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Desirée Sant’Anna Maestri
UX DESIGN, GÊNERO E TECNOLOGIA:
A MÍDIA DO CONHECIMENTO COMO INSTRUMENTO
PARA INCLUSÃO DE MULHERES
Dissertação submetida ao Programa de
Pós-Graduação em Engenharia e
Gestão do Conhecimento da
Universidade Federal de Santa Catarina
para a obtenção do Grau de mestre em
Engenharia e Gestão do Conhecimento
Orientadora: Profa
. Dra
. Luciane Maria
Fadel
Coorientadora: Profa
. Dra
. Maria
Collier de Mendonça
Florianópolis
2019
Ficha de identificação da obra elaborada pelo autor,
através do Programa de Geração Automática da Biblioteca Universitária da UFSC.
Maestri, Desirée Sant'Anna
UX DESIGN, GÊNERO E TECNOLOGIA : A MÍDIA DO
CONHECIMENTO COMO INSTRUMENTO PARA INCLUSÃO DE
MULHERES / Desirée Sant'Anna Maestri ; orientadora,
Luciane Maria Fadel , coorientadora, Maria Collier
de Mendonça , 2019.
183 p.
Dissertação (mestrado) - Universidade Federal de
Santa Catarina, Centro Tecnológico, Programa de Pós
Graduação em Engenharia e Gestão do Conhecimento,
Florianópolis, 2019.
Inclui referências.
1. Engenharia e Gestão do Conhecimento. 2.
Gênero. 3. Programação. 4. STEM. 5. Django Girls. I.
, Luciane Maria Fadel. II. , Maria Collier de
Mendonça. III. Universidade Federal de Santa
Catarina. Programa de Pós-Graduação em Engenharia e
Gestão do Conhecimento. IV. Título.
Desirée Sant’Anna Maestri
UX DESIGN, GÊNERO E TECNOLOGIA:
A MÍDIA DO CONHECIMENTO COMO INSTRUMENTO
PARA INCLUSÃO DE MULHERES
Esta Dissertação foi julgada adequada para obtenção do Título de
“Mestre em Engenharia e Gestão do Conhecimento” e aprovada em sua
forma final pelo Programa de Pós-Graduação em Engenharia e Gestão
do Conhecimento
Florianópolis, 04 de abril de 2019.
___________________________________
Prof.ª Roberto Carlos dos S. Pacheco, Dr.
Coordenador do Curso
Banca Examinadora:
_____________________________________
Prof.ª Luciane Maria Fadel, Dr.ª
Orientadora
Universidade Federal de Santa Catarina
_____________________________________
Prof. ª Marilia Abrahão Amaral, Dr ª.
Universidade Tecnológica Federal do Paraná
_____________________________________
Prof ª. Vania Ribas Ulbricht, Dr ª.
Universidade Federal de Santa Catarina
_____________________________________
Prof ª. Gertrudes Aparecida Dandolini, Dr ª.
Universidade Federal de Santa Catarina
Este trabalho é dedicado a todas
as mulheres que lutaram para que hoje
eu pudesse escrevê-lo.
AGRADECIMENTOS
Agradeço às pessoas que, de alguma forma, tornaram essa
caminhada mais leve e me ajudaram a concluí-la.
À minha orientadora, Luciane Fadel, por aceitar o desafio de
orientar (uma aluna e) um tema tão complexo. E, principalmente, por
acreditar junto comigo. Tua orientação, carinho e bom humor me
trouxeram até aqui.
À minha coorientadora, Maria Collier, por toda dedicação na
revisão, indicações de leitura e mensagens de apoio.
À minha mãe, Carmem Janice – a primeira programadora que
conheci – pela inspiração e, especialmente, por todo o processo que
passamos juntas entre o início e o final deste trabalho.
À minha avó Célia e também à toda minha família, pelo amor e
apoio de sempre.
Às minhas e meus colegas do EGC pelo companheirismo ao longo
do curso e por me levarem de cadeira de rodas e muletas para apresentar
minha pesquisa no Painel Científico com o pé quebrado.
Aos meus colegas do Hiperlab e das diversas disciplinas, por
compartilhar a rotina da pós-graduação, o café e os pensamentos.
Às mulheres incríveis do mundo da tecnologia que conheci ao
longo da minha atuação e da minha pesquisa. Em especial àquelas que
fizeram o Django Girls acontecer: Talita, Monalisa, Alana e Paula.
Às amizades que construí em Florianópolis, especialmente àquelas
que me apoiaram na reta final: Geórgia, Janaína, Gabriel, Patrícia B., Joel,
Juliana, Isadora e Danieli.
Às amizades que levo em meu coração: Débora, Lígia, Patrícia C.,
Tânia, Roberta, Kátia, Gustavo, Rafael, Guilherme, Aline, Maurício e
Renato. À minha psicóloga Maria Isabel e à minha professora de yoga
Vivian. Vocês foram fundamentais para que eu mantivesse a saúde mental
e a força para seguir.
Agradeço também pela oportunidade de ter estudado em uma
universidade pública e gratuita, num programa de Excelência Acadêmica
da CAPES, que disponibilizou bolsa de pesquisa durante meu segundo o
ano de mestrado.
me levanto
sobre o sacrifício
de um milhão de mulheres que vieram antes
e penso
o que é que eu faço
para tornar essa montanha mais alta
para que as mulheres que vierem depois de mim
possam ver além
(legado, Rupi Kaur)
RESUMO
A área de Science, Technology, Engineering and Mathematics (STEM) é
um campo social marcado pela desigualdade de gênero. A partir disso,
esta pesquisa considera o gênero como uma categoria de análise para
compreender iniciativas que buscam incluir mulheres. O projeto
analisado foi o Django Girls, um workshop de programação em Python
para mulheres. O pressuposto é de que o design (tanto físico quanto
intangível) do Django Girls cria um ambiente mais favorável para o
compartilhamento de conhecimento entre as mulheres, gerando um
sentimento de pertencimento ao campo da STEM. Muitos estudos
indicam a importância do ambiente de ensino para a inclusão e
permanência das mulheres na área. Porém, há uma lacuna na análise dessa
experiência sob a perspectiva do design, bem como sua relação com a
mídia. Desse modo, o objetivo desta pesquisa foi analisar a mídia Django
Girls com base em conceitos do design para a experiência enquanto um
espaço que propicia a criação de agência e de empoderamento das
mulheres envolvidas. Para isso, foi realizada uma revisão bibliográfica e
documental para contextualizar essa desigualdade de gênero. O quadro
teórico de análise foi construído sob a perspectiva integrada de conceitos
de gênero, agência e empoderamento relacionados à tecnologia, bem
como conceitos relacionados à mídia do conhecimento, agência na mídia
e, por fim, conceitos acerca do design para experiência. A pesquisa de
campo incluiu estudo de caso, entrevistas, aplicação de questionário e
uma etapa de observação participante, contemplando duas edições do
Django Girls ocorridas em Florianópolis em 2017 e 2018. Percebeu-se
que o objetivo do curso extrapola o ensino de programação,
configurando-se como um espaço para o compartilhamento de
experiências de ser mulher na tecnologia. Como consequência, observou-
se a sensação de empoderamento e o ganho de agência entre as
participantes. Portanto, o gênero, enquanto categoria de análise,
apresenta-se de forma espiral. Ao mesmo tempo em que é a motivação
para a criação de projetos como o Django Girls, é também o catalizador
de transformações na estrutura do campo social da STEM ao incluir
mulheres mais conscientes de sua posição de desigualdade, dispostas a
mudarem este cenário.
Palavras-chave: Gênero. Programação. STEM. Django Girls.
Python.
ABSTRACT
The area of Science, Technology, Engineering and Mathematics (STEM)
is a social field marked by gender inequality. For this reason, this research
considers gender as a category of analysis to understand initiatives that
seek to include women. The iniciative analyzed was Django Girls, a
Python programming workshop for women. The assumption is that
Django Girls' design (both physical and intangible) creates a more
supportive environment for knowledge sharing among women,
generating a sense of belonging to the STEM field. Many studies indicate
the importance of the teaching environment for the inclusion and
permanence of women in the area. However, there is a gap in the analysis
of this experience from the design perspective, as well as its relationship
with the media. Thus, this research aimed to analyze the Django Girls
media based on experience design concepts as a space that fosters
women’s agency and empowerment. For this, a bibliographical and
documentary review was carried out to contextualize this gender
inequality. The theoretical framework of analysis was built under the
integrated perspective of technology-related concepts of gender, agency
and empowerment, as well as media-related concepts of knowledge and
agency and, finally, theories about experience design. The field research
included case study, interviews, questionnaire application and participant
observation, and contemplated two editions of Django Girls that took
place in Florianópolis in 2017 and 2018. As a consequence, the feeling of
empowerment and the gain of agency among the participants were
observed. Therefore, gender, as a category of analysis, presents itself in a
spiral form. While motivating the creation of projects such as Django
Girls, it is also the catalyst for changes in the structure of STEM's social
field by including women who are more aware of their position of
inequality, willing to change this scenario.
Keywords: Gender. Programming. STEM. Django Girls. Python.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Coffee break da Pyhton Sul e do Django Girls em 2018.
Participantes do Django Girls estão usando camiseta amarela e bordô. 95
Figura 2 - Imagens do primeiro Django Girls. .....................................98
Figura 3 - Locais onde já ocorreu uma edição do Django Girls............98
Figura 4 - Participantes do Django Girls Floripa 2017.......................101
Figura 5 - Conversando com as organizadoras Monalisa Mello (esq) e
Alana Bittar (dir) ..............................................................................102
Figura 6 - De muletas, pesquisadora fotografando o final do Django Girls
2018.................................................................................................103
Figura 7 - Algumas participantes do Django Girls 2018 com os balões
dourados...........................................................................................103
Figura 8 - Organizadoras do Django Girls Floripa: Talita Rossari (esq)
Alana Bittar (centro) e Monalisa Mello (dir). ....................................115
Figura 9 - Organizadoras e tutoras do Django Girls Floripa 2017 ......117
Figura 10 - Alunos da UFSC e UDESC em evento de Ciências da
Computação .....................................................................................120
Figura 11 - Participantes do Django Girls Floripa 2017 são todas
mulheres...........................................................................................121
Figura 12 - Balões com o nome do projeto no workshop de 2018 ......123
Figura 13 - Uma tutora ajudando a colar os balões em 2018 ..............123
Figura 14 - Django Girls Acra, em Gana...........................................124
Figura 15 - Django Girls Caxias (RS) ...............................................124
Figura 16 - Django Girls Bangalore (Índia).......................................124
Figura 17 - Django Girls Mountain View (EUA)...............................124
Figura 18 - Monalisa Mello (uma das organizadoras) colocando os balões
de sinalização para a sala do Django Girls Floripa 2017....................125
Figura 19 - Doces disponibilizados ao longo do workshop ................127
Figura 20 - Uma das mesas do coffee break da edição de 2017..........127
Figura 21 - Interação entre participantes do Django Girls (usando
camisetas Amarela e Bordô) com demais participantes da PythonSul '18
.........................................................................................................128
Figura 22 - Kit de participação..........................................................129
Figura 23 - Todos os adesivos exclusivos do Django Girls Floripa ....131
Figura 24 - Ícone oficial e internacional do PyLadies ........................131
Figura 25 - Ícone do PyLadies Floripa ..............................................131
Figura 26 - Adesivos disponíveis no evento ......................................131
Figura 27 - Faz parte da cultura de T.I. colar adesivos nos notebooks 132
Figura 28 - Camisetas oficiais do Django Girls .................................132
Figura 29 - Manuela D'Ávila.............................................................133
Figura 30 - Camiseta criada para o Django Girls Floripa................... 135
Figura 31 - Exemplos de outras camisetas com o mesmo design....... 136
Figura 32 - Design original da camiseta............................................ 136
Figura 33 - Intérprete de Libras no Django Girls 2017...................... 140
Figura 34 – Gênero como processo espiral no campo da STEM........ 144
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 - Revisão bibliográfica ........................................................56
Quadro 2 - Relatórios de dados quantitativos ......................................58
Quadro 3 - Iniciativas para inclusão de mulheres na tecnologia ...........91
Quadro 4 - Trabalhos relacionados no BTD do EGC.........................155
Quadro 5 - Lista dos artigos da revisão bibliográfica .........................159
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Número de formados nos cursos de Ciências da computação e
Sistemas de Informação UFSC (2008-2018) .......................................66
Tabela 2 - Concluintes e ingressantes por Gênero (2001-2016)............67
Tabela 3 - Ingressantes nos cursos de Ciências da Computação e Sistemas
de Informação UFSC (2008-2018)......................................................68
Tabela 4 - Principais ocupações em tecnologia por mulheres e homens
...........................................................................................................74
Tabela 5 – Participação em níveis hierárquicos nas empresas ..............76
Tabela 6 - Pesquisadores(as) líderes CNPq..........................................79
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 - Cursos com maior número de matrículas entre mulheres ...63
Gráfico 2 - Cursos com maior número de matrículas entre os homens .64
Gráfico 3 - Evolução das matrículas de estudantes de computação por
gênero (2001-2016) ............................................................................65
Gráfico 4 - Docentes x Gênero............................................................69
Gráfico 5 - Mulheres em cargos relacionados à computação................73
Gráfico 6 - Remuneração por gênero - 2010........................................75
LISTA DE ABREVEATURAS E SIGLAS
AAUW – American Association of University Women
ACATE – Associação Catarinense de Tecnologia
BTD – Banco de Teses e Dissertações
EGC – Engenharia e Gestão do Conhecimento
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IHC – Interação Humano-Computador
LGBT+ - Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais e outras
identidades de gênero
PNAD – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
PSF – Python Software Foundation
STEM – Science, Technology, Engineering and Mathematics (Ciência,
Tecnologia, Engenharia e Matemática)
SPM – Secretaria de Políticas para Mulheres
UX design – User Experience design ou design para a experiência
UFSC – Universidade Federal de Santa Catarina
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO.................................................................27
1.1 CONTEXTUALIZAÇÃO DO TEMA.................................27
1.2 OBJETIVOS.......................................................................33
Objetivo geral....................................................................33
Objetivos específicos .........................................................33
1.3 JUSTIFICATIVA ...............................................................33
1.4 ESCOPO DE PESQUISA ...................................................34
1.5 ADERÊNCIA DO TEMA AO PROGRAMA PPGEGC ......35
1.6 CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA...............................36
1.7 ESTRUTURA DA DISSERTAÇÃO ...................................37
2 REFERENCIAL TEÓRICO ............................................39
2.1 CONCEITOS - QUESTÕES DE GÊNERO.........................39
Campo social .....................................................................39
Gênero...............................................................................41
Empoderamento................................................................42
Agência (gênero)................................................................44
2.2 CONCEITOS - ANÁLISE DO OBJETO.............................45
Agência (mídia) .................................................................45
Recepção midiática............................................................46
Mídia do conhecimento .....................................................47
Conhecimento....................................................................47
Design para experiência....................................................48
Projetando para a experiência..........................................49
Framework de análise.......................................................51
2.2.7.1 Os quatro aspectos da experiência .......................................51
2.2.7.2 Atribuindo significado à experiência ...................................52
2.3 SÍNTESE DO CAPÍTULO..................................................54
3 AS QUESTÕES DE GÊNERO NO CAMPO DA STEM 55
3.1 REVISÃO INTEGRATIVA DA LITERATURA................ 56
3.2 ANÁLISE GERAL DOS RESULTADOS .......................... 60
3.3 EDUCAÇÃO ..................................................................... 62
A maioria dos alunos é homem ........................................ 62
As mulheres desistem mais do que os homens ................. 66
A maioria de professores é homem .................................. 69
Fatores que influenciam a presença de mulheres ............ 70
3.4 TRABALHO...................................................................... 73
A maioria dos profissionais de TI é homem..................... 73
As mulheres ocupam posições menos técnicas................. 74
As mulheres têm remuneração menor que a dos homens 74
As mulheres e as posições de liderança em empresas...... 76
A dupla jornada de trabalho das mulheres ..................... 76
3.5 PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO CIENTÍFICO ......... 77
A maioria dos pesquisadores são homens ........................ 78
As mulheres são menos citadas do que os homens........... 78
As mulheres e a liderança de grupos de pesquisa ............ 79
A carreira acadêmica é mais difícil para as mulheres..... 80
As linguagens de programação são masculinas ............... 80
A ciência é um campo masculino...................................... 81
Saberes localizados ........................................................... 81
3.6 EXPERIÊNCIA (DE SER MULHER NA STEM) .............. 82
Principais dificuldades enfrentadas pelas mulheres........ 83
Agência e empoderamento ............................................... 84
Importância das iniciativas de inclusão de mulheres ...... 85
3.7 SITUANDO MINHA PESQUISA...................................... 86
4 CAMPO DE LUTAS: DJANGO GIRLS E
MOVIMENTOS PELA IGUALDADE DE GÊNERO NA STEM . 89
4.1 INICIATIVAS PARA IGUALDAE DE GÊNERO..............89
4.2 DJANGO GIRLS: DESCRIÇÃO DO OBJETO...................92
Python, Python Software Foundation, Django.................92
Compartilhamento do conhecimento e diversidade .........93
Django Girls......................................................................95
PyLadies ............................................................................96
História do Django Girls internacional ............................96
Dados internacionais Django Girls...................................98
História do Django Girls Brasil ........................................99
História do Django Girls Floripa......................................99
Django Girls Floripa 2017...............................................100
Django Girls Floripa 2018...............................................101
4.3 SÍNTESE DO CAPÍTULO................................................104
5 ANÁLISE DO OBJETO .................................................105
5.1 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS .......................105
Entrevistas semiestruturadas..........................................105
Entrevistas não-diretas e observação participante.........106
Análise documental e de conteúdo..................................107
Questionário online .........................................................107
5.2 MANUAL DE ORGANIZAÇÃO DO DJANGO GIRLS...108
Ideia básica do evento .....................................................109
Ambiente / clima (environment)......................................110
Tutorial............................................................................112
Tutoras e Organizadoras ................................................114
5.2.4.1 Organizadoras do Django Girls Floripa .............................114
5.2.4.2 Tutoras do Django Girls Floripa........................................116
Logística ..........................................................................121
5.2.5.1 Local do evento.................................................................121
5.2.5.2 Decoração.........................................................................122
5.2.5.3 Alimentação..................................................................... 125
5.2.5.4 Brindes............................................................................. 129
5.2.5.5 Fotos e vídeos................................................................... 139
Acessibilidade ................................................................. 140
5.3 SÍNTESES DO CAPÍTULO............................................. 140
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................... 145
REFERÊNCIAS............................................................................. 147
APÊNDICE A – Trabalhos relacionados no BTD do EGC .......... 155
APÊNDICE B – Artigos da revisão bibliográfica ......................... 159
APÊNDICE C – Entrevista com Talita Rossari............................ 167
APÊNDICE D – Entrevista com Paula Grangeiro........................ 173
APÊNDICE E – Questionário........................................................ 177
APÊNDICE F – Modelo de autorização para entrevista .............. 183
27
1 INTRODUÇÃO
1.1 CONTEXTUALIZAÇÃO DO TEMA
Toda produção humana pode ser considerada uma tecnologia,
através da “criação, apropriação e manipulação de técnicas que carregam
em si elementos culturais, políticos, religiosos e econômicos,
constituintes da concretude da existência social”. A partir dessa
perspectiva, “tecnologia está intrinsicamente presente tanto numa enxada
quanto num computador” (CARVALHO; FEITOSA; ARAÚJO, 2018).
Historicamente, os avanços tecnológicos vêm pautando nossas formas de
vivenciar o mundo e, muitas vezes, o domínio da tecnologia está
associado ao poder. Como no exemplo emblemático da Guerra Fria, que
foi uma disputa de poder pautada pelo domínio tecnológico das bombas
nucleares (GIDDENS, 1991, p. 70).
Conforme avançamos para uma “sociedade tecnológica”, a
tecnologia vai ficando cada vez mais intangível. Estamos vivenciando
uma transformação intensa em nossa forma de interagir com o mundo,
onde estamos cada vez mais rodeados de “artefatos, objetos, bens e
símbolos que remetem à tecnologia” (CARVALHO; FEITOSA;
ARAÚJO, 2018, p. 1). Essas interações virtualizam atividades antes
totalmente humanas, como a comunicação, mediando-as através de
artefatos tecnológicos (smartphones, computadores, etc.) e
transformando interações entre agentes humanos em interações humano-
computador.
Neste trabalho, a tecnologia é entendida dentro de um contexto
mais amplo, que considera os aspectos sociais, culturais, políticos,
históricos e econômicos do processo de criar conhecimento tecnológico,
criar produtos e serviços resultantes da programação de softwares, bem
como as relações humanas com a produção e com os produtos.
Os tipos de tecnologias, associadas à programação, estão inseridas
em um contexto mais amplo conhecido pela sigla STEM, que significa
Science, Technology, Engineering and Mathematics (Ciência,
Tecnologia, Engenharia e Matemática). Segundo o relatório Why So Few?
Women in STEM publicado em 2010 pela AAUW (American Association
of University Women), organizado por Catherine Hill, “o termo STEM
refere-se às ciências físicas, biológicas e agronômicas; ciências da
computação e da informação, engenharia e tecnologias de engenharia, e
matemática” (HILL; CORBETT; ST ROSE, 2010, tradução nossa). A
tecnologia, portanto, é “um elemento fundante da vida social, [...] é parte
28
da cultura e como tal deve ser compreendida” (CARVALHO; FEITOSA;
ARAÚJO, 2018, p. 3).
A partir disso, considero, então, que STEM se constitui no que
Bourdieu (1984, 1996, 2001, 2004) chama de “campo social”, pois
compreende não só o conhecimento e a produção dessas diversas áreas,
mas também as relações sociais que se estabelecem em seus diferentes
âmbitos, como trabalho, educação e produção tecnológica e científica.
Um campo social é, necessariamente, um espaço de disputas de poder
(BOURDIEU, 1984, 1996, 2001, 2004). No campo da STEM, essas
relações de poder estão intrinsicamente relacionadas ao gênero, assim
como questões de classe e de etnia, uma vez que este campo foi
constituído como um espaço de domínio de homens, brancos, ocidentais,
heterossexuais e de classe média/alta. No capítulo 3, apresento dados e
estudos anteriores que compõem este cenário.
Compreendo gênero do ponto de vista relacional, seguindo a
abordagem de Joan Scott (1995). Destarte, gênero é entendido como “um
elemento constitutivo de relações sociais” e como “uma forma primária
de dar significado às relações de poder” (SCOTT, 1995). Dessa forma, as
relações de poder do campo da STEM estão inter-relacionadas com as
relações de gênero.
Tanto a tecnologia, como as relações de poder e também as
relações de gênero são, portanto, partes fundantes da vida social. Por esse
motivo, ao estudar tecnologia, estou, necessariamente, falando também
sobre relações de poder e de gênero.
