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Universidade do Vale do Rio dos Sinos - Unisinos
Ciências da Comunicação
Comunicação Social – Habilitação: Jornalismo
Camila Schäfer
VGMUSIC COMO PRODUTO CULTURAL
AUTÔNOMO: A MÚSICA PARA ALÉM DOS
VIDEOGAMES
São Leopoldo
2009
Camila Schäfer
VGMUSIC COMO PRODUTO CULTURAL
AUTÔNOMO: A MÚSICA PARA ALÉM DOS
VIDEOGAMES
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado
como requisito parcial para a obtenção do
título de Bacharel em Comunicação Social –
Habilitação Jornalismo, da Universidade do
Vale do Rio dos Sinos.
Orientador: Prof. Tiago Lopes
São Leopoldo
2009
AGRADECIMENTOS
Neste caminho que percorri, diversas pessoas foram importantes. Entre elas posso
citar:
• Minha família e amigos, em especial minha mãe, Analice, que me deu todo apoio e
ajuda em minha vida acadêmica e meu colega Micael pelo auxílio;
• Meu namorado, Tuchaua, que, além de seu apoio e ajuda, foi quem sugeriu o assunto
para meu blog (Console Sonoro), que resultou no tema desta monografia;
• O professor Tiago Lopes, orientador deste trabalho, que também propôs que eu
investisse neste assunto e deu todo o auxílio que necessitei. Agradeço pela sua paciência em
resolver todas as minhas dúvidas;
• Aos entrevistados, que dispuseram de seu tempo para me auxiliar neste mapeamento
e a todos aqueles que, de uma forma ou outra, me auxiliaram neste desafio.
RESUMO
Nos jogos eletrônicos, a música, além de servir como fundo, também é utilizada como forma
de potencializar a experiência de imersão do jogador. Considerando seu papel no game como
de extrema importância, este trabalho procura analisar como a música de videogames ganhou
notoriedade, desencadeando um movimento de autonomização através de processos como a
venda de álbuns com estes temas, o surgimento de bandas e orquestras que os adaptam e a
criação de rádios, comunidades e sites na internet dedicados a esse tipo de música. A fim de
compreender o papel das canções nos jogos, foi preciso analisar sua história, assim como a
forma de produção, sua relação com os processos de interatividade e as sensações que essas
músicas podem causar nos jogadores. Em seguida, foi analisado o movimento de
autonomização da VGMusic, principal foco do trabalho, para identificar em quais mídias esse
tipo de música se insere atualmente e como ela está se tornando uma manifestação cada vez
mais visível também fora dos videogames. A partir destes estudos, da análise dos processos
de autonomização e das entrevistas com jogadores, bandas e compositores, concluiu-se que a
VGMusic, além de sua importância para os jogos, constitui-se num novo fenômeno midiático
que a cada dia cresce mais e contagia mais pessoas ao redor do mundo.
Palavras-chave: VGMusic, Game Music, Música, Jogos eletrônicos.
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1 – Tennis for Two ......................................................................................... 13
FIGURA 2 - Magnavox Odyssey .................................................................................. 14
FIGURA 3 - Pong .......................................................................................................... 15
FIGURA 4 - Pac Man ................................................................................................... 16
FIGURA 5 - Commodore 64 ......................................................................................... 18
FIGURA 6 – Famicom .................................................................................................. 19
FIGURA 7 - Álbum da Yellow Magic Orchestra .......................................................... 41
FIGURA 8 - Álbum Video Game Music ....................................................................... 41
FIGURA 9 - Video Games Live .................................................................................. 50
FIGURA 10 - OC ReMix .............................................................................................. 54
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 7
1.1 GETTING STARTED ............................................................................................... 7
1.2 DESAFIO ................................................................................................................ 8
1.3 METODOLOGIA ................................................................................................... 10
2 VGMUSIC .................................................................................................................. 13
2.1 HISTÓRIA ............................................................................................................... 13
2.1.1 O início ................................................................................................................. 13
2.1.2 O áudio começa a chamar a atenção ................................................................. 14
2.1.3 A busca pelo som perfeito .................................................................................. 15
2.1.4 Início da década de 80 e maior preocupação com a música ........................... 16
2.1.5 As músicas marcantes dos consoles de terceira geração ................................. 18
2.1.6 Quarta geração e o salto em qualidade das músicas ........................................ 21
2.1.7 Quinta geração e sistemas de som mais potentes ............................................. 23
2.1.8 Sexta e sétima geração: poucos avanços na forma de fazer músicas
para videogames .......................................................................................................... 24
2.2 PRODUÇÃO ........................................................................................................... 27
2.3 ESTILO GAME MUSIC? ......................................................................................... 30
2.4 IMPORTÂNCIA DA GAME MUSIC ..................................................................... 31
2.5 IMERSÃO, INTERATIVIDADE E SENSAÇÕES ................................................ 33
3 PROCESSOS DE AUTONOMIZAÇÃO ............................................................... 37
3.1 VENDA DE ÁLBUNS COM MÚSICAS SEPARADAS DOS JOGOS ................ 40
3.2 VERSÕES ............................................................................................................... 43
3.2.1 Bandas .................................................................................................................. 43
3.2.2 Orquestras ............................................................................................................. 49
3.3 INTERNET .............................................................................................................. 51
3.3.1 Comunidades ........................................................................................................ 52
3.3.2 Web-radios ............................................................................................................ 52
3.3.3 Sites ...................................................................................................................... 53
3.4 NOVOS ESTILOS .................................................................................................. 56
3.5 NOVOS FORMATOS DE ARQUIVOS DE ÁUDIO ............................................ 58
3.6 CELULARES .......................................................................................................... 58
4 CONCLUSÃO ............................................................................................................ 60
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................... 63
ANEXO A – Entrevista com compositores brasileiros de música para
videogames - 2009 ......................................................................................................... 67
ANEXO B - Entrevista com bandas e músicos que tocam game music
ou chiptune - 2009 ......................................................................................................... 81
ANEXO C - Entrevista com jogadores, donos de sites e blogs de games - 2009 ......... 94
7
1 INTRODUÇÃO
1.1 Getting Started
Antes de começar a falar em game music e como ela está atingindo outras mídias,
considero importante delinear os principais termos utilizados neste trabalho. Cheguei a esta
conclusão depois de me deparar com uma série de livros e artigos que abordam o tema do
áudio para jogos eletrônicos, mas que não delimitam expressões como soundtrack, game
music, sound symbols e outros. É preciso esclarecer que nenhum dos termos referidos possui
uma definição clara, tanto no meio acadêmico quanto na indústria. Portanto, procurei me
basear nos principais usos e em estudos da área.
Soundtrack ou trilha sonora: Este termo não aparece bem definido na indústria de
games e no meio acadêmico. Apesar de autores da área como Collins (2008), Marks (2001),
Mieszkowski (2002), Assis (2006), Belinkie (1999), Pidkameny (2002), e Mun (2008)
utilizarem “trilha sonora” significando apenas o conjunto das músicas de um jogo eletrônico,
o termo não é especificamente definido em nenhum dos estudos. No entanto, se nos
basearmos em pesquisas da área de cinema, veremos que “trilha sonora” é definida como
todos os sons de uma peça audiovisual, que vão desde a música até os diálogos. “Devemos
entender o conceito de trilha sonora sendo a junção da trilha musical, a pista de ruídos e os
diálogos” (VASCONCELOS, 2007, p. 5). Silva (2005) também possui a mesma visão:
Assim, a estrutura e o sentido do filme, desde o advento do cinema “falado”, são
construídos através das duas bandas da película: a sonora e a visual. Na banda
sonora – que chamamos aqui de trilha sonora - podemos identificar os seguintes
elementos: música, efeito sonoro (sons reconhecíveis e irreconhecíveis ou ruídos) e
voz (falas e narrações). A trilha sonora, portanto, diz respeito aos códigos de
composição sonora, ou em outras palavras, ao agenciamento sintagmático dos
elementos auditivos entre si. (SILVA, 2005, p. 1)
Por isso, tendo em vista a definição que estes autores trazem, mais clara em
comparação aos autores da área de games, considero importante definir “trilha sonora” como
sendo o conjunto de sons de um jogo: música, efeitos sonoros, diálogos, ruídos, etc.
Game Music, Video Game Music, VGMusic, VGM ou música de videogame: Como
o nome sugere, e de acordo com as definições de Collins (2008) e Marks (2001), refere-se aos
temas musicais para jogos eletrônicos. Para este trabalho, será considerada game music toda a
8
música que tenha relação com um jogo, tanto a canção original quanto as versões e remixes.
Como veremos mais adiante, não pode ser considerada um estilo musical porque, em
diferentes jogos existem diferentes estilos musicais, como rock, country, jazz, blues, etc.
Além disso, as músicas não possuem características de composição que possam enquadrá-las
em um mesmo estilo musical, mesmo que elas sejam produzidas de forma igual, ou seja, em
computador e baseadas em sintetizadores1
.
Sound symbol ou símbolo sonoro: são eventos sinalizados com recursos de áudio, ou
seja, pequenos temas musicais – ou sons específicos – que alertam sobre algum
acontecimento importante como "você ganhou", "nova missão" ou "game over".
Além destes termos específicos do áudio em jogos, também acho importante delimitar
o termo jogo, videogame ou game, aqui considerado como jogos eletrônicos, que englobam
todos os jogos em vídeo, seja em consoles domésticos2
, arcades3
, computadores ou
dispositivos móveis, como celulares e consoles portáteis.
1.2 Desafio
Qualquer estudo na área de videogames é um desafio. Mesmo fazendo parte de nossas
vidas há décadas, essa mídia de entretenimento sempre foi vista como brinquedo de criança e
apenas hoje ela ganha contornos mais sérios. A música, por outro lado, que é uma forma de
arte, sempre refletiu modismos e características da sociedade de cada época. Do popular ao
rock e pop, movimentos sociais e políticos do início dos anos 90 foram influenciados e
inspirados pela música. Agora, com a evolução tecnológica dos séculos 20 e 21, o impacto
dela tem se expandido em várias áreas e uma delas é a de videogames.
1
Espécie de instrumento musical eletrônico com o objetivo de produzir sons artificialmente. Ele sintetiza
ondas sonoras através da manipulação direta de correntes elétricas, leitura de dados contidos numa memória,
ou manipulação matemática de valores discretos com o uso de tecnologia digital incluindo computadores ou
por uma combinação de vários métodos. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Sintetizador>. Acesso em: 20
maio 2009.
2
Aparelho eletrônico capaz de executar os jogos eletrônicos que podem estar contidos em cartuchos ou discos
de leitura óptica, como CDs e DVDs. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Console_de_videogame>. Acesso
em: 20 maio 2009.
3
Videogame profissional usado em estabelecimentos de entretenimento, por vezes também chamado
erroneamente no Brasil de fliperama. É composto por um gabinete, tubo de imagem (CRT), monitor, fonte de
alimentação e sistema de jogo. Os fliperamas, por sua vez, são estabelecimentos destinados ao uso de
máquinas do tipo "pinball". Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Fliperama> e
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Arcade>. Acesso em: 20 maio 2009.
9
No início da década de 70, quando surgiram os primeiros jogos eletrônicos, as
composições musicais apareciam no começo ou entre as fases do game. Como eram feitas em
computadores, quem as elaborava era um programador, mesmo que não tivesse experiência
musical alguma. Já na década de 80, essa função foi dada a pessoas com conhecimento
musical, o que resultou em temas com maior qualidade. Essa época foi tão propícia à música
de videogame que muitas delas são lembradas até hoje. Como exemplo, podemos citar a
música tema do jogo Super Mario Bros. (Nintendo, 1985), que, segundo pesquisa realizada
com 47 estudantes universitários, ainda é lembrada por 66% deles, mesmo que eles não
joguem há anos (PIDKAMENY, 2002). Da mesma forma, entre os jogadores que entrevistei4
,
que também são donos de sites e blogs de games, todos afirmaram que poderiam reconhecer a
música de algum jogo mesmo que ela estivesse fora dele.
O sucesso das músicas nos games inspirou muitas produtoras e resultou na venda das
canções à parte do jogo. No Japão, por exemplo, onde essa cultura é mais comum, CDs de
game music são vendidos há anos e em algumas lojas até existem prateleiras dedicadas a esse
tipo de música. Compositores e músicos, que antes trabalhavam em filmes ou faziam música
popular, estão cada vez mais envolvidos na produção de jogos musicais e canções para games,
na medida em que elas ganham maior notoriedade.
Essa fama que alguns temas de jogos ganharam desencadeou um processo de
autonomização da VGMusic tanto em outros países como no Brasil. Entre as características
desse processo estão a venda de álbuns com estes temas; o surgimento de bandas e orquestras
que remixam ou adaptam as músicas dos jogos; o surgimento de rádios, comunidades e sites
na internet dedicadas a esse tipo de música; o uso dessas canções em outras mídias, como
celulares; e o surgimento de novos estilos musicais que adotam praticamente a mesma estética
ou utilizam parte das músicas de videogame.
Portanto, pensando nesse movimento e no processo de autonomização pelo qual a
game music está passando, é que este trabalho tem como objetivo principal realizar um estudo
sobre esse fenômeno, através de uma abordagem que busca evidenciar suas atualizações em
diferentes mídias. O objetivo é analisar, principalmente, o cenário que vem se consolidando
no Brasil e responder a questão: como a música de videogames está se tornando um produto
cultural autônomo, para além dos videogames?
Mas o problema não se esgota aí. Entre os demais objetivos deste trabalho estão:
entender como a música de videogame tem se tornado um produto cultural autônomo, saindo
4
Entrevista com jogadores donos de sites e blogs de games realizada por e-mail (Anexo C).
10
da esfera do próprio videogame; estudar a evolução da game music e suas extensões, como na
área artística e virtual; analisar as possibilidades de uso desse tipo de produto cultural; e
refletir sobre como a sociedade está lidando com esse fenômeno.
Depois das características e objetivos apontados e tendo em vista o fato de não
possuírem pesquisas específicas na área de comunicação que dêem conta desse fenômeno
recente, estudar como a VGMusic vem se consolidando como produto cultural autônomo é
importante uma vez que pesquisará como esse tipo de música está se inserindo em meios
como o artístico (músicos e orquestras) e o midiático (através de sites e blogs).
Ainda cito uma razão pessoal que me motivou a optar pelo tema: tenho um blog
chamado Console Sonoro5
, que traz notícias sobre o mundo da música de videogames.
Através dele pude perceber como essa admiração pela game music está crescendo e se
manifestando na rede, seja através de bandas que fazem suas versões para as músicas, sites e
outros blogs que disponibilizam arquivos musicais ou web-radios. O blog possui uma média
de 150 visitas por semana. A maioria é de leitores que possuem blogs sobre games6
, mas o
assunto também chama a atenção daquelas pessoas que não são do meio. Muitas não sabem
da existência de bandas que fazem versões e ficam admiradas ao saber que a música do jogo
de sua infância agora é tocada por uma banda como qualquer outra ou até mesmo por uma
orquestra.
1.3 Metodologia
Os videogames existem há pouco mais de 30 anos e essa ainda é uma área muito nova
para as pesquisas. No que tange à música de videogame então, fica ainda mais difícil de
encontrar estudos. Por isso, a pesquisa bibliográfica foi feita tendo como base livros e artigos
encontrados, na sua maioria, na web, que tratam de assuntos como cibercultura, VGMusic,
videogames, internet e música.
Mas somente a pesquisa bibliográfica não foi suficiente para dar profundidade e
consistência ao trabalho. Por isso, o que complementou a pesquisa foram as entrevistas em
profundidade. Escolhi esta técnica de coleta de dados por ser a que melhor se encaixa nos
5
<http://consolesonoro.blogspot.com>.
6
De acordo com o site MegaContador, o blog possui uma média de 30 visitas/dia. Oitenta por cento desses
visitantes são novos, mas os outros 20% são pessoas que visitam com maior frequência. A análise foi feita
entre os meses de agosto e outubro.
11
propósitos e objetivos deste trabalho. Como defende Duarte (2008), a entrevista em
profundidade tem como principal qualidade a flexibilidade que dá ao informante na hora de
responder e ao entrevistado na formulação das perguntas. “Este tipo de entrevista procura
intensidade nas respostas, não-quantificação ou representação estatística” (DUARTE, 2008, p.
62). A entrevista em profundidade, de acordo com o autor, busca respostas a partir da
experiência subjetiva da fonte. E é exatamente isso que busquei nas entrevistas realizadas com
compositores, músicos e jogadores. Saber como é a relação deles com a game music e, a partir
daí, compreender como a VGMusic vem atingindo outras mídias. Através das entrevistas em
profundidade não busco a precisão do que está ocorrendo, mas como e por que está
ocorrendo.
Para realizar as entrevistas, procurei dividir o estudo em eixos temáticos. São eles:
produção de VGMusic; a importância da música nos jogos, interatividade, imersão e
sensações; o estilo musical e os processos de autonomização.
As perguntas das entrevistas foram adaptadas aos eixos temáticos e às funções de cada
entrevistado. Essa decisão permitiu uma maior aproximação com o universo de cada um
deles, já que meu objetivo era buscar dados subjetivos.
Em virtude da impossibilidade de realização das entrevistas de forma presencial,
optou-se pela realização das mesmas à distância, via e-mail.
A seleção dos entrevistados foi intencional, pois escolhi pessoas que trabalham,
conhecem e ouvem game music, ou seja, possuem representatividade subjetiva, conforme
defende Duarte (2008).
Entrevistei primeiramente os compositores porque estão mais próximos da indústria de
games e do processo produtivo. A maioria é músico por formação ou já teve pelo menos
algumas aulas de música. Dos 19 e-mails enviados, obtive retorno de 10. A influência musical
destes profissionais é ampla, indo da música clássica ao rock. De acordo com eles, é preciso
ter um bom repertório nesse meio.
Além deles, entrevistei bandas que fazem versões dos temas dos jogos. O blog foi
muito útil neste sentido, pois, através dele, pude entrar em contato com algumas bandas
brasileiras. No total, fiz contato com 9 bandas (7 que fazem versões e 2 que tocam chiptune).
Todos responderam as perguntas. No geral, as bandas são formadas por jovens entre 20 e 30
anos, que tocam temas de jogos da década de 80 e 90 por nostalgia.
Também entrevistei 4 donos de sites e blogs de games porque estão, também,
próximos dos processos de autonomização pelo qual passa a música de videogames.
12
As entrevistas seguiram as necessidades e a dinâmica de uma análise qualitativa, por
isso apresentando um caráter semi-aberto, conforme definido por Boni e Quaresma (2005),
combinando perguntas abertas e fechadas. Esse caráter semi-estruturado das questões permitiu
que eu enviasse por e-mail um roteiro de perguntas já pré-definidas e, assim que recebesse a
resposta, fizesse perguntas adicionais para esclarecer alguma questão que não estava clara.
Como as questões foram enviadas por e-mail, que não permite uma conversa em tempo real,
foram enviadas muitas perguntas no primeiro contato, que depois foram complementadas no
decorrer da conversa.
Até aqui, como vimos, trouxe os principais desafios desta pesquisa, os conceitos e os
motivos que me levaram a este estudo, além da metodologia utilizada.
No capítulo 2 procuro dar uma visão ampla sobre a game music, através de sua
história, forma de produção, relação com o jogador e sua importância para os videogames.
Para isso, trago autores da área de games e áudio, como Collins (2008), Meneguette (2008) e
Marks (2001), além de informações coletadas em sites e blogs especializados e através das
entrevistas realizadas.
Já no capítulo 3 procuro mostrar o que é o remix, sua relação com a cibercultura, a
música eletrônica e a game music. Para isso, trago importantes autores, como André Lemos
(2005) que formula o termo ciber-cultura-remix, Jenkins (2008) com o conceito de
convergência, assim como Manovich (2002), Johnson (1997) e Sá (2006), que também trazem
importantes contribuições. Além disso, no terceiro capítulo trago o mapeamento dos
processos de autonomização da VGMusic, analisando a questão das versões e remixes, das
suas extensões na internet (comunidades, rádios e sites) e do movimento para outras mídias,
como o celular e os CDs. O mapeamento destes processos foi feito através de pesquisas na
internet e das entrevistas, fundamentais para este trabalho.
Para terminar, espero que a leitura seja agradável e que esta pesquisa seja um dos
pontapés iniciais para muitas outras relacionadas à game music que possam surgir.
13
2 VGMUSIC
2.1 História
Neste capítulo, trago um panorama da história da música nos videogames. Como
surgiu, qual sua importância, como foi a evolução tecnológica (que influenciou na forma de
fazer música para jogos) e como ela é produzida atualmente.
2.1.1 O início
Os primeiros jogos de videogame eram muito pobres em recursos tecnológicos. A
maioria era apenas experimentos eletrônicos que testavam a possibilidade de interatividade
televisiva. Nenhum deles possuía áudio (MCDONALD, 2004).
Em 1958, o engenheiro William Higinbotham moldou um tipo de jogo de tênis bruto
em um osciloscópio7
. Chamado de Tennis for Two, é considerado o primeiro "truque" de um
sistema de computador.
Figura 1: Tennis for Two, considerado o primeiro “truque” de computador - Fonte:
<http://en.wikipedia.org/wiki/File:Tennis_for_Two.jpg>. Acesso em: 20 maio 2009.
7
Instrumento destinado à visualização e caracterização de sinais elétricos, principalmente tensões elétricas (ou
diferenças de potencial). O monitor é constituído por um ponto que periodicamente "varre" a tela da esquerda
para a direita. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Oscilosc%C3%B3pio>. Acesso em: 20 maio 2009.
14
Em 30 de julho de 1961, um grupo de estudantes do Massachusetts Institute of
Technology (MIT) testou pela primeira vez Spacewar!, um jogo eletrônico desenvolvido em
um enorme computador que custava milhares de dólares. No entanto, tanto o game de 58
quanto o de 61 eram mudos.
2.1.2 O áudio começa a chamar a atenção
Na década de 70, os jogos eletrônicos começavam a chamar a atenção das pessoas e o
som passou a ser utilizado como recurso para gerar mais interesse nos jogadores. O áudio era
armazenado em suportes físicos, como fitas cassetes e discos de vinil. Porém, estes suportes
eram muito frágeis e caros para serem usados em máquinas de arcade (MENEGUETTE,
2008).
Em 1972 foi lançado o primeiro console doméstico, o Odyssey (Magnavox), nos
Estados Unidos. O sistema era totalmente analógico e não possuía som. Alguns meses depois,
Nolan Bushnell e Ted Dabney lançaram Pong, instalado num console ligado a um monitor e
movido a moedas. Pong foi um dos primeiros jogos a contar com áudio. O som se reduzia a
um mero "blip" que acompanhava cada batida da bola nas raquetes (dois retângulos). Os
criadores queriam colocar sons de multidão, aplausos e vaias, mas o sistema era muito
limitado. Nessa primeira geração dos videogames era utilizada síntese eletrônica de som,
passando-se uma corrente elétrica através de um amplificador, o que gerava alguns “blips” e
“bloops”.
Figura 2: Magnavox Odyssey, primeiro console doméstico - Fonte:
<http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/5/5e/Odysseye2m.png>. Acesso em: 20 maio 2009.
15
Figura 3: Pong, um dos primeiros jogos a ter áudio - Fonte:
<http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/0/0e/PongVideoGameCabinet.jpg>. Acesso em: 20 maio
2009.
