar de ser uma mídia baseada exclusivamente
no áudio, e certamente haverá quem receie pela perda de identidade que isso
pode provocar. Afinal, uma das características do rádio é a de ser uma mídia
intimista, com forte apelo ao uso da imaginação e sugestão, e a introdução da
imagem poderá distorcer ou suprimir essa característica (MAGNONI E
CARVALHO, 2010, p. 83).
Há outros fatores negativos causados por esta digitalização da transmissão, como o
delay (atraso, em inglês) de cerca de oito segundos entre a emissão e a recepção e a demora de
alguns segundos para o receptor conseguir restabelecer o sinal da rádio quando há perda.
“Com isso, a recepção em automóveis, em que essa situação de perda de sinal ocorre com
certa frequência, pode provocar sensações desagradáveis”. (Magnoni e Carvalho, 2010, p. 81).
A velocidade da conexão também é um problema para a rádio na internet, segundo eles.
Embora já existam diversas emissoras nesse sentido, a transmissão de rádio
via internet ainda padece de problemas de velocidade da rede. Se, de um
lado, a contínua construção de novas redes pode melhorar a velocidade
escoada, e portanto tornar o “ouvir uma rádio na internet” menos traumática
do que é hoje em dia, por outro lado o aumento do tráfego total da internet,
devido à adesão de novos usuários e ao surgimento de novos serviços, pode
anular aquele ganho do aumento das redes (MAGNONI E CARVALHO,
2010, P. 86).
A tecnologia streaming, pela qual são feitas as transmissões de rádio via internet, tem
na utilização do protocolo IPTV a principal saída para esta pouca velocidade na conexão, que
acaba por prejudicar a qualidade das transmissões. Como a internet funciona através da troca
constante de pacotes de dados por milhões de usuários, essa tecnologia garantiria a
continuidade no fluxo de pacotes.
Os protocolos de IPTV visam contornar esse problema, criando canais
virtuais de comunicação dentro desse caos, nos quais o tráfego de pacotes é
razoavelmente protegido e estável. Embora até o momento o foco do IPTV
tenha sido a televisão (por assinatura), esses protocolos poderiam ser
empregados para as rádios, possibilitando um fluxo mais ininterrupto de
pacotes de áudio (MAGNONI E CARVALHO, 2010, p. 87).
Agora fugindo ao aspecto técnico e falando sobre o caráter noticioso dos veículos
comunicacionais, no que se refere às informações difundidas ao público, o capítulo seguinte
vai abordar as teorias que estudam os responsáveis pela seleção das notícias publicadas nas
mídias e a capacidade de influência destas notícias no cotidiano dos indivíduos.
2 FILTROS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO
2.1 TEORIA DO AGENDAMENTO E GATEKEEPING: OS PRESSUPOSTOS DA
NOTÍCIA
Com o desenvolvimento da internet e das novas tecnologias de informação, aliado ao
desejo do público de ser alimentado, a todo instante, com novas informações, a presença da
mídia no cotidiano dos indivíduos ganhou ainda mais força. E em consequência deste fato, o
agendamento do espaço público pela agenda midiática torna-se mais evidente. Mas antes de
abordar este aspecto, explicaremos “Agendamento” (agenda setting, em inglês).
Segundo McCombs (2009), “Walter Lippmann resumiu, em 1922, a ideia do
agendamento. A tese dele era de que a opinião pública não respondia ao ambiente, mas ao
pseudoambiente criado pelos veículos noticiosos”. Ou seja, a realidade comentada pelas
pessoas não era a realidade dos fatos, mas a realidade demonstrada pelos veículos midiáticos.
A agenda da mídia é algo mais do que ser simplesmente um veio condutor
para os eventos e as situações do mundo real. [...] A mídia constrói e
apresenta ao público um pseudoambiente que significativamente condiciona
como o público vê o mundo. [...] O agendamento é um efeito robusto e
amplo de comunicação de massa, um efeito que resulta de conteúdo
específico nos mass media (MCCOMBS, 2009, p. 47, 57 e 65).
Para McCombs (2009), na “[...] sua seleção diária e apresentação das notícias, os
editores e diretores de redação focam nossa atenção e influenciam nossas percepções naqueles
que são as mais importantes questões do dia”. Opinião compartilhada por Cohen apud
Traquina (2000), que afirma que as mídias “[...] podem não dizer às pessoas como pensar,
mas sim sobre o que pensar”.
Mas essa influência não se limita apenas a pautar os assuntos do público. De acordo
com Cassol (2006, p. 29), “[...] esse sistema padrão inclui as referências e necessidades,
crenças e expectativas que influenciam aquilo que o receptor retira de uma situação
comunicativa”.
Visando ao entendimento da função do agendamento, basta observar as entrelinhas de
um veículo impresso. “A matéria principal da p. 1, a página de capa versus a página interior, o
tamanho do título, e mesmo o tamanho de uma matéria comunicam a saliência dos tópicos da
agenda noticiosa” (MCCOMBS, 2009, p.18).
Os públicos usam estas saliências da mídia para organizar suas próprias
agendas e decidirem quais assuntos são os mais importantes. Ao longo do
tempo, os tópicos enfatizados nas notícias tornam-se os assuntos
considerados os mais importantes pelo público. A agenda da mídia torna-se,
em boa medida, a agenda do público. Em outras palavras, os veículos
jornalísticos estabelecem a agenda do público (MCCOMBS, 2009, p. 18).
Esta teoria foi desenvolvida por McCombs e Shaw, dois professores da Faculdade de
Comunicação da Universidade da Carolina do Norte, nos Estados Unidos, durante uma
campanha presidencial no país. “A hipótese central deles era de que os mass media
estabeleciam a agenda de temas para a campanha política influenciando a saliência dos temas
entre os eleitores” (MCCOMBS, 2009, p. 21).
De forma a levar mais consistência ao estudo, buscou-se um método que comprovasse
esta influência da agenda midiática, um “[...] sumário estatístico que [...] permita comparar o
grau em que o agendamento está ocorrendo em diferentes localidades” (MCCOMBS, 2009, p.
28).
A mais comum medida utilizada pelos pesquisadores que examinam o papel
dos veículos noticiosos no agendamento é a correlação estatística. Este dado
estatístico resume com precisão o grau de correspondência entre o ranking
dos temas da agenda da mídia – que assunto recebeu mais cobertura
noticiosa, que assunto recebeu a segunda cobertura noticiosa mais intensa etc
– e o ranking daqueles mesmos temas na agenda pública – qual tema a
maioria dos membros do público considera o mais importante, que assunto
vem em segundo lugar etc. A amplitude possível de pontuação para a
correlação estatística vai de +1,0 (correspondência perfeita) através do zero
(não há correspondência) até -1 (uma relação perfeitamente inversa). A
Teoria da Agenda prevê uma correlação positiva alta entre a agenda da mídia
e a subsequente agenda pública (MCCOMBS, 2009, p. 28).
Esta estatística provou-se acertada quando foi feita a observação de três diferentes
comunidades eleitorais durante as eleições presidenciais de 1976, nos Estados Unidos. “[...]
durante as primárias da primavera quando a influência da agenda tanto da televisão como dos
jornais estava no seu auge, a correlação entre a agenda nacional da televisão e a agenda
subsequente do leitor era de +0,63. Este é um grau significativo de influência (MCCOMBS,
2009, p. 29).
A evidência revista até aqui, além de muitos outros levantamentos de campo
conduzidos em todo o mundo, corroboram uma relação de causa e feito entre
a agenda da mídia e a agenda do público. A condição inicial necessária para
demonstrar causalidade é um significante grau de correlação entre a
presumida causa e seu efeito. De acordo com este requisito de evidência, há
correlações substanciais entre as agendas da mídia e do público em todas as
análises recentemente revistas assim como em centenas de outras
(MCCOMBS, 2009, p. 37).
Foram realizados outros levantamentos em todo o mundo, que ratificaram “[...] uma
relação de causa e efeito entre a agenda da mídia e a agenda do público” (MCCOMBS, 2009,
p. 37). Segundo McCombs (2009, p. 39), uma “[...] variedade de controles averiguou que as
modificações na saliência do tópico manipulado ocorreram, de fato, devido à exposição à
agenda noticiosa”.
[...] num experimento, sujeitos que viram programas noticiosos na TV
enfatizarem o alerta do sistema de defesa foram comparados a sujeitos num
grupo de controle cujos programas de notícias não incluíam o alerta do
sistema de defesa. A modificação na saliência deste tema foi
significativamente mais alta para os sujeitos testados do que para os sujeitos
no grupo de controle. Em contraste, não houve diferenças significativas entre
os dois grupos de antes para depois de assistirem aos telejornais para outros
sete temas (MCCOMBS, 2009, p. 39).
Após a confirmação, por outros estudos, de que a agenda pública influencia a agenda
da mídia, iniciou-se uma comparação entre a Teoria da Agenda e outras teorias de
comunicação massiva, para que fosse descoberto “[...] quanto tempo é necessário para que um
assunto veiculado pela mídia transforme-se em algo saliente na agenda pública”
(MCCOMBS, 2009, p. 75).
A Teoria da Agenda continuou a se desenvolver por mais de 35 anos porque
ela complementa e é compatível com uma variedade de outras ideias nas
ciências sociais. À medida que os acadêmicos construíram um mapa
intelectual crescentemente detalhado da influência da comunicação massiva
no público, a Teoria da Agenda incorporou ou convergiu com vários outros
conceitos comunicacionais e teorias (MCCOMBS, 2009, p. 135).
Ainda segundo o autor (2009, p. 75), a “[...] antiga teoria hipodérmica via os efeitos da
mídia como essencialmente imediatos. Naquela visão, as mensagens da mídia eram injetadas
na audiência da mesma forma como as injeções são administradas nos pacientes alcançando
efeitos rápidos”. Esta visão, após outros estudos, foi contestada por alguns teóricos.
A base para esta visão praticamente desapareceu com o acúmulo de
evidência empírica nas décadas de 1940 e 1950, um volume de evidências
registrado no livro The Effects of Mass Communication de Klapper como a
Lei das Consequências Mínimas. Em resposta, acadêmicos como Wilbur
Schramm afirmaram que os efeitos verdadeiramente significativos da
comunicação massiva seriam provavelmente de longo prazo, da mesma
forma que as formidáveis formações de estalactites e estalagmites em
cavernas são criadas por gotas numa eternidade de tempo (MCCOMBS,
2009, p. 75).
De fato, o “prazo exigido para que sejam notados [...] os efeitos do agendamento estão
longe de ser instantâneos, mas são relativamente de curto prazo” (MCCOMBS, 2009, p. 75).
McCombs (2009, p. 77) afirma que o “[...] período de tempo envolvido na transferência da
saliência de um tópico da agenda midiática para a agenda pública é geralmente de um prazo
de quatro a oito semanas”. Na internet, o período é menor.
No ambiente contemporâneo da internet, o exame das postagens de quatro
edições na BBS – imigração, atendimento medido, impostos e aborto –
durante a campanha presidencial de outono de 1996 encontrou evidência de
que as notícias tradicionais da mídia estabeleceram a agenda de discussão
para todas estas edições exceto o aborto com períodos de tempo de um a sete
dias (MCCOMBS, 2009, p. 107).
Entretanto, as saliências na agenda do público dependem da necessidade do receptor
por informações. “Quanto maior for a necessidade de orientação que as pessoas têm no
âmbito dos assuntos públicos, maior é a probabilidade deles atentarem para a agenda da
mídia” (MCCOMBS, 2009, p. 94).
Na evolução da Teoria da Agenda, o conceito de necessidade de orientação é
a mais proeminente das condições contingentes para os efeitos do
agendamento, aqueles fatores que estimulam ou constrangem a força destes
efeitos. Estas condições contingentes podem ser divididas em dois grupos, as
características da audiência – tal como a necessidade de orientação – e as
características da mídia – tal como as comparações entre os jornais e a
televisão (MCCOMBS, 2009, p. 109).
Essa evolução da Teoria da Agenda culmina no desenvolvimento de outros conceitos
teóricos voltados para a comunicação massiva, como o “Gatekeeping, que descreve e explica
o fluxo das notícias desde uma organização noticiosa à outra” (MCCOMBS, 2009, p. 135).
Esta teoria “[...] esteve ligada com a Teoria da Agenda [...] quando os acadêmicos
inauguraram uma nova fase [...] ao perguntarem ‘Quem é que define a agenda da mídia?’”
(MCCOMBS, 2009, p. 135).
Segundo Cassol (2006, p. 36), “há vários procedimentos padrões, estabelecidos em
conjunto pelos profissionais, que fazem com que a seleção a cargo do gatekeeper tenha um
mínimo de subjetividade”. Ainda de acordo com a autora (2006, p. 36), os fatores que
influenciam na decisão do editor sobre os assuntos filtrados são a empresa, a linha editorial do
veículo e a visão de mundo do profissional e dos seus colegas.
[...] o contexto profissional-organizativo-burocrático circundante exerce uma
influência decisiva nas escolhas dos gatekeepers: já o clássico estudo de
Breed (1955) sobre controlo social nas redações – analisando os mecanismos
de manutenção da linha editorial e política dos jornais – confirma essa linha,
raramente explicitada e discutida, é apreendida ‘por osmose’ e é imposta,
sobretudo, através do processo de seleção dos jornalistas no interior da
redação. A principal fonte de expectativa, orientações e valores profissionais
não é o público, mas o grupo de referência constituído pelos colegas ou
pelos superiores (WOLF, 1995, p. 164).
A tarefa de conseguir filtrar, além das notícias, uma grande carga de influências
provenientes de diferentes partes da hierarquia da empresa, além dos cuidados em não afetar
os interesses dos anunciantes, o que em contrapartida atrapalharia os índices financeiros do
veículo, o jornalista tem mais um desafio: manter-se ético dentro deste cenário.
2.2 ÉTICA NO JORNALISMO: OS DOIS LADOS DE UMA MESMA MOEDA
A ética tem como meta estabelecer um modelo perfeito para a vida dos indivíduos em
sociedade, tanto na esfera público quanto na esfera privada, sobretudo porque se baseia nos
princípios comportamentais humanos, como o que é bom, mau, certo ou errado. Ou seja, a
ética investiga a conduta dos homens, nos aspectos referentes ao caráter, e normatiza as
atitudes individuais que sejam favoráveis ou não ao bem estar social.
Vivemos, entretanto, em um mundo extremamente individual, em que as pessoas se
preocupam cada vez mais com a própria satisfação, muitas vezes em detrimento do
contentamento de outros indivíduos. A era da liberdade sem compromisso. Da má utilização
dos direitos alcançados em lei.
De éticas socialmente constituídas, passamos por uma ética definida em
torno de cada indivíduo, o que parece uma contradição de termos, um
paradoxo, já que as condutas pessoais só podem ser avaliadas na sua
articulação com outras condutas. Pode ser uma ética provisória. O fato é que
hoje, dentro de limites bastante amplos, cada um tem o direito de pensar e
agir como quiser (GOMES, 2002, p. 9).
Essa ética paradoxalmente individual, ou “provisória”, como trata Gomes (2002),
também acaba se refletindo nos campos profissionais que atuam diretamente com a ética.
Contudo, essas mutações do “ser ético”, ou seja, do indivíduo de “bom caráter”, são delicadas
e merecem atenção.
Alheio à ética em áreas de atuação em que o aspecto moral pode variar de caso a caso,
como na medicina, em que diferentes situações levam a refletir sobre a atitude que será
melhor para o bem estar de um paciente, embora o objetivo da profissão seja sempre o de
deixar o indivíduo saudável, no jornalismo o comportamento ético deve “caminhar” junto ao
conteúdo que vai ser publicado e, principalmente, dos meios utilizados para a realização da
apuração.
O jornalista é o primeiro responsável pelas análises e críticas que ele propõe
do acontecimento. Seu trabalho, porém, insere-se num sistema de regras e
restrições, e que não pode declinar da responsabilidade daquilo que ele
divulga, sejam textos ou imagens. O ato de difusão tem o efeito de conduzir
a informação a seu estágio último: é pela mídia que ela chega ao
conhecimento do público, é difundida em meio à sociedade, é amplificada.
Entre os textos e imagens que lhe são oferecidos, entre os resumos do
acontecimento que lhe asseguram uma informação pluralista, cada pessoa do
público também tem a liberdade, e a responsabilidade de realizar certas
escolhas (CORNU, 1998, p. 78).
Afinal, informar é “[...] tratar uma informação visando torná-la significativa para outra
pessoa, ou várias. Informação, no sentido corrente, compreende ao mesmo tempo um
conteúdo e uma forma, bem como sua transmissão, sua comunicação (CORNU, 1998, p. 8).
Neste trecho, nota-se a importância de tratar o receptor e as personagens envolvidas na notícia
com o respeito que qualquer indivíduo merece, por mais que estas personagens sejam
antiéticas.
Teoria e prática, representando os dois lados da moeda, tornam-se difíceis de coexistir
diante do ciberespaço. Com a internet, que propiciou a conversação de “muitos-com-muitos”,
os veículos noticiosos iniciaram uma imensa disputa entre ideologias a fim de influenciar a
audiência. A mais evidente é entre a Rede Globo e a Rede Record. Segundo Gomes (2002, p.
10), o “[...] vazio ético do jornalismo [...] é a rigor o reflexo ideológico que se dá além da
esfera estrita da comunicação, um embate entre propostas divergentes de civilização e de
organização”.
Os profissionais consideram a atividade jornalística como uma profissão
liberal. Em sua grande maioria, são empregados assalariados. Trabalham
para alguma organização, exercem funções, seu trabalho se insere num
processo de fabricação, e estão submetidos a uma hierarquia de autoridade.
Sua inserção na empresa os obriga a um “compromisso permanente” entre a
aplicação das normas deontológicas e as exigências da empresa (CORNU,
1998, p. 83 e 84).
Na opinião do autor desta pesquisa, os jornalistas, em sua maioria, “vestem a camisa
da empresa” e se deixam levar pelas “orientações” dos superiores. “Orientações” estas que às
vezes nem existem, mas os jornalistas “deduzem” que sim e colocam em prática. Não é uma
ode à liberdade do jornalista ou ao descompromisso com o veículo e, tampouco, um grito pela
anarquia diante da hierarquia, mas sim a defesa da verdadeira imprensa.
A imprensa, que remete à “[...] categoria profissional dos jornalistas, aos jornais e
periódicos, às empresas de comunicação em geral e mesmo ao conjunto do sistema
desenvolvido para a difusão de informações e opiniões à sociedade” (CORNU, 1998, p.15),
não pode esquecer-se de sua finalidade.
Objetivo final [da mídia] é conciliar a aplicação de regras com práticas e
costumes permitindo responder às supostas expectativas do público e de
maximizar assim os benefícios da atividade ligada à produção de notícias.
Ela indica um recurso à utilização estratégica da ética: pela fixação de
normas, transmitir uma boa imagem da profissão ou do meio de
comunicação, estimular uma sensação de confiança no público, promover o
reconhecimento e maior credibilidade, dissuadir os poderes públicos de
intervir na regulamentação do jornalismo (CORNU, 1998, p. 26).
Os jornalistas têm muitas responsabilidades, porém, de acordo com Cornu (1998), elas
são tratadas em pormenores em vários códigos nacionais. Ainda segundo Cornu (1998, p.43),
a Declaração dos Deveres e Direitos dos Jornalistas, publicada na cidade alemã de Munique,
em 1971, que poderia orientar os profissionais sobre a conduta ideal, dedica “[...] maior
espaço aos direitos dos jornalistas, à proteção de sua integridade profissional”.
Entre as responsabilidades dos jornalistas com o público que consome a informação
por ele noticiada, evidencia-se o compromisso com a verdade: “[...] informações exatas,
verificadas, apresentadas de modo equânime, opiniões expostas com honestidade livres de
preconceitos, relatos jornalísticos verídicos e ciosos de sua autenticidade” (CORNU, 1998, p.
64).
[...] para com os grupos de interesse, poderosos ou não, que constituem o
ambiente econômico e social da empresa; para com o Estado e seus órgãos,
que definem a missão geral da mídia e enquadram suas atividades num certo
número de leis; frente à sociedade como um todo (CORNU, 1998, p. 49-50).
