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O BNDES e o mercado de capitais
Edição n 6/2023
A relação entre o BNDES e o mercado de capitais é frequentemente abordada na mídia
de forma antagônica, como se um fosse totalmente substituto do outro. Na visão de
muitos analistas, a substituição do BNDES pelo mercado de capitais seria positiva,
sobretudo em termos alocativos.1
A fim de aprofundar e qualificar esse debate,
chamando atenção para problemas muitas vezes ignorados, o BNDES publicou
recentemente o Texto para Discussão nº 153, intitulado “O BNDES e o mercado de
capitais: esclarecimentos para o debate público no Brasil”. O objetivo desta edição dos
Estudos Especiais do BNDES é abordar de maneira mais concisa alguns dos pontos
desenvolvidos no Texto para Discussão, além de realizar uma breve atualização do
cenário para os primeiros meses de 2023.
Um primeiro aspecto a ser abordado refere-se ao comportamento distinto entre o
BNDES e o mercado de capitais em períodos de crise. Em momentos de estresse dos
mercados, ambos costumam caminhar em direções opostas.
No mercado de capitais, a volatilidade no preço dos ativos pode contaminar as emissões
primárias, dificultando o alongamento de dívidas e a colocação de novos papéis, o que
ocorreu, por exemplo, no início da pandemia de Covid-19, e voltou a ser observado nos
primeiros meses de 2023.
Dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiros e de Capitais
(Anbima) indicam que o volume de emissões da totalidade de instrumentos de mercado
de capitais (renda fixa, renda variável e instrumentos híbridos)2
no período jan-ago/2023
foi 36% inferior ao do mesmo período de 2022. A elevação do grau de aversão a risco
proveniente do episódio “Americanas”3
e de outras grandes empresas, parece ter
contaminado o mercado de capitais, que teve forte redução em suas emissões a partir
de fevereiro de 2023.
1 Ver, por exemplo Machado (2022), Carrasco e Freitas (2022) e Mendes (2023).
2 Como instrumentos de Renda Fixa, consideram-se: i) Debêntures; ii) Notas Comerciais; iii)
Notas Promissórias; iv) Letras Financeiras (LFs); v) Certificado de Recebíveis (CRs); vi)
Certificado de Recebíveis do Agronegócio (CRAs); vii) Certificado de Recebíveis Imobiliários
(CRIs); e viii) Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FDICs). Como instrumentos de
renda variável consideram-se: i) oferta públicas primárias de ações (IPOs); e ii) ofertas
subsequentes de ações (Follow Ons). Como instrumentos híbridos consideram-se: i) Fundos de
Investimento do Agronegócio (FIAGRO); e ii) Fundos de Investimento Imobiliários (FIIs).
3 Em janeiro de 2023 a Americanas informou ter encontrado "inconsistências contábeis" de R$
20 bilhões nos balanços de 2022 e de anos anteriores, gerando forte contração das linhas de
antecipação de recebíveis no sistema bancário.
2
Na abertura por instrumento, que pode ser verificada no Gráfico 1, é possível perceber
uma contração disseminada nos volumes emitidos, com exceção de instrumentos
híbridos (FIAGRO e FII). Chama atenção o fato de que desde janeiro de 2022 não
ocorreram novas emissões primárias de ações (IPOs), evidenciando que as empresas
não enxergaram, ao longo do último ano e meio, janelas de oportunidade para abertura
de capital.
Gráfico 1: Emissões via mercado de capitais por instrumento (R$ bilhões)
Fonte: Elaboração própria a partir de dados da Anbima.
Já no BNDES, observa-se um movimento bem diferente. No período jan-ago/2023 as
consultas das empresas ao Banco, que refletem as intenções de busca por
financiamentos, atingiu R$ 183,6 bilhões, o que representa um crescimento de 111%
frente ao mesmo período de 2022 (Gráfico 2). Nos últimos 12 meses, encerrados em
ago/2023, as consultas atingiram R$ 241 bilhões, o maior valor desde o fim de 2014. O
crescimento das consultas não necessariamente se refletirá em aumento de
contratações e desembolsos, mas mantém aberta a possibilidade de uma alternativa de
funding para as empresas em um momento de elevação da aversão ao risco no mercado
de capitais. Portanto, BNDES e mercados de capitais têm comportamentos díspares em
momentos de estresse financeiro.