2.1.3 A busca pelo som perfeito
As fitas cassetes pré-gravadas com música geravam um alto custo, por isso a melhor
forma de ter música ou efeitos sonoros em um jogo seria através dos meios digitais, usando
um chip de computador que transformaria impulsos elétricos em ondas sonoras analógicas
para um alto-falante. Para inserir música nos jogos, era necessária a transcrição dessas
canções em código de computador, o que necessitava o trabalho de um programador, mesmo
que ele não tivesse nenhuma experiência musical.
Apesar do avanço tecnológico, o máximo que podia ser ouvido nos jogos eram
músicas monofônicas8
e repetidas, na maioria das vezes usadas em telas de abertura ou entre
as fases, como em Pac Man (Namco, 1981, um dos jogos mais famosos de todos os tempos) e
Pole Position (Namco, 1982). Devido às limitações tecnológicas, sempre houve uma briga
para reduzir o tamanho dos arquivos de áudio, por isso alguns jogos possuíam música apenas
na introdução e efeitos sonoros durante o jogo (COLLINS, 2008).
8
Monaural, ou Mono, é o sistema de gravação e reprodução do som em que todo o som é transmitido por meio
de um único canal, também chamado de monofônico. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Monaural>.
Acesso em: 20 maio 2009.
16
Figura 4: Pac Man, um dos jogos mais famosos de todos os tempos - Fonte:
<http://upload.wikimedia.org/wikipedia/en/5/59/Pac-man.png>. Acesso em: 20 maio 2009.
Na segunda geração de videogames surgiram consoles como o Atari 2600 (lançado em
1977) e Mattel Intellivison (lançado em 1979, com um gerador de som de três canais9
, ou
tons). O sistema do Atari era limitado, por isso suas concorrentes, a Mattel e a Coleco,
melhoraram o som e os gráficos em seus consoles, o Intellivison e o Colecovision.
Os primeiros jogos de arcade possuíam sons fortes porque, como ficavam em lugares
movimentados, precisavam competir com os sons do ambiente. Além disso, precisavam atrair
jogadores e mantê-los interessados.
Em 1978, a Taito lançou Space Invaders, um jogo que possuía de fundo uma batida
contínua, simulando um coração pulsante. Além disso, sua trilha mudava na medida em que
os inimigos se aproximavam, causando medo e suspense.
2.1.4 Início da década de 80 e maior preocupação com a música
Na década de 80 houve um verdadeiro salto tecnológico com os avanços em relação ao
silício10
e a queda nos custos de tecnologia, fazendo com que surgisse uma geração nova de
máquinas de arcades e consoles caseiros.
9
Os canais também são o número de sons simultâneos que a placa de som pode manipular de uma vez. Fonte:
<http://www.microsoft.com/brasil/windowsxp/using/games/learnmore/soundcard101.mspx>. Acesso em: 20
maio 2009.
10
Segundo elemento químico mais abundante da face da Terra. É o principal componente da maioria dos
componentes semicondutores e dos silicones, que são substâncias plásticas muitas vezes confundidas com o
silício. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Silicio>. Acesso em: 20 maio 2009.
17
Os arcades eram baseados no CPU11
68000 da Motorola e nos chips de som YM da
Yamaha. Esses chips possuíam maior variedade de tons, ou canais de som, chegando a até
oito. A maioria dos sistemas trazia co-processadores para lidar com o som. A vantagem é que
a música poderia ser tocada sem ser interrompida pelos efeitos sonoros, mesmo não existindo
música contínua em grande parte dos games nessa época.
No ano de 1980, a empresa Sega lançou Carnival, considerado o primeiro jogo com
música de fundo contínua (JOHANN; VARGAS, 2009).
Por terem surgido antes, os arcades evoluíram mais rapidamente que os consoles
caseiros, permitindo uma maior capacidade de armazenamento de memória nas placas (com
mais canais de áudio). Com isso, as produtoras passaram a investir mais na música, criando
pequenos trechos musicais (que duravam segundos) dentro dos jogos. O objetivo era uma
maior identificação entre os personagens e jogadores.
Em 1981 foi lançado para arcades o jogo Tempest (Atari), que incorporava dois chips
especialmente para o som (chamados de Pokey e criados pela própria Atari). Eles permitiam
oito canais de som simultâneos, que possibilitavam diversas combinações.
A preocupação com a música nos jogos começou a aumentar e músicos foram
contratados para compor as faixas. Algumas delas fizeram tanto sucesso que passaram a ser
vendidas separadas dos jogos pela primeira vez (MENEGUETTE, 2008). Também em 1981, a
dupla norte-americana Buckner e Garcia fez a música Pac Man Fever, em homenagem ao
jogo, que era uma febre naquele ano. O single da música vendeu mais de dois milhões de
cópias em 1982.
O ano de 1981 marcou o nascimento do jogo que foi o grande sucesso da Nintendo:
Donkey Kong. Nele, o personagem Mario apareceu pela primeira vez. O criador do jogo, o
então iniciante Shigeru Miyamoto, também compôs as músicas, feitas em um pequeno teclado
eletrônico.
A fim de concorrer com as empresas de consoles domésticos, a Commodore lançou o
Commodore 64 (C64), considerado um dos computadores pessoais mais vendidos de todos os
tempos. Seu preço relativamente baixo aumentou a procura por Personal Computer (PC),
ainda mais porque a televisão poderia ser usada como monitor. O Commodore foi o primeiro
sistema doméstico a ter chips separados para som e imagem. Seu chip de som é o 6581 Sound
Interface System (SID), considerado muito avançado para a sua época, pois imitava
11
Central Processing Unit em inglês, ou Unidade Central de Processamento, microprocessador ou Processador,
é a parte de um computador que processa as instruções contidas no software. Fonte:
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Cpu>. Acesso em: 20 maio 2009.
18
instrumentos musicais tradicionais com maior precisão que outros chips. Ele possuía três
canais que dispunham de vários filtros12
e moduladores13
. Com um som igual ao dos
sintetizadores da época, o chip funcionava por meio de síntese subtrativa, que convertia os
impulsos elétricos em ondas de som analógicas. Isso gerou novas possibilidades sonoras,
muito exploradas por compositores da época, que foram fortemente influenciados pelo rock
progressivo (especialmente Rick Wakeman), pelo som espacial de Jean Michel Jarre e pelo
Europop. Esse tipo de som se tornou uma característica marcante do C64.
Figura 5: Commodore 64, um dos computadores mais vendidos do mundo - Fonte:
<http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/9/9d/Commodore64.jpg>. Acesso em: 20 maio 2009.
2.1.5 As músicas marcantes dos consoles de terceira geração
Em 1983 começaram a surgir os consoles da terceira geração (8 bits14
), como o
Famicom, o Master System e o Atari 7800.
O Famicom (de Family Computer) foi lançado em 83 pela Nintendo e foi um dos seus
consoles mais famosos. No entanto, ele ficou popular dois anos depois, ao ser lançado no
mundo com a sigla NES, de Nintendo Entertainment System. O Famicom possuía um
processador Motorola 6502 e um sistema de som com 4 canais de síntese e outro capaz de
12
A princípio, qualquer operador ou dispositivo que modifique um sinal de áudio pode ser considerado um
filtro. Um filtro atenua a quantidade de energia presente em certas frequências ou faixas de frequências de
áudio. Existem muitos tipos de filtros, com características e aplicações bastante diferentes. Fonte:
<http://www.eca.usp.br/prof/iazzetta/tutor/audio/filtros/filtros.html>. Acesso em: 20 maio 2009.
13
Nos sintetizadores, eles alteram um valor pré-programado. Fonte: <http://roland.com.br/suporte/glossary/m>.
Acesso em: 20 maio 2009.
14
Os bits se referem à capacidade de processamento da CPU do console.
19
gerar sons digitais simples em PCM15
. Ele simula 4 “instrumentos”: um baixo, duas guitarras
e uma bateria.
Conforme foram sendo lançados outros consoles que possuíam muito mais canais de
áudio, o NES tentou se manter competitivo no mercado acrescentando nos cartuchos
um chip extra que melhorava um pouco os gráficos e aumentava o número de canais
de som. (MENEGUETTE, não paginado, 2008)
Figura 6: Famicom, um dos consoles mais famosos da Nintendo - Fonte:
<http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/d/df/Nintendo_entertainment_system.png>. Acesso em: 20
maio 2009.
Em 1984 a gravadora Yen lançou o primeiro álbum de game music. Ele trazia as faixas
originais de vários jogos da Namco, como Pole Position (1982), Xevious (1982), Pac Man
(1981), New Rally X (1981), entre outros, como veremos mais adiante.
O ano de 1985 marcou o nascimento de Super Mario Bros. e a popularidade do NES
(lançado mundialmente neste ano). O game é um dos mais famosos do mundo até hoje. A
música foi criada por um compositor profissional, Koji Kondo, e é considerada uma obra
prima em relação às limitações que o sistema impunha ao músico. Este ficou famoso
posteriormente por ter elaborado outras belas composições para jogos.
As músicas e os efeitos de Super Mario Bros. inauguraram uma era de novidades em
relação ao áudio para games. Ele criou algo novo, especialmente por causa de seus sound
symbols, que indicam, a cada momento, o status do jogador, como “está acabando seu tempo”,
“você está imune”, “você ganhou”, “você perdeu”, etc. Se jogar o jogo sem som, você perde
esses sinais (MCDONALD, 2004).
Em 1985, o computador PC-8801, lançado em 79, ganhou uma placa de som com a
série PC-8001mkIISR. Uma geração de fãs de música pode aprender a programar músicas no
novo PC, para depois enviar às revistas especializadas. Aqueles que hoje são grandes nomes
15
Modulação por código de pulsos ou modulação por pulso codificado, PCM é uma representação digital de
um sinal analógico. O objetivo é fazer com que um sinal analógico possa ser transmitido através de um meio
físico com transmissão digital. É também o método utilizado para gravar e armazenar amostras em vários
tipos de sintetizadores. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Pcm>. Acesso em: 20 maio 2009.
20
da game music, como Yuzo Koshiro, são dessa geração. O PC-8001mkIISR possuía um
processador de som Yamaha YM-2203, de 8 bits16
.
Na metade da década de 80 houve uma grande onda de lançamentos de jogos que
tinham música composta por pessoas com experiência musical. Essas pessoas passaram a
estudar os videogames, criando composições complexas de acordo com o tema do jogo. A
qualidade das canções avançou muito, tanto que essas músicas são populares até hoje17
.
Outro computador lançado em 1985 foi o Commodore Amiga. Ele foi comprado pela
Commodore International e vendido como sucessor do Commodore 64. O Amiga teve vários
modelos, mas o som permaneceu o mesmo em todos. Todo seu sistema era muito avançado
para a época. O chip de som, apelidado de “Paula”, suportava 4 canais de som estéreo18
.
Porém, com um truque de programação ele podia ampliar sua capacidade para 8 canais. Ele
permitia executar samples19
de sons pré-gravados, armazenados em memória. Esses samples
podiam ser de um instrumento real ou de um som desejado em uma qualidade e fidelidade
significativamente mais altas do que a de anos atrás. Os arquivos utilizados no Amiga eram
em formato MOD20
. Esse formato possibilitou mais sons, que por sua vez eram mais realistas
e fáceis de manipular pelos programadores que não eram músicos (COLLINS, 2008).
A fim de competir com a Nintendo nos consoles de 8 bits, a Sega lançou o Master
System em 1986. Mesmo superior ao NES em relação aos gráficos e ao som (já que foi
lançado anos depois), ele não fez tanto sucesso no mercado norte-americano e japonês. O chip
SN76489, da Texas Instrument, proporcionava 4 canais de som mono no formato PSG21
, que
tinha a característica de soar muito vibrante e metálico aos ouvidos.
Outra empresa que queria entrar na briga e restabelecer sua supremacia era a Atari,
lançando, no mesmo ano, o Atari 7800. Ele possuía um processador de áudio de dois canais
16
Neste caso se refere aos bits do processador de som, e não os da CPU. Eles indicam a quantidade de tons
simultâneos com que o sistema pode trabalhar. Fonte: <http://www.wiki2buy.com.br/wiki/Placa_de_Som>.
Acesso em: 20 maio 2009.
17
Entre os compositores que ganharam fama com músicas compostas para esses jogos são Koji Kondo (Super
Mario Bros., The Legend of Zelda, da Nintendo, 1987), Koichi Sugiyama (Dragon Quest, da Enix, 1986),
Rob Hubbard, Hirokazu Tanaka (Metroid, da Nintendo, 1986, e Kid Icarus, da Nintendo, 1988), Martin
Galway (Times of Lore, da Origin Systems, 1988), Hiroshi Miyauchi (Out Run, da Sega, 1986), Nobuo
Uematsu (Final Fantasy, da Square, 1987).
18
Consiste num sistema de reprodução do áudio que utiliza dois canais de som monaurais distintos (direito e
esquerdo) sincronizados no tempo. É o padrão de reprodução encontrado nos CDs de música, porém vem
sendo substituído nos cinema e em algumas gravações musicais pelo áudio multicanal (5.1/7.1). Fonte:
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Estereofonia>. Acesso em: 20 maio 2009.
19
Amostra de áudio.
20
Formato de arquivo utilizado principalmente para representar música. Ele contém um conjunto de
instrumentos na forma de amostras e uma série de padrões indicando como e quando as amostras devem ser
tocadas.
21
Programmable Sound Generator ou gerador de sons programável.
21
separados, gerando um desempenho superior em velocidade ao NES e gráficos e sons de
qualidade similar ao Master System. Porém, o que decretou o fracasso do Atari 7800, mesmo
sendo superior aos concorrentes, foi o baixíssimo acervo de jogos.
O ano de 1987 marcou o nascimento de The Legend of Zelda (Nintendo) para o NES,
outro dos jogos mais famosos da empresa, juntamente com Super Mario Bros. (1985) e
Metroid (1986). Suas músicas fizeram e ainda fazem sucesso, tanto que podem ser
encontradas na web em diversos formatos, como MP322
e MIDI23
.
Também em 87 foi lançado Final Fantasy (Square), para o NES, no Japão. Suas
músicas foram compostas por Nobuo Uematsu, um dos maiores nomes da VGMusic de todos
os tempos. As composições para esta série são consideradas verdadeiras obras primas até
hoje, mesmo com as limitações que o sistema impunha ao compositor.
2.1.6 Quarta geração e o salto em qualidade das músicas
A era dos consoles 16 bits, ou quarta geração, iniciou em 87, com destaque para Super
Nintendo (ou SNES, da Nintendo), Mega Drive (Sega), Neo Geo (SNK) e PC-Engine (NEC).
Esses consoles possuíam sistemas próprios de samplers24
e permitiam mais possibilidades de
síntese de sons. Além disso, possuíam sistema estéreo e cada vez mais canais de áudio
simultâneos. Houve um verdadeiro salto em qualidade das músicas nessa época. De acordo
com Collins (2008), um dos principais avanços dessa geração foi a introdução de chips FM25
,
que eram mais flexíveis e ofereciam um leque maior de timbres26
e som.
22
O MP3 (MPEG-1/2 Audio Layer 3) foi um dos primeiros tipos de compressão de áudio com perdas quase
imperceptíveis ao ouvido humano. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Mp3>. Acesso em: 20 maio 2009.
23
Musical Instrument Digital Interface, que é uma forma de armazenar em pequenos arquivos de computador,
músicas que podem ser executadas pela placa de som do computador. Os arquivos MIDI apenas guardam as
notações musicais, ou seja, a partitura da música, informações que a placa de som precisa para tocá-la.
24
Equipamento que consegue armazenar sons numa memória digital, e reproduzi-los posteriormente. Um dos
grandes responsáveis pela revolução da música eletrônica, pois através dele e usando ciclos (loops em
inglês), pode-se manipular os sons para criar novas e complexas melodias ou efeitos. Fonte:
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Samplers>. Acesso em: 20 maio 2009.
25
Na síntese de FM, quando um arquivo MIDI é executado, o sintetizador cria eletronicamente o som de cada
instrumento. Dessa forma, o som percebido por nosso ouvido não é o do instrumento, mas sim um som
eletrônico tentando imitá-lo. Percebemos que o som é típico de computador e não tem qualidade para uso
profissional. Fonte: <http://www.clubedohardware.com.br/printpage/919>. Acesso em: 20 maio 2009.
26
O timbre é aquilo que faz você saber a diferença entre o que é um violão, uma flauta, uma buzina de carro ou
uma voz feminina. São as propriedades físicas do som que atuam sobre partículas da atmosfera produzindo
uma diferença que pode ser estabelecida por seu aparelho auditivo. Fonte: <http://www.estudiolivre.org/tiki
index.php?page=TestesDeEqualizacaoEPercepcaoDoTimbre&bl>. Acesso em: 20 maio 2009.
22
Também aqui houve a adoção do MIDI. Ele foi criado em 1983 para que dispositivos
musicais como sintetizadores, teclados e sequenciadores27
fossem compatíveis em um formato
padronizado. Somente códigos eram transmitidos, ao invés de sons reais, o que ocupava
menos memória, uma vantagem para o desenvolvimento de jogos. Para os músicos também
foi vantajoso porque agora poderiam compor as músicas em teclados, sem linguagem de
programação. Com isso, mais músicos passaram a trabalhar no desenvolvimento de músicas
para jogos eletrônicos. As experimentações se tornaram mais sofisticadas e os sons mais
limpos.
Em 1987 o PC-Engine (TurboGrafx-16, nos EUA) foi lançado pela NEC em parceria
com a Hudson Soft. O detalhe mais marcante no novo console era seu suporte para leitor de
CD-ROM, uma inovação na época. Os jogos gravados em CD eram superiores a qualquer
jogo existente no mercado e algumas características, como músicas digitais, vozes e
animações eram os grandes atrativos do novo console.
Já em 1988 foi lançado o Mega Drive (ou Sega Genesis, como é conhecido nos
Estados Unidos). Apesar dos grandes avanços gráficos em relação ao NES e a melhorada
capacidade de síntese de som, o Mega Drive ainda mantinha várias similaridades com o modo
de desenvolvimento de som de seus antecessores. Seu chip, o YM2612, é um sintetizador FM,
que gera o som a partir de uma soma de frequências. O som tinha qualidade de CD e os
múltiplos canais permitiram diversos efeitos, que agora eram mais realistas. Outra
característica do Genesis foi a adoção de traços estilísticos do rock progressivo (COLLINS,
2008).
Para concorrer com o Genesis, a Nintendo lançou o Super Famicom (ou Super
Nintendo, ou ainda SNES, como é conhecido no ocidente). Deste lado do mundo ele foi
lançado em 1991. O console trazia um chip especializado da Sony para geração de som e
DSP28
. Com um sistema avançado para a época, seu chip, o SONY SPC700, é um sintetizador
wavetable29
, que gerava o som a partir de samples comprimidos de instrumentos reais e era
27
Programa onde uma música é programada. É uma tecnologia de partitura digital. Assim como os músicos
lêem a partitura para tocar uma música, o sequenciador lê a sequência para tocar uma música, utilizando
instrumentos sintetizados. Fonte: <http://forum.cifraclub.terra.com.br/forum/8/54226/>. Acesso em: 20 maio
2009.
28
Digital Signal Processor, são microprocessadores especializados em processamento digital de sinais. Ganhou
popularidade na eletrônica em aparelhos como os teclados, que sintetizam os sons de diversos instrumentos,
como órgãos, piano e violão. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Digital_Signal_Processor>. Acesso em: 20
maio 2009.
29
Na síntese por wavetable, a placa de som possui uma memória ROM (tipo de memória que permite apenas a
leitura, ou seja, não podem ser alteradas ou apagadas, somente acessadas) contendo os sons dos instrumentos,
que foram gravados em estúdio. Com isso, ao executarmos um arquivo MIDI, o som que escutamos não é
criado pela placa de som, mas uma gravação real dos instrumentos, como se estivéssemos dando um "play"
23
mais realista que o FM do Mega Drive. Ele emulava os instrumentos e era capaz de 8 canais
de sons digitais com uma resolução de até 16 bits. Enquanto o Mega Drive trazia
características do rock progressivo, o SNES era mais inclinado para as músicas populares dos
anos 90, de acordo com Collins (2008).
Com o advento do CD, a música de videogames ficou ainda mais popular. Agora os
compositores não estavam mais limitados pelos processadores sonoros e a pouca memória e
podiam gravar as músicas em estúdio, como em um CD de música comum.
Outros consoles surgiram na mesma época que o SNES, mas tiveram pouca
popularidade. A SNK lançou o Neo Geo em 1990, que possui um poderoso sistema de
processamento de samples, mas era bem mais caro que o Super Nintendo. Seu chip era um
Yamaha YM2610 com 15 canais de som (7 digitais, 4 de síntese FM, 3 PSG e 1 de ruídos).
2.1.7 Quinta geração e sistemas de som mais potentes
Na quinta geração, com consoles como Jaguar (Atari), Saturn (Sega), PlayStation
(Sony) e Nintendo 64 (Nintendo), os sistemas de som passaram a ser mais potentes e
permitiram uma trilha sonora com maior qualidade. Essa qualidade foi possibilitada pelo uso
de mídias ópticas30
, com grande capacidade de armazenamento em relação aos cartuchos. Elas
permitiram o processamento mais rápido dos consoles e melhora da transformação
analógico/digital do sinal sonoro em samples de alta fidelidade.
Um dos primeiros consoles de 32 bits foi o Atari Jaguar, lançado em 1993. Apesar da
qualidade do áudio ser igual a de CD, ele fez pouco sucesso entre os jogadores. Um dos jogos
mais populares do console, Tempest 2000 (1994) foi um dos primeiros a ter as músicas
vendidas separadamente do jogo, em formato MOD.
Preocupada com a nova geração de videogames em CD-ROM, a Nintendo resolveu
projetar o Super Famicon CD. Para isso, fez uma parceria com a Sony para realizar o projeto.
O console foi anunciado, mas nunca finalizado. A Nintendo então rompeu a parceria e deixou
em uma gravação feita com instrumentos em estúdio. Com isso, percebemos que o som é real, e pode ser
usado em aplicações profissionais. Fonte: <http://www.clubedohardware.com.br/printpage/919>. Acesso em:
20 maio 2009.
30
São meios de arquivamento que utilizam tecnologia laser de gravação. Comportam grandes quantidades de
informação em menos espaço. Desde sua criação, as mídias ópticas vêm se aperfeiçoando muito, e a cada dia
são mais populares, o que tem reduzido significativamente seu custo. Como exemplos, temos o CD, DVD,
Mini-CD, Blu-Ray e HD-DVD. Fonte: <http://www.updatebrasil.com/frames/midia_optica.htm>. Acesso em:
20 maio 2009.
24
a tecnologia do novo console com a Sony. Para a surpresa das concorrentes, a empresa deu
continuidade ao projeto e entrou na briga de consoles com seu PlayStation, em 1994. O
videogame teve sucesso imediato e popularizou os jogos em CD, assim como algumas
músicas. Ele trazia suporte a 24 canais de sons em até 44.1 kHz, uma qualidade equivalente à
de CD e que permitia efeitos digitais, tais como reverberação31
e looping32
. Mesmo assim,
muitos jogos da Squaresoft continuaram a usar música sequenciada, como em Final Fantasy
VII (1997), Legend of Mana (2000) e Final Fantasy Tactics (1997).
Após desistir da Sony, a Nintendo resolveu não lançar um console de 32 bits, indo
direto ao de 64 bits, o Nintendo 64, em 1996. O N64 tinha até 100 canais e 48 kHz de
fidelidade de reprodução, suporte a formato PCM e diversos efeitos especiais. Ao contrário do
que acontecia na época, a Nintendo continuou usando cartuchos ao invés de CD-ROM e não
conseguiu competir com o PlayStation. Os jogos para o N64 também tiveram trilhas pouco
marcantes e os sons digitais tinham qualidade inferior em relação a seus concorrentes, devido
ao custo da memória em estado sólido, o que fazia com que as músicas dos jogos do console
fossem mais simples.