Considerando esse contexto, o tema do meu estudo é a
desigualdade de gênero no campo da STEM. Meu foco de análise são
iniciativas que buscam alterar a estrutura desse campo
predominantemente masculino incluindo mais mulheres e outras minorias
através do compartilhamento de conhecimento tecnológico. Como estudo
de caso, escolhi a iniciativa Django Girls1
, que percebo como um produto
desse campo, uma vez que sua criação foi motivada por essa desigualdade
estrutural. O projeto organiza workshops e fornece tutoriais gratuitos para
ensinar programação para mulheres.
Minha motivação e interesse por esse tema perpassa minha
experiência enquanto mulher inserida neste campo. Eu também sou uma
mulher na tecnologia, atuando como profissional de UX design em
1
“Django Girls organize free Python and Django workshops, create open sourced
online tutorials and curate amazing first experiences with technology”. Frase da
página inicial do site do projeto. Disponível em: <https://djangogirls.org/>. Acesso
em: 02 mar 2019.
29
empresas de tecnologia, participando de eventos e de comunidades de
tecnologia, dando palestras, organizando e facilitando workshops,
produzindo conteúdos e também como aluna de mestrado de um
programa de pós-graduação em engenharia.
Participei de algumas dessas iniciativas para inclusão de mulheres
como aluna (Django Girls, Rails Girls2
), também fui embaixadora e
mentora do Technovation Challenge3
em Porto Alegre (2014) e em
Florianópolis (2015-2018). Tais experiências me motivaram a pesquisar
esses espaços, pois pude perceber que não só a minha experiência, como
a da maioria das mulheres envolvidas nesses projetos, transcendia seus
objetivos (aprender a programar, ensinar meninas a programar). Eu vi e
participei da criação de uma rede de apoio feminino que mudou a vida de
algumas meninas em situação de vulnerabilidade social; mas também
ajudou algumas mulheres a mudarem de carreira ou a conseguirem
empregos. Entre a primeira (novembro de 2017) e a segunda edição do
Django Girls (abril de 2018) que participei, vi uma mulher – que estava
desempregada em 2017 – voltar como tutora em 2018, contando que
conseguiu um emprego por causa do networking que ela fez nos
intervalos do evento.
Enquanto mentora de um time do Technovation Challenge em
Porto Alegre, vi minha colega, que estava começando a carreira de
programadora, ser contratada por uma empresa multinacional de
desenvolvimento de software. Através da iniciativa, ela fez um
networking que não só a levou a trabalhar lá, como também a conquistar
um espaço dentro da empresa para executar seu próprio projeto de ensino
de programação para jovens em situação de vulnerabilidade social.
Quando atuei como mentora e embaixadora do Technovation
Challenge em Florianópolis, ajudamos diretamente mais de 100 meninas,
em sua maioria de escolas públicas e/ou regiões de vulnerabilidade social.
Para citar quatro casos emblemáticos: conseguimos, através da nossa rede
de apoio, a contratação de uma jovem aprendiz em uma empresa
internacional de tecnologia, onde ela recebe auxílio financeiro, aulas de
inglês e participa de todas as áreas da empresa, conhecendo a realidade
de diversas profissões. Outra jovem, negra, nordestina, de 14/15 anos e
que não pôde estar presente na sua apresentação final do projeto pois
precisava trabalhar como babá, hoje está contratada como menor aprendiz
na ACATE, a Associação Catarinense de Tecnologia. Duas meninas que
participaram de mais de uma edição do programa (cuja duração é de 3
2
http://railsgirls.com/
3
https://technovationchallenge.org/
30
meses) levaram adiante seus projetos e foram selecionadas para participar
de uma aceleradora de startups, mas não puderam dar continuidade pois
eram menores de idade. Apesar disso, elas foram as participantes mais
jovens selecionadas na história do projeto.
O caso mais marcante para mim, no entanto, foi de uma jovem de
14 anos que morava em uma região periférica. A mentora do seu time a
buscava em casa todos os sábados ao longo dos 3 meses da competição
para participar das atividades, pois ela não tinha como se deslocar até
onde realizávamos os workshops.
Ela participava ativamente da criação do aplicativo para celular.
Eu já havia percebido que ela, além de tímida, estava com várias marcas
de automutilação. Ao longo do projeto, ela tentou se abrir comigo e
também com essa mentora, mas nós não tínhamos experiência nem
conhecimento para entender os sinais. Depois que o programa já tinha
acabado e as coisas já estavam mais difíceis, ela procurou essa mentora e
conseguiu falar o que estava acontecendo: ela sofria abusos sexuais do
padrasto e estava grávida. Ela tinha 14 anos e estava no 9o
ano do Ensino
Fundamental. Sua mãe era catadora, estava desempregada, de modo que
elas e a irmã mais nova dependiam financeiramente do padrasto. Foi
absurdamente chocante para mim, uma realidade que eu só lia nas notícias
e nos livros. Senti-me culpada por não ter percebido suas tentativas de me
contar, além de despreparada para trabalhar em um projeto social, no qual
o conhecimento tecnológico claramente não era suficiente para lidar com
a dura realidade do público atendido.
Mesmo assim, mobilizamos nossa rede e conseguimos nos
conectar com a liderança comunitária onde ela já vinha fazendo
acompanhamento psicológico e os profissionais já estavam investigando
o caso. Recebemos a notícia de que o padrasto foi preso (por outros
crimes, não pelos abusos). E ajudamos a montar um enxoval para a
criança (desde móveis até roupas e fraldas), contando com apoio inclusive
da mãe da minha orientadora Luciane, que mandou roupinhas para a
criança. As últimas notícias que tive foram de que a criança nasceu
saudável e a jovem estava estudando para o processo seletivo para cursar
o ensino médio técnico. Ela resistiu e, apesar de todas essas dificuldades,
quer seguir na área tecnológica.
Depois dessas e outras experiências que vivi em quatro anos
atuando como profissional, aluna e ativista, ficou claro para mim que o
que estava em jogo ali não era aprender a programar. As experiências
vividas por todas as pessoas envolvidas (organizadoras, tutoras, alunas)
extrapolam o compartilhamento de conhecimento tecnológico.
Representam a ação de mulheres para mudarem sua realidade, em busca
31
de maior empoderamento; ou seja, maior autoconfiança, autonomia e
realização pessoal. E isso é agência, um conceito que perpassa tanto as
questões de gênero quanto a interação com a mídia.
Por esse motivo, escolhi analisar o objeto de estudo a partir da
abordagem do Design para a experiência, ou User Experience Design
(UX Design), uma área do Design que desenvolve seus projetos com o
foco na experiência que usuários/as poderão ter ao interagir com o
produto ou serviço criado. Lembrando Donald Norman (2002, p. 4), que
diz que todas as coisas artificiais são projetadas, entendo que um curso de
programação para mulheres – desde a ideia, a filosofia, os recursos
utilizados e o próprio workshop – é projetado, consciente ou
inconscientemente. Tácita ou explicitamente (NONAKA; TAKEUCHI,
1997).
Por ser uma iniciativa que busca o empoderamento e a inserção de
mulheres no campo da tecnologia através de uma experiência mais
amigável com o ensino de programação, compreendo o Django Girls
como uma Mídia do Conhecimento. Isso porque, segundo Richard
Perassi (2017), a mídia é “a parte responsável pelo suporte, expressão e
divulgação da informação (comunicação) entre agentes humanos ou
agentes tecnológicos”. E o Django Girls opera como uma mídia
alternativa à mídia tradicional (faculdade de tecnologia), pois oferece
outro suporte, outra expressão e outra divulgação do conhecimento
tecnológico.
A partir da minha vivência no campo da STEM e da minha
trajetória enquanto aluna e pesquisadora sobre cultura, sociedade e
relações de gênero, além do discurso oficial do Django Girls e
depoimentos das organizadoras4
, meu pressuposto é de que a experiência
proporcionada pelo Django Girls extrapola a aquisição de conhecimento
tecnológico ao proporcionar empoderamento e agência.
Por um lado, o domínio do conhecimento tecnológico (saber
programar), independente da forma como é adquirido, pode levar a uma
sensação de agência, segundo o entendimento de Eichner (2014).
Por outro lado, a aquisição desse conhecimento em um ambiente
projetado intencionalmente para que seja mais amigável e acolhedor faz
com que a experiência dessas mulheres com a tecnologia seja mais
positiva. Num contexto de uma sociedade pautada pela tecnologia, saber
programar é saber como esse mundo opera e isso sustenta a sensação de
empoderamento (TORTATO, 2014).
4
“Acho que o objetivo do Django Girls é o mesmo da tecnologia, que é
empoderar pessoas” (GRANGEIRO, 2019).
32
Conforme destaca Selaimen (2013), os códigos e protocolos
computacionais determinam os modos como as tecnologias da
informação e comunicação são moldadas e utilizadas pelas pessoas. Nessa
perspectiva, artefatos tecnológicos operam como artefatos políticos:
Artefatos tecnológicos são artefatos políticos -
incorporam visões de mundo e formas específicas
de exercício de poder em vários níveis - sendo que
é no nível dos códigos e dos protocolos que este
exercício ocorre de maneira mais invisível. Não
percebemos o código enquanto ele opera – por isso
mesmo, a necessidade de se olhar para os aspectos
políticos, econômicos, sociais e culturais
embutidos na construção de códigos e protocolos é
ainda mais relevante, levando- se em conta que as
tecnologias podem servir a uma variedade de
interesses; podem fortalecer as estruturas do poder
hegemônico e também podem fortalecer a
resistência contra estas estruturas (SELAIMEN,
2013, p. 145).
A tecnologia, continua a autora (ibid.), pode ser desenvolvida tanto
para conservar quanto para alterar o poder. Assim, interferir
proativamente no desenvolvimento de tais tecnologias torna possível que
atuem de maneiras mais reflexivas, bem como alinhadas às necessidades
e aos valores contra-hegemônicos (SELAIMEN, 2013, p. 145).
Como consequência, é possível pensar que as mulheres se sintam
mais empoderadas ao adquirir esse conhecimento tecnológico através de
uma mídia projetada com foco na experiência das mulheres no campo da
STEM.
Portanto, nesta pesquisa dedico-me a compreender o UX design da
iniciativa Django Girls enquanto uma mídia do conhecimento. Para tal,
proponho a seguinte questão de pesquisa: como o UX design de uma
mídia do conhecimento evoca agência e empoderamento de mulheres no
campo da STEM?
33
1.2 OBJETIVOS
Objetivo geral
Analisar o UX design da mídia Django Girls enquanto uma
experiência com programação que evoca agência e empoderamento das
mulheres envolvidas resultando na sua inclusão no campo da STEM.
Objetivos específicos
a) Interpretar o Django Girls enquanto mídia do conhecimento.
b) Elencar elementos de análise à luz do UX design (framework).
c) Articular referenciais teóricos relacionando estudos de gênero,
mídia do conhecimento e UX design a fim de construir um
quadro de análise para o objeto de estudo.
d) Contextualizar o cenário da desigualdade de gênero no campo
da STEM, apresentando as principais questões que interferem
na experiência das mulheres nesses ambientes.
e) Apresentar um panorama de iniciativas para inclusão de
mulheres no campo da STEM e descrever o objeto de estudo
Django Girls.
f) Analisar os dados de campo a partir do quadro teórico
desenvolvido a fim de compreender os pontos de contato do
design que evocam sensação de agência e/ou empoderamento.
1.3 JUSTIFICATIVA
A justificativa de pesquisa se dá em três âmbitos: acadêmico, social
e pessoal, sendo já apresentei o último deles anteriormente, quando
destaquei minhas motivações de pesquisa. Do ponto de vista acadêmico,
esta pesquisa se justifica em virtude da escassez de outros trabalhos
acadêmicos sobre gênero na perspectiva da engenharia, gestão e mídias
do conhecimento. Realizei buscas no Banco de Teses e Dissertações do
departamento de Engenharia e Gestão do Conhecimento da Universidade
Federal de Santa Catarina (BTD/EGC/UFSC), cujo resultado pode ser
visto no Apêndice A. Ao buscar o termo “gênero e/ou mulher”, encontrei
apenas duas dissertações que abordam de fato questões de gênero.
Entretanto, nenhum destes trabalhos enfocou as mulheres enquanto
produtoras de tecnologia, tampouco as suas experiências no
compartilhamento de conhecimentos tecnológicos. Por outro lado, obtive
34
resultados expressivos quando busquei teses e dissertações produzidas
pelo programa que utilizaram abordagens relacionadas com a minha
pesquisa, como os termos “aprendizagem” (23 resultados) e “design” (8).
Isso demonstra a aderência da abordagem de estudo, ao mesmo tempo
que apresenta uma lacuna na temática de gênero.
Este trabalho é relevante para a sociedade na medida em que traz
reconhecimento para projetos que lutam pela igualdade de gênero no
campo da STEM. Também valoriza o conhecimento produzido por
mulheres, ao buscar utilizar referências teóricas femininas. Por fim,
promove um debate acerca das relações de gênero e das relações de poder
em um campo social cada vez mais importante, uma vez que estamos
vivendo em uma sociedade pautada pelas tecnologias de informação e
comunicação.
1.4 ESCOPO DE PESQUISA
Embora meu objeto de estudo seja específico da área da tecnologia
e voltado para mulheres, considero que as motivações e as consequências
dessa iniciativa podem ser ampliadas às outras áreas do campo da STEM
(como ciências, engenharias e matemática) e para outras minorias (como
pessoas negras, pessoas periféricas, pessoas com deficiência, pessoas
LGBT+, etc.), respeitando suas particularidades. Por esse motivo, refiro-
me ao campo da STEM quando considero que são questões pertinentes ao
campo como um todo, mas quando são questões ou referências
específicas, utilizo os termos mulheres5
e tecnologia.
A pesquisa de campo contemplou apenas duas edições do Django
Girls na cidade de Florianópolis/SC, entre novembro de 2017 e abril de
2018. O Django Girls, em nível nacional e mundial, será referenciado
apenas para contextualização histórica da iniciativa.
A análise do objeto de pesquisa (Django Girls) se dá apenas no
âmbito do UX design, da mídia e dos conceitos de gênero,
empoderamento e agência. Ressalto, portanto, que não analisei estratégias
5
“Mulheres” é um termo sempre utilizado no plural, pois entendo que não
existe uma única forma de ser mulher, nem uma única representação de mulher
na sociedade, conforme o site da Secretaria de Política para Mulheres:
Disponível em: < https://www.spm.gov.br/assuntos/diversidade-das-mulheres>.
Acesso em 05 fev. 2019. (Nota: ao final da escrita da primeira versão desta
dissertação, em 21/03/2019, o site da SPM não estava mais no ar, sendo
redirecionado para o novo site do novo ministério que inclui questões da SPM).
35
pedagógicas nem realizei uma avaliação de desempenho do objeto
estudado.
1.5 ADERÊNCIA DO TEMA AO PROGRAMA PPGEGC
O programa de pós-graduação em Engenharia e Gestão do
Conhecimento (PPGEGC) tem como objeto de pesquisa o conhecimento.
Na abordagem do EGC, o conhecimento
é estudado, caracterizado e definido de maneira
interdisciplinar, como conteúdo ou processo
resultante de interações sociotécnicas entre agentes
humanos e tecnológicos. Neste sentido, também é
abordado como relevante fator estratégico para a
geração de valor e equidade social (EGC, 2019).
Esta pesquisa analisa de que maneira mulheres podem ter uma
experiência mais amigável com o conhecimento tecnológico (saber
programar), uma vez que se trata de uma área de conhecimento dominada
por homens; na qual os ambientes de ensino e de trabalho podem ser
hostis a elas. Nos capítulos 2, 3 e 5 elaboro melhor essas noções.
Dessa forma, entendo que o workshop de programação Django
Girls opera como uma mídia do conhecimento, no sentido de se constituir
como outra forma de disseminar o conhecimento tecnológico,
especialmente diferente das formas tradicionais (faculdades de
tecnologia, ambientes predominantemente masculinos e com professores
e exemplos masculinos).
Por esse motivo, este trabalho está alinhado a pesquisas na área de
concentração de Mídia do Conhecimento, a qual compreende estudos de
“difusão, comunicação e compartilhamento do conhecimento; bem como
abrange a preservação, disseminação, transferência, socialização e acesso
ao conhecimento” (EGC, 2019).
O Django Girls é um espaço de compartilhamento do
conhecimento, especialmente focado na socialização e acesso ao
conhecimento como “fator estratégico” para geração de equidade social.
Meu estudo está contemplado nos temas de estudo de Mídia do
Conhecimento por tratar de “mídia, cultura e sociedade”, ao analisar o
impacto social e cultural da criação de um workshop de programação
exclusivo para mulheres. Mas também abrange o tema de “mídia,
compartilhamento e disseminação”, por entender que seu objeto é um
espaço de compartilhamento de conhecimento (PERASSI, 2017, p. 2).
36
O objeto de pesquisa está em consonância com os conceitos
articulados na área de mídia do conhecimento, uma vez que o projeto
Django Girls é entendido como uma mídia do conhecimento, ou seja, um
sistema mediador que contempla suporte, expressão e veículo da
informação.
O objetivo do projeto analisado é promover o empoderamento de
mulheres por meio do compartilhamento de conhecimento tecnológico.
Dessa forma, o conhecimento (base do EGC) é articulado em uma mídia,
que foi projetada a partir da perspectiva da experiência do usuário (UX
design) para alcançar um maior empoderamento de mulheres no campo
da tecnologia como resultado.
O objeto de pesquisa (Django Girls), assim como o campo social
em que ele está inserido (STEM), são permeados por questões de gênero,
conforme explico detalhadamente nos capítulos 2 e 3. Portanto, é
necessário articular conceitos que estão ancorados no campo de estudos
de gênero, especialmente os ligados a gênero e tecnologia (de natureza
interdisciplinar), além de outros campos de estudos como sociologia e
antropologia.
Esta pesquisa transita entre as áreas do PPGEGC na medida em
que o campo no qual o objeto de pesquisa está inserido, assim como o
tipo de conhecimento compartilhado no workshop, dizem respeito à
engenharia do conhecimento. Afinal, é um workshop que ensina a
programar e a criar produtos tecnológicos. Também dialoga com a Gestão
do Conhecimento na medida em que esse conhecimento é organizado e
distribuído. Por fim, dialoga com a mídia do conhecimento, pois o grande
diferencial de um workshop voltado a mulheres é a forma como esse
conhecimento é compartilhado. Além disso, a análise e construção dessa
forma é uma competência do design para a experiência (UX design).
Dessa forma, o desenvolvimento desta pesquisa apoia-se no
entendimento do Django Girls como uma mídia do conhecimento. E, por
conta disso, foi possível analisá-lo utilizando o referencial teórico do
design para a experiência (UX design).
1.6 CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA
Existem diferentes paradigmas epistemológicos para compreensão
da realidade, os quais possuem diferentes escolas de pensamento. De
acordo com a classificação elaborada por Morgan (1980), esta pesquisa é
caracterizada como interpretativista de abordagem qualitativa, uma vez
que compreende a visão de mundo na qual a “realidade social não existe
37
em qualquer sentido concreto, mas é um produto da experiência subjetiva
e intersubjetiva dos indivíduos”. Considera o ponto de vista do
participante em ação, enquanto a pessoa pesquisadora “tenta entender os
processos pelos quais as múltiplas realidades compartilhadas surgem, se
sustentam e se modificam”. (MORGAN, 1980).
É, ainda, uma pesquisa empírica, pois analiso dados empíricos,
entendidos como determinantes para a conclusão do trabalho, embora a
análise destes também se apoie em conceitos teóricos. A finalidade da
pesquisa é interpretativa, de ângulo sociocultural (FREIRE, 2013, p. 54–
56; SEVERINO, 2007, p. 117–119).
Para a realização da pesquisa, utilizei diferentes procedimentos
metodológicos, conforme classificação de Severino (2007, p. 117-126) e
Freire (2013, p.57-60). Na introdução de cada capítulo, explico quais
procedimentos foram utilizados naquela seção.
a) Pesquisa bibliográfica
b) Pesquisa documental
c) Observação participante
c) Análise de conteúdo
d) Entrevistas estruturadas
e) Entrevistas não-diretivas
f) Aplicação de questionário
1.7 ESTRUTURA DA DISSERTAÇÃO
A dissertação está estruturada em 5 capítulos, sendo o primeiro de
introdução, no qual o problema é contextualizado.
No capítulo 2, apresento o referencial teórico e os conceitos
utilizados nesta pesquisa.
No capítulo 3, apresento o cenário da desigualdade de gênero no
campo da STEM a partir da revisão de literatura e situo meu trabalho
dentro dos estudos de gênero e tecnologia.
No capítulo 4, apresento um panorama geral de iniciativas que
buscam igualdade de gênero no campo da STEM e descrevo o objeto de
estudo, resgatando suas origens até os eventos estudados na pesquisa.
No capítulo 5, analiso os dados de campo a partir do quadro de
análise desenvolvido no capítulo 2.
Nas considerações finais, retomo os objetivos e principais
descobertas da pesquisa, suas contribuições e limitações, como também
indicando sugestões para futuras pesquisas.
39
2 REFERENCIAL TEÓRICO
O Django Girls é um espaço de compartilhamento de
conhecimento tecnológico primordialmente entre mulheres (alguns
homens participam como tutores). Nesse sentido, o objeto de estudo está
vinculado a questões de gênero e a análise deste objeto está concentrada
no design da mídia do conhecimento. Portanto, o referencial teórico deste
trabalho relaciona esses dois universos conceituais.
Para desenvolver este capítulo, utilizei a metodologia de pesquisa
bibliográfica, a partir de livros e artigos decorrentes de pesquisas
anteriores, utilizando “categorias teóricas já trabalhadas por outros
pesquisadores e devidamente registradas” (SEVERINO, 2007, p. 122).
De maneira que o objetivo é apresentar o quadro teórico-conceitual que
norteou a análise do objeto de estudo.
Apresento uma breve contextualização teórica de conceitos
articulados em minha análise. O capítulo está estruturado em duas seções:
na primeira, apresento o referencial teórico que aborda as questões de
gênero, pertinentes ao objeto de estudo. Na segunda parte, apresento o
referencial teórico sobre mídia do conhecimento e design, que dizem
respeito à abordagem analítica do objeto.
2.1 CONCEITOS - QUESTÕES DE GÊNERO
A principal motivação para a criação de um espaço como o Django
Girls é o fato de que os ambientes de educação, de trabalho e de produção
de tecnologia são considerados, em sua maioria, hostis às mulheres.
Estudos apresentados no capítulo 3 indicam essa tendência no campo da
STEM como um todo. Portanto, as questões de gênero são fundamentais
para compreender a constituição do meu objeto de estudo e seu contexto
dentro do campo da STEM. Assim, articulo os seguintes conceitos
teóricos na construção dos meus argumentos e análises: campo social,
gênero, empoderamento, agência, recepção midiática, mídia do
conhecimento, conhecimento e design para experiência.
Campo social
Conceito elaborado pelo sociólogo Pierre Bourdieu, o qual, em
linhas gerais, significa um espaço estruturado de relações de força entre
agentes ou instituições (dominantes e dominados). Tal espaço possui leis
gerais de funcionamento, mas também conta com leis e propriedades
particulares de cada campo.
