SlideShare uma empresa Scribd logo
1 de 1
Baixar para ler offline
Opinião | 
[ 5 5 ] 
Lutar contra 
a Espionagem Económica 
Isabel Santos – Formadora em ‘Competitive Intelligence’ 
O ano passado, em Junho de 2006, o FBI deteve três pessoas na 
cidade da Atlanta, EUA, sob suspeita de terem roubado segre-dos 
comerciais à multinacional Coca Cola (no caso, informação 
sobre produtos em desenvolvimento), e tentado vendê-los à sua 
concorrente, Pepsi, por mais de 1,5 milhões de dólares. 
Os três suspeitos foram apanhados in flagrante no âmbito de 
uma operação levada a cabo pela agência de investigação ame-ricana, 
no aeroporto daquela cidade, operação na qual alguns 
agentes se fizeram passar por ‘potenciais clientes’ interessados 
na informação roubada. O crime – agora a ser tratado no cir-cuito 
da justiça – ocorreu sem o conhecimento e envolvimento 
das duas empresas que, tanto quanto se sabe, cooperaram com 
as autoridades policiais na operação que pôs a descoberto os três 
suspeitos. Embora anulada com sucesso, o facto é que esta tenta-tiva 
de roubo, colocou em alerta máximo a equipa de gestão das 
duas organizações, levando Neville Isdell, CEO da Coca Cola, a 
afirmar: “Teremos de rever a nossa política de segurança”. 
Este caso revela apenas um dos muitos rostos da espionagem 
económica e ocorreu numa das economias mais competiti-vas 
do mundo, aquela onde, com alguma frequência, outros 
episódios deste tipo são relatados, analisados e estudados em 
contexto académico, empresarial, ou no âmbito das politicas 
nacionais de segurança e ‘intelligence’. 
Contudo, a Espionagem Económica não é hoje, como se sabe, 
um fenómeno localizado. É, na verdade, uma realidade trans-nacional 
como os próprios fluxos económicos, como a infor-mação, 
os recursos humanos, de capital, etc.. 
Podemos recuar séculos na História da Humanidade para ten-tar 
identificar episódios avulso, alguns talvez algo anedóticos, 
onde este tipo de espionagem foi levada a cabo por indivíduos, 
grupos organizados mais ou menos informais, ou com o apoio 
mais ou menos velado de governos e autoridades públicas. 
Parece no entanto que, enquanto fenómeno à escala multina-cional, 
a Espionagem Económica é uma realidade muito mais 
recente. Jeffrey Wright (1991)1, designadamente, afirma que, 
com o fim da Guerra Fria e o avanço da globalização, a com-petição 
entre as economias dos países transferiu-se em grande 
parte para o mercado. Criou-se assim um terreno fértil para que 
a espionagem económica emergisse como um ‘braço bélico’ e se 
tornasse uma preocupação a nível interno, quer das empresas, 
quer dos poderes públicos e dos seus respectivos países. 
É nessa escala global que se pode explicar a existência de gran-des 
sistemas tecnológicos de recolha e análise de informação, 
como é o caso do Echelon (falaremos sobre ele noutra opor-tunidade) 
que, enquanto tal, parece representar o esforço con-certado 
de algumas nações para potenciarem o seu nível de 
conhecimento não só sobre o poder militar, mas também sobre 
o nível de competitividade económica de outros países, consi-derados 
seus concorrentes no mercado global. 
Numa definição muito simples, podemos dizer que a Espiona-gem 
Económica é o roubo de riqueza em forma de informação. 
A única maneira de as organizações se precaverem contra essa 
ameaça é através de uma atitude proactiva, que implique, como 
medida central, gerirem de forma estratégica a informação so-bre 
o ambiente competitivo. Esse processo tem um nome: cha-ma- 
se Competitive Intelligence ou Inteligência Competitiva. 
A Competitive Intelligence traz enormes vantagens para as or-ganizações: 
a Inovação e a Segurança são duas delas. Não é, 
obrigatoriamente, um processo dispendioso. Pelo contrário, 
é acessível e adaptável a todas as organizações independen-temente 
da sua dimensão. Mas é, sem dúvida, uma tarefa que 
exige trabalho e empenhamento. 
É que não tenhamos ilusões: no mercado, estamos todos em 
guerra. E a luta não é na base do ‘olho por olho, dente por den-te’ 
mas na base da ‘quota por quota, cliente por cliente’. 
Comentários, críticas e sugestões para: 
santosintelligence@gmail.com 
hhhhhhhhhhhhhhh pppppppppppppppp 
p 
1 “Intelligence and Economic Security”. In Essays on Strategy. C. L. National Defense Uni-versity 
Press. 
REVISTA EXPORTAR. ICEP - Maio 2007

