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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL
FACULDADE DE COMUNICAÇÃO SOCIAL
DEPARTAMENTO DE PUBLICIDADE E PROPAGANDA
KARLA SANCHES WÜNSCH
A IMAGEM DO ROCK DOS ANOS 2000
Porto Alegre
2013
1
KARLA SANCHES WÜNSCH
A IMAGEM DO ROCK DOS ANOS 2000
Trabalho de conclusão de curso de graduação apresentado à Faculdade de
Comunicação Social da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do
Sul, como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em
Comunicação Social, habilitação em Publicidade e Propaganda.
Orientador: Prof. Me. Ticiano Paulo
Porto Alegre
2013
2
KARLA SANCHES WÜNSCH
A IMAGEM DO ROCK DOS ANOS 2000
Trabalho de conclusão de curso de graduação apresentado à Faculdade de
Comunicação Social da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do
Sul, como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em
Comunicação Social, habilitação em Jornalismo.
Aprovada em: ____de__________________de________.
BANCA EXAMINADORA:
______________________________________________
Dr. André Fagundes Pase
______________________________________________
Dr. Roberto Tietzmann
_____________________________________________
Orientador: Prof. Me. Ticiano Paulo
Porto Alegre
2013
3
AGRADECIMENTOS
Ao professor e Me. Ticiano Paludo pelos ensinamentos e pelas conversas
inspiradoras ao longo da orientação desse trabalho. Assim como todos professores
e funcionários da Faculdade de Comunicação Social da PUCRS.
Aos amigos, que sabem que o são e que sempre estiveram ao meu lado dando
sentido e interessância a faculdade e a vida: Fagner Deport, Giovani Giordani,
Luciana Negretto, Thiago Padilha, Gabriela Lunardi, Mariana Lopes e Thuanny
Baretta. A minha metade desde que eu também era pequena, Cristiane Moro.
Ao Paul Friedlander, autor de suma importância para esse trabalho, que com
seu livro Rock and Roll: Uma história social deu os rumos inicias da pesquisa. Ao
Marcelo Valadão, por ter me dado este livro, mas também por todo apoio e amor ao
longo do processo.
A Cristiane Lisbôa e Tomás Bello pela paciência e pelas risadas que muito me
ensinaram sobre música e escrita, dentro e fora da Revista Noize.
À letra “K” do meu nome, por sempre me lembrar da importância do senso
crítico e da luta por um mundo melhor e mais justo.
Ao colo de toda família, sempre junta, sempre a melhor.
Especialmente dedico esse trabalho aos meus maiores exemplos: Dolores,
Paulo e Marina. À vocês três o meu maior e mais grato amor.
4
A sabedoria está na verdade, e não em sua aparência. Não se pode
recordar com memória alheia. Os homens registrarão, mas não recordarão.
Repetirão, mas não viverão. Serão informados, mas não saberão.
(GALEANO, 2008, p.15)
5
RESUMO
Ao longo de seis décadas de história, o rock passou por diversas
transformações, que agregaram novas características e derivações do gênero,
tornando-o múltiplo em termos musicais, mas único em sua essência. O presente
trabalho busca estudar a imagem do rock nos anos 2000, com o intuito de
compreender se existe um desvirtuamento do estilo nessa época ou se os
elementos da gênese do rock ainda se fazem presentes no chamados "anos 2000"
(período que compreende os anos de 2000 a 2009). Para tanto, primeiro faremos um
levantamento bibliográfico que aborda a história do rock, desde sua origem até a
atualidade; depois, através da coleta de imagens das fotos de divulgação das
bandas Arctic Monkeys, The Libertines e The Strokes, representantes do rock nos
anos 2000, faremos uma análise comparativa entre elas e demais imagens
promocionais de bandas do gênero de outros períodos, verificando o que se mantém
e o que se altera na proposta visual. Ao final, será possível constatar que existem
elementos base que seguem quase imutáveis desde a gênese do rock até os anos
2000.
Palavras-chave: rock, imagem, anos 2000, identidade, rebeldia.
6
ABSTRACT
Over the course of six decades, there has been many changes in rock
music, which brought with them new characteristics and created derivations from the
genre, rendering it multiple in musical terms, but unique in its essence. This text will
study the image of rock in the 2000s, with the intent of discovering if there exists a
misrepresentation of this particular musical style or if its core elements were still
present in the last decade (a period that ranges from 2000 to 2009). To make this
possible, we will first do a bibliographic research concerning the history of rock, from
its origins till the present days; afterwards, having collected promotional visual
material from rock bands Arctic Monkeys, The Libertines and The Strokes, key
figures of the 2000 scene, we will do a comparative analysis between them and other
bands' promotional material, from a broad range of periods, in order to spot which
elements remain unchanged and which are altered in the visual identity. Finally, this
will allow us to ascertain which elements of rock music remain unalterable since its
origin till the 2000s.
Key-words: rock, image, 2000s, identity, rebellion
7
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Bill Haley and his Comets em performance ao vivo .........................16
Figura 2 - A imagem marcante do ator James Dean ........................................17
Figura 3 - O ritmo do Chuck Berry ....................................................................18
Figura 4 - Reprodução de cena do clipe de “Jailhouse Rock”, de Elvis Presley
..........................................................................................................................20
Figura 5 - O início dos Beatles: otimismo e ingenuidade ..................................23
Figura 6 - Capa do álbum Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band ..................25
Figura 7 - The Rolling Stones: ritmos negros e sensualidade...........................26
Figura 8 - The Who: apresentação vibrante......................................................27
Figura 9 - Robert Plant e Jimmy Page, do Led Zeppelin ..................................31
Figura 10 - A extravagância do New York Dolls................................................32
Figura 11 - Os Sex Pistols: música e atitude ....................................................34
Figura 12 - The Cure: o lado sombrio do punk .................................................35
Figura 13 - Joy Division e a melancolia do punk...............................................36
Figura 14 - Chesterfield Kings nos anos 1980: revivendo os anos 1960 ..........37
Figura 15 - The Fuzztones................................................................................38
Figura 16 - Composição de reproduções do videoclipe Reptilla, da banda ......45
Figura 17 - O estilo do The Strokes ..................................................................52
Figura 18 - Atitude junkie do Libertines.............................................................54
Figura 19 - Os mocinhos do Arctic Mokeys ......................................................55
Figura 20 - The Strokes ....................................................................................57
Figura 21 - The Strokes ....................................................................................57
Figura 22 - The Libertines.................................................................................58
Figura 23 - The Libertines.................................................................................58
Figura 24 - Arctic Monkeys ...............................................................................59
Figura 25 - Arctic Monkeys ...............................................................................59
Figura 26 - The Beatles ....................................................................................60
Figura 27 - The Rolling Stones .........................................................................60
Figura 28 - The Rolling Stones .........................................................................61
Figura 29 - The Libertines.................................................................................62
Figura 30 - The Strokes ....................................................................................62
Figura 31 - Arctic Monkeys ...............................................................................63
8
Figura 32 - The Rolling Stones .........................................................................64
Figura 33 - The Rolling Stones .........................................................................64
Figura 34 - The Rolling Stones .........................................................................65
Figura 35 - The Strokes ....................................................................................66
Figura 36 - The Strokes ....................................................................................66
Figura 37 - The Libertines.................................................................................67
Figura 38 - The Libertines.................................................................................67
Figura 39 - Arctic Monkeys ...............................................................................68
Figura 40 - Arctic Monkeys ...............................................................................69
Figura 41- Joy Division .....................................................................................70
Figura 42 - Joy Division ....................................................................................70
Figura 43 - The Strokes ....................................................................................71
Figura 44 - The Strokes ....................................................................................72
Figura 45 - The Libertines.................................................................................72
Figura 46 - The Libertines.................................................................................73
Figura 47 - Arctic Monkeys ...............................................................................73
Figura 48 - Arctic Monkeys ...............................................................................74
Figura 49 - The Cure.........................................................................................75
Figura 50 - The Cure.........................................................................................76
Figura 51- The Libertines..................................................................................77
Figura 52 - The Libertines.................................................................................77
Figura 53 - New York Dolls ...............................................................................78
Figura 54 - The Cure.........................................................................................78
Figura 55 - Arctic Monkeys ...............................................................................79
Figura 56 - Arctic Monkeys ...............................................................................79
Figura 57 - The Strokes ....................................................................................80
Figura 58 - The Strokes ....................................................................................81
Figura 59 - The Libertines.................................................................................82
Figura 60 - The Libertines.................................................................................83
Figura 61 - Arctic Monkeys ...............................................................................83
Figura 62 - Arctic Monkeys ...............................................................................84
Figura 63- The Beatles .....................................................................................85
Figura 64 - The Rolling Stones .........................................................................86
Figura 65 - Joy Division ....................................................................................86
9
Figura 66 - Ramones ........................................................................................87
Figura 67 - Sex Pistols......................................................................................88
Figura 68 - The Strokes ....................................................................................89
Figura 69 - The Strokes ....................................................................................90
Figura 70 - The Libertines.................................................................................90
Figura 71 - The Libertines.................................................................................91
Figura 72 - Arctic Monkeys ...............................................................................91
Figura 73 - Arctic Monkeys ...............................................................................92
Figura 74 - The Rolling Stones .........................................................................93
Figura 75 - The Kinks........................................................................................94
Figura 76 - The Kinks........................................................................................94
Figura 77 - The Cure.........................................................................................95
Figura 78 - The Strokes ....................................................................................96
Figura 79 - The Strokes ....................................................................................96
Figura 80 - The Libertines.................................................................................97
Figura 81 - The Libertines.................................................................................97
Figura 82 - Arctic Monkeys ...............................................................................98
Figura 83 - Arctic Monkeys ...............................................................................98
Figura 84 - The Beatles ....................................................................................99
Figura 85 - The Beatles ....................................................................................99
Figura 86 - The Strokes ..................................................................................100
Figura 87 - The Strokes ..................................................................................101
Figura 88 - The Libertines...............................................................................101
Figura 89 - The Libertines...............................................................................102
Figura 90 - Arctic Monkeys .............................................................................103
Figura 91 - Arctic Monkeys .............................................................................103
Figura 92 - Led Zeppelin.................................................................................104
Figura 93 - Led Zeppelin.................................................................................104
Figura 94 - Ramones ......................................................................................105
10
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO............................. ..........................................................................11
2 A GÊNESE DO ROCK............................................................................................13
2.1 AS RAÍZES DO ROCK AND ROLL.....................................................................13
2.2 A EXPLOSÃO DO ROCK AND ROLL CLÁSSICO NOS ESTADO UNIDOS (1945-
1955).........................................................................................................................14
2.3 A INVASÃO BRITÂNICA (1963-1964) ................................................................21
2.4 OS SOLOS DE GUITARRA (1966-1970)............................................................29
2.5 A TERCEIRA EXPLOSÃO DO ROCK (1969-1978) ............................................30
2.6 GLAM ROCK E PUNK ROCK (ANOS 1970).......................................................32
2.7 PÓS-PUNK (1977-1980) .....................................................................................34
2.8 GARAGE ROCK REVIVAL (1980-1990) .............................................................36
3 CENÁRIOS E CONTEXTOS DO ROCK NOS ANOS 2000...................................39
3.1 PÓS-MODERNIDADE.........................................................................................39
3.2 A INDÚSTRIA CULTURAL..................................................................................41
3.3 IDENTIDADE E ROCK NOS ANOS 2000 ...........................................................43
3.4 A IMAGEM ..........................................................................................................47
4. A IMAGEM DO ROCK NOS ANOS 2000 .............................................................49
4.1. A ANÁLISE DE IMAGEM ...................................................................................49
4.2 OBJETIVO DA ANÁLISE.....................................................................................51
4.3 THE STROKES, THE LIBERTINES E ARCTIC MONKEYS: UM BREVE
HISTÓRICO ..............................................................................................................52
4.4 A IMAGEM DO ROCK DOS ANOS 2000 ATRAVÉS DAS BANDAS THE
STROKES, THE LIBERTINES E ARCTIC MONKEYS..............................................56
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS..................... ............................................................108
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.......................................................................111
11
1 INTRODUÇÃO
Música é comunicação. Uma linguagem universal capaz de transmitir uma
mensagem, emocionar, movimentar e expressar um sentimento individual e da
sociedade. O rock, desde seu princípio, foi responsável por catalisar rebeldia,
transgressão e busca por mudança, fazendo com que jovens no mundo inteiro se
identificassem. Transpassando questões musicais de letra e de ritmo, o
comportamento e a imagem sempre foram características marcantes desse estilo
musical.
Quando pensamos no momento atual, de acordo com Monteiro (2006, p.42),
vemos que “é comum proclamar a morte do rock, seu vazio, e perda de
autenticidade”. Nesse mesmo contexto em que o rock começa a ser questionado,
vivemos uma supervalorização da imagem, onde o visual, de acordo com Amaral
(2002) define a marca da nossa época, e como aponta Debord (2003 p.18), “as
simples imagens tornam-se seres reais e motivações suficientes para um
comportamento hipnótico”.
Tendo em vista esse questionamento acerca da ruptura do rock e a importância
da imagem como elemento de ordem simbólica para compreensão da realidade, o
objetivo do presente trabalho é analisar a imagem do rock dos anos 2000 (período
que compreende os anos entre 2000 e 2009), afinal, como incita Maffessoli (1996, p.
160), “ora, como aprender o estilo de uma época, se não for através do que se deixa
ver?”. Para tal iremos verificar códigos visuais comuns às bandas de rock dos anos
2000, através de fotografias de divulgação produzidas nessa época, identificando
padrões visuais que se repetem nas bandas Arctic Monkeys, The Libertines e The
Strokes e que fazem parte da construção simbólica do rock nos grupos do passado.
Para isso são necessários três capítulos, além da presente introdução e das
considerações finais. No primeiro momento usamos como metodologia o
levantamento de dados. Com essa técnica de pesquisa, no próximo capítulo
apresentaremos uma breve retrospectiva da história do rock, desde seu surgimento
no final da década de 1940 até o final da década de 1990, na busca pela
compreensão da gênese do rock, isto é: como surgiu, quem foram seus principais
artistas e movimentos, quais as características musicais e comportamentais que o
sustentaram ao longo de seis décadas. Usaremos principalmente como referencial
12
teórico os autores Friedlander (2002), Muggiati (1985) e Goffman e Joy (2007).
No terceiro capítulo iremos estudar o contexto do recorte do objeto de pesquisa
deste trabalho. Na busca pela compreensão dos aspectos da pós-modernidade e da
ascensão da cultura de consumo, através da produção em massa e a indústria
musical, usaremos como referencial teórico Harvey (1992), Featherstone (1995)
Lipovetsky (2004), Adordo (1985) e Debord (2003).
Vale ressaltar a importância do estudo da cultura de mídia, como apontam
Freire Filho e Herschmann:
A sociedade vai se dando conta não só da dificuldade de entender as
mudanças por que passa o mundo atualmente (em função, entre outras
coisas, de uma presença mais efetiva das novas tecnologias digitais
interativas no cotidiano), mas também da relevância da indústria do
entretenimento e da cultura de mídia na organização da vida social. Em
outras palavras, devido ao seu papel condicionante e estruturante, analisar
tendências nos processos comunicacionais vem se configurando, cada vez
mais, em uma questão fundamental para a sociedade contemporânea
(FREIRE FILHO; HERSCHMANN, 2007, p. 8).
Também nesse capítulo esclareceremos aspectos da mídia, identidade e rock
nos anos 2000, bem como a compreensão da imagem, sua contextualização e sua
importância. Para esses aspectos, iremos utilizar os estudos de Herschmann (2007)
e Cardoso Filho e Janotti Júnior (2006), Amaral (2002) e Maffesoli (2006) e Joly
(1996).
No segundo momento, empregaremos como metodologia a análise de imagem
proposta por Joly (1996). Através dela verificaremos as fotografias de divulgação
(produzidas até 2009) e os códigos visuais que se repetem entre as bandas de
Arctic Monkeys, The Libertines e The Strokes. Na análise pretendemos perceber se
esses modelos estão baseados nas imagens da gênese do rock e se carregam as
principais características do estilo, a saber: identificação, rebeldia e contradição.
Supomos que as representações sejam basicamente uma repetição dos signos da
década passada, que funcionam mais como uma forma de gerar identificação da
banda como gênero e do espectador com a banda do que prática de estilo de vida
efetivo.
13
2 A GÊNESE DO ROCK
O rock and roll surgiu sob a influência de décadas de música. Desde seu
aparecimento em meados dos anos 1940, o gênero carregou um forte espírito de
rebeldia e foi cultuado por inúmeros jovens. Ao longo de sua história, ídolos foram
chamados de reis, monstros e deuses e viajaram em seus próprios aviões, famosos
mundialmente, enlouquecendo multidões, influenciando na moda e no
comportamento. Neste capítulo serão abordados os aspectos históricos do rock e
suas transformações ao longo de décadas, a fim de conferir a visibilidade da
trajetória desse estilo musical, com seus personagens e suas características.
No primeiro momento será feita uma breve abordagem sobre as raízes do rock
and roll. Em seguida, estudaremos suas transformações através dos anos, com a
seguinte divisão de períodos: o rock and roll clássico; a invasão inglesa; a era dos
guitarristas; explosão do rock dos anos 1970; o glam rock e o punk rock; o pós-punk
e o garage rock revival.
Como referencial teórico utilizaremos os estudos de Cardoso Filho e Janotti
Júnior (2006), Erlewine (2013), Ferri e Alice (1995), Friedlander (2002), Mcneil
(2004), Muggiati (1985), Goffman e Joy (2007), Ruhlmann (2012) e Unterberger
(2013).
2.1 AS RAÍZES DO ROCK AND ROLL
A música afro-americana foi, de forma geral, a maior influência, com “seus
ritmos sincronizados, a voz rouca e sentimental e as vocalizações de chamado-e-
resposta, características dos trabalhadores negros” (FRIEDLANDER, 2002, pg. 31).
O blues1 rural e urbano pode ser considerado a fonte prima do rock and roll, uma vez
que foi a partir de sua ramificação, o rhythm’n’blues2,que se iniciou o estilo musical
1 O blues é um estilo musical de origem afro-americana, que se apresenta como principal
forma de expressão dos escravos diante da sociedade colonial na qual viviam. Segundo Muggitati
(1995), o blues mistura gritos com canções de trabalho e de ninar, harmonizadas com hinos religiosos
e possuindo estrutura de balada. Em suas letras, o retrato de seu cotidiano. Um exemplo é a canção
Dry Well Blues, na qual Charley Patton canta “I ain’t got no money and I sure ain’t got no hope”, “não
tenho dinheiro e tenho certeza que não tenho esperança” (tradução nossa)
<http://www.youtube.com/watch?v=KH84ejtez_I>.
2 Rhythm’n’blues, ou R&B, como também é conhecido, é um estilo de música popular negra,
tocada nas rádios negras no final de 1940 e início de 1950, que mais diretamente influenciou o
surgimento do rock and roll. O termo rock and roll era empregado com frequência em suas letras. Um
14
do presente estudo. Também aspectos das sonoridades brancas, folk e country3,
sendo elas próprias uma fusão com a cultura negra, seriam importantes para o
desenvolvimento do rock and roll (FRIEDLANDER, 2002).
2.2 A EXPLOSÃO DO ROCK AND ROLL CLÁSSICO NOS ESTADO UNIDOS (1945-
1955)
O rock and roll teve sua primeira manifestação intensa entre os anos de 1945 e
1955. Segundo Muggiati (1985), “tudo começou quando o mundo ainda se refazia da
maior e mais sangrenta guerra da História. Uma guerra que custara milhões de
vidas” (MUGGIATI, 1985, p. 7). A paz durou pouco tempo, e logo se instalaria a
duradoura disputa entre Estados Unidos e União Soviética, a Guerra Fria. Os
temores do povo americano de um eventual conflito bélico eram abafados pela
prosperidade econômica e também pelos avanços tecnológicos. Como conta o autor
(MUGGIATI, 1985, p. 9), “o consumismo era o melhor antídoto contra o comunismo
e renascia com sua força multiplicada”. Muitas pessoas achavam um sentido para
viver em suas compras, periodicamente se renovando com “o modelo do ano”.
No entanto, a satisfação não atingia todas as camadas da sociedade. Minorias
negras, imigrantes mexicanos e porto-riquenhos, que também haviam sofrido com a
guerra, não compartilhavam o enriquecimento de setores da sociedade americana.
Ao contrário, eram marginalizados e discriminados. Ao mesmo tempo, a “geração
silenciosa”, nome dado aos nascidos logo antes do ataque a Pearl Harbor, que
culminaria a entrada dos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial, nos
turbulentos anos 1950, ainda que em condições sociais mais elevadas, sentia-se
deslocada. A culpa diante das desigualdades sociais a sufocava. E o American Way
of Life4 não tinha o mesmo impacto apaziguador para ela (MUGGIATI, 1985).
É nesse contexto, e em meio às inovações tecnológicas, que se criam
exemplo é uma canção de 1947 que Wild Bill Moore, intitulado "We’re Gonna Rock, We’re Gonna
Roll." <http://www.youtube.com/watch?v=u0rncpXErKY>
3 A música country surgiu na classe trabalhadora do sul dos Estados Unidos, e entrou para a
indústria da música no inicio de 1920, com suas primeiras gravações comerciais. Seus temas giravam
em torno do estilo de vida, sentimentos e preocupações dessa classe. Cantada com sotaque sulista
por cantores de pouca técnica, geralmente é acompanhada por violão com cordas de nylon, e por
vezes também são comuns instrumentos como o violão com cordas de aço, guitarra elétrica, piano e
bateria (CUSIC, 2008).
4 Refere-se ao estilo de vida dos norte-americanos, surgido no século XVII e muito presente até
então. Tem por características o patriotismo, o individualismo e o consumismo.
15
condições facilitadoras para o crescimento da música jovem, como apontam
Cardoso Filho e Janotti Júnior (2006). Se nos EUA, era necessário pagar 250
dólares por um rádio fonógrafo que ficava na sala como um bem preciso, a entrada
dos rádios e toca-discos portáteis tornou a audição musical mais acessível
financeiramente. O custo estava reduzido para uma média de 13 dólares, o que
possibilitava a compra de até mais de um aparelho por família. Esse advento trouxe
a possibilidade de os adolescentes ouvirem música em seus quartos, permitindo-
lhes explorar novos estilos, não somente os impostos por seus pais. Como relatam
Ferri e Alice (1995, p. 10), “a juventude já não se entusiasma mais com Sinatra e
companhia”.
Segundo Friedlander (2002, p. 23), nesse cenário musical norte americano dos
anos 1950, ao mesmo tempo em que as paradas de sucesso eram dominadas pelos
hits mainstream5, muitos jovens começavam a experimentar “uma nova e vibrante
música underground 6 chamada rock and roll”.