Gráfico 2: Consultas ao BNDES (R$ bilhões)
Fonte: Elaboração própria.
3
Um segundo aspecto que merece destaque é a diferença de destinação dada aos
recursos captados via mercado de capitais e àqueles captados via BNDES. Enquanto o
crédito do Banco financia, majoritariamente, o investimento produtivo, que aumenta o
estoque de capital da economia, os recursos do mercado de capitais se destinam, em
grande parte, a capital de giro e refinanciamento de passivo das companhias. Isso não
significa diminuir a relevância desses outros usos, especialmente por permitirem às
grandes empresas brasileiras gerenciar seus níveis de fragilidade financeira com maior
flexibilidade. No entanto, é preciso pontuar que o BNDES atua em um lócus distinto.
No acumulado até agosto de 2023, algo como 2/3 (66%) das emissões de debêntures
(principal instrumento de mercado de capitais) continuaram a apresentar como maior
destinação refinanciamento de passivo, capital de giro ou recompra/resgate de emissão
anterior (Gráfico 3). Já as consultas ao BNDES, nessa mesma base de comparação,
foram majoritariamente destinadas aos setores de infraestrutura e indústria (R$ 126
bilhões ou quase 70% das intenções de financiamento).
Gráfico 3: Destinação dos recursos captados via emissão de debêntures (em %)
Fonte: Elaboração própria com base em dados da Anbima.
Há, porém, um agravante. Até mesmo parcela do mercado de capitais destinada ao
financiamento de longo prazo no Brasil – composta pela emissão de debêntures
incentivadas de infraestrutura (via Lei 12.431 Art.2), ampliando, em complementaridade
com o BNDES, as fontes de funding para investimentos em infraestrutura – tem
apresentado desempenho inferior ao verificado no último ano. O volume emitido foi de
R$ 21,7 bilhões, 16% inferior ao mesmo período de 2022. O número de operações teve
redução de 46%, com a realização de apenas 33 emissões. Essas debêntures contam
com incentivos tributários e, portanto, envolvem renúncias fiscais.4
Além disso, não há
sistemática de avaliação de impacto desses subsídios.
4 Para uma análise acerca do repasse dos incentivos tributários das debêntures incentivadas,
ver Pereira e Miterhof (2019) e (2021).
4
Gráfico 4: Emissões de debêntures 12.431 Art.2 (volume em R$ bilhões e número de
operações)
Fonte: Elaboração própria com base em dados da Anbima.
No mesmo período de jan-ago 2023, o volume de desembolsos do BNDES para o setor
de infraestrutura foi de R$ 25 bilhões. Já o volume de consultas para o setor atingiu
cerca de R$ 93 bilhões, um crescimento de 163% frente ao mesmo período de 2022.
Enfrentando uma maior restrição de liquidez nos mercados ao longo de 2023, empresas
que possuem acesso ao mercado de capitais realizaram consultas ao BNDES acerca
da possibilidade de financiamento.
Por fim, um terceiro aspecto, não menos relevante, é que o BNDES é um agente
importante para o desenvolvimento do mercado de capitais doméstico. Apenas em
2023, com dados até agosto, o apoio do BNDES à aquisição de debêntures incentivadas
atingiu valores superiores a R$ 7,3 bilhões (cerca de 33% das emissões). Além de
adquirir esses papéis como forma de apoio financeiro às empresas, o BNDES tem
atuado como agente estruturador de tais emissões. Dessa forma, contribui não apenas
para o sucesso na atração de investidores, por meio da prestação de garantia firme,
como contribui para ancorar as emissões e dar liquidez ao mercado. Assim, a presença
do BNDES no mercado de capitais oferece maior segurança para que outros players
também participem das operações, alavancando, dessa forma, o mercado.