Mais conteúdo relacionado

Semelhante a Espionagem económca e competitive intelligence

Curso de Segurança do Conhecimento Empresarial - Contra Espionagem
Curso  de Segurança do Conhecimento Empresarial - Contra EspionagemCurso  de Segurança do Conhecimento Empresarial - Contra Espionagem
Curso de Segurança do Conhecimento Empresarial - Contra EspionagemMilton R. Almeida
 
Pegadas hídricas água, o precioso líquido do presente e do futuro
Pegadas hídricas   água, o precioso líquido do presente e do futuroPegadas hídricas   água, o precioso líquido do presente e do futuro
Pegadas hídricas água, o precioso líquido do presente e do futuroUniversidade Federal Fluminense
 
Revista Opinião.Seg - Edição 10 - Maio de 2015
Revista Opinião.Seg - Edição 10 - Maio de 2015Revista Opinião.Seg - Edição 10 - Maio de 2015
Revista Opinião.Seg - Edição 10 - Maio de 2015Editora Roncarati
 
Revista Fenacon 157 - entrevista de Roberto Dias Duarte
Revista Fenacon 157 - entrevista de Roberto Dias DuarteRevista Fenacon 157 - entrevista de Roberto Dias Duarte
Revista Fenacon 157 - entrevista de Roberto Dias DuarteRoberto Dias Duarte
 
A espionagem e a politica de defesa
A espionagem e a politica de defesaA espionagem e a politica de defesa
A espionagem e a politica de defesaCIRINEU COSTA
 

Semelhante a Espionagem económca e competitive intelligence (7)

Entrevista_CH308
Entrevista_CH308Entrevista_CH308
Entrevista_CH308
 
Curso de Segurança do Conhecimento Empresarial - Contra Espionagem
Curso  de Segurança do Conhecimento Empresarial - Contra EspionagemCurso  de Segurança do Conhecimento Empresarial - Contra Espionagem
Curso de Segurança do Conhecimento Empresarial - Contra Espionagem
 
Pegadas hídricas água, o precioso líquido do presente e do futuro
Pegadas hídricas   água, o precioso líquido do presente e do futuroPegadas hídricas   água, o precioso líquido do presente e do futuro
Pegadas hídricas água, o precioso líquido do presente e do futuro
 
Revista Opinião.Seg - Edição 10 - Maio de 2015
Revista Opinião.Seg - Edição 10 - Maio de 2015Revista Opinião.Seg - Edição 10 - Maio de 2015
Revista Opinião.Seg - Edição 10 - Maio de 2015
 
Revista Fenacon 157 - entrevista de Roberto Dias Duarte
Revista Fenacon 157 - entrevista de Roberto Dias DuarteRevista Fenacon 157 - entrevista de Roberto Dias Duarte
Revista Fenacon 157 - entrevista de Roberto Dias Duarte
 
O que é Inteligência?
O que é Inteligência?O que é Inteligência?
O que é Inteligência?
 