Em termos de musicalidade, o rock and roll não era complexo. Uma de suas
características principais era a emoção na voz e a batida marcante, mais pesada
que o usual. Os jovens sentiam suas histórias cotidianas contempladas nas letras e
no ritmo bastante propício para movimentações corporais. Muitos viam ali uma forma
de extravasar a inquietude — uma expressão de rebeldia. Eram tempos de cultura
conservadora com traços rígidos. A política estava dominada pelos conservadores
republicanos, e no campo da música quem tomava conta era o “bom moço” Mitch
Miller, dono de suaves melodias (FRIEDLANDER , 2002).
Assim como no rock and roll, os conflitos da juventude foram amplamente
retratados no cinema. Como aponta Muggiati (1985), os tipos “delinquente juvenil” e
o “rapaz de boa família” que se converte ao mal foram imortalizados pelos filmes O
Selvagem (The Wild One) de László Benedek (1953), Juventude Transviada (Rebel
Without a Cause), de Nicholas Ray (1955) e Sementes da Violência (Blackboard
Jungle), de Richard Brooks (1955). Em especial este último é destacado pelo autor
5 “O mainstream (que pode ser traduzido como ‘fluxo principal’) abriga escolhas de confecção
do produto reconhecidamente eficientes, dialogando com elementos e obras consagradas e de
sucesso relativamente garantido. Ele também implica uma circulação associada a outros meios de
comunicação de massa, como a TV (através de videoclipes), o cinema (as trilhas sonoras) ou mesmo
a internet (recursos de imagens, plug ins, wallpapers)” (CARDOSO FILHO; JANOTTI JÚNIOR, p. 18 –
grifos do autor).
6O princípio do underground é estar à margem da indústria cultural homogeneizada. Para
tanto, segue um padrão de produção e circulação particular, que se firma justamente nessa negação
da ordem vigente, o mainstream (CARDOSO FILHO; JANOTTI JÚNIOR, 2006).
16
(MUGGIATI, 1985, p. 11), pois retrata “toda carga de hostilidade no relacionamento
da juventude marginalizada com o Sistema”. Esse comportamento rebelde pode ser
percebido em uma cena de Sementes da Violência em que os jovens quebram uma
coleção inteira de discos de jazz do professor. Na trilha da destruição, a música que
abre o filme, Rock Around The Clock 7, é considerada a primeira gravação de rock
and roll da história. O hit de Bill Haley se tornou um verdadeiro hino da geração,
mantendo-se em primeiro lugar nas paradas e nos discos mais vendidos. Bill Haley
(Fig. 1), de acordo com Friedlander (2002), foi o primeiro astro branco do rock and
roll.
Os rebeldes da época adotaram o rock and roll para si, bem como a imagem de
James Dean (Fig. 2), a maior estrela do cinema americano dos anos 1950, tornou-se
um símbolo, isto é, estabeleceu um “modelo visual e ideológico” (MUGGIATI, 1985
p. 11), ganhando fãs e seguidores por diversos países.
7 Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=N-qjc17KEsc>. Acesso em: 2/09/2012.
Figura 1 - Bill Haley and his Comets em performance ao vivo
Fonte: < http://bit.ly/1bMxtm8>. Último acesso em 2 de setembro de 2012
17
O rock and roll, em seus primeiros acordes, desdobrou-se em duas gerações.
A primeira, muito popular nos anos 1953 a 1955, era composta predominantemente
por negros: Fats Domino, Chuck Berry (Fig. 3), Little Richard e Bill Haley. Uma
mistura simplificada dos sons negros e brancos acompanhados por um forte e
marcado ritmo de bateria.
Figura 2 – A imagem marcante do ator James Dean
Fonte: <http://bit.ly/15Vc4GI>. Último acesso em 2 de
setembro de 2012.
18
Essa geração trazia como temática das letras a óptica adolescente do pós-
guerra, celebrava as experiências e o amor, e na coreografia exibia passos
obscenos - para a época - fazendo alusão ao sexo e ao próprio rock and roll. Como
pode ser observado nesse trecho musical da época:
Apenas me deixe ouvir um pouco de rock and roll de qualquer jeito que você
escolher / Ele tem uma batida por trás, você não pode perder / De qualquer
modo velho que você escolher / Tem que ser rock and roll / se você quiser
dançar comigo.8
Segundo Friedlander (2002), além do caráter rebelde, a princípio a oposição
dos adultos ao rock também estava ligada a questões raciais, uma vez que naquele
período a segregação era forte e apoiada por lei.
Já a segunda geração do rock and roll clássico surge no começo de 1956 e
atinge sucesso comercial ainda maior que a sua antecessora. Como explicita
Friedlander (2002), a leva era composta apenas por jovens brancos que haviam
crescido ao som country de Hank Willians e, mais tarde, seriam atingidos pelo blues
8 Trecho da canção “Rock and Roll Music”, lançada por Chuck Berry em 1957. Tradução livre
da autora.
Figura 3 – O ritmo de Chuck Berry
Fonte: http://chuckberry.com/photo-
gallery/. Último acesso em 2 de setembro
de 2012.
19
e pelo rhythm and blues. Suas músicas seriam uma fusão dessas memórias com o
rockabilly e o próprio rock primitivo. Fizeram parte dessa geração os cantores Jerry
Lee Lewis, Little Richard e Elvis Presley, que passou a ser designado de rei do rock.
Como descreve Friedlander (2002), a temática das letras ganha um caráter mais
ingênuo, voltando-se para o amor e para a rejeição. A rebeldia, no entanto, continua,
através de performances escandalosas o suficiente para “proporcionar ao seu
público juvenil uma gratificante projeção da rebeldia” (FRIEDLANDER, 2002, p. 91).
Um exemplo pode ser visto na letra dessa canção do Elvis Presley:
Um pouco menos de conversa e um pouco mais de ação, por favor / Esse
aborrecimento não está me satisfazendo (...) / Querida, feche seus olhos e
ouça a música/ soando através da brisa de verão / É uma ótima noite e eu
posso te ensinar como usá-la.9
Na época, “a velha guarda, porém, reage e taxa o novo som de demoníaco e
incontrolável” (FERRI; ALICE, 1995, p. 10). De acordo com os autores, naquela
altura a repressão paternal era inútil. O comportamento da nova geração já estava
renovado, a forma de se vestir e expor suas ideias mudara. E o que a princípio era
uma rebeldia domiciliar aumenta seu âmbito, e os valores vigentes da sociedade
passam a ser contestados.
Um exemplo é o grande ídolo da época, que assim como muitos jovens, via
dificuldade em se adaptar os padrões da sociedade. Elvis Presley era a
representação do rebelde sem causa. Abandou a escola e começou a trabalhar, mas
foi demitido por brigar no serviço. Após esses acontecimentos, gravou, por quatro
dólares, seu primeiro disco, de apenas um exemplar (MUGGIATI, 1985). O sulista de
Mississipi logo encontraria o sucesso com os blusões de couro negro e as jaquetas
brancas cravejadas de pedrarias. Na imagem a seguir, observam-se dois pontos
importantes do cantor: a coreografia, que envolvia o corpo todo, e o figurino, de
calça jeans justa e jaqueta.
9 Trecho da canção “Little less conversation”, lançada por Elvis Presley em 1968. Tradução
livre da autora.
20
Figura 4 - Reprodução de cena do clipe de “Jailhouse Rock”, de Elvis Presley
Fonte: <http://www.youtube.com/watch?v=qDID_E0FDUU> Último acesso
em 2 de setembro de 2012.
Como aponta o autor, “Elvis Presley refletiu, mais do que qualquer outro
músico, as contradições do rock and roll. Seus quarenta e dois anos consumidos
numa vida intensa englobam contrastes dramáticos” (MUGGIATI, 1985, p.32).
Porém, o cantor muda o rumo de sua carreira:
A partir do seu terceiro show na televisão americana, em janeiro de 1957, a
imagem de The Pelvis (como era chamado) só poderia ser mostrada da
cintura para cima, pois sua ginga era considerada obscena. Mas a partir do
momento em que se tornou o novo rei da canção nos Estados Unidos, Elvis
perdeu a vida própria e passou a ser manipulado para fins comerciais e até
propagandísticos. Seu gesto patriótico ao ir prestar serviço militar em 1958
foi um exemplo (MUGGIATI, 1985, p.32).
Em 1960, a “Era de ouro do rock and roll clássico” chegava ao fim. A pressão
de religiosos e de órgão oficiais aliada aos interesses das gravadoras culminou no
sufocamento do rock and roll. Para a indústria, era vantagem gravar músicas menos
censuráveis e ganhar cada vez mais posições nas paradas. Friedlander (2002, p.
92) relata o destino dos ídolos dessa fase: “Berry foi indiciado, Lewis, marginalizado,
Little Richard tornou-se religioso, Elvis alistou-se e Haley tinha quase desaparecido”.
Nos anos 1960 surge um novo modelo de negócio para a indústria da música.
Ainda de acordo com Friedlander (2002), o processo retorna aos moldes do período
anterior aos anos 1950. As gravadoras reafirmam seu controle sobre a indústria
21
musical. As músicas eram produzidas nas grandes gravadoras ou pelos maiores
produtores independentes. Canções eram compostas por profissionais contratados e
gravadas por músicos temporários em estúdios. O resultado era um rock and roll
artificial, interpretado por homens jovens e bonitos, sem ritmo ou traços de revolta,
bem longe do rock clássico.
Após o declínio imposto do rock and roll clássico, se viveu um período de
transição. Entre 1959 e 1963 observa-se o surgimento e a proliferação de diferentes
estilos10 de música popular. Para que o rock and roll encontrasse novamente seu
auge, seriam necessários cerca de 10 anos. Essa nova fase seria denominada
“invasão britânica”.
2.3 A INVASÃO BRITÂNICA (1963-1964)
A primeira metade dos anos 1960 é marcada por um entusiasmo inocente, que
dá continuidade aos projetos ideológicos e culturais, surgidos com a crise do
moralismo na década anterior. Já a segunda metade da década é marcada pela
busca de mudanças na sociedade. Surgem novos movimentos feministas e a favor
dos negros e dos homossexuais. Também é dessa época o movimento hippie,
conhecido como contracultura, que bradava o lema “paz e amor” em seus protestos
contra a Guerra Fria e a Guerra do Vietnã.
Nesse contexto, inicia-se o momento musical que ficou conhecido como
invasão britânica, que igualmente passou por esses dois momentos. Essa relação
pode ser percebida através da comparação dos títulos de canções da banda The
Beatles: no inicio, músicas de tom inocente como “She loves you, yeah, yeah, yeah”
(“Ela te ama, yeah, yeah, yeah”) atingem grande sucesso. Já em um segundo
momento, surgem canções como “Revolution” (“Revolução”).
Após ter em vista o contexto histórico, para entender o surgimento do rock
inglês (aqui abordado através de suas três principais bandas: The Beatles, The
Rolling Stones e The Who), se faz necessário entender o contexto pelo qual a
Inglaterra passava musicalmente. Em 1960, a distribuição de discos na Inglaterra
era difícil e a programação radiofônica era estatal, dominada pela empresa BBC, o
10 Nessa época ressurge o folk repaginado (tendo como seu maior representante Bob Dylan), o
soul music e o motown, dois estilos essencialmente negros que exaltavam energia e negritude
(FRIEDLANDER, 2002).
22
rock and roll levaria anos para atravessar o atlântico em direção a Grã-Bretanha. Na
rádio, o conservadorismo vetava muitas músicas em função de letras sugestivas.
Para ter acesso às músicas americanas, a única opção eram os discos editados com
atraso, muitos deles sem lançamento em solo britânico (MUGGIATI, 1985).
Como forma de preencher a lacuna musical, ainda nos anos 1950, era
difundido um estilo chamado skiffle11
, uma imitação do blues antigo, vindo do sul
rural dos Estados Unidos, feita com instrumentos caseiros como tábua de passar,
cabo de vassoura e banjo de caixa de charuto. Segundo Muggiati, foi essa
reinvenção do blues que deu ao rock britânico sua base sólida (1985).
Quando o skiffle já estava proliferado e havia sido responsável por organizar os
jovens ingleses em bandas, finalmente o rock and roll americano ganha repercussão
em larga escala na Grã-Bretanha. Esse contato faz com que os grupos comecem a
desenvolver uma nova música, que seria denominada apenas rock (MUGGIATI,
1985). Um desses grupos foi o Quarrymen, liderado por John Lennon, que viria a
fundar o The Beatles.
Na cidade costeira de Liverpool, na Inglaterra, em 1960, os amigos John
Lennon, Paul McCartney e George Harrison transformariam o grupo Quarrymen em
uma banda profissional de rock and roll: o The Beatles (Fig. 5).
11 Assista: <http://www.youtube.com/watch?v=UFNKGccDJx4>. Último acesso em: 2 de
setembro de 2012.
23
Sua primeira e importante experiência em palcos foi um período de quatro
meses e meio que a banda passou em Hamburgo, na Alemanha. Tocavam de seis a
oito horas por noite em um clube do subúrbio. Durante as performances, conta
Friedlander (2002, p.120), “o público se divertia com a batida, e o John
ocasionalmente o brindara com suas opiniões e seus trajes que incluíam calcinhas e
tampa de privada em volta do pescoço”.
No regresso dos Beatles a Liverpool, as apresentações ao vivo passaram a ser
no clube Cavern Club. Em 1961, os Beatles já tinham conquistado um público fiel
por toda Liverpool. Em 1962 o então baterista, Pete Best, seria substituído por Ringo
Starr. No ano seguinte, por toda Grã-Bretanha aconteceria um fanatismo extremo,
que mais tarde seria denominado como o fenômeno da Beatlemania
(FRIEDLANDER, 2002). O autor relata como a banda de destacou, em primeiro
momento, pelo uso criativo de referências:
Os Beatles criaram um som original que fundia elementos de todas essas
raízes musicais. Eles adotaram o formato duas guitarras/baixo/bateria de
[Buddy] Holly, assim como sua visão adolescente do amor, geralmente
assexuada. O manejo hábil das letras de rock lembravam Tin Pan Alley e
Chuck Berry (FRIEDLANDER, 2002, p. 124).
Em 1967, a banda recebe influência do cantor folk Bob Dylan, que a inicia no
Figura 5 – O início dos Beatles: otimismo e ingenuidade
Fonte:< http://bit.ly/1bYih54>. Último acesso em 13 de
outubro de 2013.
24
uso de substâncias ilícitas e incita-a ao pensamento mais crítico. Dessa forma, o
cantor contribui para a metamorfose da banda, que faz a transformação de “músicos
pop otimistas e despreocupados em artistas culturalmente consequentes”, a partir de
então. O rock estava adquirindo “uma dimensão séria” (FRIEDLANDER, 2002, p.
132). A confirmação veio com “Revolver” (PARLOPHONE, 1966). Nas canções do
álbum, isso pode ser percebido em letras com influências psicodélicas e surrealistas
que evocam o domínio da psique:
Desligue sua mente, relaxe e flutue correnteza abaixo/ Não está morrendo,
não está morrendo/ Abaixo todos os seus pensamentos, renda-os ao vazio
/Está brilhando, está brilhando/ Ainda que você possa ver o significado de
dentro/ Está sendo, está sendo.12
Em seguida, é lançado o álbum que é referido pelos próprios membros da
banda como o trabalho apogeu do grupo, o “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band”
PARLOPHONE, 1967 (Fig. 6).
12 Trecho da canção “Tomorrow Never Knows”, lançada pelos Beatles em 1966.Tradução livre
da autora.
25
A grande abrangência dos Beatles e o impacto do grupo, segundo Friedlander
(2002), é consequência de uma série de fatores:
Os Beatles não causaram sozinhos estas mudanças na sociedade e na
indústria da música. Entretanto, seu enorme sucesso comercial, aliado à
simultânea explosão das tecnologias de comunicação e marketing,
permitiram que os Beatles transmitissem suas mensagens musicais e
culturais e o conteúdo de suas letras para um número muito maior de
pessoas, o que nenhum outro artista antes deles conseguiu. E, por causa
do seu status de divindades culturais, os jovens os escutavam e, na maioria
das vezes, acreditavam neles (FRIEDLANDER, 2002, p. 118).
O próximo artista analisado é o grupo The Rolling Stones. A banda nasceu em
Londres no cenário do blues britânico. Pode-se ter uma melhor compreensão das
referências, dos gostos e dos hábitos da banda a partir de um trecho de uma carta
enviada pelo membro fundador da banda, Keith Richards, a uma tia em 1962. Nela,
o músico retrata o dia em que conheceu Mick Jagger, outro integrante original da
banda:
Figura 6 – Capa do álbum Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club
Band
Fonte: <http://bit.ly/N3Ow9R> Último acesso em: 20 de outubro
de 2013.
26
Você sabe que eu estava interessado em Chuck Berry e eu pensei que eu
era o único fã em quilômetros, mas uma manhã na Est. Dartford (para que
eu não tenha que escrever uma palavra longa como estação), eu estava
segurando um dos discos de Chuck quando um cara que eu conheci na
escola primária, ali pelos 7-11 anos, sabe? veio até mim. Ele tem todas as
gravações que Chuck Berry já fez e todos os seus parceiros têm também:
eles são todos fãs de ritmo e fãs de rhythm’n’blues, o verdadeiro R & B, ou
seja, (não aquele porcaria de Dinah Shore, Brook Benton) Jimmy Reed,
Muddy Waters, Chuck, Howlin ‘Wolf, John Lee Hooker e todos os blueseiros
de Chicago coisas realmente lowdown, maravilhoso. Outro que é ótimo é o
Bo Diddley. De qualquer forma o cara na estação, o nome dele é Mick
Jagger. e todas as garotas e os caras se encontram todos os Sábados de
manhã no ‘Carrossel’, um juke-joint. (RICHARDS, 1962, tradução nossa -
grifos do autor).
Nesse depoimento pode-se observar a intensa relação dos membros
fundadores da banda com a música negra. Além do interesse por Chuck Berry e do
gosto por rhythm’n’blues, Richards conta que eram frequentadores de juke-joints,
nome que designa os pequenos bares com música e dança afro-americanas, bem
comuns no sudoeste dos Estados Unidos.
Pouco tempo depois desse primeiro encontro, surge o Rolling Stones, com
aparente sensualidade, como pode ser visto na figura 7, que atingiria o sucesso
comercial em todo mundo, por volta de 1965.
Simultaneamente à autodestruição dos Beatles, os Stones ingressavam em
sua Era de Ouro (MUGGIATI, 1985), marcada pelo crescimento intelectual e pelo
Figura 7 - The Rolling Stones: ritmos negros e sensualidade
Fonte: < http://bit.ly/1a4VdTg>. Último acesso em 20 de outubro de 2013.
27
aprofundamento musical. No período, eles amadureceram e fizeram trabalhos
multifacetados (FRIEDLANDER, 2002).
Segundo Frielander (2002, p. 153) “a banda capitalizou a agressividade e a
crueza da música negra americana para se projetar à linha de frente do incipiente
movimento do blues britânico”, sendo reconhecidos como bad boys do rock devido
suas músicas e atitude no palco. Como aponta Muggiati:
Mick Jagger, segurando o microfone com insinuações fálicas e gingando
como um travesti, antecipava o rock andrógino nas apresentações ao vivo.
Nos discos, sua voz metálica com sotaque proletário e um tom de deboche
era o veículo ideal para as letras cáusticas das canções originais do grupo
(MUGGIATI, 1985, p. 88).
Mais um importante grupo da invasão inglesa foi o The Who, que contribuiu
para a redefinição dos papéis e das funções dos instrumentos. Eles desenvolveram
o formato power trio, que consistia em utilizar somente guitarra, bateria e baixo,
resultando em um rock mais sofisticado e ousado. Além disso, o The Who tinha
como característica marcante as suas apresentações ao vivo (Fig. 8), que os fizeram
ser considerados um dos grupos mais vibrantes e divertidos da história do rock
(FRIEDLANDER, 2002).
Para o autor, o The Who exerceu bastante influência nas próximas gerações:
Figura 8- The Who: apresentação vibrante
Fonte: http://www.allmusic.com/artist/the-who-mn0000577627.
Último acesso em 20 de outubro de 2013
28
Além da qualidade das suas contribuições, eles também tiveram um
impacto significativo nas gerações de roqueiros posteriores. A fúria rebelde
de seu hino adolescente My Generation de 1965 plantou as sementes de
duas principais formas musicais que brotariam nos anos 70, o hard rock e o
punk. Os acordes poderosos de Townshed, o estilo vigoroso de Moon tocar
bateria, a imagem agressiva de vocalista de Daltery e os show em altos
decibéis da banda foram percursores do hard rock; as raízes do punk estão
visíveis na música guiadas pelo impulso e agressividade (FRIEDLANDER,
2002, p. 177 – grifos do autor).
Das três bandas da invasão britânica que vêm sendo abordadas nesse
subcapítulo, The Who é a que mais expunha de forma direta e reflexiva questões
políticas e filosóficas da época. O guitarrista Pete Townshed via a música como um
eficiente meio de transmitir uma ideia. Por isso, a qualidade do rock poderia ser
avaliada de acordo com sua preocupação social (FRIEDLANDER, 2002). Um
exemplo de suas letras pode ser visto com o refrão “Vamos ver ação, vamos ver
pessoas, vamos ver a liberdade no ar”.13
Tendo em vista algumas características do estilo do rock e suas bandas, para
Friedlander (2002) existe um chamado modelo anatomicamente perfeito do rock,
que funciona para melhor compreensão de uma canção ou banda. Consiste em
questionar-se qual a parte do corpo que mais é afetada diante da audição da
música. Para tanto, o pesquisador idealizou um esquema do que cada parte
representa: cérebro (intelectual), o coração (emocional), a genitália sexual (sexual) e
os pés (dança e movimento). Ao aplicar essa técnica nos três maiores grupos da
chamada invasão britânica, o autor indica que os Beatles e o The Who priorizam
para a cabeça e o coração, embora, tenham sonoridades diferentes, e o Rolling
Stones age mais na genitália e nos pés.
Antes de finalizar este breve estudo acerca da invasão inglesa, vale ressaltar
uma quarta banda do mesmo período, The Kinks. Os ingleses foram contra a
primeira geração da invasão britânica, que buscava arranjos cada vez mais
complexos, e primaram pelo minimalismo. Nas letras, optaram por trocar o comum –
amor – por uma crítica refinada a sociedade inglesa através de parábolas e paródias
(FRIEDLANDER, 2002).
13 Trecho da canção “Let´s see action”, do The Who, lançada em 1971. Tradução livre da
autora.
29
2.4 OS SOLOS DE GUITARRA (1966-1970)
A efervescência criativa musical também encontrava espaço em Londres. Em
1966, dois guitarristas radicados na cidade iniciariam um novo estilo, “centrado na
guitarra que fundia elementos do blues com a distorção conceitual culturalmente
adquirida dos experimentais anos 60” (FRIEDLANDER, 2002, p. 295).