2.1.8 Sexta e sétima geração: poucos avanços na forma de fazer música para videogames
Em 1998 a Sega lançou o primeiro console de 128 bits, o Dreamcast, dando início à
sexta geração de consoles, que ainda traria o GameCube (Nintendo), o PlayStation 2 (Sony) e
o Xbox (Microsoft).
Apesar da avançada tecnologia, o Dreamcast agradou pouco o público. O som tinha
dois processadores, e, ao contrário do Nintendo 64, as amostras não precisavam ser
31
Quando uma fonte sonora é acionada, as primeiras ondas geradas propagam-se até as paredes, sendo
refletidas. Percorrem um caminho em ziguezague por todas as direções. Nesse intervalo de tempo, a fonte
emitiu novas ondas que se combinam com as anteriores. As vibrações sonoras aumentam, portanto,
progressivamente de intensidade até alcançar um valor estacionário. A reverberação ocorre quando a
diferença entre os instantes de recebimento dos dois sons é inferior a 0,1 s. Fonte:
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Reverbera%C3%A7%C3%A3o>. Acesso em: 20 maio 2009.
32
Permite tocar o mesmo trecho de uma música ou tocar uma frase em um sampler, repetidas vezes
subsequentes. No caso de processadores de efeito, loop representa uma forma de aplicar o efeito ao sinal de
áudio, enviando uma parte do som natural para o processador de efeito e depois mixando o sinal já
processado junto com o sinal natural (limpo). Fonte: <http://roland.com.br/suporte/glossary/l>. Acesso em:
20 maio 2009.
25
descomprimidas, o que melhorava a fidelidade do áudio. Possuía um processador de som
Yamaha de 64 canais (45MHz) e som surround33
.
Em 1998 a Nintendo lançou A Legend of Zelda: Ocarina of Time para o Nintendo 64.
Este é um dos primeiros jogos onde a música influencia na jogabilidade. No game, você usa a
ocarina, espécie de flauta, para abrir portais, se teleportar ou convocar aliados.
Muito esperado pelos jogadores, a Sony lançou o PlayStation 2, em 2000. Além da
CPU de 128 bits, seu sistema de som possui 48 canais de som mais 2MB de memória somente
para o som. O console também pode reproduzir filmes em DVD e possui som surround em
formato AC334
. Seu sucesso foi enorme, assim como os jogos lançados, com bons gráficos e
trilhas cinematográficas.
No ano seguinte, em 2001, a Microsoft entrou na briga pelos consoles e lançou o
Xbox, com 64 canais 3D35
(até 256 vozes em estéreo) e Dolby Digital 5.136
. O console possui
quatro processadores independentes para o áudio e os compositores que compõem para o
Xbox não precisam aprender a usar as novas ferramentas, mas podem usar seus equipamentos
comuns de áudio, como sequenciadores (MARKS, 2001).
No ano de 2004 aconteceu um fato inusitado. A dupla de nado sincronizado dos
Estados Unidos, Alison Bartosik e Anna Kozlova, utilizou as músicas "One Winged Angel" e
“Liberi Fatali”, ambas do jogo Final Fantasy VIII (Squaresoft, 1999), para sonorizar as
coreografias subaquáticas. A prova lhes rendeu a medalha de bronze.
Em 2005 foi lançado o Xbox 360, com saída surround, suporte para áudio em 16 bits e
mais de 256 canais de áudio. Ele dá início à geração atual (sétima) de consoles, que conta
ainda com o PlayStation 3 e o Nintendo Wii.
O PlayStation 3 foi lançado em 2006. Entre as funções do console estão uma robusta
capacidade para multimídia, conectividade com o PlayStation Portable (console portátil da
33
Som Surround é o conceito da expansão da imagem do som a duas ou três dimensões. O surround recria um
ambiente mais realista de áudio através de várias caixas de som espalhadas pelo ambiente. Enquanto o
estéreo possui dois canais, o surround possui quatro (esquerdo, direito, central e surround) codificados em
uma trilha de dois canais. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Dolby>. Acesso em: 20 maio 2009.
34
O Dolby Digital ou AC3 é um formato de compressão de dados de áudio desenvolvido pela Dolby
Laboratories, Inc. que é muito utilizado nos filmes em DVD. Destaca-se pelo sistema que permite armazenar
áudio em múltiplos canais independentes. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Dolby>. Acesso em: 20 maio
2009.
35
O som 3D ou Binaural tem a capacidade de dar a sensação de espaço e tempo aos sons. Fonte:
<http://www.informemusical.com.br/ver_artigo.php?id=9>. Acesso em: 20 maio 2009.
36
Mesmo que o AC3, ou seja, possui cinco canais de som separados e um canal para os graves. Fonte:
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Dolby>. Acesso em: 20 maio 2009.
26
Sony) e o uso da próxima geração de discos ópticos, Blu-ray Disc37
, como o meio de
armazenamento primário. Ainda possui saída S/PDIF para áudio digital até 7.138
, que pode ser
conectada a um home theater39
e dar ao jogador maior sensação de realismo. Ao contrário de
consoles anteriores, o Processador Central Cell se encarrega também pelo áudio (JOHANN;
VARGAS, 2009).
Ainda em 2006, a Nintendo lança o Wii, com uma proposta totalmente diferente. O
controle, Wii Remote, possui sensores de movimento e para jogar o jogador precisa
movimentá-lo. O áudio principal é Dolby Pro Logic II40
.
Em 2008, outro fato curioso. O candidato à presidência dos EUA, John McCain, usou
em um de seus vídeos de campanha uma música do jogo Medal of Honor: European Assault
(Electronic Arts, 2005). McCain fala no vídeo da participação de sua família nas guerras e
também da sua prisão no Vietnã ao som da música do jogo. Porém, o compositor da canção,
Christopher Lennertz, não ficou muito feliz com a ideia porque ele era um defensor ferrenho
de Barack Obama.
A tecnologia mudou a forma de fazer música porque agora os compositores não
dependem mais da memória ou capacidade de processamento dos consoles, exceto no caso
dos dispositivos portáteis, que possuem memória limitada. Aí, ainda são utilizadas técnicas
similares àquelas adotadas nos anos 90. De qualquer forma, atualmente os compositores têm
mais liberdade para criar. No entanto, o processo criativo continua o mesmo. Utiliza-se o
conceito do leitmotiv41
definindo o clima e o tema de cada cena e logo após os pontos
musicais de articulação com o enredo proposto, de acordo com Allen Ferraudo42
. “Certamente
pode-se identificar uma mudança de sonoridade através das gerações, mas esteticamente
criou-se uma linguagem própria, tendo o loop como elemento que exemplifica a própria
lógica da máquina, com seus ciclos calculados e sintéticos” (como aponta Lucas
37
O DVD, usado no PlayStation 2 e no Xbox, estoca até 4,7 gigabytes por camada, podendo conter até duas
camadas. Já o Blu-Ray armazena até 25 gigabytes por camada, podendo conter até duas. Existem protótipos
com até 8 camadas e protótipos com 6 camadas de 33 gigabytes cada.
38
Enquanto o AC3 possui cinco canais de som separados e um para os graves, o 7.1 é capaz de reproduzir 8
canais.
39
Home Theater, também conhecido como home cinema ou cinema em casa, é o nome que se dá ao hobby que
consiste em montar pequenas salas de cinema em residências usando sofisticados aparelhos eletrônicos.
Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Home_theater>. Acesso em: 20 maio 2009.
40
O Dolby Pro Logic II permite uma reconstituição artificial de um ambiente sonoro 5.1 graças a tratamentos
informáticos aplicados a uma fonte estéreo (2.0) ou Dolby Surround (3.0/4.0/4.1). Fonte:
<http://pt.kioskea.net/contents/audio/dolby-surround-pro-logic.php3>. Acesso em: 20 maio 2009.
41
Técnica de composição introduzida por Richard Wagner em suas óperas, constituindo-se em tema associado,
no decurso de todo o drama musical, a uma personagem, uma situação, um sentimento, ou um objeto. Fonte:
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Leitmotiv>. Acesso em: 30 set. 2009.
42
Entrevista com Allen Ferraudo realizada por e-mail em 15 de setembro de 2009 (Anexo A).
27
Meneguette43
). A seguir, mostrarei como é o processo de produção das músicas para
videogames atualmente e como são tratadas as questões da interatividade, imersão e sensações
causadas pela game music.
2.2 Produção
A música para videogames é produzida durante a criação do próprio jogo e, na maioria
das vezes, com poucos dados do game. Na hora de produzir um jogo, um time de
desenvolvedores é montado. Eles podem ser terceirizados, funcionários da empresa com
contrato permanente (in-house) ou independentes. No caso do áudio, a maioria é terceirizado
ou free lancer. Entre os profissionais que fazem parte do processo de produção estão
principalmente: compositor (que compõe as músicas); sound designer (que desenvolve e
implementa os sons); voice talent (que faz os diálogos) e programador de áudio (responsável
por programar como todos esses elementos funcionarão em conjunto e no jogo). A equipe de
áudio pode variar muito, dependendo do tamanho e orçamento da empresa. As menores têm
uma pessoa responsável por todos os efeitos sonoros, música, voz e implementação, enquanto
as maiores podem ter equipes de compositores, sound designers e atores para dublar as vozes.
Em alguns casos, o músico in-house também acumula diversas funções. As grandes franquias
têm trabalhado com orquestras, mas as pequenas ainda preferem os sintetizadores, por serem
mais baratos e por permitirem modificações mais rapidamente. “[...] a realidade do Brasil é
diferente. Quando há preocupação com o áudio, esse elemento importantíssimo de qualquer
audiovisual, o serviço ou é terceirizado ou compõe-se pequenas equipes: um faz-tudo de
áudio, um faz-tudo de programação que acaba implementando a parte sonora do jogo” (como
fala Lucas Meneguette em entrevista). Em jogos casuais ou para celulares, dificilmente haverá
uma equipe e ferramentas necessárias para a produção de um áudio mais elaborado.
A contratação dos músicos, no geral, acontece por indicação ou porque possuem um
portfólio ou estrutura de equipamentos boa. Nas grandes franquias de jogos, eles são
procurados por seu currículo. “Para os compositores iniciantes, é mais fácil mostrar seu
trabalho através de portfólios em produtoras de jogos para celular, por exemplo” (Lucas
Meneguette). Sete, dos 10 músicos entrevistados, já trabalhou ou trabalha com áudio para
43
Entrevista com Lucas Meneguette realizada por e-mail em 20 de agosto de 2009 (Anexo A).
28
games. Eles confessam que é uma área ainda pouco explorada no Brasil e que a atividade
acaba surgindo por acaso e, algumas vezes, como complemento financeiro.
Músicos de primeira classe também são convocados para trabalhar com músicas de
videogames. Como exemplo, temos a música orquestrada de Mikael Karlsson para Battlefield
(EA Games, 2002), que foi executada por um grupo de 70 pessoas (inclusive membros da
câmara Alarm Will Sound e do International Contemporary Ensemble) sob condução de Alan
Pierson. Grandes compositores do cinema, como Danny Elfman, Howard Shore e Hans
Zimmer também já fizeram composições para games. Para os jogadores entrevistados, que
também são donos de sites e blogs de games44
, as produtoras deveriam investir mais na
utilização de instrumentos reais e orquestras, para que a trilha não fosse sempre sintetizada.
Porém, o custo para a utilização desse tipo de música ainda é alto para algumas produtoras.
De qualquer forma, o que podemos perceber é que o investimento em áudio vem aumentando
nos últimos anos, com trilhas muito parecidas com as cinematográficas.
A fase de pré-produção de um jogo começa com um desenho detalhando o enredo, o
diálogo, os mapas, o áudio, os gráficos, a animação e a programação. A partir dele as equipes,
inclusive a de áudio, começam a trabalhar. Algumas o deixam mais pormenorizado, de acordo
com sua tarefa. Nessa fase, é necessário que a equipe de áudio saiba, primeiro, qual o tipo de
jogo, para poder criar a trilha adequada. A segunda questão a lidar é a da jogabilidade, como o
som interage com ela. Na terceira fase, é preciso determinar quais partes do jogo terão som
ambiente e quais terão música. As canções, então, são criadas de acordo com suas funções,
por exemplo, o tema principal, tema do herói, tema do anti-herói, tema de ação etc. Até os
movimentos que o jogador faz nos botões do controle devem servir de base para os efeitos
sonoros (COLLINS, 2008). Na fase final do processo de produção de áudio são integrados a
música, os efeitos sonoros e o diálogo.
Azevedo (2009)45
afirma que cada compositor tem seu processo e mostra como é feito
o seu:
• Spot ou Briefing - quando se conversa com o desenvolvedor do jogo e se busca
definir o direcionamento musical do jogo;
• Listagem - um inventário aproximado de quantos temas musicais serão necessários e
em quais situações;
• Composição - nessa etapa são compostos os temas sem tanta preocupação com a
qualidade dos timbres e a produção. A ideia é avaliar as músicas baseado em sua estrutura
44
Entrevista com jogadores donos de sites e blogs de games realizada por e-mail (Anexo C).
45
Entrevista com Werther Azevedo realizada por e-mail em 4 de setembro de 2009 (Anexo A).
29
formal e melódica. Nesta fase são feitos muitos ajustes até se chegar a uma concordância com
o cliente;
• Produção - com todos os temas aprovados, é a hora de lapidar cada timbre e mixar as
músicas para se chegar à máxima qualidade sonora possível;
• Masterização - normalização dos níveis entre os diferentes temas, compressão e
ajustes finais.
A interatividade é uma característica dos jogos que influencia o áudio. Para alguns
compositores isso é um problema porque interatividade significa imprevisibilidade. Enquanto
os compositores de trilhas sonoras para filmes têm alguma noção sobre o que vai acontecer
em cada cena, os compositores de games precisam prever cada movimento do jogador. Às
vezes, a situação pode não ocorrer exatamente como foi prevista ou pode mudar a qualquer
momento e esse é o desafio para o compositor.
Mas nem sempre as músicas são criadas especialmente para um jogo. Em alguns deles,
como os de corrida e esportes radicais, são usadas músicas licenciadas, ou seja, canções pré-
existentes e que possuem direitos autorais. Geralmente quando uma produtora deseja usar
uma música licenciada em seu jogo ela faz uma lista com as possíveis canções, sem se
importar com o orçamento. Depois, com o tempo, ela utilizará aquelas que se encaixarem no
valor que a empresa estipulou (D‟ARCY, 2004). O uso desse tipo de música varia de acordo
com o tipo de jogo. Games como os de corrida ou esportes radicais, por exemplo, não
precisam de uma música muito interativa porque não possuem uma narrativa complexa, como
os de plataforma ou RPG46
, que necessitam de uma trilha própria, que lhes dê uma identidade.
Os quatro jogadores entrevistados, donos de sites e blogs de games, preferem jogos com
trilhas originais. Para eles, o game ganha em identidade e originalidade.
No caso das músicas licenciadas, uma das tarefas mais difíceis para a equipe de áudio
é obter a licença de canções que possuem muitos editores, como as de hip hop, onde há três
ou quatro cantores, um co-escritor e as amostras de músicas pré-existentes, que também
possuem direitos autorais. Mas, para facilitar a procura, alguns sites disponibilizam uma lista
de músicas e álbuns com os respectivos detentores dos direitos, facilitando assim o contato
entre a produtora do jogo e o detentor.
46
O Role-playing game (RPG, traduzido como "jogo de interpretação de personagens") é um tipo de jogo em
que os jogadores assumem os papeis de personagens e criam narrativas colaborativamente. O progresso de
um jogo se dá de acordo com um sistema de regras predeterminado, dentro das quais os jogadores podem
improvisar livremente. As escolhas dos jogadores determinam a direção que o jogo irá tomar. Fonte:
<http://pt.wikipedia.org/wiki/RPG_%28jogo%29>. Acesso em: 30 set. 2009.
30
Feito o contato, o detentor dos direitos autorais irá questionar algumas coisas, por
exemplo: utilização inicial (se a música será utilizada no menu, durante o jogo, na seleção de
um personagem, etc. Dependendo da utilização, o detentor dos direitos autorais pode cobrar
mais ou menos); mídia solicitada (se a música será para PlayStation 1, 2 ou 3, Xbox, PC, etc);
comprimento da licença (geralmente a vida útil de um console é pouca, por isso o padrão é de
cinco anos); território (em quais países o jogo será lançado); direitos adicionais (se a música
será utilizada em outros locais e mídias, como em eventos, em CDs com revistas, sites, etc); e
direitos especiais (quando a produtora do jogo quiser usar a música em comerciais de
lançamento, etc) (D‟ARCY, 2004).
Alguns músicos vendem os direitos de utilização de suas músicas em jogos, como por
exemplo, Aerosmith, Blur e até mesmo Os Tribalistas e Zeca Pagodinho no jogo Fifa Soccer
2004 (EA Games). Outros são contratados para criar músicas exclusivas, como Peter Gabriel,
que compôs uma música para a nova versão de Myst (Cyan). No caso das músicas licenciadas,
o jogador pode criar sua própria trilha, escolhendo, entre as músicas disponíveis, aquelas que
quer ouvir. Geralmente, durante o jogo, o jogador aperta um botão, que passa para a próxima
faixa.
A popularidade de um jogo pode aumentar quando artistas do mundo “pop” são
convidados a participarem da trilha sonora. Para os jogadores entrevistados, quando um game
é lançado com a música de artista “x”, além dos jogadores habituais, ele pode conquistar o fã
desse determinado artista. Além disso, o respaldo que a mídia dá para jogos com alguma
celebridade é maior, o que, consequentemente, aumenta a popularidade do jogo.
2.3 Estilo game music?
As músicas dos consoles mais antigos possuem características muito parecidas, em
termos de composição musical. Essas características, no entanto, surgem devido às restrições
tecnológicas da época em que foram produzidas, cerca de 20 anos atrás, e não podem servir
de base para que a game music seja considerada um estilo ou gênero musical. Alguns tipos de
jogos, como os RPGs, possuem músicas muito parecidas entre si. Na maioria das vezes são
músicas calmas, orquestradas, com características medievais, por exemplo. Já os jogos de
ação possuem músicas mais aceleradas, geralmente se prefere o rock. Jogos de luta, por outro
lado, trazem em sua trilha músicas diferentes para personagens diferentes. Por este motivo é
31
que não podemos classificar TODAS as músicas de games como pertencentes a um “estilo”
game music.
Para os compositores entrevistados47
, game music não é um estilo musical, pelos
mesmos motivos apontados. Segundo eles, as músicas de diferentes jogos podem variar
muito, o que dificulta uma definição do tipo “estilo game music”. Para Larson (2009)48
, por
exemplo, se pegarmos uma grande amostra de músicas e analisá-la, perceberemos certos
padrões que tem a ver com o suporte, nesse caso o console e sua influência tecnológica.
Porém, isso não pode servir de parâmetro para que a game music seja considerada um estilo
musical, muito embora o mercado já tenha adotado o termo, como vemos em sites ou lojas de
música on-line. André Luiz Oliveira, da banda 8 Bit Instrumental49
concorda com a opinião
dos compositores e fala da seguinte forma sobre a música que toca: “Quando digo que minha
banda toca Video Game Music, estou me referindo ao repertório, mas o estilo é variado, vai de
country a trash metal”.
Para os jogadores entrevistados50
a opinião é a mesma, ou seja, para eles game music
não é um estilo musical.
2.4 Importância da game music
Segundo Murray (2003), nas décadas de 70 e 80 as pessoas viam os videogames como
algo diabólico, porque eles adicionaram interatividade ao encantamento sensorial da visão, do
som e do movimento. Muitos condenaram a estimulação fácil dos jogos, achavam que eram
viciantes e que poderiam representar o abandono dos livros. Porém, essa visão “apocalíptica”
acabou não se confirmando e atualmente os videogames estão ganhando cada vez mais
relevância no universo audiovisual. Cursos, palestras, eventos, seminários e pesquisas já
começam a analisar essa mídia como algo além de um “brinquedo para crianças”. Não
podemos ignorar ou deixar de considerar todo o aprimoramento visual, sonoro e conceitual
pelo qual os games vêm passando, conforme afirma Haeser (2005). Também não podemos
47
Ver Anexo A.
48
Entrevista com Duda Larson realizada por e-mail em 10 de setembro de 2009 (Anexo A).
49
Entrevista com André Luiz Oliveira, da banda 8 Bit Instrumental, realizada por e-mail em 29 de agosto de
2009 (Anexo B).
50
Entrevista com jogadores donos de sites e blogs de games realizada por e-mail (Anexo C).
32
desconsiderar o trabalho dos compositores e negar o efeito que as músicas têm nas nossas
consciências.
A trilha sonora é de extrema importância em um jogo e possui várias funções, de
acordo com Collins (2008). Em games como Super Mario Bros. (Nintendo, 1985), por
exemplo, é quase impossível jogar sem som, pois diversos sinais são dados ao longo do game
através do áudio. Já os jogos de consoles portáteis, como o GameBoy, o Nintendo DS ou o
PlayStation Portable não podem ter esse tipo de trilha, uma vez que se pressupõe que eles
podem ser jogados sem som, em locais públicos, por exemplo (COLLINS, 2008). Para os
jogadores entrevistados até é possível jogar um jogo sem som, mas a experiência seria
desestimulante.
Whalen (2004) traz dois termos da linguística para descrever duas funções-chave da
VGMusic: metáfora e metonímia. A função metafórica é a que proporciona uma sensação de
espaço, caracterização e atmosfera em um jogo. É a música de fundo ou que representa certo
ambiente (dia ensolarado, caverna escura, etc). Já a função metonímica é a que mantém a
estrutura sintática do jogo, obrigando o jogador a progredir na narrativa do jogo. Como
exemplo, temos as músicas que sinalizam para o jogador quando o inimigo se aproxima.
Analisando estas funções, podemos perceber que a trilha sonora dos videogames não serve
mais apenas como “plano de fundo” de um game. Cada canção, cada efeito sonoro, está em
seu lugar, cumprindo sua função de ambientar o jogo e tornar a experiência mais realista.
Para os compositores entrevistados, a trilha sonora de um jogo não influencia
diretamente em sua popularidade, mas é preciso que haja um equilíbrio com a jogabilidade
para que ele possa ser considerado bom, logo, para que se torne popular.
Acredito que a música desempenha um papel muito importante, mas para que seja
notada e apreciada, os outros elementos que fazem um jogo, como a jogabilidade,
programação e arte visual também devem funcionar. Dificilmente um jogo se tornará
popular com a jogabilidade ruim, e dificilmente essa jogabilidade será boa com uma
trilha chata, repetitiva ou mal implementada. É tudo uma questão de equilíbrio.
(AZEVEDO (2009)51
)
Entre os jogadores entrevistados, que também são donos de sites e blogs de games52
, a
opinião é a mesma, ou seja, se um jogo tem uma jogabilidade ruim, a trilha sonora não o
salvará. Ela tem um papel importante, mas não definitivo, na popularidade do jogo.
A música para videogames tem ganhado tanta importância que prêmios foram criados
a fim de homenagear os músicos pela qualidade de suas composições nos videogames. O
51
Entrevista com Werther Azevedo realizada por e-mail em 4 de setembro de 2009 (Anexo A).
52
Ver Anexo C.