Existem vários tipos de campo, como o campo político, o campo
científico, o campo das artes, entre outros, os quais podem se desdobrar
40
em diversos subcampos. Um campo se define através do estabelecimento
de interesses e de investimentos dos agentes e das instituições nele
envolvidas (BOURDIEU, 1984, p. 89–91). Ou seja, um campo social se
define por pessoas que conhecem as regras da disputa sobre certos
objetos, e que não podem ser percebidas por quem não foi formado para
entrar neste campo (BOURDIEU, 2001, p. 124).
Podemos dizer, então, que o campo é tanto um "campo de forças",
uma estrutura que constrange os agentes nele envolvidos, quanto um
"campo de lutas", em que os agentes atuam conforme suas posições
relativas no campo de forças, conservando ou transformando a sua
estrutura (BOURDIEU, 1996, p. 50).
Nesta pesquisa considero que STEM é um campo social,
constituído por relações de força entre os próprios agentes (profissionais,
professores/as, estudantes, cientistas, etc.) e entre agentes e instituições
(empresas, universidades, etc.). Conforme estabelecido na introdução,
STEM é um campo composto por microcampos das diferentes áreas do
conhecimento: ciência, tecnologia, engenharias e matemática, além de
microcampos de relações entre os agentes (trabalho, educação, produção
cientifica). Embora analise especificamente um workshop de
programação, entendo que as relações (sociais, culturais, políticas e de
poder) que se estabelecem no meu objeto de estudo transcendem o
subcampo da tecnologia e os subcampos da educação por razões que
desenvolvo ao longo do trabalho. Por esse motivo, ao invés de falar em
“mulheres na área de tecnologia”, prefiro usar o termo “mulheres no
campo da STEM”, por entender que foi observado um subcampo de
ensino de programação, que também diz respeito às relações de trabalho,
à produção de conhecimento científico-tecnológico e às outras áreas da
STEM.
Como todo campo, STEM é tanto um “campo de forças”, quanto
um “campo de lutas”. Considerando que STEM é uma área
majoritariamente composta por homens, conforme apresentado no
capítulo 3, o gênero é o que primeiro define quem são as “pessoas prontas
para disputar o jogo” (BOURDIEU, 2001, p.124). Não é a idade, não é a
raça, não é o tempo de experiência profissional, não é a titulação
acadêmica, não é a renda, nem nenhum outro marcador social que não o
sexo/gênero. Na STEM, as mulheres e outras minorias de gênero - como
Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transsexuais, Travestis, Pessoas não-
41
binárias, entre outras identidades de gênero, resumidas na sigla LGBT+6
-, são as dominadas.
Nós, mulheres atuantes no campo da STEM, estamos em uma
posição inferior tanto quantitativamente (em menor número), quanto
qualitativamente (não somos as lideranças, as produtoras, nem as
disseminadoras de conhecimento tecnológico) no “campo de forças”. Isso
nos leva a atuar no “campo de lutas” para que possamos transformar a
sua estrutura.
Gênero
A palavra “gênero” teve diversos usos e significados ao longo da
história. Adoto a perspectiva da teórica feminista Joan Scott (1995) em
seu texto “Gênero: uma categoria útil para análise histórica”, no qual ela
retoma alguns desses significados e elabora uma definição do termo
“gênero”. Essa definição é composta por duas proposições e diversos
subconjuntos que estão inter-relacionados: (1) o gênero é um elemento
constitutivo de relações sociais baseadas nas diferenças percebidas entre
os sexos e (2) o gênero é uma forma primária de dar significado às
relações de poder (SCOTT, 1995, p. 86).
Na primeira parte, sobre o gênero ser um elemento constitutivo de
relações sociais, Scott divide em 4 sub-partes:
(1) Símbolos culturalmente disponíveis que evocam
representações simbólicas,
(2) Conceitos normativos que expressam interpretações dos
significados dos símbolos, que tentam limitar e conter as suas
possibilidades metafóricas,
(3) A noção de fixidez que leva à aparência de uma permanência
intemporal na representação binária dos gêneros e
(4) A noção de Identidade Subjetiva, quando a autora explica
como as Identidades de Gênero são construídas a partir de formação de
conceitos/preconceitos imaginária e simbolicamente.
6
Considero que na posição de dominante estão os homens cis heterossexuais.
"Homens cis" são pessoas que nasceram com sexo masculino e se identificam
com o gênero masculino - nasceu homem e se vê como homem - e "homens
heterossexuais" são homens que se relacionam afetiva e sexualmente com
mulheres) e na posição de dominadas estão as mulheres e todas as pessoas
LGBT+. No entanto, meu trabalho é focado nas questões das mulheres,
portanto, a partir de agora vou me referir apenas às mulheres, embora
reconheça que todas as minorias de gênero constituem o mesmo grupo
"dominado" nesse campo de forças.
42
E na segunda parte ela diz: “o gênero é um campo primário no
interior do qual, ou por meio do qual, o poder é articulado. O gênero não
é o único campo, mas ele parece ter sido uma forma persistente e
recorrente de possibilitar a significação do poder no ocidente, nas
tradições judaico-cristãs e islâmicas” (SCOTT, 1995, p. 88).
Ou seja, o gênero não é sexo feminino ou masculino, mas sim uma
construção (em constante transformação) de símbolos, significados e
identidades que fazem parte das relações sociais. Sempre nos
relacionamos através do gênero, além disso, através do gênero é que se
articulam as relações de poder.
Nessa perspectiva, o gênero não é uma característica isolada de um
indivíduo, é sempre relacional: não existe mulher, se não existe homem.
Se uma coisa “não é de mulher” é porque ela é uma “coisa de homem”.
Se a mulher está numa posição subalterna nas tradições judaico-cristãs e
islâmicas, é porque o homem está numa posição de poder (SCOTT,
1995). Nesse sentido, não se tratam de “estudos da mulher” e sim estudos
sobre as "relações de gênero", pois o gênero só se constitui na relação
com o outro e, conforme essa relação se modifica, o próprio conceito do
gênero se modifica (SCOTT, 1995).
Portanto, ao refletir sobre o campo da STEM, especificamente a
tecnologia – que inclui ensinar (professores/as), aprender (alunos/as),
produzir (trabalhadores/as) e criar (cientistas, teóricos/as, linguagens de
programação) tecnologia – considero que todas essas relações (professor-
aluno, aluno-aluno, chefe-empregado, conhecimento-pessoas) são,
necessariamente, relações de gênero.
Empoderamento
Empoderamento é um termo amplo, que pode abordar diferentes
dimensões de poder, como econômica, humana e social, política e
cultural. “Pode ser relacionado a habilidades, oportunidades,
capacidades, pode estar relacionado ao indivíduo ou à coletividade”
(TORTATO, 2014).
No estudo de Cínthia Tortato (2014), o conceito de
empoderamento está relacionado às mulheres no contexto de um curso de
capacitação sobre questões de gênero para professoras mulheres da rede
básica de ensino. O presente trabalho está inserido no contexto de um
workshop de programação para mulheres, portanto, considero pertinente
apoiar-me em suas concepções acerca do termo, uma vez que relaciona
empoderamento com mulheres e aquisição de conhecimento.
Tortato (2014) entende o empoderamento como a conscientização
do valor de si e do trabalho para se combater as desigualdades. Segundo
43
a autora, o empoderamento pode ser sustentado pelo conhecimento
adquirido. É a partir da aquisição de conhecimento que as mulheres
tomam consciência não apenas das condições relacionadas às questões de
gênero mas, principalmente, daquelas relacionadas a si próprias. Assim,
ao compreenderem a situação das mulheres na sociedade, as mulheres
compreendem também sua própria situação cotidiana em diversos
âmbitos. A agência surge no momento em que as mulheres tomam
iniciativas pessoais e profissionais como consequência do
empoderamento sustentado pelo conhecimento (TORTATO, 2014).
O estudo de Cristina Rocha (2006) sobre questões de gênero na
tecnociência também traz abordagens sobre empoderamento que são
pertinentes ao objeto de estudo desta dissertação. Rocha (2006) diz que
as atividades relacionadas aos “contextos computacionais”,
especialmente à utilização de códigos e linguagens de programação,
trazem uma “sensação de empoderamento” (ROCHA, 2006, p. 115).
A autora também relaciona o empoderamento com a agência, a
partir da perspectiva de Tânia Swain (2005), pois para Rocha o
empoderamento sustenta a agência. Por esse motivo, é necessário
conscientizar as mulheres de que elas têm o poder de pensar e agir na
busca contínua da igualdade de gênero (ROCHA, 2006, p. 196).
Articulando a noção de agência com a noção de empoderamento,
Rocha (2006) demonstra como isso está presente no campo feminino da
STEM (ou tecnociência, como ela se refere):
A própria possibilidade de escolhas por parte das
mulheres não apenas quanto aos cursos mas
também quanto às profissões, implica em admitir
seu empoderamento. As escolhas expressam seu
agenciamento, e este transparece em níveis
diferenciados de poder (em suas funções de sócias,
de diretoras, de técnicas de computação), além de
níveis diferenciados de intenção e desejo no
prosseguimento e no cumprimento de metas e de
projetos (quando intencionam cursar níveis
superiores aos da graduação na área das exatas, por
exemplo). (ROCHA, 2006, p. 223)
Além de concordar com as autoras e reflexões teóricas citadas,
convém ressaltar que o empoderamento também faz parte da missão
organizacional do Django Girls, conforme descrição textual no site da
iniciativa: “Django Girls é uma organização sem fins lucrativos e uma
44
comunidade que empodera e ajuda as mulheres a organizar workshops
gratuitos de programação” (DJANGO GIRLS FOUNDATION, 2018a) .
Agência (gênero)
Na perspectiva dos estudos de gênero, o conceito de agência foi
definido por Sherry Ortner (2007), com base em dois campos de
significação. O primeiro deles está relacionado à intencionalidade e ao
fato de o campo perseguir projetos culturalmente definidos. O segundo
campo de significação diz respeito à agência e está relacionado ao poder
e ao fato de o campo atuar no contexto de relações de desigualdade,
assimetria e forças sociais. Vale ressaltar que estas duas faces do conceito
de agência se entrelaçam (ORTNER, 2007).
A intencionalidade refere-se a estados cognitivos orientados a um
determinado fim. Tais estados podem ser mais exatos como enredos,
planos e esquemas, metas e objetivos ou mais abstratos como vontades e
desejos (ORTNER, 2007, p. 52).
A agência é sempre cultural e historicamente construída, sendo
que todos os humanos têm capacidade de agência (ORTNER, 2007, p.
54). Ortner chama esse tipo de “agência de projetos”, constituída de
“intenções, propósitos e desejos formulados em termos de projetos
culturalmente estabelecidos” (ORTNER, 2007, p. 65).
Por outro lado, Ortner conceitua a “agência de poder”, como as
formas de poder que as pessoas têm à disposição, sua capacidade de
agirem em seu próprio nome, de influenciarem outras pessoas e de
controlarem suas próprias vidas. Além disso, a agência é pertinente tanto
na dominação quanto na resistência, uma vez que os dominados também
influenciam de certa forma os modos como os acontecimentos se
desenrolam (ORTNER, 2007, p. 64).
Para a autora, a “agência de poder” (tanto de dominantes quanto
de resistentes) atua para a realização de projetos fazendo da “agência de
projetos” a “dimensão mais fundamental da ideia de agência”. Portanto,
é essa agência (de projetos) que os menos poderosos procuram proteger
através da preservação de lugares, “literal ou metaforicamente, ‘nas
margens do poder’” (ORTNER, 2007, p. 65).
Em outras palavras, Ortner argumenta que a capacidade de agir
(agência de poder) está condicionada aos objetivos dessa ação (agência
de projetos), os quais são estabelecidos culturalmente. E, ao mesmo
tempo em que os dominantes perpetuam seus projetos através de sua
“agência de poder”, os menos poderosos criam lugares para alimentar
seus próprios projetos, que representam resistência à estrutura de poder
estabelecida.
45
2.2 CONCEITOS - ANÁLISE DO OBJETO
De acordo com o site oficial do projeto Django Girls, seu principal
objetivo é proporcionar uma experiência com o conhecimento
tecnológico que seja mais positiva para as mulheres: “Django Girls
organiza workshops gratuitos de Python e Django, cria tutoriais online de
código aberto e projeta incríveis primeiras experiências com tecnologia”
(DJANGO, 2019, tradução nossa)7
.
Com base nesta visão, Django Girls pretende criar uma
experiência diferenciada com a tecnologia através de workshops gratuitos
e tutoriais online. Esta iniciativa, como um todo, é entendida como uma
mídia do conhecimento nesta pesquisa. Dessa forma, é possível analisa-
la como um produto de design, cujo projeto pode ser centrado na
experiência das usuárias. Para isso, utilizo os seguintes conceitos:
Agência (mídia)
No campo de estudos da mídia, a agência tem um significado um
pouco diferente, mas ainda convergente, uma vez que também está
baseada na teoria da prática. Segundo Susanne Eichner, agência é uma
parte estrutural que age em nossas vidas, mas que depende das
disposições que mantemos e das estruturas que enfrentamos (EICHNER,
2014, p. 12), tradução nossa).
Eichner (ibid.) diz que a agência não é restrita à agência pessoal
ou individual, uma vez que suas dimensões estruturais se tornam
aparentes a partir da noção de relações de poder de Foucault. Para esta
autora, quem controla o conhecimento detém o poder.
Na argumentação de Eichner (ibid.), a agência enquanto modo de
experienciar a mídia não está restrita à experiência com videogames. Isso
porque grande parte dos trabalhos investigam a agência em jogos digitais,
como Janet Murray, para quem agência é o “poder satisfatório de tomar
ações significativas e ver os resultados de nossas decisões e escolhas”
(Murray 1997, p.126, tradução nossa).
7
Ao longo desta pesquisa, o site foi atualizado e o texto da página inicial foi
modificado. Essa frase estava no site disponível em: https://djangogirls.org/
acessado em 06 de março de 2019. A frase original é: Django Girls organize
free Python and Django workshops, create open sourced online tutorials and
curate amazing first experiences with technology.
46
A autora compreende também que a agência, como uma forma
especial de envolvimento com a mídia, está potencialmente presente em
todas as recepções midiáticas. Apesar das particularidades de cada mídia,
diferentes estudos indicam que o senso de agência, quando facilitado por
determinadas estratégias textuais, pode ocorrer em todas as recepções
midiáticas (EICHNER, 2014, p. 13).
Portanto, a agência da mídia se expressa na interação das usuárias
com o produto, que é uma mídia. Nesta pesquisa, o produto é a iniciativa
Django Girls como um todo, o que engloba sua ideia (concepção e
filosofia), o site, as comunidades online, os tutoriais; e, especialmente, as
interações que ocorrem durante o workshop – das alunas com o ambiente,
entre alunas e tutoras, entre alunas e computadores e linguagem de
programação, etc.
Recepção midiática
Segundo Eichner, a recepção de mídia é um processo de
significação que ocorre por meio da interação com o material simbólico
apresentado pela mídia. Por esse motivo, a mídia que é considerada uma
forma específica de ação e comunicação social (EICHNER, 2014, p. 12).
Marshall McLuhan entende a mídia ou o “meio” de comunicação
como qualquer extensão de nós mesmos, sendo, ele próprio, a mensagem.
Isto é meramente para dizer que as consequências
pessoais e sociais de qualquer meio - isto é, de
qualquer extensão de nós mesmos - resultam da
nova escala que é introduzida em nossos assuntos
por cada extensão de nós mesmos, ou por qualquer
nova tecnologia. (MCLUHAN, 1964, p. 9,
tradução nossa)
Mídia é, então, “a parte física da informação”, ou seja, “a parte
responsável pelo suporte, expressão e divulgação da informação
(comunicação) entre agentes humanos ou agentes tecnológicos”
(PERASSI, 2017, p. 1). Já a forma “é aquilo que é inteligível na
informação”, ou seja, é o que permite distinguir uma mancha em forma
de triângulo de uma mancha em forma de retângulo, embora ambas
estejam representadas na mesma mídia (PERASSI, 2017).
Informação: “é, portanto, a composição integrada de duas partes,
sendo uma expressiva (física) e a outra inteligível ou vivencial
(ideia/explícita ou sentimento/tácito)” (PERASSI, 2017).
47
Mídia do conhecimento
A mídia pode ser um composto com diversos elementos, que
“necessariamente interagem entre si de maneira autônoma ou induzida
pela ação dos agentes humanos”. Por esse motivo, argumenta Perassi
(2017), a mídia atua como um sistema, com interações e mudanças de
estado ao longo do tempo (PERASSI, 2017, p. 2). Um sistema mediador
completo realiza três funções: suporte, veículo e canal.
Ainda segundo Perassi, mídia do conhecimento são sistemas
mediadores que, de maneira autônoma, realizam associações de
informações, produzindo novas informações, como resultados do
processo associativo” (PERASSI, 2017). Segundo o autor, diferentes
profissionais se dedicam a “projetar e aplicar modelos de composição de
sistemas mediadores (mídia), a partir da reunião de agentes humanos
(pessoas) e agentes tecnológicos (máquinas)” (PERASSI, 2017, p.2).
A partir da definição de Perassi entendo no presente trabalho que
o Django Girls é uma mídia do conhecimento. Isso porque nesse contexto
o agente humano é tanto a mídia quanto o produtor da mídia. Além disso,
os agentes humanos também produziram agentes tecnológicos
(PERASSI, 2017, p.3),
De maneira autônoma, o sistema mediador (composto pelo
conhecimento tecnológico, pelo design do workshop e pela agência das
organizadoras e tutoras) realiza associações de informações (sobre
programação e sobre a condição das mulheres no campo da STEM), que
produzem novas informações como resultado desse processo associativo
(como o empoderamento e a agência das alunas).
Conhecimento
O conhecimento, segundo o EGC, é caracterizado de forma
multifacetada e apresenta:
múltiplos estados (tácito, implícito ou explícito),
diferentes lócus (humanos ou artefatos),
dimensões (individual, de grupo, organizacional,
interorganizacional ou em rede) e propriedades (é
gerenciável, é transmissível) (EGC, 2019).
Segundo Nonaka e Takeuchi (NONAKA; TAKEUCHI, 1997, p.
63–65), o “conhecimento, ao contrário da informação, diz respeito a
crenças e compromissos” é intencional, relacionado à ação humana e diz
respeito ao significado, ou seja, “é específico ao contexto relacional”.
48
O processo de criação do conhecimento ocorre em duas
dimensões: na ontológica, os autores dizem que o conhecimento só pode
ser criado por pessoas. Enquanto na dimensão epistemológica, o
conhecimento se distingue entre tácito – que é pessoal, específico ao
contexto e difícil de ser formulado – e explícito – que é codificado,
transmissível em linguagem formal e sistemática.
Design para experiência
O conceito de design para experiência, ou experience design, ou
user experience design, que se popularizou sob a sigla UX design, tem
origens um pouco difusas na literatura. Nesta pesquisa, ancorei o conceito
a partir de três pensadores: Donald Norman, Peter Wright e Marc
Hassenzahl.
Situando no tempo, as definições começaram mais ou menos na
mesma época, no início dos anos 2000. Em 2002, Donald Norman
afirmou que "todas as coisas artificiais são projetadas", desde a
disposição dos móveis em uma sala, uma trilha na floresta ou dispositivos
eletrônicos. Nem todas as “coisas artificiais” envolvem estruturas físicas,
como por exemplo serviços, aulas e estruturas organizacionais. Segundo
o autor, as regras de operação devem ser projetadas, algumas vezes
informalmente, outras vezes registradas e especificadas (NORMAN,
2002).
A partir disso, posso afirmar que existe um design para o Django
Girls, que se verifica em suas "regras de operação", tanto no serviço e no
conteúdo, quanto na composição dos objetos no local do workshop.
Conforme Norman, alguns elementos foram projetados informalmente
enquanto outros são explícitos, conforme mostrarei mais adiante.
O campo do design que adoto nesta pesquisa é o do Experience
design, que Norman conceitua como: “A prática de projetar produtos,
processos, serviços, eventos e ambientes com o foco voltado para a
qualidade e satisfação da experiência como um todo” (NORMAN, 2002,
p. 5, tradução nossa).
Para ele, o design diz respeito a como as coisas funcionam, como
elas são controladas, e a natureza da interação entre as pessoas e a
tecnologia. Assim, se o design for concebido respeitando-se seus
princípios e elementos, o resultado evoca uma estética agradável. O
contrário pode implicar num desacordo seja de seu uso ou de sua
significação. Ou, ainda, são impossíveis de usar, causando grande
frustração ou irritação (NORMAN, 2002, p. 5).
49
Por sua vez, Marc Hassenzahl (2010, p. 2, 2011, p. 4) entende que
a experiência é quase sempre mediada. Segundo o autor, as coisas que
mediam as experiências não são o seu oposto, mas criam e
substancialmente moldam tais experiências. A experiência se torna
"experiência do usuário" ou "user experience - UX" quando o foco de
análise são o mediador de experiências – que ele chama de produtos
interativos – e as respectivas experiências que emergem de tais
interações. Logo, um produto interativo pode ser tanto um serviço, um
produto, um evento ou, ainda, outras pessoas.
Seguindo esse raciocínio, posso dizer que o Django Girls é um
grande mediador que contém um serviço (ensinar a programar), um
produto (a iniciativa como um todo), um evento (o workshop) e outras
pessoas (organizadoras, tutoras, alunas). Hassenzahl (2010, p. 2-3)
salienta a importância de analisar cada uma dessas fontes de interação na
medida em que oferecem diferentes formas de criar e moldar
experiências.
Essa abordagem considera que a experiência deve ser colocada
como foco do design. Só é possível determinar os requisitos do projeto a
partir de um entendimento pleno do que se espera que o usuário
experiencie. Atualmente, é conhecida pelos termos “design centrado no
usuário” ou “human-centered design”.
Peter Wright publicou, juntamente com John McCarthy e Lisa
Meekison, um estudo sobre a experiência, especificamente a experiência
ao interagir com ou através da tecnologia. Os autores sugerem que tentar
analisar a experiência de uso pode ser um ponto de partida para
compreender por que um produto ou design é mais agradável de usar
(WRIGHT; ET.AL., 2004, p. 43).
No entanto, Wright, McCarthy e Meekison (2004, p. 52)
argumentam que não é possível projetar uma experiência, portanto, não é
possível fazer um design da experiência do usuário. Ancorados nas
perspectivas de Dewey e Bakhtin, os autores entendem que a experiência
é “tanto o produto do que os usuários trazem para a situação quanto é
sobre os artefatos que participam da experiência”. A experiência é dada
numa perspectiva relacional e dialógica. É sempre uma relação entre o
usuário e o produto. Por isso, esses autores defendem a ideia de que é
possível fazer, através de uma compreensão sensível e habilidosa dos
usuários, um design para a experiência.