Segundo o autor (2002), a guitarra de corpo sólido começou a ser produzida
em massa no final dos anos 1940. Em 1952, a fabricante Gibson coloca no mercado
o inovador modelo de guitarra sólida de Les Paul. Ao mesmo tempo, a guitarra
elétrica evoluía e ganhava mais destaque, possibilitados pelos solos de guitarra.
Na década seguinte, pela primeira vez o público começa a ser atraído não pela
banda e pelo repertório, mas sim pelos instrumentistas. Entre seus percussores, de
1967 a 1970, Eric Clapton formou o grupo Cream e Jimi Hendrix formaria o The Jimi
Hendrix Experince. Dentre suas qualidades:
Ambos amavam o blues e nunca perderam a habilidade de transmitir a
profundidade e a emoção do blues para as plateias. Mas contrário de
Clapton, Hendrix não limitou seu jeito de tocar guitarra a uma fusão de
elementos estilísticos, ele ultrapassou as fronteiras da música, ingressando
nos domínios do sons (FRIEDLANDER, 2002, p. 309).
Até os dias de hoje, ao pensar em guitarra elétrica se pondera Jimi Hendrix.
Muito por sua inventividade, como descreve Unterberger (2013, tradução nossa):
“quando Jimi Hendrix se tornou uma estrela internacional em 1967, parecia que ele
havia saltado de uma espaçonave vinda de marte”. Seu álbum de estreia, “Are You
Experienced?” (TRACK RECORDS, 1967), que sintetiza a vanguarda do rock em
1967, foi um dos mais surpreendentes começos de carreira da história do rock. Sua
musicalidade possuía aspectos futuristas ao mesmo tempo em que mostrava suas
raízes no rock, blues, pop e soul (UNTERBERGER, 2013). Uma das faixas do álbum
“Foxy lady” mostra sua personalidade erótica, que também tinha sua expressão nos
palcos. Tocava guitarra no meio das pernas, simulando um falo, e por muitas vezes
insinuava cometer o ato sexual com a guitarra (FRIEDLANDER, 2002).
De acordo com o Friedlander (2012), em junho de 1967, Jimi Hendrix faz uma
performance no Monterey International Pop que marcaria para sempre sua carreira.
Na última música do show, “Wild Thing”, o músico coloca em solo do palco sua
30
própria guitarra, joga líquido inflamável, ajoelha-se e coloca fogo no instrumento14
.
Ao todo, são quatro anos de carreira, que culmina seu fim com a morte do
cantor, aos 27 anos, em setembro de 1970, em função de uma alta dosagem de
tranquilizantes. Para Friedlander (2002), a contribuição mais importante do
guitarrista para o rock foi a expansão do papel musical da guitarra do rock and roll
clássico. Nesse ano encontra-se o marco divisor de uma nova época. O lema “sexo,
drogas e rock and roll” seria a base para o hard rock dos anos 1970, na busca por
anestesiar as problemáticas sociais.
2.5 A TERCEIRA EXPLOSÃO DO ROCK (1969-1978)
Com a chegada dos anos 1970, os movimentos musicais anteriores enfrentam
o declínio. Os Beatles haviam se separado, os Rolling Stones optaram por uma
pausa, Eric Clapton estava envolvido com drogas, e Jimi Hendrix havia falecido. No
entanto, esses acontecimentos já haviam transformado e expandido a indústria da
música. Em 1967, pela primeira vez foi alcançada a marca de um bilhão de discos
vendidos; em 1973, chegava a dois bilhões, e em 1978 a quatro bilhões
(FRIELANDER, 2002). Como apresenta o autor (2002), o rock já não era uma
novidade, se não parte da cultura oficial. Ao fim dos anos 1960, os jovens que o
viram florescer já não eram mais adolescentes e agora chegavam a idade adulta.
A contracultura dos anos 1970 pode ser caracterizada como hedonista e
niilista. Para Goffman e Joy (2007), isso se dá em função do desvirtuamento da
geração revolucionária dos anos 1960, que sem os esperados resultados culminou
em crise, tendo na sequência pessoas comuns, egoístas, sem imaginação e prontas
para se render ao sistema. É nesse contexto que surge o Led Zeppelin e a terceira
grande explosão do rock. O lema adotado não era mais político e social, se não de
cunho pessoal e egoísta: “sexo, drogas e rock and roll”, iniciado pelo Cream, Jimi
Hendrix e The Who, com a máxima “espero morrer antes de ficar velho (falando a
respeito da minha geração)”15. Nesse momento, essa filosofia se solidifica, virando
símbolo da busca por dinheiro e prazer.
14 Assista em: <https://www.youtube.com/watch?v=Z4QghNBwyt8> Último acesso em 9 de
outubro de 2013.
15 Trecho da canção “My Generation”, lançada pelo The Who e 1965. Tradução livre da autora.
31
Com o Led Zeppelin também vinha o estopim do Heavy Metal:
Led Zeppelin foi a definitiva banda de Heavy Metal. E isso não somente por
causa da sua interpretação do blues esmagadoramente alta mas também
pela forma como eles incorporaram mitologia, misticismo e uma variedade
de gêneros. O som deles tinha mística (ERLEWINE, 2013a, tradução
nossa).
A geração de 1970 continuava com características de revolta, mas a busca se
tornava própria, a liberdade pessoal e a libertação da repressão sexual. Por conta
dessas características, o cenário vivido era de promiscuidade sem culpas.
(GOFFMAN; JOY, 2007). O cotidiano do Led Zeppelin foi retratado na fotografia a
seguir: integrantes da banda, em seu próprio avião, acompanhados da garrafa de
whisky, com a qual eram identificados como inseparáveis.
A constatação de que a banda foi responsável por preencher uma lacuna no
rock, com qualidade e inventividade, condizente com a mentalidade dos jovens, foi
seu sucesso imediato. O primeiro álbum, homônimo, foi lançado em fevereiro de
1969 e em dois meses atingiu o Top 10 da Billboard. No mesmo ano, Led Zeppelin II
foi lançado em outubro e em dezembro atingiu o número um na lista. Ao todo cinco
dos seus quatorze álbuns chegaram ao topo das paradas (ROLLING STONE, 2013).
Mas a rápida ascensão também levou a uma conturbada carreira. Segundo
Figura 9 – Robert Plant e Jimmy Page, do Led Zeppelin
Fonte: <http://bit.ly/HbXHUM> Último acesso em: 9 de outubro de 2013.
32
Graham (2008, p.417), “o Led Zeppelin sempre foi complicado. Esse era o problema
inicial deles. Os shows deles sempre tinham violência masculina. Isso foi um desvio
nos anos 1970, que foi uma época muito estranha. Era uma anarquia sem causa”.
2.6 GLAM ROCK E PUNK ROCK (ANOS 1970)
Assim como surge o heavy metal nos anos 1970, vem outros estilos, já latentes
desde os anos 60, o glam rock e o punk rock.
Começando pelo glam rock, ele foi um estilo que, segundo Goffman; Joy
(2007, p. 343), forjou uma “estética neodecadente (...) em uma época em que o rock
estava ficando rançoso (...) eles não se levavam a sério (...) com vestimentas
andróginas e intencionalmente deselegantes” A linguagem operante era a do
exagero nas roupas, na maquiagem e no cabelo, como pode-se perceber na figura a
seguir:
Para os autores, foi uma contracultura trivial, pois representou um movimento
unificado que demarcou a separação do rock em tribos conflitantes. Uma das
bandas mais representativas do glam rock foi o New York Dolls, que trazia a
essência do estilo:
Fonte: <http://bit.ly/17Eqb0z> Último acesso em 05 de setembro
de 2013.
Figura 10 – A extravagância do New York Dolls
33
Os New York Dolls eram divertidos [...] sendo bastardos vaidosos daquele
jeito, pensei que eram ligados à ideia de narcisismo tão evidente nos anos
60 – de não querer crescer nunca – os Dolls a simbolizavam na sua forma
transexual de vestir e na ideia geral de permanecer uma boneca, uma
bonequinha (MCNEIL; MCCAIN, 2004, p. 248).
Por volta de 1975, o glam rock acaba deixando sua beleza, suas cores; e
aspectos menos glamorosos, envolvendo correntes, agulhas e moicanos, começam
a aparecer. É a chegada do punk em níveis mais amplos. Entretanto, o derradeiro
início do punk foi dado entre 1966 e 1967 com a banda Velvet Underground,
alicerçada no artista máximo da pop-art16, Andy Warhol, nos Estados Unidos. A
afirmação musical da vanguarda de Warhol veio com o primeiro álbum da banda
americana Ramones. Nele, músicas simples, sóbrias e curtas. A banda se
consagraria com uma das bandas mais influentes do punk rock (GOFFMAN; JOY,
2007).
A influência punk rock de Nova Iorque chegou à Inglaterra, onde se deparou
com uma depressão econômica. A população havia perdido a referência dos astros
de rock, agora ricos e completamente distanciados do desemprego e da pobreza
pela qual passava a população. A banda Sex Pistols mudaria isso, com seu primeiro
compacto Anarchy in the U.K (EMI, 1975). O estilo musical do disco, segundo
Goffman e Joy, “batia em muros psíquicos que nem mesmo os Ramones
conseguiam chegar” (2007, p. 360).
De acordo com Friedlander, “o punk foi um estilo heterogêneo (...) conduzido
por um ritmo frenético”, as “palavras eram vomitadas por vocalistas sem noção
prévia de ritmos”, refletindo “graus variados de ódio justificado” (2002, p. 352).
Acrescentando, a análise de Goffman e Joy é de que o estilo “se transformou em
uma identidade global que significou muitas coisas para muitas pessoas” (2007, p.
361). Foi além da música e influenciou a moda DIY - faça você mesmo.
Um dos pontos fundamentais do punk era a moda. Malcom Mclaren, produtor
dos Sex Pistols, também era dono de uma marca de roupa, a Sex, que possuía um
16 Surgido em Nova Iorque o movimento artístico teve como principais nomes: Roy
Lichtenstein, Claes Oldenburg, James Rosenquist, Tom Wesselmann e Andy Warhol. As suas
pinturas e esculturas tinham por característica celebrar a linguagem da cultura urbana, como
anúncios e fotografias às vezes de forma positiva e as vezes de forma irônica e crítica (HONNEF,
2004)
34
estilo fortemente influenciado pelo sadomasoquismo17, por roupas rasgadas, por
tachas, por correntes e por estampas de caráter contestador, como visto a seguir na
figura 11.
O termo punk foi eleito como denominação para o que estava acontecendo
pelo escritor e jornalista punk Legs McNeil. Segundo o próprio (MCNEIL; MCCAIN,
2004, p. 266), o vocábulo representava “bebedeira, antipatia, esperteza sem
pretensão, absurdo, ironia e coisas com um apelo mais sombrio”, ou seja, atividades
relacionadas ao seu dia-a-dia.
2.7 PÓS-PUNK (1977-1980)
De acordo com Bollon (1993), a partir de 1977 o punk enquanto música perde
sua identidade:
17 Nota da autora: O sadomasoquismo, que pode ser entendido como a satisfação sexual
diante da humilhação física e ou psicológica, já era um tema abordado no principio do punk, com a
banda Velvet Underground, que tratava do tema em suas letras a apresentações.
Figura 11 – Os Sex Pistols: música e atitude
Fonte: <http://static.giantbomb.com/uploads/original/15/152787/2175847-
Sex-Pistols-sex-pistols-4058394-1280-747.jpg> Último acesso em 09 de
outubro de 2013.
35
O punk triunfava como moda e novo conformismo, no mesmo momento em
que morria como estilo e ameaça. Tudo voltava à ordem e ao já conhecido:
nesse intervalo a sociedade se renovara. Os anos 80 seriam, de ponta a
ponta, os anos do ‘pós-punk’ (BOLLON, 1993, p. 144 – grifos da autora).
Segundo AllMusic Guide (online, 2013), após a revolução punk surgem dois
vieses musicais. São eles: o new wave, apresentando uma faceta mais pop alegre e
dançante do punk através de batidas eletrônicas, e o pós-punk, apresentando um
lado mais audacioso do punk, mais experimental e complexo musicalmente, mas
não menos agressivo ou político. Para este trabalho cabe um olhar um pouco mais
detalhado sobre o pós-punk, uma vez que esse movimento foi um dos grandes
influenciadores de bandas de rock dos anos 2000.
Erlewine (2013b) aponta The Cure (Fig. 12) como uma das poucas bandas do
pós-punk que conseguiu sucesso em larga escala. A banda começou em 1976 e
logo no primeiro álbum foi bem recebido pela crítica.
Como apontado por Erlewine (2013b), o The Cure em suas canções sobrepôs
camadas de guitarras e de sintetizadores e foi uma das bandas que lançaram as
sementes do rock gótico. No entanto, no final anos 1980 eles já haviam deixado o
lado gótico, seguindo com sucesso comercial até a primeira metade dos anos 1990.
A influência deles pode ser ouvida em dezenas de novas bandas do novo milênio,
Figura 12 - The Cure: o lado sombrio do punk
Fonte:<http://www.allmusic.com/artist/the-cure-mn0000137390>.
Último acesso em: 20 de outubro de 2013.
36
incluindo muitos que tinham pouco a ver com o gótico.
De acordo com Bush (2013), o Joy Division (Fig. 13) foi a primeira banda do
pós-punk que buscou sua expressão não na raiva, mas na melancolia, dando início
à música alternativa melancólica dos anos 1980. O produtor da banda, Martin
Hannet, foi responsável por introduzir sintetizadores, riffs de guitarra irregulares,
destaque a bateria e também a um experimentalismo musical, com o uso de ruídos
diversos (como vento, vidros quebrando, sons de maquinas)18.
Figura 13 – Joy Division e a melancolia do punk
Fonte: < http://bit.ly/1a2Vkk2>. Último acesso em: 20 de outubro de
2013.
As canções da banda traziam inquietação pós-industrial e desespero
emocional. As apresentações do vocalista Ian Curtis também chamavam atenção.
Portador de epilepsia, o cantor muitas vezes tinha ataques reais ou inventados no
palco.
2.8 GARAGE ROCK REVIVAL (1980-1990)
Em 1980 surge o garage rock revival, na busca de recapturar o espírito
selvagem do garage rock dos anos 196019. É um movimento baseado em reviver um
18
O Processo De Gravação Das Canções Do Joy Division pode ser visto no filme A Festa
Nunca Termina (24 Hour Party People), de Michael Winterbottom (2002).
19 Fonte: http://bit.ly/1b8a51y. Acesso em: 20/10/2012.
37
estilo musical inspirado na invasão inglesa. Hicks (1999) aponta que o garage rock
original é caracterizado pelo alto emprego do fuzz (distorção), pela presença de
ironia e de sarcasmo, por vocais marcados por autocontradições e pela ideia do
“Faça você mesmo” (do it yourself). Gravações feitas em estúdios precários
caracterizaram esta tendência por uma crueza estilística.
Abbey (2006) afirma que o garage rock surgiu como um esforço para trazer de
volta a simplicidade dos grupos originais de rock. E o garage rock revival ou
contemporâneo, como conceitua o autor, continua com essa intenção, tem como
características grande nostalgia e individualismo e teve como epicentro geográfico
os subúrbios de Michigan, Detroit. O estilo nunca atingiu grande audiência nem teve
grande representantes. Sua primeira “onda” foi nos anos 1980. Entre algumas das
bandas de maior destaque estavam Chesterfield Kings (Fig.14), The Mono Men, The
Lyres, The Fleshtones e The Fuzztones (Fig. 15).
Fonte: <http://bit.ly/1fR7EpS> Último acesso em 20 de outubro de 2013.
Figura 14 - Chesterfield Kings nos anos 1980: revivendo os anos 1960
38
O estilo continuou cultuado por algumas pessoas nos anos 1990 – embora
ainda sem sucesso – e muitas bandas surgidas no final da década basearam seu
som e sua imagem no garage rock revival, bandas de rock essas que estrearam
seus discos nos anos 2000, como é o caso da banda The Strokes, que será
estudada no capítulo 4.
Antes de entrarmos no rock dos anos 2000, no próximo capítulo iremos
contextualizar o período de forma geral abordando aspectos da pós-modernidade,
da indústria cultural da identidade e a imagem.
Figura 15 - The Fuzztones
Fonte: <http://www.allmusic.com/artist/the-fuzztones-
mn0000764290> Último acesso em 20 de outubro de 2013.
39
3 CENÁRIOS E CONTEXTOS DO ROCK NOS ANOS 2000
Neste capítulo abordaremos breves aspectos da pós-modernidade, tendo como
referencial Harvey (1989), Lipovetsky (2004) e Castells (1999), da indústria cultural,
utilizando Adorno (1985) e Debord (2003), da indústria fonográfica, através de
Herschmann (2007) e de Cardoso Filho e Janotti Júnior (2006). Também trataremos
de mídia, de identidade e do rock nos anos 2000, com Amaral (2003) e com
Maffesoli (2006), sendo esses dois autores também utilizados como referencial para
o estudo da imagem, junto com Joly (1996).
3.1 PÓS-MODERNIDADE
Me diz meu Deus o que é que eu vou cantar / Se até cantar sobre me diz
meu deus o que é que eu vou cantar / Já foi cantado por alguém20
Para compreensão da pós-modernidade é preciso levar em conta o significado
da sua antecessora modernidade. Segundo Harvey (1989, p.22), o conceito de
modernidade está ligado à “ruptura com todas e quaisquer condições históricas
precedentes”. O projeto modernista começou a ser tratado pelos pensadores
iluministas ainda no século XVII e tinha por objetivo desenvolver a racionalização da
organização social para liberação do indivíduo.
Os ideais iluministas, porém, sofreram enfraquecimento durante o século XX.
Diante de duas guerras e a ameaça da aniquilação nuclear, o otimismo progressista
enfrenta dificuldades em se manter.
Diante desse contexto, artistas, escritores, arquitetos, compositores, poetas,
pensadores e filósofos surgem com uma nova concepção de projeto modernista,
através da imagem da “destruição criativa”, com o intuito da fundação de um mundo
novo. O artista moderno era alguém capaz de se expressar de forma universal, que
afetasse aspectos da vida urbana diária (HARVEY, 1989). Segundo Harvey,
O modernismo surgido antes da Primeira Guerra Mundial era mais uma
reação às novas condições de produção (a máquina, a fábrica, a
urbanização), de circulação (os novos sistemas de transportes e
comunicações) e de consumo (a ascensão dos mercados de massa, da
20 Todas as frases que abrem os subcapítulo desse capítulo são trechos da letra de “66”, da
banda O terno, inclusa no álbum “66” (Independente, 2012).
40
publicidade, da moda de massas) do que um pioneiro na produção dessas
mudanças. Mas a forma tomada pela reação iria ter uma considerável
importância subsequente. Ela não apenas forneceu meios de absorver,
codificar e refletir sobre essas rápidas mudanças, como sugeriu linhas de
ação capazes de modificá-las ou sustentá-las (HARVEY, 1989. p. 32).
Para Lipovetsky (2004), a passagem da modernidade à pós modernidade, na
segunda metade do século XX, deu-se através do consumo das massas e os
valores que ele veicula. De acordo com o autor, o termo pós-modernidade vem
salientar uma reorganização do modo de funcionamento social e cultural das
sociedades democráticas avançadas.
Castells (1999) aponta que essa mudança ocorreu principalmente através de
três importantes processos na história:
Um novo mundo está tomando forma neste fim de milênio. Originou-se mais
ou menos no fim dos anos 60 e meados da década de 70 na coincidência
histórica de três processos independentes: revolução da tecnologia da
informação; crise econômica do capitalismo e do estatismo e a consequente
reestruturação de ambos; e apogeu de movimentos sociais culturais, tais
como libertarismo, direitos humanos, feminismo e ambientalismo. A
interação entre esses processos e as reações por eles desencadeadas
fizeram surgir uma nova estrutura social dominante, a sociedade em rede;
uma nova economia, a economia informacional/global; e uma nova cultura,
a cultura da virtualidade real. A lógica inserida nessa economia, nessa
sociedade e nessa cultura está subjacente à ação e às instituições sociais
em um mundo interdependente (CASTELLS, 1999, p. 412).
Ainda como cita Featherstone (1995), alguns autores acreditam que o pós-
modernismo se refere mais a uma crise interna no campo dos próprios intelectuais
do que a uma crise social mais ampla. Já para Lipovetsky (2004) ela traz consigo os
seguintes pontos:
A rápida expansão do consumo e da comunicação de massa;
enfraquecimento das normas autoritárias e disciplinares; surto de
individualização; consagração do hedonismo e do psicologismo; perda da fé
no futuro revolucionário; descontentamento com as paixões políticas e as
militâncias (LIPOVETSKY, 2004, p. 52)
Para Bauman (200, p.13 – grifos do autor), estamos vivendo a modernidade
líquida, que implica em uma “realocação dos ‘poderes de derretimento’ da
modernidade”. E Charles (2004) acredita que, de um lado, o pensamento das Luzes
continuam. Indivíduos são cada vez mais capazes de exercer o livre arbítrio, através
da informação.
41
3.2 A Indústria cultural
Então não sei o que eu devo fazer / Pois se eu fizer bem quadradão
Vão me chamar de quadradão / Mas se eu fizer muita loucura vão dizer que
eu tô maluco / E desse jeito você nunca vai ser muito popular.
Um contexto de transformações sociais e psicológicas causa impactos nas
diversas camadas de organização da sociedade, como é o caso da cultura, que
ganha aspectos de “indústria”.
Indústria cultural para Coelho (1981) é o fruto de uma sociedade
industrializada e capitalista, a sociedade dita de consumo. Ela só é possível quando
admite-se a divisão cultural em superior, média e de massa, apesar dos equívocos
envolvidos nessa classificação. Para o autor, as funções dessa indústria possuem
ambos os lados, positivos e negativos. Como positivo, aponta o dinamismo, capaz
de gerar efeitos além dos previstos, e o não combate às outras culturas, sendo
apenas complementar às tradicionais. Como negativos, tendência a alienação do
homem, através do reforço das normas sociais e o esquecimento do debate sobre
as questões da sociedade.
Segundo Santaella (2003), até meados do século XIX a cultura no ocidente era
delimitada em dois tipos: a cultura erudita, das elites, e a cultura popular produzida
pelas classes dominadas. Porém, a partir da explosão de meios de reprodução
técnica, jornal, cinema e foto, advém a cultura de massa, que segundo a autora,
(SANTAELLA, 2003, p. 52), “produziu um impacto até hoje atordoante naquela
tradicional divisão da cultura”.