33
compositor do jogo Diablo (Blizzard, 1996), Matt Uelmen, por exemplo, foi vencedor do
prêmio de excelência em áudio, concedido pela IGDA (International Game Developers
Association) pelo seu trabalho no game citado. Também existe o G.A.N.G. Awards, criado pela
G.A.N.G. (Game Audio Networking Guild), organização destinada a unir e ajudar os
compositores de VGMusic através de capacitação, recursos para a educação, negócios,
questões técnicas, publicidade e reconhecimento. Todo ano (em março) ela premia diversas
categorias relacionadas à música e efeitos sonoros do mundo dos games como música do ano,
sound design do ano, áudio do ano, melhor trilha interativa, melhor diálogo, melhor áudio
cinematográfico, melhor gravação de performance ao vivo e outras.
Ainda existem o Interactive Achievement Awards (categorias Outstanding
Achievement in Original Music Composition, Outstanding Achievement in Soundtrack, e
Outstanding Achievement in Sound Design); MTV Video Music Awards (categorias Best Video
Game Soundtrack e Best Video Game Score), que só durou de 2004 a 2006; British Academy
Video Games Awards (categorias variam com o ano. Neste ano teve Use of audio) e Game
Developers Choice Awards (categoria Best Audio).
2.5 Imersão, interatividade e sensações
Na época das radionovelas já podíamos perceber como o som, os ruídos e as vozes
podiam levar os ouvintes a ambientes imaginários. Utilizando apenas o recurso do áudio, os
produtores podiam fazer com que as pessoas imaginassem histórias, sentissem medo,
suspense, alegria. O exemplo do que aconteceu com “A guerra dos mundos”, de Orson
Welles, transmitido em 1938, ilustra bem como os sons podem causar todas essas sensações.
A radionovela era uma adaptação da obra “A guerra dos mundos”, de H. G. Wells, que relata
uma inesperada e violenta invasão da Terra pelos marcianos. A história foi relatada como se
fosse uma reportagem real e milhões de americanos ficaram aterrorizados e entraram em
pânico. No final, Welles explicou que tudo isso era apenas uma brincadeira de Halloween.
Este exemplo ilustra como o som, quando traz grande carga de realismo, pode levar as
pessoas a um estado de imersão onde acreditam e se identificam com algo muitas vezes irreal.
No quesito imersão, a música para videogames funciona quase da mesma forma que
nas radionovelas ou no cinema, quando se busca a identificação do espectador através da
34
emoção. O áudio funciona como forma de ambientar o espaço onde o avatar53
se encontra,
além de ter a função de despertar os mais diferentes sentimentos no jogador, como medo,
suspense, alegria, tristeza. Segundo Collins (2008), a imersão é o momento em que o jogador
se identifica com o personagem, esquecendo temporariamente a fronteira que o separa do
avatar. Ferreira (2008, p. 1) define da seguinte forma: “[...] entendemos por imersão a
capacidade de um sistema (ou dispositivo) de trazer seus espectadores ou usuários para dentro
da realidade (virtual) por ele construída (Cf. COUCHOT, 2003, p. 175); nas palavras de
Couchot, para esta outra dimensão do real”. Murray (2003, p. 102) também traz sua
contribuição: “A experiência de ser transportado para um lugar primorosamente simulado é
prazerosa em si mesma, independentemente do conteúdo da fantasia. Referimo-nos a essa
experiência como imersão”.
Lucas Meneguette (2009)54
fala desse espaço envolvente que a música cria:
Os portáteis - sejam celulares, sejam consoles de mão - são consumidos em todos os
cantos da vida urbana: ônibus, metrô, sala de aula... A própria origem deles está
relacionada com um aparato de ouvir música (os radinhos transistorizados da Sony,
desde a década de 1960, o Walkman em 1970, o Discman em 1980, etc.), que pode
ser carregado às ruas, formando um espaço próprio. O que é o jogo visual em meio a
um metrô? A concentração necessária, o chacoalhar do espaço, as pessoas ali
apertadas são fatores que dificultam a existência de um espaço fechado entre o
jogador e seu aparato. A imersão no jogo é composta nesse fechamento espacial.
Ora, mas o espaço visual é um espaço perspectivo, com ponto de fuga,
unidirecional, e se é possível formar um espaço envolvente que circunde o jogador, é
através de um adormecimento (ou esquecimento) do mundo, do entorno. Mas a
música, o espaço sonoro, - diria Marshall McLuhan ou Murray Schafer - já se
constitui em um espaço esférico, envolvente. Daí a popularidade do fone de ouvido
e a facilidade de se jogar, em diversos espaços públicos, usando-se fones de ouvido -
é a música e o som que constituem esse espaço que banha o jogador.
Para Collins (2008), a imersão está relacionada mais ao áudio do que à tecnologia ou
realismo do jogo. Segundo ela, três dos cinco games que estavam no topo do top 100 de 2006
eram jogos antigos, da era de 16 bits, pressupondo que não é a tecnologia ou o realismo que
gera maior imersão. Murray (2003) cita como exemplo o jogo em CD-ROM Myst (Cian,
1993), afirmando que seu poder de imersão está relacionado ao som, que muda de acordo com
cada área do jogo.
A trilha sonora faz parte da técnica do jogo: ela fornece pistas de que estou clicando
com o mouse na direção certa, como as dicas de frio e quente nas brincadeiras de
caça ao tesouro. Mas o seu tom não é o de uma brincadeira. Pelo contrário, a
53
Em informática, avatar é a representação gráfica de um utilizador em realidade virtual. Fonte:
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Avatar_%28realidade_virtual%29>. Acesso em: 12 out. 2009.
54
Entrevista com Lucas Meneguette realizada por e-mail em 20 de agosto de 2009 (Anexo A).
35
solenidade da música reforça minha sensação de estar em contato direto com um
terrível ato de perversidade. A música define minha experiência dentro daquela cena
dramática, transformando uma simples descoberta num momento de revelação.
(MURRAY, 2003, p. 63)
Para os compositores e jogadores entrevistados, o áudio não possui toda essa
responsabilidade em relação à imersão, apesar de seu papel ser muito importante. Para eles, o
visual ainda tem muita força.
Já a questão da interatividade, como afirma Assis (2006), é mais delicada e deve ser
bem definida. De acordo com ele, há a interatividade trivial, onde os objetos que nos cercam
reagem às nossas ações, e a segunda interatividade, que diz respeito aos programas que
reagem de forma inusitada. “A interatividade dos videogames é aquela que permite
exploração e surpresa e, ao mesmo tempo, é coerente e razoavelmente previsível” (ASSIS,
2006, p. 20).
Devido à interatividade, o compositor de game music não sabe qual o momento exato
em que a música deve transmitir alegria, tristeza, drama, etc. “Nesse caso, é preciso que o
programa dê parâmetros que permitam modular andamento, volume, instrumentação ou
mesmo trocar ou suprimir a seqüência musical programada para aquele ponto” (ASSIS, 2006,
p.47). Entre os compositores entrevistados não há um consenso. Alguns acreditam que há essa
dificuldade, outros pensam que não. No entanto, todos concordam que este é um desafio para
o compositor e não um complicador, algo que não possa ser resolvido.
Em alguns games podemos identificar o áudio dinâmico, composição sonora que varia
dinamicamente, não é totalmente pré-determinada, segundo Lucas Meneguette. O resultado
pode ser diferente de acordo com combinações ativadas algoritmicamente. O áudio dinâmico
pode ser subdividido em interativo e adaptativo, conforme ele mesmo define:
O barulho de passos, o estampido do tiro, ou a música que se modifica diretamente
pela ação do jogador são elementos de áudio interativo. A trilha sonora que antecipa
um evento iminente – como quando inimigos estão se aproximando –, ou que se
modifica conforme os rearranjos do ambiente do jogo – por exemplo, que
acompanha o anoitecer e o amanhecer –, está mais ligada ao áudio adaptativo.
(MENEGUETTE, 2008b, p. 2)
Durante a década de 90, alguns compositores e programadores de áudio tentaram criar
sistemas de som interativo, onde o jogador atuaria diretamente sobre a música. Uma das
primeiras tentativas de colocar esse tipo de áudio em games foi através da tecnologia iMUSE,
(Interactive MUsic Streaming Engine, patenteado em 1994), desenvolvida pela LucasArts em
1991 e usada nos primeiros jogos de aventura e simuladores de vôo. A qualidade nas
36
composições trazida pelo MIDI foi ótima, porém ele trabalhava com uma sequência muito
linear, ou seja, respondia mal aos eventos do jogo. O objetivo da criação do iMUSE foi
justamente acabar com esses problemas. A tecnologia permitiu que a música mudasse de
acordo com as decisões do jogador e os eventos do jogo. A Microsoft também testou algo
parecido, com o sistema DirectMusic, um programa que serve somente para tocar músicas de
fundo, no formato MIDI (MENEGUETTE, 2008).
Alguns jogos para PlayStation permitem que o jogador troque o CD do jogo pelo CD
de música. Porém, toda vez que os dados são carregados, é preciso colocar novamente o CD
do jogo. O Xbox, por sua vez, permite que músicas de um CD sejam copiadas para uma
memória interna. Assim, o jogador pode fazer sua própria trilha. Essa possibilidade é chamada
de Custom Soundtrack e também está presente no Xbox 360, no PlayStation Portable e no
Nintendo Wii.
Outra questão importante é a das sensações causadas pela música nos games. Collins
(2008), em seu estudo, traz uma entrevista com o compositor B. Scott Morton. Nela, o músico
defende que o jogador precisa saber quando está em uma fase importante do jogo e isso deve
ser mostrado através da música. Ele precisa sentir isso sem fazer esforço algum. O compositor
afirma ainda que medo, antecipação e ansiedade são facilmente evocados pela cuidadosa
colocação de sons ambientes em um jogo.
Essas sensações causadas pela game music são as principais responsáveis pelo
surgimento de bandas que fazem adaptações e comunidades virtuais de fãs de VGMusic. As 7
bandas entrevistadas, que tocam game music55
, afirmaram que escolheram estas músicas para
tocar devido ao sentimento de nostalgia que elas causam. Durante um jogo, o jogador passa
horas em frente à tela e em contato com a música, portanto, é natural que ele guarde na
memória as canções que tocaram por um longo tempo ou que caracterizaram um momento
emocionante do game. Para se ter uma ideia, os quatro jogadores entrevistados afirmaram que
poderiam lembrar a música de algum jogo mesmo que ela estivesse fora dele. Isso gera uma
identificação e admiração por parte do jogador, e é natural que ele queira levar esses
sentimentos para outras mídias. No próximo capítulo veremos como surgiu o conceito de
remix e em seguida como ele foi sendo incorporado pelos fãs de game music, dando início ao
processo de autonomização desse tipo de música.
55
Entrevista com bandas e músicos que tocam game music ou chiptune, realizada por e-mail em 15 de setembro
de 2009 (Anexo B).
37
3 PROCESSOS DE AUTONOMIZAÇÃO
Nos últimos anos, os videogames se tornaram um objeto de estudo com aproximação à
área de comunicação. Atualmente, essa mídia traz características da publicidade (anúncios
dentro dos jogos), relações públicas (jogos de treinamento e capacitação usados na relação
com os públicos) e jornalismo (sites e blogs especializados no “jornalismo de games”) e sua
importância não pode ser ignorada, uma vez que os videogames estão inseridos em quase
todas as mídias que utilizamos no século XXI.
Já a música deixou de ser um simples complemento da imagem quando se percebeu
que ela poderia agir no inconsciente do jogador e quando a preocupação com ela aumentou,
por parte das produtoras, nos anos 80. O sucesso dessas canções resultou na venda delas à
parte do jogo, como acontece há anos no Japão. As pessoas começaram a perceber que as
músicas dos jogos podiam ser interessantes fora deles, como qualquer outra composição.
Segundo Santaella (2004, p. 2), “Do mesmo modo que os games absorvem as linguagens de
outras mídias, estas também passaram a incorporar recursos semióticos e estéticos que são
próprios dos games”. Com o passar do tempo, a game music foi se tornando um produto
cultural autônomo, saindo da esfera dos videogames e atingindo outras mídias, principalmente
a internet. Bandas e fãs passaram a fazer versões para essas músicas, postando-as na rede de
forma independente. Além disso, podemos ouvir parte das músicas originais dos jogos (ou os
sons gerados pelos chips dos consoles) em trabalhos totalmente novos e originais, muitas
vezes chamados de chiptune, nintendocore, bitpop, etc.
Essas versões das músicas de videogame podem ser chamadas de remix, uma prática
que já é bastante conhecida. De acordo com Lemos (2005), a noção de propriedade intelectual
e de autor surgiu com o capitalismo e a imprensa no século XVIII. Com ela, os autores
passaram a receber royalties56
para cederem seu direito de propriedade aos editores. Porém,
em meados do século XX, esse sistema começou a decair, quando muitos artistas passaram a
utilizar em suas obras materiais de outros artistas, fazendo recombinações. Dessa forma, os
conceitos de obra, autor, autoria e propriedade entraram em crise, junto com a arte (LEMOS,
2005). Da mesma forma, Manovich (2002) também afirma que as novas mídias trouxeram
56
Refere-se a uma importância cobrada pelo proprietário de uma patente de produto, processo de produção,
marca, entre outros, ou pelo autor de uma obra, para permitir seu uso ou comercialização. Fonte:
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Royalties>. Acesso em: 12 out. 2009.
38
novos modelos de autoria. Com a cibercultura surge o remix, definida por Lemos (2005) e Sá
(2006) da seguinte maneira:
Por remix compreendemos as possibilidades de apropriação, desvios e criação livre
(que começam com a música, com os DJ‟s no hip hop e os Sound Systems) a partir
de outros formatos, modalidades ou tecnologias, potencializados pelas
características das ferramentas digitais e pela dinâmica da sociedade contemporânea.
(LEMOS, 2005, p. 2)
A prática do remix - ou da versão – populariza-se durante a disco music. Num
primeiro momento, tratava-se de adequar uma música, às vezes um sucesso pop, por
exemplo, à pista de dança. Desta forma, o DJ utilizava-se de seus conhecimentos
técnicos para produzir uma versão que funcionasse na pista – seja estendendo o seu
tamanho, seja ajustando a gravação aos sistemas sonoros das discotecas.
Paulatinamente, o remix foi ganhando status de atividade criativa e a música original
tornou-se pretexto para intervenções cada vez mais livres de DJs/produtores,
alterando elementos tais como ritmo, textura, instrumentação e andamento ao ponto
de tornar a música irreconhecível. (SÁ, 2006, p. 11)
Lemos (2005) também nos mostra as três leis que estão na base do que chama de
ciber-cultura-remix: liberação do pólo da emissão, princípio de conexão em rede e
reconfiguração de formatos midiáticos e práticas sociais. No universo da game music
encontramos o princípio da liberação do pólo da emissão quando vemos as pessoas
produzindo informação, que antes era reprimida e editada pelos mass media. Assim, surgem
sites e blogs dedicados aos games. Já a conexão em rede permitiu que muitos trabalhos de
adaptação e remixes pudessem chegar a todos os cantos do planeta através da internet. Por
último, a lei da reconfiguração pode ser associada às bandas que utilizam os sons originais
dos jogos para criar novas músicas, como no caso do chiptune e outros, que veremos adiante.
Para entender como funcionam esses processos de autonomização, trago o pensamento
de De Certeau (1980 apud MANOVICH, 2008) a partir do qual ele desenvolve, de forma
muito interessante, as relações de tensão entre os modos como, na sociedade, instauram-se
estruturas estratégicas e, por outro lado, como os cidadãos apropriam-se dessas estruturas
através de usos táticos. Segundo ele, as estratégias são criadas pelas instituições e estruturas
de poder e definidas para toda a sociedade. Já as táticas, são as formas como os indivíduos
negociam essas estratégias, ou seja, eles as adaptam de acordo com suas necessidades. De
Certeau (1980 apud MANOVICH, 2008) ainda lembra que na sociedade moderna os objetos
são produzidos em massa e as pessoas os utilizam de acordo com suas necessidades,
construindo seus mundos e identidades baseados nesses objetos e utilizando diferentes táticas.
Entre elas, como cita Manovich (2008), está o remix. Trazendo para o movimento de
autonomização da VGMusic, poderíamos dizer que a indústria de games é quem traça as
39
estratégias, entendidas como os usos sugeridos por ela para os seus produtos, ou seja, sugere-
se que os jogos sejam simplesmente jogados pelas pessoas e que as músicas sejam apenas
ouvidas enquanto se joga o game. Porém, para estas estratégias existem também as táticas,
que são os modos de apropriação que as pessoas fazem disso. Na maioria das vezes são
orientadas e coincidem com essas estratégias da indústria de games (neste caso, a maioria das
pessoas que consome jogos acaba apenas jogando e ouvindo a música enquanto joga, nada
mais). Mas, em outros casos, as táticas são totalmente distintas e tomam formas inesperadas,
como é o caso das pessoas que se apropriam dos jogos de forma a se aterem a um elemento (a
música) e tornam isso um novo produto (ou um produto autônomo) distinto daquele que lhe
deu origem.
Na sociedade atual, a tendência é de que as novas e antigas mídias passem a interagir
cada vez mais, com o mesmo conteúdo circulando por diversas delas, como vem acontecendo
com a game music. Isso se chama convergência e é entendida por Jenkins (2008, p. 27) como
“[...] fluxo de conteúdos através de múltiplos suportes midiáticos, à cooperação entre
múltiplos mercados midiáticos e ao comportamento migratório dos públicos dos meios de
comunicação”. Em seu estudo, o humanista fala desse movimento assim como da cultura
participativa e da inteligência coletiva, como veremos mais adiante. Os estudos de
convergência dificilmente citam os videogames como um suporte midiático ou analisam suas
possibilidades, mas podemos perceber claramente que a VGMusic, antes restrita apenas ao seu
suporte original (o videogame) está transitando em outros meios. Ela está presente na
indústria fonográfica (através dos álbuns com músicas separadas dos jogos), na internet
(através de sites e blogs), nos celulares (através dos ringtones), nos concertos de música
clássica, nos shows de rock, nas rádios on-line e até mesmo na televisão. Para se ter uma
ideia, em outubro deste ano, quando a Video Games Live se apresentou no Brasil, os
programas da Rede Globo, Jornal Hoje e Mais Você, divulgaram os shows no país. Prova de
que a música de videogames está alcançando espaços onde os próprios games ainda têm
dificuldade em entrar.
Ao longo dos anos, a música de videogames foi evoluindo. Podemos relacionar isso
com o conceito de “exaptação”, citado por Johnson (1997), que, na biologia, são as aplicações
novas dadas a algo que evoluiu por necessidade. Ou seja, um órgão que evoluiu para um fim
pode ser convertido para outro fim. O autor afirma que o mundo virtual está repleto de
“exaptações” e para isso cita como exemplo a web, que foi originalmente projetada como um
sistema local de arquivos para a pesquisa acadêmica e que se tornou um poderoso meio de
comunicação de massa. Relacionando com a game music, poderíamos dizer que a música, que
40
surgiu como uma necessidade nos games, ganhou novas aplicações, seja para servir como
toque no celular ou como parte do repertório de uma orquestra.
De Certeau (1997) analisa também, em outro estudo, como as coisas antigas ganharam
importância em meio à cidade modernista que se tornou Paris. O antigo é visto com outros
olhos, olhos curiosos. Dessa forma, imóveis novos ganharam aspecto envelhecido e
rapidamente foram transformados em construções antiquadas. Segundo ele, renova-se mais do
que se inova. Seguindo para os videogames, podemos perceber praticamente o mesmo
raciocínio. Claro que atualmente existem mais criações originais do que novos arranjos em
game music, mas, se analisarmos as novas versões de jogos como Super Mario Bros.
(Nintendo, 1985), The Legend of Zelda (Nintendo, 1987) e Metroid (Nintendo, 1986), que
tiveram músicas marcantes, veremos que várias das músicas antigas foram mantidas, porém,
de forma renovada, como em Super Mario Galaxy (Nintendo, 2007), que traz novas versões
para músicas dos primeiros jogos da série. Além disso, os temas antigos de videogames são os
preferidos de bandas e orquestras que fazem versões. Nesse caso, a nostalgia fala mais alto.
Quando fala em restauração, De Certeau (1997) afirma que, quando renovados, os
objetos passam dos seus usuários habituais para uma nova clientela, que os utilizará para
outros fins. Da mesma forma, a música de videogames, originalmente no jogo, é consumida
pelos jogadores. Porém, quando é adaptada, remixada, ela se destina a outro público, que
geralmente não foge muito do original, ainda são jogadores, mas jogadores que apreciam
game music. Aí sim os usos também são os mais diversos, seja uma música adaptada para
estilos como rock ou jazz, seja o toque no celular.
É aí que entramos nos processos de autonomização da música de videogames. Bandas
que fazem versões, orquestras que tocam game music, web-radios, sites, blogs e toques de
celulares são algumas dessas adaptações que surgiram a partir de um elemento específico dos
videogames: a música. Estes e outros processos de autonomização da VGMusic podem ser
conferidos abaixo mais detalhadamente:
3.1 Venda de álbuns com músicas separadas dos jogos
Em 1978 surgiu aquele que é considerado o primeiro álbum a ter música de
videogame, o disco da Yellow Magic Orchestra (YMO), que continha a faixa Computer
Game, com efeitos sonoros de Space Invaders (Taito, 1978).
41
Figura 7: Álbum da Yellow Magic Orchestra, primeiro a ter uma música de videogame - Fonte:
<http://vgmdb.net/album/7778>. Acesso em: 20 maio 2009.
Em 1984, a gravadora Yen lançou o primeiro álbum completo de game music. Ele
trazia as faixas originais de vários jogos da Namco, como Pole Position (1982), Xevious
(1982), Pac Man (1981), New Rally X (1981), entre outros. A estreia oficial do álbum
aconteceu no mesmo ano, quando Haruomi Hosono, da Yellow Magic Orchestra, produziu
uma coletânea de músicas dos games da Namco. Ele afirmou que era fã de Xevious. Dessa
forma, foram lançados, em 25 de abril de 1984, uma fita cassete e um LP intitulados “Video
Game Music”, com as músicas originais de Pac Man, Xevious, Mappy (1983), Bosconian
(1981), Galaga (1981) e outros.
Figura 8: Álbum Video Game Music, primeiro álbum de game music - Fonte: <http://vgmdb.net/album/3435>.
Acesso em: 20 maio 2009.
42
Como sucessora da Yen, surgiu a Game Music Organization (GMO), em 1986.
Tratava-se de um selo dedicado a lançar exclusivamente álbuns de game music. A explosão
desse tipo de música se deu neste ano, com o lançamento de dezenas de álbuns contendo
músicas originais, arranjadas e vocais de jogos da Namco, Konami, Nintendo, Hudson,
Capcom, Tecmo, Enix, Imagineer, Falcom e Sega.
A game music começava a ganhar ainda mais valor em 1998. Somente neste ano
foram lançados mais de 700 álbuns de VGMusic no Japão.
A partir deste levantamento histórico, verificamos que a venda de discos com músicas
separadas dos jogos pode ser considerada uma iniciativa pioneira entre os processos de
autonomização da game music. A prática teve início no Japão. Alguns álbuns possuíam novas
versões, remixes e performances ao vivo. Entre os primeiros a se envolverem com o
lançamento destes discos está Koichi Sugiyama, o compositor de várias trilhas famosas, entre
elas a de Dragon Quest (Enix, 1986). Outro pioneiro foi Yuzo Koshiro, compositor das
músicas do jogo Ys (Sega, 1988), que recebeu o título de um dos jogos que mais teve discos
lançados.
Assim como acontecia com as músicas de animes57
, esses álbuns com as músicas
separadas dos games eram vendidos exclusivamente no Japão e fãs de outros países tinham
que importar os produtos com empresas especializadas. Foi somente no final da década de 90
que alguns títulos começaram a ser lançados em outros países, como Estados Unidos e
Inglaterra.