Consciente disto, o profissional de comunicação não deve fazer uso de artifícios não
condizentes com a realidade dos fatos, como a “[...] espetacularização da informação, que
privilegia certos aspectos da realidade como método para manter os níveis de audiência e o
número de leitores” (CORNU, 1998, p. 16).
O jornalista também tem responsabilidades com o veículo de comunicação que o
emprega. Além de respeitar a hierarquia, essas responsabilidades também envolvem os
anunciantes que adquirem espaço no meio de comunicação, independentemente do tipo de
mídia, seja ela impressa, rádio, TV ou até mesmo a internet.
[...] junto a seu público e à opinião pública em geral; para com suas fontes e
as pessoas sobre as quais tece comentários; para com as normas profissionais
e seus órgãos tutelares; perante suas próprias convicções e conforme sua
consciência individual; para com a hierarquia redacional, que é também
responsável pelo trabalho desenvolvido pelos jornalistas individualmente
junto ao editor ou proprietário do veículo de comunicação, bem como aos
anunciantes (CORNU, 1998, p. 49-50).
Mais uma vez o compromisso com a verdade e o respeito aos indivíduos são
salientados. Ou seja, desempenhar um bom jornalismo, que não se deixa levar pela influência
de terceiros ou pela preguiça de se dedicar a ouvir os diversos lados envolvidos com a notícia,
de forma a não arranhar a imagem do veículo.
A credibilidade dos meios de comunicação está ligada à veracidade das
notícias, à honestidade com que são tratadas, à exatidão de seu conteúdo.
Uma boa informação apresenta o reflexo do essencial dos fatos ocorridos no
dia. Ela é plural e deve visar a objetividade, em particular pela apresentação
de todos os seus elementos constitutivos e a ausência de manipulações
(CORNU, 1998, p. 65).
E também sem afetar a imagem dos personagens citados na reportagem.
Os jornalistas são responsáveis, quanto ao conteúdo, pelo reflexo fiel e
completo dos negócios públicos, pela proposta de uma visão crítica,
assegurando uma informação respeitosa dos fatos e pessoas. Esta
responsabilidade, individual e coletiva ao mesmo tempo, estende-se sobre o
campo dos deveres que são impostos aos jornalistas pelas diversas
formulações de sua deontologia profissional (CORNU, 1998, p. 107).
Em caso de publicação de uma notícia errada, o jornalista tem o dever ético de
desmentir, por mais que esta atitude não seja capaz de minimizar os danos à imagem de uma
pessoa, no caso de haver algum indivíduo envolvido na informação, pois o público toma
como verdade qualquer notícia veiculada em meios de comunicação. A atitude de retificar a
notícia, entretanto, é o mínimo que se pode fazer.
A notícia divulgada pode ser desmentida, corrigida, complementada por
outros personagens, testemunhas ou peritos. Em sua pretensão da verdade,
de valor fundamental, a informação fica portanto submetida a uma avaliação
crítica permanente. A obrigação de retificação representa um desafio
importante. Se um fato foi relatado de modo parcial ou inexato, se um artigo
ou uma emissão divulgou uma informação contendo erros materiais, os fatos
devem ser precisados e os erros, corrigidos. Não existem jornalistas ou
jornais que não cometam erros, por menores que sejam. Os jornais sérios e
os jornalistas exigentes distinguem-se dos demais por publicar precisões e
retificações. O Código de conduta dos jornalistas britânicos acrescenta a
obrigação de pedir desculpas (CORNU, 1998, p. 68-69).
Como apontado neste capítulo, a conduta ética dos jornalistas é imutável, entretanto, a
forma com a qual o público se relaciona com os meios de comunicação sofre alterações. Essas
mudanças têm ocorrido atualmente, em virtude da convergência entre os meios e a crescente
popularização da internet, que trouxe novas ferramentas para uso no meio digital.
2.3 O RECEPTOR NO RÁDIO: NOVOS PÚBLICOS NO AR
Conforme aponta Prata (2002, p. 1), no Brasil e em toda a América Latina existe “[...]
uma tendência de se voltar para o receptor as pesquisas em comunicação”. Para ela, “[...] há
uma intensa procura sobre o que pensa, o quer, o que deseja e como age o receptor e, mais do
que isto, entender o receptor como sujeito do processo de comunicação”.
Prata (2002, p.2) ressalta que, em entrevista de Nilda Jacks com Guilherme Orozco,
publicada em 1993 pelo INTERCOM, ele salientava que os primeiros estudos da
comunicação eram voltados para o emissor, sendo o receptor “[...] estudado como um
consumidor, em função de suas necessidades, seus gostos, para ver de que maneira seriam
oferecidos mercadorias e serviços”.
De acordo com Sousa (1995:40), no modelo antigo de estudos da recepção, o
receptor era uma tábua rasa, apenas um recipiente vazio para depositar os
conhecimentos originados, ou produzidos, em outro lugar, havendo uma
confusão permanente “da significação da mensagem com o sentido do
processo e o das práticas de comunicação, como também reduzindo o
sentido destas práticas na vida das pessoas ao significado que veicula a
mensagem” (PRATA, 2002, p. 2).
Antes tratados apenas como meros consumidores de informação ou serviços, aos
poucos os ouvintes começam a ser observados de maneira diferente pelos veículos e,
principalmente, se fazem querer ser ouvidos. Hoje o receptor é visto como Prosumer, conceito
criado pelo escrito Alvin Toffler, em que o usuário é encarado como produtor (producer, em
inglês) e consumidor (consumer, em inglês) do conteúdo.
As evoluções acompanharam os avanços tecnológicos. Para Braz e Meireles (2011, p.
2), quando “[...] o rádio passa a se fazer presente na internet, algumas de suas características
passam por mudanças muito peculiares que outrora o definiam e agora já não se fazem
presente, nem tampouco o definem”. Essas alterações acabam influenciando os ouvintes. Por
se tratar de uma mídia massiva, ou seja, capaz de alcançar parcela significativa da população,
a influência se torna ainda mais evidente, inclusive na linguagem.
No rádio hertziano a linguagem utilizada é a oral, que atua em conjunto com
os recursos sonoros. Para o entendimento da mensagem basta apenas o
sentido da audição, não necessitando qualquer grau de instrução do ouvinte.
Já na webradio, juntamente com a linguagem sonora, outras linguagens
também se fazem presentes, como a textual e a imagética. Diferentemente do
rádio com transmissão em ondas eletromagnéticas, as webradios ainda
conservam um certo grau de exclusão, exigindo um mínimo de instrução
para se compreender as mensagens textuais e até mesmo para se ter acesso
ao endereço das emissoras da web (BRAZ E MEIRELES, 2011, p. 2).
Desde os primeiros anos em que o rádio foi implantado já existia uma demanda por
parte dos ouvintes de se comunicar com os profissionais das rádios, conceito que hoje
chamamos de interatividade. Até pouco tempo atrás, esse relacionamento era realizado de
forma mais lenta, através de cartas, telefonemas e telegramas.
O rádio firmou-se como um meio interativo desde os seus primeiros anos de
existência. Cartas, telegramas e telefonemas sempre foram a ponte de
interação entre a produção dos programas radiofônicos e os ouvintes. Ao
convergir com a internet, e tornar-se uma mídia digital, o caráter interativo
do rádio ganha dimensões ainda maiores (BRAZ E MEIRELES, 2011, p. 3).
O avanço da tecnologia colocou diversas plataformas à disposição dos ouvintes –
agora chamados de usuários –, que começaram a alimentar os veículos com mensagens em
áudio e vídeo e a utilizar largamente as redes sociais, como Twitter e Facebook, para enviar
recados para o programa, tudo com muito mais velocidade.
Thompson (1998, p. 77) explica que “[...] os indivíduos se relacionavam entre si
principalmente na aproximação e no intercâmbio de formas simbólicas, ou se ocupavam de
outros tipos de ação dentro de um ambiente físico compartilhado”, culminando na existência
de três situações interativas: ‘interação face a face’, ‘interação mediada’ e ‘quase interação
mediada’.
A interação face a face acontece num contexto de co-presença [...] e têm
também um caráter dialógico, no sentido de que geralmente implicam ida e
volta no fluxo de informação e comunicação, os receptores podem responder
aos produtores, e estes são também receptores de mensagens que lhe são
endereçadas pelos receptores de seus comentários. (THOMPSON, 1998,
p.78.).
Outro tipo de interação dialógica são as mediadas.
[...] formas de interação tais como cartas, conversas telefônicas etc. As
interações mediadas implicam o uso de um meio técnico (papel, fios
elétricos, ondas eletromagnéticas etc.) que possibilitam a transmissão de
informação e conteúdo simbólico para indivíduos situados remotamente no
espaço, no tempo, ou em ambos. [...] Os participantes de uma interação
mediada podem estar em contextos espaciais ou temporais distintos
(THOMPSON, 1998, p.78.).
Já as quase mediadas são estabelecidas através de meios de comunicação.
[...] relações sociais estabelecidas pelos meios de comunicação de massa
(livros, jornais, rádio, televisão etc.). [...] este terceiro tipo de interação
implica uma extensa disponibilidade de informação e conteúdo simbólico no
espaço e no tempo. [...] é monológica, isto é, o fluxo da comunicação é
predominantemente de sentido único. O leitor de um livro, por exemplo, é
principalmente o receptor de uma forma simbólica cujo remetente não exige
(e geralmente não recebe) uma resposta direta e imediata (THOMPSON,
1998, p.78.).
Primo (2008) diz que “[...] existem dois níveis de interação mediada por computador:
interação reativa e interação mútua”. Segundo Braz e Meireles (2011, p. 5), “as interações
reativas são aquelas que ocorrem entre o usuário e o sistema informático [...] os sistemas são
fechados e se caracterizam por operarem na forma estímulo-resposta”.
[...] quando o indivíduo seleciona essa ou aquela função o sistema
informático já tem a resposta predefinida. Se o usuário selecionar a mesma
função, obterá a mesma resposta. Outra característica desse tipo de interação
é a linearidade, visto que só quem codifica a mensagem é o webdesigner.
Não podemos nos esquecer que é devido a essa relação linear e unilateral
que o sistema é fechado (BRAZ E MEIRELES, 2011, p.5).
Já as interações mútuas são o oposto. Ainda de acordo com Braz e Meireles (2011, p.
5), neste tipo de interação o “[...] sistema é aberto e vale-se das trocas de conteúdo entre os
indivíduos, que se dá de forma dinâmica e sempre em desenvolvimento. Os agentes são ativos
e criativos, por isso, interagem”. Entretanto, elas ressaltam que as duas podem funcionar
simultaneamente.
A existência de um nível interativo não exclui a existência do outro. O que
queremos destacar aqui é que a interatividade pode ocorrer nesses dois níveis
simultaneamente. Para que um internauta tenha acesso a uma sala de bate
papo virtual, para iniciar um diálogo com outro internauta, ele deve interagir
com o mouse, com o teclado ao mesmo tempo em que interage com o
software e também com a outra pessoa que está no bate-papo (BRAZ E
MEIRELES, 2011, p. 5 e 6).
A internet intensificou essa interação. Para Recuero, este meio de comunicação “[...]
amplificou a capacidade de conexão, permitindo que redes fossem criadas e expressas nesses
espaços: as redes sociais mediadas pelo computador”. De acordo com Braz e Meireles (2011,
p. 6), essas redes “[...] tornaram-se mais uma fonte de interação e de estreitamento da relação
entre produção e audiência que muitas mídias, tanto as analógicas quanto as digitais, utilizam
desse mecanismo para fomentar a interatividade com o seu público-alvo”.
3 HISTÓRIAS QUE SE CONFUNDEM
3.1 FUTEBOL: ESTRANGEIRICES ENTRAM, SIM, NA TERRA DO ESPINHO
O futebol, como é conhecido atualmente, foi criado apenas em 1846, na Inglaterra,
quando foram definidas regras distintas para a prática do football, que passou a ser jogado
com os pés – com exceção do goleiro (goalkeeper, em inglês), que pode utilizar as mãos –, e
do rugby, que permaneceu sendo disputado com as mãos. Até então, ambos os esportes eram
semelhantes, com diferenciações apenas nas escolas em que eram praticados.
Essas regulamentações, porém, só haviam sido estipuladas nas escolas de elite, sendo
que o football também era praticado pela classe operária e, sem regras, era bastante violento,
provocando a ausência dos operários e, consequentemente, a perda de lucro pelas empresas.
Desta forma, fez-se necessário estender as Regras de Cambridge.4
Era preciso, assim como foi feito nas escolas, regulamentar esses jogos, para
torná-los menos violentos e trazê-los para dentro da esfera do controle do
Estado. Tal regulamentação do Football foi expandida, com a ajuda do
Estado, para toda a sociedade inglesa. A classe burguesa industrial triunfou,
e suas regulamentações esportivas se massificaram, tornado o futebol em um
esporte de massa (ANTUNES DE LIMA, 2002, p. 6).
Em 1863 foi criada, também na Inglaterra, a Football Association (FA), primeira
associação de futebol de todo o mundo, que desenvolveu e universalizou as regras oficiais do
esporte. Foi então definido que os jogos de futebol seriam disputados em datas especificadas
pela FA, que, desta forma, teria controle sobre a prática do esporte. Os confrontos passaram a
ser disputados nos sábados à tarde, dia de folga dos operários.
4
Criada em outubro de 1948, no Trinity College, em Cambridge, Reino Unido.
Assim, num curtíssimo espaço de tempo, o futebol conquistou por completo
toda a população trabalhadora inglesa e, em breve, conquistaria a do mundo
inteiro. Como entender esse frenesi, esse poder irresistível de sedução, essa
difusão epidêmica inelutável? Como vimos, parte da explicação está nas
cidades, parte no próprio futebol. A extraordinária expansão das cidades se
deu, como vimos, a partir da Revolução Científico-Tecnológica, pela
multiplicação acelerada da massa trabalhadora que para elas acorreu em
sucessivas e gigantescas ondas migratórias. Nas metrópoles assim surgidas,
ninguém tinha raízes ou tradições, todos vinham de diferentes partes do
território nacional ou do mundo. Na sua busca de novos traços de identidade
e de solidariedade coletiva, de novas bases emocionais de coesão que
substituíssem as comunidades e os laços de parentesco que cada um deixou
ao emigrar, essas pessoas se vêem atraídas, dragadas para a paixão
futebolística que imana estranhos, os faz comungarem ideais, objetivos e
sonhos, consolida gigantescas famílias vestindo as mesmas cores
(SEVCENKO, 1994, p. 35).
Embora existam indícios de que o futebol já era praticado no Brasil, o esporte,
oficialmente, foi introduzido no país por Charles Miller, em 1894, que voltara da Inglaterra,
onde passara dez anos estudando, trazendo uma bola e um conjunto de camisas. Ele ensinou a
prática aos sócios do São Paulo Atletic Club.
Três anos mais tarde, Oscar Cox, que retornara da Suíça trazendo a ideia de formar
uma equipe profissional de futebol, tentou encontrar jovens dispostos a “comprar” a ideia. A
meta só foi alcançada em 1901, no Rio Cricket Club, clube de Niterói-RJ fundado por George
Cox, pai de Oscar. No que é considerado o jogo inaugural do Rio de Janeiro, Rio Cricket e
Payssandu empataram em 1 a 1 após disputarem dois tempos de 20 minutos com 15 de
intervalo.
A primeira partida envolvendo equipes de dois diferentes estados do Brasil foi
realizada no mesmo ano, em 19 de outubro, quando o Rio Team e o São Paulo Scratch Team
também ficaram no empate, desta vez em 2 a 2, em partida que teve inicio às 4h55 da manhã e
foi realizada no Estádio do Velódromo, que pertencia ao clube São Paulo Atletic e estava
sendo inaugurado naquele dia (LANNA FERNANDEZ, 2010, p. 17).
Segundo Lanna Fernandez (2010), em novembro de 1901, Oscar Cox e outros dois
atletas do Rio Cricket, Mário Frias e C. Robinson, redigem um comunicado informando sobre
uma reunião que trataria da fundação do primeiro clube criado especificamente para o futebol,
o qual se chamaria Rio Football Club. Entretanto, essa ideia não vingaria rapidamente.
Ainda de acordo com Lanna Fernandez (2010, p. 18), em julho de 1902 o inglês Mr.
Machentock, que era o capitão da equipe, foi barrado por Cox de uma partida realizada em
São Paulo e acabou se desligando do grupo. Ele então fundou, no dia 18 daquele mês, o Rio
Football Club, que só aceitava atletas de origem inglesa. Ao tomar conhecimento da fundação
do Rio Football Club, Cox decidiu fundar o Fluminense Football Club.
Conforme trata Coelho Netto, “[...] o Fluminense foi o verdadeiro guia e modelo de
todos os clubes cariocas. A ele se deve o desenvolvimento do Football (grifo do autor) no Rio
de Janeiro. É uma sociedade que tanto vem trabalhando pelo aprimoramento moral e cultural
da mocidade”. Mais tarde falaremos do Tricolor das Laranjeiras, alcunha pela qual o
Fluminense é conhecido.
Segundo o jornalista Paulo Vinícius Coelho (2011, p. 7), o escritor Graciliano Ramos,
no início do século XX, fez o pior palpite da história do futebol ao afirmar que “Futebol não
pega, tenho certeza; estrangeirices não entram facilmente na terra do espinho”. Graciliano não
tinha nada contra o futebol, ele apenas acreditava que o esporte inglês não iria se firmar entre
os brasileiros. Mas se firmou.
Em 7 de maio de 1919, quatro dias antes do Campeonato Sul Americano daquele ano,
realizado no Brasil, o jornal ‘A Rua’ fez a seguinte publicação, de acordo com (COELHO,
2011): “Antes do campeonato, o football aqui já era uma doença: agora é uma grande
epidemia, a coqueluche da cidade, de que ninguém escapa”. Já no dia 11, data da estréia da
Seleção Brasileira, foi a vez do ‘Rio Jornal’ estampar o torneio em suas páginas, ressaltando o
apoio do Fluminense, que construiu com a própria renda um estádio para ser Sede da
competição.
Iniciou-se hoje, às 15 ½ horas, sob os melhores auspícios, o sensacional
Terceiro Campeonato Sul-Americano de Football. Fazendo coincidir com
esta temporada de “matches” internacionais, a festa de hoje teve ainda o seu
brilho aumentado pela inauguração do stadium do Fluminense Football
Club, o glorioso campeão tricolor brasileiro. A cerimônia de inauguração do
stadium consistiu juntamente na inauguração do “match” internacional, para
o qual foi construído o soberbo campo (COELHO, 2011).
No dia 29 de maio, data de disputa da grande final da competição, em que o Brasil
viria a se sagrar campeão com uma vitória de 1 a 0 sobre o Uruguai, com gol marcado por
Friedenreich aos dois minutos do primeiro tempo da segunda prorrogação – atualmente só
existe uma prorrogação e não havendo um vencedor a partida vai para a disputa de pênaltis –,
o jornal ‘A noite’ estampou o triunfo brasileiro da seguinte forma.
A concorrência, se não era colossal como a de domingo, era seletíssima,
notadamente pelo número de senhoras. A animação, extraordinária desde 11
horas, tornou-se como poucas vezes tem acontecido ao aproximar-se a hora
do jogo. Um alarido unânime atroava e nos morros vizinhos a multidão
agitava bandeiras nacionais, por entre vivas. [...] O jogo de hoje era já de
desempate e, assim, de graves responsabilidades para ambos os teams. [...]
Brasileiros: Marcos, Píndaro e Bianco, Sergio, Amilcar e Fortes, Millon,
Néco, Friedenreich, Heitor e Arnaldo. [...] 1º Half Time: Brasileiros 0 goal
Uruguaios 0 goal – 2º Half Time: Brasileiros 0 goal Uruguaios 0 goal –
Nova prorrogação: 1º goal brasileiro Hurrah! Friedenreich! Hurrah – Brasil!
(...) Néco corre pela direita, centra, sendo a bola recebida de cabeça por
Heitor, que a passa a Friedenreich. Este, com um shoot de meia altura, ao
meio do poste, marca o 1º goal brasileiro. Hurrah! Friedenreich! Hurrah –
Brasil! [...] Final: Brasileiros 1 goal Uruguaios 0 goal – Com este resultado
foram os brasileiros aclamados campeões da América do Sul (COELHO,
2011)
“Em 1925, o futebol já era o esporte nacional e faltavam apenas cinco anos para o
início da primeira Copa do Mundo. O Brasil havia sido bicampeão sul americano em 1919 e
1922, mas o profissionalismo só chegaria ao país oito anos mais tarde” (Coelho, 2011, p. 11).