Adorno (1985) aponta algumas dessas mudanças no jeito de fazer cultura:
A técnica da indústria cultural levou apenas à padronização e à produção
em série, sacrificando o que fazia diferença entre a lógica da obra e a do
sistema social. Isso, porém, não deve ser atribuído a nenhuma lei evolutiva
da técnica enquanto tal, mas à sua função na economia atual (ADORNO,
1985, p.114)
Esse sistema de produção em série está baseado na diversão. Segundo o
autor, a diversão serve como escapatória do processo de trabalho mecanizado, e
portanto não deve exigir pensamento próprio e esforço intelectual. Como explicita,
(ADORNO, 1985, p. 135): “divertir-se significa estar de acordo (...) significa sempre:
não ter que pensar nisso, esquecer o sofrimento até mesmo onde ele é mostrado”,
42
Aqui, essa fuga intelectual se dá através do retrato do próprio cotidiano, através de
uma ideia de resistência, uma realidade que deve subsistir. Para ele, trata-se de um
rompimento da cultura na busca pela diversão. Através da repetição mecânica do
belo, de estereótipos e de personagens, para Adorno (1985, p. 131), “a indústria
cultural não sublima, mas reprime”.
Featherstone (1997) afirma que, pela ótica pós-moderna, a ascensão da cultura
de consumo, através da produção em massa e sua proliferação, termina com a
esfera cultural separada. Por esse motivo, muitas vezes é proferido o fim da arte e
da figura heroica do artista.
Para Debord (2003, p.16 – grifos do autor), trata-se da sociedade do
espetáculo, sendo espetáculo “a afirmação da aparência e a afirmação de toda a
vida humana – isto é, social – como simples aparência”, tendo em vista que não se
trata apenas de um conjunto de imagens, mas de “uma relação social entre pessoas,
mediado por imagens”. O consumidor transforma-se em um consumidor de ilusões.
E nessa sociedade, para o autor, tudo se torna uma acumulação de espetáculos:
Toda a vida das sociedades nas quais reinam as modernas condições de
produção se apresenta como uma imensa acumulação de espetáculos.
Tudo o que era vivido diretamente tornou-se uma representação (DEBORD,
2003, p.13 - grifos do autor).
Llossa (2012) lança mão de uma nova denominação, a civilização de
espetáculo. Na qual afirma que a palavra está cada vez mais subordinada à imagem
e ao entretenimento. O autor culpa a democratização da cultura pela queda de sua
qualidade. Em função da quebra de barreiras entre críticos e público geral, perde-se
o discernimento de baixa e alta cultura, popularizando um gênero cultural superficial.
Para Chauí (2000), por outro lado, a democratização da cultura é uma
questão necessária:
Trata-se de contestar o uso privado da cultura, sua condição de privilégio
“natural” dos bem-dotados, a dissimulação da divisão social do trabalho sob
a imagem da diferença de talentos e de inteligências. É a noção de
competência que torna possível a imagem da comunicação e da informação
como espaço da opinião pública, imagem aparentemente democrática e, na
realidade, antidemocrática por excelência, pois ao fazer do público espaço
da opinião, essa imagem destrói a possibilidade de elevar o saber à
condição de coisa pública, isto é, de direito à sua produção por parte de
todos (Chauí, 2000, p.2 – grifos da autora).
43
Este pensamento segue a mesma linha de Warnier, quando se refere à
chamada globalização da cultura:
Pode-se ver que a chamada “globalização” dos fluxos mercantis não é uma
verdadeira globalização. É uma troca privilegiada entre países mais ricos
(...) trata-se portanto de uma vasta mistura cultural sob o comando
hegemônico das indústrias privadas do triângulo América – Europa – Ásia
rica, encorajados pelos Estados (WAINER, 2000, p. 95 – grifos do autor).
Complementando, é preciso ter em vista que, de acordo com Kellener (2001),
deve-se evitar ver os efeitos da cultura de mídia com a visão extrema de que o
público é uma massa homogênea e passiva, da mesma forma que devemos ter em
mente a contradição da mídia: enquanto manipula também é manipulada e usada.
3.3 IDENTIDADE E ROCK NOS ANOS 2000
Então não sei o que eu devo fazer / Pois se eu não posso inovar
Eu vou cantar o que já foi e vão dizer que é nostalgia / E que esse tempo já
passou e eu tô por fora do que é novo / Mas se é novo falam mal.
Kellner (2001) aponta que é a partir da modernidade que se toma consciência
de que a identidade não é fixa, sólida e estável, como se pensava, e sim mutável,
podendo ser criada e recriada. A identidade passa a ser um problema pessoal e
teórico, e é vista como função da criação de uma individualidade particular e não
mais em função do coletivo. Na pós-modernidade a identidade é fragmentada,
desconexa, é o sujeito como parte de um fluxo de euforia intensa. Ao mesmo tempo
em que se cultua o individualismo, Kellner (2001) ressalta que teóricos como
Baudrillard indicam que os sujeitos implodem, formando massas, ou seja, deixam de
ser importantes por si, tornando-se mais um.
De acordo com Mafessoli (1999), vivemos o neotribalismo, que está baseado
em afinidades comuns do cotidiano. O vínculo social está na cultura dos
sentimentos. De acordo com ele, essa formação de tribos:
É certamente porque há prevalência do conjunto sobre o particular, ou seja,
do outro, que se podem reconhecer os outros em si. Assim como há
identificações sucessivas, em função dos diferentes momentos da
comunicação, pode haver identificação de diversas facetas da própria
pessoa (MAFESSOLI, 1999, p.311).
44
Para Bauman (2004), a identidade surge com as “comunidades”, que mesmo
diante de um mundo policultural conseguem fundir ideias. O conceito de identidade,
de acordo com o autor, advém com a crise do pertencimento e da necessidade de
transpor as barreiras do “deve” para o “é”, recriando a realidade à semelhança da
ideia.
Nesse sentido, os ídolos do rock tornam-se figuras emblemáticas, personagens
capazes de influenciar comportamentos. De acordo com Maffesoli:
Quando trabalhamos com personagens, a imagem se sobressai diante de
outras características, como nome, pois ela tem um caráter representativo.
É como se estivesse um passo elevado, sendo capaz da criação de um
emblema. Por isso, é possível que determinado personagem, levando
consigo um conjunto de figuras emblemáticas, seja passado de uma cultura
à outra, sem que ele perca sua essência (MAFESSOLI, 1999, p. 142).
Para Cardoso Filho e Janotti Júnior (2006), a indústria fonográfica surge com
personalidades musicais que tenham a universalidade necessária para se tornarem
figuras públicas e veicularem em todos os meios, como revista, televisão, filmes.
Sendo também figuras responsáveis por endossar produtos e serviços, constituem,
assim, uma rede globalizante que interliga publicidade com lazer e entretenimento.
Hoje, por exemplo, os videoclipes são usados como um canal de publicidade através
da técnica de inserção de produto na narrativa, o chamado produtc placement.
45
Figura 16: Composição de reproduções do videoclipe Reptilla, da banda
The Strokes. Aparição de três produtos de marcas
.
Fonte: Reptilia - Videoclipe do The Strokes (BMG, 2003), disponível em
http://www.youtube.com/watch?v=b8-tXG8KrWs>. Último acesso em 3 de
outubro de 2013
Voltando às questões de identidade, Amaral (2000) afirma que um dos pontos
fundamentais do rock é a socialização a um gênio coletivo. A autora aponta a
estética artística como importante fator de identificação:
A estética constitui o outro elemento fundamental da arte e, geralmente, é o
que propicia o estabelecimento da identificação entre os artistas e os fãs.
Quando refiro-me à estética, não estou tratando da idealização do belo.
Trato de uma estética que preocupa-se com as transformações do mundo
contemporâneo. Uma estética decadente e também ascendente e
afirmativa, cujos valores representem uma desconstrução dos valores
anteriores, e que se vincule aos sentidos do corpo, ou seja, uma estética em
que a emoção permaneça ligada ao próprio sentido da vida. A necessidade
de incorporação das contradições inerentes à essência da arte e do artista
fazem dela uma estética fisiológica [...] (AMARAL, 2000, p.36).
Um dos conceitos de Nietzsche trazidos por Amaral (2002) levanta o lado
filosófico de que existe um fator fundamental que define arte, a embriaguez:
(…) para que haja arte não é necessário que nos atenhamos aos conceitos
de "verdadeiro" e de "não-verdadeiro", mas "para que haja uma ação e
visualização estéticas é incontornável uma precondição fisiológica: a
embriaguez" (Nietzsche, 2000, p.70). A embriaguez é o sentimento de
elevação da força e da plenitude que se encontram nos conceitos de
apolíneo e de dionisíaco. A embriaguez apolínea está relacionada ao
sentido da visão, do olhar, como o dos pintores e escultores, enquanto que
46
na instância dionisíaca, todos os sentidos apresentam-se mais exaltados.
Por isso, artes como a música e o teatro tendem a estar mais ligadas a ela
(AMARAL, 2000, p. 36).
Porém, para o rock, o discurso em torno da legitimidade da música ainda recaí,
por muitas vezes, na contradição undergoround versus mainstream21. De acordo
com Monteiro (2006), a ideologia do rock vive dessa contradição básica: trata-se de
uma música produzida comercialmente para uma audiência massiva, mas que
sustenta um discurso crítico em relação ao comercialismo e à cultura de massas. A
ideia de que a figura do rock é um ser “superior”, indo contra a cultura pop, também
é característica da ideologia do rock, como explica o pesquisador:
A ideologia do Rock reflete uma certa concepção do fazer artístico herdada
do Romantismo do século XIX, segundo o qual o artista seria um individuo
abençoado pelos deuses, capaz de transmitir ao mundo seu universo
interior, suas emoções e sua filosofia de vida através da música, da pintura,
da poesia. A Ideologia Rock se apropria desse discurso como forma de
estabelecer fronteiras do que é digno ser considerado rock (ou seja, a
música que é capaz de expressar esse universo interior do artista) e os
demais gêneros musicais, reféns de fórmulas predeterminadas, voltadas
para o mercado e incapazes de expressar esse sentido de transcendência
que o rock consegue manifestar (Bollon, 1993; Grossberg, 1992, p. 160-
162, 1998, p.298) (MONTEIRO, 2006, p. 41 – grifos do autor).
De acordo com Friedlander (2002), com a popularização do videoclipe a partir
dos anos 1980, essas questões tornam-se ainda mais evidentes. O surgimento da
MTV (Music Television) e sua programação exclusivamente voltada pra música
impactou o mercado da música aumentando as vendas de CD e levando a cultura
pop cada vez mais ao mainstream.
Ainda segundo Friedlander (2002), os vídeos traziam os valores do rock
contemporâneo: a impaciência, prazer sexual, arrogância e individualismo, e por
vezes deixavam a música em si, atentando-se mais para a imagem.
Monteiro (2006) afirma que em função dessas mudanças começa-se a
questionar a validade do discurso rebelde do rock. Na opinião do autor,
(MONTEIRO, 2006, p. 46), enquanto ideologia, o rock não deve ser considerado
como fonte de alienação, e sim, um discurso que “ajuda a conferir sentido às
práticas relacionadas ao universo do rock’n’roll, mas não impõe um modelo de
comportamento que o jovem é obrigado a seguir cegamente”. E afirma:
21
O underground, na produção cultural, busca vias alternativas e se firmam, quase
invariavelmente, a partir da negação do o mainstream, a “via principal”, ligada a produção em massa.
(FILHO et JUNIOR, 2006).
47
O distanciamento temporal em relação às diversas fases e ciclos do rock ao
longo dos últimos anos 50 anos, somando à emergência de uma
mentalidade pós-moderna bastante desconfiada em relação à pertinência
de valores como autenticidade e atitude nos dias de hoje, deu origem a
certo tipo de crítica que tende a enxergar o rock como uma mera
manifestação da ideologia travestida de elementos transgressores. Por trás
do aparente choque com os ideais conformistas burgueses, o rock apenas
proporcionaria a ratificação desses valores, por meio de um “descontrole
controlado das emoções”, em que a transgressão seria permitida dentro de
certos limites, impedindo um ruptura efetiva com a ordem vigente e o status
quo (MONTEIRO, 2006, p.41).
De acordo com Monteiro (2006), por isso mesmo é comum que seja
proclamada a morte do rock, seu vazio e sua perda de autenticidade. Porém, o autor
acredita que a ideologia do rock ainda é bastante eficaz, principalmente entre os
jovens. Segundo o autor, é necessário continuar validando esse discurso, o que não
significa fazer uma apologia acrítica dos valores e contravalores dessa linha
ideológica, e sim pensar de que forma esse sistema pode ser apropriado de forma
reflexiva pelo público consumidor.
3.4 A IMAGEM
E hoje faz sucesso quem faz plágio diferente / E de repente pode até ser
bem legal / Pois já fizeram coisa boa no passado / Eu misturo como eu
quero com mais tudo o que eu quiser
Depois de apontarmos ao longo dessa dissertação a importância da imagem no
atual contexto histórico e para o rock, vamos transcorrer brevemente sobre o que se
trata quando estamos falando de imagem. Esse subcapítulo cabe aqui com o intuito
de preparar a análise do presente trabalho, que se volta para a imagem do rock.
Para Joly (1996), imagem significa aquilo que não necessariamente seja
visível, mas de certa forma tenha traços do visual, e que “depende da produção de
um sujeito: imaginária ou concreta, a imagem passa por alguém que a produz ou
reconhece” (JOLY, 1996, p.13).
Amaral (2002, p. 34) vê a imagem como a “musa sedutora” dos dias de hoje,
na qual “tende-se a desconsiderar os sons, os ruídos e a própria música como seus
elementos. A imagem e os outros componentes do sentido da visão definem a
marca de nossa época”.
Segundo Maffesoli (1996), o espaço no qual vivemos é um agrupamento de
48
ordem simbólica que pode ser compreendido como um conjunto complexo
constituído pela materialidade das coisas e pela imaterialidade das imagens de
diversas ordens. Essas imagens apresentam-se em desordem, com rapidez e
difração e podem ser vistas como a expressão do vitalismo. Mesmo anárquicas, têm
o importante papel de agregação, sendo assim um elo entre as tribos, as “neotribos”,
baseado em laços afetivos oriundos da estética, do estar-junto e do cotidiano.
Através da publicidade e da TV esse cotidiano é invadido pelo imaginário,
aponta Maffesoli (1996). Vivemos a exacerbação do emocional e do sensível, ao
mesmo tempo em que ocorre uma supervalorização da imagem, do aparente.
Contudo, a aparência, de acordo com ele, não deve ser vista como mera futilidade
superficial, e sim como a representação visual de um campo simbólico formado por
diversos signos. Como aponta Debord (2000, p.18) “quando o mundo real se
transforma em simples imagens, as simples imagens tornam-se seres reais e
motivações eficientes de um comportamento hipnótico”.
A forma, para Maffesoli (1996), é vista como poder catalisador de aglomerar
um grupo de imagens, transformando a comunicação em estilo de vida, vestuário e
comportamento. É uma mediadora entre o mundo social e natural e o eu pessoal. A
imagem é composta de signos, e segundo Joly (1996), um signo só pode ser
considerado signo quando exprime ideias.
Como visto no subcapítulo sobre a indústria cultural, segundo Debord, a
imagem hoje sobrepõe, muitas vezes, ao conteúdo. Kellner (2001, p. 301- grifos do
autor) vai de encontro e afirma que: “se, na maior parte da história da televisão, a
palavra-chave foi narração, a visão pós-modernista da televisão como imagem
muitas vezes descentra a importância da narrativa”.
Para Amaral, essa supervalorização da imagem no consumo de mídia se
transfere para a vida pessoal:
A tendência ao endeusamento e, por consequência, uma fetichização da
imagem faz com que nos concentremos apenas na veloz sucessão de
frames que perpassam o controle remoto em um zapping contínuo do
mundo. Assim, recortamos e colamos não só imagens propriamente ditas,
como sons, ruídos e músicas, tramando uma verdadeira sinfonia visual do
presente (AMARAL, 2002, P. 35).
No próximo capítulo, partiremos para a análise de imagem para compreensão
do rock nos anos 2000.
49
4. A IMAGEM DO ROCK NOS ANOS 2000
Neste capítulo efetuaremos a análise da imagem do rock nos anos 2000,
através da metodologia proposta por Joly (1996). Segundo Maffesoli (1996), as
imagens possuem uma representação própria que não depende apenas de seu
contexto, o que não significa ser dispensável o estudo de seu histórico. Nesse
sentido, percorremos a trajetória do rock, desde seu surgimento, e o
contextualizamos no seu atual período histórico, que segundo Monteiro (2006), é um
momento em que podemos considerar haver um desvirtuamento de tal estilo
musical, sendo esse o motivo pela delimitação da presente pesquisa no período dos
anos 2000, que corresponde ao ano de 2000 até 2009. Por sua vez quanto à opção
pela análise da imagem, ressaltamos que para Debord (2003) estamos vivendo um
período de supervalorização da imagem. Essa afirmação também foi vista em
publicações de Maffesoli (1996), Amaral (2002) e Llosa (2011). Para tal, optamos na
presente pesquisa por um estudo da imagem, para compreensão do rock nos anos
2000.
4.1. A ANÁLISE DE IMAGEM
A imagem enquanto parte do processo de aprendizagem é algo naturalizado
nos procedimentos de educação desde a fase infantil do ser humano. As próprias
imagens muitas vezes servem como suporte para a aprendizagem de escrita e da
fala, o que, de acordo com Joly (1996), torna a leitura de imagem uma prática
natural. No presente trabalho, iremos decifrar as significações além dessa aparente
naturalidade, usando como metodologia a análise de imagem proposta por Joly
(1996). De acordo com a autora:
Interpretar uma mensagem, analisá-la, não consiste certamente em tentar
encontrar ao máximo uma mensagem preexistente, mas em compreender o
que essa mensagem, nessas circunstâncias, provoca significações aqui e
agora, ao mesmo tempo que se tenta separar o que é pessoal do que é
coletivo. (JOLY, 2006, p.44)
Com base nesse pressuposto, pretendemos efetuar a análise de imagem do
50
rock nos anos 2000, tendo em vista o lado da emissão, na busca por encontrar
significações que são transmitidas. Seguindo as funções da análise de imagem,
destacadas por Joly:
Demonstrar que a imagem é de fato uma linguagem, uma linguagem
específica e heterogênea; que, nessa qualidade, distingue-se do mundo real
e que, por meio de signos particulares dele, propõe uma representação
escolhida e necessariamente orientada; distinguir as principais ferramentas
dessa linguagem e o que sua ausência ou sua presença significam;
relativizar sua própria interpretação, ao mesmo tempo que se compreendem
seus fundamentos: todas garantias de liberdade intelectual que a análise
pedagógica da imagem pode proporcionar. (JOLY, 1996, p. 48)
Também devemos levar em consideração a afirmação da autora (JOLY, 1996,
p. 99) de que “para ver as formas organizadas em uma mensagem visual e
compreender a interpretação a que induzem, é preciso esforçar-se para esquecer o
que representam e contemplá-las por si mesmas, com atenção”.
A técnica será aplicada através da categorização proposta por Joly (1996),
onde optamos pelas divisões que se fazem mais relevantes para o presente objeto
de estudo, a saber:
- Ângulo de tomada e escolha da objetiva: reforça ou contradiz a impressão
de realidade vinculada ao suporte fotográfico. Joly (1996) aponta que os mais
comuns são ploongé (de baixo), contre-ploongé (de cima) e o chamado pela autora
de: à altura do homem e de frente (de frente). Os dois primeiros evidenciam o
operador da câmera, isso é, deixam mais evidente a sensação de que existe um
intermediário entre a foto e o receptor – no caso, o fotógrafo.
- Enquadramento: corresponde ao tamanho da imagem. O enquadramento
pode ser mais fechado ou mais amplo.
- Composição e diagramação: é a escolha da posição dos elementos na
construção da imagem. Tem o papel de hierarquização da visão.
- Cores e iluminação: é uma interpretação antropológica, que exerce o efeito
psico-fisiológico sobre o espectador, uma vez que é vista pela ótica, mas sentida
psiquicamente, podendo remeter ao natural a tons mais frios ou mais quentes.
- A textura: também pode estar presente em imagem de duas dimensões. Se
refere a sinestesia, a sensações não visuais (táteis, auditivas, olfativas) que são
transmitidas através do visual.
Também propomos mais duas categorias relevantes para essa pesquisa:
51
- Ambientação: é o cenário onde a foto foi produzida.
- Personagens e atitudes: os fotografados com sua pose, comportamento,
figurino e direção cênica.
Em nosso estudo, faremos uma apropriação da metodologia proposta por Joly
utilizando algumas categorias distintas - como a autora propõe - mas agrupando
outras, como o caso do enquadramento e da diagramação. Este agrupamento
mantém a proposta metodológica e facilitará nossa análise a seguir.
4.2 OBJETIVO DA ANÁLISE
Como exposto anteriormente, o presente estudo busca analisar a imagem do
rock nos anos 2000 através da imagem, com o intuito de compreender se realmente
existe um desvirtuamento do estilo nessa época ou se os elementos da gênese do
rock ainda se fazem presente nos anos 2000. Tendo isto como objetivo geral,
delimitamos essa análise de imagem ao seguinte: verificar através de fotografias de
divulgação, produzidas entre 2000 e 2009, quais são os padrões visuais que se
repetem nas bandas Arctic Monkeys, The Libertines e The Strokes e que fazem
parte da construção simbólica do rock nas bandas do passado.
A referida escolha dessas bandas não foi efetuada de maneira aleatória. O
critério utilizado teve como referência a lista dos 100 melhores álbuns da década22
de acordo com a revista NME23 americana, especializada em música. Usando como
recorte bandas com álbum de estreia lançado entre 2000 e 2009, que ocupam as
primerias posições da lista24.
São as três bandas, de acordo com suas posições: The Strokes, (1°), com “Is
This It” (RCA, 2001), Libertines, (2°), com “Up the Bracket” (ROUGH TRADE, 2002)
e Arctic Monkeys, (4º), com “Whatever People Say I Am, That's What I'm Not, Not”
(DOMINO, 2006). Na sequência efetuaremos uma breve revisão bibliográfica de
cada uma dessas bandas, bem como aspectos da crítica às mesmas.
22 Lançada em 2009, a lista é resultado de uma votação que inclui colaboradores da revista e
uma seleção de músicos e figuras da indústria musical. Fonte: <http://www.nme.com/list/the-top-100-
greatest-albums-of-the-decade/158049/page/10> Último acesso em 15 de outubro de 2013.
23 Abreviatura de New Music Express. A revista estabeleceu a “primeira lista regular de modo
lógico e exato referente à vendagem de gravações na Grã-Bretanha” (FRITH, 1981, p. 167). Hoje o
veículo se autointitula a fonte de notícias sobre música número um no mundo. Possui publicação
mensal com foco no rock e na música alternativa. Para mais informações: <http://www.nme.com>
Último acesso em 15 de outubro de 2013.