Nesse sentido o BNDES participou, recentemente, das duas maiores emissões da
história do mercado de debêntures de infraestrutura do país: i) Iguá, em junho de 2023:
oferta pública de R$ 3,8 bilhões, com o BNDES subscrevendo 47% do total (R$ 1,8
bilhão); e ii) Aegea, em agosto de 2023: oferta pública de R$ 5,5 bilhões, com o BNDES
subscrevendo 35% desse valor (R$ 1,9 bilhão).
Reafirmamos, portanto, que o BNDES pode e deve coexistir com um mercado de
capitais dinâmico para assegurar a funcionalidade do sistema financeiro ao
desenvolvimento econômico do país.
Referências
Barboza, R et al. O BNDES e o mercado de capitais: esclarecimentos para o debate
público no Brasil. [Rio de Janeiro: Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e
Social], 2023. 23 p. (Textos para discussão; 153).
5
Carrasco, V; Freitas, G. Crédito direcionado e produtividade: o psi como exemplo. In:
MENDES, Marcos (org.). Para não esquecer: políticas que empobrecem o Brasil. Rio de
Janeiro: Autografia, 2022.
Machado, C. O BNDES e o desenvolvimento do mercado de capitais. Folha de S. Paulo,
São Paulo, 20 dez. 2022.
Mendes, M. O BNDES, de novo. Folha de S. Paulo, São Paulo, 7 abr. 2023.
Pereira, T. R; Miterhof, M. T. Debêntures de infraestrutura: qual fração do custo fiscal é
transferida aos projetos? [Rio de Janeiro: Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social], 2019. 40 p. (Textos para discussão; 143).
Pereira, T. R; Miterhof, M. T. Uma nota sobre a eficiência fiscal das debêntures
incentivadas em infraestrutura no Brasil. Revista Brasileira de Economia, Rio de Janeiro,
v. 75, n. 2, p. 245-265, 2021.

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  • 1. 1 O BNDES e o mercado de capitais Edição n 6/2023 A relação entre o BNDES e o mercado de capitais é frequentemente abordada na mídia de forma antagônica, como se um fosse totalmente substituto do outro. Na visão de muitos analistas, a substituição do BNDES pelo mercado de capitais seria positiva, sobretudo em termos alocativos.1 A fim de aprofundar e qualificar esse debate, chamando atenção para problemas muitas vezes ignorados, o BNDES publicou recentemente o Texto para Discussão nº 153, intitulado “O BNDES e o mercado de capitais: esclarecimentos para o debate público no Brasil”. O objetivo desta edição dos Estudos Especiais do BNDES é abordar de maneira mais concisa alguns dos pontos desenvolvidos no Texto para Discussão, além de realizar uma breve atualização do cenário para os primeiros meses de 2023. Um primeiro aspecto a ser abordado refere-se ao comportamento distinto entre o BNDES e o mercado de capitais em períodos de crise. Em momentos de estresse dos mercados, ambos costumam caminhar em direções opostas. No mercado de capitais, a volatilidade no preço dos ativos pode contaminar as emissões primárias, dificultando o alongamento de dívidas e a colocação de novos papéis, o que ocorreu, por exemplo, no início da pandemia de Covid-19, e voltou a ser observado nos primeiros meses de 2023. Dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiros e de Capitais (Anbima) indicam que o volume de emissões da totalidade de instrumentos de mercado de capitais (renda fixa, renda variável e instrumentos híbridos)2 no período jan-ago/2023 foi 36% inferior ao do mesmo período de 2022. A elevação do grau de aversão a risco proveniente do episódio “Americanas”3 e de outras grandes empresas, parece ter contaminado o mercado de capitais, que teve forte redução em suas emissões a partir de fevereiro de 2023. 1 Ver, por exemplo Machado (2022), Carrasco e Freitas (2022) e Mendes (2023). 2 Como instrumentos de Renda Fixa, consideram-se: i) Debêntures; ii) Notas Comerciais; iii) Notas Promissórias; iv) Letras Financeiras (LFs); v) Certificado de Recebíveis (CRs); vi) Certificado de Recebíveis do Agronegócio (CRAs); vii) Certificado de Recebíveis Imobiliários (CRIs); e viii) Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FDICs). Como instrumentos de renda variável consideram-se: i) oferta públicas primárias de ações (IPOs); e ii) ofertas subsequentes de ações (Follow Ons). Como instrumentos híbridos consideram-se: i) Fundos de Investimento do Agronegócio (FIAGRO); e ii) Fundos de Investimento Imobiliários (FIIs). 3 Em janeiro de 2023 a Americanas informou ter encontrado "inconsistências contábeis" de R$ 20 bilhões nos balanços de 2022 e de anos anteriores, gerando forte contração das linhas de antecipação de recebíveis no sistema bancário.