Projetando para a experiência
Embora os elementos de design possam ser identificados e
categorizados no Django Girls, cada mulher que ajudou a criar o
50
workshop e cada mulher que participou tem sua trajetória e, portanto,
cada experiência vivida nos workshops é única. Mas, mesmo assim, é
possível fazer um esforço teórico para compreender como as duas
dimensões (o gênero e o design) se relacionam dentro do Django Girls e
fazem dele uma experiência mais inclusiva para as mulheres. O
pressuposto, conforme já comentei na introdução, é de que o design (tanto
físico quanto intangível) do Django Girls cria um ambiente mais
favorável para o compartilhamento de conhecimento entre as mulheres,
gerando, assim, um sentimento de pertencimento ao campo da STEM.
O design para a experiência, dizem Wright, McCarthy e Meekison
(2004, p. 52), requer que a/o designer tenha meios para “ver e falar sobre
a experiência, analisar as relações entre as partes e entender como a
tecnologia participa para fazer essa experiência satisfatória”. Por isso, os
autores criaram um framework que não analisa a experiência, mas serve
como ferramenta para falar sobre a experiência. Nessa perspectiva, não
seria possível projetar uma experiência, afinal analisar uma experiência é
algo muito subjetivo e específico, pois cada experiência é única.
Entretanto, é possível concretizar e sistematizar alguns elementos para
que o entendimento da experiência fique mais palpável e, assim,
projetável.
Marc Hassenzahl (2010, p. 6) segue a mesma linha de raciocínio
proposta por Wright, McCarthy e Meekison (2004) e argumenta que a
experiência é uma qualidade emergente, que não é totalmente redutível a
seus elementos e processos subjacentes, nem totalmente explicável por
eles, mas que pode ser moldada através de uma cuidadosa elaboração de
elementos. Ou seja, a experiência vivida no Django Girls é, em parte,
única e individual, mas também pode ser moldada através de elementos
como a concepção do workshop, o conteúdo, a disposição dos objetos,
etc.
A abordagem teórica do framework de Wright, McCarthy e
Meekison (2004) é de Dewey (1925; 1934), que é holística,
construcionista e pragmática. O conceito de experiência não tem um
consenso, mas Wright, McCarthy e Meekison (2004, p. 44) entendem
como sendo as relações entre pessoas e tecnologia. Dewey entende a
experiência de forma holística, no sentido de que não há divisão entre
sujeito e objeto e, sim, a totalidade irredutível de pessoas agindo,
sentindo, pensando e atribuindo significados em um contexto, incluindo
suas percepções sobre as próprias ações.
Essa visão holística de Dewey é compreendida pelos autores
(WRIGHT; MCCARTHY; MEEKISON, 2004, p. 46) a partir do conceito
de dialogismo de Bakhtin (1986, 1993), que argumenta que na atividade
51
humana sempre existe pelo menos duas consciências envolvidas. Bakhtin
diz que nós atribuímos significados a uma experiência a partir da nossa
experiência com nós mesmos, nossa cultura e nossa vida. Se uma
experiência não pode ser integrada na “minha vida”, se ela não condiz
com minha percepção de mim mesma, provavelmente será uma
experiência menos envolvente (WRIGHT; MCCARTHY; MEEKISON,
2004, p. 45).
O conhecimento dialógico é sempre relacional. O conhecimento
de si emerge da expressão das relações de si com os outros. E o
conhecimento sobre um objeto emerge da expressão das relações do
sujeito com o objeto. Para os autores, isso significa que qualquer discurso
sobre a experiência é sempre “social, plural e perspectivista” que, nos
termos de Bakhtin, é inter animada com os discursos dos outros
(WRIGHT; MCCARTHY; MEEKISON, 2004, p. 45).
Framework de análise
Na visão de Dewey, a experiência é essencialmente holística,
situada e construída. Mas ela precisa ser descrita de forma que se possa
compreender. Por isso, Wright, McCarthy e Meekison (2004) descrevem
experiência a partir de quatro pontos de vista, que eles chamam no texto
de aspectos (threads) e, na segunda parte, demonstram como as pessoas
atribuem significado a uma experiência (making sense in experience). Os
autores entendem esses quatro aspectos da experiência como fios
entrelaçados compondo uma trança.
2.2.7.1 Os quatro aspectos da experiência
Composição
É a composição estrutural de uma experiência, uma interação que
se revela envolvendo a si mesma e os outros. Pode ser pensado como uma
estrutura narrativa, as possibilidades de ação, plausibilidade,
consequências e explicações de ações. É quando a usuária se pergunta o
que aconteceu, o que vai acontecer em seguida, sobre o que é isso, etc.
Sensorial
É o “look and feel”, a parte visual, sensorial, e, mesmo que não
possa ser descrita com precisão, é algo que pode afetar a nossa decisão a
respeito da experiência. Esse aspecto é responsável por sensações como
emoção, medo, excitação. E também sentimentos como entrar numa sala
e acha-la acolhedora, uma sensação de pertencimento, uma ligeira
sensação de desconforto ou embaraço numa conversa.
52
Emocional
É como nos sentimos na experiência. Pode evocar raiva, alegria,
desapontamento, frustração, desespero, etc., como também coisas mais
sutis como realização, satisfação, diversão. As emoções podem ser
sentidas a partir da nossa própria experiência ou através da empatia. sentir
emoções em função da experiência dos outros, como por exemplo,
personagem de um filme ou até mesmo o vendedor de uma loja online,
mesmo que ele não esteja fisicamente presente.
Os autores também alertam para o fato de que as emoções não são
apenas respostas passivas, pois muitas de nossas ações são motivadas por
aspectos emocionais, como compaixão ou moralidade.
Espaço-tempo
Toda experiência tem um aspecto espaço-tempo, pois as ações e
os eventos acontecem num determinado espaço e em um determinado
momento. Por exemplo, quando estamos emocionalmente envolvidos,
podemos alterar nossa percepção de tempo e ter a sensação de que o
tempo voa. O ritmo de uma experiência pode aumentar ou diminuir,
assim como a percepção do espaço pode se ampliar ou se fechar (se sentir
confinado) (p. 48). É através do aspecto de espaço-tempo que
diferenciamos espaços públicos e privados, reconhecemos zonas de
conforto e os limites entre nós e os outros, ou presente e futuro. E isso
influencia nos resultados da experiência, como a vontade de ficar ou
revisitar lugares ou a vontade de se envolver em uma troca de
informações, serviços ou bens.
2.2.7.2 Atribuindo significado à experiência
As pessoas constroem ativamente a experiência através de um
processo de significação (sense making) e não através de algo dado,
pronto. É um processo reflexivo e recursivo. É reflexivo porque a
experiência é vista sempre a partir do ponto de vista de alguém. E é
recursivo porque estamos sempre envolvidos em dar sentido. Mesmo
quando nós refletimos sobre uma experiência passada, nós estamos tendo
uma experiência.
Os itens do “sense making” não são linearmente relacionados em
causa e efeito. Os itens podem se relacionar não-linearmente, como a
antecipação influenciar na resposta sensorial.
Antecipação
Ao analisar uma experiência, temos que considerar o que vem
antes e depois que ela termina. Nós trazemos todo tipo de expectativas,
53
possibilidades e formas de dar sentido para um episódio. Podemos ter a
sensação de apreensão ou possivelmente de excitação. Os autores
afirmam ainda que nós podemos esperar que a experiência ofereça certas
possibilidades de ação ou certos resultados, como o desejo de satisfazer
certas necessidades. Nós antecipamos o caráter espacial e temporal de
uma experiência. Mas a antecipação não é só o que vem antes da
experiência em si (por exemplo, o dia do workshop). Os aspectos
sensoriais e emocionais da antecipação e nossa expectativa sobre a
estrutura composicional e espaço-temporal também ajuda a dar forma à
experiência, no sentido de que nossa antecipação está constantemente
sendo revisada e se relaciona com a atualidade da experiência. Assim, a
relação entre antecipação revisada e atualidade é que cria o espaço da
experiência (WRIGHT; MCCARTHY; MEEKISON, 2004, p. 49).
Conexão
É a primeira impressão, é sensorial, pré-linguística. No aspecto de
espaço-tempo, a conexão pode ser percebida como uma percepção de
velocidade ou de abertura, por exemplo. Já no aspecto sensorial, a
conexão pode se dar através de uma sensação de tensão ou a emoção de
uma novidade. Os aspectos emocionais e causal pode provocar um senso
de alívio ou antecipação de algo vai acontecer.
Interpretação
Dar sentido a uma experiência que está acontecendo implica nos
aspectos composicionais e emocionais na medida em que discernimos
sua estrutura narrativa, os agentes e as possibilidades de ação. Também
diz respeito a como isso se relaciona com nossos desejos, esperanças e
medos, assim como nossas experiências prévias. Podemos nos sentir
desapontados caso nossas expectativas tenham sido frustradas ou
podemos nos arrepender de estar naquela situação e querer sair dela. Se
nossa interpretação estiver aquém da nossa antecipação, podemos refletir
sobre nossas expectativas e alinhá-las para a nova situação. (WRIGHT;
MCCARTHY; MEEKISON, 2004, p. 49).
Reflexão
Nós fazemos julgamentos e atribuímos valores sobre as
experiências que estamos vivendo. Refletindo sobre o aspecto causal,
podemos nos perguntar se estamos satisfeitos com o senso de progresso
na experiência. Do ponto de vista emocional, estamos tendo satisfação ou
realização? Na perspectiva sensorial podemos estar ansiosos, entediados
ou animados. Além de refletir durante a experiência, refletimos sobre a
54
experiência depois que ela aconteceu. Os autores explicam que criamos
um diálogo interno, que é uma forma de recontar internamente e isso
ajuda a relatar a experiência para os outros de forma mais avaliativa.
(WRIGHT; MCCARTHY; MEEKISON, 2004, p. 49).
Apropriação
A apropriação é quando relacionamos uma experiência com
experiências passadas e futuras. Ao se apropriar de uma experiência
fazemos dela a nossa experiência. A relacionamos com nossa percepção
de nós mesmos, nossa história pessoal e nossas esperanças para o futuro.
E podemos acabar mudando nossa percepção de nós mesmos em função
de uma experiência ou ela pode ser apenas mais uma. No aspecto
emocional, por exemplo, podemos ter uma experiência de “flow” e
engajamento jogando um jogo que seja catártico. Do ponto de vista da
composição podemos relacionar uma experiência com a percepção de nós
mesmos, como moralidade ou socialmente aceitável (WRIGHT;
MCCARTHY; MEEKISON, 2004, p. 50).
Recontar
Para recontar uma experiência, precisamos ir além da experiência
imediata e considerá-la no contexto de outras experiências. Através de
um processo interno de recontar nós refletimos e nos apropriamos das
experiências e, uma vez apropriada, é natural contar para os outros. Ao
recontar para os outros, nós acabamos saboreando de novo, encontrando
novas possibilidades e novos significados e normalmente isso nos leva a
querer repetir a experiência. Uma mesma experiência ganha diferentes
significados e a ela são atribuídos diferentes valores, dependendo do
contexto (tempo e espaço) em que recontamos. Ao contar para os outros,
lemos uma resposta avaliativa dos outros que acaba modificando nossa
própria avaliação. Ou seja, podemos ressignificar e reviver uma
experiência ao recontá-la.
2.3 SÍNTESE DO CAPÍTULO
Neste capítulo busquei relacionar as diferentes áreas de estudo que
compõem esta pesquisa interdisciplinar na criação de um quadro teórico.
No capítulo seguinte, apresento o cenário da desigualdade de gênero no
campo da STEM a partir da revisão de literatura, bem como as categorias
de estudos sobre o tema.
55
3 AS QUESTÕES DE GÊNERO NO CAMPO DA STEM
Conforme argumentei na introdução desta dissertação, o campo da
STEM se constituiu, histórica e culturalmente, como um espaço
masculino, branco, heteronormativo e de classe média/alta. No passado,
as mulheres eram simplesmente proibidas de participar do campo,
conforme declara Fabiane Lima:
[...] a partir do século XVII, em um processo que
se estendeu e se consolidou no século XIX, as
mulheres foram formalmente proibidas de
frequentar ambientes acadêmicos e de pesquisa e
passaram a atuar como assistentes anônimas.
(LIMA, 2014)
A desigualdade de gênero, portanto, é uma característica que
acompanhou o desenvolvimento da área da STEM, desde o surgimento
até os dias correntes.
Na atualidade, ainda existem menos mulheres do que homens
trabalhando no campo da STEM. Como veremos na revisão de literatura
e nos dados de pesquisa que são apresentados neste capítulo, até hoje as
mulheres ganham menos do que os homens nas mesmas funções, ainda
que possuam as mesmas qualificações; e também há menos mulheres nas
posições de liderança nas empresas. Além disso, grande parte dos
professores nas áreas tecnológicas são homens e a maioria dos alunos dos
cursos de computação são homens. Como consequência, há menos
mulheres produtoras de conhecimento científico-acadêmico e há menos
mulheres sendo citadas nas produções científicas nesta área, pois a
maioria das linguagens de programação foram escritas por homens.
Neste capítulo, então, apresento uma revisão integrativa da
literatura, com estudos qualitativos e quantitativos sobre as questões de
gênero no campo da STEM. O objetivo é desenhar o cenário em que os
estudos relacionam essas duas áreas, gênero e STEM, conhecendo os
principais temas. Com isso, pretendo encontrar evidências que ancorem
os argumentos necessários ao desenvolvimento da minha pesquisa. Por
fim, situo a minha pesquisa dentro do campo de estudos sobre gênero e
tecnologia.
Os procedimentos metodológicos utilizados embasaram-se na
pesquisa bibliográfica (FREIRE, 2013; SEVERINO, 2007). O capítulo
foi organizado da seguinte forma:
a) Apresentação da revisão integrativa da literatura e dados
quantitativos: com base na pesquisa bibliográfica e no
levantamento de dados quantitativos sobre gênero e STEM.
56
b) Análise geral dos resultados, agrupando os dados e os estudos
em quatro eixos temáticos.
c) Apresentação das principais evidências para ancorar os
argumentos de pesquisa.
d) Situar o trabalho no campo de estudos interdisciplinares sobre
gênero e STEM no eixo temático da experiência.
3.1 REVISÃO INTEGRATIVA DA LITERATURA
Ao longo do período de pesquisa (2017-2019), realizei buscas em
bases de dados e consultei relatórios de pesquisas quantitativas. Algumas
buscas foram a partir de sintaxes específicas, enquanto outras, em bases
menores e mais pontuais, foram exploratórias. Além disso, pude contar
com o apoio de pesquisadoras da área de gênero na indicação de materiais
pertinentes. Pesquisei dados e estudos com interseções entre questões de
gênero, tecnologia e, eventualmente, educação.
Os termos buscados com relação a gênero foram: gênero, gender,
gender gap, woman, women, mulher, mulheres.
Os termos buscados com relação à tecnologia foram: STEM,
technology, code, programming, computing, informática, programação,
tecnologia.
Os termos buscados com relação à educação foram: education,
educação, ensino, aprendizagem, aprendizado.
Os resultados foram sistematizados nos quadros 1 e 2, a seguir:
Quadro 1 - Revisão bibliográfica
Artigos científicos e livros Resultados
1. Bases de dados científicos
1.1. Scopus Sintaxe: TITLE ( ( "gender gap"; OR "woman"
) AND ( "stem" OR "technology" ) AND
"education" ) AND ( LIMIT-TO ( SUBJAREA
, "SOCI" ) OR LIMIT-TO ( SUBJAREA ,
"COMP" ) OR LIMIT-TO ( SUBJAREA ,
"ARTS" ) ) AND ( LIMIT- TO ( LANGUAGE
, "English" ) OR LIMIT-TO ( LANGUAGE ,
"Portuguese" ) )
Total: 29 Selecionados: 10
1.2. ACM Sintaxe: (+code +AND +(woman +OR
+women +OR +gender)). Total: 18
57
Selecionados: 18
Sintaxe: (+(code +OR +programming +OR
+computing) +(women +OR +woman +OR
+gender)). Total: 5 Selecionados: 5
Sintaxe: (women + code). Total: 76
Selecionados: 2
Total de todas as sintaxes: 25
Total selecionados: 4
1.3. Scielo Sintaxe: mulher OR mulheres OR gênero
[Todos os índices] and educação OR ensino OR
aprendizagem OU aprendizado [Todos os
índices] and informática OR programação OR
tecnologia [Todos os índices] Total: 147
Selecionados: 6
Total selecionados: 0
1.4. Google Acadêmico Sintaxe: ("ensino programação" mulher), só em
português, de 2015-2018
Total: 131 Selecionados: 8
1.5. Science Direct - Revista
Computers & Education
Sintaxe: (gender OR women OR woman, Title,
abstract, keywords) de 2015-2018
Total: 66 Selecionados: 17
2. Grupos de pesquisa e periódicos nacionais
2.1. Revista de Estudos Feministas
- UFSC
Total: 26
Selecionados: 9
2.2. Cadernos Pagu - Unicamp Total: 4
Selecionados: 4
2.3. Cadernos Gênero e Tecnologia
- UTFPR, programas das
disciplinas do PPG em Tecnologia
e Sociedade relacionadas a gênero
e teses e dissertações do programa
relacionadas a gênero e tecnologia
Cadernos Gênero e Tecnologia: 10
Disciplinas e teses: 15
Total selecionados: 25
2.4. Outros:
IBICT - UFRJ
Pandora - UFRN
GIG@ - UFBA
Total selecionados: 4
3. Indicações de pesquisadoras da área de gênero
3.1. Coorientadora de pesquisa:
Dra. Maria Collier de Mendonça
Total: 8
Selecionados: 6
3.2. Professora e assistente pós-
doutoranda da disciplina de
Total: 42
Selecionados: 4
58
Relações de Gênero: Dra. Miriam
Grossi e Dra. Soraia Mello
4. Outros
Pesquisas livres, a partir de
referências de textos, etc.
Total: 11
Total 102
Quadro 2 - Relatórios de dados quantitativos
Dados Quantitativos Descrição
Aschcraft et al., 2016. Women
in tech: the facts 2016 update.
National Center for Women &
Information Technology
(NCWIT), 2016
Relatório elaborado pelo National Center for
Women & Information Technology (NCWIT),
organização sem fins lucrativos norte-americana.
Os dados referem-se ao campo da tecnologia nos
Estados Unidos.
BARRETO, 2014. A Mulher No
Ensino Superior: Distribuição E
Representatividade. Cadernos do
GEA, Rio de Janeiro, 2014.
Estudo realizado por Andreia Barreto para o
Grupo Estratégico de Análise da Educação
Superior no Brasil, sobre a presença das mulheres
na educação superior com base dados recentes
oriundos do Censo da Educação Superior (INEP,
2012) e do Exame Nacional de Desempenho dos
Estudantes – Enade (INEP, 2011).
Elsevier, 2017. Gender in the
global research landscape.
Analysis of research
performance through a gender
lens across 20 years, 12
geographies, and 27 subject
areas.
Relatório elaborado pelo Grupo Elsevier,
referenciando dados de larga escala para
monitorar vários aspectos da pesquisa global ao
longo de 20 anos, em 12 países, abordando 27
temáticas (ELSEVIER, 2017, p. 6). Neste
capítulo, cito dados referentes ao Brasil.
HILL, Catherine et al., 2010.
Why So Few? Women in
Science, Technology,
Engineering, and Mathematics.
Washington, DC: AAUW, 2010.
Relatório elaborado pela American Association of
University Women (AAUW) sobre ensino nos
Estados Unidos, desde a escola básica até as
universidades, focado em mulheres na área de
STEM. Os dados incluem diferentes fontes
(estadunidenses) e o relatório foi publicado em
2010. Nesta dissertação, utilizo a definição de
STEM e alguns dados do cenário estadunidense.
IBGE, 2018. Estatísticas de
gênero: indicadores sociais das
mulheres no Brasil
Informativo elaborado pelo Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE) com dados de
abrangência nacional sobre indicadores sociais
59
referentes a mulheres. Nesta pesquisa, utilizo
indicadores referentes a trabalho e educação.
IBGE, 2017. PNAD contínua -
outras formas de trabalho
Informativo elaborado pelo Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE) com dados de
abrangência nacional sobre trabalho. Neste
capítulo, citamos dados referentes a inserção das
mulheres no mercado de trabalho.
IBGE, 2009 - PNAD 2009
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
(PNAD) realizada pelo Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE) e publicada no ano
de 2009. Os dados utilizados são de abrangência
nacional e se referem ao tema trabalho e
educação das mulheres.
INEP, 2007. Simpósio “gênero e
indicadores da educação superior
brasileira”.
Publicação do Instituto Nacional de Estudos e
Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP)
com diversos estudos sobre questões de gênero,
bem como análises de indicadores referentes ao
tema. Os dados são de abrangência nacional e
foram auditados até o ano de 2007.
INEP, 2018. Censo da Educação
Superior 2017.
Divulgação de dados de abrangência nacional,
coletados no Censo da Educação Superior em
2017 pelo Instituto Nacional de Estudos e
Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP).
SOCIEDADE BRASILEIRA
DE COMPUTAÇÃO, 2016.
Educação Superior em
Computação - Estatísticas 2016
Relatório compilado pela Sociedade Brasileira de
Computação (SBC) com base em dados nacionais
fornecidos pelo INEP, publicados no Censo 2016.
"As estatísticas mostram o estado quantitativo da
Educação Superior em Computação no país desde
2001, vistas a partir do ano 2016" (SBC, 2016, p.
1).
UN Women, 2015. Progress of
the World’s Women 2015-2016.
Relatório publicado pela United Nations Entity
for Gender Equality and the Empowerment of
Women (UN Women) com dados internacionais e
brasileiros sobre o progresso das mulheres no
mundo.
UFSC, 2018. Estatística de
graduação.
Estatísticas regionais referentes aos cursos de
graduação em Ciências da Computação e
Sistemas de Informação da Universidade Federal
de Santa Catarina (UFSC), fornecidas pela
Secretaria de Tecnologia (SETIC) da
universidade.
Total 12
60
3.2 ANÁLISE GERAL DOS RESULTADOS
Ao analisar os resultados, percebi que os estudos e dados
relacionados à interseção entre gênero, tecnologia e educação
contemplam temas ligados ao trabalho, à produção científica e
tecnológica, à educação e também sobre a experiência de mulheres na
STEM.
Os estudos sobre trabalho abordam questões como diferença
salarial entre homens e mulheres, cargos e lideranças, divisão sexual do
trabalho, trabalho e cuidados domésticos, carreiras. Optei por separar em
outra categoria os estudos e dados sobre a produção científica e
tecnológica porque são sempre permeados por subjetividades, inclusive
questões de gênero. A ciência e a tecnologia, como linguagens de
programação, são os instrumentos de trabalho no campo da STEM e
considero relevante saber quem são as pessoas que as produzem.
Os estudos sobre educação trazem dimensões tanto de ensino
quanto de aprendizagem, bem como alguns relatos de iniciativas para
inclusão de mulheres que foram realizadas em escolas ou universidades.
Os dados quantitativos apresentam as diferenças entre os números de
alunos e alunas, especialmente no ensino superior.
