1. 1. Terminou o apagão
fevereiro 12, 2011
Autor: Yoani Sánchez
Sentada nas poltronas de um hotel abro meu laptop, observo as piscadelas do emissor de WiFi e vejo o rosto sombrio dos
seguranças. Este poderia ser um dia a mais tentando entrar com um Proxy anônimo no meu próprio blog e burlando a
censura com alguns truques que me permitem provar do proibido. Na parte inferior da tela uma tarja anuncia que estou
navegando a 41 kilobytes por segundo. Ironizo com uma amiga e lhe advirto que prenda o cabelo para que tanta
“velocidade” não nos despenteie. Porém pouco me importa a banda estreita nesta tarde de fevereiro. Estou aqui para me
alegrar, não para me deprimir novamente com a maldita circunstância de uma Internet oprimida pelos filtros. Vim
comprovar se a longa noite da censura já não aferrolha Geração Y. Basta um clic e consigo entrar no portal que, desde
março de 2008, não vejo num lugar público. Surpreendo-me tanto que grito e a câmera que observa do teto grava as
obturações dos meus molares numa gargalhada incontrolável.
Depois de três anos meu espaço virtual volta a ser acessado dentro de Cuba.
Desconheço as razões para este desbloqueio, mesmo que possa especular que a celebração em Havana da Feira
Internacional de Informática 2011 haja trazido numerosos convidados estrangeiros frente aos quais é melhor passar uma
imagem de tolerância, de supostas aberturas no terreno da expressão cidadã. Também é possível que depois de haver
comprovado que bloquear um sítio só o torna mais atraente para os internautas, os policiais cibernéticos optaram por
exibir o fruto proibido que tanto satanizaram nos últimos meses. Se se trata de um acidente tecnológico que será corrigido,
novamente jogando sombras sobre meu diário virtual, então haverá tempo para denunciá-lo em voz alta. Porém por agora
faço planos sobre uma longa estadia entre nós das plataformas www.desdecuba.com e www.vocescubanas.com.
Esta é uma vitória cidadã sobre os demônios do controle. Arrebatamos-lhe o que nos pertence, essas praças virtuais que
são nossas, com as quais vão ter que aprender a conviver e que já não podem negar.
Traduzido por Humberto Sisley de Souza Neto
OBSERVAÇÃO: O site Geração Y é um blog criado por Yoani Sanchez; é talvez o blog mais visitado do mundo; a
própria Yoani ficou muito tempo sem acessá-lo;
2. A desastrada diplomacia de Lula
fevereiro 12, 2011
Autor: João Mellão Neto - Convidado
Aos 40 dias de governo, Dilma Rousseff tem dado seguidos sinais de que sua gestão não será uma continuação da
anterior. Nem poderia. Ela não teria como competir com Lula no seu principal quesito, que é o carisma. Ele tem uma
história de vida fascinante, à qual alia uma retórica arrebatadora. Dilma terá de compensar tudo isso firmando uma
imagem diferente. Em princípio – ao que parece – ela o fará primando pela racionalidade, pela firmeza e pela eficiência.
Isso tudo a levará a divergir de seu criador. Ao menos no que tange aos aspectos mais polêmicos e heterodoxos de sua
administração. Política exterior, por exemplo. Dilma já declarou que se vai contentar em defender valores universais, tais
como os direitos humanos. E, também, em respeitar e fazer que sejam respeitados todos os acordos e contratos que forem
estabelecidos com as demais nações.
Dilma não pretende seguir a espetaculosa diplomacia de Lula. Nos últimos oito anos, o nosso incansável ex-presidente
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perambulou e predicou pelo mundo inteiro. Agora já dá para fazer um balanço dos resultados.
2. Lula fez-se presente nas mais obscuras e desconhecidas nações da África. Oficialmente o fez para incrementar o nosso
comércio. Na prática, tudo o que conseguiu foi alimentar nossa curiosidade por geografia.
Como um pai generoso, mostrou-se condescendente com todas as diabruras de nossos vizinhos, aqui, da América Latina.
Triplicou o valor que o Brasil paga pela eletricidade do Paraguai, entregou refinarias brasileiras à Bolívia, defendeu
intransigentemente a Venezuela, exaltou o regime de Cuba e cedeu a todas as chantagens comerciais da Argentina. Tudo a
pretexto de manter uma política de boa vizinhança.
Comprou briga com os EUA a título de reafirmar a nossa autonomia, reconheceu a China como “economia de mercado”,
cortejou a França como “parceira estratégica”, irritou tanto árabes como israelenses ao tentar intermediar os seus conflitos
e se indispôs com o resto do mundo ao dar legitimidade ao regime vira-latas de Ahmadinejad, no Irã.