Este trecho faz referência ao não pagamento de salários aos jogadores que representavam os
clubes de futebol, o que viria a acontecer em 1933.
Quando o futebol se tornou profissional e os atletas começaram a receber salários,
muitos clubes que até então eram de elite deixaram de praticar o esporte, “a exemplo do Clube
Atlético Paulistano, maior campeão do período do amadorismo no futebol paulista, com 11
títulos” (ANTUNES DE LIMA, 2002, p.12).
Alguns clubes formados em várzea pelos operários das fábricas, entretanto, resistem
até hoje, como o carioca Bangu e os paulistanos Corinthians e Palmeiras (ex-Palestra Itália).
Entre as equipes de elite, a única que continua existindo é a do Fluminense, que,
coincidentemente, foi o primeiro clube nacional dedicado prioritariamente ao futebol, seguido
pelo mesmo Bangu, além do América e do Botafogo.
O futebol brasileiro move, nos dias de hoje, bilhões de reais, entre investimentos em
salários de jogadores, pagamento de prêmios de assinatura de contrato e compra dos direitos
econômicos sobre os atletas, patrocínios em uniforme, fornecedores de material esportivo,
venda dos direitos de transmissão para meios de comunicação, receitas de público etc.
O rádio, que diferentemente de outros meios de comunicação não é obrigado a pagar
pelos direitos de transmissão das partidas, também realiza essas transmissões. Lógico, dentro
das próprias características dos veículos, lidando com o imaginário e a emoção dos
torcedores, fatores que serão expostos a seguir.
3.2 IMPARCIALIDADE E EMOÇÃO: OS ASPECTOS COMPORTAMENTAIS DOS
PROFISSIONAIS
É comum observar alguns pais comprando roupas e acessórios do clube do coração
para o filho que ainda está na barriga da mãe e, muitas das vezes, sonhando com o dia em que
levará o herdeiro ao estádio para ver o time ser campeão. Por esses e outros comportamentos,
fica evidente que esporte envolve paixão, principalmente quando se trata de futebol, que para
muitos dos brasileiros é encarada como algo superior às próprias crenças.
Baseamos nossa lealdade e fidelidade, valores importantíssimos no campo
da identidade política e religiosa, em coisa tão pouco séria como o esporte.
Mais uma manifestação da nossa originalidade, autenticidade, criatividade,
singularidade, particularidade, valores românticos dos quais fazemos parte
(LOVISOLO, 2002, p. 13).
Sendo assim, fica difícil separar esse sentimentalismo do cotidiano, inclusive quando
se trabalha diretamente com futebol, não do lado de dentro das quatro linhas, mas do lado de
fora, descrevendo as partidas para os ouvintes durante as transmissões de rádio de uma
maneira que seja capaz de seduzir o ouvinte a manter-se “preso” à transmissão.
O rádio é um veículo de comunicação de massa que apresenta o sentido
midiático da alteridade, razão pela qual afirmamos que, ao produzir qualquer
programa, o produtor deve ter em mente a noção de que vai dizer alguma
coisa a alguém cujo conteúdo deve ser interessante, inteligível e que,
sobremaneira, possa catalisar a atenção para aquilo que é comunicado
(GOMES, 2006, p. 1).
De acordo com Ortriwano (1985, p. 26), o “[...] rádio esportivo sempre foi muito
participante, muito vibrante, gerando polêmicas, um dos setores mais opinativos de toda a
programação”. E as opiniões dos especialistas são essenciais para deixar o ouvinte atento,
interessado tanto nas partidas quanto nos fatores envolvidos nelas. Segundo César (2005, p.
7), “é impossível fazer rádio sem falar em emoção”.
De Araújo (2007, p. 25) diz que “[...] o rádio passa a evocar o imaginário do ouvinte
nas mais diversas situações. Em rádio, falar de fantasia não quer dizer falar em algo
inverídico. O ouvinte de rádio é capaz de sintonizar não para fruir de uma mera transmissão,
mas, está sintonizado simplesmente por gostar”.
A criação de “imagens mentais” é tão poderosa, a ponto de ser muito mais
emocionante ouvir uma partida pelo rádio do que assisti-la no próprio
estádio. O torcedor vai ao estádio, mas leva seu “radinho” para saber que
está acontecendo... Ou assiste a imagem na televisão, ouvindo a narração do
rádio (ORTRIWANO, 1985, p.27).
Na opinião de Gotschalg (2006, p. 16), torcedores, jornalistas esportivos e críticos de
arte têm em comum a paixão pelo futebol como forma de arte. Para ele, “[...] isso quer dizer
que mediante a emoção, eles se situam na perspectiva dos de dentro, ou seja, dos que
pertencem ao campo de significados das obras que observam. E pra falar de arte ou esporte é
preciso amá-los de alguma maneira”.
As transmissões de rádio, no Brasil, começaram em 1922, mas as notícias de caráter
esportivo, segundo Almeida e Micelli (2004), tiveram início apenas entre os anos 1929 e
1930, com informações curtas sobre as partidas realizadas no Rio de Janeiro e em São Paulo,
devido ao pouco recurso à disposição dos profissionais.
Há muitas divergências sobre quem teria sido o responsável pela primeira transmissão
ao vivo de uma partida de futebol. Entre os possíveis “pais”, são citados Oduvaldo Cozzi, a
emissora Record, e a mais plausível entre as suposições: Nicolau Tuma. Embora Ortriwano
(1985) afirme que a primeira transmissão ao vivo de uma partida de futebol foi realizada por
Tuma em 10 de fevereiro de 1932, Soares (1994, p. 21) defende que aconteceu no ano
anterior, no duelo “[...] entre as seleções dos estados de São Paulo e Paraná”, narrado pelo
próprio Tuma.
Segundo de Araújo (2007, p. 27), Prado (2006) diz que “[...] as coberturas com
emoção agradam mais o público brasileiro do que as do estilo europeu: frias. [...] emissoras
como a CBN de São Paulo procuram investir em uma cobertura que se preocupa mais com o
jornalismo do que com a emoção”. Entretanto, Prado reforça que “[...] esse novo tipo de
narração começou há pouco tempo e não dá para se ter uma ideia se esse estilo vingará”.
Não adianta inventar muito, o forte do esporte no Brasil é o futebol mesmo.
Você até pode introduzir dropes (boletins curtinhos, de dois a três minutos)
de informações sobre as demais modalidades de esporte, como basquete,
tênis ou automobilismo. É uma boa idéia que enriquece a programação
esportiva. Não espere, porém, retorno retumbante. O que dá audiência é a
bola no pé (PRADO, 2006, p.42).
Mas como tentar seu neutro em um ambiente recheado de emoções? Como não deixar
transparecer a felicidade ou a raiva ao ver o time pelo qual torce ou o rival triunfar de maneira
extraordinária ou sucumbir de forma ridícula? Por isso, Souza Neto (2008, p. 43) diz que “[...]
o conceito de imparcialidade no jornalismo traz sempre uma discussão, principalmente na
parte esportiva”.
Jornalismo é tudo igual. Econômico, esportivo, policial, as regras básicas são
sempre as mesmas. Ouvir todos os lados da questão, para checar cada
informação, escrever com ética e clareza. Em uma frase se resume tudo. Ou
quase. O jornalismo esportivo se atrapalha de vez em quando em um
requisito básico da profissão, que é a imparcialidade. Como podemos
praticar a imparcialidade se, no fundo, não somos imparciais? Porque, antes
de mais nada, desconfie de repórter de futebol que diz não ter time. Se não
tem, provavelmente não ama o esporte e talvez esteja sem emprego. (...)
Todos torcemos, a dificuldade é separar a paixão que vem da infância da
atividade diária. Os melhores conseguem, mas muita gente é condescendente
demais quando se trata do próprio clube ou, como costuma acontecer,
extremamente exigente. Temos um complicado exercício cotidiano para
separar emoção de razão. (FILHO, 2008)
Antes de apontar as características da Rádio Canal Fluminense, objeto de estudo desta
pesquisa, e explicar como ela encara os aspectos de imparcialidade e emoção durante as
transmissões, apresentamos um breve histórico do Fluminense Football Club, clube pioneiro
no futebol do Brasil.
3.3 FLUMINENSE FOOTBALL CLUB: RETUMBANTE DE GLÓRIAS
O Fluminense Football Club foi fundado no dia 21 de julho de 1902, na casa do atleta
Horácio da Costa Santos, localizada na Rua Marquês de Abrantes, nº 21, no bairro do
Flamengo, Zona Sul do Rio de Janeiro, por 20 sócios fundadores, todos da mais alta classe do
estado, que foram escolhidos por convite.
Segundo Lanna Fernandez (2010, p. 20), a origem do nome Fluminense deve-se ao
hábito de, na época, todos os cariocas, independentemente de morarem na capital ou no
interior, serem chamados, indistintamente, de fluminenses. Ainda de acordo com o autor, essa
distinção “[...] só se estabeleceu depois de 1892, quando o Rio de Janeiro deixa de ser
município neutro e passa a ser Distrito Federal [...] Após a lei, continuou o hábito de se usar o
termo fluminense para os habitantes do Distrito Federal”.
Nessa primeira assembléia, os associados também elegeram Oscar Cox
como presidente e fundaram duas comissões, uma para arranjar um terreno
para a prática do jogo e outra para a redação dos estatutos do novo clube. A
primeira tentativa foi o aluguel de um terreno na Rua Dona Mariana em
Botafogo, mas o aluguel era muito alto e eles desistiram. Outro local foi
encontrado na Rua Guanabara (atual Pinheiro Machado), esquina do Roso
(atual Coelho Netto), bem ao lado do Palácio Guanabara, antiga residência
da Princesa Isabel. O terreno foi alugado ao Banco da República, em 17 de
outubro de 1902, por 100$000. Dois anos depois, Eduardo Guinle comprou a
casa dos fundos do terreno para transformá-la em sede, além de todo o
terreno em volta do campo para ampliar o clube. Nesse momento o clube
contava com cerca de 30 sócios que pagavam uma mensalidade de 5$000,
correspondente à compra de um sapato, com uma arrecadação total de
150$000. Esse dinheiro só bancava as despesas de manutenção do clube.
Quando havia necessidade de gastos extras, como compra de bolas ou para
levantar um barracão para servir de vestiários, abria-se um subscrição que,
nesse caso, chegou a 25$000 (LANNA FERNANDEZ, 2010, p. 21).
Em reunião realizada no dia 17 de outubro de 1902, no clube das Laranjeiras, foi
definido o uniforme oficial do Fluminense: camisas em tonalidades cinza e branco, metade de
cada cor, shorts branco e meias pretas. O escudo tinha as iniciais “F.F.C.” bordadas em
vermelho.
Depois da fundação, da escolha do campo e do seu primeiro uniforme, o Fluminense
enfrentou o seu primeiro adversário no campo do Paysandu Cricket Club, no dia 19 de
outubro de 1902. O jogo foi contra o Rio Football Club e o placar foi um acachapante 8 x 0
para o Fluminense, com gols de Horácio da Costa Santos (3), Heráclito de Vasconcellos (2),
Félix Frias, Eurico de Moraes e Simonsen (1). O time foi: Américo Couto; M. Frias e V.
Etchegaray (cap.); Mário Rocha , Oscar Cox e W. Schuback; A. Simonsen ; E. Moraes; Costa
Santos , H. Vasconcellos e F. Frias. Sendo que o primeiro gol da história do Fluminense foi
marcado por Horácio da Costa Santos5
.
Quadro 1 – Súmula de Fluminense Football Club 8 x 0 Rio Football Club
Fonte: Flu Memória
No mesmo ano, o Fluminense formou uma equipe de atletismo para disputar, a convite
do Rio Cricket, os jogos comemorativos da coroação do Rei Eduardo VII da Inglaterra. Victor
Etchegaray, que era capitão do time de futebol, foi o destaque do clube, conseguindo o
primeiro lugar na prova eliminatória de 100 jardas e ficando com o segundo lugar na prova
final.
Em 1903 o Fluminense, mais uma vez, é pioneiro no futebol, ao alavancar a rivalidade
entre cariocas e paulistas. Em série de três amistosos, empatou em 0 x 0 com o Internacional-
5
Disponível em < http://www.canalfluminense.com.br/historia >. Acesso em: 30/10/2011.
SP, venceu o Paulistano, de Charles Miller, por 2 a 1, e atropelou o São Paulo Athletic,
campeão paulista daquele ano, por 3 a 0. Em 15 de julho de 1904, ocorreu a mudança que
viria a caracterizar os atletas do Flu como “sportsmen tricolores”.
De acordo com o historiador Marcel Cezar, o uniforme nas cores cinza e branco eram
de rara fabricação em Londres, na Inglaterra, onde eram comprados. Foi então que Oscar Cox
e Mário Rocha, que estavam na cidade londrina, viram uma camisa nas cores verde, branco e
encarnado, encaminhando uma correspondência aos sócios do clube, no Rio de Janeiro,
sugerindo a mudança. A proposta foi colocada em votação e aceita por unanimidade. Na
despedida do uniforme cinza e branco, goleada do Fluminense sobre o Rio Cricket: 4 x 0.
Em 1905, o Fluminense tentou a criação de uma liga estadual, mas não obteve sucesso
pela demora dos rivais em responder a ideia. Então disputou alguns amistosos, goleando o Rio
Cricket por 7 x 1, o F. G. Athletic Club por 10 x 0 e o Botafogo de Futebol e Regatas, um de
seus principais rivais na atualidade, por 6 x 0, no primeiro confronto entre os clubes.
No ano seguinte o Fluminense se sagrou o primeiro campeão do Campeonato Carioca
de Futebol. Em dez jogos, venceu nove e perdeu apenas 1, totalizando 52 gols marcados e
apenas seis sofridos. Teve ainda o artilheiro do torneio: Horácio da Costa Santos, que marcou
18 gols, inclusive o primeiro do Estadual, na vitória de 7 x 1 sobre o Paysandu Cricket, em 3
de maio, nas Laranjeiras.
Em 1907, o Fluminense novamente venceu o campeonato do estado, mas o Botafogo
não respeitou o regulamento do torneio, que previa, em caso de igualdade de pontos entre as
equipes, a conquista da taça pelo time que tivesse mais saldo de gols, e exigia a disputa de
uma partida extra. O Fluminense se negou, pois era o campeão de direito, e desligou-se da
Liga Metropolitana de Sports Atléticos. Com a saída do seu principal filiado, a Liga foi
extinta.
Nos dois anos seguintes, 1908 e 1909, em ambos o Fluminense foi campeão invicto do
Estadual, ou seja, sem sofrer nenhum revés. Ao todo, durante a campanha do
Tetracampeonato, foram disputados 39 jogos, com 33 vitórias, quatro empates e apenas duas
derrotas.
Em 1910, o primeiro confronto internacional dos “sportsmen” tricolores. O clube
patrocinou a vinda do Corinthians de Londres, maior time da Inglaterra, para três amistosos.
O Flu abriu o placar aos 15 segundos, gol de Oswaldo Gomes, mas sofreu impiedosa virada:
10 x 1. Dois anos depois, o episódio que culminou na fundação do futebol do Clube de
Regatas do Flamengo, outro rival do Fluminense na atualidade.
Em julho, Ernesto Paranhos e Haroldo Cox foram demitidos. Os substitutos naturais
seriam Oswaldo Gomes e Alair Antunes, mas após uma série de divergências, Oswaldo
recusou o posto e, em 7 de agosto, enviou carta à diretoria do clube comunicando sobre a
saída dele do quadro de sub-capitão, às vésperar do jogo contra o Rio Cricket.
A Comissão escalou o seguinte quadro: Baena, Píndaro e Nery, Lawrence,
Amarante e Galo; Oswaldo, Orlando, Paranhos, Gustavo e Calvert. Alberto
Borgerth porém sugeriu, com apoio da maioria, que os jogadores fossem
consultados sobre a escalação do quadro. Afonso de Castro, voto vencido,
bateu-se contra a sugestão, ponderando que isso constituiria um mau
precedente, pois transferiria para os jogadores as atribuições do Gound
Committee. Com a exceção de Oswaldo Gomes e James Calvert, os demais
jogadores se pronunciaram pela substituição de Oswaldo por Arnaldo
Guimarães e Paranhos por Borgerth, mas o Ground Committee manteve o
conjunto escalado contra o voto de Borgerth que estava de acordo com a
opinião da maioria dos jogadores. O quadro escolhido pelo Committee
venceu o jogo por 5 x 0... A 3 de outubro, entretanto, Alberto Borgerth,
Othon Baena, Píndaro de Carvalho Rodrigues, Emmanuel Nery, Ernesto
Amarante, Armando de Almeida (Galo), Orlando Mattos, Gustavo de
Carvalho e Lawrence Andrews solicitaram demissão do Club. O Fluminense
perdeu 9 dos seus 11 jogadores campeões do ano, mas seus princípios foram
mantidos (História do Fluminense, Tomo I, Paulo Coelho Netto).
No dia 7 de julho de 1912, com elenco completamente renovado e apenas dois
remanescentes do time campeão invicto de 1911, o Fluminense enfrentaria seus dissidentes
pela primeira vez. Edward Calvert abriu o placar para o time das Laranjeiras logo no primeiro
minuto. Arnaldo empatou aos quatro e assim o jogo prosseguiu até o intervalo. Aos 17 da
segunda etapa, James Calvert, um dos que permaneceram no Flu, recolocou a equipe na
frente, mas a vantagem durou apenas 13 minutos – Píndaro fez para o Fla. O gol que coroaria
a honra tricolor veio aos 32, quando Bartholomeu aproveitou lançamento de James Calvert e
deu a vitória ao Fluminense.
A primeira Seleção Brasileira de Futebol, formada em 1914, também conta com dois
atletas do Fluminense entre os convocados: Marcos Carneiro de Mendonça, goleiro de apenas
19 anos, e Oswaldo Gomes, autor do primeiro gol da história da Seleção, na vitória de 2 x 0
sobre o inglês Exeter City.
Outro dado marcante de 1914 é o episódio que resulta no apelido do
Fluminense. Carlos Alberto, um dos atletas oriundos do América, era um
jogador muito habilidoso, mas que não dispunha das características quase
que obrigatórias para os padrões tricolores da época: ser branco, de família
tradicional e educado. Mulato e de origem humilde, Carlos Alberto ganhou
espaço no 1º quadro tricolor pelo seu bom futebol. Mas tinha receio da
reação da torcida no tocante a sua cor. Por isso, teve a ideia de passar pó-de-
arroz pelo corpo para tentar disfarçá-la. O que Carlos Alberto não imaginava
é que, com o decorrer da partida, quanto mais se esforçava, mais o suor
tirava o pó-de-arroz, vindo à tona a sua cor natural. Pobre Carlos Alberto! E
logo contra o América, seu ex-clube! A torcida americana percebeu o truque
e, de maneira pejorativa, atribuiu o apelido de Pó-de-arroz aos tricolores. Se
para os americanos, o apelido era uma afronta ao Fluminense, para o resto da
cidade o apelido soou como a mais perfeita descrição do aristocrático clube
das Laranjeiras.6
Em 1919, a pedido da prefeitura do Rio de Janeiro, cidade-sede do Sul-Americano de
Seleções daquele ano, o Fluminense constrói, com o próprio dinheiro, o Estádio das
Laranjeiras, primeiro estádio de futebol do Brasil, com capacidade para 18 mil pessoas. Três
anos mais tarde, com o Rio novamente selecionado como sede do torneio, o Flu ampliou o
estádio, que passaria a comportar público de 25 mil pessoas. Para isso, teve de hipotecar a
própria sede para financiar os custos com a construção.
No ano de 1949, o Fluminense recebeu, por unanimidade de votos, o troféu máximo
do esporte, a Taça Olímpica, que foi instituída pelo Barão Pierre de Coubertin com o objetivo
de premiar o órgão esportivo que mais contribuiu para o olimpismo, além de ser organizado e
comprometido com o esporte em geral.