Essas três categorias já eram esperadas, pois os parâmetros das
pesquisas relacionavam essas temáticas. No entanto, percebi que alguns
estudos falavam especificamente sobre as experiências de mulheres e
meninas em relação ao campo da STEM, seja como aluna, seja como
profissional no mercado de tecnologia ou, ainda, como professora e
pesquisadora. Como minha análise é focada na experiência das mulheres,
criei uma categoria especial para essas pesquisas que falam sobre o “ser
mulher” na tecnologia.
Dessa forma, os resultados da revisão integrativa da literatura
dividem-se em quatro categorias: (1) educação, (2) trabalho, (3)
produção científica e tecnológica e (4) experiência. Existem outros
subcampos do campo da STEM, no entanto, esses são os que identifiquei
e escolhi abordar por estarem diretamente relacionados ao objeto de
análise desta dissertação, o Django Girls.
Em certa medida, o Django Girls está relacionado à educação, pois
é um workshop cujo objetivo é ensinar mulheres a programar um site com
a linguagem Python através do framework Django. Está fortemente
conectado com o mercado de trabalho, tanto por trazer instrutoras que não
são professoras e, sim, profissionais atuantes no mercado de tecnologia,
quanto por promover um networking que se mostrou efetivo,
(re)colocando mulheres no mercado após o evento.
UX Design e gênero: Como o Django Girls empodera mulheres na tecnologia
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UX Design e gênero: Como o Django Girls empodera mulheres na tecnologia

  • 1. Desirée Sant’Anna Maestri UX DESIGN, GÊNERO E TECNOLOGIA: A MÍDIA DO CONHECIMENTO COMO INSTRUMENTO PARA INCLUSÃO DE MULHERES Dissertação submetida ao Programa de Pós-Graduação em Engenharia e Gestão do Conhecimento da Universidade Federal de Santa Catarina para a obtenção do Grau de mestre em Engenharia e Gestão do Conhecimento Orientadora: Profa . Dra . Luciane Maria Fadel Coorientadora: Profa . Dra . Maria Collier de Mendonça Florianópolis 2019
  • 2. Ficha de identificação da obra elaborada pelo autor, através do Programa de Geração Automática da Biblioteca Universitária da UFSC. Maestri, Desirée Sant'Anna UX DESIGN, GÊNERO E TECNOLOGIA : A MÍDIA DO CONHECIMENTO COMO INSTRUMENTO PARA INCLUSÃO DE MULHERES / Desirée Sant'Anna Maestri ; orientadora, Luciane Maria Fadel , coorientadora, Maria Collier de Mendonça , 2019. 183 p. Dissertação (mestrado) - Universidade Federal de Santa Catarina, Centro Tecnológico, Programa de Pós Graduação em Engenharia e Gestão do Conhecimento, Florianópolis, 2019. Inclui referências. 1. Engenharia e Gestão do Conhecimento. 2. Gênero. 3. Programação. 4. STEM. 5. Django Girls. I. , Luciane Maria Fadel. II. , Maria Collier de Mendonça. III. Universidade Federal de Santa Catarina. Programa de Pós-Graduação em Engenharia e Gestão do Conhecimento. IV. Título.
  • 3. Desirée Sant’Anna Maestri UX DESIGN, GÊNERO E TECNOLOGIA: A MÍDIA DO CONHECIMENTO COMO INSTRUMENTO PARA INCLUSÃO DE MULHERES Esta Dissertação foi julgada adequada para obtenção do Título de “Mestre em Engenharia e Gestão do Conhecimento” e aprovada em sua forma final pelo Programa de Pós-Graduação em Engenharia e Gestão do Conhecimento Florianópolis, 04 de abril de 2019. ___________________________________ Prof.ª Roberto Carlos dos S. Pacheco, Dr. Coordenador do Curso Banca Examinadora: _____________________________________ Prof.ª Luciane Maria Fadel, Dr.ª Orientadora Universidade Federal de Santa Catarina _____________________________________ Prof. ª Marilia Abrahão Amaral, Dr ª. Universidade Tecnológica Federal do Paraná _____________________________________ Prof ª. Vania Ribas Ulbricht, Dr ª. Universidade Federal de Santa Catarina _____________________________________ Prof ª. Gertrudes Aparecida Dandolini, Dr ª. Universidade Federal de Santa Catarina
  • 4.
  • 5. Este trabalho é dedicado a todas as mulheres que lutaram para que hoje eu pudesse escrevê-lo.
  • 6.
  • 7. AGRADECIMENTOS Agradeço às pessoas que, de alguma forma, tornaram essa caminhada mais leve e me ajudaram a concluí-la. À minha orientadora, Luciane Fadel, por aceitar o desafio de orientar (uma aluna e) um tema tão complexo. E, principalmente, por acreditar junto comigo. Tua orientação, carinho e bom humor me trouxeram até aqui. À minha coorientadora, Maria Collier, por toda dedicação na revisão, indicações de leitura e mensagens de apoio. À minha mãe, Carmem Janice – a primeira programadora que conheci – pela inspiração e, especialmente, por todo o processo que passamos juntas entre o início e o final deste trabalho. À minha avó Célia e também à toda minha família, pelo amor e apoio de sempre. Às minhas e meus colegas do EGC pelo companheirismo ao longo do curso e por me levarem de cadeira de rodas e muletas para apresentar minha pesquisa no Painel Científico com o pé quebrado. Aos meus colegas do Hiperlab e das diversas disciplinas, por compartilhar a rotina da pós-graduação, o café e os pensamentos. Às mulheres incríveis do mundo da tecnologia que conheci ao longo da minha atuação e da minha pesquisa. Em especial àquelas que fizeram o Django Girls acontecer: Talita, Monalisa, Alana e Paula. Às amizades que construí em Florianópolis, especialmente àquelas que me apoiaram na reta final: Geórgia, Janaína, Gabriel, Patrícia B., Joel, Juliana, Isadora e Danieli. Às amizades que levo em meu coração: Débora, Lígia, Patrícia C., Tânia, Roberta, Kátia, Gustavo, Rafael, Guilherme, Aline, Maurício e Renato. À minha psicóloga Maria Isabel e à minha professora de yoga Vivian. Vocês foram fundamentais para que eu mantivesse a saúde mental e a força para seguir. Agradeço também pela oportunidade de ter estudado em uma universidade pública e gratuita, num programa de Excelência Acadêmica da CAPES, que disponibilizou bolsa de pesquisa durante meu segundo o ano de mestrado.
  • 8.
  • 9. me levanto sobre o sacrifício de um milhão de mulheres que vieram antes e penso o que é que eu faço para tornar essa montanha mais alta para que as mulheres que vierem depois de mim possam ver além (legado, Rupi Kaur)
  • 10.
  • 11. RESUMO A área de Science, Technology, Engineering and Mathematics (STEM) é um campo social marcado pela desigualdade de gênero. A partir disso, esta pesquisa considera o gênero como uma categoria de análise para compreender iniciativas que buscam incluir mulheres. O projeto analisado foi o Django Girls, um workshop de programação em Python para mulheres. O pressuposto é de que o design (tanto físico quanto intangível) do Django Girls cria um ambiente mais favorável para o compartilhamento de conhecimento entre as mulheres, gerando um sentimento de pertencimento ao campo da STEM. Muitos estudos indicam a importância do ambiente de ensino para a inclusão e permanência das mulheres na área. Porém, há uma lacuna na análise dessa experiência sob a perspectiva do design, bem como sua relação com a mídia. Desse modo, o objetivo desta pesquisa foi analisar a mídia Django Girls com base em conceitos do design para a experiência enquanto um espaço que propicia a criação de agência e de empoderamento das mulheres envolvidas. Para isso, foi realizada uma revisão bibliográfica e documental para contextualizar essa desigualdade de gênero. O quadro teórico de análise foi construído sob a perspectiva integrada de conceitos de gênero, agência e empoderamento relacionados à tecnologia, bem como conceitos relacionados à mídia do conhecimento, agência na mídia e, por fim, conceitos acerca do design para experiência. A pesquisa de campo incluiu estudo de caso, entrevistas, aplicação de questionário e uma etapa de observação participante, contemplando duas edições do Django Girls ocorridas em Florianópolis em 2017 e 2018. Percebeu-se que o objetivo do curso extrapola o ensino de programação, configurando-se como um espaço para o compartilhamento de experiências de ser mulher na tecnologia. Como consequência, observou- se a sensação de empoderamento e o ganho de agência entre as participantes. Portanto, o gênero, enquanto categoria de análise, apresenta-se de forma espiral. Ao mesmo tempo em que é a motivação para a criação de projetos como o Django Girls, é também o catalizador de transformações na estrutura do campo social da STEM ao incluir mulheres mais conscientes de sua posição de desigualdade, dispostas a mudarem este cenário. Palavras-chave: Gênero. Programação. STEM. Django Girls. Python.
  • 12.
  • 13. ABSTRACT The area of Science, Technology, Engineering and Mathematics (STEM) is a social field marked by gender inequality. For this reason, this research considers gender as a category of analysis to understand initiatives that seek to include women. The iniciative analyzed was Django Girls, a Python programming workshop for women. The assumption is that Django Girls' design (both physical and intangible) creates a more supportive environment for knowledge sharing among women, generating a sense of belonging to the STEM field. Many studies indicate the importance of the teaching environment for the inclusion and permanence of women in the area. However, there is a gap in the analysis of this experience from the design perspective, as well as its relationship with the media. Thus, this research aimed to analyze the Django Girls media based on experience design concepts as a space that fosters women’s agency and empowerment. For this, a bibliographical and documentary review was carried out to contextualize this gender inequality. The theoretical framework of analysis was built under the integrated perspective of technology-related concepts of gender, agency and empowerment, as well as media-related concepts of knowledge and agency and, finally, theories about experience design. The field research included case study, interviews, questionnaire application and participant observation, and contemplated two editions of Django Girls that took place in Florianópolis in 2017 and 2018. As a consequence, the feeling of empowerment and the gain of agency among the participants were observed. Therefore, gender, as a category of analysis, presents itself in a spiral form. While motivating the creation of projects such as Django Girls, it is also the catalyst for changes in the structure of STEM's social field by including women who are more aware of their position of inequality, willing to change this scenario. Keywords: Gender. Programming. STEM. Django Girls. Python.
  • 14.
  • 15. LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Coffee break da Pyhton Sul e do Django Girls em 2018. Participantes do Django Girls estão usando camiseta amarela e bordô. 95 Figura 2 - Imagens do primeiro Django Girls. .....................................98 Figura 3 - Locais onde já ocorreu uma edição do Django Girls............98 Figura 4 - Participantes do Django Girls Floripa 2017.......................101 Figura 5 - Conversando com as organizadoras Monalisa Mello (esq) e Alana Bittar (dir) ..............................................................................102 Figura 6 - De muletas, pesquisadora fotografando o final do Django Girls 2018.................................................................................................103 Figura 7 - Algumas participantes do Django Girls 2018 com os balões dourados...........................................................................................103 Figura 8 - Organizadoras do Django Girls Floripa: Talita Rossari (esq) Alana Bittar (centro) e Monalisa Mello (dir). ....................................115 Figura 9 - Organizadoras e tutoras do Django Girls Floripa 2017 ......117 Figura 10 - Alunos da UFSC e UDESC em evento de Ciências da Computação .....................................................................................120 Figura 11 - Participantes do Django Girls Floripa 2017 são todas mulheres...........................................................................................121 Figura 12 - Balões com o nome do projeto no workshop de 2018 ......123 Figura 13 - Uma tutora ajudando a colar os balões em 2018 ..............123 Figura 14 - Django Girls Acra, em Gana...........................................124 Figura 15 - Django Girls Caxias (RS) ...............................................124 Figura 16 - Django Girls Bangalore (Índia).......................................124 Figura 17 - Django Girls Mountain View (EUA)...............................124 Figura 18 - Monalisa Mello (uma das organizadoras) colocando os balões de sinalização para a sala do Django Girls Floripa 2017....................125 Figura 19 - Doces disponibilizados ao longo do workshop ................127 Figura 20 - Uma das mesas do coffee break da edição de 2017..........127 Figura 21 - Interação entre participantes do Django Girls (usando camisetas Amarela e Bordô) com demais participantes da PythonSul '18 .........................................................................................................128 Figura 22 - Kit de participação..........................................................129 Figura 23 - Todos os adesivos exclusivos do Django Girls Floripa ....131 Figura 24 - Ícone oficial e internacional do PyLadies ........................131 Figura 25 - Ícone do PyLadies Floripa ..............................................131 Figura 26 - Adesivos disponíveis no evento ......................................131 Figura 27 - Faz parte da cultura de T.I. colar adesivos nos notebooks 132 Figura 28 - Camisetas oficiais do Django Girls .................................132 Figura 29 - Manuela D'Ávila.............................................................133
  • 16. Figura 30 - Camiseta criada para o Django Girls Floripa................... 135 Figura 31 - Exemplos de outras camisetas com o mesmo design....... 136 Figura 32 - Design original da camiseta............................................ 136 Figura 33 - Intérprete de Libras no Django Girls 2017...................... 140 Figura 34 – Gênero como processo espiral no campo da STEM........ 144
  • 17. LISTA DE QUADROS Quadro 1 - Revisão bibliográfica ........................................................56 Quadro 2 - Relatórios de dados quantitativos ......................................58 Quadro 3 - Iniciativas para inclusão de mulheres na tecnologia ...........91 Quadro 4 - Trabalhos relacionados no BTD do EGC.........................155 Quadro 5 - Lista dos artigos da revisão bibliográfica .........................159
  • 18.
  • 19. LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Número de formados nos cursos de Ciências da computação e Sistemas de Informação UFSC (2008-2018) .......................................66 Tabela 2 - Concluintes e ingressantes por Gênero (2001-2016)............67 Tabela 3 - Ingressantes nos cursos de Ciências da Computação e Sistemas de Informação UFSC (2008-2018)......................................................68 Tabela 4 - Principais ocupações em tecnologia por mulheres e homens ...........................................................................................................74 Tabela 5 – Participação em níveis hierárquicos nas empresas ..............76 Tabela 6 - Pesquisadores(as) líderes CNPq..........................................79
  • 20.
  • 21. LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1 - Cursos com maior número de matrículas entre mulheres ...63 Gráfico 2 - Cursos com maior número de matrículas entre os homens .64 Gráfico 3 - Evolução das matrículas de estudantes de computação por gênero (2001-2016) ............................................................................65 Gráfico 4 - Docentes x Gênero............................................................69 Gráfico 5 - Mulheres em cargos relacionados à computação................73 Gráfico 6 - Remuneração por gênero - 2010........................................75
  • 22.
  • 23. LISTA DE ABREVEATURAS E SIGLAS AAUW – American Association of University Women ACATE – Associação Catarinense de Tecnologia BTD – Banco de Teses e Dissertações EGC – Engenharia e Gestão do Conhecimento IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IHC – Interação Humano-Computador LGBT+ - Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais e outras identidades de gênero PNAD – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios PSF – Python Software Foundation STEM – Science, Technology, Engineering and Mathematics (Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática) SPM – Secretaria de Políticas para Mulheres UX design – User Experience design ou design para a experiência UFSC – Universidade Federal de Santa Catarina
  • 24.
  • 25. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO.................................................................27 1.1 CONTEXTUALIZAÇÃO DO TEMA.................................27 1.2 OBJETIVOS.......................................................................33 Objetivo geral....................................................................33 Objetivos específicos .........................................................33 1.3 JUSTIFICATIVA ...............................................................33 1.4 ESCOPO DE PESQUISA ...................................................34 1.5 ADERÊNCIA DO TEMA AO PROGRAMA PPGEGC ......35 1.6 CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA...............................36 1.7 ESTRUTURA DA DISSERTAÇÃO ...................................37 2 REFERENCIAL TEÓRICO ............................................39 2.1 CONCEITOS - QUESTÕES DE GÊNERO.........................39 Campo social .....................................................................39 Gênero...............................................................................41 Empoderamento................................................................42 Agência (gênero)................................................................44 2.2 CONCEITOS - ANÁLISE DO OBJETO.............................45 Agência (mídia) .................................................................45 Recepção midiática............................................................46 Mídia do conhecimento .....................................................47 Conhecimento....................................................................47 Design para experiência....................................................48 Projetando para a experiência..........................................49 Framework de análise.......................................................51 2.2.7.1 Os quatro aspectos da experiência .......................................51 2.2.7.2 Atribuindo significado à experiência ...................................52 2.3 SÍNTESE DO CAPÍTULO..................................................54
  • 26. 3 AS QUESTÕES DE GÊNERO NO CAMPO DA STEM 55 3.1 REVISÃO INTEGRATIVA DA LITERATURA................ 56 3.2 ANÁLISE GERAL DOS RESULTADOS .......................... 60 3.3 EDUCAÇÃO ..................................................................... 62 A maioria dos alunos é homem ........................................ 62 As mulheres desistem mais do que os homens ................. 66 A maioria de professores é homem .................................. 69 Fatores que influenciam a presença de mulheres ............ 70 3.4 TRABALHO...................................................................... 73 A maioria dos profissionais de TI é homem..................... 73 As mulheres ocupam posições menos técnicas................. 74 As mulheres têm remuneração menor que a dos homens 74 As mulheres e as posições de liderança em empresas...... 76 A dupla jornada de trabalho das mulheres ..................... 76 3.5 PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO CIENTÍFICO ......... 77 A maioria dos pesquisadores são homens ........................ 78 As mulheres são menos citadas do que os homens........... 78 As mulheres e a liderança de grupos de pesquisa ............ 79 A carreira acadêmica é mais difícil para as mulheres..... 80 As linguagens de programação são masculinas ............... 80 A ciência é um campo masculino...................................... 81 Saberes localizados ........................................................... 81 3.6 EXPERIÊNCIA (DE SER MULHER NA STEM) .............. 82 Principais dificuldades enfrentadas pelas mulheres........ 83 Agência e empoderamento ............................................... 84 Importância das iniciativas de inclusão de mulheres ...... 85 3.7 SITUANDO MINHA PESQUISA...................................... 86 4 CAMPO DE LUTAS: DJANGO GIRLS E MOVIMENTOS PELA IGUALDADE DE GÊNERO NA STEM . 89
  • 27. 4.1 INICIATIVAS PARA IGUALDAE DE GÊNERO..............89 4.2 DJANGO GIRLS: DESCRIÇÃO DO OBJETO...................92 Python, Python Software Foundation, Django.................92 Compartilhamento do conhecimento e diversidade .........93 Django Girls......................................................................95 PyLadies ............................................................................96 História do Django Girls internacional ............................96 Dados internacionais Django Girls...................................98 História do Django Girls Brasil ........................................99 História do Django Girls Floripa......................................99 Django Girls Floripa 2017...............................................100 Django Girls Floripa 2018...............................................101 4.3 SÍNTESE DO CAPÍTULO................................................104 5 ANÁLISE DO OBJETO .................................................105 5.1 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS .......................105 Entrevistas semiestruturadas..........................................105 Entrevistas não-diretas e observação participante.........106 Análise documental e de conteúdo..................................107 Questionário online .........................................................107 5.2 MANUAL DE ORGANIZAÇÃO DO DJANGO GIRLS...108 Ideia básica do evento .....................................................109 Ambiente / clima (environment)......................................110 Tutorial............................................................................112 Tutoras e Organizadoras ................................................114 5.2.4.1 Organizadoras do Django Girls Floripa .............................114 5.2.4.2 Tutoras do Django Girls Floripa........................................116 Logística ..........................................................................121 5.2.5.1 Local do evento.................................................................121 5.2.5.2 Decoração.........................................................................122
  • 28. 5.2.5.3 Alimentação..................................................................... 125 5.2.5.4 Brindes............................................................................. 129 5.2.5.5 Fotos e vídeos................................................................... 139 Acessibilidade ................................................................. 140 5.3 SÍNTESES DO CAPÍTULO............................................. 140 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................... 145 REFERÊNCIAS............................................................................. 147 APÊNDICE A – Trabalhos relacionados no BTD do EGC .......... 155 APÊNDICE B – Artigos da revisão bibliográfica ......................... 159 APÊNDICE C – Entrevista com Talita Rossari............................ 167 APÊNDICE D – Entrevista com Paula Grangeiro........................ 173 APÊNDICE E – Questionário........................................................ 177 APÊNDICE F – Modelo de autorização para entrevista .............. 183
  • 29. 27 1 INTRODUÇÃO 1.1 CONTEXTUALIZAÇÃO DO TEMA Toda produção humana pode ser considerada uma tecnologia, através da “criação, apropriação e manipulação de técnicas que carregam em si elementos culturais, políticos, religiosos e econômicos, constituintes da concretude da existência social”. A partir dessa perspectiva, “tecnologia está intrinsicamente presente tanto numa enxada quanto num computador” (CARVALHO; FEITOSA; ARAÚJO, 2018). Historicamente, os avanços tecnológicos vêm pautando nossas formas de vivenciar o mundo e, muitas vezes, o domínio da tecnologia está associado ao poder. Como no exemplo emblemático da Guerra Fria, que foi uma disputa de poder pautada pelo domínio tecnológico das bombas nucleares (GIDDENS, 1991, p. 70). Conforme avançamos para uma “sociedade tecnológica”, a tecnologia vai ficando cada vez mais intangível. Estamos vivenciando uma transformação intensa em nossa forma de interagir com o mundo, onde estamos cada vez mais rodeados de “artefatos, objetos, bens e símbolos que remetem à tecnologia” (CARVALHO; FEITOSA; ARAÚJO, 2018, p. 1). Essas interações virtualizam atividades antes totalmente humanas, como a comunicação, mediando-as através de artefatos tecnológicos (smartphones, computadores, etc.) e transformando interações entre agentes humanos em interações humano- computador. Neste trabalho, a tecnologia é entendida dentro de um contexto mais amplo, que considera os aspectos sociais, culturais, políticos, históricos e econômicos do processo de criar conhecimento tecnológico, criar produtos e serviços resultantes da programação de softwares, bem como as relações humanas com a produção e com os produtos. Os tipos de tecnologias, associadas à programação, estão inseridas em um contexto mais amplo conhecido pela sigla STEM, que significa Science, Technology, Engineering and Mathematics (Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática). Segundo o relatório Why So Few? Women in STEM publicado em 2010 pela AAUW (American Association of University Women), organizado por Catherine Hill, “o termo STEM refere-se às ciências físicas, biológicas e agronômicas; ciências da computação e da informação, engenharia e tecnologias de engenharia, e matemática” (HILL; CORBETT; ST ROSE, 2010, tradução nossa). A tecnologia, portanto, é “um elemento fundante da vida social, [...] é parte
  • 30. 28 da cultura e como tal deve ser compreendida” (CARVALHO; FEITOSA; ARAÚJO, 2018, p. 3). A partir disso, considero, então, que STEM se constitui no que Bourdieu (1984, 1996, 2001, 2004) chama de “campo social”, pois compreende não só o conhecimento e a produção dessas diversas áreas, mas também as relações sociais que se estabelecem em seus diferentes âmbitos, como trabalho, educação e produção tecnológica e científica. Um campo social é, necessariamente, um espaço de disputas de poder (BOURDIEU, 1984, 1996, 2001, 2004). No campo da STEM, essas relações de poder estão intrinsicamente relacionadas ao gênero, assim como questões de classe e de etnia, uma vez que este campo foi constituído como um espaço de domínio de homens, brancos, ocidentais, heterossexuais e de classe média/alta. No capítulo 3, apresento dados e estudos anteriores que compõem este cenário. Compreendo gênero do ponto de vista relacional, seguindo a abordagem de Joan Scott (1995). Destarte, gênero é entendido como “um elemento constitutivo de relações sociais” e como “uma forma primária de dar significado às relações de poder” (SCOTT, 1995). Dessa forma, as relações de poder do campo da STEM estão inter-relacionadas com as relações de gênero. Tanto a tecnologia, como as relações de poder e também as relações de gênero são, portanto, partes fundantes da vida social. Por esse motivo, ao estudar tecnologia, estou, necessariamente, falando também sobre relações de poder e de gênero. Considerando esse contexto, o tema do meu estudo é a desigualdade de gênero no campo da STEM. Meu foco de análise são iniciativas que buscam alterar a estrutura desse campo predominantemente masculino incluindo mais mulheres e outras minorias através do compartilhamento de conhecimento tecnológico. Como estudo de caso, escolhi a iniciativa Django Girls1 , que percebo como um produto desse campo, uma vez que sua criação foi motivada por essa desigualdade estrutural. O projeto organiza workshops e fornece tutoriais gratuitos para ensinar programação para mulheres. Minha motivação e interesse por esse tema perpassa minha experiência enquanto mulher inserida neste campo. Eu também sou uma mulher na tecnologia, atuando como profissional de UX design em 1 “Django Girls organize free Python and Django workshops, create open sourced online tutorials and curate amazing first experiences with technology”. Frase da página inicial do site do projeto. Disponível em: <https://djangogirls.org/>. Acesso em: 02 mar 2019.