Fez tudo isso com o manifesto objetivo de conseguir para nós uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da
ONU. E também, segundo ele, para fazer brilhar a imagem do Brasil no exterior. Quais foram os resultados? Vamos lá.
Os países africanos receberam Lula com grandes festas, e não passou disso. No que diz respeito ao comércio, eles não têm
dinheiro para comprar nada da gente e nós não temos interesse em comprar nada deles. Fazer um intercâmbio de
coqueiros talvez funcione.
Aqui, na América Latina, a imagem do Brasil é a de um grande e balofo cão São Bernardo que, na ânsia de agradar, faz
papel de bobo perante os seus coleguinhas menores. A tão almejada “liderança natural” do Brasil no subcontinente, assim,
ainda está muito longe de ser alcançada.
Ao contrário. Na Unasul e no Foro de São Paulo quem dá as cartas é Hugo Chávez, que, aliás, se valeu da vaidade e da
boa-fé de Lula para nos pôr em situações difíceis. Foi ele que instigou Evo Morales, da Bolívia, a nacionalizar as
empresas brasileiras e também transformou a nossa embaixada em Honduras em casa de repouso do ex-presidente de lá.
Lula dispôs-se até a enviar tropas brasileiras para garantir a paz no Haiti. Nossos soldados estão nesse país até hoje. E já
faz mais de seis anos. Ninguém sabe quando e como sairemos de lá. Que benefício este gesto de generosidade nos trouxe?
Nenhum. Quando ocorreu algo realmente sério – um terremoto -, os norte-americanos trataram de desembarcar por lá e
resolver o problema sozinhos. Não confiaram nos nossos pracinhas para nada.
A propósito dos EUA, os nossos gestos de hostilidade a eles serviram apenas para reafirmar a nossa pretensa autonomia
terceiro-mundista. Em termos comerciais e políticos, foi um verdadeiro desastre. Logo que assumiu a presidência, Barack
Obama cuidou de afirmar, em público, que Lula era “o cara”. O nosso presidente levou a gentileza ao pé da letra,
acreditou que era realmente um sujeito “especial”, e passou a esnobar o colega e o seu país.
Não que os norte-americanos tenham ficado muito sentidos com isso. Apenas o Departamento de Estado riscou o Brasil
do mapa e, em consequência, nós perdemos uma chance histórica de vender etanol a eles. Obama já tinha declarado a sua
intenção de buscar, em curto prazo, fontes “limpas” de combustível.
Quanto aos outros dois países ricos que Lula cultivou, ocorreu o seguinte: a China aproveitou o status de economia de
mercado que o Brasil lhe concedeu para nos entupir de bugigangas fabricadas por lá. E nós não podemos mais levantar
nenhuma barreira contra isso. Já quanto à França, a simpatia dela nos custou a promessa de lhes comprarmos três dezenas
de aviões de combate.
Agora, a obra-prima da desastrada diplomacia lulista foi a inconsequente tentativa de intermediar um acordo em torno do
programa nuclear iraniano. Será que o nosso ex-presidente estava tão cheio de si a ponto de acreditar – como ele mesmo
declarou em público – que estava “conseguindo, em 24 horas, o que os americanos não obtiveram em 20 anos”?
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3. O que o Brasil conseguiu, de fato, foi atrapalhar a negociação internacional de sanções contra o Irã. O mundo zangou-se
por causa da nossa intromissão e o Brasil ficou com a fama de “parceiro não confiável”.
Até os países africanos – que Lula tanto cultivou – votaram contra a proposta brasileira na ONU. E nós contávamos com o
apoio deles… Com tudo isso, o tão almejado assento permanente no Conselho de Segurança ficou ainda mais distante.
Pensando bem, será que valeu a pena?
Fonte: O Estado de S. Paulo, 11/02/2011
3. Israel se inquieta
fevereiro 11, 2011
Autor: Merval Pereira
A situação no Egito está evoluindo bem, já há consenso para reformar a Constituição, dando-lhe uma feição mais liberal, e
as negociações estão sendo encaminhadas sem a presença do ditador Hosni Mubarak. Ele continua na presidência, mas
afastado das negociações, sem poder real, que está sendo exercido pelo vice-presidente Omar Suleiman, que negocia com
as oposições, inclusive com a Irmandade Muçulmana.
O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, está convencido de que “nunca mais” o Egito será igual depois do que
está acontecendo nesses últimos dias, e ele tem razão, embora não se possa dizer ainda o que acontecerá com o país ao
final das negociações e da transição para um futuro governo.