24 Na 3° posição temos a banda Primal Screm, que teve seu primeiro álbum lançado em 1987.
52
4.3 THE STROKES, THE LIBERTINES E ARCTIC MONKEYS: UM BREVE
HISTÓRICO
Para compreender, ainda que brevemente, estas três bandas utilizaremos
como referência a biografia de cada uma e a crítica desses três álbuns no site da
própria NME (2009), empregando também como referência o guia da música
independente, a Pitchfork25.
De acordo com a NME (2013c), The Strokes (Fig. 17) é uma banda americana
formada em 1998 em Nova Iorque, composta por cinco integrantes: Julian
Casablancas (vocais), Nick Valensi (guitarra/vocais), Albert Hammond, Jr.
(guitarra/backing vocal), Nikolai Fraiture (baixo) e Fabrizio Moretti
(bateria/percussão). É uma das bandas que contribuíram para a revitalização do
rock de garagem no século XXI. O álbum de estreia da banda foi lançado em 2001 e
foi aclamado pela crítica. A banda foi classificada como número 199 na Rolling
Stones “500 Maiores Álbuns de Todos os Tempos” e número 8 na revista Rolling
Stone “100 melhores álbuns estreia de todos os tempos”26.
Figura 17 – O estilo do The Strokes
Fonte: <http://www.lastfm.com.br/music/The+Strokes/+images/27554>.
Último acesso em 3 de outubro de 2013
25 Publicação online estadunidense. Fonte: <http://pitchfork.com/> Acesso em: 15/10/2013.
26 Fonte: <http://www.nme.com/artists/the-strokes#biography> Acesso em: 19/10/2013.
53
Segundo Schreiber (2001, tradução nossa), “eles são uma banda de rock, puro
e simples”. De acordo com o autor, o álbum de estreia dos Strokes atingiu um
equilíbrio entre os dois extremos da música rock: sentimentalismo e apatia. Para
Robinson (2005, tradução nossa): “o álbum traz canções tocantes, comoventes
engraçadas, melodiosas, bem escritas e tocadas por pessoas em ótimos trajes”.
Por sua vez a banda The Libertines (Fig. 18) é uma banda britânica formada
em 1997 em Londres, de acordo com NME (2013b). Centrada na dupla: Carl Barat
(vocais/guitarra) e Pete Doherty (vocais/guitarra), a banda também conta com John
Hassall (baixo) e Gary Powell (bateria), e teve seus dois álbuns produzidos por Mick
Jones, da banda punk britânica The Clash. Assim como o The Strokes, a banda fez
parte da revitalização do rock de garagem e foi responsável por liderar o movimento
no Reino Unido.
54
Figura 18 - Atitude junkie do Libertines
Fonte: <http://www.nme.com/reviews/the-libertines/7537/photo/2#28>.
Último acesso em 3 de outubro de 2013
Seu álbum de estreia foi lançado em 2002, segundo Carr (2003) carrega
décadas de tradição rock, se valendo do blues e de alguns riffs ao estilo de Chuck
Berry. Na opinião do autor, eles geraram uma riqueza para o rock, sendo
responsáveis por abordar um vasto leque de atitudes com igual proficiência.
Intercalando emoção, explosão e rebeldia em músicas que se fragmentam e ao
mesmo tempo, parecem se encaixar. Segundo a NME (2013a), diante de inúmeros
conflitos internos decorrentes de vícios de Doherty em drogas e de problemas de
relacionamento entre os integrantes, a banda se dissolveu em 2004, reunindo-se
para alguns shows em 2010.
Já a banda Arctic Monkeys (Fig. 19) foi formada em 2002 em Sheffield, na
Inglaterra, conforme a NME (2013a). O grupo é composto por Alex Turner
(vocais/guitarra), Jamie Cook (guitarra), Nick O'Malley (baixo/backing vocals) e Matt
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A imagem do rock dos anos 2000

  • 1. 0 PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL FACULDADE DE COMUNICAÇÃO SOCIAL DEPARTAMENTO DE PUBLICIDADE E PROPAGANDA KARLA SANCHES WÜNSCH A IMAGEM DO ROCK DOS ANOS 2000 Porto Alegre 2013
  • 2. 1 KARLA SANCHES WÜNSCH A IMAGEM DO ROCK DOS ANOS 2000 Trabalho de conclusão de curso de graduação apresentado à Faculdade de Comunicação Social da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Comunicação Social, habilitação em Publicidade e Propaganda. Orientador: Prof. Me. Ticiano Paulo Porto Alegre 2013
  • 3. 2 KARLA SANCHES WÜNSCH A IMAGEM DO ROCK DOS ANOS 2000 Trabalho de conclusão de curso de graduação apresentado à Faculdade de Comunicação Social da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Comunicação Social, habilitação em Jornalismo. Aprovada em: ____de__________________de________. BANCA EXAMINADORA: ______________________________________________ Dr. André Fagundes Pase ______________________________________________ Dr. Roberto Tietzmann _____________________________________________ Orientador: Prof. Me. Ticiano Paulo Porto Alegre 2013
  • 4. 3 AGRADECIMENTOS Ao professor e Me. Ticiano Paludo pelos ensinamentos e pelas conversas inspiradoras ao longo da orientação desse trabalho. Assim como todos professores e funcionários da Faculdade de Comunicação Social da PUCRS. Aos amigos, que sabem que o são e que sempre estiveram ao meu lado dando sentido e interessância a faculdade e a vida: Fagner Deport, Giovani Giordani, Luciana Negretto, Thiago Padilha, Gabriela Lunardi, Mariana Lopes e Thuanny Baretta. A minha metade desde que eu também era pequena, Cristiane Moro. Ao Paul Friedlander, autor de suma importância para esse trabalho, que com seu livro Rock and Roll: Uma história social deu os rumos inicias da pesquisa. Ao Marcelo Valadão, por ter me dado este livro, mas também por todo apoio e amor ao longo do processo. A Cristiane Lisbôa e Tomás Bello pela paciência e pelas risadas que muito me ensinaram sobre música e escrita, dentro e fora da Revista Noize. À letra “K” do meu nome, por sempre me lembrar da importância do senso crítico e da luta por um mundo melhor e mais justo. Ao colo de toda família, sempre junta, sempre a melhor. Especialmente dedico esse trabalho aos meus maiores exemplos: Dolores, Paulo e Marina. À vocês três o meu maior e mais grato amor.
  • 5. 4 A sabedoria está na verdade, e não em sua aparência. Não se pode recordar com memória alheia. Os homens registrarão, mas não recordarão. Repetirão, mas não viverão. Serão informados, mas não saberão. (GALEANO, 2008, p.15)
  • 6. 5 RESUMO Ao longo de seis décadas de história, o rock passou por diversas transformações, que agregaram novas características e derivações do gênero, tornando-o múltiplo em termos musicais, mas único em sua essência. O presente trabalho busca estudar a imagem do rock nos anos 2000, com o intuito de compreender se existe um desvirtuamento do estilo nessa época ou se os elementos da gênese do rock ainda se fazem presentes no chamados "anos 2000" (período que compreende os anos de 2000 a 2009). Para tanto, primeiro faremos um levantamento bibliográfico que aborda a história do rock, desde sua origem até a atualidade; depois, através da coleta de imagens das fotos de divulgação das bandas Arctic Monkeys, The Libertines e The Strokes, representantes do rock nos anos 2000, faremos uma análise comparativa entre elas e demais imagens promocionais de bandas do gênero de outros períodos, verificando o que se mantém e o que se altera na proposta visual. Ao final, será possível constatar que existem elementos base que seguem quase imutáveis desde a gênese do rock até os anos 2000. Palavras-chave: rock, imagem, anos 2000, identidade, rebeldia.
  • 7. 6 ABSTRACT Over the course of six decades, there has been many changes in rock music, which brought with them new characteristics and created derivations from the genre, rendering it multiple in musical terms, but unique in its essence. This text will study the image of rock in the 2000s, with the intent of discovering if there exists a misrepresentation of this particular musical style or if its core elements were still present in the last decade (a period that ranges from 2000 to 2009). To make this possible, we will first do a bibliographic research concerning the history of rock, from its origins till the present days; afterwards, having collected promotional visual material from rock bands Arctic Monkeys, The Libertines and The Strokes, key figures of the 2000 scene, we will do a comparative analysis between them and other bands' promotional material, from a broad range of periods, in order to spot which elements remain unchanged and which are altered in the visual identity. Finally, this will allow us to ascertain which elements of rock music remain unalterable since its origin till the 2000s. Key-words: rock, image, 2000s, identity, rebellion
  • 8. 7 LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Bill Haley and his Comets em performance ao vivo .........................16 Figura 2 - A imagem marcante do ator James Dean ........................................17 Figura 3 - O ritmo do Chuck Berry ....................................................................18 Figura 4 - Reprodução de cena do clipe de “Jailhouse Rock”, de Elvis Presley ..........................................................................................................................20 Figura 5 - O início dos Beatles: otimismo e ingenuidade ..................................23 Figura 6 - Capa do álbum Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band ..................25 Figura 7 - The Rolling Stones: ritmos negros e sensualidade...........................26 Figura 8 - The Who: apresentação vibrante......................................................27 Figura 9 - Robert Plant e Jimmy Page, do Led Zeppelin ..................................31 Figura 10 - A extravagância do New York Dolls................................................32 Figura 11 - Os Sex Pistols: música e atitude ....................................................34 Figura 12 - The Cure: o lado sombrio do punk .................................................35 Figura 13 - Joy Division e a melancolia do punk...............................................36 Figura 14 - Chesterfield Kings nos anos 1980: revivendo os anos 1960 ..........37 Figura 15 - The Fuzztones................................................................................38 Figura 16 - Composição de reproduções do videoclipe Reptilla, da banda ......45 Figura 17 - O estilo do The Strokes ..................................................................52 Figura 18 - Atitude junkie do Libertines.............................................................54 Figura 19 - Os mocinhos do Arctic Mokeys ......................................................55 Figura 20 - The Strokes ....................................................................................57 Figura 21 - The Strokes ....................................................................................57 Figura 22 - The Libertines.................................................................................58 Figura 23 - The Libertines.................................................................................58 Figura 24 - Arctic Monkeys ...............................................................................59 Figura 25 - Arctic Monkeys ...............................................................................59 Figura 26 - The Beatles ....................................................................................60 Figura 27 - The Rolling Stones .........................................................................60 Figura 28 - The Rolling Stones .........................................................................61 Figura 29 - The Libertines.................................................................................62 Figura 30 - The Strokes ....................................................................................62 Figura 31 - Arctic Monkeys ...............................................................................63
  • 9. 8 Figura 32 - The Rolling Stones .........................................................................64 Figura 33 - The Rolling Stones .........................................................................64 Figura 34 - The Rolling Stones .........................................................................65 Figura 35 - The Strokes ....................................................................................66 Figura 36 - The Strokes ....................................................................................66 Figura 37 - The Libertines.................................................................................67 Figura 38 - The Libertines.................................................................................67 Figura 39 - Arctic Monkeys ...............................................................................68 Figura 40 - Arctic Monkeys ...............................................................................69 Figura 41- Joy Division .....................................................................................70 Figura 42 - Joy Division ....................................................................................70 Figura 43 - The Strokes ....................................................................................71 Figura 44 - The Strokes ....................................................................................72 Figura 45 - The Libertines.................................................................................72 Figura 46 - The Libertines.................................................................................73 Figura 47 - Arctic Monkeys ...............................................................................73 Figura 48 - Arctic Monkeys ...............................................................................74 Figura 49 - The Cure.........................................................................................75 Figura 50 - The Cure.........................................................................................76 Figura 51- The Libertines..................................................................................77 Figura 52 - The Libertines.................................................................................77 Figura 53 - New York Dolls ...............................................................................78 Figura 54 - The Cure.........................................................................................78 Figura 55 - Arctic Monkeys ...............................................................................79 Figura 56 - Arctic Monkeys ...............................................................................79 Figura 57 - The Strokes ....................................................................................80 Figura 58 - The Strokes ....................................................................................81 Figura 59 - The Libertines.................................................................................82 Figura 60 - The Libertines.................................................................................83 Figura 61 - Arctic Monkeys ...............................................................................83 Figura 62 - Arctic Monkeys ...............................................................................84 Figura 63- The Beatles .....................................................................................85 Figura 64 - The Rolling Stones .........................................................................86 Figura 65 - Joy Division ....................................................................................86
  • 10. 9 Figura 66 - Ramones ........................................................................................87 Figura 67 - Sex Pistols......................................................................................88 Figura 68 - The Strokes ....................................................................................89 Figura 69 - The Strokes ....................................................................................90 Figura 70 - The Libertines.................................................................................90 Figura 71 - The Libertines.................................................................................91 Figura 72 - Arctic Monkeys ...............................................................................91 Figura 73 - Arctic Monkeys ...............................................................................92 Figura 74 - The Rolling Stones .........................................................................93 Figura 75 - The Kinks........................................................................................94 Figura 76 - The Kinks........................................................................................94 Figura 77 - The Cure.........................................................................................95 Figura 78 - The Strokes ....................................................................................96 Figura 79 - The Strokes ....................................................................................96 Figura 80 - The Libertines.................................................................................97 Figura 81 - The Libertines.................................................................................97 Figura 82 - Arctic Monkeys ...............................................................................98 Figura 83 - Arctic Monkeys ...............................................................................98 Figura 84 - The Beatles ....................................................................................99 Figura 85 - The Beatles ....................................................................................99 Figura 86 - The Strokes ..................................................................................100 Figura 87 - The Strokes ..................................................................................101 Figura 88 - The Libertines...............................................................................101 Figura 89 - The Libertines...............................................................................102 Figura 90 - Arctic Monkeys .............................................................................103 Figura 91 - Arctic Monkeys .............................................................................103 Figura 92 - Led Zeppelin.................................................................................104 Figura 93 - Led Zeppelin.................................................................................104 Figura 94 - Ramones ......................................................................................105
  • 11. 10 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO............................. ..........................................................................11 2 A GÊNESE DO ROCK............................................................................................13 2.1 AS RAÍZES DO ROCK AND ROLL.....................................................................13 2.2 A EXPLOSÃO DO ROCK AND ROLL CLÁSSICO NOS ESTADO UNIDOS (1945- 1955).........................................................................................................................14 2.3 A INVASÃO BRITÂNICA (1963-1964) ................................................................21 2.4 OS SOLOS DE GUITARRA (1966-1970)............................................................29 2.5 A TERCEIRA EXPLOSÃO DO ROCK (1969-1978) ............................................30 2.6 GLAM ROCK E PUNK ROCK (ANOS 1970).......................................................32 2.7 PÓS-PUNK (1977-1980) .....................................................................................34 2.8 GARAGE ROCK REVIVAL (1980-1990) .............................................................36 3 CENÁRIOS E CONTEXTOS DO ROCK NOS ANOS 2000...................................39 3.1 PÓS-MODERNIDADE.........................................................................................39 3.2 A INDÚSTRIA CULTURAL..................................................................................41 3.3 IDENTIDADE E ROCK NOS ANOS 2000 ...........................................................43 3.4 A IMAGEM ..........................................................................................................47 4. A IMAGEM DO ROCK NOS ANOS 2000 .............................................................49 4.1. A ANÁLISE DE IMAGEM ...................................................................................49 4.2 OBJETIVO DA ANÁLISE.....................................................................................51 4.3 THE STROKES, THE LIBERTINES E ARCTIC MONKEYS: UM BREVE HISTÓRICO ..............................................................................................................52 4.4 A IMAGEM DO ROCK DOS ANOS 2000 ATRAVÉS DAS BANDAS THE STROKES, THE LIBERTINES E ARCTIC MONKEYS..............................................56 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS..................... ............................................................108 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.......................................................................111
  • 12. 11 1 INTRODUÇÃO Música é comunicação. Uma linguagem universal capaz de transmitir uma mensagem, emocionar, movimentar e expressar um sentimento individual e da sociedade. O rock, desde seu princípio, foi responsável por catalisar rebeldia, transgressão e busca por mudança, fazendo com que jovens no mundo inteiro se identificassem. Transpassando questões musicais de letra e de ritmo, o comportamento e a imagem sempre foram características marcantes desse estilo musical. Quando pensamos no momento atual, de acordo com Monteiro (2006, p.42), vemos que “é comum proclamar a morte do rock, seu vazio, e perda de autenticidade”. Nesse mesmo contexto em que o rock começa a ser questionado, vivemos uma supervalorização da imagem, onde o visual, de acordo com Amaral (2002) define a marca da nossa época, e como aponta Debord (2003 p.18), “as simples imagens tornam-se seres reais e motivações suficientes para um comportamento hipnótico”. Tendo em vista esse questionamento acerca da ruptura do rock e a importância da imagem como elemento de ordem simbólica para compreensão da realidade, o objetivo do presente trabalho é analisar a imagem do rock dos anos 2000 (período que compreende os anos entre 2000 e 2009), afinal, como incita Maffessoli (1996, p. 160), “ora, como aprender o estilo de uma época, se não for através do que se deixa ver?”. Para tal iremos verificar códigos visuais comuns às bandas de rock dos anos 2000, através de fotografias de divulgação produzidas nessa época, identificando padrões visuais que se repetem nas bandas Arctic Monkeys, The Libertines e The Strokes e que fazem parte da construção simbólica do rock nos grupos do passado. Para isso são necessários três capítulos, além da presente introdução e das considerações finais. No primeiro momento usamos como metodologia o levantamento de dados. Com essa técnica de pesquisa, no próximo capítulo apresentaremos uma breve retrospectiva da história do rock, desde seu surgimento no final da década de 1940 até o final da década de 1990, na busca pela compreensão da gênese do rock, isto é: como surgiu, quem foram seus principais artistas e movimentos, quais as características musicais e comportamentais que o sustentaram ao longo de seis décadas. Usaremos principalmente como referencial
  • 13. 12 teórico os autores Friedlander (2002), Muggiati (1985) e Goffman e Joy (2007). No terceiro capítulo iremos estudar o contexto do recorte do objeto de pesquisa deste trabalho. Na busca pela compreensão dos aspectos da pós-modernidade e da ascensão da cultura de consumo, através da produção em massa e a indústria musical, usaremos como referencial teórico Harvey (1992), Featherstone (1995) Lipovetsky (2004), Adordo (1985) e Debord (2003). Vale ressaltar a importância do estudo da cultura de mídia, como apontam Freire Filho e Herschmann: A sociedade vai se dando conta não só da dificuldade de entender as mudanças por que passa o mundo atualmente (em função, entre outras coisas, de uma presença mais efetiva das novas tecnologias digitais interativas no cotidiano), mas também da relevância da indústria do entretenimento e da cultura de mídia na organização da vida social. Em outras palavras, devido ao seu papel condicionante e estruturante, analisar tendências nos processos comunicacionais vem se configurando, cada vez mais, em uma questão fundamental para a sociedade contemporânea (FREIRE FILHO; HERSCHMANN, 2007, p. 8). Também nesse capítulo esclareceremos aspectos da mídia, identidade e rock nos anos 2000, bem como a compreensão da imagem, sua contextualização e sua importância. Para esses aspectos, iremos utilizar os estudos de Herschmann (2007) e Cardoso Filho e Janotti Júnior (2006), Amaral (2002) e Maffesoli (2006) e Joly (1996). No segundo momento, empregaremos como metodologia a análise de imagem proposta por Joly (1996). Através dela verificaremos as fotografias de divulgação (produzidas até 2009) e os códigos visuais que se repetem entre as bandas de Arctic Monkeys, The Libertines e The Strokes. Na análise pretendemos perceber se esses modelos estão baseados nas imagens da gênese do rock e se carregam as principais características do estilo, a saber: identificação, rebeldia e contradição. Supomos que as representações sejam basicamente uma repetição dos signos da década passada, que funcionam mais como uma forma de gerar identificação da banda como gênero e do espectador com a banda do que prática de estilo de vida efetivo.
  • 14. 13 2 A GÊNESE DO ROCK O rock and roll surgiu sob a influência de décadas de música. Desde seu aparecimento em meados dos anos 1940, o gênero carregou um forte espírito de rebeldia e foi cultuado por inúmeros jovens. Ao longo de sua história, ídolos foram chamados de reis, monstros e deuses e viajaram em seus próprios aviões, famosos mundialmente, enlouquecendo multidões, influenciando na moda e no comportamento. Neste capítulo serão abordados os aspectos históricos do rock e suas transformações ao longo de décadas, a fim de conferir a visibilidade da trajetória desse estilo musical, com seus personagens e suas características. No primeiro momento será feita uma breve abordagem sobre as raízes do rock and roll. Em seguida, estudaremos suas transformações através dos anos, com a seguinte divisão de períodos: o rock and roll clássico; a invasão inglesa; a era dos guitarristas; explosão do rock dos anos 1970; o glam rock e o punk rock; o pós-punk e o garage rock revival. Como referencial teórico utilizaremos os estudos de Cardoso Filho e Janotti Júnior (2006), Erlewine (2013), Ferri e Alice (1995), Friedlander (2002), Mcneil (2004), Muggiati (1985), Goffman e Joy (2007), Ruhlmann (2012) e Unterberger (2013). 2.1 AS RAÍZES DO ROCK AND ROLL A música afro-americana foi, de forma geral, a maior influência, com “seus ritmos sincronizados, a voz rouca e sentimental e as vocalizações de chamado-e- resposta, características dos trabalhadores negros” (FRIEDLANDER, 2002, pg. 31). O blues1 rural e urbano pode ser considerado a fonte prima do rock and roll, uma vez que foi a partir de sua ramificação, o rhythm’n’blues2,que se iniciou o estilo musical 1 O blues é um estilo musical de origem afro-americana, que se apresenta como principal forma de expressão dos escravos diante da sociedade colonial na qual viviam. Segundo Muggitati (1995), o blues mistura gritos com canções de trabalho e de ninar, harmonizadas com hinos religiosos e possuindo estrutura de balada. Em suas letras, o retrato de seu cotidiano. Um exemplo é a canção Dry Well Blues, na qual Charley Patton canta “I ain’t got no money and I sure ain’t got no hope”, “não tenho dinheiro e tenho certeza que não tenho esperança” (tradução nossa) <http://www.youtube.com/watch?v=KH84ejtez_I>. 2 Rhythm’n’blues, ou R&B, como também é conhecido, é um estilo de música popular negra, tocada nas rádios negras no final de 1940 e início de 1950, que mais diretamente influenciou o surgimento do rock and roll. O termo rock and roll era empregado com frequência em suas letras. Um
  • 15. 14 do presente estudo. Também aspectos das sonoridades brancas, folk e country3, sendo elas próprias uma fusão com a cultura negra, seriam importantes para o desenvolvimento do rock and roll (FRIEDLANDER, 2002). 2.2 A EXPLOSÃO DO ROCK AND ROLL CLÁSSICO NOS ESTADO UNIDOS (1945- 1955) O rock and roll teve sua primeira manifestação intensa entre os anos de 1945 e 1955. Segundo Muggiati (1985), “tudo começou quando o mundo ainda se refazia da maior e mais sangrenta guerra da História. Uma guerra que custara milhões de vidas” (MUGGIATI, 1985, p. 7). A paz durou pouco tempo, e logo se instalaria a duradoura disputa entre Estados Unidos e União Soviética, a Guerra Fria. Os temores do povo americano de um eventual conflito bélico eram abafados pela prosperidade econômica e também pelos avanços tecnológicos. Como conta o autor (MUGGIATI, 1985, p. 9), “o consumismo era o melhor antídoto contra o comunismo e renascia com sua força multiplicada”. Muitas pessoas achavam um sentido para viver em suas compras, periodicamente se renovando com “o modelo do ano”. No entanto, a satisfação não atingia todas as camadas da sociedade. Minorias negras, imigrantes mexicanos e porto-riquenhos, que também haviam sofrido com a guerra, não compartilhavam o enriquecimento de setores da sociedade americana. Ao contrário, eram marginalizados e discriminados. Ao mesmo tempo, a “geração silenciosa”, nome dado aos nascidos logo antes do ataque a Pearl Harbor, que culminaria a entrada dos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial, nos turbulentos anos 1950, ainda que em condições sociais mais elevadas, sentia-se deslocada. A culpa diante das desigualdades sociais a sufocava. E o American Way of Life4 não tinha o mesmo impacto apaziguador para ela (MUGGIATI, 1985). É nesse contexto, e em meio às inovações tecnológicas, que se criam exemplo é uma canção de 1947 que Wild Bill Moore, intitulado "We’re Gonna Rock, We’re Gonna Roll." <http://www.youtube.com/watch?v=u0rncpXErKY> 3 A música country surgiu na classe trabalhadora do sul dos Estados Unidos, e entrou para a indústria da música no inicio de 1920, com suas primeiras gravações comerciais. Seus temas giravam em torno do estilo de vida, sentimentos e preocupações dessa classe. Cantada com sotaque sulista por cantores de pouca técnica, geralmente é acompanhada por violão com cordas de nylon, e por vezes também são comuns instrumentos como o violão com cordas de aço, guitarra elétrica, piano e bateria (CUSIC, 2008). 4 Refere-se ao estilo de vida dos norte-americanos, surgido no século XVII e muito presente até então. Tem por características o patriotismo, o individualismo e o consumismo.