  • 2. 2 Na abertura por instrumento, que pode ser verificada no Gráfico 1, é possível perceber uma contração disseminada nos volumes emitidos, com exceção de instrumentos híbridos (FIAGRO e FII). Chama atenção o fato de que desde janeiro de 2022 não ocorreram novas emissões primárias de ações (IPOs), evidenciando que as empresas não enxergaram, ao longo do último ano e meio, janelas de oportunidade para abertura de capital. Gráfico 1: Emissões via mercado de capitais por instrumento (R$ bilhões) Fonte: Elaboração própria a partir de dados da Anbima. Já no BNDES, observa-se um movimento bem diferente. No período jan-ago/2023 as consultas das empresas ao Banco, que refletem as intenções de busca por financiamentos, atingiu R$ 183,6 bilhões, o que representa um crescimento de 111% frente ao mesmo período de 2022 (Gráfico 2). Nos últimos 12 meses, encerrados em ago/2023, as consultas atingiram R$ 241 bilhões, o maior valor desde o fim de 2014. O crescimento das consultas não necessariamente se refletirá em aumento de contratações e desembolsos, mas mantém aberta a possibilidade de uma alternativa de funding para as empresas em um momento de elevação da aversão ao risco no mercado de capitais. Portanto, BNDES e mercados de capitais têm comportamentos díspares em momentos de estresse financeiro. Gráfico 2: Consultas ao BNDES (R$ bilhões) Fonte: Elaboração própria.
  • 3. 3 Um segundo aspecto que merece destaque é a diferença de destinação dada aos recursos captados via mercado de capitais e àqueles captados via BNDES. Enquanto o crédito do Banco financia, majoritariamente, o investimento produtivo, que aumenta o estoque de capital da economia, os recursos do mercado de capitais se destinam, em grande parte, a capital de giro e refinanciamento de passivo das companhias. Isso não significa diminuir a relevância desses outros usos, especialmente por permitirem às grandes empresas brasileiras gerenciar seus níveis de fragilidade financeira com maior flexibilidade. No entanto, é preciso pontuar que o BNDES atua em um lócus distinto. No acumulado até agosto de 2023, algo como 2/3 (66%) das emissões de debêntures (principal instrumento de mercado de capitais) continuaram a apresentar como maior destinação refinanciamento de passivo, capital de giro ou recompra/resgate de emissão anterior (Gráfico 3). Já as consultas ao BNDES, nessa mesma base de comparação, foram majoritariamente destinadas aos setores de infraestrutura e indústria (R$ 126 bilhões ou quase 70% das intenções de financiamento). Gráfico 3: Destinação dos recursos captados via emissão de debêntures (em %) Fonte: Elaboração própria com base em dados da Anbima. Há, porém, um agravante. Até mesmo parcela do mercado de capitais destinada ao financiamento de longo prazo no Brasil – composta pela emissão de debêntures incentivadas de infraestrutura (via Lei 12.431 Art.2), ampliando, em complementaridade com o BNDES, as fontes de funding para investimentos em infraestrutura – tem apresentado desempenho inferior ao verificado no último ano. O volume emitido foi de R$ 21,7 bilhões, 16% inferior ao mesmo período de 2022. O número de operações teve redução de 46%, com a realização de apenas 33 emissões. Essas debêntures contam com incentivos tributários e, portanto, envolvem renúncias fiscais.4 Além disso, não há sistemática de avaliação de impacto desses subsídios. 4 Para uma análise acerca do repasse dos incentivos tributários das debêntures incentivadas, ver Pereira e Miterhof (2019) e (2021).