No Brasil, os álbuns podem ser encontrados à venda na internet. O site bitpopshop58
é
uma dessas lojas virtuais. A grande maioria dos produtos é importada de países como Estados
Unidos, Japão e China. Em sites internacionais, como Sumthing Digital59
, Amazon60
e a loja
do iTunes61
, também é possível adquirir estes CDs ou músicas digitais. Além deles, há o
AnimeNation62
(muitas músicas de videogame e anime disponíveis para encomenda); CD
57
Nome usado para se referir a qualquer produto de animação (ou "desenhos animados") produzido no Japão.
Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Anime>. Acesso em: 29 out. 2009.
58
<http://www.bitpopshop.com.br/vitrine.aspx>
59
<https://www.sumthingdigital.com/index.aspx>
60
<http://www.amazon.com/>
61
<http://www.apple.com/br/itunes/>
62
<http://www.animenation.com/>
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VGMusic como produto cultural autônomo: a música para além dos videogames

  • 1. Universidade do Vale do Rio dos Sinos - Unisinos Ciências da Comunicação Comunicação Social – Habilitação: Jornalismo Camila Schäfer VGMUSIC COMO PRODUTO CULTURAL AUTÔNOMO: A MÚSICA PARA ALÉM DOS VIDEOGAMES São Leopoldo 2009
  • 2. Camila Schäfer VGMUSIC COMO PRODUTO CULTURAL AUTÔNOMO: A MÚSICA PARA ALÉM DOS VIDEOGAMES Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Comunicação Social – Habilitação Jornalismo, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos. Orientador: Prof. Tiago Lopes São Leopoldo 2009
  • 3. AGRADECIMENTOS Neste caminho que percorri, diversas pessoas foram importantes. Entre elas posso citar: • Minha família e amigos, em especial minha mãe, Analice, que me deu todo apoio e ajuda em minha vida acadêmica e meu colega Micael pelo auxílio; • Meu namorado, Tuchaua, que, além de seu apoio e ajuda, foi quem sugeriu o assunto para meu blog (Console Sonoro), que resultou no tema desta monografia; • O professor Tiago Lopes, orientador deste trabalho, que também propôs que eu investisse neste assunto e deu todo o auxílio que necessitei. Agradeço pela sua paciência em resolver todas as minhas dúvidas; • Aos entrevistados, que dispuseram de seu tempo para me auxiliar neste mapeamento e a todos aqueles que, de uma forma ou outra, me auxiliaram neste desafio.
  • 4. RESUMO Nos jogos eletrônicos, a música, além de servir como fundo, também é utilizada como forma de potencializar a experiência de imersão do jogador. Considerando seu papel no game como de extrema importância, este trabalho procura analisar como a música de videogames ganhou notoriedade, desencadeando um movimento de autonomização através de processos como a venda de álbuns com estes temas, o surgimento de bandas e orquestras que os adaptam e a criação de rádios, comunidades e sites na internet dedicados a esse tipo de música. A fim de compreender o papel das canções nos jogos, foi preciso analisar sua história, assim como a forma de produção, sua relação com os processos de interatividade e as sensações que essas músicas podem causar nos jogadores. Em seguida, foi analisado o movimento de autonomização da VGMusic, principal foco do trabalho, para identificar em quais mídias esse tipo de música se insere atualmente e como ela está se tornando uma manifestação cada vez mais visível também fora dos videogames. A partir destes estudos, da análise dos processos de autonomização e das entrevistas com jogadores, bandas e compositores, concluiu-se que a VGMusic, além de sua importância para os jogos, constitui-se num novo fenômeno midiático que a cada dia cresce mais e contagia mais pessoas ao redor do mundo. Palavras-chave: VGMusic, Game Music, Música, Jogos eletrônicos.
  • 5. LISTA DE FIGURAS FIGURA 1 – Tennis for Two ......................................................................................... 13 FIGURA 2 - Magnavox Odyssey .................................................................................. 14 FIGURA 3 - Pong .......................................................................................................... 15 FIGURA 4 - Pac Man ................................................................................................... 16 FIGURA 5 - Commodore 64 ......................................................................................... 18 FIGURA 6 – Famicom .................................................................................................. 19 FIGURA 7 - Álbum da Yellow Magic Orchestra .......................................................... 41 FIGURA 8 - Álbum Video Game Music ....................................................................... 41 FIGURA 9 - Video Games Live .................................................................................. 50 FIGURA 10 - OC ReMix .............................................................................................. 54
  • 6. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 7 1.1 GETTING STARTED ............................................................................................... 7 1.2 DESAFIO ................................................................................................................ 8 1.3 METODOLOGIA ................................................................................................... 10 2 VGMUSIC .................................................................................................................. 13 2.1 HISTÓRIA ............................................................................................................... 13 2.1.1 O início ................................................................................................................. 13 2.1.2 O áudio começa a chamar a atenção ................................................................. 14 2.1.3 A busca pelo som perfeito .................................................................................. 15 2.1.4 Início da década de 80 e maior preocupação com a música ........................... 16 2.1.5 As músicas marcantes dos consoles de terceira geração ................................. 18 2.1.6 Quarta geração e o salto em qualidade das músicas ........................................ 21 2.1.7 Quinta geração e sistemas de som mais potentes ............................................. 23 2.1.8 Sexta e sétima geração: poucos avanços na forma de fazer músicas para videogames .......................................................................................................... 24 2.2 PRODUÇÃO ........................................................................................................... 27 2.3 ESTILO GAME MUSIC? ......................................................................................... 30 2.4 IMPORTÂNCIA DA GAME MUSIC ..................................................................... 31 2.5 IMERSÃO, INTERATIVIDADE E SENSAÇÕES ................................................ 33 3 PROCESSOS DE AUTONOMIZAÇÃO ............................................................... 37 3.1 VENDA DE ÁLBUNS COM MÚSICAS SEPARADAS DOS JOGOS ................ 40 3.2 VERSÕES ............................................................................................................... 43 3.2.1 Bandas .................................................................................................................. 43 3.2.2 Orquestras ............................................................................................................. 49 3.3 INTERNET .............................................................................................................. 51 3.3.1 Comunidades ........................................................................................................ 52 3.3.2 Web-radios ............................................................................................................ 52 3.3.3 Sites ...................................................................................................................... 53 3.4 NOVOS ESTILOS .................................................................................................. 56 3.5 NOVOS FORMATOS DE ARQUIVOS DE ÁUDIO ............................................ 58 3.6 CELULARES .......................................................................................................... 58
  • 7. 4 CONCLUSÃO ............................................................................................................ 60 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................... 63 ANEXO A – Entrevista com compositores brasileiros de música para videogames - 2009 ......................................................................................................... 67 ANEXO B - Entrevista com bandas e músicos que tocam game music ou chiptune - 2009 ......................................................................................................... 81 ANEXO C - Entrevista com jogadores, donos de sites e blogs de games - 2009 ......... 94
  • 8. 7 1 INTRODUÇÃO 1.1 Getting Started Antes de começar a falar em game music e como ela está atingindo outras mídias, considero importante delinear os principais termos utilizados neste trabalho. Cheguei a esta conclusão depois de me deparar com uma série de livros e artigos que abordam o tema do áudio para jogos eletrônicos, mas que não delimitam expressões como soundtrack, game music, sound symbols e outros. É preciso esclarecer que nenhum dos termos referidos possui uma definição clara, tanto no meio acadêmico quanto na indústria. Portanto, procurei me basear nos principais usos e em estudos da área. Soundtrack ou trilha sonora: Este termo não aparece bem definido na indústria de games e no meio acadêmico. Apesar de autores da área como Collins (2008), Marks (2001), Mieszkowski (2002), Assis (2006), Belinkie (1999), Pidkameny (2002), e Mun (2008) utilizarem “trilha sonora” significando apenas o conjunto das músicas de um jogo eletrônico, o termo não é especificamente definido em nenhum dos estudos. No entanto, se nos basearmos em pesquisas da área de cinema, veremos que “trilha sonora” é definida como todos os sons de uma peça audiovisual, que vão desde a música até os diálogos. “Devemos entender o conceito de trilha sonora sendo a junção da trilha musical, a pista de ruídos e os diálogos” (VASCONCELOS, 2007, p. 5). Silva (2005) também possui a mesma visão: Assim, a estrutura e o sentido do filme, desde o advento do cinema “falado”, são construídos através das duas bandas da película: a sonora e a visual. Na banda sonora – que chamamos aqui de trilha sonora - podemos identificar os seguintes elementos: música, efeito sonoro (sons reconhecíveis e irreconhecíveis ou ruídos) e voz (falas e narrações). A trilha sonora, portanto, diz respeito aos códigos de composição sonora, ou em outras palavras, ao agenciamento sintagmático dos elementos auditivos entre si. (SILVA, 2005, p. 1) Por isso, tendo em vista a definição que estes autores trazem, mais clara em comparação aos autores da área de games, considero importante definir “trilha sonora” como sendo o conjunto de sons de um jogo: música, efeitos sonoros, diálogos, ruídos, etc. Game Music, Video Game Music, VGMusic, VGM ou música de videogame: Como o nome sugere, e de acordo com as definições de Collins (2008) e Marks (2001), refere-se aos temas musicais para jogos eletrônicos. Para este trabalho, será considerada game music toda a
  • 9. 8 música que tenha relação com um jogo, tanto a canção original quanto as versões e remixes. Como veremos mais adiante, não pode ser considerada um estilo musical porque, em diferentes jogos existem diferentes estilos musicais, como rock, country, jazz, blues, etc. Além disso, as músicas não possuem características de composição que possam enquadrá-las em um mesmo estilo musical, mesmo que elas sejam produzidas de forma igual, ou seja, em computador e baseadas em sintetizadores1 . Sound symbol ou símbolo sonoro: são eventos sinalizados com recursos de áudio, ou seja, pequenos temas musicais – ou sons específicos – que alertam sobre algum acontecimento importante como "você ganhou", "nova missão" ou "game over". Além destes termos específicos do áudio em jogos, também acho importante delimitar o termo jogo, videogame ou game, aqui considerado como jogos eletrônicos, que englobam todos os jogos em vídeo, seja em consoles domésticos2 , arcades3 , computadores ou dispositivos móveis, como celulares e consoles portáteis. 1.2 Desafio Qualquer estudo na área de videogames é um desafio. Mesmo fazendo parte de nossas vidas há décadas, essa mídia de entretenimento sempre foi vista como brinquedo de criança e apenas hoje ela ganha contornos mais sérios. A música, por outro lado, que é uma forma de arte, sempre refletiu modismos e características da sociedade de cada época. Do popular ao rock e pop, movimentos sociais e políticos do início dos anos 90 foram influenciados e inspirados pela música. Agora, com a evolução tecnológica dos séculos 20 e 21, o impacto dela tem se expandido em várias áreas e uma delas é a de videogames. 1 Espécie de instrumento musical eletrônico com o objetivo de produzir sons artificialmente. Ele sintetiza ondas sonoras através da manipulação direta de correntes elétricas, leitura de dados contidos numa memória, ou manipulação matemática de valores discretos com o uso de tecnologia digital incluindo computadores ou por uma combinação de vários métodos. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Sintetizador>. Acesso em: 20 maio 2009. 2 Aparelho eletrônico capaz de executar os jogos eletrônicos que podem estar contidos em cartuchos ou discos de leitura óptica, como CDs e DVDs. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Console_de_videogame>. Acesso em: 20 maio 2009. 3 Videogame profissional usado em estabelecimentos de entretenimento, por vezes também chamado erroneamente no Brasil de fliperama. É composto por um gabinete, tubo de imagem (CRT), monitor, fonte de alimentação e sistema de jogo. Os fliperamas, por sua vez, são estabelecimentos destinados ao uso de máquinas do tipo "pinball". Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Fliperama> e <http://pt.wikipedia.org/wiki/Arcade>. Acesso em: 20 maio 2009.
  • 10. 9 No início da década de 70, quando surgiram os primeiros jogos eletrônicos, as composições musicais apareciam no começo ou entre as fases do game. Como eram feitas em computadores, quem as elaborava era um programador, mesmo que não tivesse experiência musical alguma. Já na década de 80, essa função foi dada a pessoas com conhecimento musical, o que resultou em temas com maior qualidade. Essa época foi tão propícia à música de videogame que muitas delas são lembradas até hoje. Como exemplo, podemos citar a música tema do jogo Super Mario Bros. (Nintendo, 1985), que, segundo pesquisa realizada com 47 estudantes universitários, ainda é lembrada por 66% deles, mesmo que eles não joguem há anos (PIDKAMENY, 2002). Da mesma forma, entre os jogadores que entrevistei4 , que também são donos de sites e blogs de games, todos afirmaram que poderiam reconhecer a música de algum jogo mesmo que ela estivesse fora dele. O sucesso das músicas nos games inspirou muitas produtoras e resultou na venda das canções à parte do jogo. No Japão, por exemplo, onde essa cultura é mais comum, CDs de game music são vendidos há anos e em algumas lojas até existem prateleiras dedicadas a esse tipo de música. Compositores e músicos, que antes trabalhavam em filmes ou faziam música popular, estão cada vez mais envolvidos na produção de jogos musicais e canções para games, na medida em que elas ganham maior notoriedade. Essa fama que alguns temas de jogos ganharam desencadeou um processo de autonomização da VGMusic tanto em outros países como no Brasil. Entre as características desse processo estão a venda de álbuns com estes temas; o surgimento de bandas e orquestras que remixam ou adaptam as músicas dos jogos; o surgimento de rádios, comunidades e sites na internet dedicadas a esse tipo de música; o uso dessas canções em outras mídias, como celulares; e o surgimento de novos estilos musicais que adotam praticamente a mesma estética ou utilizam parte das músicas de videogame. Portanto, pensando nesse movimento e no processo de autonomização pelo qual a game music está passando, é que este trabalho tem como objetivo principal realizar um estudo sobre esse fenômeno, através de uma abordagem que busca evidenciar suas atualizações em diferentes mídias. O objetivo é analisar, principalmente, o cenário que vem se consolidando no Brasil e responder a questão: como a música de videogames está se tornando um produto cultural autônomo, para além dos videogames? Mas o problema não se esgota aí. Entre os demais objetivos deste trabalho estão: entender como a música de videogame tem se tornado um produto cultural autônomo, saindo 4 Entrevista com jogadores donos de sites e blogs de games realizada por e-mail (Anexo C).
  • 11. 10 da esfera do próprio videogame; estudar a evolução da game music e suas extensões, como na área artística e virtual; analisar as possibilidades de uso desse tipo de produto cultural; e refletir sobre como a sociedade está lidando com esse fenômeno. Depois das características e objetivos apontados e tendo em vista o fato de não possuírem pesquisas específicas na área de comunicação que dêem conta desse fenômeno recente, estudar como a VGMusic vem se consolidando como produto cultural autônomo é importante uma vez que pesquisará como esse tipo de música está se inserindo em meios como o artístico (músicos e orquestras) e o midiático (através de sites e blogs). Ainda cito uma razão pessoal que me motivou a optar pelo tema: tenho um blog chamado Console Sonoro5 , que traz notícias sobre o mundo da música de videogames. Através dele pude perceber como essa admiração pela game music está crescendo e se manifestando na rede, seja através de bandas que fazem suas versões para as músicas, sites e outros blogs que disponibilizam arquivos musicais ou web-radios. O blog possui uma média de 150 visitas por semana. A maioria é de leitores que possuem blogs sobre games6 , mas o assunto também chama a atenção daquelas pessoas que não são do meio. Muitas não sabem da existência de bandas que fazem versões e ficam admiradas ao saber que a música do jogo de sua infância agora é tocada por uma banda como qualquer outra ou até mesmo por uma orquestra. 1.3 Metodologia Os videogames existem há pouco mais de 30 anos e essa ainda é uma área muito nova para as pesquisas. No que tange à música de videogame então, fica ainda mais difícil de encontrar estudos. Por isso, a pesquisa bibliográfica foi feita tendo como base livros e artigos encontrados, na sua maioria, na web, que tratam de assuntos como cibercultura, VGMusic, videogames, internet e música. Mas somente a pesquisa bibliográfica não foi suficiente para dar profundidade e consistência ao trabalho. Por isso, o que complementou a pesquisa foram as entrevistas em profundidade. Escolhi esta técnica de coleta de dados por ser a que melhor se encaixa nos 5 <http://consolesonoro.blogspot.com>. 6 De acordo com o site MegaContador, o blog possui uma média de 30 visitas/dia. Oitenta por cento desses visitantes são novos, mas os outros 20% são pessoas que visitam com maior frequência. A análise foi feita entre os meses de agosto e outubro.
  • 12. 11 propósitos e objetivos deste trabalho. Como defende Duarte (2008), a entrevista em profundidade tem como principal qualidade a flexibilidade que dá ao informante na hora de responder e ao entrevistado na formulação das perguntas. “Este tipo de entrevista procura intensidade nas respostas, não-quantificação ou representação estatística” (DUARTE, 2008, p. 62). A entrevista em profundidade, de acordo com o autor, busca respostas a partir da experiência subjetiva da fonte. E é exatamente isso que busquei nas entrevistas realizadas com compositores, músicos e jogadores. Saber como é a relação deles com a game music e, a partir daí, compreender como a VGMusic vem atingindo outras mídias. Através das entrevistas em profundidade não busco a precisão do que está ocorrendo, mas como e por que está ocorrendo. Para realizar as entrevistas, procurei dividir o estudo em eixos temáticos. São eles: produção de VGMusic; a importância da música nos jogos, interatividade, imersão e sensações; o estilo musical e os processos de autonomização. As perguntas das entrevistas foram adaptadas aos eixos temáticos e às funções de cada entrevistado. Essa decisão permitiu uma maior aproximação com o universo de cada um deles, já que meu objetivo era buscar dados subjetivos. Em virtude da impossibilidade de realização das entrevistas de forma presencial, optou-se pela realização das mesmas à distância, via e-mail. A seleção dos entrevistados foi intencional, pois escolhi pessoas que trabalham, conhecem e ouvem game music, ou seja, possuem representatividade subjetiva, conforme defende Duarte (2008). Entrevistei primeiramente os compositores porque estão mais próximos da indústria de games e do processo produtivo. A maioria é músico por formação ou já teve pelo menos algumas aulas de música. Dos 19 e-mails enviados, obtive retorno de 10. A influência musical destes profissionais é ampla, indo da música clássica ao rock. De acordo com eles, é preciso ter um bom repertório nesse meio. Além deles, entrevistei bandas que fazem versões dos temas dos jogos. O blog foi muito útil neste sentido, pois, através dele, pude entrar em contato com algumas bandas brasileiras. No total, fiz contato com 9 bandas (7 que fazem versões e 2 que tocam chiptune). Todos responderam as perguntas. No geral, as bandas são formadas por jovens entre 20 e 30 anos, que tocam temas de jogos da década de 80 e 90 por nostalgia. Também entrevistei 4 donos de sites e blogs de games porque estão, também, próximos dos processos de autonomização pelo qual passa a música de videogames.
  • 13. 12 As entrevistas seguiram as necessidades e a dinâmica de uma análise qualitativa, por isso apresentando um caráter semi-aberto, conforme definido por Boni e Quaresma (2005), combinando perguntas abertas e fechadas. Esse caráter semi-estruturado das questões permitiu que eu enviasse por e-mail um roteiro de perguntas já pré-definidas e, assim que recebesse a resposta, fizesse perguntas adicionais para esclarecer alguma questão que não estava clara. Como as questões foram enviadas por e-mail, que não permite uma conversa em tempo real, foram enviadas muitas perguntas no primeiro contato, que depois foram complementadas no decorrer da conversa. Até aqui, como vimos, trouxe os principais desafios desta pesquisa, os conceitos e os motivos que me levaram a este estudo, além da metodologia utilizada. No capítulo 2 procuro dar uma visão ampla sobre a game music, através de sua história, forma de produção, relação com o jogador e sua importância para os videogames. Para isso, trago autores da área de games e áudio, como Collins (2008), Meneguette (2008) e Marks (2001), além de informações coletadas em sites e blogs especializados e através das entrevistas realizadas. Já no capítulo 3 procuro mostrar o que é o remix, sua relação com a cibercultura, a música eletrônica e a game music. Para isso, trago importantes autores, como André Lemos (2005) que formula o termo ciber-cultura-remix, Jenkins (2008) com o conceito de convergência, assim como Manovich (2002), Johnson (1997) e Sá (2006), que também trazem importantes contribuições. Além disso, no terceiro capítulo trago o mapeamento dos processos de autonomização da VGMusic, analisando a questão das versões e remixes, das suas extensões na internet (comunidades, rádios e sites) e do movimento para outras mídias, como o celular e os CDs. O mapeamento destes processos foi feito através de pesquisas na internet e das entrevistas, fundamentais para este trabalho. Para terminar, espero que a leitura seja agradável e que esta pesquisa seja um dos pontapés iniciais para muitas outras relacionadas à game music que possam surgir.
  • 14. 13 2 VGMUSIC 2.1 História Neste capítulo, trago um panorama da história da música nos videogames. Como surgiu, qual sua importância, como foi a evolução tecnológica (que influenciou na forma de fazer música para jogos) e como ela é produzida atualmente. 2.1.1 O início Os primeiros jogos de videogame eram muito pobres em recursos tecnológicos. A maioria era apenas experimentos eletrônicos que testavam a possibilidade de interatividade televisiva. Nenhum deles possuía áudio (MCDONALD, 2004). Em 1958, o engenheiro William Higinbotham moldou um tipo de jogo de tênis bruto em um osciloscópio7 . Chamado de Tennis for Two, é considerado o primeiro "truque" de um sistema de computador. Figura 1: Tennis for Two, considerado o primeiro “truque” de computador - Fonte: <http://en.wikipedia.org/wiki/File:Tennis_for_Two.jpg>. Acesso em: 20 maio 2009. 7 Instrumento destinado à visualização e caracterização de sinais elétricos, principalmente tensões elétricas (ou diferenças de potencial). O monitor é constituído por um ponto que periodicamente "varre" a tela da esquerda para a direita. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Oscilosc%C3%B3pio>. Acesso em: 20 maio 2009.
  • 15. 14 Em 30 de julho de 1961, um grupo de estudantes do Massachusetts Institute of Technology (MIT) testou pela primeira vez Spacewar!, um jogo eletrônico desenvolvido em um enorme computador que custava milhares de dólares. No entanto, tanto o game de 58 quanto o de 61 eram mudos. 2.1.2 O áudio começa a chamar a atenção Na década de 70, os jogos eletrônicos começavam a chamar a atenção das pessoas e o som passou a ser utilizado como recurso para gerar mais interesse nos jogadores. O áudio era armazenado em suportes físicos, como fitas cassetes e discos de vinil. Porém, estes suportes eram muito frágeis e caros para serem usados em máquinas de arcade (MENEGUETTE, 2008). Em 1972 foi lançado o primeiro console doméstico, o Odyssey (Magnavox), nos Estados Unidos. O sistema era totalmente analógico e não possuía som. Alguns meses depois, Nolan Bushnell e Ted Dabney lançaram Pong, instalado num console ligado a um monitor e movido a moedas. Pong foi um dos primeiros jogos a contar com áudio. O som se reduzia a um mero "blip" que acompanhava cada batida da bola nas raquetes (dois retângulos). Os criadores queriam colocar sons de multidão, aplausos e vaias, mas o sistema era muito limitado. Nessa primeira geração dos videogames era utilizada síntese eletrônica de som, passando-se uma corrente elétrica através de um amplificador, o que gerava alguns “blips” e “bloops”. Figura 2: Magnavox Odyssey, primeiro console doméstico - Fonte: <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/5/5e/Odysseye2m.png>. Acesso em: 20 maio 2009.