  • 16. 15 condições facilitadoras para o crescimento da música jovem, como apontam Cardoso Filho e Janotti Júnior (2006). Se nos EUA, era necessário pagar 250 dólares por um rádio fonógrafo que ficava na sala como um bem preciso, a entrada dos rádios e toca-discos portáteis tornou a audição musical mais acessível financeiramente. O custo estava reduzido para uma média de 13 dólares, o que possibilitava a compra de até mais de um aparelho por família. Esse advento trouxe a possibilidade de os adolescentes ouvirem música em seus quartos, permitindo- lhes explorar novos estilos, não somente os impostos por seus pais. Como relatam Ferri e Alice (1995, p. 10), “a juventude já não se entusiasma mais com Sinatra e companhia”. Segundo Friedlander (2002, p. 23), nesse cenário musical norte americano dos anos 1950, ao mesmo tempo em que as paradas de sucesso eram dominadas pelos hits mainstream5, muitos jovens começavam a experimentar “uma nova e vibrante música underground 6 chamada rock and roll”. Em termos de musicalidade, o rock and roll não era complexo. Uma de suas características principais era a emoção na voz e a batida marcante, mais pesada que o usual. Os jovens sentiam suas histórias cotidianas contempladas nas letras e no ritmo bastante propício para movimentações corporais. Muitos viam ali uma forma de extravasar a inquietude — uma expressão de rebeldia. Eram tempos de cultura conservadora com traços rígidos. A política estava dominada pelos conservadores republicanos, e no campo da música quem tomava conta era o “bom moço” Mitch Miller, dono de suaves melodias (FRIEDLANDER , 2002). Assim como no rock and roll, os conflitos da juventude foram amplamente retratados no cinema. Como aponta Muggiati (1985), os tipos “delinquente juvenil” e o “rapaz de boa família” que se converte ao mal foram imortalizados pelos filmes O Selvagem (The Wild One) de László Benedek (1953), Juventude Transviada (Rebel Without a Cause), de Nicholas Ray (1955) e Sementes da Violência (Blackboard Jungle), de Richard Brooks (1955). Em especial este último é destacado pelo autor 5 “O mainstream (que pode ser traduzido como ‘fluxo principal’) abriga escolhas de confecção do produto reconhecidamente eficientes, dialogando com elementos e obras consagradas e de sucesso relativamente garantido. Ele também implica uma circulação associada a outros meios de comunicação de massa, como a TV (através de videoclipes), o cinema (as trilhas sonoras) ou mesmo a internet (recursos de imagens, plug ins, wallpapers)” (CARDOSO FILHO; JANOTTI JÚNIOR, p. 18 – grifos do autor). 6O princípio do underground é estar à margem da indústria cultural homogeneizada. Para tanto, segue um padrão de produção e circulação particular, que se firma justamente nessa negação da ordem vigente, o mainstream (CARDOSO FILHO; JANOTTI JÚNIOR, 2006).
  • 17. 16 (MUGGIATI, 1985, p. 11), pois retrata “toda carga de hostilidade no relacionamento da juventude marginalizada com o Sistema”. Esse comportamento rebelde pode ser percebido em uma cena de Sementes da Violência em que os jovens quebram uma coleção inteira de discos de jazz do professor. Na trilha da destruição, a música que abre o filme, Rock Around The Clock 7, é considerada a primeira gravação de rock and roll da história. O hit de Bill Haley se tornou um verdadeiro hino da geração, mantendo-se em primeiro lugar nas paradas e nos discos mais vendidos. Bill Haley (Fig. 1), de acordo com Friedlander (2002), foi o primeiro astro branco do rock and roll. Os rebeldes da época adotaram o rock and roll para si, bem como a imagem de James Dean (Fig. 2), a maior estrela do cinema americano dos anos 1950, tornou-se um símbolo, isto é, estabeleceu um “modelo visual e ideológico” (MUGGIATI, 1985 p. 11), ganhando fãs e seguidores por diversos países. 7 Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=N-qjc17KEsc>. Acesso em: 2/09/2012. Figura 1 - Bill Haley and his Comets em performance ao vivo Fonte: < http://bit.ly/1bMxtm8>. Último acesso em 2 de setembro de 2012
  • 18. 17 O rock and roll, em seus primeiros acordes, desdobrou-se em duas gerações. A primeira, muito popular nos anos 1953 a 1955, era composta predominantemente por negros: Fats Domino, Chuck Berry (Fig. 3), Little Richard e Bill Haley. Uma mistura simplificada dos sons negros e brancos acompanhados por um forte e marcado ritmo de bateria. Figura 2 – A imagem marcante do ator James Dean Fonte: <http://bit.ly/15Vc4GI>. Último acesso em 2 de setembro de 2012.
  • 19. 18 Essa geração trazia como temática das letras a óptica adolescente do pós- guerra, celebrava as experiências e o amor, e na coreografia exibia passos obscenos - para a época - fazendo alusão ao sexo e ao próprio rock and roll. Como pode ser observado nesse trecho musical da época: Apenas me deixe ouvir um pouco de rock and roll de qualquer jeito que você escolher / Ele tem uma batida por trás, você não pode perder / De qualquer modo velho que você escolher / Tem que ser rock and roll / se você quiser dançar comigo.8 Segundo Friedlander (2002), além do caráter rebelde, a princípio a oposição dos adultos ao rock também estava ligada a questões raciais, uma vez que naquele período a segregação era forte e apoiada por lei. Já a segunda geração do rock and roll clássico surge no começo de 1956 e atinge sucesso comercial ainda maior que a sua antecessora. Como explicita Friedlander (2002), a leva era composta apenas por jovens brancos que haviam crescido ao som country de Hank Willians e, mais tarde, seriam atingidos pelo blues 8 Trecho da canção “Rock and Roll Music”, lançada por Chuck Berry em 1957. Tradução livre da autora. Figura 3 – O ritmo de Chuck Berry Fonte: http://chuckberry.com/photo- gallery/. Último acesso em 2 de setembro de 2012.
  • 20. 19 e pelo rhythm and blues. Suas músicas seriam uma fusão dessas memórias com o rockabilly e o próprio rock primitivo. Fizeram parte dessa geração os cantores Jerry Lee Lewis, Little Richard e Elvis Presley, que passou a ser designado de rei do rock. Como descreve Friedlander (2002), a temática das letras ganha um caráter mais ingênuo, voltando-se para o amor e para a rejeição. A rebeldia, no entanto, continua, através de performances escandalosas o suficiente para “proporcionar ao seu público juvenil uma gratificante projeção da rebeldia” (FRIEDLANDER, 2002, p. 91). Um exemplo pode ser visto na letra dessa canção do Elvis Presley: Um pouco menos de conversa e um pouco mais de ação, por favor / Esse aborrecimento não está me satisfazendo (...) / Querida, feche seus olhos e ouça a música/ soando através da brisa de verão / É uma ótima noite e eu posso te ensinar como usá-la.9 Na época, “a velha guarda, porém, reage e taxa o novo som de demoníaco e incontrolável” (FERRI; ALICE, 1995, p. 10). De acordo com os autores, naquela altura a repressão paternal era inútil. O comportamento da nova geração já estava renovado, a forma de se vestir e expor suas ideias mudara. E o que a princípio era uma rebeldia domiciliar aumenta seu âmbito, e os valores vigentes da sociedade passam a ser contestados. Um exemplo é o grande ídolo da época, que assim como muitos jovens, via dificuldade em se adaptar os padrões da sociedade. Elvis Presley era a representação do rebelde sem causa. Abandou a escola e começou a trabalhar, mas foi demitido por brigar no serviço. Após esses acontecimentos, gravou, por quatro dólares, seu primeiro disco, de apenas um exemplar (MUGGIATI, 1985). O sulista de Mississipi logo encontraria o sucesso com os blusões de couro negro e as jaquetas brancas cravejadas de pedrarias. Na imagem a seguir, observam-se dois pontos importantes do cantor: a coreografia, que envolvia o corpo todo, e o figurino, de calça jeans justa e jaqueta. 9 Trecho da canção “Little less conversation”, lançada por Elvis Presley em 1968. Tradução livre da autora.
  • 21. 20 Figura 4 - Reprodução de cena do clipe de “Jailhouse Rock”, de Elvis Presley Fonte: <http://www.youtube.com/watch?v=qDID_E0FDUU> Último acesso em 2 de setembro de 2012. Como aponta o autor, “Elvis Presley refletiu, mais do que qualquer outro músico, as contradições do rock and roll. Seus quarenta e dois anos consumidos numa vida intensa englobam contrastes dramáticos” (MUGGIATI, 1985, p.32). Porém, o cantor muda o rumo de sua carreira: A partir do seu terceiro show na televisão americana, em janeiro de 1957, a imagem de The Pelvis (como era chamado) só poderia ser mostrada da cintura para cima, pois sua ginga era considerada obscena. Mas a partir do momento em que se tornou o novo rei da canção nos Estados Unidos, Elvis perdeu a vida própria e passou a ser manipulado para fins comerciais e até propagandísticos. Seu gesto patriótico ao ir prestar serviço militar em 1958 foi um exemplo (MUGGIATI, 1985, p.32). Em 1960, a “Era de ouro do rock and roll clássico” chegava ao fim. A pressão de religiosos e de órgão oficiais aliada aos interesses das gravadoras culminou no sufocamento do rock and roll. Para a indústria, era vantagem gravar músicas menos censuráveis e ganhar cada vez mais posições nas paradas. Friedlander (2002, p. 92) relata o destino dos ídolos dessa fase: “Berry foi indiciado, Lewis, marginalizado, Little Richard tornou-se religioso, Elvis alistou-se e Haley tinha quase desaparecido”. Nos anos 1960 surge um novo modelo de negócio para a indústria da música. Ainda de acordo com Friedlander (2002), o processo retorna aos moldes do período anterior aos anos 1950. As gravadoras reafirmam seu controle sobre a indústria
  • 22. 21 musical. As músicas eram produzidas nas grandes gravadoras ou pelos maiores produtores independentes. Canções eram compostas por profissionais contratados e gravadas por músicos temporários em estúdios. O resultado era um rock and roll artificial, interpretado por homens jovens e bonitos, sem ritmo ou traços de revolta, bem longe do rock clássico. Após o declínio imposto do rock and roll clássico, se viveu um período de transição. Entre 1959 e 1963 observa-se o surgimento e a proliferação de diferentes estilos10 de música popular. Para que o rock and roll encontrasse novamente seu auge, seriam necessários cerca de 10 anos. Essa nova fase seria denominada “invasão britânica”. 2.3 A INVASÃO BRITÂNICA (1963-1964) A primeira metade dos anos 1960 é marcada por um entusiasmo inocente, que dá continuidade aos projetos ideológicos e culturais, surgidos com a crise do moralismo na década anterior. Já a segunda metade da década é marcada pela busca de mudanças na sociedade. Surgem novos movimentos feministas e a favor dos negros e dos homossexuais. Também é dessa época o movimento hippie, conhecido como contracultura, que bradava o lema “paz e amor” em seus protestos contra a Guerra Fria e a Guerra do Vietnã. Nesse contexto, inicia-se o momento musical que ficou conhecido como invasão britânica, que igualmente passou por esses dois momentos. Essa relação pode ser percebida através da comparação dos títulos de canções da banda The Beatles: no inicio, músicas de tom inocente como “She loves you, yeah, yeah, yeah” (“Ela te ama, yeah, yeah, yeah”) atingem grande sucesso. Já em um segundo momento, surgem canções como “Revolution” (“Revolução”). Após ter em vista o contexto histórico, para entender o surgimento do rock inglês (aqui abordado através de suas três principais bandas: The Beatles, The Rolling Stones e The Who), se faz necessário entender o contexto pelo qual a Inglaterra passava musicalmente. Em 1960, a distribuição de discos na Inglaterra era difícil e a programação radiofônica era estatal, dominada pela empresa BBC, o 10 Nessa época ressurge o folk repaginado (tendo como seu maior representante Bob Dylan), o soul music e o motown, dois estilos essencialmente negros que exaltavam energia e negritude (FRIEDLANDER, 2002).
  • 23. 22 rock and roll levaria anos para atravessar o atlântico em direção a Grã-Bretanha. Na rádio, o conservadorismo vetava muitas músicas em função de letras sugestivas. Para ter acesso às músicas americanas, a única opção eram os discos editados com atraso, muitos deles sem lançamento em solo britânico (MUGGIATI, 1985). Como forma de preencher a lacuna musical, ainda nos anos 1950, era difundido um estilo chamado skiffle11 , uma imitação do blues antigo, vindo do sul rural dos Estados Unidos, feita com instrumentos caseiros como tábua de passar, cabo de vassoura e banjo de caixa de charuto. Segundo Muggiati, foi essa reinvenção do blues que deu ao rock britânico sua base sólida (1985). Quando o skiffle já estava proliferado e havia sido responsável por organizar os jovens ingleses em bandas, finalmente o rock and roll americano ganha repercussão em larga escala na Grã-Bretanha. Esse contato faz com que os grupos comecem a desenvolver uma nova música, que seria denominada apenas rock (MUGGIATI, 1985). Um desses grupos foi o Quarrymen, liderado por John Lennon, que viria a fundar o The Beatles. Na cidade costeira de Liverpool, na Inglaterra, em 1960, os amigos John Lennon, Paul McCartney e George Harrison transformariam o grupo Quarrymen em uma banda profissional de rock and roll: o The Beatles (Fig. 5). 11 Assista: <http://www.youtube.com/watch?v=UFNKGccDJx4>. Último acesso em: 2 de setembro de 2012.
  • 24. 23 Sua primeira e importante experiência em palcos foi um período de quatro meses e meio que a banda passou em Hamburgo, na Alemanha. Tocavam de seis a oito horas por noite em um clube do subúrbio. Durante as performances, conta Friedlander (2002, p.120), “o público se divertia com a batida, e o John ocasionalmente o brindara com suas opiniões e seus trajes que incluíam calcinhas e tampa de privada em volta do pescoço”. No regresso dos Beatles a Liverpool, as apresentações ao vivo passaram a ser no clube Cavern Club. Em 1961, os Beatles já tinham conquistado um público fiel por toda Liverpool. Em 1962 o então baterista, Pete Best, seria substituído por Ringo Starr. No ano seguinte, por toda Grã-Bretanha aconteceria um fanatismo extremo, que mais tarde seria denominado como o fenômeno da Beatlemania (FRIEDLANDER, 2002). O autor relata como a banda de destacou, em primeiro momento, pelo uso criativo de referências: Os Beatles criaram um som original que fundia elementos de todas essas raízes musicais. Eles adotaram o formato duas guitarras/baixo/bateria de [Buddy] Holly, assim como sua visão adolescente do amor, geralmente assexuada. O manejo hábil das letras de rock lembravam Tin Pan Alley e Chuck Berry (FRIEDLANDER, 2002, p. 124). Em 1967, a banda recebe influência do cantor folk Bob Dylan, que a inicia no Figura 5 – O início dos Beatles: otimismo e ingenuidade Fonte:< http://bit.ly/1bYih54>. Último acesso em 13 de outubro de 2013.
  • 25. 24 uso de substâncias ilícitas e incita-a ao pensamento mais crítico. Dessa forma, o cantor contribui para a metamorfose da banda, que faz a transformação de “músicos pop otimistas e despreocupados em artistas culturalmente consequentes”, a partir de então. O rock estava adquirindo “uma dimensão séria” (FRIEDLANDER, 2002, p. 132). A confirmação veio com “Revolver” (PARLOPHONE, 1966). Nas canções do álbum, isso pode ser percebido em letras com influências psicodélicas e surrealistas que evocam o domínio da psique: Desligue sua mente, relaxe e flutue correnteza abaixo/ Não está morrendo, não está morrendo/ Abaixo todos os seus pensamentos, renda-os ao vazio /Está brilhando, está brilhando/ Ainda que você possa ver o significado de dentro/ Está sendo, está sendo.12 Em seguida, é lançado o álbum que é referido pelos próprios membros da banda como o trabalho apogeu do grupo, o “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band” PARLOPHONE, 1967 (Fig. 6). 12 Trecho da canção “Tomorrow Never Knows”, lançada pelos Beatles em 1966.Tradução livre da autora.
  • 26. 25 A grande abrangência dos Beatles e o impacto do grupo, segundo Friedlander (2002), é consequência de uma série de fatores: Os Beatles não causaram sozinhos estas mudanças na sociedade e na indústria da música. Entretanto, seu enorme sucesso comercial, aliado à simultânea explosão das tecnologias de comunicação e marketing, permitiram que os Beatles transmitissem suas mensagens musicais e culturais e o conteúdo de suas letras para um número muito maior de pessoas, o que nenhum outro artista antes deles conseguiu. E, por causa do seu status de divindades culturais, os jovens os escutavam e, na maioria das vezes, acreditavam neles (FRIEDLANDER, 2002, p. 118). O próximo artista analisado é o grupo The Rolling Stones. A banda nasceu em Londres no cenário do blues britânico. Pode-se ter uma melhor compreensão das referências, dos gostos e dos hábitos da banda a partir de um trecho de uma carta enviada pelo membro fundador da banda, Keith Richards, a uma tia em 1962. Nela, o músico retrata o dia em que conheceu Mick Jagger, outro integrante original da banda: Figura 6 – Capa do álbum Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band Fonte: <http://bit.ly/N3Ow9R> Último acesso em: 20 de outubro de 2013.
  • 27. 26 Você sabe que eu estava interessado em Chuck Berry e eu pensei que eu era o único fã em quilômetros, mas uma manhã na Est. Dartford (para que eu não tenha que escrever uma palavra longa como estação), eu estava segurando um dos discos de Chuck quando um cara que eu conheci na escola primária, ali pelos 7-11 anos, sabe? veio até mim. Ele tem todas as gravações que Chuck Berry já fez e todos os seus parceiros têm também: eles são todos fãs de ritmo e fãs de rhythm’n’blues, o verdadeiro R & B, ou seja, (não aquele porcaria de Dinah Shore, Brook Benton) Jimmy Reed, Muddy Waters, Chuck, Howlin ‘Wolf, John Lee Hooker e todos os blueseiros de Chicago coisas realmente lowdown, maravilhoso. Outro que é ótimo é o Bo Diddley. De qualquer forma o cara na estação, o nome dele é Mick Jagger. e todas as garotas e os caras se encontram todos os Sábados de manhã no ‘Carrossel’, um juke-joint. (RICHARDS, 1962, tradução nossa - grifos do autor). Nesse depoimento pode-se observar a intensa relação dos membros fundadores da banda com a música negra. Além do interesse por Chuck Berry e do gosto por rhythm’n’blues, Richards conta que eram frequentadores de juke-joints, nome que designa os pequenos bares com música e dança afro-americanas, bem comuns no sudoeste dos Estados Unidos. Pouco tempo depois desse primeiro encontro, surge o Rolling Stones, com aparente sensualidade, como pode ser visto na figura 7, que atingiria o sucesso comercial em todo mundo, por volta de 1965. Simultaneamente à autodestruição dos Beatles, os Stones ingressavam em sua Era de Ouro (MUGGIATI, 1985), marcada pelo crescimento intelectual e pelo Figura 7 - The Rolling Stones: ritmos negros e sensualidade Fonte: < http://bit.ly/1a4VdTg>. Último acesso em 20 de outubro de 2013.