  • 31. 29 empresas de tecnologia, participando de eventos e de comunidades de tecnologia, dando palestras, organizando e facilitando workshops, produzindo conteúdos e também como aluna de mestrado de um programa de pós-graduação em engenharia. Participei de algumas dessas iniciativas para inclusão de mulheres como aluna (Django Girls, Rails Girls2 ), também fui embaixadora e mentora do Technovation Challenge3 em Porto Alegre (2014) e em Florianópolis (2015-2018). Tais experiências me motivaram a pesquisar esses espaços, pois pude perceber que não só a minha experiência, como a da maioria das mulheres envolvidas nesses projetos, transcendia seus objetivos (aprender a programar, ensinar meninas a programar). Eu vi e participei da criação de uma rede de apoio feminino que mudou a vida de algumas meninas em situação de vulnerabilidade social; mas também ajudou algumas mulheres a mudarem de carreira ou a conseguirem empregos. Entre a primeira (novembro de 2017) e a segunda edição do Django Girls (abril de 2018) que participei, vi uma mulher – que estava desempregada em 2017 – voltar como tutora em 2018, contando que conseguiu um emprego por causa do networking que ela fez nos intervalos do evento. Enquanto mentora de um time do Technovation Challenge em Porto Alegre, vi minha colega, que estava começando a carreira de programadora, ser contratada por uma empresa multinacional de desenvolvimento de software. Através da iniciativa, ela fez um networking que não só a levou a trabalhar lá, como também a conquistar um espaço dentro da empresa para executar seu próprio projeto de ensino de programação para jovens em situação de vulnerabilidade social. Quando atuei como mentora e embaixadora do Technovation Challenge em Florianópolis, ajudamos diretamente mais de 100 meninas, em sua maioria de escolas públicas e/ou regiões de vulnerabilidade social. Para citar quatro casos emblemáticos: conseguimos, através da nossa rede de apoio, a contratação de uma jovem aprendiz em uma empresa internacional de tecnologia, onde ela recebe auxílio financeiro, aulas de inglês e participa de todas as áreas da empresa, conhecendo a realidade de diversas profissões. Outra jovem, negra, nordestina, de 14/15 anos e que não pôde estar presente na sua apresentação final do projeto pois precisava trabalhar como babá, hoje está contratada como menor aprendiz na ACATE, a Associação Catarinense de Tecnologia. Duas meninas que participaram de mais de uma edição do programa (cuja duração é de 3 2 http://railsgirls.com/ 3 https://technovationchallenge.org/
  • 32. 30 meses) levaram adiante seus projetos e foram selecionadas para participar de uma aceleradora de startups, mas não puderam dar continuidade pois eram menores de idade. Apesar disso, elas foram as participantes mais jovens selecionadas na história do projeto. O caso mais marcante para mim, no entanto, foi de uma jovem de 14 anos que morava em uma região periférica. A mentora do seu time a buscava em casa todos os sábados ao longo dos 3 meses da competição para participar das atividades, pois ela não tinha como se deslocar até onde realizávamos os workshops. Ela participava ativamente da criação do aplicativo para celular. Eu já havia percebido que ela, além de tímida, estava com várias marcas de automutilação. Ao longo do projeto, ela tentou se abrir comigo e também com essa mentora, mas nós não tínhamos experiência nem conhecimento para entender os sinais. Depois que o programa já tinha acabado e as coisas já estavam mais difíceis, ela procurou essa mentora e conseguiu falar o que estava acontecendo: ela sofria abusos sexuais do padrasto e estava grávida. Ela tinha 14 anos e estava no 9o ano do Ensino Fundamental. Sua mãe era catadora, estava desempregada, de modo que elas e a irmã mais nova dependiam financeiramente do padrasto. Foi absurdamente chocante para mim, uma realidade que eu só lia nas notícias e nos livros. Senti-me culpada por não ter percebido suas tentativas de me contar, além de despreparada para trabalhar em um projeto social, no qual o conhecimento tecnológico claramente não era suficiente para lidar com a dura realidade do público atendido. Mesmo assim, mobilizamos nossa rede e conseguimos nos conectar com a liderança comunitária onde ela já vinha fazendo acompanhamento psicológico e os profissionais já estavam investigando o caso. Recebemos a notícia de que o padrasto foi preso (por outros crimes, não pelos abusos). E ajudamos a montar um enxoval para a criança (desde móveis até roupas e fraldas), contando com apoio inclusive da mãe da minha orientadora Luciane, que mandou roupinhas para a criança. As últimas notícias que tive foram de que a criança nasceu saudável e a jovem estava estudando para o processo seletivo para cursar o ensino médio técnico. Ela resistiu e, apesar de todas essas dificuldades, quer seguir na área tecnológica. Depois dessas e outras experiências que vivi em quatro anos atuando como profissional, aluna e ativista, ficou claro para mim que o que estava em jogo ali não era aprender a programar. As experiências vividas por todas as pessoas envolvidas (organizadoras, tutoras, alunas) extrapolam o compartilhamento de conhecimento tecnológico. Representam a ação de mulheres para mudarem sua realidade, em busca
  • 33. 31 de maior empoderamento; ou seja, maior autoconfiança, autonomia e realização pessoal. E isso é agência, um conceito que perpassa tanto as questões de gênero quanto a interação com a mídia. Por esse motivo, escolhi analisar o objeto de estudo a partir da abordagem do Design para a experiência, ou User Experience Design (UX Design), uma área do Design que desenvolve seus projetos com o foco na experiência que usuários/as poderão ter ao interagir com o produto ou serviço criado. Lembrando Donald Norman (2002, p. 4), que diz que todas as coisas artificiais são projetadas, entendo que um curso de programação para mulheres – desde a ideia, a filosofia, os recursos utilizados e o próprio workshop – é projetado, consciente ou inconscientemente. Tácita ou explicitamente (NONAKA; TAKEUCHI, 1997). Por ser uma iniciativa que busca o empoderamento e a inserção de mulheres no campo da tecnologia através de uma experiência mais amigável com o ensino de programação, compreendo o Django Girls como uma Mídia do Conhecimento. Isso porque, segundo Richard Perassi (2017), a mídia é “a parte responsável pelo suporte, expressão e divulgação da informação (comunicação) entre agentes humanos ou agentes tecnológicos”. E o Django Girls opera como uma mídia alternativa à mídia tradicional (faculdade de tecnologia), pois oferece outro suporte, outra expressão e outra divulgação do conhecimento tecnológico. A partir da minha vivência no campo da STEM e da minha trajetória enquanto aluna e pesquisadora sobre cultura, sociedade e relações de gênero, além do discurso oficial do Django Girls e depoimentos das organizadoras4 , meu pressuposto é de que a experiência proporcionada pelo Django Girls extrapola a aquisição de conhecimento tecnológico ao proporcionar empoderamento e agência. Por um lado, o domínio do conhecimento tecnológico (saber programar), independente da forma como é adquirido, pode levar a uma sensação de agência, segundo o entendimento de Eichner (2014). Por outro lado, a aquisição desse conhecimento em um ambiente projetado intencionalmente para que seja mais amigável e acolhedor faz com que a experiência dessas mulheres com a tecnologia seja mais positiva. Num contexto de uma sociedade pautada pela tecnologia, saber programar é saber como esse mundo opera e isso sustenta a sensação de empoderamento (TORTATO, 2014). 4 “Acho que o objetivo do Django Girls é o mesmo da tecnologia, que é empoderar pessoas” (GRANGEIRO, 2019).
  • 34. 32 Conforme destaca Selaimen (2013), os códigos e protocolos computacionais determinam os modos como as tecnologias da informação e comunicação são moldadas e utilizadas pelas pessoas. Nessa perspectiva, artefatos tecnológicos operam como artefatos políticos: Artefatos tecnológicos são artefatos políticos - incorporam visões de mundo e formas específicas de exercício de poder em vários níveis - sendo que é no nível dos códigos e dos protocolos que este exercício ocorre de maneira mais invisível. Não percebemos o código enquanto ele opera – por isso mesmo, a necessidade de se olhar para os aspectos políticos, econômicos, sociais e culturais embutidos na construção de códigos e protocolos é ainda mais relevante, levando- se em conta que as tecnologias podem servir a uma variedade de interesses; podem fortalecer as estruturas do poder hegemônico e também podem fortalecer a resistência contra estas estruturas (SELAIMEN, 2013, p. 145). A tecnologia, continua a autora (ibid.), pode ser desenvolvida tanto para conservar quanto para alterar o poder. Assim, interferir proativamente no desenvolvimento de tais tecnologias torna possível que atuem de maneiras mais reflexivas, bem como alinhadas às necessidades e aos valores contra-hegemônicos (SELAIMEN, 2013, p. 145). Como consequência, é possível pensar que as mulheres se sintam mais empoderadas ao adquirir esse conhecimento tecnológico através de uma mídia projetada com foco na experiência das mulheres no campo da STEM. Portanto, nesta pesquisa dedico-me a compreender o UX design da iniciativa Django Girls enquanto uma mídia do conhecimento. Para tal, proponho a seguinte questão de pesquisa: como o UX design de uma mídia do conhecimento evoca agência e empoderamento de mulheres no campo da STEM?
  • 35. 33 1.2 OBJETIVOS Objetivo geral Analisar o UX design da mídia Django Girls enquanto uma experiência com programação que evoca agência e empoderamento das mulheres envolvidas resultando na sua inclusão no campo da STEM. Objetivos específicos a) Interpretar o Django Girls enquanto mídia do conhecimento. b) Elencar elementos de análise à luz do UX design (framework). c) Articular referenciais teóricos relacionando estudos de gênero, mídia do conhecimento e UX design a fim de construir um quadro de análise para o objeto de estudo. d) Contextualizar o cenário da desigualdade de gênero no campo da STEM, apresentando as principais questões que interferem na experiência das mulheres nesses ambientes. e) Apresentar um panorama de iniciativas para inclusão de mulheres no campo da STEM e descrever o objeto de estudo Django Girls. f) Analisar os dados de campo a partir do quadro teórico desenvolvido a fim de compreender os pontos de contato do design que evocam sensação de agência e/ou empoderamento. 1.3 JUSTIFICATIVA A justificativa de pesquisa se dá em três âmbitos: acadêmico, social e pessoal, sendo já apresentei o último deles anteriormente, quando destaquei minhas motivações de pesquisa. Do ponto de vista acadêmico, esta pesquisa se justifica em virtude da escassez de outros trabalhos acadêmicos sobre gênero na perspectiva da engenharia, gestão e mídias do conhecimento. Realizei buscas no Banco de Teses e Dissertações do departamento de Engenharia e Gestão do Conhecimento da Universidade Federal de Santa Catarina (BTD/EGC/UFSC), cujo resultado pode ser visto no Apêndice A. Ao buscar o termo “gênero e/ou mulher”, encontrei apenas duas dissertações que abordam de fato questões de gênero. Entretanto, nenhum destes trabalhos enfocou as mulheres enquanto produtoras de tecnologia, tampouco as suas experiências no compartilhamento de conhecimentos tecnológicos. Por outro lado, obtive
  • 36. 34 resultados expressivos quando busquei teses e dissertações produzidas pelo programa que utilizaram abordagens relacionadas com a minha pesquisa, como os termos “aprendizagem” (23 resultados) e “design” (8). Isso demonstra a aderência da abordagem de estudo, ao mesmo tempo que apresenta uma lacuna na temática de gênero. Este trabalho é relevante para a sociedade na medida em que traz reconhecimento para projetos que lutam pela igualdade de gênero no campo da STEM. Também valoriza o conhecimento produzido por mulheres, ao buscar utilizar referências teóricas femininas. Por fim, promove um debate acerca das relações de gênero e das relações de poder em um campo social cada vez mais importante, uma vez que estamos vivendo em uma sociedade pautada pelas tecnologias de informação e comunicação. 1.4 ESCOPO DE PESQUISA Embora meu objeto de estudo seja específico da área da tecnologia e voltado para mulheres, considero que as motivações e as consequências dessa iniciativa podem ser ampliadas às outras áreas do campo da STEM (como ciências, engenharias e matemática) e para outras minorias (como pessoas negras, pessoas periféricas, pessoas com deficiência, pessoas LGBT+, etc.), respeitando suas particularidades. Por esse motivo, refiro- me ao campo da STEM quando considero que são questões pertinentes ao campo como um todo, mas quando são questões ou referências específicas, utilizo os termos mulheres5 e tecnologia. A pesquisa de campo contemplou apenas duas edições do Django Girls na cidade de Florianópolis/SC, entre novembro de 2017 e abril de 2018. O Django Girls, em nível nacional e mundial, será referenciado apenas para contextualização histórica da iniciativa. A análise do objeto de pesquisa (Django Girls) se dá apenas no âmbito do UX design, da mídia e dos conceitos de gênero, empoderamento e agência. Ressalto, portanto, que não analisei estratégias 5 “Mulheres” é um termo sempre utilizado no plural, pois entendo que não existe uma única forma de ser mulher, nem uma única representação de mulher na sociedade, conforme o site da Secretaria de Política para Mulheres: Disponível em: < https://www.spm.gov.br/assuntos/diversidade-das-mulheres>. Acesso em 05 fev. 2019. (Nota: ao final da escrita da primeira versão desta dissertação, em 21/03/2019, o site da SPM não estava mais no ar, sendo redirecionado para o novo site do novo ministério que inclui questões da SPM).
  • 37. 35 pedagógicas nem realizei uma avaliação de desempenho do objeto estudado. 1.5 ADERÊNCIA DO TEMA AO PROGRAMA PPGEGC O programa de pós-graduação em Engenharia e Gestão do Conhecimento (PPGEGC) tem como objeto de pesquisa o conhecimento. Na abordagem do EGC, o conhecimento é estudado, caracterizado e definido de maneira interdisciplinar, como conteúdo ou processo resultante de interações sociotécnicas entre agentes humanos e tecnológicos. Neste sentido, também é abordado como relevante fator estratégico para a geração de valor e equidade social (EGC, 2019). Esta pesquisa analisa de que maneira mulheres podem ter uma experiência mais amigável com o conhecimento tecnológico (saber programar), uma vez que se trata de uma área de conhecimento dominada por homens; na qual os ambientes de ensino e de trabalho podem ser hostis a elas. Nos capítulos 2, 3 e 5 elaboro melhor essas noções. Dessa forma, entendo que o workshop de programação Django Girls opera como uma mídia do conhecimento, no sentido de se constituir como outra forma de disseminar o conhecimento tecnológico, especialmente diferente das formas tradicionais (faculdades de tecnologia, ambientes predominantemente masculinos e com professores e exemplos masculinos). Por esse motivo, este trabalho está alinhado a pesquisas na área de concentração de Mídia do Conhecimento, a qual compreende estudos de “difusão, comunicação e compartilhamento do conhecimento; bem como abrange a preservação, disseminação, transferência, socialização e acesso ao conhecimento” (EGC, 2019). O Django Girls é um espaço de compartilhamento do conhecimento, especialmente focado na socialização e acesso ao conhecimento como “fator estratégico” para geração de equidade social. Meu estudo está contemplado nos temas de estudo de Mídia do Conhecimento por tratar de “mídia, cultura e sociedade”, ao analisar o impacto social e cultural da criação de um workshop de programação exclusivo para mulheres. Mas também abrange o tema de “mídia, compartilhamento e disseminação”, por entender que seu objeto é um espaço de compartilhamento de conhecimento (PERASSI, 2017, p. 2).
  • 38. 36 O objeto de pesquisa está em consonância com os conceitos articulados na área de mídia do conhecimento, uma vez que o projeto Django Girls é entendido como uma mídia do conhecimento, ou seja, um sistema mediador que contempla suporte, expressão e veículo da informação. O objetivo do projeto analisado é promover o empoderamento de mulheres por meio do compartilhamento de conhecimento tecnológico. Dessa forma, o conhecimento (base do EGC) é articulado em uma mídia, que foi projetada a partir da perspectiva da experiência do usuário (UX design) para alcançar um maior empoderamento de mulheres no campo da tecnologia como resultado. O objeto de pesquisa (Django Girls), assim como o campo social em que ele está inserido (STEM), são permeados por questões de gênero, conforme explico detalhadamente nos capítulos 2 e 3. Portanto, é necessário articular conceitos que estão ancorados no campo de estudos de gênero, especialmente os ligados a gênero e tecnologia (de natureza interdisciplinar), além de outros campos de estudos como sociologia e antropologia. Esta pesquisa transita entre as áreas do PPGEGC na medida em que o campo no qual o objeto de pesquisa está inserido, assim como o tipo de conhecimento compartilhado no workshop, dizem respeito à engenharia do conhecimento. Afinal, é um workshop que ensina a programar e a criar produtos tecnológicos. Também dialoga com a Gestão do Conhecimento na medida em que esse conhecimento é organizado e distribuído. Por fim, dialoga com a mídia do conhecimento, pois o grande diferencial de um workshop voltado a mulheres é a forma como esse conhecimento é compartilhado. Além disso, a análise e construção dessa forma é uma competência do design para a experiência (UX design). Dessa forma, o desenvolvimento desta pesquisa apoia-se no entendimento do Django Girls como uma mídia do conhecimento. E, por conta disso, foi possível analisá-lo utilizando o referencial teórico do design para a experiência (UX design). 1.6 CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA Existem diferentes paradigmas epistemológicos para compreensão da realidade, os quais possuem diferentes escolas de pensamento. De acordo com a classificação elaborada por Morgan (1980), esta pesquisa é caracterizada como interpretativista de abordagem qualitativa, uma vez que compreende a visão de mundo na qual a “realidade social não existe
  • 39. 37 em qualquer sentido concreto, mas é um produto da experiência subjetiva e intersubjetiva dos indivíduos”. Considera o ponto de vista do participante em ação, enquanto a pessoa pesquisadora “tenta entender os processos pelos quais as múltiplas realidades compartilhadas surgem, se sustentam e se modificam”. (MORGAN, 1980). É, ainda, uma pesquisa empírica, pois analiso dados empíricos, entendidos como determinantes para a conclusão do trabalho, embora a análise destes também se apoie em conceitos teóricos. A finalidade da pesquisa é interpretativa, de ângulo sociocultural (FREIRE, 2013, p. 54– 56; SEVERINO, 2007, p. 117–119). Para a realização da pesquisa, utilizei diferentes procedimentos metodológicos, conforme classificação de Severino (2007, p. 117-126) e Freire (2013, p.57-60). Na introdução de cada capítulo, explico quais procedimentos foram utilizados naquela seção. a) Pesquisa bibliográfica b) Pesquisa documental c) Observação participante c) Análise de conteúdo d) Entrevistas estruturadas e) Entrevistas não-diretivas f) Aplicação de questionário 1.7 ESTRUTURA DA DISSERTAÇÃO A dissertação está estruturada em 5 capítulos, sendo o primeiro de introdução, no qual o problema é contextualizado. No capítulo 2, apresento o referencial teórico e os conceitos utilizados nesta pesquisa. No capítulo 3, apresento o cenário da desigualdade de gênero no campo da STEM a partir da revisão de literatura e situo meu trabalho dentro dos estudos de gênero e tecnologia. No capítulo 4, apresento um panorama geral de iniciativas que buscam igualdade de gênero no campo da STEM e descrevo o objeto de estudo, resgatando suas origens até os eventos estudados na pesquisa. No capítulo 5, analiso os dados de campo a partir do quadro de análise desenvolvido no capítulo 2. Nas considerações finais, retomo os objetivos e principais descobertas da pesquisa, suas contribuições e limitações, como também indicando sugestões para futuras pesquisas.
  • 40.