Sempre pioneiro, o Fluminense, introdutor do futebol no Rio de Janeiro, foi
o clube que lançou as bases do esporte nacional, projetando e organizando os
esportes olímpicos. O Tricolor deu à sociedade a oportunidade de praticar
esportes até então desconhecidos e praticados somente fora do país, como
vôlei, basquete, futebol e water pólo. Construiu o primeiro estádio de
futebol, a primeira pista de atletismo, a primeira piscina coberta do país e o
primeiro ginásio poli-esportivo, capaz de abrigar apresentações esportivas e
artísticas. O Fluminense serviu de modelo para as agremiações esportivas da
América do Sul e este feito foi reconhecido no dia 28 de abril, quando foi
6
Disponível em < http://www.canalfluminense.com.br/historia >. Acesso em: 30/10/2011.
conferida ao Fluminense Football Club a Taça Olímpica de 1949 por
unanimidade.7
Três anos depois, em 1952, no ano em que completava 50 anos de fundação, o
Fluminense se sagrou campeão Mundial de Clubes. De forma invicta – 5 vitórias e 2 empates
em 7 jogos –, o Tricolor das Laranjeiras superou Sporting, de Portugal, Grasshopper, da
Suíça, e Peñarol, do Uruguai, na primeira fase, Áustria Viena, da Áustria, na semifinal, e
Corinthians, do Brasil, na grande decisão, para ficar com a taça.
Em 1970, o Flu conquistou o Campeonato Brasileiro, competição que viria a ganhar
novamente em 1984. Na década de 1990, o Flu acumulou sucessivos rebaixamentos, sendo
um deles revogado após divulgação do escândalo Ivens Mendes, que consistia em um
esquema de corrupção na CBF para que alguns árbitros influenciassem no resultado dos
jogos.
Outra “virada de mesa” também é erradamente atribuída ao Fluminense. Em 2000,
impedida de realizar o Campeonato Brasileiro por estar em litígio judicial com o Gama-DF, a
CBF transfere a função de organizador do torneio para o Clube dos 13. Com isso, Fluminense,
Bahia, Juventude e América-MG são incluídos no Brasileirão, da mesma forma que
Corinthians e Santa Cruz acabaram não sendo rebaixados naquele ano.
Superada esta fase, o Flu volta a se consolidar como uma das principais forças
nacionais a partir do ano de 2007, quando levantou o troféu da Copa do Brasil. Em 2008, foi
vice-campeão da Taça Libertadores, principal torneio da América do Sul, e no ano seguinte
alcançou a mesma posição na Copa Sul-Americana, segunda competição mais importante do
continente.
Em 2010, liderado pelo apoiador argentino Darío Conca, que disputou todos os 38
jogos da competição, o Fluminense voltou a conquistar o Campeonato Brasileiro, com uma
campanha de 20 vitórias, 11 empates e apenas sete derrotas. Marcando, no total, 68 gols e
sofrendo 36, o que credenciou o clube como a defesa menos vazada do Brasileirão.
7
Disponível em < http://www.canalfluminense.com.br/historia >. Acesso em: 30/10/2011.
3.4 RÁDIO CANAL FLUMINENSE: A PROPOSTA DA SEGMENTAÇÃO
O Canal Fluminense era um canal de bate papo entre torcedores do clube no programa
mIRC, em 2001. Percebendo a “força” do nome para um veículo de comunicação, o jornalista
Gabriel Peres então decidiu criar um site para unir o útil ao agradável: produzir conteúdo
jornalístico para um pequeno, mas fiel, público e colocar em prática o desejo de fazer a
cobertura do time pelo qual torcia.
Em entrevista concedida por ele a um programa de TV acadêmico na Universidade
Estácio de Sá, Gabriel ratificou que a estrutura do site era realmente “muito pequena e
experimental”. Após período de testes que durou todo o ano de 2002, o Canal Fluminense
começou a se estabelecer como veículo informativo a partir de 2003, quando criou a primeira
equipe de jornalistas para fazer a cobertura das notícias do Fluminense para o Campeonato
Carioca daquele.
O primeiro furo veio ainda durante a fase de testes, em 2002, quando noticiou as
contratações do atacante Romário e do apoiador Beto. Segundo Gabriel Peres, “ninguém
acreditou na notícia, mas este acontecimento serviu para percebermos que poderíamos tratar
aquele site, que no início lidávamos de forma despretensiosa, de uma maneira séria”.
Foi aí que o Canal Fluminense passou a ir ao clube diariamente para realizar a
cobertura dos acontecimentos no Tricolor e, além disso, adquiriu uma câmera digital, que
possibilitou a veiculação de imagens feitas pela equipe e reduziu os custos de manutenção do
site. Comprovada a seriedade do trabalho, conseguiu credenciar um jornalista e um estudante
de jornalismo junto a ACERJ (Associação dos Cronistas do Estado do Rio de Janeiro), que
controla o trabalho dos jornalistas e radialistas em praças esportivas.
Conseguimos, aos poucos, a tirar aquela imagem de ‘Que site é esse? Isso é
site de clube? Coisa de garoto... de criança... será que isso é sério?’ Nós
lutamos muito tempo para termos credibilidade perante os usuários, que
eram torcedores querendo notícias. A forma de conquistarmos essa
confiança era desenvolver o trabalho de forma que o torcedor entrasse no
site e visse que ali tinha um conteúdo informativo, com uma linguagem
jornalística. Não era uma brincadeira, apesar de que na internet nós podemos
ver muitas mentiras, principalmente em fóruns.
Evolução do rádio e da internet e a convergência na webrádio Canal Fluminense
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Evolução do rádio e da internet e a convergência na webrádio Canal Fluminense

  • 1. Cássio Cornachi do Nascimento O rádio na era da convergência digital: um estudo de caso sobre a webrádio Canal Fluminense Rio de Janeiro 2011
  • 2. Cássio Cornachi do Nascimento O rádio na era da convergência digital: um estudo de caso sobre a webrádio Canal Fluminense Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Universidade Estácio de Sá como requisito para obtenção do 3º grau no curso de Comunicação Social – habilitação em Jornalismo Orientador: Prof. Marcio Gonçalves Rio de Janeiro 2011
  • 3. Cássio Cornachi do Nascimento O rádio na era da convergência digital: um estudo de caso sobre a webrádio Canal Fluminense Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Universidade Estácio de Sá como requisito para obtenção do 3º grau no curso de Comunicação Social – habilitação em Jornalismo BANCA EXAMINADORA Prof. Marcio Gonçalves Orientador Universidade Estácio de Sá Francisco Aiello Universidade Estácio de Sá Gabriela Toledo Universidade Estácio de Sá Rio de Janeiro, 08 de dezembro de 2011.
  • 4. AGRADECIMENTOS Aos meus pais, pelos ensinamentos que certamente vão além de qualquer aprendizado universitário. À minha avó, padrinho, madrinha e demais parentes próximos, pelo carinho e apoio. À minha namorada Yasmin, pelo amor, ternura e companheirismo demonstrados diariamente. Aos amigos Allan, Diego, Diogo e Tania, pelas incontáveis gargalhadas. Aos amigos Gabriel Peres e Claudio Kote, pela primeira oportunidade profissional. Aos professores Marcio Gonçalves e Rafael Rocha, pela orientação ao longo da pesquisa. Aos professores Francisco Aiello, Patrícia Cupello e Ricardo Mazella, que sem meias verdades contribuíram para minha formação. Ao Fluminense Football Club. Você é a história.
  • 5. “Quem olha o nosso passado, quem examina a nossa história, tem que chegar honestamente a uma conclusão fatal: o Fluminense deve ser o primeiro em tudo, particularmente, no futebol”. Nelson Rodrigues
  • 6. RESUMO Esta monografia consiste em um estudo sobre as características e uma análise da interatividade da webrádio Canal Fluminense, veículo segmentado de mídia de massa que transmite todos os jogos do Fluminense Football Club através do site oficial do clube. Os objetivos com este trabalho eram o de abordar a evolução histórica das mídias rádio e internet e entender como elas funcionam no ambiente digital em que convergiram; apresentar o funcionamento de uma webrádio com programação exclusiva para a internet e as questões técnicas envolvidas no projeto da rádio online e digital; explicar a utilização de uma linguagem deliberadamente parcial em transmissão de jogos de futebol com base nas características éticas e comportamentais exigidas aos jornalistas em geral; demonstrar como os profissionais da rádio interagem com os ouvintes e verificar se estes usuários se sentem valorizados com a participação deles ao longo das transmissões; e apontar se o Fluminense, por sua vez, foi privilegiado com a disseminação das notícias de interesse dele e se houve algum benefício com a integração da rádio como veículo oficial. Desta forma, a conclusão baseia-se na ascensão de um veículo segmentado que utiliza as novas tecnologias de comunicação e cultura. A metodologia usada é a pesquisa bibliográfica e o estudo de caso. As principais referências foram Cornu (1998), McCombs (2009), Magnoni e Carvalho (2010) e Lanna Fernandez (2010). Palavras-chave: webrádio, convergência, rádio e internet, Fluminense Football Club, Canal Fluminense, jornalismo esportivo, interatividade, imparcialidade e emoção.
  • 8. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Quadro 1 – Súmula de Fluminense Football Club 8 x 0 Rio Football Club 50 Quadro 2 – Fred recebendo o troféu Guerreiro da Galera 58 Quadro 3 – Enquete no Facebook do Canal Fluminense 62
  • 9. SUMÁRIO INTRODUÇÃO ......................................................................................................................10 1 DO DESENVOLVIMENTO DO RÁDIO ATÉ A ERA DA INTERNET ......................12 1.1 RÁDIO: O PONTO A PONTO PELO AR ............................................................12 1.2 INTERNET: COMUNICAÇÃO EM ESCALA GLOBAL ...................................16 1.3 CONVERGÊNCIA: O RÁDIO NA WEBEMERGÊNCIA ...................................21 2 FILTROS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO .....................................................26 2.1 TEORIA DO AGENDAMENTO E GATEKEEPING: OS PRESSUPOSTOS DA NOTÍCIA .................................................................................................................................26 2.2 ÉTICA NO JORNALISMO: OS DOIS LADOS DE UMA MESMA MOEDA ...................................................................................................................................................32 2.3 O RECEPTOR NO RÁDIO: NOVOS PÚBLICOS NO AR ..................................37 3 HISTÓRIAS QUE SE CONFUNDEM .............................................................................41 3.1 ESTRANGEIRICES ENTRAM, SIM, NA TERRA DO ESPINHO .....................41 3.2 IMPARCIALIDADE E EMOÇÃO: OS ASPECTOS COMPORTAMENTAIS DOS PROFISSIONAIS ...........................................................................................................46 3.3 FLUMINENSE FOOTBALL CLUB: RETUMBANTE DE GLÓRIAS ...............49 3.4 RÁDIO CANAL FLUMINENSE: A PROPOSTA DA SEGMENTAÇÃO ..........55 3.5 ANÁLISE QUALITATIVA DA INTERATIVIDADE E DA VALORIZAÇÃO DO USUÁRIO DA RÁDIO CANAL FLUMINENSE ............................................................60 CONCLUSÃO ........................................................................................................................63 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................65
  • 10. INTRODUÇÃO No século XXI, com a popularização dos computadores e, consequentemente, da internet, ficou cada vez mais intensa a demanda por notícias em “tempo real”, tendo em vista suprir mais uma parcela que se abria no mercado da comunicação. Neste período, alguns veículos radiofônicos já consolidados passaram a produzir notícias exclusivas para a internet, enquanto outros ainda embrionários vislumbraram neste cenário a chance perfeita para crescer. Com o desenvolvimento da tecnologia streaming, tornou-se possível a distribuição de conteúdo multimídia sem a necessidade de se descarregar o arquivo para o computador, ou seja, a mídia passa a ser reproduzida à medida que os pacotes de informações são salvos no buffer, região da memória do computador utilizada para a retenção temporária de dados. Embora algumas emissoras apenas reproduzam na web o conteúdo das transmissões realizadas no dial, existem as webrádios que funcionam exclusivamente para o público da grande rede, aproveitando as diversas características oferecidas por este novo meio. Uma das ferramentas que é mais bem utilizada na web do que em rádios AM e FM é a interatividade, mais aguçada no público da internet. Além disso, é mais barato levar uma webrádio ao ar do que administrar uma emissora convencional. Com a meta de explorar este novo mercado, cheio de novas possibilidades e um tanto quanto ‘desconhecido’ do grande público – inclusive de grandes veículos –, a empresa Canal Fluminense lançou, em 2007, a primeira rádio online dedicada exclusivamente às transmissões de jogos de um clube de futebol: o Fluminense Football Club. A proposta do veículo era de permitir que torcedores em todo o lugar do mundo pudessem acompanhar o clube do coração – através de uma emissora parcial, em que todos os profissionais torciam deliberadamente pelo Fluminense ao longo das transmissões – utilizando apenas um computador conectado à internet, sem que a qualidade da transmissão fosse afetada pelas interferências de sinal. Para explorar a interatividade, um profissional se dedicava apenas a conversar com os torcedores-ouvintes por programas de mensagem instantânea, reproduzindo no ar a opinião de
  • 11. alguns torcedores. Em 2011, a Rádio Canal Fluminense foi agregada ao site oficial do Fluminense < www.fluminense.com.br > e tornou-se a rádio oficial do clube.
  • 12. 1 DO DESENVOLVIMENTO DO RÁDIO ATÉ A ERA DA INTERNET 1.1 RÁDIO: O PONTO A PONTO PELO AR O rádio é o meio de comunicação que funciona através da propagação de ondas eletromagnéticas no espaço. Estas ondas podem ser curtas com alta frequência ou longas de baixa frequência. O rádio atingiu seu auge entre os anos de 1919 e 1951. No Brasil, o aparelho foi apresentado ao público apenas na década de 20, mais precisamente no ano de 1922, como parte dos festejos do centenário da independência política do país em relação a Portugal. Segundo Straubhaar e LaRose (2004, p. 56), no final da década de 1890 e início da década de 1900, o italiano Guglielmo Marconi, que “[...] ajudou a inventar o rádio, com patentes na Grã-Bretanha, em 1896. [...] tentou empurrar o rádio para o uso militar e em negócios em sua Itália nativa, mas o governo não estava interessado”. Entretanto, a oferta de Marconi foi aceita pela Inglaterra e, mais tarde, pelos Estados Unidos. O rádio, utilizado como equipamento militar, teve importância evidenciada durante a Primeira Guerra Mundial, que durou de 1914 a 1918. Para Straubhaar e LaRose (2004, p. 56), neste período “[...] o rádio era visto como um telégrafo de duas mãos ou ponto a ponto pelo ar”. Já na opinião de Worts (1915, p. 647-650), a razão pelo rádio ter se destacado foi que “[...] no início das hostilidades, os principais cabos de comunicação da Alemanha haviam sido cortados ou desligados, de modo que seu contato com o exterior dependia essencialmente da comunicação sem fio”. O equipamento sem fio que o General Joffre usava para manter contato com as linhas de frente dos aliados era portátil e tinha um alcance de 320 km. Não eram precisos mais do que 15 minutos para montar esta estação e torná- la operante. Na linha de frente eram utilizados equipamentos menores e mais leves, conhecidos como "knapsack". Podiam ser divididos de modo que quatro homens pudessem transportá-los - cada parte pesava menos de 10 kg - e eram preparados para entrar em operação em menos de 5 minutos (WORTS, 1915, p. 647-650).
  • 13. Marconi ainda “[...] tentou comprar as patentes dos Estados Unidos para consolidar o monopólio de comunicações entre esse país e a Europa, mas o governo dos Estados Unidos se opôs ao controle estrangeiro” (STRAUBHAAR E LAROSE, 2004, p. 57). Em face desta recusa, “[...] um acordo negociado forçou Marconi a vender seu patrimônio americano para a General Electric. Em conjunto com a AT&T e a Westinghouse, a GE montou uma nova empresa, a Radio Corporation of America” (STRAUBHAAR E LAROSE, 2004, p. 57). Com o fim da Primeira Guerra, os aparelhos de rádio fabricados para a utilização dos militares estadunidenses ficaram em estoque e, por conta disso, uma das opções encontradas para minimizar o prejuízo foi instalar uma antena no pátio da empresa Westinghouse, a fabricante dos aparelhos, e transmitir música para as pessoas da vizinhança, que puderam comprar os rádios estocados. Foi então que o engenheiro Frank Conrad deu início a uma estação regular de transmissão na Companhia. Uma loja de departamentos de Pittsburgh decidiu tentar vender rádios para sintonizar as transmissões de Conrad. Não demorou muito para que a Westinghouse descobrisse que a transmissão regular de rádio poderia ajudar a vender rádios, e ela logo abriu a estação KDKA em Pittsburgh, em 1920. [...] Foram 100 mil em 1922 e mais de 500 mil em 1923 (STRAUBHAAR E LAROSE, 2004, p. 58). A popularização do rádio foi tanta que, em pouco mais de um ano, o número de emissoras de rádio dos Estados Unidos passou de quatro para 382. E esse novo conceito de utilização do rádio se estendeu mundo a fora, sendo “[...] particularmente importante por alcançar com muito mais facilidade as áreas rurais”. (STRAUBHAAR E LAROSE, 2003, p. 34) Nas palavras de McLuhan, (1977, p. 192) “[...] nossa própria ‘turbulenta década de vinte’ foi a primeira a sentir o meio quente do filme e também o não menos quente do rádio. Foi a primeira grande era de consumo”. A primeira emissora de rádio brasileira foi a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro – hoje Rádio MEC –, com finalidade cultural e educativa. Contudo, além da qualidade ruim das transmissões, tanto no que se refere ao profissionalismo quanto às dificuldades técnicas para minimizar os ruídos, as taxas cobradas pelas rádios sociedades afastaram parte do público ouvinte da rádio, que só recebiam a transmissão mediante o pagamento pelo serviço.
  • 14. A fórmula utilizada, então, para a criação de uma nova emissora era a da formação de uma rádio-sociedade, que previa em seus estatutos a existência de associados com obrigação de colaborar com uma determinada quantia mensal. A verba arrecadada dessa forma era a principal, senão a única, fonte de renda das emissoras. Muitas pessoas se associavam, mas poucas se mantinham pagando regularmente as mensalidades. Eram tempos difíceis para as rádio-sociedades (CALABRE, 2004, p. 12). Anos depois, o rádio de galena foi substituído pelo de válvula. Essa substituição barateou o custo de fabricação dos aparelhos, culminando na popularização do rádio e no maior alcance da população. Em face disso, o rádio rapidamente consolidou-se como o principal meio de comunicação brasileiro e viveu seu auge até a década de 50, tendo crescimento freado pelo aparecimento de um novo meio de comunicação: a televisão. O rádio criou modas, inovou estilos, inventou práticas cotidianas, estimulou novos tipos de sociabilidade. Ícone de modernidade até a década de 1950, ele cumpriu um destacado papel social tanto na vida privada como na vida pública, promovendo um processo de integração que suplantava os limites físicos e os altos índices de analfabetismo no país (CALABRE, 2004, p. 7). Situação semelhante aconteceu nos Estados Unidos, segundo Straubhaar e LaRose (2004, p. 63), que citaram a utilização do rádio na Segunda Guerra (1939–1945) e, assim como a autora Lia Calabre, ligaram a queda do número de emissoras de rádio à ascensão da televisão. As redes de rádio continuaram fortes ao longo da Segunda Guerra Mundial, o que em muitos casos representou um pico na importância do rádio quando comparado a outras formas de mídia. [...] As redes de rádio desenvolveram- se altamente até 1947, o mesmo ano em que a audiência dos cinemas chegou ao pico, mas, à medida que a televisão cresceu em proeminência, tornando- se a principal fonte nacional de entretenimento de massa, a rede de rádio começou a ter seu progresso restringido. O número de redes afiliadas caiu de 97%, em 1947, para 50% em 1955 (STRAUBHAAR E LAROSE, 2004, p. 63).
  • 15. Em paralelo à ascensão da televisão, que foi tomando o espaço ocupado pela rádio por unir som e imagem, iniciou-se a Guerra Fria, que durou de 1945 a 1989, ano em que o socialismo já estava praticamente suprimido na extinta União Soviética. Foi neste período histórico, em que os Estados Unidos e a União Soviética travaram uma corrida armamentista, que a internet se desenvolveu.