  • 4. 4 Gráfico 4: Emissões de debêntures 12.431 Art.2 (volume em R$ bilhões e número de operações) Fonte: Elaboração própria com base em dados da Anbima. No mesmo período de jan-ago 2023, o volume de desembolsos do BNDES para o setor de infraestrutura foi de R$ 25 bilhões. Já o volume de consultas para o setor atingiu cerca de R$ 93 bilhões, um crescimento de 163% frente ao mesmo período de 2022. Enfrentando uma maior restrição de liquidez nos mercados ao longo de 2023, empresas que possuem acesso ao mercado de capitais realizaram consultas ao BNDES acerca da possibilidade de financiamento. Por fim, um terceiro aspecto, não menos relevante, é que o BNDES é um agente importante para o desenvolvimento do mercado de capitais doméstico. Apenas em 2023, com dados até agosto, o apoio do BNDES à aquisição de debêntures incentivadas atingiu valores superiores a R$ 7,3 bilhões (cerca de 33% das emissões). Além de adquirir esses papéis como forma de apoio financeiro às empresas, o BNDES tem atuado como agente estruturador de tais emissões. Dessa forma, contribui não apenas para o sucesso na atração de investidores, por meio da prestação de garantia firme, como contribui para ancorar as emissões e dar liquidez ao mercado. Assim, a presença do BNDES no mercado de capitais oferece maior segurança para que outros players também participem das operações, alavancando, dessa forma, o mercado. Nesse sentido o BNDES participou, recentemente, das duas maiores emissões da história do mercado de debêntures de infraestrutura do país: i) Iguá, em junho de 2023: oferta pública de R$ 3,8 bilhões, com o BNDES subscrevendo 47% do total (R$ 1,8 bilhão); e ii) Aegea, em agosto de 2023: oferta pública de R$ 5,5 bilhões, com o BNDES subscrevendo 35% desse valor (R$ 1,9 bilhão). Reafirmamos, portanto, que o BNDES pode e deve coexistir com um mercado de capitais dinâmico para assegurar a funcionalidade do sistema financeiro ao desenvolvimento econômico do país. Referências Barboza, R et al. O BNDES e o mercado de capitais: esclarecimentos para o debate público no Brasil. [Rio de Janeiro: Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social], 2023. 23 p. (Textos para discussão; 153).
  • 5. 5 Carrasco, V; Freitas, G. Crédito direcionado e produtividade: o psi como exemplo. In: MENDES, Marcos (org.). Para não esquecer: políticas que empobrecem o Brasil. Rio de Janeiro: Autografia, 2022. Machado, C. O BNDES e o desenvolvimento do mercado de capitais. Folha de S. Paulo, São Paulo, 20 dez. 2022. Mendes, M. O BNDES, de novo. Folha de S. Paulo, São Paulo, 7 abr. 2023. Pereira, T. R; Miterhof, M. T. Debêntures de infraestrutura: qual fração do custo fiscal é transferida aos projetos? [Rio de Janeiro: Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social], 2019. 40 p. (Textos para discussão; 143). Pereira, T. R; Miterhof, M. T. Uma nota sobre a eficiência fiscal das debêntures incentivadas em infraestrutura no Brasil. Revista Brasileira de Economia, Rio de Janeiro, v. 75, n. 2, p. 245-265, 2021.