A espionagem e a politica de defesa
A espionagem e a politica de defesaA espionagem e a politica de defesa
A espionagem e a politica de defesa
 

Espionagem económca e competitive intelligence

  • 1. Opinião | [ 5 5 ] Lutar contra a Espionagem Económica Isabel Santos – Formadora em ‘Competitive Intelligence’ O ano passado, em Junho de 2006, o FBI deteve três pessoas na cidade da Atlanta, EUA, sob suspeita de terem roubado segre-dos comerciais à multinacional Coca Cola (no caso, informação sobre produtos em desenvolvimento), e tentado vendê-los à sua concorrente, Pepsi, por mais de 1,5 milhões de dólares. Os três suspeitos foram apanhados in flagrante no âmbito de uma operação levada a cabo pela agência de investigação ame-ricana, no aeroporto daquela cidade, operação na qual alguns agentes se fizeram passar por ‘potenciais clientes’ interessados na informação roubada. O crime – agora a ser tratado no cir-cuito da justiça – ocorreu sem o conhecimento e envolvimento das duas empresas que, tanto quanto se sabe, cooperaram com as autoridades policiais na operação que pôs a descoberto os três suspeitos. Embora anulada com sucesso, o facto é que esta tenta-tiva de roubo, colocou em alerta máximo a equipa de gestão das duas organizações, levando Neville Isdell, CEO da Coca Cola, a afirmar: “Teremos de rever a nossa política de segurança”. Este caso revela apenas um dos muitos rostos da espionagem económica e ocorreu numa das economias mais competiti-vas do mundo, aquela onde, com alguma frequência, outros episódios deste tipo são relatados, analisados e estudados em contexto académico, empresarial, ou no âmbito das politicas nacionais de segurança e ‘intelligence’. Contudo, a Espionagem Económica não é hoje, como se sabe, um fenómeno localizado. É, na verdade, uma realidade trans-nacional como os próprios fluxos económicos, como a infor-mação, os recursos humanos, de capital, etc.. Podemos recuar séculos na História da Humanidade para ten-tar identificar episódios avulso, alguns talvez algo anedóticos, onde este tipo de espionagem foi levada a cabo por indivíduos, grupos organizados mais ou menos informais, ou com o apoio mais ou menos velado de governos e autoridades públicas. Parece no entanto que, enquanto fenómeno à escala multina-cional, a Espionagem Económica é uma realidade muito mais recente. Jeffrey Wright (1991)1, designadamente, afirma que, com o fim da Guerra Fria e o avanço da globalização, a com-petição entre as economias dos países transferiu-se em grande parte para o mercado. Criou-se assim um terreno fértil para que a espionagem económica emergisse como um ‘braço bélico’ e se tornasse uma preocupação a nível interno, quer das empresas, quer dos poderes públicos e dos seus respectivos países. É nessa escala global que se pode explicar a existência de gran-des sistemas tecnológicos de recolha e análise de informação, como é o caso do Echelon (falaremos sobre ele noutra opor-tunidade) que, enquanto tal, parece representar o esforço con-certado de algumas nações para potenciarem o seu nível de conhecimento não só sobre o poder militar, mas também sobre o nível de competitividade económica de outros países, consi-derados seus concorrentes no mercado global. Numa definição muito simples, podemos dizer que a Espiona-gem Económica é o roubo de riqueza em forma de informação. A única maneira de as organizações se precaverem contra essa ameaça é através de uma atitude proactiva, que implique, como medida central, gerirem de forma estratégica a informação so-bre o ambiente competitivo. Esse processo tem um nome: cha-ma- se Competitive Intelligence ou Inteligência Competitiva. A Competitive Intelligence traz enormes vantagens para as or-ganizações: a Inovação e a Segurança são duas delas. Não é, obrigatoriamente, um processo dispendioso. Pelo contrário, é acessível e adaptável a todas as organizações independen-temente da sua dimensão. Mas é, sem dúvida, uma tarefa que exige trabalho e empenhamento. É que não tenhamos ilusões: no mercado, estamos todos em guerra. E a luta não é na base do ‘olho por olho, dente por den-te’ mas na base da ‘quota por quota, cliente por cliente’. Comentários, críticas e sugestões para: santosintelligence@gmail.com hhhhhhhhhhhhhhh pppppppppppppppp p 1 “Intelligence and Economic Security”. In Essays on Strategy. C. L. National Defense Uni-versity Press. REVISTA EXPORTAR. ICEP - Maio 2007