  • 16. 1.2 INTERNET: COMUNICAÇÃO EM ESCALA GLOBAL A internet, segundo Castells (2003, p. 8), foi o meio de comunicação que permitiu “[...] pela primeira vez, a comunicação de muitos-com-muitos, num momento escolhido, em escala global”, aspecto aguçado pela criação recente das redes sociais. No entanto, esta forma de comunicação era diferente do conceito de comunicação de massa que classificava o rádio, a televisão e as demais mídias existentes, em que a comunicação era de um-para-muitos. Comunicação de massa é geralmente definida como um-para-muitos ou ponto a multiponto. Nesse caso, uma mensagem é comunicada de uma única fonte para centenas ou milhares de receptores, com relativamente poucas oportunidades para a audiência comunicar-se de volta com a fonte (STRAUBHAAR E LAROSE, 2004, p. 9). Embora existam divergências entre autores quanto ao conceito de comunicação de massa e quais mídias se encaixam neste modelo, fator que vai ser esclarecido no capítulo ‘Convergência: o rádio na webemergência’, neste será abordado o surgimento e desenvolvimento da internet, que, assim como o rádio, foi utilizada com objetivos militares. O intuito dos estadunidenses, que travava corrida armamentista contra a União Soviética, era desenvolver a possibilidade de manter comunicação com as bases militares mesmo que o Pentágono e os meios convencionais de comunicação da época fossem atingidos em um ataque inimigo durante a Guerra Fria. Um grupo de programadores e engenheiros eletrônicos, contratados pelo Departamento de Defesa dos Estados Unidos, desenvolveu o conceito de uma rede sem nenhum controle central, por onde as mensagens passariam divididas em pequenas partes [...] Assim, as informações seriam transmitidas com rapidez, flexibilidade e tolerância a erros, em uma rede onde cada computador seria apenas um ponto (ou “nó”) que, se impossibilitado de operar, não interromperia o fluxo das informações (MONTEIRO, 2001, p. 28).
  • 17. Com esta proposta surgiu a Arpanet, precursora da internet, que foi “[...] uma rede de computadores montada pela Advanced Research Projects Agency (ARPA) em setembro de 1969” (CASTELLS, 2003, p. 13). Entretanto, o projeto foi usado pelo cientista da computação J.C.R. Licklider, contratado pela ARPA para liderar o IPTO (Information Processing Techniques Office), para realizar um sonho pessoal dele, o da criação de “[...] uma rede de computadores que permitisse o trabalho cooperativo em grupos, mesmo que fossem integrados por pessoas geograficamente distantes” (IMRE, 1997). Para montar uma rede interativa de computadores, o IPTO valeu-se de uma tecnologia revolucionária de transmissão de telecomunicações, a comutação por pacote, desenvolvida independentemente por Paul Baran na Rand Corporation e por Donald Davies no British National Physical Laboratory. O projeto de Baran de uma rede de comunicação descentralizada, flexível, foi uma proposta que a Rand Corporation fez ao Departamento de Defesa para a construção de um sistema militar de comunicações capaz de sobreviver a um ataque nuclear, embora esse nunca tenha sido o objetivo por trás do desenvolvimento da Arpanet (grifo nosso). O IPTO usou essa tecnologia de comutação por pacote no projeto da Arpanet (CASTELLS, 2003, p. 14). “O passo seguinte foi tornar possível a conexão da Arpanet com outras redes de computadores, a começar pelas redes de comunicação que a ARPA estava administrando, a PRNET e a SATNET” (CASTELLS, 2003, p.14). A possibilidade de conexão entre diferentes redes foi alcançada apenas no fim da década de 1970, com “o desenvolvimento e utilização do TCP/IP (Transmission Control Protocol/Internet Protocol) como protocolo para a troca de informações na ARPAnet” (MONTEIRO, 2001, p. 28). Para que pudessem falar umas com as outras, as redes de computadores precisavam de protocolos de comunicação padronizados. Isso foi conseguido em parte em 1973, num seminário em Stanford, por um grupo liderado por Cerf, Gerard Lelann (do grupo de pesquisa francês Cyclades), e Robert Metcalfe [então no Xerox PARC], com o projeto do protocolo de controle de transmissão [TCP]. Em 1978 Cerf, Postel e Crocker, trabalhando na Universidade da Califórnia do Sul, dividiram o TCP em duas partes, acrescentando um protocolo intra-rede [IP], o que gerou o protocolo TCP/IP, o padrão segundo o qual a Internet continua operando até hoje (CASTELLS, 2003: p. 14-15).
  • 18. Por mais que a abrangência da rede tenha aumentado enormemente após a criação do protocolo TCP/IP, a internet se popularizou apenas após o desenvolvimento do WWW (World Wide Web), “[...] aplicação de compartilhamento de informação desenvolvida em 1990 por um programador inglês, Tim Berners-Lee, que trabalhava no CERN, o Laboratório Europeu para Física de Partículas baseado em Genebra” (CASTELLS, 2003, p. 17). A WWW permite a troca de conteúdos multimídias, como texto, imagens, sons e vídeos, em um ambiente de interface mais agradável e o acesso a informações através de navegadores. “[...] a WWW foi imediatamente adotada pela comunidade da internet, sendo responsável [...] pelo grande crescimento da internet verificado na década de 1990, com um aumento de 50% a cada ano em média (DIZARD, 2000, p. 24). A Mosaic Communications, que mais tarde foi obrigada a mudar seu nome para Netscape Communications [...] tornou disponível na Net o primeiro navegador comercial, o Netscape Navigator em outubro de 1994, e despachou o primeiro produto no dia 15 de dezembro de 1994. Em 1995, lançaram o software Navigator através da Net, gratuitamente para fins educacionais e ao custo de 39 dólares para uso comercial (CASTELLS, 2003, p. 18). “Depois do sucesso do Navigator, a Microsoft finalmente descobriu a Internet e em 1995, junto com seu software Windows 95, introduziu seu próprio navegador, o Internet Explorer” (CASTELLS, 2003, p. 19). O surgimento cada vez mais acelerado de browsers, provedores de acesso e possibilidades de websites, fizeram com que os usuários começassem a enxergar na internet a chance de conhecer novas pessoas, expandir os negócios da empresa, entreter-se com os mais diversos jogos e seguir buscando conhecimento tanto através de pesquisas como com veículos online, que na década de 90 apenas reproduziam as notícias dos jornais impressos. Com o maior interesse das pessoas no universo online, a internet se desenvolveu e se tornou mais colaborativa – conceito wiki –, além de favorecer a interação entre internautas em fóruns específicos. Por conta disso, em 2004, Tim O’Reilly, fundador da O’Reilly Media, classificou esta nova fase da internet de ‘Web 2.0’, em que a “nova versão” era referente às formas de comunicação entre usuários e não às alterações técnicas.
  • 19. A Web 2.0, termo criado por Tim O’Reilly, não traz quase nenhum paradigma tecnológico novo, mas aponta para o conceito de ampla troca de informações e colaboração dos usuários dos serviços, sem, contudo, demandar uma infraestrutura proprietária para o fornecimento de conteúdo.1 De acordo com Hamadoun Toure (2011), responsável pela agência de comunicação da ONU (Organização das Nações Unidas), em janeiro de 2011, 2,08 bilhões de pessoas no mundo já haviam acessado a internet, quase 1/3 da população mundial, estimada em 6,8 bilhões. Em 2009, a quantidade de internautas era de 1,86 bilhão. Este aumento desenfreado de usuários da internet é motivo de preocupação para Wolton (2010, p. 23), pois, segundo ele, “[...] com a tecnologia, tudo se simplifica, com os homens e a sociedade, tudo se complica”. Eis o desafio: perpetuar, num mundo saturado de informação, de comunicação e de tecnologia, o valor da emancipação, que sempre as regeu desde o século XVI. É preciso impedir que a informação e a comunicação, até ontem fatores de aproximação, tornem-se aceleradores de incompreensão e de ódio justamente por serem visíveis todas as diferenças e toda alteridade (WOLTON, 2010, p. 14). Entretanto, este crescente uso das redes sociais não pode ser encarado apenas por um viés negativo no que se refere aos desentendimentos virtuais, ele também oferece um novo espaço a ser explorado pelas companhias, ou seja, “[...] uma grande oportunidade de mercado para as empresas sintonizadas com as novas tendências de mídias e canais”.2 A crescente adoção das mídias sociais nos ambientes corporativos se evidencia como a migração bem sucedida de uma tendência que começou no mundo individual e chegou ao organizacional. A compreensão e o reconhecimento prático da sua utilidade com o meio e/ou estratégia para melhorar os negócios, processos, relacionamentos e comunicações da empresa – internas ou externas –, de forma a transformar sua prática diária em um modelo mais participativo e interativo com os diversos públicos de 1 Disponível em: < http://www.ecnetwork.com.br/a-web-2-0-acelerando-e-desgovernando-a- convergencia/ >. Acesso em: 21/09/2011. 2 Disponível em: < http://www.publicidadedigital.com/index.php/publicidade-online/ > Acesso em: 21/09/2011.
  • 20. relacionamento [stakeholders] é fator essencial para que as empresas 1.0 se redefinam, de fato, como organizações 2.0.3 Além da ampliação do mercado comercial, a internet também propiciou novas possibilidades de comunicação, muito em virtude da multimidialidade, ou seja, a convergência, que “[...] consiste na união de todos os meios de comunicação em um único” (MAGNONI E CARVALHO, 2010, p. 274). 3 Disponível em: < http://www.e-consultingcorp.com.br/midia/ultimos-artigos/Redes-Sociais-S.A-1 >. Acesso em: 21/09/2011.
  • 21. 1.3 CONVERGÊNCIA: O RÁDIO NA WEBEMERGÊNCIA A internet tem a capacidade de absorver os mais diversos meios de comunicação e fazer com que eles funcionem juntos, a chamada convergência digital. A multimídia, na opinião de Straubhaar e LaRose (2004, p. 23), “[...] está apagando as antigas distinções rígidas entre os meios de comunicação”. Segundo Fidler (1998, p. 57), a convergência é uma “[...] metamorfose dos meios antigos. E quando emergem novas formas de meios de comunicação, as antigas geralmente não deixam de existir, mas continuam evoluindo e se adaptando”. Foi o caso do rádio. De acordo com Castells (2003, p. 157), “[...] a radiotransmissão está vivendo um renascimento, tornando-se de fato o meio de comunicação de maior penetração no mundo”, sendo considerado por Magnoni e Carvalho (2010, p. 7) como “[...] a maior prova da capacidade de convivência dos diferentes meios de comunicação”. A audição de rádio está florescendo na Internet, tanto a partir de estações de transmissão aberta quanto de transmissões radiofônicas feitas pela Internet. A relação de rádios feita pelo MIT nos EUA mostra mais de 10.000 estações transmitindo na Internet (CASTELLS, 2003, p.162). Quantidade superior à de rádios analógicas encontradas no Brasil, que “[...] ultrapassou a marca de nove mil estações de rádio em 2010. No final do ano, eram 2.602 FMs, 1.784 Mas, 4.193 comunitárias, 465 FMs educativas, 74 OTs e 66 OCs, totalizando 9.184 emissoras” (Sandra Regina da Silva, 2011, p. 24). Estes números mostram que a opinião de Barbeiro e Lima (2003) é mais do que correta. É preciso separar a idéia de rádio como aquele aparelhinho quadrado, com botões, e que retransmite emissoras de áudio. O rádio, comunicação auditiva, eletrônica à distância, pode se materializar no computador, basta que este tenha instalado um programa de áudio (BARBEIRO E LIMA, 2003, p. 45). Para Jung (2011, p. 21), a “[...] internet deu um novo fôlego para o rádio. É o meio em que ele vai navegar. Mais do que o próprio rádio digital, que até agora não conseguiu se
  • 22. estabelecer no Brasil. [...] rádio é internet, é lá que as pessoas vão nos ouvir cada vez mais”. Com o surgimento da internet, o fazer radiofônico se digitalizou e surgiram as webrádios: rádios com veiculação exclusiva na rede (PRATA, 2008). Uma característica importante de uma webrádio é a junção de linguagens sonoras, imagéticas e textuais, que se encontram através de um endereço na URL (BRAZ E MEIRELES, 2011, p. 1). São veículos complementares. Não tenho dúvida de que a internet valorizou o rádio. Primeiro, porque é o único veículo que opera em conjunto com a internet. E segundo, por ser o único realmente real time. Internet e rádio trabalhando em conjunto geram resultados, inclusive para anunciantes, excepcionais (CALAINHO, 2011, p. 33). Entretanto, para o rádio “navegar” na internet, é necessário se adaptar a este novo ambiente. Apenas retransmitir a programação do analógico não basta, pois os usuários estão cada vez mais exigentes. É necessário, então, criar um portal mais personalizado, mais agradável, com constante atualização de conteúdos interessantes, de forma a não perder audiência. Quando um usuário acessa um portal, quer sentir-se único. Gosta de ser ouvido e interage [seja conversando nas salas de bate-papo, mandando mensagens nos fóruns ou respondendo pesquisas de opinião]. Essas mudanças, ainda que em estágio inicial, delineiam o novo padrão de informação e entretenimento de massa. É uma combinação da mídia antiga e da nova, que se complementam e ao mesmo tempo competem entre si (FERRARI, 2008, p. 38). A programação também terá de ser alterada, pois os usuários de determinada rádio querem a opção de ouvir o conteúdo em tempo não-linear, uma possibilidade oferecida pela rádio digital, ou rádio na internet, que não é disponibilizada pela rádio de caráter analógico. A grade de programação do rádio analógico é linear e cronológica. Prevê antecipadamente todos os programas e intervalos para publicidade, serviços, utilidade pública etc. A grade define o perfil ou segmento de mercado em que a emissora vai atuar. No rádio digital, os programadores terão que criar novas estratégias para suprir uma grade que não contará só com os ouvintes em tempo real. Os recursos, os espaços e conteúdos para interatividade com
  • 23. os ouvintes também será tarefa da programação (MAGNONI E CARVALHO, 2010, p. 138). Magnoni e Carvalho (2010) tratam com mais serenidade, sem exagero, as mudanças pelos quais o rádio com tecnologia digital terá de passar. Assim como em outros momentos, como no que precisou se adaptar à migração de seus profissionais para outros meios, o rádio passará por nova mudança, porém não muito brusca. É presumido que a digitalização não irá reescrever totalmente a cultura radiofônica consolidada no trajeto social de um veículo que já resistiu e se adaptou à concorrência do cinema sonoro, da televisão, do videocassete e da informática, bem como de todas as suas ferramentas versáteis de comunicação e entretenimento. De imediato, o novo processo apresentará poucas rupturas e muitas readaptações em matrizes clássicas da programação das emissoras, que foram desenvolvidas, copiadas, aperfeiçoadas ou reinterpretadas desde meados dos anos 1930 (MAGNONI E CARVALHO, 2010, p. 119). Para os autores (2010, p. 109), o “[...] rádio continuará sendo sonoro, porém com funções multimídia, portanto terá de agregar uma linguagem flexível que possibilita diversificar conteúdos, o que torna inevitável integrar sua programação a novos formatos de distribuição”. A digitalização também oferece um novo padrão de qualidade dos sons, sem os ruídos da transmissão analógica. Este aspecto deve-se à programação dos computadores em código binário, ou seja, zeros e uns, que garante mais estabilidade ao som durante a transmissão digital. Na transmissão analógica há a oscilação elétrica que provoca uma perda natural de tensão: um sinal que é gerado com 1,0 volt pode cair para 0,8 volts na recepção. Uma perda de sinal que compromete a qualidade do som recebido, principalmente em altas frequências. Essa perda de tensão não ocorre com a digitalização se um sinal digital for gerado com a combinação 1001, o primeiro dígito corresponderia a 1 volt. Na transmissão analógica, com a perda de percurso, ele chegaria ao receptor reduzido a 0,8 volts. Para a lógica digital não existe 0,8 volts: ou é zero ou é um. Se há tensão maior do que zero (0,8), ela terá de ser elevada para 1. Portanto, o sinal é regenerado com sua tensão original na recepção. Para cada dígito ocorre o mesmo processo de restauração da tensão de origem. (MOREIRA E DEL BIANCO, 1999, p. 48).
  • 24. Para Magnoni e Carvalho (2010, p. 57), esta alteração traz também outros benefícios, pois com ela “[...] consegue-se não apenas transmitir um som mais puro mas, além disso, como bit é bit, pode-se transmitir qualquer coisa que seja digital – de pequenos vídeos a programas de computador”. Os autores, contudo, manifestam um pouco de receio acerca desta possibilidade. Com isso, o rádio poderá deixar de ser uma mídia baseada exclusivamente no áudio, e certamente haverá quem receie pela perda de identidade que isso pode provocar. Afinal, uma das características do rádio é a de ser uma mídia intimista, com forte apelo ao uso da imaginação e sugestão, e a introdução da imagem poderá distorcer ou suprimir essa característica (MAGNONI E CARVALHO, 2010, p. 83). Há outros fatores negativos causados por esta digitalização da transmissão, como o delay (atraso, em inglês) de cerca de oito segundos entre a emissão e a recepção e a demora de alguns segundos para o receptor conseguir restabelecer o sinal da rádio quando há perda. “Com isso, a recepção em automóveis, em que essa situação de perda de sinal ocorre com certa frequência, pode provocar sensações desagradáveis”. (Magnoni e Carvalho, 2010, p. 81). A velocidade da conexão também é um problema para a rádio na internet, segundo eles. Embora já existam diversas emissoras nesse sentido, a transmissão de rádio via internet ainda padece de problemas de velocidade da rede. Se, de um lado, a contínua construção de novas redes pode melhorar a velocidade escoada, e portanto tornar o “ouvir uma rádio na internet” menos traumática do que é hoje em dia, por outro lado o aumento do tráfego total da internet, devido à adesão de novos usuários e ao surgimento de novos serviços, pode anular aquele ganho do aumento das redes (MAGNONI E CARVALHO, 2010, P. 86). A tecnologia streaming, pela qual são feitas as transmissões de rádio via internet, tem na utilização do protocolo IPTV a principal saída para esta pouca velocidade na conexão, que acaba por prejudicar a qualidade das transmissões. Como a internet funciona através da troca constante de pacotes de dados por milhões de usuários, essa tecnologia garantiria a continuidade no fluxo de pacotes.
  • 25. Os protocolos de IPTV visam contornar esse problema, criando canais virtuais de comunicação dentro desse caos, nos quais o tráfego de pacotes é razoavelmente protegido e estável. Embora até o momento o foco do IPTV tenha sido a televisão (por assinatura), esses protocolos poderiam ser empregados para as rádios, possibilitando um fluxo mais ininterrupto de pacotes de áudio (MAGNONI E CARVALHO, 2010, p. 87). Agora fugindo ao aspecto técnico e falando sobre o caráter noticioso dos veículos comunicacionais, no que se refere às informações difundidas ao público, o capítulo seguinte vai abordar as teorias que estudam os responsáveis pela seleção das notícias publicadas nas mídias e a capacidade de influência destas notícias no cotidiano dos indivíduos.