  • 16. 15 Figura 3: Pong, um dos primeiros jogos a ter áudio - Fonte: <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/0/0e/PongVideoGameCabinet.jpg>. Acesso em: 20 maio 2009. 2.1.3 A busca pelo som perfeito As fitas cassetes pré-gravadas com música geravam um alto custo, por isso a melhor forma de ter música ou efeitos sonoros em um jogo seria através dos meios digitais, usando um chip de computador que transformaria impulsos elétricos em ondas sonoras analógicas para um alto-falante. Para inserir música nos jogos, era necessária a transcrição dessas canções em código de computador, o que necessitava o trabalho de um programador, mesmo que ele não tivesse nenhuma experiência musical. Apesar do avanço tecnológico, o máximo que podia ser ouvido nos jogos eram músicas monofônicas8 e repetidas, na maioria das vezes usadas em telas de abertura ou entre as fases, como em Pac Man (Namco, 1981, um dos jogos mais famosos de todos os tempos) e Pole Position (Namco, 1982). Devido às limitações tecnológicas, sempre houve uma briga para reduzir o tamanho dos arquivos de áudio, por isso alguns jogos possuíam música apenas na introdução e efeitos sonoros durante o jogo (COLLINS, 2008). 8 Monaural, ou Mono, é o sistema de gravação e reprodução do som em que todo o som é transmitido por meio de um único canal, também chamado de monofônico. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Monaural>. Acesso em: 20 maio 2009.
  • 17. 16 Figura 4: Pac Man, um dos jogos mais famosos de todos os tempos - Fonte: <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/en/5/59/Pac-man.png>. Acesso em: 20 maio 2009. Na segunda geração de videogames surgiram consoles como o Atari 2600 (lançado em 1977) e Mattel Intellivison (lançado em 1979, com um gerador de som de três canais9 , ou tons). O sistema do Atari era limitado, por isso suas concorrentes, a Mattel e a Coleco, melhoraram o som e os gráficos em seus consoles, o Intellivison e o Colecovision. Os primeiros jogos de arcade possuíam sons fortes porque, como ficavam em lugares movimentados, precisavam competir com os sons do ambiente. Além disso, precisavam atrair jogadores e mantê-los interessados. Em 1978, a Taito lançou Space Invaders, um jogo que possuía de fundo uma batida contínua, simulando um coração pulsante. Além disso, sua trilha mudava na medida em que os inimigos se aproximavam, causando medo e suspense. 2.1.4 Início da década de 80 e maior preocupação com a música Na década de 80 houve um verdadeiro salto tecnológico com os avanços em relação ao silício10 e a queda nos custos de tecnologia, fazendo com que surgisse uma geração nova de máquinas de arcades e consoles caseiros. 9 Os canais também são o número de sons simultâneos que a placa de som pode manipular de uma vez. Fonte: <http://www.microsoft.com/brasil/windowsxp/using/games/learnmore/soundcard101.mspx>. Acesso em: 20 maio 2009. 10 Segundo elemento químico mais abundante da face da Terra. É o principal componente da maioria dos componentes semicondutores e dos silicones, que são substâncias plásticas muitas vezes confundidas com o silício. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Silicio>. Acesso em: 20 maio 2009.
  • 18. 17 Os arcades eram baseados no CPU11 68000 da Motorola e nos chips de som YM da Yamaha. Esses chips possuíam maior variedade de tons, ou canais de som, chegando a até oito. A maioria dos sistemas trazia co-processadores para lidar com o som. A vantagem é que a música poderia ser tocada sem ser interrompida pelos efeitos sonoros, mesmo não existindo música contínua em grande parte dos games nessa época. No ano de 1980, a empresa Sega lançou Carnival, considerado o primeiro jogo com música de fundo contínua (JOHANN; VARGAS, 2009). Por terem surgido antes, os arcades evoluíram mais rapidamente que os consoles caseiros, permitindo uma maior capacidade de armazenamento de memória nas placas (com mais canais de áudio). Com isso, as produtoras passaram a investir mais na música, criando pequenos trechos musicais (que duravam segundos) dentro dos jogos. O objetivo era uma maior identificação entre os personagens e jogadores. Em 1981 foi lançado para arcades o jogo Tempest (Atari), que incorporava dois chips especialmente para o som (chamados de Pokey e criados pela própria Atari). Eles permitiam oito canais de som simultâneos, que possibilitavam diversas combinações. A preocupação com a música nos jogos começou a aumentar e músicos foram contratados para compor as faixas. Algumas delas fizeram tanto sucesso que passaram a ser vendidas separadas dos jogos pela primeira vez (MENEGUETTE, 2008). Também em 1981, a dupla norte-americana Buckner e Garcia fez a música Pac Man Fever, em homenagem ao jogo, que era uma febre naquele ano. O single da música vendeu mais de dois milhões de cópias em 1982. O ano de 1981 marcou o nascimento do jogo que foi o grande sucesso da Nintendo: Donkey Kong. Nele, o personagem Mario apareceu pela primeira vez. O criador do jogo, o então iniciante Shigeru Miyamoto, também compôs as músicas, feitas em um pequeno teclado eletrônico. A fim de concorrer com as empresas de consoles domésticos, a Commodore lançou o Commodore 64 (C64), considerado um dos computadores pessoais mais vendidos de todos os tempos. Seu preço relativamente baixo aumentou a procura por Personal Computer (PC), ainda mais porque a televisão poderia ser usada como monitor. O Commodore foi o primeiro sistema doméstico a ter chips separados para som e imagem. Seu chip de som é o 6581 Sound Interface System (SID), considerado muito avançado para a sua época, pois imitava 11 Central Processing Unit em inglês, ou Unidade Central de Processamento, microprocessador ou Processador, é a parte de um computador que processa as instruções contidas no software. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Cpu>. Acesso em: 20 maio 2009.
  • 19. 18 instrumentos musicais tradicionais com maior precisão que outros chips. Ele possuía três canais que dispunham de vários filtros12 e moduladores13 . Com um som igual ao dos sintetizadores da época, o chip funcionava por meio de síntese subtrativa, que convertia os impulsos elétricos em ondas de som analógicas. Isso gerou novas possibilidades sonoras, muito exploradas por compositores da época, que foram fortemente influenciados pelo rock progressivo (especialmente Rick Wakeman), pelo som espacial de Jean Michel Jarre e pelo Europop. Esse tipo de som se tornou uma característica marcante do C64. Figura 5: Commodore 64, um dos computadores mais vendidos do mundo - Fonte: <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/9/9d/Commodore64.jpg>. Acesso em: 20 maio 2009. 2.1.5 As músicas marcantes dos consoles de terceira geração Em 1983 começaram a surgir os consoles da terceira geração (8 bits14 ), como o Famicom, o Master System e o Atari 7800. O Famicom (de Family Computer) foi lançado em 83 pela Nintendo e foi um dos seus consoles mais famosos. No entanto, ele ficou popular dois anos depois, ao ser lançado no mundo com a sigla NES, de Nintendo Entertainment System. O Famicom possuía um processador Motorola 6502 e um sistema de som com 4 canais de síntese e outro capaz de 12 A princípio, qualquer operador ou dispositivo que modifique um sinal de áudio pode ser considerado um filtro. Um filtro atenua a quantidade de energia presente em certas frequências ou faixas de frequências de áudio. Existem muitos tipos de filtros, com características e aplicações bastante diferentes. Fonte: <http://www.eca.usp.br/prof/iazzetta/tutor/audio/filtros/filtros.html>. Acesso em: 20 maio 2009. 13 Nos sintetizadores, eles alteram um valor pré-programado. Fonte: <http://roland.com.br/suporte/glossary/m>. Acesso em: 20 maio 2009. 14 Os bits se referem à capacidade de processamento da CPU do console.
  • 20. 19 gerar sons digitais simples em PCM15 . Ele simula 4 “instrumentos”: um baixo, duas guitarras e uma bateria. Conforme foram sendo lançados outros consoles que possuíam muito mais canais de áudio, o NES tentou se manter competitivo no mercado acrescentando nos cartuchos um chip extra que melhorava um pouco os gráficos e aumentava o número de canais de som. (MENEGUETTE, não paginado, 2008) Figura 6: Famicom, um dos consoles mais famosos da Nintendo - Fonte: <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/d/df/Nintendo_entertainment_system.png>. Acesso em: 20 maio 2009. Em 1984 a gravadora Yen lançou o primeiro álbum de game music. Ele trazia as faixas originais de vários jogos da Namco, como Pole Position (1982), Xevious (1982), Pac Man (1981), New Rally X (1981), entre outros, como veremos mais adiante. O ano de 1985 marcou o nascimento de Super Mario Bros. e a popularidade do NES (lançado mundialmente neste ano). O game é um dos mais famosos do mundo até hoje. A música foi criada por um compositor profissional, Koji Kondo, e é considerada uma obra prima em relação às limitações que o sistema impunha ao músico. Este ficou famoso posteriormente por ter elaborado outras belas composições para jogos. As músicas e os efeitos de Super Mario Bros. inauguraram uma era de novidades em relação ao áudio para games. Ele criou algo novo, especialmente por causa de seus sound symbols, que indicam, a cada momento, o status do jogador, como “está acabando seu tempo”, “você está imune”, “você ganhou”, “você perdeu”, etc. Se jogar o jogo sem som, você perde esses sinais (MCDONALD, 2004). Em 1985, o computador PC-8801, lançado em 79, ganhou uma placa de som com a série PC-8001mkIISR. Uma geração de fãs de música pode aprender a programar músicas no novo PC, para depois enviar às revistas especializadas. Aqueles que hoje são grandes nomes 15 Modulação por código de pulsos ou modulação por pulso codificado, PCM é uma representação digital de um sinal analógico. O objetivo é fazer com que um sinal analógico possa ser transmitido através de um meio físico com transmissão digital. É também o método utilizado para gravar e armazenar amostras em vários tipos de sintetizadores. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Pcm>. Acesso em: 20 maio 2009.
  • 21. 20 da game music, como Yuzo Koshiro, são dessa geração. O PC-8001mkIISR possuía um processador de som Yamaha YM-2203, de 8 bits16 . Na metade da década de 80 houve uma grande onda de lançamentos de jogos que tinham música composta por pessoas com experiência musical. Essas pessoas passaram a estudar os videogames, criando composições complexas de acordo com o tema do jogo. A qualidade das canções avançou muito, tanto que essas músicas são populares até hoje17 . Outro computador lançado em 1985 foi o Commodore Amiga. Ele foi comprado pela Commodore International e vendido como sucessor do Commodore 64. O Amiga teve vários modelos, mas o som permaneceu o mesmo em todos. Todo seu sistema era muito avançado para a época. O chip de som, apelidado de “Paula”, suportava 4 canais de som estéreo18 . Porém, com um truque de programação ele podia ampliar sua capacidade para 8 canais. Ele permitia executar samples19 de sons pré-gravados, armazenados em memória. Esses samples podiam ser de um instrumento real ou de um som desejado em uma qualidade e fidelidade significativamente mais altas do que a de anos atrás. Os arquivos utilizados no Amiga eram em formato MOD20 . Esse formato possibilitou mais sons, que por sua vez eram mais realistas e fáceis de manipular pelos programadores que não eram músicos (COLLINS, 2008). A fim de competir com a Nintendo nos consoles de 8 bits, a Sega lançou o Master System em 1986. Mesmo superior ao NES em relação aos gráficos e ao som (já que foi lançado anos depois), ele não fez tanto sucesso no mercado norte-americano e japonês. O chip SN76489, da Texas Instrument, proporcionava 4 canais de som mono no formato PSG21 , que tinha a característica de soar muito vibrante e metálico aos ouvidos. Outra empresa que queria entrar na briga e restabelecer sua supremacia era a Atari, lançando, no mesmo ano, o Atari 7800. Ele possuía um processador de áudio de dois canais 16 Neste caso se refere aos bits do processador de som, e não os da CPU. Eles indicam a quantidade de tons simultâneos com que o sistema pode trabalhar. Fonte: <http://www.wiki2buy.com.br/wiki/Placa_de_Som>. Acesso em: 20 maio 2009. 17 Entre os compositores que ganharam fama com músicas compostas para esses jogos são Koji Kondo (Super Mario Bros., The Legend of Zelda, da Nintendo, 1987), Koichi Sugiyama (Dragon Quest, da Enix, 1986), Rob Hubbard, Hirokazu Tanaka (Metroid, da Nintendo, 1986, e Kid Icarus, da Nintendo, 1988), Martin Galway (Times of Lore, da Origin Systems, 1988), Hiroshi Miyauchi (Out Run, da Sega, 1986), Nobuo Uematsu (Final Fantasy, da Square, 1987). 18 Consiste num sistema de reprodução do áudio que utiliza dois canais de som monaurais distintos (direito e esquerdo) sincronizados no tempo. É o padrão de reprodução encontrado nos CDs de música, porém vem sendo substituído nos cinema e em algumas gravações musicais pelo áudio multicanal (5.1/7.1). Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Estereofonia>. Acesso em: 20 maio 2009. 19 Amostra de áudio. 20 Formato de arquivo utilizado principalmente para representar música. Ele contém um conjunto de instrumentos na forma de amostras e uma série de padrões indicando como e quando as amostras devem ser tocadas. 21 Programmable Sound Generator ou gerador de sons programável.
  • 22. 21 separados, gerando um desempenho superior em velocidade ao NES e gráficos e sons de qualidade similar ao Master System. Porém, o que decretou o fracasso do Atari 7800, mesmo sendo superior aos concorrentes, foi o baixíssimo acervo de jogos. O ano de 1987 marcou o nascimento de The Legend of Zelda (Nintendo) para o NES, outro dos jogos mais famosos da empresa, juntamente com Super Mario Bros. (1985) e Metroid (1986). Suas músicas fizeram e ainda fazem sucesso, tanto que podem ser encontradas na web em diversos formatos, como MP322 e MIDI23 . Também em 87 foi lançado Final Fantasy (Square), para o NES, no Japão. Suas músicas foram compostas por Nobuo Uematsu, um dos maiores nomes da VGMusic de todos os tempos. As composições para esta série são consideradas verdadeiras obras primas até hoje, mesmo com as limitações que o sistema impunha ao compositor. 2.1.6 Quarta geração e o salto em qualidade das músicas A era dos consoles 16 bits, ou quarta geração, iniciou em 87, com destaque para Super Nintendo (ou SNES, da Nintendo), Mega Drive (Sega), Neo Geo (SNK) e PC-Engine (NEC). Esses consoles possuíam sistemas próprios de samplers24 e permitiam mais possibilidades de síntese de sons. Além disso, possuíam sistema estéreo e cada vez mais canais de áudio simultâneos. Houve um verdadeiro salto em qualidade das músicas nessa época. De acordo com Collins (2008), um dos principais avanços dessa geração foi a introdução de chips FM25 , que eram mais flexíveis e ofereciam um leque maior de timbres26 e som. 22 O MP3 (MPEG-1/2 Audio Layer 3) foi um dos primeiros tipos de compressão de áudio com perdas quase imperceptíveis ao ouvido humano. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Mp3>. Acesso em: 20 maio 2009. 23 Musical Instrument Digital Interface, que é uma forma de armazenar em pequenos arquivos de computador, músicas que podem ser executadas pela placa de som do computador. Os arquivos MIDI apenas guardam as notações musicais, ou seja, a partitura da música, informações que a placa de som precisa para tocá-la. 24 Equipamento que consegue armazenar sons numa memória digital, e reproduzi-los posteriormente. Um dos grandes responsáveis pela revolução da música eletrônica, pois através dele e usando ciclos (loops em inglês), pode-se manipular os sons para criar novas e complexas melodias ou efeitos. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Samplers>. Acesso em: 20 maio 2009. 25 Na síntese de FM, quando um arquivo MIDI é executado, o sintetizador cria eletronicamente o som de cada instrumento. Dessa forma, o som percebido por nosso ouvido não é o do instrumento, mas sim um som eletrônico tentando imitá-lo. Percebemos que o som é típico de computador e não tem qualidade para uso profissional. Fonte: <http://www.clubedohardware.com.br/printpage/919>. Acesso em: 20 maio 2009. 26 O timbre é aquilo que faz você saber a diferença entre o que é um violão, uma flauta, uma buzina de carro ou uma voz feminina. São as propriedades físicas do som que atuam sobre partículas da atmosfera produzindo uma diferença que pode ser estabelecida por seu aparelho auditivo. Fonte: <http://www.estudiolivre.org/tiki index.php?page=TestesDeEqualizacaoEPercepcaoDoTimbre&bl>. Acesso em: 20 maio 2009.
  • 23. 22 Também aqui houve a adoção do MIDI. Ele foi criado em 1983 para que dispositivos musicais como sintetizadores, teclados e sequenciadores27 fossem compatíveis em um formato padronizado. Somente códigos eram transmitidos, ao invés de sons reais, o que ocupava menos memória, uma vantagem para o desenvolvimento de jogos. Para os músicos também foi vantajoso porque agora poderiam compor as músicas em teclados, sem linguagem de programação. Com isso, mais músicos passaram a trabalhar no desenvolvimento de músicas para jogos eletrônicos. As experimentações se tornaram mais sofisticadas e os sons mais limpos. Em 1987 o PC-Engine (TurboGrafx-16, nos EUA) foi lançado pela NEC em parceria com a Hudson Soft. O detalhe mais marcante no novo console era seu suporte para leitor de CD-ROM, uma inovação na época. Os jogos gravados em CD eram superiores a qualquer jogo existente no mercado e algumas características, como músicas digitais, vozes e animações eram os grandes atrativos do novo console. Já em 1988 foi lançado o Mega Drive (ou Sega Genesis, como é conhecido nos Estados Unidos). Apesar dos grandes avanços gráficos em relação ao NES e a melhorada capacidade de síntese de som, o Mega Drive ainda mantinha várias similaridades com o modo de desenvolvimento de som de seus antecessores. Seu chip, o YM2612, é um sintetizador FM, que gera o som a partir de uma soma de frequências. O som tinha qualidade de CD e os múltiplos canais permitiram diversos efeitos, que agora eram mais realistas. Outra característica do Genesis foi a adoção de traços estilísticos do rock progressivo (COLLINS, 2008). Para concorrer com o Genesis, a Nintendo lançou o Super Famicom (ou Super Nintendo, ou ainda SNES, como é conhecido no ocidente). Deste lado do mundo ele foi lançado em 1991. O console trazia um chip especializado da Sony para geração de som e DSP28 . Com um sistema avançado para a época, seu chip, o SONY SPC700, é um sintetizador wavetable29 , que gerava o som a partir de samples comprimidos de instrumentos reais e era 27 Programa onde uma música é programada. É uma tecnologia de partitura digital. Assim como os músicos lêem a partitura para tocar uma música, o sequenciador lê a sequência para tocar uma música, utilizando instrumentos sintetizados. Fonte: <http://forum.cifraclub.terra.com.br/forum/8/54226/>. Acesso em: 20 maio 2009. 28 Digital Signal Processor, são microprocessadores especializados em processamento digital de sinais. Ganhou popularidade na eletrônica em aparelhos como os teclados, que sintetizam os sons de diversos instrumentos, como órgãos, piano e violão. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Digital_Signal_Processor>. Acesso em: 20 maio 2009. 29 Na síntese por wavetable, a placa de som possui uma memória ROM (tipo de memória que permite apenas a leitura, ou seja, não podem ser alteradas ou apagadas, somente acessadas) contendo os sons dos instrumentos, que foram gravados em estúdio. Com isso, ao executarmos um arquivo MIDI, o som que escutamos não é criado pela placa de som, mas uma gravação real dos instrumentos, como se estivéssemos dando um "play"
  • 24. 23 mais realista que o FM do Mega Drive. Ele emulava os instrumentos e era capaz de 8 canais de sons digitais com uma resolução de até 16 bits. Enquanto o Mega Drive trazia características do rock progressivo, o SNES era mais inclinado para as músicas populares dos anos 90, de acordo com Collins (2008). Com o advento do CD, a música de videogames ficou ainda mais popular. Agora os compositores não estavam mais limitados pelos processadores sonoros e a pouca memória e podiam gravar as músicas em estúdio, como em um CD de música comum. Outros consoles surgiram na mesma época que o SNES, mas tiveram pouca popularidade. A SNK lançou o Neo Geo em 1990, que possui um poderoso sistema de processamento de samples, mas era bem mais caro que o Super Nintendo. Seu chip era um Yamaha YM2610 com 15 canais de som (7 digitais, 4 de síntese FM, 3 PSG e 1 de ruídos). 2.1.7 Quinta geração e sistemas de som mais potentes Na quinta geração, com consoles como Jaguar (Atari), Saturn (Sega), PlayStation (Sony) e Nintendo 64 (Nintendo), os sistemas de som passaram a ser mais potentes e permitiram uma trilha sonora com maior qualidade. Essa qualidade foi possibilitada pelo uso de mídias ópticas30 , com grande capacidade de armazenamento em relação aos cartuchos. Elas permitiram o processamento mais rápido dos consoles e melhora da transformação analógico/digital do sinal sonoro em samples de alta fidelidade. Um dos primeiros consoles de 32 bits foi o Atari Jaguar, lançado em 1993. Apesar da qualidade do áudio ser igual a de CD, ele fez pouco sucesso entre os jogadores. Um dos jogos mais populares do console, Tempest 2000 (1994) foi um dos primeiros a ter as músicas vendidas separadamente do jogo, em formato MOD. Preocupada com a nova geração de videogames em CD-ROM, a Nintendo resolveu projetar o Super Famicon CD. Para isso, fez uma parceria com a Sony para realizar o projeto. O console foi anunciado, mas nunca finalizado. A Nintendo então rompeu a parceria e deixou em uma gravação feita com instrumentos em estúdio. Com isso, percebemos que o som é real, e pode ser usado em aplicações profissionais. Fonte: <http://www.clubedohardware.com.br/printpage/919>. Acesso em: 20 maio 2009. 30 São meios de arquivamento que utilizam tecnologia laser de gravação. Comportam grandes quantidades de informação em menos espaço. Desde sua criação, as mídias ópticas vêm se aperfeiçoando muito, e a cada dia são mais populares, o que tem reduzido significativamente seu custo. Como exemplos, temos o CD, DVD, Mini-CD, Blu-Ray e HD-DVD. Fonte: <http://www.updatebrasil.com/frames/midia_optica.htm>. Acesso em: 20 maio 2009.