Tudo indica que se chegou à conclusão de que não será possível retirar Hosni Mubarak da presidência, e optou-se por
prosseguir nas negociações para a transição com o ditador afastado delas, mas ainda no poder. Com condições, por
exemplo, de reunir o ministério e dar um aumento para os funcionários públicos.
A manutenção de Mubarak, que o governo dos Estados Unidos não queria inicialmente, serve, sobretudo, para acalmar
Israel, o maior aliado dos Estados Unidos na região.
A onda de reivindicações, que a secretária de Estado dos Estados Unidos, Hillary Clinton, já classificou como de uma
“tempestade perfeita”, continua varrendo a região.
Mesmo com a promessa de levantar o estado de emergência, em vigor há 19 anos, de flexibilizar a legislação para ampliar
as liberdades democráticas, e de criar novos empregos, o presidente da Argélia não consegue conter o ímpeto das ruas, e
já há uma manifestação sendo anunciada para o próximo sábado.
Além do anseio por mais liberdade, e a capacidade de mobilização facilitada pelo uso dos novos meios tecnológicos de
relacionamento pela internet, como o Facebook e o Twitter, há questões práticas também em jogo naquela região.
O desemprego está muito alto em países que, como o Egito, têm a maioria da população em idade de procurar emprego, e
a inflação permanece comendo o já baixo salário dos cidadãos.
Por isso os governos acenam com aumentos salariais e promessas de mais empregos, mas nem mesmo com a
concretização dessas promessas poderá haver um pouco mais de ordem nas ruas.
Tudo indica que essa onda de reivindicações não cessará tão simplesmente, e o resultado natural será uma renovação de
governos.
A grande dúvida é se estas mudanças, que atingem principalmente as chamadas “ditaduras amigas” dos Estados Unidos e
do mundo ocidental de maneira geral, levarão a governos democráticos ou se haverá, como alguns temem, a uma onda de
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4. governos de radicais islâmicos. Este é o grande receio dos que apostam em uma onda democrática na região, como o
presidente dos Estados Unidos, Barack Obama.
Segundo fontes israelenses, é indiferente o tipo de governo que vier a se instalar no Egito, isto seria “questão interna” do
povo egípcio, embora muitas nações dependam do petróleo que passa pelo Canal de Suez e da posição estratégica egípcia
no norte da África.
O que preocupa realmente o governo de Israel é a manutenção do acordo de paz com o Egito. Eles ressaltam que desde
1979, quando foi assinado por Sadat e Begin, o acordo jamais foi “arranhado” e o governo egípcio tem tido papel
fundamental de intermediário nas negociações entre israelenses e palestinos.
O governo israelense não engole a definição de “moderada” da Irmandade Muçulmana e lembra que ela sempre se
colocou contra o acordo de paz, e, segundo a mesma fonte, “jamais reconheceu os legítimos direitos à existência de Israel,
tendo inclusive planejado uma vingança e executado o assassinato de Sadat em praça pública durante parada militar, em
1981”.
Apesar disso, o Egito continuou cumprindo fielmente todos os itens do acordo original. Em troca recebeu o Sinai de volta,
áreas petrolíferas e ganhou um parceiro estratégico e comercial de relevância.
O que mais importa para Israel é a tranqüilidade de mais de três décadas na fronteira com o maior e mais poderoso pais
árabe do mundo.
Em conseqüência desse relacionamento, egípcios visitam Israel desde 1979, enquanto os israelenses “invadem” a
maravilhosa cidade balneária de Sharm al Sheik — local onde Hosni Mubarak tem uma casa e onde deseja terminar seus
dias —, além de intenso comércio bilateral.
As duas embaixadas ainda funcionam normalmente. O entendimento do governo israelense é de que, se o Egito cair nas
mãos do fundamentalismo islâmico liderado pela Irmandade Muçulmana, como aconteceu com o Irã após a queda do Xá e
o advento dos Aiatolás, todo o mundo árabe, aliado do Ocidente, estará em gravíssimo risco de ebulição.
O Hamas em Gaza recebe apoio da Irmandade e qualquer ascensão deste grupo ao governo do Egito significaria uma
grave derrota para os palestinos do Fatah na Cisjordânia, e um profundo golpe na liderança de Mahmoud Abbas, que,
juntamente com Ehud Olmert, primeiro-ministro de Israel, desenhou uma proposta de paz em 2008 que é o único plano
existente com a possibilidade de ser retomado para discussões.
Fonte: O Globo, 08/02/2011
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Nele discuto política, cultura, economia e analiso imagens.
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