  • 26. 2 FILTROS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO 2.1 TEORIA DO AGENDAMENTO E GATEKEEPING: OS PRESSUPOSTOS DA NOTÍCIA Com o desenvolvimento da internet e das novas tecnologias de informação, aliado ao desejo do público de ser alimentado, a todo instante, com novas informações, a presença da mídia no cotidiano dos indivíduos ganhou ainda mais força. E em consequência deste fato, o agendamento do espaço público pela agenda midiática torna-se mais evidente. Mas antes de abordar este aspecto, explicaremos “Agendamento” (agenda setting, em inglês). Segundo McCombs (2009), “Walter Lippmann resumiu, em 1922, a ideia do agendamento. A tese dele era de que a opinião pública não respondia ao ambiente, mas ao pseudoambiente criado pelos veículos noticiosos”. Ou seja, a realidade comentada pelas pessoas não era a realidade dos fatos, mas a realidade demonstrada pelos veículos midiáticos. A agenda da mídia é algo mais do que ser simplesmente um veio condutor para os eventos e as situações do mundo real. [...] A mídia constrói e apresenta ao público um pseudoambiente que significativamente condiciona como o público vê o mundo. [...] O agendamento é um efeito robusto e amplo de comunicação de massa, um efeito que resulta de conteúdo específico nos mass media (MCCOMBS, 2009, p. 47, 57 e 65). Para McCombs (2009), na “[...] sua seleção diária e apresentação das notícias, os editores e diretores de redação focam nossa atenção e influenciam nossas percepções naqueles que são as mais importantes questões do dia”. Opinião compartilhada por Cohen apud Traquina (2000), que afirma que as mídias “[...] podem não dizer às pessoas como pensar, mas sim sobre o que pensar”. Mas essa influência não se limita apenas a pautar os assuntos do público. De acordo com Cassol (2006, p. 29), “[...] esse sistema padrão inclui as referências e necessidades,
  • 27. crenças e expectativas que influenciam aquilo que o receptor retira de uma situação comunicativa”. Visando ao entendimento da função do agendamento, basta observar as entrelinhas de um veículo impresso. “A matéria principal da p. 1, a página de capa versus a página interior, o tamanho do título, e mesmo o tamanho de uma matéria comunicam a saliência dos tópicos da agenda noticiosa” (MCCOMBS, 2009, p.18). Os públicos usam estas saliências da mídia para organizar suas próprias agendas e decidirem quais assuntos são os mais importantes. Ao longo do tempo, os tópicos enfatizados nas notícias tornam-se os assuntos considerados os mais importantes pelo público. A agenda da mídia torna-se, em boa medida, a agenda do público. Em outras palavras, os veículos jornalísticos estabelecem a agenda do público (MCCOMBS, 2009, p. 18). Esta teoria foi desenvolvida por McCombs e Shaw, dois professores da Faculdade de Comunicação da Universidade da Carolina do Norte, nos Estados Unidos, durante uma campanha presidencial no país. “A hipótese central deles era de que os mass media estabeleciam a agenda de temas para a campanha política influenciando a saliência dos temas entre os eleitores” (MCCOMBS, 2009, p. 21). De forma a levar mais consistência ao estudo, buscou-se um método que comprovasse esta influência da agenda midiática, um “[...] sumário estatístico que [...] permita comparar o grau em que o agendamento está ocorrendo em diferentes localidades” (MCCOMBS, 2009, p. 28). A mais comum medida utilizada pelos pesquisadores que examinam o papel dos veículos noticiosos no agendamento é a correlação estatística. Este dado estatístico resume com precisão o grau de correspondência entre o ranking dos temas da agenda da mídia – que assunto recebeu mais cobertura noticiosa, que assunto recebeu a segunda cobertura noticiosa mais intensa etc – e o ranking daqueles mesmos temas na agenda pública – qual tema a maioria dos membros do público considera o mais importante, que assunto vem em segundo lugar etc. A amplitude possível de pontuação para a correlação estatística vai de +1,0 (correspondência perfeita) através do zero (não há correspondência) até -1 (uma relação perfeitamente inversa). A Teoria da Agenda prevê uma correlação positiva alta entre a agenda da mídia e a subsequente agenda pública (MCCOMBS, 2009, p. 28).
  • 28. Esta estatística provou-se acertada quando foi feita a observação de três diferentes comunidades eleitorais durante as eleições presidenciais de 1976, nos Estados Unidos. “[...] durante as primárias da primavera quando a influência da agenda tanto da televisão como dos jornais estava no seu auge, a correlação entre a agenda nacional da televisão e a agenda subsequente do leitor era de +0,63. Este é um grau significativo de influência (MCCOMBS, 2009, p. 29). A evidência revista até aqui, além de muitos outros levantamentos de campo conduzidos em todo o mundo, corroboram uma relação de causa e feito entre a agenda da mídia e a agenda do público. A condição inicial necessária para demonstrar causalidade é um significante grau de correlação entre a presumida causa e seu efeito. De acordo com este requisito de evidência, há correlações substanciais entre as agendas da mídia e do público em todas as análises recentemente revistas assim como em centenas de outras (MCCOMBS, 2009, p. 37). Foram realizados outros levantamentos em todo o mundo, que ratificaram “[...] uma relação de causa e efeito entre a agenda da mídia e a agenda do público” (MCCOMBS, 2009, p. 37). Segundo McCombs (2009, p. 39), uma “[...] variedade de controles averiguou que as modificações na saliência do tópico manipulado ocorreram, de fato, devido à exposição à agenda noticiosa”. [...] num experimento, sujeitos que viram programas noticiosos na TV enfatizarem o alerta do sistema de defesa foram comparados a sujeitos num grupo de controle cujos programas de notícias não incluíam o alerta do sistema de defesa. A modificação na saliência deste tema foi significativamente mais alta para os sujeitos testados do que para os sujeitos no grupo de controle. Em contraste, não houve diferenças significativas entre os dois grupos de antes para depois de assistirem aos telejornais para outros sete temas (MCCOMBS, 2009, p. 39). Após a confirmação, por outros estudos, de que a agenda pública influencia a agenda da mídia, iniciou-se uma comparação entre a Teoria da Agenda e outras teorias de comunicação massiva, para que fosse descoberto “[...] quanto tempo é necessário para que um assunto veiculado pela mídia transforme-se em algo saliente na agenda pública” (MCCOMBS, 2009, p. 75).
  • 29. A Teoria da Agenda continuou a se desenvolver por mais de 35 anos porque ela complementa e é compatível com uma variedade de outras ideias nas ciências sociais. À medida que os acadêmicos construíram um mapa intelectual crescentemente detalhado da influência da comunicação massiva no público, a Teoria da Agenda incorporou ou convergiu com vários outros conceitos comunicacionais e teorias (MCCOMBS, 2009, p. 135). Ainda segundo o autor (2009, p. 75), a “[...] antiga teoria hipodérmica via os efeitos da mídia como essencialmente imediatos. Naquela visão, as mensagens da mídia eram injetadas na audiência da mesma forma como as injeções são administradas nos pacientes alcançando efeitos rápidos”. Esta visão, após outros estudos, foi contestada por alguns teóricos. A base para esta visão praticamente desapareceu com o acúmulo de evidência empírica nas décadas de 1940 e 1950, um volume de evidências registrado no livro The Effects of Mass Communication de Klapper como a Lei das Consequências Mínimas. Em resposta, acadêmicos como Wilbur Schramm afirmaram que os efeitos verdadeiramente significativos da comunicação massiva seriam provavelmente de longo prazo, da mesma forma que as formidáveis formações de estalactites e estalagmites em cavernas são criadas por gotas numa eternidade de tempo (MCCOMBS, 2009, p. 75). De fato, o “prazo exigido para que sejam notados [...] os efeitos do agendamento estão longe de ser instantâneos, mas são relativamente de curto prazo” (MCCOMBS, 2009, p. 75). McCombs (2009, p. 77) afirma que o “[...] período de tempo envolvido na transferência da saliência de um tópico da agenda midiática para a agenda pública é geralmente de um prazo de quatro a oito semanas”. Na internet, o período é menor. No ambiente contemporâneo da internet, o exame das postagens de quatro edições na BBS – imigração, atendimento medido, impostos e aborto – durante a campanha presidencial de outono de 1996 encontrou evidência de que as notícias tradicionais da mídia estabeleceram a agenda de discussão para todas estas edições exceto o aborto com períodos de tempo de um a sete dias (MCCOMBS, 2009, p. 107). Entretanto, as saliências na agenda do público dependem da necessidade do receptor por informações. “Quanto maior for a necessidade de orientação que as pessoas têm no
  • 30. âmbito dos assuntos públicos, maior é a probabilidade deles atentarem para a agenda da mídia” (MCCOMBS, 2009, p. 94). Na evolução da Teoria da Agenda, o conceito de necessidade de orientação é a mais proeminente das condições contingentes para os efeitos do agendamento, aqueles fatores que estimulam ou constrangem a força destes efeitos. Estas condições contingentes podem ser divididas em dois grupos, as características da audiência – tal como a necessidade de orientação – e as características da mídia – tal como as comparações entre os jornais e a televisão (MCCOMBS, 2009, p. 109). Essa evolução da Teoria da Agenda culmina no desenvolvimento de outros conceitos teóricos voltados para a comunicação massiva, como o “Gatekeeping, que descreve e explica o fluxo das notícias desde uma organização noticiosa à outra” (MCCOMBS, 2009, p. 135). Esta teoria “[...] esteve ligada com a Teoria da Agenda [...] quando os acadêmicos inauguraram uma nova fase [...] ao perguntarem ‘Quem é que define a agenda da mídia?’” (MCCOMBS, 2009, p. 135). Segundo Cassol (2006, p. 36), “há vários procedimentos padrões, estabelecidos em conjunto pelos profissionais, que fazem com que a seleção a cargo do gatekeeper tenha um mínimo de subjetividade”. Ainda de acordo com a autora (2006, p. 36), os fatores que influenciam na decisão do editor sobre os assuntos filtrados são a empresa, a linha editorial do veículo e a visão de mundo do profissional e dos seus colegas. [...] o contexto profissional-organizativo-burocrático circundante exerce uma influência decisiva nas escolhas dos gatekeepers: já o clássico estudo de Breed (1955) sobre controlo social nas redações – analisando os mecanismos de manutenção da linha editorial e política dos jornais – confirma essa linha, raramente explicitada e discutida, é apreendida ‘por osmose’ e é imposta, sobretudo, através do processo de seleção dos jornalistas no interior da redação. A principal fonte de expectativa, orientações e valores profissionais não é o público, mas o grupo de referência constituído pelos colegas ou pelos superiores (WOLF, 1995, p. 164). A tarefa de conseguir filtrar, além das notícias, uma grande carga de influências provenientes de diferentes partes da hierarquia da empresa, além dos cuidados em não afetar
  • 31. os interesses dos anunciantes, o que em contrapartida atrapalharia os índices financeiros do veículo, o jornalista tem mais um desafio: manter-se ético dentro deste cenário.
  • 32. 2.2 ÉTICA NO JORNALISMO: OS DOIS LADOS DE UMA MESMA MOEDA A ética tem como meta estabelecer um modelo perfeito para a vida dos indivíduos em sociedade, tanto na esfera público quanto na esfera privada, sobretudo porque se baseia nos princípios comportamentais humanos, como o que é bom, mau, certo ou errado. Ou seja, a ética investiga a conduta dos homens, nos aspectos referentes ao caráter, e normatiza as atitudes individuais que sejam favoráveis ou não ao bem estar social. Vivemos, entretanto, em um mundo extremamente individual, em que as pessoas se preocupam cada vez mais com a própria satisfação, muitas vezes em detrimento do contentamento de outros indivíduos. A era da liberdade sem compromisso. Da má utilização dos direitos alcançados em lei. De éticas socialmente constituídas, passamos por uma ética definida em torno de cada indivíduo, o que parece uma contradição de termos, um paradoxo, já que as condutas pessoais só podem ser avaliadas na sua articulação com outras condutas. Pode ser uma ética provisória. O fato é que hoje, dentro de limites bastante amplos, cada um tem o direito de pensar e agir como quiser (GOMES, 2002, p. 9). Essa ética paradoxalmente individual, ou “provisória”, como trata Gomes (2002), também acaba se refletindo nos campos profissionais que atuam diretamente com a ética. Contudo, essas mutações do “ser ético”, ou seja, do indivíduo de “bom caráter”, são delicadas e merecem atenção. Alheio à ética em áreas de atuação em que o aspecto moral pode variar de caso a caso, como na medicina, em que diferentes situações levam a refletir sobre a atitude que será melhor para o bem estar de um paciente, embora o objetivo da profissão seja sempre o de deixar o indivíduo saudável, no jornalismo o comportamento ético deve “caminhar” junto ao conteúdo que vai ser publicado e, principalmente, dos meios utilizados para a realização da apuração. O jornalista é o primeiro responsável pelas análises e críticas que ele propõe do acontecimento. Seu trabalho, porém, insere-se num sistema de regras e
  • 33. restrições, e que não pode declinar da responsabilidade daquilo que ele divulga, sejam textos ou imagens. O ato de difusão tem o efeito de conduzir a informação a seu estágio último: é pela mídia que ela chega ao conhecimento do público, é difundida em meio à sociedade, é amplificada. Entre os textos e imagens que lhe são oferecidos, entre os resumos do acontecimento que lhe asseguram uma informação pluralista, cada pessoa do público também tem a liberdade, e a responsabilidade de realizar certas escolhas (CORNU, 1998, p. 78). Afinal, informar é “[...] tratar uma informação visando torná-la significativa para outra pessoa, ou várias. Informação, no sentido corrente, compreende ao mesmo tempo um conteúdo e uma forma, bem como sua transmissão, sua comunicação (CORNU, 1998, p. 8). Neste trecho, nota-se a importância de tratar o receptor e as personagens envolvidas na notícia com o respeito que qualquer indivíduo merece, por mais que estas personagens sejam antiéticas. Teoria e prática, representando os dois lados da moeda, tornam-se difíceis de coexistir diante do ciberespaço. Com a internet, que propiciou a conversação de “muitos-com-muitos”, os veículos noticiosos iniciaram uma imensa disputa entre ideologias a fim de influenciar a audiência. A mais evidente é entre a Rede Globo e a Rede Record. Segundo Gomes (2002, p. 10), o “[...] vazio ético do jornalismo [...] é a rigor o reflexo ideológico que se dá além da esfera estrita da comunicação, um embate entre propostas divergentes de civilização e de organização”. Os profissionais consideram a atividade jornalística como uma profissão liberal. Em sua grande maioria, são empregados assalariados. Trabalham para alguma organização, exercem funções, seu trabalho se insere num processo de fabricação, e estão submetidos a uma hierarquia de autoridade. Sua inserção na empresa os obriga a um “compromisso permanente” entre a aplicação das normas deontológicas e as exigências da empresa (CORNU, 1998, p. 83 e 84). Na opinião do autor desta pesquisa, os jornalistas, em sua maioria, “vestem a camisa da empresa” e se deixam levar pelas “orientações” dos superiores. “Orientações” estas que às vezes nem existem, mas os jornalistas “deduzem” que sim e colocam em prática. Não é uma ode à liberdade do jornalista ou ao descompromisso com o veículo e, tampouco, um grito pela anarquia diante da hierarquia, mas sim a defesa da verdadeira imprensa.
  • 34. A imprensa, que remete à “[...] categoria profissional dos jornalistas, aos jornais e periódicos, às empresas de comunicação em geral e mesmo ao conjunto do sistema desenvolvido para a difusão de informações e opiniões à sociedade” (CORNU, 1998, p.15), não pode esquecer-se de sua finalidade. Objetivo final [da mídia] é conciliar a aplicação de regras com práticas e costumes permitindo responder às supostas expectativas do público e de maximizar assim os benefícios da atividade ligada à produção de notícias. Ela indica um recurso à utilização estratégica da ética: pela fixação de normas, transmitir uma boa imagem da profissão ou do meio de comunicação, estimular uma sensação de confiança no público, promover o reconhecimento e maior credibilidade, dissuadir os poderes públicos de intervir na regulamentação do jornalismo (CORNU, 1998, p. 26). Os jornalistas têm muitas responsabilidades, porém, de acordo com Cornu (1998), elas são tratadas em pormenores em vários códigos nacionais. Ainda segundo Cornu (1998, p.43), a Declaração dos Deveres e Direitos dos Jornalistas, publicada na cidade alemã de Munique, em 1971, que poderia orientar os profissionais sobre a conduta ideal, dedica “[...] maior espaço aos direitos dos jornalistas, à proteção de sua integridade profissional”. Entre as responsabilidades dos jornalistas com o público que consome a informação por ele noticiada, evidencia-se o compromisso com a verdade: “[...] informações exatas, verificadas, apresentadas de modo equânime, opiniões expostas com honestidade livres de preconceitos, relatos jornalísticos verídicos e ciosos de sua autenticidade” (CORNU, 1998, p. 64). [...] para com os grupos de interesse, poderosos ou não, que constituem o ambiente econômico e social da empresa; para com o Estado e seus órgãos, que definem a missão geral da mídia e enquadram suas atividades num certo número de leis; frente à sociedade como um todo (CORNU, 1998, p. 49-50). Consciente disto, o profissional de comunicação não deve fazer uso de artifícios não condizentes com a realidade dos fatos, como a “[...] espetacularização da informação, que privilegia certos aspectos da realidade como método para manter os níveis de audiência e o número de leitores” (CORNU, 1998, p. 16).
  • 35. O jornalista também tem responsabilidades com o veículo de comunicação que o emprega. Além de respeitar a hierarquia, essas responsabilidades também envolvem os anunciantes que adquirem espaço no meio de comunicação, independentemente do tipo de mídia, seja ela impressa, rádio, TV ou até mesmo a internet. [...] junto a seu público e à opinião pública em geral; para com suas fontes e as pessoas sobre as quais tece comentários; para com as normas profissionais e seus órgãos tutelares; perante suas próprias convicções e conforme sua consciência individual; para com a hierarquia redacional, que é também responsável pelo trabalho desenvolvido pelos jornalistas individualmente junto ao editor ou proprietário do veículo de comunicação, bem como aos anunciantes (CORNU, 1998, p. 49-50). Mais uma vez o compromisso com a verdade e o respeito aos indivíduos são salientados. Ou seja, desempenhar um bom jornalismo, que não se deixa levar pela influência de terceiros ou pela preguiça de se dedicar a ouvir os diversos lados envolvidos com a notícia, de forma a não arranhar a imagem do veículo. A credibilidade dos meios de comunicação está ligada à veracidade das notícias, à honestidade com que são tratadas, à exatidão de seu conteúdo. Uma boa informação apresenta o reflexo do essencial dos fatos ocorridos no dia. Ela é plural e deve visar a objetividade, em particular pela apresentação de todos os seus elementos constitutivos e a ausência de manipulações (CORNU, 1998, p. 65). E também sem afetar a imagem dos personagens citados na reportagem. Os jornalistas são responsáveis, quanto ao conteúdo, pelo reflexo fiel e completo dos negócios públicos, pela proposta de uma visão crítica, assegurando uma informação respeitosa dos fatos e pessoas. Esta responsabilidade, individual e coletiva ao mesmo tempo, estende-se sobre o campo dos deveres que são impostos aos jornalistas pelas diversas formulações de sua deontologia profissional (CORNU, 1998, p. 107). Em caso de publicação de uma notícia errada, o jornalista tem o dever ético de desmentir, por mais que esta atitude não seja capaz de minimizar os danos à imagem de uma
  • 36. pessoa, no caso de haver algum indivíduo envolvido na informação, pois o público toma como verdade qualquer notícia veiculada em meios de comunicação. A atitude de retificar a notícia, entretanto, é o mínimo que se pode fazer. A notícia divulgada pode ser desmentida, corrigida, complementada por outros personagens, testemunhas ou peritos. Em sua pretensão da verdade, de valor fundamental, a informação fica portanto submetida a uma avaliação crítica permanente. A obrigação de retificação representa um desafio importante. Se um fato foi relatado de modo parcial ou inexato, se um artigo ou uma emissão divulgou uma informação contendo erros materiais, os fatos devem ser precisados e os erros, corrigidos. Não existem jornalistas ou jornais que não cometam erros, por menores que sejam. Os jornais sérios e os jornalistas exigentes distinguem-se dos demais por publicar precisões e retificações. O Código de conduta dos jornalistas britânicos acrescenta a obrigação de pedir desculpas (CORNU, 1998, p. 68-69). Como apontado neste capítulo, a conduta ética dos jornalistas é imutável, entretanto, a forma com a qual o público se relaciona com os meios de comunicação sofre alterações. Essas mudanças têm ocorrido atualmente, em virtude da convergência entre os meios e a crescente popularização da internet, que trouxe novas ferramentas para uso no meio digital.