  • 25. 24 a tecnologia do novo console com a Sony. Para a surpresa das concorrentes, a empresa deu continuidade ao projeto e entrou na briga de consoles com seu PlayStation, em 1994. O videogame teve sucesso imediato e popularizou os jogos em CD, assim como algumas músicas. Ele trazia suporte a 24 canais de sons em até 44.1 kHz, uma qualidade equivalente à de CD e que permitia efeitos digitais, tais como reverberação31 e looping32 . Mesmo assim, muitos jogos da Squaresoft continuaram a usar música sequenciada, como em Final Fantasy VII (1997), Legend of Mana (2000) e Final Fantasy Tactics (1997). Após desistir da Sony, a Nintendo resolveu não lançar um console de 32 bits, indo direto ao de 64 bits, o Nintendo 64, em 1996. O N64 tinha até 100 canais e 48 kHz de fidelidade de reprodução, suporte a formato PCM e diversos efeitos especiais. Ao contrário do que acontecia na época, a Nintendo continuou usando cartuchos ao invés de CD-ROM e não conseguiu competir com o PlayStation. Os jogos para o N64 também tiveram trilhas pouco marcantes e os sons digitais tinham qualidade inferior em relação a seus concorrentes, devido ao custo da memória em estado sólido, o que fazia com que as músicas dos jogos do console fossem mais simples. 2.1.8 Sexta e sétima geração: poucos avanços na forma de fazer música para videogames Em 1998 a Sega lançou o primeiro console de 128 bits, o Dreamcast, dando início à sexta geração de consoles, que ainda traria o GameCube (Nintendo), o PlayStation 2 (Sony) e o Xbox (Microsoft). Apesar da avançada tecnologia, o Dreamcast agradou pouco o público. O som tinha dois processadores, e, ao contrário do Nintendo 64, as amostras não precisavam ser 31 Quando uma fonte sonora é acionada, as primeiras ondas geradas propagam-se até as paredes, sendo refletidas. Percorrem um caminho em ziguezague por todas as direções. Nesse intervalo de tempo, a fonte emitiu novas ondas que se combinam com as anteriores. As vibrações sonoras aumentam, portanto, progressivamente de intensidade até alcançar um valor estacionário. A reverberação ocorre quando a diferença entre os instantes de recebimento dos dois sons é inferior a 0,1 s. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Reverbera%C3%A7%C3%A3o>. Acesso em: 20 maio 2009. 32 Permite tocar o mesmo trecho de uma música ou tocar uma frase em um sampler, repetidas vezes subsequentes. No caso de processadores de efeito, loop representa uma forma de aplicar o efeito ao sinal de áudio, enviando uma parte do som natural para o processador de efeito e depois mixando o sinal já processado junto com o sinal natural (limpo). Fonte: <http://roland.com.br/suporte/glossary/l>. Acesso em: 20 maio 2009.
  • 26. 25 descomprimidas, o que melhorava a fidelidade do áudio. Possuía um processador de som Yamaha de 64 canais (45MHz) e som surround33 . Em 1998 a Nintendo lançou A Legend of Zelda: Ocarina of Time para o Nintendo 64. Este é um dos primeiros jogos onde a música influencia na jogabilidade. No game, você usa a ocarina, espécie de flauta, para abrir portais, se teleportar ou convocar aliados. Muito esperado pelos jogadores, a Sony lançou o PlayStation 2, em 2000. Além da CPU de 128 bits, seu sistema de som possui 48 canais de som mais 2MB de memória somente para o som. O console também pode reproduzir filmes em DVD e possui som surround em formato AC334 . Seu sucesso foi enorme, assim como os jogos lançados, com bons gráficos e trilhas cinematográficas. No ano seguinte, em 2001, a Microsoft entrou na briga pelos consoles e lançou o Xbox, com 64 canais 3D35 (até 256 vozes em estéreo) e Dolby Digital 5.136 . O console possui quatro processadores independentes para o áudio e os compositores que compõem para o Xbox não precisam aprender a usar as novas ferramentas, mas podem usar seus equipamentos comuns de áudio, como sequenciadores (MARKS, 2001). No ano de 2004 aconteceu um fato inusitado. A dupla de nado sincronizado dos Estados Unidos, Alison Bartosik e Anna Kozlova, utilizou as músicas "One Winged Angel" e “Liberi Fatali”, ambas do jogo Final Fantasy VIII (Squaresoft, 1999), para sonorizar as coreografias subaquáticas. A prova lhes rendeu a medalha de bronze. Em 2005 foi lançado o Xbox 360, com saída surround, suporte para áudio em 16 bits e mais de 256 canais de áudio. Ele dá início à geração atual (sétima) de consoles, que conta ainda com o PlayStation 3 e o Nintendo Wii. O PlayStation 3 foi lançado em 2006. Entre as funções do console estão uma robusta capacidade para multimídia, conectividade com o PlayStation Portable (console portátil da 33 Som Surround é o conceito da expansão da imagem do som a duas ou três dimensões. O surround recria um ambiente mais realista de áudio através de várias caixas de som espalhadas pelo ambiente. Enquanto o estéreo possui dois canais, o surround possui quatro (esquerdo, direito, central e surround) codificados em uma trilha de dois canais. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Dolby>. Acesso em: 20 maio 2009. 34 O Dolby Digital ou AC3 é um formato de compressão de dados de áudio desenvolvido pela Dolby Laboratories, Inc. que é muito utilizado nos filmes em DVD. Destaca-se pelo sistema que permite armazenar áudio em múltiplos canais independentes. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Dolby>. Acesso em: 20 maio 2009. 35 O som 3D ou Binaural tem a capacidade de dar a sensação de espaço e tempo aos sons. Fonte: <http://www.informemusical.com.br/ver_artigo.php?id=9>. Acesso em: 20 maio 2009. 36 Mesmo que o AC3, ou seja, possui cinco canais de som separados e um canal para os graves. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Dolby>. Acesso em: 20 maio 2009.
  • 27. 26 Sony) e o uso da próxima geração de discos ópticos, Blu-ray Disc37 , como o meio de armazenamento primário. Ainda possui saída S/PDIF para áudio digital até 7.138 , que pode ser conectada a um home theater39 e dar ao jogador maior sensação de realismo. Ao contrário de consoles anteriores, o Processador Central Cell se encarrega também pelo áudio (JOHANN; VARGAS, 2009). Ainda em 2006, a Nintendo lança o Wii, com uma proposta totalmente diferente. O controle, Wii Remote, possui sensores de movimento e para jogar o jogador precisa movimentá-lo. O áudio principal é Dolby Pro Logic II40 . Em 2008, outro fato curioso. O candidato à presidência dos EUA, John McCain, usou em um de seus vídeos de campanha uma música do jogo Medal of Honor: European Assault (Electronic Arts, 2005). McCain fala no vídeo da participação de sua família nas guerras e também da sua prisão no Vietnã ao som da música do jogo. Porém, o compositor da canção, Christopher Lennertz, não ficou muito feliz com a ideia porque ele era um defensor ferrenho de Barack Obama. A tecnologia mudou a forma de fazer música porque agora os compositores não dependem mais da memória ou capacidade de processamento dos consoles, exceto no caso dos dispositivos portáteis, que possuem memória limitada. Aí, ainda são utilizadas técnicas similares àquelas adotadas nos anos 90. De qualquer forma, atualmente os compositores têm mais liberdade para criar. No entanto, o processo criativo continua o mesmo. Utiliza-se o conceito do leitmotiv41 definindo o clima e o tema de cada cena e logo após os pontos musicais de articulação com o enredo proposto, de acordo com Allen Ferraudo42 . “Certamente pode-se identificar uma mudança de sonoridade através das gerações, mas esteticamente criou-se uma linguagem própria, tendo o loop como elemento que exemplifica a própria lógica da máquina, com seus ciclos calculados e sintéticos” (como aponta Lucas 37 O DVD, usado no PlayStation 2 e no Xbox, estoca até 4,7 gigabytes por camada, podendo conter até duas camadas. Já o Blu-Ray armazena até 25 gigabytes por camada, podendo conter até duas. Existem protótipos com até 8 camadas e protótipos com 6 camadas de 33 gigabytes cada. 38 Enquanto o AC3 possui cinco canais de som separados e um para os graves, o 7.1 é capaz de reproduzir 8 canais. 39 Home Theater, também conhecido como home cinema ou cinema em casa, é o nome que se dá ao hobby que consiste em montar pequenas salas de cinema em residências usando sofisticados aparelhos eletrônicos. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Home_theater>. Acesso em: 20 maio 2009. 40 O Dolby Pro Logic II permite uma reconstituição artificial de um ambiente sonoro 5.1 graças a tratamentos informáticos aplicados a uma fonte estéreo (2.0) ou Dolby Surround (3.0/4.0/4.1). Fonte: <http://pt.kioskea.net/contents/audio/dolby-surround-pro-logic.php3>. Acesso em: 20 maio 2009. 41 Técnica de composição introduzida por Richard Wagner em suas óperas, constituindo-se em tema associado, no decurso de todo o drama musical, a uma personagem, uma situação, um sentimento, ou um objeto. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Leitmotiv>. Acesso em: 30 set. 2009. 42 Entrevista com Allen Ferraudo realizada por e-mail em 15 de setembro de 2009 (Anexo A).
  • 28. 27 Meneguette43 ). A seguir, mostrarei como é o processo de produção das músicas para videogames atualmente e como são tratadas as questões da interatividade, imersão e sensações causadas pela game music. 2.2 Produção A música para videogames é produzida durante a criação do próprio jogo e, na maioria das vezes, com poucos dados do game. Na hora de produzir um jogo, um time de desenvolvedores é montado. Eles podem ser terceirizados, funcionários da empresa com contrato permanente (in-house) ou independentes. No caso do áudio, a maioria é terceirizado ou free lancer. Entre os profissionais que fazem parte do processo de produção estão principalmente: compositor (que compõe as músicas); sound designer (que desenvolve e implementa os sons); voice talent (que faz os diálogos) e programador de áudio (responsável por programar como todos esses elementos funcionarão em conjunto e no jogo). A equipe de áudio pode variar muito, dependendo do tamanho e orçamento da empresa. As menores têm uma pessoa responsável por todos os efeitos sonoros, música, voz e implementação, enquanto as maiores podem ter equipes de compositores, sound designers e atores para dublar as vozes. Em alguns casos, o músico in-house também acumula diversas funções. As grandes franquias têm trabalhado com orquestras, mas as pequenas ainda preferem os sintetizadores, por serem mais baratos e por permitirem modificações mais rapidamente. “[...] a realidade do Brasil é diferente. Quando há preocupação com o áudio, esse elemento importantíssimo de qualquer audiovisual, o serviço ou é terceirizado ou compõe-se pequenas equipes: um faz-tudo de áudio, um faz-tudo de programação que acaba implementando a parte sonora do jogo” (como fala Lucas Meneguette em entrevista). Em jogos casuais ou para celulares, dificilmente haverá uma equipe e ferramentas necessárias para a produção de um áudio mais elaborado. A contratação dos músicos, no geral, acontece por indicação ou porque possuem um portfólio ou estrutura de equipamentos boa. Nas grandes franquias de jogos, eles são procurados por seu currículo. “Para os compositores iniciantes, é mais fácil mostrar seu trabalho através de portfólios em produtoras de jogos para celular, por exemplo” (Lucas Meneguette). Sete, dos 10 músicos entrevistados, já trabalhou ou trabalha com áudio para 43 Entrevista com Lucas Meneguette realizada por e-mail em 20 de agosto de 2009 (Anexo A).
  • 29. 28 games. Eles confessam que é uma área ainda pouco explorada no Brasil e que a atividade acaba surgindo por acaso e, algumas vezes, como complemento financeiro. Músicos de primeira classe também são convocados para trabalhar com músicas de videogames. Como exemplo, temos a música orquestrada de Mikael Karlsson para Battlefield (EA Games, 2002), que foi executada por um grupo de 70 pessoas (inclusive membros da câmara Alarm Will Sound e do International Contemporary Ensemble) sob condução de Alan Pierson. Grandes compositores do cinema, como Danny Elfman, Howard Shore e Hans Zimmer também já fizeram composições para games. Para os jogadores entrevistados, que também são donos de sites e blogs de games44 , as produtoras deveriam investir mais na utilização de instrumentos reais e orquestras, para que a trilha não fosse sempre sintetizada. Porém, o custo para a utilização desse tipo de música ainda é alto para algumas produtoras. De qualquer forma, o que podemos perceber é que o investimento em áudio vem aumentando nos últimos anos, com trilhas muito parecidas com as cinematográficas. A fase de pré-produção de um jogo começa com um desenho detalhando o enredo, o diálogo, os mapas, o áudio, os gráficos, a animação e a programação. A partir dele as equipes, inclusive a de áudio, começam a trabalhar. Algumas o deixam mais pormenorizado, de acordo com sua tarefa. Nessa fase, é necessário que a equipe de áudio saiba, primeiro, qual o tipo de jogo, para poder criar a trilha adequada. A segunda questão a lidar é a da jogabilidade, como o som interage com ela. Na terceira fase, é preciso determinar quais partes do jogo terão som ambiente e quais terão música. As canções, então, são criadas de acordo com suas funções, por exemplo, o tema principal, tema do herói, tema do anti-herói, tema de ação etc. Até os movimentos que o jogador faz nos botões do controle devem servir de base para os efeitos sonoros (COLLINS, 2008). Na fase final do processo de produção de áudio são integrados a música, os efeitos sonoros e o diálogo. Azevedo (2009)45 afirma que cada compositor tem seu processo e mostra como é feito o seu: • Spot ou Briefing - quando se conversa com o desenvolvedor do jogo e se busca definir o direcionamento musical do jogo; • Listagem - um inventário aproximado de quantos temas musicais serão necessários e em quais situações; • Composição - nessa etapa são compostos os temas sem tanta preocupação com a qualidade dos timbres e a produção. A ideia é avaliar as músicas baseado em sua estrutura 44 Entrevista com jogadores donos de sites e blogs de games realizada por e-mail (Anexo C). 45 Entrevista com Werther Azevedo realizada por e-mail em 4 de setembro de 2009 (Anexo A).
  • 30. 29 formal e melódica. Nesta fase são feitos muitos ajustes até se chegar a uma concordância com o cliente; • Produção - com todos os temas aprovados, é a hora de lapidar cada timbre e mixar as músicas para se chegar à máxima qualidade sonora possível; • Masterização - normalização dos níveis entre os diferentes temas, compressão e ajustes finais. A interatividade é uma característica dos jogos que influencia o áudio. Para alguns compositores isso é um problema porque interatividade significa imprevisibilidade. Enquanto os compositores de trilhas sonoras para filmes têm alguma noção sobre o que vai acontecer em cada cena, os compositores de games precisam prever cada movimento do jogador. Às vezes, a situação pode não ocorrer exatamente como foi prevista ou pode mudar a qualquer momento e esse é o desafio para o compositor. Mas nem sempre as músicas são criadas especialmente para um jogo. Em alguns deles, como os de corrida e esportes radicais, são usadas músicas licenciadas, ou seja, canções pré- existentes e que possuem direitos autorais. Geralmente quando uma produtora deseja usar uma música licenciada em seu jogo ela faz uma lista com as possíveis canções, sem se importar com o orçamento. Depois, com o tempo, ela utilizará aquelas que se encaixarem no valor que a empresa estipulou (D‟ARCY, 2004). O uso desse tipo de música varia de acordo com o tipo de jogo. Games como os de corrida ou esportes radicais, por exemplo, não precisam de uma música muito interativa porque não possuem uma narrativa complexa, como os de plataforma ou RPG46 , que necessitam de uma trilha própria, que lhes dê uma identidade. Os quatro jogadores entrevistados, donos de sites e blogs de games, preferem jogos com trilhas originais. Para eles, o game ganha em identidade e originalidade. No caso das músicas licenciadas, uma das tarefas mais difíceis para a equipe de áudio é obter a licença de canções que possuem muitos editores, como as de hip hop, onde há três ou quatro cantores, um co-escritor e as amostras de músicas pré-existentes, que também possuem direitos autorais. Mas, para facilitar a procura, alguns sites disponibilizam uma lista de músicas e álbuns com os respectivos detentores dos direitos, facilitando assim o contato entre a produtora do jogo e o detentor. 46 O Role-playing game (RPG, traduzido como "jogo de interpretação de personagens") é um tipo de jogo em que os jogadores assumem os papeis de personagens e criam narrativas colaborativamente. O progresso de um jogo se dá de acordo com um sistema de regras predeterminado, dentro das quais os jogadores podem improvisar livremente. As escolhas dos jogadores determinam a direção que o jogo irá tomar. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/RPG_%28jogo%29>. Acesso em: 30 set. 2009.
  • 31. 30 Feito o contato, o detentor dos direitos autorais irá questionar algumas coisas, por exemplo: utilização inicial (se a música será utilizada no menu, durante o jogo, na seleção de um personagem, etc. Dependendo da utilização, o detentor dos direitos autorais pode cobrar mais ou menos); mídia solicitada (se a música será para PlayStation 1, 2 ou 3, Xbox, PC, etc); comprimento da licença (geralmente a vida útil de um console é pouca, por isso o padrão é de cinco anos); território (em quais países o jogo será lançado); direitos adicionais (se a música será utilizada em outros locais e mídias, como em eventos, em CDs com revistas, sites, etc); e direitos especiais (quando a produtora do jogo quiser usar a música em comerciais de lançamento, etc) (D‟ARCY, 2004). Alguns músicos vendem os direitos de utilização de suas músicas em jogos, como por exemplo, Aerosmith, Blur e até mesmo Os Tribalistas e Zeca Pagodinho no jogo Fifa Soccer 2004 (EA Games). Outros são contratados para criar músicas exclusivas, como Peter Gabriel, que compôs uma música para a nova versão de Myst (Cyan). No caso das músicas licenciadas, o jogador pode criar sua própria trilha, escolhendo, entre as músicas disponíveis, aquelas que quer ouvir. Geralmente, durante o jogo, o jogador aperta um botão, que passa para a próxima faixa. A popularidade de um jogo pode aumentar quando artistas do mundo “pop” são convidados a participarem da trilha sonora. Para os jogadores entrevistados, quando um game é lançado com a música de artista “x”, além dos jogadores habituais, ele pode conquistar o fã desse determinado artista. Além disso, o respaldo que a mídia dá para jogos com alguma celebridade é maior, o que, consequentemente, aumenta a popularidade do jogo. 2.3 Estilo game music? As músicas dos consoles mais antigos possuem características muito parecidas, em termos de composição musical. Essas características, no entanto, surgem devido às restrições tecnológicas da época em que foram produzidas, cerca de 20 anos atrás, e não podem servir de base para que a game music seja considerada um estilo ou gênero musical. Alguns tipos de jogos, como os RPGs, possuem músicas muito parecidas entre si. Na maioria das vezes são músicas calmas, orquestradas, com características medievais, por exemplo. Já os jogos de ação possuem músicas mais aceleradas, geralmente se prefere o rock. Jogos de luta, por outro lado, trazem em sua trilha músicas diferentes para personagens diferentes. Por este motivo é
  • 32. 31 que não podemos classificar TODAS as músicas de games como pertencentes a um “estilo” game music. Para os compositores entrevistados47 , game music não é um estilo musical, pelos mesmos motivos apontados. Segundo eles, as músicas de diferentes jogos podem variar muito, o que dificulta uma definição do tipo “estilo game music”. Para Larson (2009)48 , por exemplo, se pegarmos uma grande amostra de músicas e analisá-la, perceberemos certos padrões que tem a ver com o suporte, nesse caso o console e sua influência tecnológica. Porém, isso não pode servir de parâmetro para que a game music seja considerada um estilo musical, muito embora o mercado já tenha adotado o termo, como vemos em sites ou lojas de música on-line. André Luiz Oliveira, da banda 8 Bit Instrumental49 concorda com a opinião dos compositores e fala da seguinte forma sobre a música que toca: “Quando digo que minha banda toca Video Game Music, estou me referindo ao repertório, mas o estilo é variado, vai de country a trash metal”. Para os jogadores entrevistados50 a opinião é a mesma, ou seja, para eles game music não é um estilo musical. 2.4 Importância da game music Segundo Murray (2003), nas décadas de 70 e 80 as pessoas viam os videogames como algo diabólico, porque eles adicionaram interatividade ao encantamento sensorial da visão, do som e do movimento. Muitos condenaram a estimulação fácil dos jogos, achavam que eram viciantes e que poderiam representar o abandono dos livros. Porém, essa visão “apocalíptica” acabou não se confirmando e atualmente os videogames estão ganhando cada vez mais relevância no universo audiovisual. Cursos, palestras, eventos, seminários e pesquisas já começam a analisar essa mídia como algo além de um “brinquedo para crianças”. Não podemos ignorar ou deixar de considerar todo o aprimoramento visual, sonoro e conceitual pelo qual os games vêm passando, conforme afirma Haeser (2005). Também não podemos 47 Ver Anexo A. 48 Entrevista com Duda Larson realizada por e-mail em 10 de setembro de 2009 (Anexo A). 49 Entrevista com André Luiz Oliveira, da banda 8 Bit Instrumental, realizada por e-mail em 29 de agosto de 2009 (Anexo B). 50 Entrevista com jogadores donos de sites e blogs de games realizada por e-mail (Anexo C).
  • 33. 32 desconsiderar o trabalho dos compositores e negar o efeito que as músicas têm nas nossas consciências. A trilha sonora é de extrema importância em um jogo e possui várias funções, de acordo com Collins (2008). Em games como Super Mario Bros. (Nintendo, 1985), por exemplo, é quase impossível jogar sem som, pois diversos sinais são dados ao longo do game através do áudio. Já os jogos de consoles portáteis, como o GameBoy, o Nintendo DS ou o PlayStation Portable não podem ter esse tipo de trilha, uma vez que se pressupõe que eles podem ser jogados sem som, em locais públicos, por exemplo (COLLINS, 2008). Para os jogadores entrevistados até é possível jogar um jogo sem som, mas a experiência seria desestimulante. Whalen (2004) traz dois termos da linguística para descrever duas funções-chave da VGMusic: metáfora e metonímia. A função metafórica é a que proporciona uma sensação de espaço, caracterização e atmosfera em um jogo. É a música de fundo ou que representa certo ambiente (dia ensolarado, caverna escura, etc). Já a função metonímica é a que mantém a estrutura sintática do jogo, obrigando o jogador a progredir na narrativa do jogo. Como exemplo, temos as músicas que sinalizam para o jogador quando o inimigo se aproxima. Analisando estas funções, podemos perceber que a trilha sonora dos videogames não serve mais apenas como “plano de fundo” de um game. Cada canção, cada efeito sonoro, está em seu lugar, cumprindo sua função de ambientar o jogo e tornar a experiência mais realista. Para os compositores entrevistados, a trilha sonora de um jogo não influencia diretamente em sua popularidade, mas é preciso que haja um equilíbrio com a jogabilidade para que ele possa ser considerado bom, logo, para que se torne popular. Acredito que a música desempenha um papel muito importante, mas para que seja notada e apreciada, os outros elementos que fazem um jogo, como a jogabilidade, programação e arte visual também devem funcionar. Dificilmente um jogo se tornará popular com a jogabilidade ruim, e dificilmente essa jogabilidade será boa com uma trilha chata, repetitiva ou mal implementada. É tudo uma questão de equilíbrio. (AZEVEDO (2009)51 ) Entre os jogadores entrevistados, que também são donos de sites e blogs de games52 , a opinião é a mesma, ou seja, se um jogo tem uma jogabilidade ruim, a trilha sonora não o salvará. Ela tem um papel importante, mas não definitivo, na popularidade do jogo. A música para videogames tem ganhado tanta importância que prêmios foram criados a fim de homenagear os músicos pela qualidade de suas composições nos videogames. O 51 Entrevista com Werther Azevedo realizada por e-mail em 4 de setembro de 2009 (Anexo A). 52 Ver Anexo C.