  • 41. 39 2 REFERENCIAL TEÓRICO O Django Girls é um espaço de compartilhamento de conhecimento tecnológico primordialmente entre mulheres (alguns homens participam como tutores). Nesse sentido, o objeto de estudo está vinculado a questões de gênero e a análise deste objeto está concentrada no design da mídia do conhecimento. Portanto, o referencial teórico deste trabalho relaciona esses dois universos conceituais. Para desenvolver este capítulo, utilizei a metodologia de pesquisa bibliográfica, a partir de livros e artigos decorrentes de pesquisas anteriores, utilizando “categorias teóricas já trabalhadas por outros pesquisadores e devidamente registradas” (SEVERINO, 2007, p. 122). De maneira que o objetivo é apresentar o quadro teórico-conceitual que norteou a análise do objeto de estudo. Apresento uma breve contextualização teórica de conceitos articulados em minha análise. O capítulo está estruturado em duas seções: na primeira, apresento o referencial teórico que aborda as questões de gênero, pertinentes ao objeto de estudo. Na segunda parte, apresento o referencial teórico sobre mídia do conhecimento e design, que dizem respeito à abordagem analítica do objeto. 2.1 CONCEITOS - QUESTÕES DE GÊNERO A principal motivação para a criação de um espaço como o Django Girls é o fato de que os ambientes de educação, de trabalho e de produção de tecnologia são considerados, em sua maioria, hostis às mulheres. Estudos apresentados no capítulo 3 indicam essa tendência no campo da STEM como um todo. Portanto, as questões de gênero são fundamentais para compreender a constituição do meu objeto de estudo e seu contexto dentro do campo da STEM. Assim, articulo os seguintes conceitos teóricos na construção dos meus argumentos e análises: campo social, gênero, empoderamento, agência, recepção midiática, mídia do conhecimento, conhecimento e design para experiência. Campo social Conceito elaborado pelo sociólogo Pierre Bourdieu, o qual, em linhas gerais, significa um espaço estruturado de relações de força entre agentes ou instituições (dominantes e dominados). Tal espaço possui leis gerais de funcionamento, mas também conta com leis e propriedades particulares de cada campo. Existem vários tipos de campo, como o campo político, o campo científico, o campo das artes, entre outros, os quais podem se desdobrar
  • 42. 40 em diversos subcampos. Um campo se define através do estabelecimento de interesses e de investimentos dos agentes e das instituições nele envolvidas (BOURDIEU, 1984, p. 89–91). Ou seja, um campo social se define por pessoas que conhecem as regras da disputa sobre certos objetos, e que não podem ser percebidas por quem não foi formado para entrar neste campo (BOURDIEU, 2001, p. 124). Podemos dizer, então, que o campo é tanto um "campo de forças", uma estrutura que constrange os agentes nele envolvidos, quanto um "campo de lutas", em que os agentes atuam conforme suas posições relativas no campo de forças, conservando ou transformando a sua estrutura (BOURDIEU, 1996, p. 50). Nesta pesquisa considero que STEM é um campo social, constituído por relações de força entre os próprios agentes (profissionais, professores/as, estudantes, cientistas, etc.) e entre agentes e instituições (empresas, universidades, etc.). Conforme estabelecido na introdução, STEM é um campo composto por microcampos das diferentes áreas do conhecimento: ciência, tecnologia, engenharias e matemática, além de microcampos de relações entre os agentes (trabalho, educação, produção cientifica). Embora analise especificamente um workshop de programação, entendo que as relações (sociais, culturais, políticas e de poder) que se estabelecem no meu objeto de estudo transcendem o subcampo da tecnologia e os subcampos da educação por razões que desenvolvo ao longo do trabalho. Por esse motivo, ao invés de falar em “mulheres na área de tecnologia”, prefiro usar o termo “mulheres no campo da STEM”, por entender que foi observado um subcampo de ensino de programação, que também diz respeito às relações de trabalho, à produção de conhecimento científico-tecnológico e às outras áreas da STEM. Como todo campo, STEM é tanto um “campo de forças”, quanto um “campo de lutas”. Considerando que STEM é uma área majoritariamente composta por homens, conforme apresentado no capítulo 3, o gênero é o que primeiro define quem são as “pessoas prontas para disputar o jogo” (BOURDIEU, 2001, p.124). Não é a idade, não é a raça, não é o tempo de experiência profissional, não é a titulação acadêmica, não é a renda, nem nenhum outro marcador social que não o sexo/gênero. Na STEM, as mulheres e outras minorias de gênero - como Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transsexuais, Travestis, Pessoas não-
  • 43. 41 binárias, entre outras identidades de gênero, resumidas na sigla LGBT+6 -, são as dominadas. Nós, mulheres atuantes no campo da STEM, estamos em uma posição inferior tanto quantitativamente (em menor número), quanto qualitativamente (não somos as lideranças, as produtoras, nem as disseminadoras de conhecimento tecnológico) no “campo de forças”. Isso nos leva a atuar no “campo de lutas” para que possamos transformar a sua estrutura. Gênero A palavra “gênero” teve diversos usos e significados ao longo da história. Adoto a perspectiva da teórica feminista Joan Scott (1995) em seu texto “Gênero: uma categoria útil para análise histórica”, no qual ela retoma alguns desses significados e elabora uma definição do termo “gênero”. Essa definição é composta por duas proposições e diversos subconjuntos que estão inter-relacionados: (1) o gênero é um elemento constitutivo de relações sociais baseadas nas diferenças percebidas entre os sexos e (2) o gênero é uma forma primária de dar significado às relações de poder (SCOTT, 1995, p. 86). Na primeira parte, sobre o gênero ser um elemento constitutivo de relações sociais, Scott divide em 4 sub-partes: (1) Símbolos culturalmente disponíveis que evocam representações simbólicas, (2) Conceitos normativos que expressam interpretações dos significados dos símbolos, que tentam limitar e conter as suas possibilidades metafóricas, (3) A noção de fixidez que leva à aparência de uma permanência intemporal na representação binária dos gêneros e (4) A noção de Identidade Subjetiva, quando a autora explica como as Identidades de Gênero são construídas a partir de formação de conceitos/preconceitos imaginária e simbolicamente. 6 Considero que na posição de dominante estão os homens cis heterossexuais. "Homens cis" são pessoas que nasceram com sexo masculino e se identificam com o gênero masculino - nasceu homem e se vê como homem - e "homens heterossexuais" são homens que se relacionam afetiva e sexualmente com mulheres) e na posição de dominadas estão as mulheres e todas as pessoas LGBT+. No entanto, meu trabalho é focado nas questões das mulheres, portanto, a partir de agora vou me referir apenas às mulheres, embora reconheça que todas as minorias de gênero constituem o mesmo grupo "dominado" nesse campo de forças.
  • 44. 42 E na segunda parte ela diz: “o gênero é um campo primário no interior do qual, ou por meio do qual, o poder é articulado. O gênero não é o único campo, mas ele parece ter sido uma forma persistente e recorrente de possibilitar a significação do poder no ocidente, nas tradições judaico-cristãs e islâmicas” (SCOTT, 1995, p. 88). Ou seja, o gênero não é sexo feminino ou masculino, mas sim uma construção (em constante transformação) de símbolos, significados e identidades que fazem parte das relações sociais. Sempre nos relacionamos através do gênero, além disso, através do gênero é que se articulam as relações de poder. Nessa perspectiva, o gênero não é uma característica isolada de um indivíduo, é sempre relacional: não existe mulher, se não existe homem. Se uma coisa “não é de mulher” é porque ela é uma “coisa de homem”. Se a mulher está numa posição subalterna nas tradições judaico-cristãs e islâmicas, é porque o homem está numa posição de poder (SCOTT, 1995). Nesse sentido, não se tratam de “estudos da mulher” e sim estudos sobre as "relações de gênero", pois o gênero só se constitui na relação com o outro e, conforme essa relação se modifica, o próprio conceito do gênero se modifica (SCOTT, 1995). Portanto, ao refletir sobre o campo da STEM, especificamente a tecnologia – que inclui ensinar (professores/as), aprender (alunos/as), produzir (trabalhadores/as) e criar (cientistas, teóricos/as, linguagens de programação) tecnologia – considero que todas essas relações (professor- aluno, aluno-aluno, chefe-empregado, conhecimento-pessoas) são, necessariamente, relações de gênero. Empoderamento Empoderamento é um termo amplo, que pode abordar diferentes dimensões de poder, como econômica, humana e social, política e cultural. “Pode ser relacionado a habilidades, oportunidades, capacidades, pode estar relacionado ao indivíduo ou à coletividade” (TORTATO, 2014). No estudo de Cínthia Tortato (2014), o conceito de empoderamento está relacionado às mulheres no contexto de um curso de capacitação sobre questões de gênero para professoras mulheres da rede básica de ensino. O presente trabalho está inserido no contexto de um workshop de programação para mulheres, portanto, considero pertinente apoiar-me em suas concepções acerca do termo, uma vez que relaciona empoderamento com mulheres e aquisição de conhecimento. Tortato (2014) entende o empoderamento como a conscientização do valor de si e do trabalho para se combater as desigualdades. Segundo
  • 45. 43 a autora, o empoderamento pode ser sustentado pelo conhecimento adquirido. É a partir da aquisição de conhecimento que as mulheres tomam consciência não apenas das condições relacionadas às questões de gênero mas, principalmente, daquelas relacionadas a si próprias. Assim, ao compreenderem a situação das mulheres na sociedade, as mulheres compreendem também sua própria situação cotidiana em diversos âmbitos. A agência surge no momento em que as mulheres tomam iniciativas pessoais e profissionais como consequência do empoderamento sustentado pelo conhecimento (TORTATO, 2014). O estudo de Cristina Rocha (2006) sobre questões de gênero na tecnociência também traz abordagens sobre empoderamento que são pertinentes ao objeto de estudo desta dissertação. Rocha (2006) diz que as atividades relacionadas aos “contextos computacionais”, especialmente à utilização de códigos e linguagens de programação, trazem uma “sensação de empoderamento” (ROCHA, 2006, p. 115). A autora também relaciona o empoderamento com a agência, a partir da perspectiva de Tânia Swain (2005), pois para Rocha o empoderamento sustenta a agência. Por esse motivo, é necessário conscientizar as mulheres de que elas têm o poder de pensar e agir na busca contínua da igualdade de gênero (ROCHA, 2006, p. 196). Articulando a noção de agência com a noção de empoderamento, Rocha (2006) demonstra como isso está presente no campo feminino da STEM (ou tecnociência, como ela se refere): A própria possibilidade de escolhas por parte das mulheres não apenas quanto aos cursos mas também quanto às profissões, implica em admitir seu empoderamento. As escolhas expressam seu agenciamento, e este transparece em níveis diferenciados de poder (em suas funções de sócias, de diretoras, de técnicas de computação), além de níveis diferenciados de intenção e desejo no prosseguimento e no cumprimento de metas e de projetos (quando intencionam cursar níveis superiores aos da graduação na área das exatas, por exemplo). (ROCHA, 2006, p. 223) Além de concordar com as autoras e reflexões teóricas citadas, convém ressaltar que o empoderamento também faz parte da missão organizacional do Django Girls, conforme descrição textual no site da iniciativa: “Django Girls é uma organização sem fins lucrativos e uma
  • 46. 44 comunidade que empodera e ajuda as mulheres a organizar workshops gratuitos de programação” (DJANGO GIRLS FOUNDATION, 2018a) . Agência (gênero) Na perspectiva dos estudos de gênero, o conceito de agência foi definido por Sherry Ortner (2007), com base em dois campos de significação. O primeiro deles está relacionado à intencionalidade e ao fato de o campo perseguir projetos culturalmente definidos. O segundo campo de significação diz respeito à agência e está relacionado ao poder e ao fato de o campo atuar no contexto de relações de desigualdade, assimetria e forças sociais. Vale ressaltar que estas duas faces do conceito de agência se entrelaçam (ORTNER, 2007). A intencionalidade refere-se a estados cognitivos orientados a um determinado fim. Tais estados podem ser mais exatos como enredos, planos e esquemas, metas e objetivos ou mais abstratos como vontades e desejos (ORTNER, 2007, p. 52). A agência é sempre cultural e historicamente construída, sendo que todos os humanos têm capacidade de agência (ORTNER, 2007, p. 54). Ortner chama esse tipo de “agência de projetos”, constituída de “intenções, propósitos e desejos formulados em termos de projetos culturalmente estabelecidos” (ORTNER, 2007, p. 65). Por outro lado, Ortner conceitua a “agência de poder”, como as formas de poder que as pessoas têm à disposição, sua capacidade de agirem em seu próprio nome, de influenciarem outras pessoas e de controlarem suas próprias vidas. Além disso, a agência é pertinente tanto na dominação quanto na resistência, uma vez que os dominados também influenciam de certa forma os modos como os acontecimentos se desenrolam (ORTNER, 2007, p. 64). Para a autora, a “agência de poder” (tanto de dominantes quanto de resistentes) atua para a realização de projetos fazendo da “agência de projetos” a “dimensão mais fundamental da ideia de agência”. Portanto, é essa agência (de projetos) que os menos poderosos procuram proteger através da preservação de lugares, “literal ou metaforicamente, ‘nas margens do poder’” (ORTNER, 2007, p. 65). Em outras palavras, Ortner argumenta que a capacidade de agir (agência de poder) está condicionada aos objetivos dessa ação (agência de projetos), os quais são estabelecidos culturalmente. E, ao mesmo tempo em que os dominantes perpetuam seus projetos através de sua “agência de poder”, os menos poderosos criam lugares para alimentar seus próprios projetos, que representam resistência à estrutura de poder estabelecida.
  • 47. 45 2.2 CONCEITOS - ANÁLISE DO OBJETO De acordo com o site oficial do projeto Django Girls, seu principal objetivo é proporcionar uma experiência com o conhecimento tecnológico que seja mais positiva para as mulheres: “Django Girls organiza workshops gratuitos de Python e Django, cria tutoriais online de código aberto e projeta incríveis primeiras experiências com tecnologia” (DJANGO, 2019, tradução nossa)7 . Com base nesta visão, Django Girls pretende criar uma experiência diferenciada com a tecnologia através de workshops gratuitos e tutoriais online. Esta iniciativa, como um todo, é entendida como uma mídia do conhecimento nesta pesquisa. Dessa forma, é possível analisa- la como um produto de design, cujo projeto pode ser centrado na experiência das usuárias. Para isso, utilizo os seguintes conceitos: Agência (mídia) No campo de estudos da mídia, a agência tem um significado um pouco diferente, mas ainda convergente, uma vez que também está baseada na teoria da prática. Segundo Susanne Eichner, agência é uma parte estrutural que age em nossas vidas, mas que depende das disposições que mantemos e das estruturas que enfrentamos (EICHNER, 2014, p. 12), tradução nossa). Eichner (ibid.) diz que a agência não é restrita à agência pessoal ou individual, uma vez que suas dimensões estruturais se tornam aparentes a partir da noção de relações de poder de Foucault. Para esta autora, quem controla o conhecimento detém o poder. Na argumentação de Eichner (ibid.), a agência enquanto modo de experienciar a mídia não está restrita à experiência com videogames. Isso porque grande parte dos trabalhos investigam a agência em jogos digitais, como Janet Murray, para quem agência é o “poder satisfatório de tomar ações significativas e ver os resultados de nossas decisões e escolhas” (Murray 1997, p.126, tradução nossa). 7 Ao longo desta pesquisa, o site foi atualizado e o texto da página inicial foi modificado. Essa frase estava no site disponível em: https://djangogirls.org/ acessado em 06 de março de 2019. A frase original é: Django Girls organize free Python and Django workshops, create open sourced online tutorials and curate amazing first experiences with technology.
  • 48. 46 A autora compreende também que a agência, como uma forma especial de envolvimento com a mídia, está potencialmente presente em todas as recepções midiáticas. Apesar das particularidades de cada mídia, diferentes estudos indicam que o senso de agência, quando facilitado por determinadas estratégias textuais, pode ocorrer em todas as recepções midiáticas (EICHNER, 2014, p. 13). Portanto, a agência da mídia se expressa na interação das usuárias com o produto, que é uma mídia. Nesta pesquisa, o produto é a iniciativa Django Girls como um todo, o que engloba sua ideia (concepção e filosofia), o site, as comunidades online, os tutoriais; e, especialmente, as interações que ocorrem durante o workshop – das alunas com o ambiente, entre alunas e tutoras, entre alunas e computadores e linguagem de programação, etc. Recepção midiática Segundo Eichner, a recepção de mídia é um processo de significação que ocorre por meio da interação com o material simbólico apresentado pela mídia. Por esse motivo, a mídia que é considerada uma forma específica de ação e comunicação social (EICHNER, 2014, p. 12). Marshall McLuhan entende a mídia ou o “meio” de comunicação como qualquer extensão de nós mesmos, sendo, ele próprio, a mensagem. Isto é meramente para dizer que as consequências pessoais e sociais de qualquer meio - isto é, de qualquer extensão de nós mesmos - resultam da nova escala que é introduzida em nossos assuntos por cada extensão de nós mesmos, ou por qualquer nova tecnologia. (MCLUHAN, 1964, p. 9, tradução nossa) Mídia é, então, “a parte física da informação”, ou seja, “a parte responsável pelo suporte, expressão e divulgação da informação (comunicação) entre agentes humanos ou agentes tecnológicos” (PERASSI, 2017, p. 1). Já a forma “é aquilo que é inteligível na informação”, ou seja, é o que permite distinguir uma mancha em forma de triângulo de uma mancha em forma de retângulo, embora ambas estejam representadas na mesma mídia (PERASSI, 2017). Informação: “é, portanto, a composição integrada de duas partes, sendo uma expressiva (física) e a outra inteligível ou vivencial (ideia/explícita ou sentimento/tácito)” (PERASSI, 2017).
  • 49. 47 Mídia do conhecimento A mídia pode ser um composto com diversos elementos, que “necessariamente interagem entre si de maneira autônoma ou induzida pela ação dos agentes humanos”. Por esse motivo, argumenta Perassi (2017), a mídia atua como um sistema, com interações e mudanças de estado ao longo do tempo (PERASSI, 2017, p. 2). Um sistema mediador completo realiza três funções: suporte, veículo e canal. Ainda segundo Perassi, mídia do conhecimento são sistemas mediadores que, de maneira autônoma, realizam associações de informações, produzindo novas informações, como resultados do processo associativo” (PERASSI, 2017). Segundo o autor, diferentes profissionais se dedicam a “projetar e aplicar modelos de composição de sistemas mediadores (mídia), a partir da reunião de agentes humanos (pessoas) e agentes tecnológicos (máquinas)” (PERASSI, 2017, p.2). A partir da definição de Perassi entendo no presente trabalho que o Django Girls é uma mídia do conhecimento. Isso porque nesse contexto o agente humano é tanto a mídia quanto o produtor da mídia. Além disso, os agentes humanos também produziram agentes tecnológicos (PERASSI, 2017, p.3), De maneira autônoma, o sistema mediador (composto pelo conhecimento tecnológico, pelo design do workshop e pela agência das organizadoras e tutoras) realiza associações de informações (sobre programação e sobre a condição das mulheres no campo da STEM), que produzem novas informações como resultado desse processo associativo (como o empoderamento e a agência das alunas). Conhecimento O conhecimento, segundo o EGC, é caracterizado de forma multifacetada e apresenta: múltiplos estados (tácito, implícito ou explícito), diferentes lócus (humanos ou artefatos), dimensões (individual, de grupo, organizacional, interorganizacional ou em rede) e propriedades (é gerenciável, é transmissível) (EGC, 2019). Segundo Nonaka e Takeuchi (NONAKA; TAKEUCHI, 1997, p. 63–65), o “conhecimento, ao contrário da informação, diz respeito a crenças e compromissos” é intencional, relacionado à ação humana e diz respeito ao significado, ou seja, “é específico ao contexto relacional”.
  • 50. 48 O processo de criação do conhecimento ocorre em duas dimensões: na ontológica, os autores dizem que o conhecimento só pode ser criado por pessoas. Enquanto na dimensão epistemológica, o conhecimento se distingue entre tácito – que é pessoal, específico ao contexto e difícil de ser formulado – e explícito – que é codificado, transmissível em linguagem formal e sistemática. Design para experiência O conceito de design para experiência, ou experience design, ou user experience design, que se popularizou sob a sigla UX design, tem origens um pouco difusas na literatura. Nesta pesquisa, ancorei o conceito a partir de três pensadores: Donald Norman, Peter Wright e Marc Hassenzahl. Situando no tempo, as definições começaram mais ou menos na mesma época, no início dos anos 2000. Em 2002, Donald Norman afirmou que "todas as coisas artificiais são projetadas", desde a disposição dos móveis em uma sala, uma trilha na floresta ou dispositivos eletrônicos. Nem todas as “coisas artificiais” envolvem estruturas físicas, como por exemplo serviços, aulas e estruturas organizacionais. Segundo o autor, as regras de operação devem ser projetadas, algumas vezes informalmente, outras vezes registradas e especificadas (NORMAN, 2002). A partir disso, posso afirmar que existe um design para o Django Girls, que se verifica em suas "regras de operação", tanto no serviço e no conteúdo, quanto na composição dos objetos no local do workshop. Conforme Norman, alguns elementos foram projetados informalmente enquanto outros são explícitos, conforme mostrarei mais adiante. O campo do design que adoto nesta pesquisa é o do Experience design, que Norman conceitua como: “A prática de projetar produtos, processos, serviços, eventos e ambientes com o foco voltado para a qualidade e satisfação da experiência como um todo” (NORMAN, 2002, p. 5, tradução nossa). Para ele, o design diz respeito a como as coisas funcionam, como elas são controladas, e a natureza da interação entre as pessoas e a tecnologia. Assim, se o design for concebido respeitando-se seus princípios e elementos, o resultado evoca uma estética agradável. O contrário pode implicar num desacordo seja de seu uso ou de sua significação. Ou, ainda, são impossíveis de usar, causando grande frustração ou irritação (NORMAN, 2002, p. 5).