  • 28. 27 aprofundamento musical. No período, eles amadureceram e fizeram trabalhos multifacetados (FRIEDLANDER, 2002). Segundo Frielander (2002, p. 153) “a banda capitalizou a agressividade e a crueza da música negra americana para se projetar à linha de frente do incipiente movimento do blues britânico”, sendo reconhecidos como bad boys do rock devido suas músicas e atitude no palco. Como aponta Muggiati: Mick Jagger, segurando o microfone com insinuações fálicas e gingando como um travesti, antecipava o rock andrógino nas apresentações ao vivo. Nos discos, sua voz metálica com sotaque proletário e um tom de deboche era o veículo ideal para as letras cáusticas das canções originais do grupo (MUGGIATI, 1985, p. 88). Mais um importante grupo da invasão inglesa foi o The Who, que contribuiu para a redefinição dos papéis e das funções dos instrumentos. Eles desenvolveram o formato power trio, que consistia em utilizar somente guitarra, bateria e baixo, resultando em um rock mais sofisticado e ousado. Além disso, o The Who tinha como característica marcante as suas apresentações ao vivo (Fig. 8), que os fizeram ser considerados um dos grupos mais vibrantes e divertidos da história do rock (FRIEDLANDER, 2002). Para o autor, o The Who exerceu bastante influência nas próximas gerações: Figura 8- The Who: apresentação vibrante Fonte: http://www.allmusic.com/artist/the-who-mn0000577627. Último acesso em 20 de outubro de 2013
  • 29. 28 Além da qualidade das suas contribuições, eles também tiveram um impacto significativo nas gerações de roqueiros posteriores. A fúria rebelde de seu hino adolescente My Generation de 1965 plantou as sementes de duas principais formas musicais que brotariam nos anos 70, o hard rock e o punk. Os acordes poderosos de Townshed, o estilo vigoroso de Moon tocar bateria, a imagem agressiva de vocalista de Daltery e os show em altos decibéis da banda foram percursores do hard rock; as raízes do punk estão visíveis na música guiadas pelo impulso e agressividade (FRIEDLANDER, 2002, p. 177 – grifos do autor). Das três bandas da invasão britânica que vêm sendo abordadas nesse subcapítulo, The Who é a que mais expunha de forma direta e reflexiva questões políticas e filosóficas da época. O guitarrista Pete Townshed via a música como um eficiente meio de transmitir uma ideia. Por isso, a qualidade do rock poderia ser avaliada de acordo com sua preocupação social (FRIEDLANDER, 2002). Um exemplo de suas letras pode ser visto com o refrão “Vamos ver ação, vamos ver pessoas, vamos ver a liberdade no ar”.13 Tendo em vista algumas características do estilo do rock e suas bandas, para Friedlander (2002) existe um chamado modelo anatomicamente perfeito do rock, que funciona para melhor compreensão de uma canção ou banda. Consiste em questionar-se qual a parte do corpo que mais é afetada diante da audição da música. Para tanto, o pesquisador idealizou um esquema do que cada parte representa: cérebro (intelectual), o coração (emocional), a genitália sexual (sexual) e os pés (dança e movimento). Ao aplicar essa técnica nos três maiores grupos da chamada invasão britânica, o autor indica que os Beatles e o The Who priorizam para a cabeça e o coração, embora, tenham sonoridades diferentes, e o Rolling Stones age mais na genitália e nos pés. Antes de finalizar este breve estudo acerca da invasão inglesa, vale ressaltar uma quarta banda do mesmo período, The Kinks. Os ingleses foram contra a primeira geração da invasão britânica, que buscava arranjos cada vez mais complexos, e primaram pelo minimalismo. Nas letras, optaram por trocar o comum – amor – por uma crítica refinada a sociedade inglesa através de parábolas e paródias (FRIEDLANDER, 2002). 13 Trecho da canção “Let´s see action”, do The Who, lançada em 1971. Tradução livre da autora.
  • 30. 29 2.4 OS SOLOS DE GUITARRA (1966-1970) A efervescência criativa musical também encontrava espaço em Londres. Em 1966, dois guitarristas radicados na cidade iniciariam um novo estilo, “centrado na guitarra que fundia elementos do blues com a distorção conceitual culturalmente adquirida dos experimentais anos 60” (FRIEDLANDER, 2002, p. 295). Segundo o autor (2002), a guitarra de corpo sólido começou a ser produzida em massa no final dos anos 1940. Em 1952, a fabricante Gibson coloca no mercado o inovador modelo de guitarra sólida de Les Paul. Ao mesmo tempo, a guitarra elétrica evoluía e ganhava mais destaque, possibilitados pelos solos de guitarra. Na década seguinte, pela primeira vez o público começa a ser atraído não pela banda e pelo repertório, mas sim pelos instrumentistas. Entre seus percussores, de 1967 a 1970, Eric Clapton formou o grupo Cream e Jimi Hendrix formaria o The Jimi Hendrix Experince. Dentre suas qualidades: Ambos amavam o blues e nunca perderam a habilidade de transmitir a profundidade e a emoção do blues para as plateias. Mas contrário de Clapton, Hendrix não limitou seu jeito de tocar guitarra a uma fusão de elementos estilísticos, ele ultrapassou as fronteiras da música, ingressando nos domínios do sons (FRIEDLANDER, 2002, p. 309). Até os dias de hoje, ao pensar em guitarra elétrica se pondera Jimi Hendrix. Muito por sua inventividade, como descreve Unterberger (2013, tradução nossa): “quando Jimi Hendrix se tornou uma estrela internacional em 1967, parecia que ele havia saltado de uma espaçonave vinda de marte”. Seu álbum de estreia, “Are You Experienced?” (TRACK RECORDS, 1967), que sintetiza a vanguarda do rock em 1967, foi um dos mais surpreendentes começos de carreira da história do rock. Sua musicalidade possuía aspectos futuristas ao mesmo tempo em que mostrava suas raízes no rock, blues, pop e soul (UNTERBERGER, 2013). Uma das faixas do álbum “Foxy lady” mostra sua personalidade erótica, que também tinha sua expressão nos palcos. Tocava guitarra no meio das pernas, simulando um falo, e por muitas vezes insinuava cometer o ato sexual com a guitarra (FRIEDLANDER, 2002). De acordo com o Friedlander (2012), em junho de 1967, Jimi Hendrix faz uma performance no Monterey International Pop que marcaria para sempre sua carreira. Na última música do show, “Wild Thing”, o músico coloca em solo do palco sua
  • 31. 30 própria guitarra, joga líquido inflamável, ajoelha-se e coloca fogo no instrumento14 . Ao todo, são quatro anos de carreira, que culmina seu fim com a morte do cantor, aos 27 anos, em setembro de 1970, em função de uma alta dosagem de tranquilizantes. Para Friedlander (2002), a contribuição mais importante do guitarrista para o rock foi a expansão do papel musical da guitarra do rock and roll clássico. Nesse ano encontra-se o marco divisor de uma nova época. O lema “sexo, drogas e rock and roll” seria a base para o hard rock dos anos 1970, na busca por anestesiar as problemáticas sociais. 2.5 A TERCEIRA EXPLOSÃO DO ROCK (1969-1978) Com a chegada dos anos 1970, os movimentos musicais anteriores enfrentam o declínio. Os Beatles haviam se separado, os Rolling Stones optaram por uma pausa, Eric Clapton estava envolvido com drogas, e Jimi Hendrix havia falecido. No entanto, esses acontecimentos já haviam transformado e expandido a indústria da música. Em 1967, pela primeira vez foi alcançada a marca de um bilhão de discos vendidos; em 1973, chegava a dois bilhões, e em 1978 a quatro bilhões (FRIELANDER, 2002). Como apresenta o autor (2002), o rock já não era uma novidade, se não parte da cultura oficial. Ao fim dos anos 1960, os jovens que o viram florescer já não eram mais adolescentes e agora chegavam a idade adulta. A contracultura dos anos 1970 pode ser caracterizada como hedonista e niilista. Para Goffman e Joy (2007), isso se dá em função do desvirtuamento da geração revolucionária dos anos 1960, que sem os esperados resultados culminou em crise, tendo na sequência pessoas comuns, egoístas, sem imaginação e prontas para se render ao sistema. É nesse contexto que surge o Led Zeppelin e a terceira grande explosão do rock. O lema adotado não era mais político e social, se não de cunho pessoal e egoísta: “sexo, drogas e rock and roll”, iniciado pelo Cream, Jimi Hendrix e The Who, com a máxima “espero morrer antes de ficar velho (falando a respeito da minha geração)”15. Nesse momento, essa filosofia se solidifica, virando símbolo da busca por dinheiro e prazer. 14 Assista em: <https://www.youtube.com/watch?v=Z4QghNBwyt8> Último acesso em 9 de outubro de 2013. 15 Trecho da canção “My Generation”, lançada pelo The Who e 1965. Tradução livre da autora.
  • 32. 31 Com o Led Zeppelin também vinha o estopim do Heavy Metal: Led Zeppelin foi a definitiva banda de Heavy Metal. E isso não somente por causa da sua interpretação do blues esmagadoramente alta mas também pela forma como eles incorporaram mitologia, misticismo e uma variedade de gêneros. O som deles tinha mística (ERLEWINE, 2013a, tradução nossa). A geração de 1970 continuava com características de revolta, mas a busca se tornava própria, a liberdade pessoal e a libertação da repressão sexual. Por conta dessas características, o cenário vivido era de promiscuidade sem culpas. (GOFFMAN; JOY, 2007). O cotidiano do Led Zeppelin foi retratado na fotografia a seguir: integrantes da banda, em seu próprio avião, acompanhados da garrafa de whisky, com a qual eram identificados como inseparáveis. A constatação de que a banda foi responsável por preencher uma lacuna no rock, com qualidade e inventividade, condizente com a mentalidade dos jovens, foi seu sucesso imediato. O primeiro álbum, homônimo, foi lançado em fevereiro de 1969 e em dois meses atingiu o Top 10 da Billboard. No mesmo ano, Led Zeppelin II foi lançado em outubro e em dezembro atingiu o número um na lista. Ao todo cinco dos seus quatorze álbuns chegaram ao topo das paradas (ROLLING STONE, 2013). Mas a rápida ascensão também levou a uma conturbada carreira. Segundo Figura 9 – Robert Plant e Jimmy Page, do Led Zeppelin Fonte: <http://bit.ly/HbXHUM> Último acesso em: 9 de outubro de 2013.
  • 33. 32 Graham (2008, p.417), “o Led Zeppelin sempre foi complicado. Esse era o problema inicial deles. Os shows deles sempre tinham violência masculina. Isso foi um desvio nos anos 1970, que foi uma época muito estranha. Era uma anarquia sem causa”. 2.6 GLAM ROCK E PUNK ROCK (ANOS 1970) Assim como surge o heavy metal nos anos 1970, vem outros estilos, já latentes desde os anos 60, o glam rock e o punk rock. Começando pelo glam rock, ele foi um estilo que, segundo Goffman; Joy (2007, p. 343), forjou uma “estética neodecadente (...) em uma época em que o rock estava ficando rançoso (...) eles não se levavam a sério (...) com vestimentas andróginas e intencionalmente deselegantes” A linguagem operante era a do exagero nas roupas, na maquiagem e no cabelo, como pode-se perceber na figura a seguir: Para os autores, foi uma contracultura trivial, pois representou um movimento unificado que demarcou a separação do rock em tribos conflitantes. Uma das bandas mais representativas do glam rock foi o New York Dolls, que trazia a essência do estilo: Fonte: <http://bit.ly/17Eqb0z> Último acesso em 05 de setembro de 2013. Figura 10 – A extravagância do New York Dolls
  • 34. 33 Os New York Dolls eram divertidos [...] sendo bastardos vaidosos daquele jeito, pensei que eram ligados à ideia de narcisismo tão evidente nos anos 60 – de não querer crescer nunca – os Dolls a simbolizavam na sua forma transexual de vestir e na ideia geral de permanecer uma boneca, uma bonequinha (MCNEIL; MCCAIN, 2004, p. 248). Por volta de 1975, o glam rock acaba deixando sua beleza, suas cores; e aspectos menos glamorosos, envolvendo correntes, agulhas e moicanos, começam a aparecer. É a chegada do punk em níveis mais amplos. Entretanto, o derradeiro início do punk foi dado entre 1966 e 1967 com a banda Velvet Underground, alicerçada no artista máximo da pop-art16, Andy Warhol, nos Estados Unidos. A afirmação musical da vanguarda de Warhol veio com o primeiro álbum da banda americana Ramones. Nele, músicas simples, sóbrias e curtas. A banda se consagraria com uma das bandas mais influentes do punk rock (GOFFMAN; JOY, 2007). A influência punk rock de Nova Iorque chegou à Inglaterra, onde se deparou com uma depressão econômica. A população havia perdido a referência dos astros de rock, agora ricos e completamente distanciados do desemprego e da pobreza pela qual passava a população. A banda Sex Pistols mudaria isso, com seu primeiro compacto Anarchy in the U.K (EMI, 1975). O estilo musical do disco, segundo Goffman e Joy, “batia em muros psíquicos que nem mesmo os Ramones conseguiam chegar” (2007, p. 360). De acordo com Friedlander, “o punk foi um estilo heterogêneo (...) conduzido por um ritmo frenético”, as “palavras eram vomitadas por vocalistas sem noção prévia de ritmos”, refletindo “graus variados de ódio justificado” (2002, p. 352). Acrescentando, a análise de Goffman e Joy é de que o estilo “se transformou em uma identidade global que significou muitas coisas para muitas pessoas” (2007, p. 361). Foi além da música e influenciou a moda DIY - faça você mesmo. Um dos pontos fundamentais do punk era a moda. Malcom Mclaren, produtor dos Sex Pistols, também era dono de uma marca de roupa, a Sex, que possuía um 16 Surgido em Nova Iorque o movimento artístico teve como principais nomes: Roy Lichtenstein, Claes Oldenburg, James Rosenquist, Tom Wesselmann e Andy Warhol. As suas pinturas e esculturas tinham por característica celebrar a linguagem da cultura urbana, como anúncios e fotografias às vezes de forma positiva e as vezes de forma irônica e crítica (HONNEF, 2004)
  • 35. 34 estilo fortemente influenciado pelo sadomasoquismo17, por roupas rasgadas, por tachas, por correntes e por estampas de caráter contestador, como visto a seguir na figura 11. O termo punk foi eleito como denominação para o que estava acontecendo pelo escritor e jornalista punk Legs McNeil. Segundo o próprio (MCNEIL; MCCAIN, 2004, p. 266), o vocábulo representava “bebedeira, antipatia, esperteza sem pretensão, absurdo, ironia e coisas com um apelo mais sombrio”, ou seja, atividades relacionadas ao seu dia-a-dia. 2.7 PÓS-PUNK (1977-1980) De acordo com Bollon (1993), a partir de 1977 o punk enquanto música perde sua identidade: 17 Nota da autora: O sadomasoquismo, que pode ser entendido como a satisfação sexual diante da humilhação física e ou psicológica, já era um tema abordado no principio do punk, com a banda Velvet Underground, que tratava do tema em suas letras a apresentações. Figura 11 – Os Sex Pistols: música e atitude Fonte: <http://static.giantbomb.com/uploads/original/15/152787/2175847- Sex-Pistols-sex-pistols-4058394-1280-747.jpg> Último acesso em 09 de outubro de 2013.
  • 36. 35 O punk triunfava como moda e novo conformismo, no mesmo momento em que morria como estilo e ameaça. Tudo voltava à ordem e ao já conhecido: nesse intervalo a sociedade se renovara. Os anos 80 seriam, de ponta a ponta, os anos do ‘pós-punk’ (BOLLON, 1993, p. 144 – grifos da autora). Segundo AllMusic Guide (online, 2013), após a revolução punk surgem dois vieses musicais. São eles: o new wave, apresentando uma faceta mais pop alegre e dançante do punk através de batidas eletrônicas, e o pós-punk, apresentando um lado mais audacioso do punk, mais experimental e complexo musicalmente, mas não menos agressivo ou político. Para este trabalho cabe um olhar um pouco mais detalhado sobre o pós-punk, uma vez que esse movimento foi um dos grandes influenciadores de bandas de rock dos anos 2000. Erlewine (2013b) aponta The Cure (Fig. 12) como uma das poucas bandas do pós-punk que conseguiu sucesso em larga escala. A banda começou em 1976 e logo no primeiro álbum foi bem recebido pela crítica. Como apontado por Erlewine (2013b), o The Cure em suas canções sobrepôs camadas de guitarras e de sintetizadores e foi uma das bandas que lançaram as sementes do rock gótico. No entanto, no final anos 1980 eles já haviam deixado o lado gótico, seguindo com sucesso comercial até a primeira metade dos anos 1990. A influência deles pode ser ouvida em dezenas de novas bandas do novo milênio, Figura 12 - The Cure: o lado sombrio do punk Fonte:<http://www.allmusic.com/artist/the-cure-mn0000137390>. Último acesso em: 20 de outubro de 2013.
  • 37. 36 incluindo muitos que tinham pouco a ver com o gótico. De acordo com Bush (2013), o Joy Division (Fig. 13) foi a primeira banda do pós-punk que buscou sua expressão não na raiva, mas na melancolia, dando início à música alternativa melancólica dos anos 1980. O produtor da banda, Martin Hannet, foi responsável por introduzir sintetizadores, riffs de guitarra irregulares, destaque a bateria e também a um experimentalismo musical, com o uso de ruídos diversos (como vento, vidros quebrando, sons de maquinas)18. Figura 13 – Joy Division e a melancolia do punk Fonte: < http://bit.ly/1a2Vkk2>. Último acesso em: 20 de outubro de 2013. As canções da banda traziam inquietação pós-industrial e desespero emocional. As apresentações do vocalista Ian Curtis também chamavam atenção. Portador de epilepsia, o cantor muitas vezes tinha ataques reais ou inventados no palco. 2.8 GARAGE ROCK REVIVAL (1980-1990) Em 1980 surge o garage rock revival, na busca de recapturar o espírito selvagem do garage rock dos anos 196019. É um movimento baseado em reviver um 18 O Processo De Gravação Das Canções Do Joy Division pode ser visto no filme A Festa Nunca Termina (24 Hour Party People), de Michael Winterbottom (2002). 19 Fonte: http://bit.ly/1b8a51y. Acesso em: 20/10/2012.
  • 38. 37 estilo musical inspirado na invasão inglesa. Hicks (1999) aponta que o garage rock original é caracterizado pelo alto emprego do fuzz (distorção), pela presença de ironia e de sarcasmo, por vocais marcados por autocontradições e pela ideia do “Faça você mesmo” (do it yourself). Gravações feitas em estúdios precários caracterizaram esta tendência por uma crueza estilística. Abbey (2006) afirma que o garage rock surgiu como um esforço para trazer de volta a simplicidade dos grupos originais de rock. E o garage rock revival ou contemporâneo, como conceitua o autor, continua com essa intenção, tem como características grande nostalgia e individualismo e teve como epicentro geográfico os subúrbios de Michigan, Detroit. O estilo nunca atingiu grande audiência nem teve grande representantes. Sua primeira “onda” foi nos anos 1980. Entre algumas das bandas de maior destaque estavam Chesterfield Kings (Fig.14), The Mono Men, The Lyres, The Fleshtones e The Fuzztones (Fig. 15). Fonte: <http://bit.ly/1fR7EpS> Último acesso em 20 de outubro de 2013. Figura 14 - Chesterfield Kings nos anos 1980: revivendo os anos 1960
  • 39. 38 O estilo continuou cultuado por algumas pessoas nos anos 1990 – embora ainda sem sucesso – e muitas bandas surgidas no final da década basearam seu som e sua imagem no garage rock revival, bandas de rock essas que estrearam seus discos nos anos 2000, como é o caso da banda The Strokes, que será estudada no capítulo 4. Antes de entrarmos no rock dos anos 2000, no próximo capítulo iremos contextualizar o período de forma geral abordando aspectos da pós-modernidade, da indústria cultural da identidade e a imagem. Figura 15 - The Fuzztones Fonte: <http://www.allmusic.com/artist/the-fuzztones- mn0000764290> Último acesso em 20 de outubro de 2013.
  • 40. 39 3 CENÁRIOS E CONTEXTOS DO ROCK NOS ANOS 2000 Neste capítulo abordaremos breves aspectos da pós-modernidade, tendo como referencial Harvey (1989), Lipovetsky (2004) e Castells (1999), da indústria cultural, utilizando Adorno (1985) e Debord (2003), da indústria fonográfica, através de Herschmann (2007) e de Cardoso Filho e Janotti Júnior (2006). Também trataremos de mídia, de identidade e do rock nos anos 2000, com Amaral (2003) e com Maffesoli (2006), sendo esses dois autores também utilizados como referencial para o estudo da imagem, junto com Joly (1996). 3.1 PÓS-MODERNIDADE Me diz meu Deus o que é que eu vou cantar / Se até cantar sobre me diz meu deus o que é que eu vou cantar / Já foi cantado por alguém20 Para compreensão da pós-modernidade é preciso levar em conta o significado da sua antecessora modernidade. Segundo Harvey (1989, p.22), o conceito de modernidade está ligado à “ruptura com todas e quaisquer condições históricas precedentes”. O projeto modernista começou a ser tratado pelos pensadores iluministas ainda no século XVII e tinha por objetivo desenvolver a racionalização da organização social para liberação do indivíduo. Os ideais iluministas, porém, sofreram enfraquecimento durante o século XX. Diante de duas guerras e a ameaça da aniquilação nuclear, o otimismo progressista enfrenta dificuldades em se manter. Diante desse contexto, artistas, escritores, arquitetos, compositores, poetas, pensadores e filósofos surgem com uma nova concepção de projeto modernista, através da imagem da “destruição criativa”, com o intuito da fundação de um mundo novo. O artista moderno era alguém capaz de se expressar de forma universal, que afetasse aspectos da vida urbana diária (HARVEY, 1989). Segundo Harvey, O modernismo surgido antes da Primeira Guerra Mundial era mais uma reação às novas condições de produção (a máquina, a fábrica, a urbanização), de circulação (os novos sistemas de transportes e comunicações) e de consumo (a ascensão dos mercados de massa, da 20 Todas as frases que abrem os subcapítulo desse capítulo são trechos da letra de “66”, da banda O terno, inclusa no álbum “66” (Independente, 2012).
  • 41. 40 publicidade, da moda de massas) do que um pioneiro na produção dessas mudanças. Mas a forma tomada pela reação iria ter uma considerável importância subsequente. Ela não apenas forneceu meios de absorver, codificar e refletir sobre essas rápidas mudanças, como sugeriu linhas de ação capazes de modificá-las ou sustentá-las (HARVEY, 1989. p. 32). Para Lipovetsky (2004), a passagem da modernidade à pós modernidade, na segunda metade do século XX, deu-se através do consumo das massas e os valores que ele veicula. De acordo com o autor, o termo pós-modernidade vem salientar uma reorganização do modo de funcionamento social e cultural das sociedades democráticas avançadas. Castells (1999) aponta que essa mudança ocorreu principalmente através de três importantes processos na história: Um novo mundo está tomando forma neste fim de milênio. Originou-se mais ou menos no fim dos anos 60 e meados da década de 70 na coincidência histórica de três processos independentes: revolução da tecnologia da informação; crise econômica do capitalismo e do estatismo e a consequente reestruturação de ambos; e apogeu de movimentos sociais culturais, tais como libertarismo, direitos humanos, feminismo e ambientalismo. A interação entre esses processos e as reações por eles desencadeadas fizeram surgir uma nova estrutura social dominante, a sociedade em rede; uma nova economia, a economia informacional/global; e uma nova cultura, a cultura da virtualidade real. A lógica inserida nessa economia, nessa sociedade e nessa cultura está subjacente à ação e às instituições sociais em um mundo interdependente (CASTELLS, 1999, p. 412). Ainda como cita Featherstone (1995), alguns autores acreditam que o pós- modernismo se refere mais a uma crise interna no campo dos próprios intelectuais do que a uma crise social mais ampla. Já para Lipovetsky (2004) ela traz consigo os seguintes pontos: A rápida expansão do consumo e da comunicação de massa; enfraquecimento das normas autoritárias e disciplinares; surto de individualização; consagração do hedonismo e do psicologismo; perda da fé no futuro revolucionário; descontentamento com as paixões políticas e as militâncias (LIPOVETSKY, 2004, p. 52) Para Bauman (200, p.13 – grifos do autor), estamos vivendo a modernidade líquida, que implica em uma “realocação dos ‘poderes de derretimento’ da modernidade”. E Charles (2004) acredita que, de um lado, o pensamento das Luzes continuam. Indivíduos são cada vez mais capazes de exercer o livre arbítrio, através da informação.