  • 34. 33 compositor do jogo Diablo (Blizzard, 1996), Matt Uelmen, por exemplo, foi vencedor do prêmio de excelência em áudio, concedido pela IGDA (International Game Developers Association) pelo seu trabalho no game citado. Também existe o G.A.N.G. Awards, criado pela G.A.N.G. (Game Audio Networking Guild), organização destinada a unir e ajudar os compositores de VGMusic através de capacitação, recursos para a educação, negócios, questões técnicas, publicidade e reconhecimento. Todo ano (em março) ela premia diversas categorias relacionadas à música e efeitos sonoros do mundo dos games como música do ano, sound design do ano, áudio do ano, melhor trilha interativa, melhor diálogo, melhor áudio cinematográfico, melhor gravação de performance ao vivo e outras. Ainda existem o Interactive Achievement Awards (categorias Outstanding Achievement in Original Music Composition, Outstanding Achievement in Soundtrack, e Outstanding Achievement in Sound Design); MTV Video Music Awards (categorias Best Video Game Soundtrack e Best Video Game Score), que só durou de 2004 a 2006; British Academy Video Games Awards (categorias variam com o ano. Neste ano teve Use of audio) e Game Developers Choice Awards (categoria Best Audio). 2.5 Imersão, interatividade e sensações Na época das radionovelas já podíamos perceber como o som, os ruídos e as vozes podiam levar os ouvintes a ambientes imaginários. Utilizando apenas o recurso do áudio, os produtores podiam fazer com que as pessoas imaginassem histórias, sentissem medo, suspense, alegria. O exemplo do que aconteceu com “A guerra dos mundos”, de Orson Welles, transmitido em 1938, ilustra bem como os sons podem causar todas essas sensações. A radionovela era uma adaptação da obra “A guerra dos mundos”, de H. G. Wells, que relata uma inesperada e violenta invasão da Terra pelos marcianos. A história foi relatada como se fosse uma reportagem real e milhões de americanos ficaram aterrorizados e entraram em pânico. No final, Welles explicou que tudo isso era apenas uma brincadeira de Halloween. Este exemplo ilustra como o som, quando traz grande carga de realismo, pode levar as pessoas a um estado de imersão onde acreditam e se identificam com algo muitas vezes irreal. No quesito imersão, a música para videogames funciona quase da mesma forma que nas radionovelas ou no cinema, quando se busca a identificação do espectador através da
  • 35. 34 emoção. O áudio funciona como forma de ambientar o espaço onde o avatar53 se encontra, além de ter a função de despertar os mais diferentes sentimentos no jogador, como medo, suspense, alegria, tristeza. Segundo Collins (2008), a imersão é o momento em que o jogador se identifica com o personagem, esquecendo temporariamente a fronteira que o separa do avatar. Ferreira (2008, p. 1) define da seguinte forma: “[...] entendemos por imersão a capacidade de um sistema (ou dispositivo) de trazer seus espectadores ou usuários para dentro da realidade (virtual) por ele construída (Cf. COUCHOT, 2003, p. 175); nas palavras de Couchot, para esta outra dimensão do real”. Murray (2003, p. 102) também traz sua contribuição: “A experiência de ser transportado para um lugar primorosamente simulado é prazerosa em si mesma, independentemente do conteúdo da fantasia. Referimo-nos a essa experiência como imersão”. Lucas Meneguette (2009)54 fala desse espaço envolvente que a música cria: Os portáteis - sejam celulares, sejam consoles de mão - são consumidos em todos os cantos da vida urbana: ônibus, metrô, sala de aula... A própria origem deles está relacionada com um aparato de ouvir música (os radinhos transistorizados da Sony, desde a década de 1960, o Walkman em 1970, o Discman em 1980, etc.), que pode ser carregado às ruas, formando um espaço próprio. O que é o jogo visual em meio a um metrô? A concentração necessária, o chacoalhar do espaço, as pessoas ali apertadas são fatores que dificultam a existência de um espaço fechado entre o jogador e seu aparato. A imersão no jogo é composta nesse fechamento espacial. Ora, mas o espaço visual é um espaço perspectivo, com ponto de fuga, unidirecional, e se é possível formar um espaço envolvente que circunde o jogador, é através de um adormecimento (ou esquecimento) do mundo, do entorno. Mas a música, o espaço sonoro, - diria Marshall McLuhan ou Murray Schafer - já se constitui em um espaço esférico, envolvente. Daí a popularidade do fone de ouvido e a facilidade de se jogar, em diversos espaços públicos, usando-se fones de ouvido - é a música e o som que constituem esse espaço que banha o jogador. Para Collins (2008), a imersão está relacionada mais ao áudio do que à tecnologia ou realismo do jogo. Segundo ela, três dos cinco games que estavam no topo do top 100 de 2006 eram jogos antigos, da era de 16 bits, pressupondo que não é a tecnologia ou o realismo que gera maior imersão. Murray (2003) cita como exemplo o jogo em CD-ROM Myst (Cian, 1993), afirmando que seu poder de imersão está relacionado ao som, que muda de acordo com cada área do jogo. A trilha sonora faz parte da técnica do jogo: ela fornece pistas de que estou clicando com o mouse na direção certa, como as dicas de frio e quente nas brincadeiras de caça ao tesouro. Mas o seu tom não é o de uma brincadeira. Pelo contrário, a 53 Em informática, avatar é a representação gráfica de um utilizador em realidade virtual. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Avatar_%28realidade_virtual%29>. Acesso em: 12 out. 2009. 54 Entrevista com Lucas Meneguette realizada por e-mail em 20 de agosto de 2009 (Anexo A).
  • 36. 35 solenidade da música reforça minha sensação de estar em contato direto com um terrível ato de perversidade. A música define minha experiência dentro daquela cena dramática, transformando uma simples descoberta num momento de revelação. (MURRAY, 2003, p. 63) Para os compositores e jogadores entrevistados, o áudio não possui toda essa responsabilidade em relação à imersão, apesar de seu papel ser muito importante. Para eles, o visual ainda tem muita força. Já a questão da interatividade, como afirma Assis (2006), é mais delicada e deve ser bem definida. De acordo com ele, há a interatividade trivial, onde os objetos que nos cercam reagem às nossas ações, e a segunda interatividade, que diz respeito aos programas que reagem de forma inusitada. “A interatividade dos videogames é aquela que permite exploração e surpresa e, ao mesmo tempo, é coerente e razoavelmente previsível” (ASSIS, 2006, p. 20). Devido à interatividade, o compositor de game music não sabe qual o momento exato em que a música deve transmitir alegria, tristeza, drama, etc. “Nesse caso, é preciso que o programa dê parâmetros que permitam modular andamento, volume, instrumentação ou mesmo trocar ou suprimir a seqüência musical programada para aquele ponto” (ASSIS, 2006, p.47). Entre os compositores entrevistados não há um consenso. Alguns acreditam que há essa dificuldade, outros pensam que não. No entanto, todos concordam que este é um desafio para o compositor e não um complicador, algo que não possa ser resolvido. Em alguns games podemos identificar o áudio dinâmico, composição sonora que varia dinamicamente, não é totalmente pré-determinada, segundo Lucas Meneguette. O resultado pode ser diferente de acordo com combinações ativadas algoritmicamente. O áudio dinâmico pode ser subdividido em interativo e adaptativo, conforme ele mesmo define: O barulho de passos, o estampido do tiro, ou a música que se modifica diretamente pela ação do jogador são elementos de áudio interativo. A trilha sonora que antecipa um evento iminente – como quando inimigos estão se aproximando –, ou que se modifica conforme os rearranjos do ambiente do jogo – por exemplo, que acompanha o anoitecer e o amanhecer –, está mais ligada ao áudio adaptativo. (MENEGUETTE, 2008b, p. 2) Durante a década de 90, alguns compositores e programadores de áudio tentaram criar sistemas de som interativo, onde o jogador atuaria diretamente sobre a música. Uma das primeiras tentativas de colocar esse tipo de áudio em games foi através da tecnologia iMUSE, (Interactive MUsic Streaming Engine, patenteado em 1994), desenvolvida pela LucasArts em 1991 e usada nos primeiros jogos de aventura e simuladores de vôo. A qualidade nas
  • 37. 36 composições trazida pelo MIDI foi ótima, porém ele trabalhava com uma sequência muito linear, ou seja, respondia mal aos eventos do jogo. O objetivo da criação do iMUSE foi justamente acabar com esses problemas. A tecnologia permitiu que a música mudasse de acordo com as decisões do jogador e os eventos do jogo. A Microsoft também testou algo parecido, com o sistema DirectMusic, um programa que serve somente para tocar músicas de fundo, no formato MIDI (MENEGUETTE, 2008). Alguns jogos para PlayStation permitem que o jogador troque o CD do jogo pelo CD de música. Porém, toda vez que os dados são carregados, é preciso colocar novamente o CD do jogo. O Xbox, por sua vez, permite que músicas de um CD sejam copiadas para uma memória interna. Assim, o jogador pode fazer sua própria trilha. Essa possibilidade é chamada de Custom Soundtrack e também está presente no Xbox 360, no PlayStation Portable e no Nintendo Wii. Outra questão importante é a das sensações causadas pela música nos games. Collins (2008), em seu estudo, traz uma entrevista com o compositor B. Scott Morton. Nela, o músico defende que o jogador precisa saber quando está em uma fase importante do jogo e isso deve ser mostrado através da música. Ele precisa sentir isso sem fazer esforço algum. O compositor afirma ainda que medo, antecipação e ansiedade são facilmente evocados pela cuidadosa colocação de sons ambientes em um jogo. Essas sensações causadas pela game music são as principais responsáveis pelo surgimento de bandas que fazem adaptações e comunidades virtuais de fãs de VGMusic. As 7 bandas entrevistadas, que tocam game music55 , afirmaram que escolheram estas músicas para tocar devido ao sentimento de nostalgia que elas causam. Durante um jogo, o jogador passa horas em frente à tela e em contato com a música, portanto, é natural que ele guarde na memória as canções que tocaram por um longo tempo ou que caracterizaram um momento emocionante do game. Para se ter uma ideia, os quatro jogadores entrevistados afirmaram que poderiam lembrar a música de algum jogo mesmo que ela estivesse fora dele. Isso gera uma identificação e admiração por parte do jogador, e é natural que ele queira levar esses sentimentos para outras mídias. No próximo capítulo veremos como surgiu o conceito de remix e em seguida como ele foi sendo incorporado pelos fãs de game music, dando início ao processo de autonomização desse tipo de música. 55 Entrevista com bandas e músicos que tocam game music ou chiptune, realizada por e-mail em 15 de setembro de 2009 (Anexo B).
  • 38. 37 3 PROCESSOS DE AUTONOMIZAÇÃO Nos últimos anos, os videogames se tornaram um objeto de estudo com aproximação à área de comunicação. Atualmente, essa mídia traz características da publicidade (anúncios dentro dos jogos), relações públicas (jogos de treinamento e capacitação usados na relação com os públicos) e jornalismo (sites e blogs especializados no “jornalismo de games”) e sua importância não pode ser ignorada, uma vez que os videogames estão inseridos em quase todas as mídias que utilizamos no século XXI. Já a música deixou de ser um simples complemento da imagem quando se percebeu que ela poderia agir no inconsciente do jogador e quando a preocupação com ela aumentou, por parte das produtoras, nos anos 80. O sucesso dessas canções resultou na venda delas à parte do jogo, como acontece há anos no Japão. As pessoas começaram a perceber que as músicas dos jogos podiam ser interessantes fora deles, como qualquer outra composição. Segundo Santaella (2004, p. 2), “Do mesmo modo que os games absorvem as linguagens de outras mídias, estas também passaram a incorporar recursos semióticos e estéticos que são próprios dos games”. Com o passar do tempo, a game music foi se tornando um produto cultural autônomo, saindo da esfera dos videogames e atingindo outras mídias, principalmente a internet. Bandas e fãs passaram a fazer versões para essas músicas, postando-as na rede de forma independente. Além disso, podemos ouvir parte das músicas originais dos jogos (ou os sons gerados pelos chips dos consoles) em trabalhos totalmente novos e originais, muitas vezes chamados de chiptune, nintendocore, bitpop, etc. Essas versões das músicas de videogame podem ser chamadas de remix, uma prática que já é bastante conhecida. De acordo com Lemos (2005), a noção de propriedade intelectual e de autor surgiu com o capitalismo e a imprensa no século XVIII. Com ela, os autores passaram a receber royalties56 para cederem seu direito de propriedade aos editores. Porém, em meados do século XX, esse sistema começou a decair, quando muitos artistas passaram a utilizar em suas obras materiais de outros artistas, fazendo recombinações. Dessa forma, os conceitos de obra, autor, autoria e propriedade entraram em crise, junto com a arte (LEMOS, 2005). Da mesma forma, Manovich (2002) também afirma que as novas mídias trouxeram 56 Refere-se a uma importância cobrada pelo proprietário de uma patente de produto, processo de produção, marca, entre outros, ou pelo autor de uma obra, para permitir seu uso ou comercialização. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Royalties>. Acesso em: 12 out. 2009.
  • 39. 38 novos modelos de autoria. Com a cibercultura surge o remix, definida por Lemos (2005) e Sá (2006) da seguinte maneira: Por remix compreendemos as possibilidades de apropriação, desvios e criação livre (que começam com a música, com os DJ‟s no hip hop e os Sound Systems) a partir de outros formatos, modalidades ou tecnologias, potencializados pelas características das ferramentas digitais e pela dinâmica da sociedade contemporânea. (LEMOS, 2005, p. 2) A prática do remix - ou da versão – populariza-se durante a disco music. Num primeiro momento, tratava-se de adequar uma música, às vezes um sucesso pop, por exemplo, à pista de dança. Desta forma, o DJ utilizava-se de seus conhecimentos técnicos para produzir uma versão que funcionasse na pista – seja estendendo o seu tamanho, seja ajustando a gravação aos sistemas sonoros das discotecas. Paulatinamente, o remix foi ganhando status de atividade criativa e a música original tornou-se pretexto para intervenções cada vez mais livres de DJs/produtores, alterando elementos tais como ritmo, textura, instrumentação e andamento ao ponto de tornar a música irreconhecível. (SÁ, 2006, p. 11) Lemos (2005) também nos mostra as três leis que estão na base do que chama de ciber-cultura-remix: liberação do pólo da emissão, princípio de conexão em rede e reconfiguração de formatos midiáticos e práticas sociais. No universo da game music encontramos o princípio da liberação do pólo da emissão quando vemos as pessoas produzindo informação, que antes era reprimida e editada pelos mass media. Assim, surgem sites e blogs dedicados aos games. Já a conexão em rede permitiu que muitos trabalhos de adaptação e remixes pudessem chegar a todos os cantos do planeta através da internet. Por último, a lei da reconfiguração pode ser associada às bandas que utilizam os sons originais dos jogos para criar novas músicas, como no caso do chiptune e outros, que veremos adiante. Para entender como funcionam esses processos de autonomização, trago o pensamento de De Certeau (1980 apud MANOVICH, 2008) a partir do qual ele desenvolve, de forma muito interessante, as relações de tensão entre os modos como, na sociedade, instauram-se estruturas estratégicas e, por outro lado, como os cidadãos apropriam-se dessas estruturas através de usos táticos. Segundo ele, as estratégias são criadas pelas instituições e estruturas de poder e definidas para toda a sociedade. Já as táticas, são as formas como os indivíduos negociam essas estratégias, ou seja, eles as adaptam de acordo com suas necessidades. De Certeau (1980 apud MANOVICH, 2008) ainda lembra que na sociedade moderna os objetos são produzidos em massa e as pessoas os utilizam de acordo com suas necessidades, construindo seus mundos e identidades baseados nesses objetos e utilizando diferentes táticas. Entre elas, como cita Manovich (2008), está o remix. Trazendo para o movimento de autonomização da VGMusic, poderíamos dizer que a indústria de games é quem traça as
  • 40. 39 estratégias, entendidas como os usos sugeridos por ela para os seus produtos, ou seja, sugere- se que os jogos sejam simplesmente jogados pelas pessoas e que as músicas sejam apenas ouvidas enquanto se joga o game. Porém, para estas estratégias existem também as táticas, que são os modos de apropriação que as pessoas fazem disso. Na maioria das vezes são orientadas e coincidem com essas estratégias da indústria de games (neste caso, a maioria das pessoas que consome jogos acaba apenas jogando e ouvindo a música enquanto joga, nada mais). Mas, em outros casos, as táticas são totalmente distintas e tomam formas inesperadas, como é o caso das pessoas que se apropriam dos jogos de forma a se aterem a um elemento (a música) e tornam isso um novo produto (ou um produto autônomo) distinto daquele que lhe deu origem. Na sociedade atual, a tendência é de que as novas e antigas mídias passem a interagir cada vez mais, com o mesmo conteúdo circulando por diversas delas, como vem acontecendo com a game music. Isso se chama convergência e é entendida por Jenkins (2008, p. 27) como “[...] fluxo de conteúdos através de múltiplos suportes midiáticos, à cooperação entre múltiplos mercados midiáticos e ao comportamento migratório dos públicos dos meios de comunicação”. Em seu estudo, o humanista fala desse movimento assim como da cultura participativa e da inteligência coletiva, como veremos mais adiante. Os estudos de convergência dificilmente citam os videogames como um suporte midiático ou analisam suas possibilidades, mas podemos perceber claramente que a VGMusic, antes restrita apenas ao seu suporte original (o videogame) está transitando em outros meios. Ela está presente na indústria fonográfica (através dos álbuns com músicas separadas dos jogos), na internet (através de sites e blogs), nos celulares (através dos ringtones), nos concertos de música clássica, nos shows de rock, nas rádios on-line e até mesmo na televisão. Para se ter uma ideia, em outubro deste ano, quando a Video Games Live se apresentou no Brasil, os programas da Rede Globo, Jornal Hoje e Mais Você, divulgaram os shows no país. Prova de que a música de videogames está alcançando espaços onde os próprios games ainda têm dificuldade em entrar. Ao longo dos anos, a música de videogames foi evoluindo. Podemos relacionar isso com o conceito de “exaptação”, citado por Johnson (1997), que, na biologia, são as aplicações novas dadas a algo que evoluiu por necessidade. Ou seja, um órgão que evoluiu para um fim pode ser convertido para outro fim. O autor afirma que o mundo virtual está repleto de “exaptações” e para isso cita como exemplo a web, que foi originalmente projetada como um sistema local de arquivos para a pesquisa acadêmica e que se tornou um poderoso meio de comunicação de massa. Relacionando com a game music, poderíamos dizer que a música, que
  • 41. 40 surgiu como uma necessidade nos games, ganhou novas aplicações, seja para servir como toque no celular ou como parte do repertório de uma orquestra. De Certeau (1997) analisa também, em outro estudo, como as coisas antigas ganharam importância em meio à cidade modernista que se tornou Paris. O antigo é visto com outros olhos, olhos curiosos. Dessa forma, imóveis novos ganharam aspecto envelhecido e rapidamente foram transformados em construções antiquadas. Segundo ele, renova-se mais do que se inova. Seguindo para os videogames, podemos perceber praticamente o mesmo raciocínio. Claro que atualmente existem mais criações originais do que novos arranjos em game music, mas, se analisarmos as novas versões de jogos como Super Mario Bros. (Nintendo, 1985), The Legend of Zelda (Nintendo, 1987) e Metroid (Nintendo, 1986), que tiveram músicas marcantes, veremos que várias das músicas antigas foram mantidas, porém, de forma renovada, como em Super Mario Galaxy (Nintendo, 2007), que traz novas versões para músicas dos primeiros jogos da série. Além disso, os temas antigos de videogames são os preferidos de bandas e orquestras que fazem versões. Nesse caso, a nostalgia fala mais alto. Quando fala em restauração, De Certeau (1997) afirma que, quando renovados, os objetos passam dos seus usuários habituais para uma nova clientela, que os utilizará para outros fins. Da mesma forma, a música de videogames, originalmente no jogo, é consumida pelos jogadores. Porém, quando é adaptada, remixada, ela se destina a outro público, que geralmente não foge muito do original, ainda são jogadores, mas jogadores que apreciam game music. Aí sim os usos também são os mais diversos, seja uma música adaptada para estilos como rock ou jazz, seja o toque no celular. É aí que entramos nos processos de autonomização da música de videogames. Bandas que fazem versões, orquestras que tocam game music, web-radios, sites, blogs e toques de celulares são algumas dessas adaptações que surgiram a partir de um elemento específico dos videogames: a música. Estes e outros processos de autonomização da VGMusic podem ser conferidos abaixo mais detalhadamente: 3.1 Venda de álbuns com músicas separadas dos jogos Em 1978 surgiu aquele que é considerado o primeiro álbum a ter música de videogame, o disco da Yellow Magic Orchestra (YMO), que continha a faixa Computer Game, com efeitos sonoros de Space Invaders (Taito, 1978).
  • 42. 41 Figura 7: Álbum da Yellow Magic Orchestra, primeiro a ter uma música de videogame - Fonte: <http://vgmdb.net/album/7778>. Acesso em: 20 maio 2009. Em 1984, a gravadora Yen lançou o primeiro álbum completo de game music. Ele trazia as faixas originais de vários jogos da Namco, como Pole Position (1982), Xevious (1982), Pac Man (1981), New Rally X (1981), entre outros. A estreia oficial do álbum aconteceu no mesmo ano, quando Haruomi Hosono, da Yellow Magic Orchestra, produziu uma coletânea de músicas dos games da Namco. Ele afirmou que era fã de Xevious. Dessa forma, foram lançados, em 25 de abril de 1984, uma fita cassete e um LP intitulados “Video Game Music”, com as músicas originais de Pac Man, Xevious, Mappy (1983), Bosconian (1981), Galaga (1981) e outros. Figura 8: Álbum Video Game Music, primeiro álbum de game music - Fonte: <http://vgmdb.net/album/3435>. Acesso em: 20 maio 2009.
  • 43. 42 Como sucessora da Yen, surgiu a Game Music Organization (GMO), em 1986. Tratava-se de um selo dedicado a lançar exclusivamente álbuns de game music. A explosão desse tipo de música se deu neste ano, com o lançamento de dezenas de álbuns contendo músicas originais, arranjadas e vocais de jogos da Namco, Konami, Nintendo, Hudson, Capcom, Tecmo, Enix, Imagineer, Falcom e Sega. A game music começava a ganhar ainda mais valor em 1998. Somente neste ano foram lançados mais de 700 álbuns de VGMusic no Japão. A partir deste levantamento histórico, verificamos que a venda de discos com músicas separadas dos jogos pode ser considerada uma iniciativa pioneira entre os processos de autonomização da game music. A prática teve início no Japão. Alguns álbuns possuíam novas versões, remixes e performances ao vivo. Entre os primeiros a se envolverem com o lançamento destes discos está Koichi Sugiyama, o compositor de várias trilhas famosas, entre elas a de Dragon Quest (Enix, 1986). Outro pioneiro foi Yuzo Koshiro, compositor das músicas do jogo Ys (Sega, 1988), que recebeu o título de um dos jogos que mais teve discos lançados. Assim como acontecia com as músicas de animes57 , esses álbuns com as músicas separadas dos games eram vendidos exclusivamente no Japão e fãs de outros países tinham que importar os produtos com empresas especializadas. Foi somente no final da década de 90 que alguns títulos começaram a ser lançados em outros países, como Estados Unidos e Inglaterra. No Brasil, os álbuns podem ser encontrados à venda na internet. O site bitpopshop58 é uma dessas lojas virtuais. A grande maioria dos produtos é importada de países como Estados Unidos, Japão e China. Em sites internacionais, como Sumthing Digital59 , Amazon60 e a loja do iTunes61 , também é possível adquirir estes CDs ou músicas digitais. Além deles, há o AnimeNation62 (muitas músicas de videogame e anime disponíveis para encomenda); CD 57 Nome usado para se referir a qualquer produto de animação (ou "desenhos animados") produzido no Japão. Fonte: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Anime>. Acesso em: 29 out. 2009. 58 <http://www.bitpopshop.com.br/vitrine.aspx> 59 <https://www.sumthingdigital.com/index.aspx> 60 <http://www.amazon.com/> 61 <http://www.apple.com/br/itunes/> 62 <http://www.animenation.com/>