  • 51. 49 Por sua vez, Marc Hassenzahl (2010, p. 2, 2011, p. 4) entende que a experiência é quase sempre mediada. Segundo o autor, as coisas que mediam as experiências não são o seu oposto, mas criam e substancialmente moldam tais experiências. A experiência se torna "experiência do usuário" ou "user experience - UX" quando o foco de análise são o mediador de experiências – que ele chama de produtos interativos – e as respectivas experiências que emergem de tais interações. Logo, um produto interativo pode ser tanto um serviço, um produto, um evento ou, ainda, outras pessoas. Seguindo esse raciocínio, posso dizer que o Django Girls é um grande mediador que contém um serviço (ensinar a programar), um produto (a iniciativa como um todo), um evento (o workshop) e outras pessoas (organizadoras, tutoras, alunas). Hassenzahl (2010, p. 2-3) salienta a importância de analisar cada uma dessas fontes de interação na medida em que oferecem diferentes formas de criar e moldar experiências. Essa abordagem considera que a experiência deve ser colocada como foco do design. Só é possível determinar os requisitos do projeto a partir de um entendimento pleno do que se espera que o usuário experiencie. Atualmente, é conhecida pelos termos “design centrado no usuário” ou “human-centered design”. Peter Wright publicou, juntamente com John McCarthy e Lisa Meekison, um estudo sobre a experiência, especificamente a experiência ao interagir com ou através da tecnologia. Os autores sugerem que tentar analisar a experiência de uso pode ser um ponto de partida para compreender por que um produto ou design é mais agradável de usar (WRIGHT; ET.AL., 2004, p. 43). No entanto, Wright, McCarthy e Meekison (2004, p. 52) argumentam que não é possível projetar uma experiência, portanto, não é possível fazer um design da experiência do usuário. Ancorados nas perspectivas de Dewey e Bakhtin, os autores entendem que a experiência é “tanto o produto do que os usuários trazem para a situação quanto é sobre os artefatos que participam da experiência”. A experiência é dada numa perspectiva relacional e dialógica. É sempre uma relação entre o usuário e o produto. Por isso, esses autores defendem a ideia de que é possível fazer, através de uma compreensão sensível e habilidosa dos usuários, um design para a experiência. Projetando para a experiência Embora os elementos de design possam ser identificados e categorizados no Django Girls, cada mulher que ajudou a criar o
  • 52. 50 workshop e cada mulher que participou tem sua trajetória e, portanto, cada experiência vivida nos workshops é única. Mas, mesmo assim, é possível fazer um esforço teórico para compreender como as duas dimensões (o gênero e o design) se relacionam dentro do Django Girls e fazem dele uma experiência mais inclusiva para as mulheres. O pressuposto, conforme já comentei na introdução, é de que o design (tanto físico quanto intangível) do Django Girls cria um ambiente mais favorável para o compartilhamento de conhecimento entre as mulheres, gerando, assim, um sentimento de pertencimento ao campo da STEM. O design para a experiência, dizem Wright, McCarthy e Meekison (2004, p. 52), requer que a/o designer tenha meios para “ver e falar sobre a experiência, analisar as relações entre as partes e entender como a tecnologia participa para fazer essa experiência satisfatória”. Por isso, os autores criaram um framework que não analisa a experiência, mas serve como ferramenta para falar sobre a experiência. Nessa perspectiva, não seria possível projetar uma experiência, afinal analisar uma experiência é algo muito subjetivo e específico, pois cada experiência é única. Entretanto, é possível concretizar e sistematizar alguns elementos para que o entendimento da experiência fique mais palpável e, assim, projetável. Marc Hassenzahl (2010, p. 6) segue a mesma linha de raciocínio proposta por Wright, McCarthy e Meekison (2004) e argumenta que a experiência é uma qualidade emergente, que não é totalmente redutível a seus elementos e processos subjacentes, nem totalmente explicável por eles, mas que pode ser moldada através de uma cuidadosa elaboração de elementos. Ou seja, a experiência vivida no Django Girls é, em parte, única e individual, mas também pode ser moldada através de elementos como a concepção do workshop, o conteúdo, a disposição dos objetos, etc. A abordagem teórica do framework de Wright, McCarthy e Meekison (2004) é de Dewey (1925; 1934), que é holística, construcionista e pragmática. O conceito de experiência não tem um consenso, mas Wright, McCarthy e Meekison (2004, p. 44) entendem como sendo as relações entre pessoas e tecnologia. Dewey entende a experiência de forma holística, no sentido de que não há divisão entre sujeito e objeto e, sim, a totalidade irredutível de pessoas agindo, sentindo, pensando e atribuindo significados em um contexto, incluindo suas percepções sobre as próprias ações. Essa visão holística de Dewey é compreendida pelos autores (WRIGHT; MCCARTHY; MEEKISON, 2004, p. 46) a partir do conceito de dialogismo de Bakhtin (1986, 1993), que argumenta que na atividade
  • 53. 51 humana sempre existe pelo menos duas consciências envolvidas. Bakhtin diz que nós atribuímos significados a uma experiência a partir da nossa experiência com nós mesmos, nossa cultura e nossa vida. Se uma experiência não pode ser integrada na “minha vida”, se ela não condiz com minha percepção de mim mesma, provavelmente será uma experiência menos envolvente (WRIGHT; MCCARTHY; MEEKISON, 2004, p. 45). O conhecimento dialógico é sempre relacional. O conhecimento de si emerge da expressão das relações de si com os outros. E o conhecimento sobre um objeto emerge da expressão das relações do sujeito com o objeto. Para os autores, isso significa que qualquer discurso sobre a experiência é sempre “social, plural e perspectivista” que, nos termos de Bakhtin, é inter animada com os discursos dos outros (WRIGHT; MCCARTHY; MEEKISON, 2004, p. 45). Framework de análise Na visão de Dewey, a experiência é essencialmente holística, situada e construída. Mas ela precisa ser descrita de forma que se possa compreender. Por isso, Wright, McCarthy e Meekison (2004) descrevem experiência a partir de quatro pontos de vista, que eles chamam no texto de aspectos (threads) e, na segunda parte, demonstram como as pessoas atribuem significado a uma experiência (making sense in experience). Os autores entendem esses quatro aspectos da experiência como fios entrelaçados compondo uma trança. 2.2.7.1 Os quatro aspectos da experiência Composição É a composição estrutural de uma experiência, uma interação que se revela envolvendo a si mesma e os outros. Pode ser pensado como uma estrutura narrativa, as possibilidades de ação, plausibilidade, consequências e explicações de ações. É quando a usuária se pergunta o que aconteceu, o que vai acontecer em seguida, sobre o que é isso, etc. Sensorial É o “look and feel”, a parte visual, sensorial, e, mesmo que não possa ser descrita com precisão, é algo que pode afetar a nossa decisão a respeito da experiência. Esse aspecto é responsável por sensações como emoção, medo, excitação. E também sentimentos como entrar numa sala e acha-la acolhedora, uma sensação de pertencimento, uma ligeira sensação de desconforto ou embaraço numa conversa.
  • 54. 52 Emocional É como nos sentimos na experiência. Pode evocar raiva, alegria, desapontamento, frustração, desespero, etc., como também coisas mais sutis como realização, satisfação, diversão. As emoções podem ser sentidas a partir da nossa própria experiência ou através da empatia. sentir emoções em função da experiência dos outros, como por exemplo, personagem de um filme ou até mesmo o vendedor de uma loja online, mesmo que ele não esteja fisicamente presente. Os autores também alertam para o fato de que as emoções não são apenas respostas passivas, pois muitas de nossas ações são motivadas por aspectos emocionais, como compaixão ou moralidade. Espaço-tempo Toda experiência tem um aspecto espaço-tempo, pois as ações e os eventos acontecem num determinado espaço e em um determinado momento. Por exemplo, quando estamos emocionalmente envolvidos, podemos alterar nossa percepção de tempo e ter a sensação de que o tempo voa. O ritmo de uma experiência pode aumentar ou diminuir, assim como a percepção do espaço pode se ampliar ou se fechar (se sentir confinado) (p. 48). É através do aspecto de espaço-tempo que diferenciamos espaços públicos e privados, reconhecemos zonas de conforto e os limites entre nós e os outros, ou presente e futuro. E isso influencia nos resultados da experiência, como a vontade de ficar ou revisitar lugares ou a vontade de se envolver em uma troca de informações, serviços ou bens. 2.2.7.2 Atribuindo significado à experiência As pessoas constroem ativamente a experiência através de um processo de significação (sense making) e não através de algo dado, pronto. É um processo reflexivo e recursivo. É reflexivo porque a experiência é vista sempre a partir do ponto de vista de alguém. E é recursivo porque estamos sempre envolvidos em dar sentido. Mesmo quando nós refletimos sobre uma experiência passada, nós estamos tendo uma experiência. Os itens do “sense making” não são linearmente relacionados em causa e efeito. Os itens podem se relacionar não-linearmente, como a antecipação influenciar na resposta sensorial. Antecipação Ao analisar uma experiência, temos que considerar o que vem antes e depois que ela termina. Nós trazemos todo tipo de expectativas,
  • 55. 53 possibilidades e formas de dar sentido para um episódio. Podemos ter a sensação de apreensão ou possivelmente de excitação. Os autores afirmam ainda que nós podemos esperar que a experiência ofereça certas possibilidades de ação ou certos resultados, como o desejo de satisfazer certas necessidades. Nós antecipamos o caráter espacial e temporal de uma experiência. Mas a antecipação não é só o que vem antes da experiência em si (por exemplo, o dia do workshop). Os aspectos sensoriais e emocionais da antecipação e nossa expectativa sobre a estrutura composicional e espaço-temporal também ajuda a dar forma à experiência, no sentido de que nossa antecipação está constantemente sendo revisada e se relaciona com a atualidade da experiência. Assim, a relação entre antecipação revisada e atualidade é que cria o espaço da experiência (WRIGHT; MCCARTHY; MEEKISON, 2004, p. 49). Conexão É a primeira impressão, é sensorial, pré-linguística. No aspecto de espaço-tempo, a conexão pode ser percebida como uma percepção de velocidade ou de abertura, por exemplo. Já no aspecto sensorial, a conexão pode se dar através de uma sensação de tensão ou a emoção de uma novidade. Os aspectos emocionais e causal pode provocar um senso de alívio ou antecipação de algo vai acontecer. Interpretação Dar sentido a uma experiência que está acontecendo implica nos aspectos composicionais e emocionais na medida em que discernimos sua estrutura narrativa, os agentes e as possibilidades de ação. Também diz respeito a como isso se relaciona com nossos desejos, esperanças e medos, assim como nossas experiências prévias. Podemos nos sentir desapontados caso nossas expectativas tenham sido frustradas ou podemos nos arrepender de estar naquela situação e querer sair dela. Se nossa interpretação estiver aquém da nossa antecipação, podemos refletir sobre nossas expectativas e alinhá-las para a nova situação. (WRIGHT; MCCARTHY; MEEKISON, 2004, p. 49). Reflexão Nós fazemos julgamentos e atribuímos valores sobre as experiências que estamos vivendo. Refletindo sobre o aspecto causal, podemos nos perguntar se estamos satisfeitos com o senso de progresso na experiência. Do ponto de vista emocional, estamos tendo satisfação ou realização? Na perspectiva sensorial podemos estar ansiosos, entediados ou animados. Além de refletir durante a experiência, refletimos sobre a
  • 56. 54 experiência depois que ela aconteceu. Os autores explicam que criamos um diálogo interno, que é uma forma de recontar internamente e isso ajuda a relatar a experiência para os outros de forma mais avaliativa. (WRIGHT; MCCARTHY; MEEKISON, 2004, p. 49). Apropriação A apropriação é quando relacionamos uma experiência com experiências passadas e futuras. Ao se apropriar de uma experiência fazemos dela a nossa experiência. A relacionamos com nossa percepção de nós mesmos, nossa história pessoal e nossas esperanças para o futuro. E podemos acabar mudando nossa percepção de nós mesmos em função de uma experiência ou ela pode ser apenas mais uma. No aspecto emocional, por exemplo, podemos ter uma experiência de “flow” e engajamento jogando um jogo que seja catártico. Do ponto de vista da composição podemos relacionar uma experiência com a percepção de nós mesmos, como moralidade ou socialmente aceitável (WRIGHT; MCCARTHY; MEEKISON, 2004, p. 50). Recontar Para recontar uma experiência, precisamos ir além da experiência imediata e considerá-la no contexto de outras experiências. Através de um processo interno de recontar nós refletimos e nos apropriamos das experiências e, uma vez apropriada, é natural contar para os outros. Ao recontar para os outros, nós acabamos saboreando de novo, encontrando novas possibilidades e novos significados e normalmente isso nos leva a querer repetir a experiência. Uma mesma experiência ganha diferentes significados e a ela são atribuídos diferentes valores, dependendo do contexto (tempo e espaço) em que recontamos. Ao contar para os outros, lemos uma resposta avaliativa dos outros que acaba modificando nossa própria avaliação. Ou seja, podemos ressignificar e reviver uma experiência ao recontá-la. 2.3 SÍNTESE DO CAPÍTULO Neste capítulo busquei relacionar as diferentes áreas de estudo que compõem esta pesquisa interdisciplinar na criação de um quadro teórico. No capítulo seguinte, apresento o cenário da desigualdade de gênero no campo da STEM a partir da revisão de literatura, bem como as categorias de estudos sobre o tema.
  • 57. 55 3 AS QUESTÕES DE GÊNERO NO CAMPO DA STEM Conforme argumentei na introdução desta dissertação, o campo da STEM se constituiu, histórica e culturalmente, como um espaço masculino, branco, heteronormativo e de classe média/alta. No passado, as mulheres eram simplesmente proibidas de participar do campo, conforme declara Fabiane Lima: [...] a partir do século XVII, em um processo que se estendeu e se consolidou no século XIX, as mulheres foram formalmente proibidas de frequentar ambientes acadêmicos e de pesquisa e passaram a atuar como assistentes anônimas. (LIMA, 2014) A desigualdade de gênero, portanto, é uma característica que acompanhou o desenvolvimento da área da STEM, desde o surgimento até os dias correntes. Na atualidade, ainda existem menos mulheres do que homens trabalhando no campo da STEM. Como veremos na revisão de literatura e nos dados de pesquisa que são apresentados neste capítulo, até hoje as mulheres ganham menos do que os homens nas mesmas funções, ainda que possuam as mesmas qualificações; e também há menos mulheres nas posições de liderança nas empresas. Além disso, grande parte dos professores nas áreas tecnológicas são homens e a maioria dos alunos dos cursos de computação são homens. Como consequência, há menos mulheres produtoras de conhecimento científico-acadêmico e há menos mulheres sendo citadas nas produções científicas nesta área, pois a maioria das linguagens de programação foram escritas por homens. Neste capítulo, então, apresento uma revisão integrativa da literatura, com estudos qualitativos e quantitativos sobre as questões de gênero no campo da STEM. O objetivo é desenhar o cenário em que os estudos relacionam essas duas áreas, gênero e STEM, conhecendo os principais temas. Com isso, pretendo encontrar evidências que ancorem os argumentos necessários ao desenvolvimento da minha pesquisa. Por fim, situo a minha pesquisa dentro do campo de estudos sobre gênero e tecnologia. Os procedimentos metodológicos utilizados embasaram-se na pesquisa bibliográfica (FREIRE, 2013; SEVERINO, 2007). O capítulo foi organizado da seguinte forma: a) Apresentação da revisão integrativa da literatura e dados quantitativos: com base na pesquisa bibliográfica e no levantamento de dados quantitativos sobre gênero e STEM.
  • 58. 56 b) Análise geral dos resultados, agrupando os dados e os estudos em quatro eixos temáticos. c) Apresentação das principais evidências para ancorar os argumentos de pesquisa. d) Situar o trabalho no campo de estudos interdisciplinares sobre gênero e STEM no eixo temático da experiência. 3.1 REVISÃO INTEGRATIVA DA LITERATURA Ao longo do período de pesquisa (2017-2019), realizei buscas em bases de dados e consultei relatórios de pesquisas quantitativas. Algumas buscas foram a partir de sintaxes específicas, enquanto outras, em bases menores e mais pontuais, foram exploratórias. Além disso, pude contar com o apoio de pesquisadoras da área de gênero na indicação de materiais pertinentes. Pesquisei dados e estudos com interseções entre questões de gênero, tecnologia e, eventualmente, educação. Os termos buscados com relação a gênero foram: gênero, gender, gender gap, woman, women, mulher, mulheres. Os termos buscados com relação à tecnologia foram: STEM, technology, code, programming, computing, informática, programação, tecnologia. Os termos buscados com relação à educação foram: education, educação, ensino, aprendizagem, aprendizado. Os resultados foram sistematizados nos quadros 1 e 2, a seguir: Quadro 1 - Revisão bibliográfica Artigos científicos e livros Resultados 1. Bases de dados científicos 1.1. Scopus Sintaxe: TITLE ( ( "gender gap"; OR "woman" ) AND ( "stem" OR "technology" ) AND "education" ) AND ( LIMIT-TO ( SUBJAREA , "SOCI" ) OR LIMIT-TO ( SUBJAREA , "COMP" ) OR LIMIT-TO ( SUBJAREA , "ARTS" ) ) AND ( LIMIT- TO ( LANGUAGE , "English" ) OR LIMIT-TO ( LANGUAGE , "Portuguese" ) ) Total: 29 Selecionados: 10 1.2. ACM Sintaxe: (+code +AND +(woman +OR +women +OR +gender)). Total: 18
  • 59. 57 Selecionados: 18 Sintaxe: (+(code +OR +programming +OR +computing) +(women +OR +woman +OR +gender)). Total: 5 Selecionados: 5 Sintaxe: (women + code). Total: 76 Selecionados: 2 Total de todas as sintaxes: 25 Total selecionados: 4 1.3. Scielo Sintaxe: mulher OR mulheres OR gênero [Todos os índices] and educação OR ensino OR aprendizagem OU aprendizado [Todos os índices] and informática OR programação OR tecnologia [Todos os índices] Total: 147 Selecionados: 6 Total selecionados: 0 1.4. Google Acadêmico Sintaxe: ("ensino programação" mulher), só em português, de 2015-2018 Total: 131 Selecionados: 8 1.5. Science Direct - Revista Computers & Education Sintaxe: (gender OR women OR woman, Title, abstract, keywords) de 2015-2018 Total: 66 Selecionados: 17 2. Grupos de pesquisa e periódicos nacionais 2.1. Revista de Estudos Feministas - UFSC Total: 26 Selecionados: 9 2.2. Cadernos Pagu - Unicamp Total: 4 Selecionados: 4 2.3. Cadernos Gênero e Tecnologia - UTFPR, programas das disciplinas do PPG em Tecnologia e Sociedade relacionadas a gênero e teses e dissertações do programa relacionadas a gênero e tecnologia Cadernos Gênero e Tecnologia: 10 Disciplinas e teses: 15 Total selecionados: 25 2.4. Outros: IBICT - UFRJ Pandora - UFRN GIG@ - UFBA Total selecionados: 4 3. Indicações de pesquisadoras da área de gênero 3.1. Coorientadora de pesquisa: Dra. Maria Collier de Mendonça Total: 8 Selecionados: 6 3.2. Professora e assistente pós- doutoranda da disciplina de Total: 42 Selecionados: 4
  • 60. 58 Relações de Gênero: Dra. Miriam Grossi e Dra. Soraia Mello 4. Outros Pesquisas livres, a partir de referências de textos, etc. Total: 11 Total 102 Quadro 2 - Relatórios de dados quantitativos Dados Quantitativos Descrição Aschcraft et al., 2016. Women in tech: the facts 2016 update. National Center for Women & Information Technology (NCWIT), 2016 Relatório elaborado pelo National Center for Women & Information Technology (NCWIT), organização sem fins lucrativos norte-americana. Os dados referem-se ao campo da tecnologia nos Estados Unidos. BARRETO, 2014. A Mulher No Ensino Superior: Distribuição E Representatividade. Cadernos do GEA, Rio de Janeiro, 2014. Estudo realizado por Andreia Barreto para o Grupo Estratégico de Análise da Educação Superior no Brasil, sobre a presença das mulheres na educação superior com base dados recentes oriundos do Censo da Educação Superior (INEP, 2012) e do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes – Enade (INEP, 2011). Elsevier, 2017. Gender in the global research landscape. Analysis of research performance through a gender lens across 20 years, 12 geographies, and 27 subject areas. Relatório elaborado pelo Grupo Elsevier, referenciando dados de larga escala para monitorar vários aspectos da pesquisa global ao longo de 20 anos, em 12 países, abordando 27 temáticas (ELSEVIER, 2017, p. 6). Neste capítulo, cito dados referentes ao Brasil. HILL, Catherine et al., 2010. Why So Few? Women in Science, Technology, Engineering, and Mathematics. Washington, DC: AAUW, 2010. Relatório elaborado pela American Association of University Women (AAUW) sobre ensino nos Estados Unidos, desde a escola básica até as universidades, focado em mulheres na área de STEM. Os dados incluem diferentes fontes (estadunidenses) e o relatório foi publicado em 2010. Nesta dissertação, utilizo a definição de STEM e alguns dados do cenário estadunidense. IBGE, 2018. Estatísticas de gênero: indicadores sociais das mulheres no Brasil Informativo elaborado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) com dados de abrangência nacional sobre indicadores sociais
  • 61. 59 referentes a mulheres. Nesta pesquisa, utilizo indicadores referentes a trabalho e educação. IBGE, 2017. PNAD contínua - outras formas de trabalho Informativo elaborado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) com dados de abrangência nacional sobre trabalho. Neste capítulo, citamos dados referentes a inserção das mulheres no mercado de trabalho. IBGE, 2009 - PNAD 2009 Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e publicada no ano de 2009. Os dados utilizados são de abrangência nacional e se referem ao tema trabalho e educação das mulheres. INEP, 2007. Simpósio “gênero e indicadores da educação superior brasileira”. Publicação do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) com diversos estudos sobre questões de gênero, bem como análises de indicadores referentes ao tema. Os dados são de abrangência nacional e foram auditados até o ano de 2007. INEP, 2018. Censo da Educação Superior 2017. Divulgação de dados de abrangência nacional, coletados no Censo da Educação Superior em 2017 pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). SOCIEDADE BRASILEIRA DE COMPUTAÇÃO, 2016. Educação Superior em Computação - Estatísticas 2016 Relatório compilado pela Sociedade Brasileira de Computação (SBC) com base em dados nacionais fornecidos pelo INEP, publicados no Censo 2016. "As estatísticas mostram o estado quantitativo da Educação Superior em Computação no país desde 2001, vistas a partir do ano 2016" (SBC, 2016, p. 1). UN Women, 2015. Progress of the World’s Women 2015-2016. Relatório publicado pela United Nations Entity for Gender Equality and the Empowerment of Women (UN Women) com dados internacionais e brasileiros sobre o progresso das mulheres no mundo. UFSC, 2018. Estatística de graduação. Estatísticas regionais referentes aos cursos de graduação em Ciências da Computação e Sistemas de Informação da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), fornecidas pela Secretaria de Tecnologia (SETIC) da universidade. Total 12
  • 62. 60 3.2 ANÁLISE GERAL DOS RESULTADOS Ao analisar os resultados, percebi que os estudos e dados relacionados à interseção entre gênero, tecnologia e educação contemplam temas ligados ao trabalho, à produção científica e tecnológica, à educação e também sobre a experiência de mulheres na STEM. Os estudos sobre trabalho abordam questões como diferença salarial entre homens e mulheres, cargos e lideranças, divisão sexual do trabalho, trabalho e cuidados domésticos, carreiras. Optei por separar em outra categoria os estudos e dados sobre a produção científica e tecnológica porque são sempre permeados por subjetividades, inclusive questões de gênero. A ciência e a tecnologia, como linguagens de programação, são os instrumentos de trabalho no campo da STEM e considero relevante saber quem são as pessoas que as produzem. Os estudos sobre educação trazem dimensões tanto de ensino quanto de aprendizagem, bem como alguns relatos de iniciativas para inclusão de mulheres que foram realizadas em escolas ou universidades. Os dados quantitativos apresentam as diferenças entre os números de alunos e alunas, especialmente no ensino superior. Essas três categorias já eram esperadas, pois os parâmetros das pesquisas relacionavam essas temáticas. No entanto, percebi que alguns estudos falavam especificamente sobre as experiências de mulheres e meninas em relação ao campo da STEM, seja como aluna, seja como profissional no mercado de tecnologia ou, ainda, como professora e pesquisadora. Como minha análise é focada na experiência das mulheres, criei uma categoria especial para essas pesquisas que falam sobre o “ser mulher” na tecnologia. Dessa forma, os resultados da revisão integrativa da literatura dividem-se em quatro categorias: (1) educação, (2) trabalho, (3) produção científica e tecnológica e (4) experiência. Existem outros subcampos do campo da STEM, no entanto, esses são os que identifiquei e escolhi abordar por estarem diretamente relacionados ao objeto de análise desta dissertação, o Django Girls. Em certa medida, o Django Girls está relacionado à educação, pois é um workshop cujo objetivo é ensinar mulheres a programar um site com a linguagem Python através do framework Django. Está fortemente conectado com o mercado de trabalho, tanto por trazer instrutoras que não são professoras e, sim, profissionais atuantes no mercado de tecnologia, quanto por promover um networking que se mostrou efetivo, (re)colocando mulheres no mercado após o evento.