  • 37. 2.3 O RECEPTOR NO RÁDIO: NOVOS PÚBLICOS NO AR Conforme aponta Prata (2002, p. 1), no Brasil e em toda a América Latina existe “[...] uma tendência de se voltar para o receptor as pesquisas em comunicação”. Para ela, “[...] há uma intensa procura sobre o que pensa, o quer, o que deseja e como age o receptor e, mais do que isto, entender o receptor como sujeito do processo de comunicação”. Prata (2002, p.2) ressalta que, em entrevista de Nilda Jacks com Guilherme Orozco, publicada em 1993 pelo INTERCOM, ele salientava que os primeiros estudos da comunicação eram voltados para o emissor, sendo o receptor “[...] estudado como um consumidor, em função de suas necessidades, seus gostos, para ver de que maneira seriam oferecidos mercadorias e serviços”. De acordo com Sousa (1995:40), no modelo antigo de estudos da recepção, o receptor era uma tábua rasa, apenas um recipiente vazio para depositar os conhecimentos originados, ou produzidos, em outro lugar, havendo uma confusão permanente “da significação da mensagem com o sentido do processo e o das práticas de comunicação, como também reduzindo o sentido destas práticas na vida das pessoas ao significado que veicula a mensagem” (PRATA, 2002, p. 2). Antes tratados apenas como meros consumidores de informação ou serviços, aos poucos os ouvintes começam a ser observados de maneira diferente pelos veículos e, principalmente, se fazem querer ser ouvidos. Hoje o receptor é visto como Prosumer, conceito criado pelo escrito Alvin Toffler, em que o usuário é encarado como produtor (producer, em inglês) e consumidor (consumer, em inglês) do conteúdo. As evoluções acompanharam os avanços tecnológicos. Para Braz e Meireles (2011, p. 2), quando “[...] o rádio passa a se fazer presente na internet, algumas de suas características passam por mudanças muito peculiares que outrora o definiam e agora já não se fazem presente, nem tampouco o definem”. Essas alterações acabam influenciando os ouvintes. Por se tratar de uma mídia massiva, ou seja, capaz de alcançar parcela significativa da população, a influência se torna ainda mais evidente, inclusive na linguagem.
  • 38. No rádio hertziano a linguagem utilizada é a oral, que atua em conjunto com os recursos sonoros. Para o entendimento da mensagem basta apenas o sentido da audição, não necessitando qualquer grau de instrução do ouvinte. Já na webradio, juntamente com a linguagem sonora, outras linguagens também se fazem presentes, como a textual e a imagética. Diferentemente do rádio com transmissão em ondas eletromagnéticas, as webradios ainda conservam um certo grau de exclusão, exigindo um mínimo de instrução para se compreender as mensagens textuais e até mesmo para se ter acesso ao endereço das emissoras da web (BRAZ E MEIRELES, 2011, p. 2). Desde os primeiros anos em que o rádio foi implantado já existia uma demanda por parte dos ouvintes de se comunicar com os profissionais das rádios, conceito que hoje chamamos de interatividade. Até pouco tempo atrás, esse relacionamento era realizado de forma mais lenta, através de cartas, telefonemas e telegramas. O rádio firmou-se como um meio interativo desde os seus primeiros anos de existência. Cartas, telegramas e telefonemas sempre foram a ponte de interação entre a produção dos programas radiofônicos e os ouvintes. Ao convergir com a internet, e tornar-se uma mídia digital, o caráter interativo do rádio ganha dimensões ainda maiores (BRAZ E MEIRELES, 2011, p. 3). O avanço da tecnologia colocou diversas plataformas à disposição dos ouvintes – agora chamados de usuários –, que começaram a alimentar os veículos com mensagens em áudio e vídeo e a utilizar largamente as redes sociais, como Twitter e Facebook, para enviar recados para o programa, tudo com muito mais velocidade. Thompson (1998, p. 77) explica que “[...] os indivíduos se relacionavam entre si principalmente na aproximação e no intercâmbio de formas simbólicas, ou se ocupavam de outros tipos de ação dentro de um ambiente físico compartilhado”, culminando na existência de três situações interativas: ‘interação face a face’, ‘interação mediada’ e ‘quase interação mediada’. A interação face a face acontece num contexto de co-presença [...] e têm também um caráter dialógico, no sentido de que geralmente implicam ida e volta no fluxo de informação e comunicação, os receptores podem responder aos produtores, e estes são também receptores de mensagens que lhe são endereçadas pelos receptores de seus comentários. (THOMPSON, 1998, p.78.).
  • 39. Outro tipo de interação dialógica são as mediadas. [...] formas de interação tais como cartas, conversas telefônicas etc. As interações mediadas implicam o uso de um meio técnico (papel, fios elétricos, ondas eletromagnéticas etc.) que possibilitam a transmissão de informação e conteúdo simbólico para indivíduos situados remotamente no espaço, no tempo, ou em ambos. [...] Os participantes de uma interação mediada podem estar em contextos espaciais ou temporais distintos (THOMPSON, 1998, p.78.). Já as quase mediadas são estabelecidas através de meios de comunicação. [...] relações sociais estabelecidas pelos meios de comunicação de massa (livros, jornais, rádio, televisão etc.). [...] este terceiro tipo de interação implica uma extensa disponibilidade de informação e conteúdo simbólico no espaço e no tempo. [...] é monológica, isto é, o fluxo da comunicação é predominantemente de sentido único. O leitor de um livro, por exemplo, é principalmente o receptor de uma forma simbólica cujo remetente não exige (e geralmente não recebe) uma resposta direta e imediata (THOMPSON, 1998, p.78.). Primo (2008) diz que “[...] existem dois níveis de interação mediada por computador: interação reativa e interação mútua”. Segundo Braz e Meireles (2011, p. 5), “as interações reativas são aquelas que ocorrem entre o usuário e o sistema informático [...] os sistemas são fechados e se caracterizam por operarem na forma estímulo-resposta”. [...] quando o indivíduo seleciona essa ou aquela função o sistema informático já tem a resposta predefinida. Se o usuário selecionar a mesma função, obterá a mesma resposta. Outra característica desse tipo de interação é a linearidade, visto que só quem codifica a mensagem é o webdesigner. Não podemos nos esquecer que é devido a essa relação linear e unilateral que o sistema é fechado (BRAZ E MEIRELES, 2011, p.5). Já as interações mútuas são o oposto. Ainda de acordo com Braz e Meireles (2011, p. 5), neste tipo de interação o “[...] sistema é aberto e vale-se das trocas de conteúdo entre os
  • 40. indivíduos, que se dá de forma dinâmica e sempre em desenvolvimento. Os agentes são ativos e criativos, por isso, interagem”. Entretanto, elas ressaltam que as duas podem funcionar simultaneamente. A existência de um nível interativo não exclui a existência do outro. O que queremos destacar aqui é que a interatividade pode ocorrer nesses dois níveis simultaneamente. Para que um internauta tenha acesso a uma sala de bate papo virtual, para iniciar um diálogo com outro internauta, ele deve interagir com o mouse, com o teclado ao mesmo tempo em que interage com o software e também com a outra pessoa que está no bate-papo (BRAZ E MEIRELES, 2011, p. 5 e 6). A internet intensificou essa interação. Para Recuero, este meio de comunicação “[...] amplificou a capacidade de conexão, permitindo que redes fossem criadas e expressas nesses espaços: as redes sociais mediadas pelo computador”. De acordo com Braz e Meireles (2011, p. 6), essas redes “[...] tornaram-se mais uma fonte de interação e de estreitamento da relação entre produção e audiência que muitas mídias, tanto as analógicas quanto as digitais, utilizam desse mecanismo para fomentar a interatividade com o seu público-alvo”.
  • 41. 3 HISTÓRIAS QUE SE CONFUNDEM 3.1 FUTEBOL: ESTRANGEIRICES ENTRAM, SIM, NA TERRA DO ESPINHO O futebol, como é conhecido atualmente, foi criado apenas em 1846, na Inglaterra, quando foram definidas regras distintas para a prática do football, que passou a ser jogado com os pés – com exceção do goleiro (goalkeeper, em inglês), que pode utilizar as mãos –, e do rugby, que permaneceu sendo disputado com as mãos. Até então, ambos os esportes eram semelhantes, com diferenciações apenas nas escolas em que eram praticados. Essas regulamentações, porém, só haviam sido estipuladas nas escolas de elite, sendo que o football também era praticado pela classe operária e, sem regras, era bastante violento, provocando a ausência dos operários e, consequentemente, a perda de lucro pelas empresas. Desta forma, fez-se necessário estender as Regras de Cambridge.4 Era preciso, assim como foi feito nas escolas, regulamentar esses jogos, para torná-los menos violentos e trazê-los para dentro da esfera do controle do Estado. Tal regulamentação do Football foi expandida, com a ajuda do Estado, para toda a sociedade inglesa. A classe burguesa industrial triunfou, e suas regulamentações esportivas se massificaram, tornado o futebol em um esporte de massa (ANTUNES DE LIMA, 2002, p. 6). Em 1863 foi criada, também na Inglaterra, a Football Association (FA), primeira associação de futebol de todo o mundo, que desenvolveu e universalizou as regras oficiais do esporte. Foi então definido que os jogos de futebol seriam disputados em datas especificadas pela FA, que, desta forma, teria controle sobre a prática do esporte. Os confrontos passaram a ser disputados nos sábados à tarde, dia de folga dos operários. 4 Criada em outubro de 1948, no Trinity College, em Cambridge, Reino Unido.
  • 42. Assim, num curtíssimo espaço de tempo, o futebol conquistou por completo toda a população trabalhadora inglesa e, em breve, conquistaria a do mundo inteiro. Como entender esse frenesi, esse poder irresistível de sedução, essa difusão epidêmica inelutável? Como vimos, parte da explicação está nas cidades, parte no próprio futebol. A extraordinária expansão das cidades se deu, como vimos, a partir da Revolução Científico-Tecnológica, pela multiplicação acelerada da massa trabalhadora que para elas acorreu em sucessivas e gigantescas ondas migratórias. Nas metrópoles assim surgidas, ninguém tinha raízes ou tradições, todos vinham de diferentes partes do território nacional ou do mundo. Na sua busca de novos traços de identidade e de solidariedade coletiva, de novas bases emocionais de coesão que substituíssem as comunidades e os laços de parentesco que cada um deixou ao emigrar, essas pessoas se vêem atraídas, dragadas para a paixão futebolística que imana estranhos, os faz comungarem ideais, objetivos e sonhos, consolida gigantescas famílias vestindo as mesmas cores (SEVCENKO, 1994, p. 35). Embora existam indícios de que o futebol já era praticado no Brasil, o esporte, oficialmente, foi introduzido no país por Charles Miller, em 1894, que voltara da Inglaterra, onde passara dez anos estudando, trazendo uma bola e um conjunto de camisas. Ele ensinou a prática aos sócios do São Paulo Atletic Club. Três anos mais tarde, Oscar Cox, que retornara da Suíça trazendo a ideia de formar uma equipe profissional de futebol, tentou encontrar jovens dispostos a “comprar” a ideia. A meta só foi alcançada em 1901, no Rio Cricket Club, clube de Niterói-RJ fundado por George Cox, pai de Oscar. No que é considerado o jogo inaugural do Rio de Janeiro, Rio Cricket e Payssandu empataram em 1 a 1 após disputarem dois tempos de 20 minutos com 15 de intervalo. A primeira partida envolvendo equipes de dois diferentes estados do Brasil foi realizada no mesmo ano, em 19 de outubro, quando o Rio Team e o São Paulo Scratch Team também ficaram no empate, desta vez em 2 a 2, em partida que teve inicio às 4h55 da manhã e foi realizada no Estádio do Velódromo, que pertencia ao clube São Paulo Atletic e estava sendo inaugurado naquele dia (LANNA FERNANDEZ, 2010, p. 17). Segundo Lanna Fernandez (2010), em novembro de 1901, Oscar Cox e outros dois atletas do Rio Cricket, Mário Frias e C. Robinson, redigem um comunicado informando sobre uma reunião que trataria da fundação do primeiro clube criado especificamente para o futebol, o qual se chamaria Rio Football Club. Entretanto, essa ideia não vingaria rapidamente.
  • 43. Ainda de acordo com Lanna Fernandez (2010, p. 18), em julho de 1902 o inglês Mr. Machentock, que era o capitão da equipe, foi barrado por Cox de uma partida realizada em São Paulo e acabou se desligando do grupo. Ele então fundou, no dia 18 daquele mês, o Rio Football Club, que só aceitava atletas de origem inglesa. Ao tomar conhecimento da fundação do Rio Football Club, Cox decidiu fundar o Fluminense Football Club. Conforme trata Coelho Netto, “[...] o Fluminense foi o verdadeiro guia e modelo de todos os clubes cariocas. A ele se deve o desenvolvimento do Football (grifo do autor) no Rio de Janeiro. É uma sociedade que tanto vem trabalhando pelo aprimoramento moral e cultural da mocidade”. Mais tarde falaremos do Tricolor das Laranjeiras, alcunha pela qual o Fluminense é conhecido. Segundo o jornalista Paulo Vinícius Coelho (2011, p. 7), o escritor Graciliano Ramos, no início do século XX, fez o pior palpite da história do futebol ao afirmar que “Futebol não pega, tenho certeza; estrangeirices não entram facilmente na terra do espinho”. Graciliano não tinha nada contra o futebol, ele apenas acreditava que o esporte inglês não iria se firmar entre os brasileiros. Mas se firmou. Em 7 de maio de 1919, quatro dias antes do Campeonato Sul Americano daquele ano, realizado no Brasil, o jornal ‘A Rua’ fez a seguinte publicação, de acordo com (COELHO, 2011): “Antes do campeonato, o football aqui já era uma doença: agora é uma grande epidemia, a coqueluche da cidade, de que ninguém escapa”. Já no dia 11, data da estréia da Seleção Brasileira, foi a vez do ‘Rio Jornal’ estampar o torneio em suas páginas, ressaltando o apoio do Fluminense, que construiu com a própria renda um estádio para ser Sede da competição. Iniciou-se hoje, às 15 ½ horas, sob os melhores auspícios, o sensacional Terceiro Campeonato Sul-Americano de Football. Fazendo coincidir com esta temporada de “matches” internacionais, a festa de hoje teve ainda o seu brilho aumentado pela inauguração do stadium do Fluminense Football Club, o glorioso campeão tricolor brasileiro. A cerimônia de inauguração do stadium consistiu juntamente na inauguração do “match” internacional, para o qual foi construído o soberbo campo (COELHO, 2011). No dia 29 de maio, data de disputa da grande final da competição, em que o Brasil viria a se sagrar campeão com uma vitória de 1 a 0 sobre o Uruguai, com gol marcado por Friedenreich aos dois minutos do primeiro tempo da segunda prorrogação – atualmente só
  • 44. existe uma prorrogação e não havendo um vencedor a partida vai para a disputa de pênaltis –, o jornal ‘A noite’ estampou o triunfo brasileiro da seguinte forma. A concorrência, se não era colossal como a de domingo, era seletíssima, notadamente pelo número de senhoras. A animação, extraordinária desde 11 horas, tornou-se como poucas vezes tem acontecido ao aproximar-se a hora do jogo. Um alarido unânime atroava e nos morros vizinhos a multidão agitava bandeiras nacionais, por entre vivas. [...] O jogo de hoje era já de desempate e, assim, de graves responsabilidades para ambos os teams. [...] Brasileiros: Marcos, Píndaro e Bianco, Sergio, Amilcar e Fortes, Millon, Néco, Friedenreich, Heitor e Arnaldo. [...] 1º Half Time: Brasileiros 0 goal Uruguaios 0 goal – 2º Half Time: Brasileiros 0 goal Uruguaios 0 goal – Nova prorrogação: 1º goal brasileiro Hurrah! Friedenreich! Hurrah – Brasil! (...) Néco corre pela direita, centra, sendo a bola recebida de cabeça por Heitor, que a passa a Friedenreich. Este, com um shoot de meia altura, ao meio do poste, marca o 1º goal brasileiro. Hurrah! Friedenreich! Hurrah – Brasil! [...] Final: Brasileiros 1 goal Uruguaios 0 goal – Com este resultado foram os brasileiros aclamados campeões da América do Sul (COELHO, 2011) “Em 1925, o futebol já era o esporte nacional e faltavam apenas cinco anos para o início da primeira Copa do Mundo. O Brasil havia sido bicampeão sul americano em 1919 e 1922, mas o profissionalismo só chegaria ao país oito anos mais tarde” (Coelho, 2011, p. 11). Este trecho faz referência ao não pagamento de salários aos jogadores que representavam os clubes de futebol, o que viria a acontecer em 1933. Quando o futebol se tornou profissional e os atletas começaram a receber salários, muitos clubes que até então eram de elite deixaram de praticar o esporte, “a exemplo do Clube Atlético Paulistano, maior campeão do período do amadorismo no futebol paulista, com 11 títulos” (ANTUNES DE LIMA, 2002, p.12). Alguns clubes formados em várzea pelos operários das fábricas, entretanto, resistem até hoje, como o carioca Bangu e os paulistanos Corinthians e Palmeiras (ex-Palestra Itália). Entre as equipes de elite, a única que continua existindo é a do Fluminense, que, coincidentemente, foi o primeiro clube nacional dedicado prioritariamente ao futebol, seguido pelo mesmo Bangu, além do América e do Botafogo. O futebol brasileiro move, nos dias de hoje, bilhões de reais, entre investimentos em salários de jogadores, pagamento de prêmios de assinatura de contrato e compra dos direitos econômicos sobre os atletas, patrocínios em uniforme, fornecedores de material esportivo, venda dos direitos de transmissão para meios de comunicação, receitas de público etc.
  • 45. O rádio, que diferentemente de outros meios de comunicação não é obrigado a pagar pelos direitos de transmissão das partidas, também realiza essas transmissões. Lógico, dentro das próprias características dos veículos, lidando com o imaginário e a emoção dos torcedores, fatores que serão expostos a seguir.
  • 46. 3.2 IMPARCIALIDADE E EMOÇÃO: OS ASPECTOS COMPORTAMENTAIS DOS PROFISSIONAIS É comum observar alguns pais comprando roupas e acessórios do clube do coração para o filho que ainda está na barriga da mãe e, muitas das vezes, sonhando com o dia em que levará o herdeiro ao estádio para ver o time ser campeão. Por esses e outros comportamentos, fica evidente que esporte envolve paixão, principalmente quando se trata de futebol, que para muitos dos brasileiros é encarada como algo superior às próprias crenças. Baseamos nossa lealdade e fidelidade, valores importantíssimos no campo da identidade política e religiosa, em coisa tão pouco séria como o esporte. Mais uma manifestação da nossa originalidade, autenticidade, criatividade, singularidade, particularidade, valores românticos dos quais fazemos parte (LOVISOLO, 2002, p. 13). Sendo assim, fica difícil separar esse sentimentalismo do cotidiano, inclusive quando se trabalha diretamente com futebol, não do lado de dentro das quatro linhas, mas do lado de fora, descrevendo as partidas para os ouvintes durante as transmissões de rádio de uma maneira que seja capaz de seduzir o ouvinte a manter-se “preso” à transmissão. O rádio é um veículo de comunicação de massa que apresenta o sentido midiático da alteridade, razão pela qual afirmamos que, ao produzir qualquer programa, o produtor deve ter em mente a noção de que vai dizer alguma coisa a alguém cujo conteúdo deve ser interessante, inteligível e que, sobremaneira, possa catalisar a atenção para aquilo que é comunicado (GOMES, 2006, p. 1). De acordo com Ortriwano (1985, p. 26), o “[...] rádio esportivo sempre foi muito participante, muito vibrante, gerando polêmicas, um dos setores mais opinativos de toda a programação”. E as opiniões dos especialistas são essenciais para deixar o ouvinte atento, interessado tanto nas partidas quanto nos fatores envolvidos nelas. Segundo César (2005, p. 7), “é impossível fazer rádio sem falar em emoção”.
  • 47. De Araújo (2007, p. 25) diz que “[...] o rádio passa a evocar o imaginário do ouvinte nas mais diversas situações. Em rádio, falar de fantasia não quer dizer falar em algo inverídico. O ouvinte de rádio é capaz de sintonizar não para fruir de uma mera transmissão, mas, está sintonizado simplesmente por gostar”. A criação de “imagens mentais” é tão poderosa, a ponto de ser muito mais emocionante ouvir uma partida pelo rádio do que assisti-la no próprio estádio. O torcedor vai ao estádio, mas leva seu “radinho” para saber que está acontecendo... Ou assiste a imagem na televisão, ouvindo a narração do rádio (ORTRIWANO, 1985, p.27). Na opinião de Gotschalg (2006, p. 16), torcedores, jornalistas esportivos e críticos de arte têm em comum a paixão pelo futebol como forma de arte. Para ele, “[...] isso quer dizer que mediante a emoção, eles se situam na perspectiva dos de dentro, ou seja, dos que pertencem ao campo de significados das obras que observam. E pra falar de arte ou esporte é preciso amá-los de alguma maneira”. As transmissões de rádio, no Brasil, começaram em 1922, mas as notícias de caráter esportivo, segundo Almeida e Micelli (2004), tiveram início apenas entre os anos 1929 e 1930, com informações curtas sobre as partidas realizadas no Rio de Janeiro e em São Paulo, devido ao pouco recurso à disposição dos profissionais. Há muitas divergências sobre quem teria sido o responsável pela primeira transmissão ao vivo de uma partida de futebol. Entre os possíveis “pais”, são citados Oduvaldo Cozzi, a emissora Record, e a mais plausível entre as suposições: Nicolau Tuma. Embora Ortriwano (1985) afirme que a primeira transmissão ao vivo de uma partida de futebol foi realizada por Tuma em 10 de fevereiro de 1932, Soares (1994, p. 21) defende que aconteceu no ano anterior, no duelo “[...] entre as seleções dos estados de São Paulo e Paraná”, narrado pelo próprio Tuma. Segundo de Araújo (2007, p. 27), Prado (2006) diz que “[...] as coberturas com emoção agradam mais o público brasileiro do que as do estilo europeu: frias. [...] emissoras como a CBN de São Paulo procuram investir em uma cobertura que se preocupa mais com o jornalismo do que com a emoção”. Entretanto, Prado reforça que “[...] esse novo tipo de narração começou há pouco tempo e não dá para se ter uma ideia se esse estilo vingará”.
  • 48. Não adianta inventar muito, o forte do esporte no Brasil é o futebol mesmo. Você até pode introduzir dropes (boletins curtinhos, de dois a três minutos) de informações sobre as demais modalidades de esporte, como basquete, tênis ou automobilismo. É uma boa idéia que enriquece a programação esportiva. Não espere, porém, retorno retumbante. O que dá audiência é a bola no pé (PRADO, 2006, p.42). Mas como tentar seu neutro em um ambiente recheado de emoções? Como não deixar transparecer a felicidade ou a raiva ao ver o time pelo qual torce ou o rival triunfar de maneira extraordinária ou sucumbir de forma ridícula? Por isso, Souza Neto (2008, p. 43) diz que “[...] o conceito de imparcialidade no jornalismo traz sempre uma discussão, principalmente na parte esportiva”. Jornalismo é tudo igual. Econômico, esportivo, policial, as regras básicas são sempre as mesmas. Ouvir todos os lados da questão, para checar cada informação, escrever com ética e clareza. Em uma frase se resume tudo. Ou quase. O jornalismo esportivo se atrapalha de vez em quando em um requisito básico da profissão, que é a imparcialidade. Como podemos praticar a imparcialidade se, no fundo, não somos imparciais? Porque, antes de mais nada, desconfie de repórter de futebol que diz não ter time. Se não tem, provavelmente não ama o esporte e talvez esteja sem emprego. (...) Todos torcemos, a dificuldade é separar a paixão que vem da infância da atividade diária. Os melhores conseguem, mas muita gente é condescendente demais quando se trata do próprio clube ou, como costuma acontecer, extremamente exigente. Temos um complicado exercício cotidiano para separar emoção de razão. (FILHO, 2008) Antes de apontar as características da Rádio Canal Fluminense, objeto de estudo desta pesquisa, e explicar como ela encara os aspectos de imparcialidade e emoção durante as transmissões, apresentamos um breve histórico do Fluminense Football Club, clube pioneiro no futebol do Brasil.
  • 49. 3.3 FLUMINENSE FOOTBALL CLUB: RETUMBANTE DE GLÓRIAS O Fluminense Football Club foi fundado no dia 21 de julho de 1902, na casa do atleta Horácio da Costa Santos, localizada na Rua Marquês de Abrantes, nº 21, no bairro do Flamengo, Zona Sul do Rio de Janeiro, por 20 sócios fundadores, todos da mais alta classe do estado, que foram escolhidos por convite. Segundo Lanna Fernandez (2010, p. 20), a origem do nome Fluminense deve-se ao hábito de, na época, todos os cariocas, independentemente de morarem na capital ou no interior, serem chamados, indistintamente, de fluminenses. Ainda de acordo com o autor, essa distinção “[...] só se estabeleceu depois de 1892, quando o Rio de Janeiro deixa de ser município neutro e passa a ser Distrito Federal [...] Após a lei, continuou o hábito de se usar o termo fluminense para os habitantes do Distrito Federal”. Nessa primeira assembléia, os associados também elegeram Oscar Cox como presidente e fundaram duas comissões, uma para arranjar um terreno para a prática do jogo e outra para a redação dos estatutos do novo clube. A primeira tentativa foi o aluguel de um terreno na Rua Dona Mariana em Botafogo, mas o aluguel era muito alto e eles desistiram. Outro local foi encontrado na Rua Guanabara (atual Pinheiro Machado), esquina do Roso (atual Coelho Netto), bem ao lado do Palácio Guanabara, antiga residência da Princesa Isabel. O terreno foi alugado ao Banco da República, em 17 de outubro de 1902, por 100$000. Dois anos depois, Eduardo Guinle comprou a casa dos fundos do terreno para transformá-la em sede, além de todo o terreno em volta do campo para ampliar o clube. Nesse momento o clube contava com cerca de 30 sócios que pagavam uma mensalidade de 5$000, correspondente à compra de um sapato, com uma arrecadação total de 150$000. Esse dinheiro só bancava as despesas de manutenção do clube. Quando havia necessidade de gastos extras, como compra de bolas ou para levantar um barracão para servir de vestiários, abria-se um subscrição que, nesse caso, chegou a 25$000 (LANNA FERNANDEZ, 2010, p. 21). Em reunião realizada no dia 17 de outubro de 1902, no clube das Laranjeiras, foi definido o uniforme oficial do Fluminense: camisas em tonalidades cinza e branco, metade de cada cor, shorts branco e meias pretas. O escudo tinha as iniciais “F.F.C.” bordadas em vermelho.
  • 50. Depois da fundação, da escolha do campo e do seu primeiro uniforme, o Fluminense enfrentou o seu primeiro adversário no campo do Paysandu Cricket Club, no dia 19 de outubro de 1902. O jogo foi contra o Rio Football Club e o placar foi um acachapante 8 x 0 para o Fluminense, com gols de Horácio da Costa Santos (3), Heráclito de Vasconcellos (2), Félix Frias, Eurico de Moraes e Simonsen (1). O time foi: Américo Couto; M. Frias e V. Etchegaray (cap.); Mário Rocha , Oscar Cox e W. Schuback; A. Simonsen ; E. Moraes; Costa Santos , H. Vasconcellos e F. Frias. Sendo que o primeiro gol da história do Fluminense foi marcado por Horácio da Costa Santos5 . Quadro 1 – Súmula de Fluminense Football Club 8 x 0 Rio Football Club Fonte: Flu Memória No mesmo ano, o Fluminense formou uma equipe de atletismo para disputar, a convite do Rio Cricket, os jogos comemorativos da coroação do Rei Eduardo VII da Inglaterra. Victor Etchegaray, que era capitão do time de futebol, foi o destaque do clube, conseguindo o primeiro lugar na prova eliminatória de 100 jardas e ficando com o segundo lugar na prova final. Em 1903 o Fluminense, mais uma vez, é pioneiro no futebol, ao alavancar a rivalidade entre cariocas e paulistas. Em série de três amistosos, empatou em 0 x 0 com o Internacional- 5 Disponível em < http://www.canalfluminense.com.br/historia >. Acesso em: 30/10/2011.
  • 51. SP, venceu o Paulistano, de Charles Miller, por 2 a 1, e atropelou o São Paulo Athletic, campeão paulista daquele ano, por 3 a 0. Em 15 de julho de 1904, ocorreu a mudança que viria a caracterizar os atletas do Flu como “sportsmen tricolores”. De acordo com o historiador Marcel Cezar, o uniforme nas cores cinza e branco eram de rara fabricação em Londres, na Inglaterra, onde eram comprados. Foi então que Oscar Cox e Mário Rocha, que estavam na cidade londrina, viram uma camisa nas cores verde, branco e encarnado, encaminhando uma correspondência aos sócios do clube, no Rio de Janeiro, sugerindo a mudança. A proposta foi colocada em votação e aceita por unanimidade. Na despedida do uniforme cinza e branco, goleada do Fluminense sobre o Rio Cricket: 4 x 0. Em 1905, o Fluminense tentou a criação de uma liga estadual, mas não obteve sucesso pela demora dos rivais em responder a ideia. Então disputou alguns amistosos, goleando o Rio Cricket por 7 x 1, o F. G. Athletic Club por 10 x 0 e o Botafogo de Futebol e Regatas, um de seus principais rivais na atualidade, por 6 x 0, no primeiro confronto entre os clubes. No ano seguinte o Fluminense se sagrou o primeiro campeão do Campeonato Carioca de Futebol. Em dez jogos, venceu nove e perdeu apenas 1, totalizando 52 gols marcados e apenas seis sofridos. Teve ainda o artilheiro do torneio: Horácio da Costa Santos, que marcou 18 gols, inclusive o primeiro do Estadual, na vitória de 7 x 1 sobre o Paysandu Cricket, em 3 de maio, nas Laranjeiras. Em 1907, o Fluminense novamente venceu o campeonato do estado, mas o Botafogo não respeitou o regulamento do torneio, que previa, em caso de igualdade de pontos entre as equipes, a conquista da taça pelo time que tivesse mais saldo de gols, e exigia a disputa de uma partida extra. O Fluminense se negou, pois era o campeão de direito, e desligou-se da Liga Metropolitana de Sports Atléticos. Com a saída do seu principal filiado, a Liga foi extinta. Nos dois anos seguintes, 1908 e 1909, em ambos o Fluminense foi campeão invicto do Estadual, ou seja, sem sofrer nenhum revés. Ao todo, durante a campanha do Tetracampeonato, foram disputados 39 jogos, com 33 vitórias, quatro empates e apenas duas derrotas. Em 1910, o primeiro confronto internacional dos “sportsmen” tricolores. O clube patrocinou a vinda do Corinthians de Londres, maior time da Inglaterra, para três amistosos. O Flu abriu o placar aos 15 segundos, gol de Oswaldo Gomes, mas sofreu impiedosa virada:
  • 52. 10 x 1. Dois anos depois, o episódio que culminou na fundação do futebol do Clube de Regatas do Flamengo, outro rival do Fluminense na atualidade. Em julho, Ernesto Paranhos e Haroldo Cox foram demitidos. Os substitutos naturais seriam Oswaldo Gomes e Alair Antunes, mas após uma série de divergências, Oswaldo recusou o posto e, em 7 de agosto, enviou carta à diretoria do clube comunicando sobre a saída dele do quadro de sub-capitão, às vésperar do jogo contra o Rio Cricket. A Comissão escalou o seguinte quadro: Baena, Píndaro e Nery, Lawrence, Amarante e Galo; Oswaldo, Orlando, Paranhos, Gustavo e Calvert. Alberto Borgerth porém sugeriu, com apoio da maioria, que os jogadores fossem consultados sobre a escalação do quadro. Afonso de Castro, voto vencido, bateu-se contra a sugestão, ponderando que isso constituiria um mau precedente, pois transferiria para os jogadores as atribuições do Gound Committee. Com a exceção de Oswaldo Gomes e James Calvert, os demais jogadores se pronunciaram pela substituição de Oswaldo por Arnaldo Guimarães e Paranhos por Borgerth, mas o Ground Committee manteve o conjunto escalado contra o voto de Borgerth que estava de acordo com a opinião da maioria dos jogadores. O quadro escolhido pelo Committee venceu o jogo por 5 x 0... A 3 de outubro, entretanto, Alberto Borgerth, Othon Baena, Píndaro de Carvalho Rodrigues, Emmanuel Nery, Ernesto Amarante, Armando de Almeida (Galo), Orlando Mattos, Gustavo de Carvalho e Lawrence Andrews solicitaram demissão do Club. O Fluminense perdeu 9 dos seus 11 jogadores campeões do ano, mas seus princípios foram mantidos (História do Fluminense, Tomo I, Paulo Coelho Netto). No dia 7 de julho de 1912, com elenco completamente renovado e apenas dois remanescentes do time campeão invicto de 1911, o Fluminense enfrentaria seus dissidentes pela primeira vez. Edward Calvert abriu o placar para o time das Laranjeiras logo no primeiro minuto. Arnaldo empatou aos quatro e assim o jogo prosseguiu até o intervalo. Aos 17 da segunda etapa, James Calvert, um dos que permaneceram no Flu, recolocou a equipe na frente, mas a vantagem durou apenas 13 minutos – Píndaro fez para o Fla. O gol que coroaria a honra tricolor veio aos 32, quando Bartholomeu aproveitou lançamento de James Calvert e deu a vitória ao Fluminense. A primeira Seleção Brasileira de Futebol, formada em 1914, também conta com dois atletas do Fluminense entre os convocados: Marcos Carneiro de Mendonça, goleiro de apenas 19 anos, e Oswaldo Gomes, autor do primeiro gol da história da Seleção, na vitória de 2 x 0 sobre o inglês Exeter City.
  • 53. Outro dado marcante de 1914 é o episódio que resulta no apelido do Fluminense. Carlos Alberto, um dos atletas oriundos do América, era um jogador muito habilidoso, mas que não dispunha das características quase que obrigatórias para os padrões tricolores da época: ser branco, de família tradicional e educado. Mulato e de origem humilde, Carlos Alberto ganhou espaço no 1º quadro tricolor pelo seu bom futebol. Mas tinha receio da reação da torcida no tocante a sua cor. Por isso, teve a ideia de passar pó-de- arroz pelo corpo para tentar disfarçá-la. O que Carlos Alberto não imaginava é que, com o decorrer da partida, quanto mais se esforçava, mais o suor tirava o pó-de-arroz, vindo à tona a sua cor natural. Pobre Carlos Alberto! E logo contra o América, seu ex-clube! A torcida americana percebeu o truque e, de maneira pejorativa, atribuiu o apelido de Pó-de-arroz aos tricolores. Se para os americanos, o apelido era uma afronta ao Fluminense, para o resto da cidade o apelido soou como a mais perfeita descrição do aristocrático clube das Laranjeiras.6 Em 1919, a pedido da prefeitura do Rio de Janeiro, cidade-sede do Sul-Americano de Seleções daquele ano, o Fluminense constrói, com o próprio dinheiro, o Estádio das Laranjeiras, primeiro estádio de futebol do Brasil, com capacidade para 18 mil pessoas. Três anos mais tarde, com o Rio novamente selecionado como sede do torneio, o Flu ampliou o estádio, que passaria a comportar público de 25 mil pessoas. Para isso, teve de hipotecar a própria sede para financiar os custos com a construção. No ano de 1949, o Fluminense recebeu, por unanimidade de votos, o troféu máximo do esporte, a Taça Olímpica, que foi instituída pelo Barão Pierre de Coubertin com o objetivo de premiar o órgão esportivo que mais contribuiu para o olimpismo, além de ser organizado e comprometido com o esporte em geral. Sempre pioneiro, o Fluminense, introdutor do futebol no Rio de Janeiro, foi o clube que lançou as bases do esporte nacional, projetando e organizando os esportes olímpicos. O Tricolor deu à sociedade a oportunidade de praticar esportes até então desconhecidos e praticados somente fora do país, como vôlei, basquete, futebol e water pólo. Construiu o primeiro estádio de futebol, a primeira pista de atletismo, a primeira piscina coberta do país e o primeiro ginásio poli-esportivo, capaz de abrigar apresentações esportivas e artísticas. O Fluminense serviu de modelo para as agremiações esportivas da América do Sul e este feito foi reconhecido no dia 28 de abril, quando foi 6 Disponível em < http://www.canalfluminense.com.br/historia >. Acesso em: 30/10/2011.
  • 54. conferida ao Fluminense Football Club a Taça Olímpica de 1949 por unanimidade.7 Três anos depois, em 1952, no ano em que completava 50 anos de fundação, o Fluminense se sagrou campeão Mundial de Clubes. De forma invicta – 5 vitórias e 2 empates em 7 jogos –, o Tricolor das Laranjeiras superou Sporting, de Portugal, Grasshopper, da Suíça, e Peñarol, do Uruguai, na primeira fase, Áustria Viena, da Áustria, na semifinal, e Corinthians, do Brasil, na grande decisão, para ficar com a taça. Em 1970, o Flu conquistou o Campeonato Brasileiro, competição que viria a ganhar novamente em 1984. Na década de 1990, o Flu acumulou sucessivos rebaixamentos, sendo um deles revogado após divulgação do escândalo Ivens Mendes, que consistia em um esquema de corrupção na CBF para que alguns árbitros influenciassem no resultado dos jogos. Outra “virada de mesa” também é erradamente atribuída ao Fluminense. Em 2000, impedida de realizar o Campeonato Brasileiro por estar em litígio judicial com o Gama-DF, a CBF transfere a função de organizador do torneio para o Clube dos 13. Com isso, Fluminense, Bahia, Juventude e América-MG são incluídos no Brasileirão, da mesma forma que Corinthians e Santa Cruz acabaram não sendo rebaixados naquele ano. Superada esta fase, o Flu volta a se consolidar como uma das principais forças nacionais a partir do ano de 2007, quando levantou o troféu da Copa do Brasil. Em 2008, foi vice-campeão da Taça Libertadores, principal torneio da América do Sul, e no ano seguinte alcançou a mesma posição na Copa Sul-Americana, segunda competição mais importante do continente. Em 2010, liderado pelo apoiador argentino Darío Conca, que disputou todos os 38 jogos da competição, o Fluminense voltou a conquistar o Campeonato Brasileiro, com uma campanha de 20 vitórias, 11 empates e apenas sete derrotas. Marcando, no total, 68 gols e sofrendo 36, o que credenciou o clube como a defesa menos vazada do Brasileirão. 7 Disponível em < http://www.canalfluminense.com.br/historia >. Acesso em: 30/10/2011.
  • 55. 3.4 RÁDIO CANAL FLUMINENSE: A PROPOSTA DA SEGMENTAÇÃO O Canal Fluminense era um canal de bate papo entre torcedores do clube no programa mIRC, em 2001. Percebendo a “força” do nome para um veículo de comunicação, o jornalista Gabriel Peres então decidiu criar um site para unir o útil ao agradável: produzir conteúdo jornalístico para um pequeno, mas fiel, público e colocar em prática o desejo de fazer a cobertura do time pelo qual torcia. Em entrevista concedida por ele a um programa de TV acadêmico na Universidade Estácio de Sá, Gabriel ratificou que a estrutura do site era realmente “muito pequena e experimental”. Após período de testes que durou todo o ano de 2002, o Canal Fluminense começou a se estabelecer como veículo informativo a partir de 2003, quando criou a primeira equipe de jornalistas para fazer a cobertura das notícias do Fluminense para o Campeonato Carioca daquele. O primeiro furo veio ainda durante a fase de testes, em 2002, quando noticiou as contratações do atacante Romário e do apoiador Beto. Segundo Gabriel Peres, “ninguém acreditou na notícia, mas este acontecimento serviu para percebermos que poderíamos tratar aquele site, que no início lidávamos de forma despretensiosa, de uma maneira séria”. Foi aí que o Canal Fluminense passou a ir ao clube diariamente para realizar a cobertura dos acontecimentos no Tricolor e, além disso, adquiriu uma câmera digital, que possibilitou a veiculação de imagens feitas pela equipe e reduziu os custos de manutenção do site. Comprovada a seriedade do trabalho, conseguiu credenciar um jornalista e um estudante de jornalismo junto a ACERJ (Associação dos Cronistas do Estado do Rio de Janeiro), que controla o trabalho dos jornalistas e radialistas em praças esportivas. Conseguimos, aos poucos, a tirar aquela imagem de ‘Que site é esse? Isso é site de clube? Coisa de garoto... de criança... será que isso é sério?’ Nós lutamos muito tempo para termos credibilidade perante os usuários, que eram torcedores querendo notícias. A forma de conquistarmos essa confiança era desenvolver o trabalho de forma que o torcedor entrasse no site e visse que ali tinha um conteúdo informativo, com uma linguagem jornalística. Não era uma brincadeira, apesar de que na internet nós podemos ver muitas mentiras, principalmente em fóruns.