  • 42. 41 3.2 A Indústria cultural Então não sei o que eu devo fazer / Pois se eu fizer bem quadradão Vão me chamar de quadradão / Mas se eu fizer muita loucura vão dizer que eu tô maluco / E desse jeito você nunca vai ser muito popular. Um contexto de transformações sociais e psicológicas causa impactos nas diversas camadas de organização da sociedade, como é o caso da cultura, que ganha aspectos de “indústria”. Indústria cultural para Coelho (1981) é o fruto de uma sociedade industrializada e capitalista, a sociedade dita de consumo. Ela só é possível quando admite-se a divisão cultural em superior, média e de massa, apesar dos equívocos envolvidos nessa classificação. Para o autor, as funções dessa indústria possuem ambos os lados, positivos e negativos. Como positivo, aponta o dinamismo, capaz de gerar efeitos além dos previstos, e o não combate às outras culturas, sendo apenas complementar às tradicionais. Como negativos, tendência a alienação do homem, através do reforço das normas sociais e o esquecimento do debate sobre as questões da sociedade. Segundo Santaella (2003), até meados do século XIX a cultura no ocidente era delimitada em dois tipos: a cultura erudita, das elites, e a cultura popular produzida pelas classes dominadas. Porém, a partir da explosão de meios de reprodução técnica, jornal, cinema e foto, advém a cultura de massa, que segundo a autora, (SANTAELLA, 2003, p. 52), “produziu um impacto até hoje atordoante naquela tradicional divisão da cultura”. Adorno (1985) aponta algumas dessas mudanças no jeito de fazer cultura: A técnica da indústria cultural levou apenas à padronização e à produção em série, sacrificando o que fazia diferença entre a lógica da obra e a do sistema social. Isso, porém, não deve ser atribuído a nenhuma lei evolutiva da técnica enquanto tal, mas à sua função na economia atual (ADORNO, 1985, p.114) Esse sistema de produção em série está baseado na diversão. Segundo o autor, a diversão serve como escapatória do processo de trabalho mecanizado, e portanto não deve exigir pensamento próprio e esforço intelectual. Como explicita, (ADORNO, 1985, p. 135): “divertir-se significa estar de acordo (...) significa sempre: não ter que pensar nisso, esquecer o sofrimento até mesmo onde ele é mostrado”,
  • 43. 42 Aqui, essa fuga intelectual se dá através do retrato do próprio cotidiano, através de uma ideia de resistência, uma realidade que deve subsistir. Para ele, trata-se de um rompimento da cultura na busca pela diversão. Através da repetição mecânica do belo, de estereótipos e de personagens, para Adorno (1985, p. 131), “a indústria cultural não sublima, mas reprime”. Featherstone (1997) afirma que, pela ótica pós-moderna, a ascensão da cultura de consumo, através da produção em massa e sua proliferação, termina com a esfera cultural separada. Por esse motivo, muitas vezes é proferido o fim da arte e da figura heroica do artista. Para Debord (2003, p.16 – grifos do autor), trata-se da sociedade do espetáculo, sendo espetáculo “a afirmação da aparência e a afirmação de toda a vida humana – isto é, social – como simples aparência”, tendo em vista que não se trata apenas de um conjunto de imagens, mas de “uma relação social entre pessoas, mediado por imagens”. O consumidor transforma-se em um consumidor de ilusões. E nessa sociedade, para o autor, tudo se torna uma acumulação de espetáculos: Toda a vida das sociedades nas quais reinam as modernas condições de produção se apresenta como uma imensa acumulação de espetáculos. Tudo o que era vivido diretamente tornou-se uma representação (DEBORD, 2003, p.13 - grifos do autor). Llossa (2012) lança mão de uma nova denominação, a civilização de espetáculo. Na qual afirma que a palavra está cada vez mais subordinada à imagem e ao entretenimento. O autor culpa a democratização da cultura pela queda de sua qualidade. Em função da quebra de barreiras entre críticos e público geral, perde-se o discernimento de baixa e alta cultura, popularizando um gênero cultural superficial. Para Chauí (2000), por outro lado, a democratização da cultura é uma questão necessária: Trata-se de contestar o uso privado da cultura, sua condição de privilégio “natural” dos bem-dotados, a dissimulação da divisão social do trabalho sob a imagem da diferença de talentos e de inteligências. É a noção de competência que torna possível a imagem da comunicação e da informação como espaço da opinião pública, imagem aparentemente democrática e, na realidade, antidemocrática por excelência, pois ao fazer do público espaço da opinião, essa imagem destrói a possibilidade de elevar o saber à condição de coisa pública, isto é, de direito à sua produção por parte de todos (Chauí, 2000, p.2 – grifos da autora).
  • 44. 43 Este pensamento segue a mesma linha de Warnier, quando se refere à chamada globalização da cultura: Pode-se ver que a chamada “globalização” dos fluxos mercantis não é uma verdadeira globalização. É uma troca privilegiada entre países mais ricos (...) trata-se portanto de uma vasta mistura cultural sob o comando hegemônico das indústrias privadas do triângulo América – Europa – Ásia rica, encorajados pelos Estados (WAINER, 2000, p. 95 – grifos do autor). Complementando, é preciso ter em vista que, de acordo com Kellener (2001), deve-se evitar ver os efeitos da cultura de mídia com a visão extrema de que o público é uma massa homogênea e passiva, da mesma forma que devemos ter em mente a contradição da mídia: enquanto manipula também é manipulada e usada. 3.3 IDENTIDADE E ROCK NOS ANOS 2000 Então não sei o que eu devo fazer / Pois se eu não posso inovar Eu vou cantar o que já foi e vão dizer que é nostalgia / E que esse tempo já passou e eu tô por fora do que é novo / Mas se é novo falam mal. Kellner (2001) aponta que é a partir da modernidade que se toma consciência de que a identidade não é fixa, sólida e estável, como se pensava, e sim mutável, podendo ser criada e recriada. A identidade passa a ser um problema pessoal e teórico, e é vista como função da criação de uma individualidade particular e não mais em função do coletivo. Na pós-modernidade a identidade é fragmentada, desconexa, é o sujeito como parte de um fluxo de euforia intensa. Ao mesmo tempo em que se cultua o individualismo, Kellner (2001) ressalta que teóricos como Baudrillard indicam que os sujeitos implodem, formando massas, ou seja, deixam de ser importantes por si, tornando-se mais um. De acordo com Mafessoli (1999), vivemos o neotribalismo, que está baseado em afinidades comuns do cotidiano. O vínculo social está na cultura dos sentimentos. De acordo com ele, essa formação de tribos: É certamente porque há prevalência do conjunto sobre o particular, ou seja, do outro, que se podem reconhecer os outros em si. Assim como há identificações sucessivas, em função dos diferentes momentos da comunicação, pode haver identificação de diversas facetas da própria pessoa (MAFESSOLI, 1999, p.311).
  • 45. 44 Para Bauman (2004), a identidade surge com as “comunidades”, que mesmo diante de um mundo policultural conseguem fundir ideias. O conceito de identidade, de acordo com o autor, advém com a crise do pertencimento e da necessidade de transpor as barreiras do “deve” para o “é”, recriando a realidade à semelhança da ideia. Nesse sentido, os ídolos do rock tornam-se figuras emblemáticas, personagens capazes de influenciar comportamentos. De acordo com Maffesoli: Quando trabalhamos com personagens, a imagem se sobressai diante de outras características, como nome, pois ela tem um caráter representativo. É como se estivesse um passo elevado, sendo capaz da criação de um emblema. Por isso, é possível que determinado personagem, levando consigo um conjunto de figuras emblemáticas, seja passado de uma cultura à outra, sem que ele perca sua essência (MAFESSOLI, 1999, p. 142). Para Cardoso Filho e Janotti Júnior (2006), a indústria fonográfica surge com personalidades musicais que tenham a universalidade necessária para se tornarem figuras públicas e veicularem em todos os meios, como revista, televisão, filmes. Sendo também figuras responsáveis por endossar produtos e serviços, constituem, assim, uma rede globalizante que interliga publicidade com lazer e entretenimento. Hoje, por exemplo, os videoclipes são usados como um canal de publicidade através da técnica de inserção de produto na narrativa, o chamado produtc placement.
  • 46. 45 Figura 16: Composição de reproduções do videoclipe Reptilla, da banda The Strokes. Aparição de três produtos de marcas . Fonte: Reptilia - Videoclipe do The Strokes (BMG, 2003), disponível em http://www.youtube.com/watch?v=b8-tXG8KrWs>. Último acesso em 3 de outubro de 2013 Voltando às questões de identidade, Amaral (2000) afirma que um dos pontos fundamentais do rock é a socialização a um gênio coletivo. A autora aponta a estética artística como importante fator de identificação: A estética constitui o outro elemento fundamental da arte e, geralmente, é o que propicia o estabelecimento da identificação entre os artistas e os fãs. Quando refiro-me à estética, não estou tratando da idealização do belo. Trato de uma estética que preocupa-se com as transformações do mundo contemporâneo. Uma estética decadente e também ascendente e afirmativa, cujos valores representem uma desconstrução dos valores anteriores, e que se vincule aos sentidos do corpo, ou seja, uma estética em que a emoção permaneça ligada ao próprio sentido da vida. A necessidade de incorporação das contradições inerentes à essência da arte e do artista fazem dela uma estética fisiológica [...] (AMARAL, 2000, p.36). Um dos conceitos de Nietzsche trazidos por Amaral (2002) levanta o lado filosófico de que existe um fator fundamental que define arte, a embriaguez: (…) para que haja arte não é necessário que nos atenhamos aos conceitos de "verdadeiro" e de "não-verdadeiro", mas "para que haja uma ação e visualização estéticas é incontornável uma precondição fisiológica: a embriaguez" (Nietzsche, 2000, p.70). A embriaguez é o sentimento de elevação da força e da plenitude que se encontram nos conceitos de apolíneo e de dionisíaco. A embriaguez apolínea está relacionada ao sentido da visão, do olhar, como o dos pintores e escultores, enquanto que
  • 47. 46 na instância dionisíaca, todos os sentidos apresentam-se mais exaltados. Por isso, artes como a música e o teatro tendem a estar mais ligadas a ela (AMARAL, 2000, p. 36). Porém, para o rock, o discurso em torno da legitimidade da música ainda recaí, por muitas vezes, na contradição undergoround versus mainstream21. De acordo com Monteiro (2006), a ideologia do rock vive dessa contradição básica: trata-se de uma música produzida comercialmente para uma audiência massiva, mas que sustenta um discurso crítico em relação ao comercialismo e à cultura de massas. A ideia de que a figura do rock é um ser “superior”, indo contra a cultura pop, também é característica da ideologia do rock, como explica o pesquisador: A ideologia do Rock reflete uma certa concepção do fazer artístico herdada do Romantismo do século XIX, segundo o qual o artista seria um individuo abençoado pelos deuses, capaz de transmitir ao mundo seu universo interior, suas emoções e sua filosofia de vida através da música, da pintura, da poesia. A Ideologia Rock se apropria desse discurso como forma de estabelecer fronteiras do que é digno ser considerado rock (ou seja, a música que é capaz de expressar esse universo interior do artista) e os demais gêneros musicais, reféns de fórmulas predeterminadas, voltadas para o mercado e incapazes de expressar esse sentido de transcendência que o rock consegue manifestar (Bollon, 1993; Grossberg, 1992, p. 160- 162, 1998, p.298) (MONTEIRO, 2006, p. 41 – grifos do autor). De acordo com Friedlander (2002), com a popularização do videoclipe a partir dos anos 1980, essas questões tornam-se ainda mais evidentes. O surgimento da MTV (Music Television) e sua programação exclusivamente voltada pra música impactou o mercado da música aumentando as vendas de CD e levando a cultura pop cada vez mais ao mainstream. Ainda segundo Friedlander (2002), os vídeos traziam os valores do rock contemporâneo: a impaciência, prazer sexual, arrogância e individualismo, e por vezes deixavam a música em si, atentando-se mais para a imagem. Monteiro (2006) afirma que em função dessas mudanças começa-se a questionar a validade do discurso rebelde do rock. Na opinião do autor, (MONTEIRO, 2006, p. 46), enquanto ideologia, o rock não deve ser considerado como fonte de alienação, e sim, um discurso que “ajuda a conferir sentido às práticas relacionadas ao universo do rock’n’roll, mas não impõe um modelo de comportamento que o jovem é obrigado a seguir cegamente”. E afirma: 21 O underground, na produção cultural, busca vias alternativas e se firmam, quase invariavelmente, a partir da negação do o mainstream, a “via principal”, ligada a produção em massa. (FILHO et JUNIOR, 2006).
  • 48. 47 O distanciamento temporal em relação às diversas fases e ciclos do rock ao longo dos últimos anos 50 anos, somando à emergência de uma mentalidade pós-moderna bastante desconfiada em relação à pertinência de valores como autenticidade e atitude nos dias de hoje, deu origem a certo tipo de crítica que tende a enxergar o rock como uma mera manifestação da ideologia travestida de elementos transgressores. Por trás do aparente choque com os ideais conformistas burgueses, o rock apenas proporcionaria a ratificação desses valores, por meio de um “descontrole controlado das emoções”, em que a transgressão seria permitida dentro de certos limites, impedindo um ruptura efetiva com a ordem vigente e o status quo (MONTEIRO, 2006, p.41). De acordo com Monteiro (2006), por isso mesmo é comum que seja proclamada a morte do rock, seu vazio e sua perda de autenticidade. Porém, o autor acredita que a ideologia do rock ainda é bastante eficaz, principalmente entre os jovens. Segundo o autor, é necessário continuar validando esse discurso, o que não significa fazer uma apologia acrítica dos valores e contravalores dessa linha ideológica, e sim pensar de que forma esse sistema pode ser apropriado de forma reflexiva pelo público consumidor. 3.4 A IMAGEM E hoje faz sucesso quem faz plágio diferente / E de repente pode até ser bem legal / Pois já fizeram coisa boa no passado / Eu misturo como eu quero com mais tudo o que eu quiser Depois de apontarmos ao longo dessa dissertação a importância da imagem no atual contexto histórico e para o rock, vamos transcorrer brevemente sobre o que se trata quando estamos falando de imagem. Esse subcapítulo cabe aqui com o intuito de preparar a análise do presente trabalho, que se volta para a imagem do rock. Para Joly (1996), imagem significa aquilo que não necessariamente seja visível, mas de certa forma tenha traços do visual, e que “depende da produção de um sujeito: imaginária ou concreta, a imagem passa por alguém que a produz ou reconhece” (JOLY, 1996, p.13). Amaral (2002, p. 34) vê a imagem como a “musa sedutora” dos dias de hoje, na qual “tende-se a desconsiderar os sons, os ruídos e a própria música como seus elementos. A imagem e os outros componentes do sentido da visão definem a marca de nossa época”. Segundo Maffesoli (1996), o espaço no qual vivemos é um agrupamento de
  • 49. 48 ordem simbólica que pode ser compreendido como um conjunto complexo constituído pela materialidade das coisas e pela imaterialidade das imagens de diversas ordens. Essas imagens apresentam-se em desordem, com rapidez e difração e podem ser vistas como a expressão do vitalismo. Mesmo anárquicas, têm o importante papel de agregação, sendo assim um elo entre as tribos, as “neotribos”, baseado em laços afetivos oriundos da estética, do estar-junto e do cotidiano. Através da publicidade e da TV esse cotidiano é invadido pelo imaginário, aponta Maffesoli (1996). Vivemos a exacerbação do emocional e do sensível, ao mesmo tempo em que ocorre uma supervalorização da imagem, do aparente. Contudo, a aparência, de acordo com ele, não deve ser vista como mera futilidade superficial, e sim como a representação visual de um campo simbólico formado por diversos signos. Como aponta Debord (2000, p.18) “quando o mundo real se transforma em simples imagens, as simples imagens tornam-se seres reais e motivações eficientes de um comportamento hipnótico”. A forma, para Maffesoli (1996), é vista como poder catalisador de aglomerar um grupo de imagens, transformando a comunicação em estilo de vida, vestuário e comportamento. É uma mediadora entre o mundo social e natural e o eu pessoal. A imagem é composta de signos, e segundo Joly (1996), um signo só pode ser considerado signo quando exprime ideias. Como visto no subcapítulo sobre a indústria cultural, segundo Debord, a imagem hoje sobrepõe, muitas vezes, ao conteúdo. Kellner (2001, p. 301- grifos do autor) vai de encontro e afirma que: “se, na maior parte da história da televisão, a palavra-chave foi narração, a visão pós-modernista da televisão como imagem muitas vezes descentra a importância da narrativa”. Para Amaral, essa supervalorização da imagem no consumo de mídia se transfere para a vida pessoal: A tendência ao endeusamento e, por consequência, uma fetichização da imagem faz com que nos concentremos apenas na veloz sucessão de frames que perpassam o controle remoto em um zapping contínuo do mundo. Assim, recortamos e colamos não só imagens propriamente ditas, como sons, ruídos e músicas, tramando uma verdadeira sinfonia visual do presente (AMARAL, 2002, P. 35). No próximo capítulo, partiremos para a análise de imagem para compreensão do rock nos anos 2000.
  • 50. 49 4. A IMAGEM DO ROCK NOS ANOS 2000 Neste capítulo efetuaremos a análise da imagem do rock nos anos 2000, através da metodologia proposta por Joly (1996). Segundo Maffesoli (1996), as imagens possuem uma representação própria que não depende apenas de seu contexto, o que não significa ser dispensável o estudo de seu histórico. Nesse sentido, percorremos a trajetória do rock, desde seu surgimento, e o contextualizamos no seu atual período histórico, que segundo Monteiro (2006), é um momento em que podemos considerar haver um desvirtuamento de tal estilo musical, sendo esse o motivo pela delimitação da presente pesquisa no período dos anos 2000, que corresponde ao ano de 2000 até 2009. Por sua vez quanto à opção pela análise da imagem, ressaltamos que para Debord (2003) estamos vivendo um período de supervalorização da imagem. Essa afirmação também foi vista em publicações de Maffesoli (1996), Amaral (2002) e Llosa (2011). Para tal, optamos na presente pesquisa por um estudo da imagem, para compreensão do rock nos anos 2000. 4.1. A ANÁLISE DE IMAGEM A imagem enquanto parte do processo de aprendizagem é algo naturalizado nos procedimentos de educação desde a fase infantil do ser humano. As próprias imagens muitas vezes servem como suporte para a aprendizagem de escrita e da fala, o que, de acordo com Joly (1996), torna a leitura de imagem uma prática natural. No presente trabalho, iremos decifrar as significações além dessa aparente naturalidade, usando como metodologia a análise de imagem proposta por Joly (1996). De acordo com a autora: Interpretar uma mensagem, analisá-la, não consiste certamente em tentar encontrar ao máximo uma mensagem preexistente, mas em compreender o que essa mensagem, nessas circunstâncias, provoca significações aqui e agora, ao mesmo tempo que se tenta separar o que é pessoal do que é coletivo. (JOLY, 2006, p.44) Com base nesse pressuposto, pretendemos efetuar a análise de imagem do
  • 51. 50 rock nos anos 2000, tendo em vista o lado da emissão, na busca por encontrar significações que são transmitidas. Seguindo as funções da análise de imagem, destacadas por Joly: Demonstrar que a imagem é de fato uma linguagem, uma linguagem específica e heterogênea; que, nessa qualidade, distingue-se do mundo real e que, por meio de signos particulares dele, propõe uma representação escolhida e necessariamente orientada; distinguir as principais ferramentas dessa linguagem e o que sua ausência ou sua presença significam; relativizar sua própria interpretação, ao mesmo tempo que se compreendem seus fundamentos: todas garantias de liberdade intelectual que a análise pedagógica da imagem pode proporcionar. (JOLY, 1996, p. 48) Também devemos levar em consideração a afirmação da autora (JOLY, 1996, p. 99) de que “para ver as formas organizadas em uma mensagem visual e compreender a interpretação a que induzem, é preciso esforçar-se para esquecer o que representam e contemplá-las por si mesmas, com atenção”. A técnica será aplicada através da categorização proposta por Joly (1996), onde optamos pelas divisões que se fazem mais relevantes para o presente objeto de estudo, a saber: - Ângulo de tomada e escolha da objetiva: reforça ou contradiz a impressão de realidade vinculada ao suporte fotográfico. Joly (1996) aponta que os mais comuns são ploongé (de baixo), contre-ploongé (de cima) e o chamado pela autora de: à altura do homem e de frente (de frente). Os dois primeiros evidenciam o operador da câmera, isso é, deixam mais evidente a sensação de que existe um intermediário entre a foto e o receptor – no caso, o fotógrafo. - Enquadramento: corresponde ao tamanho da imagem. O enquadramento pode ser mais fechado ou mais amplo. - Composição e diagramação: é a escolha da posição dos elementos na construção da imagem. Tem o papel de hierarquização da visão. - Cores e iluminação: é uma interpretação antropológica, que exerce o efeito psico-fisiológico sobre o espectador, uma vez que é vista pela ótica, mas sentida psiquicamente, podendo remeter ao natural a tons mais frios ou mais quentes. - A textura: também pode estar presente em imagem de duas dimensões. Se refere a sinestesia, a sensações não visuais (táteis, auditivas, olfativas) que são transmitidas através do visual. Também propomos mais duas categorias relevantes para essa pesquisa:
  • 52. 51 - Ambientação: é o cenário onde a foto foi produzida. - Personagens e atitudes: os fotografados com sua pose, comportamento, figurino e direção cênica. Em nosso estudo, faremos uma apropriação da metodologia proposta por Joly utilizando algumas categorias distintas - como a autora propõe - mas agrupando outras, como o caso do enquadramento e da diagramação. Este agrupamento mantém a proposta metodológica e facilitará nossa análise a seguir. 4.2 OBJETIVO DA ANÁLISE Como exposto anteriormente, o presente estudo busca analisar a imagem do rock nos anos 2000 através da imagem, com o intuito de compreender se realmente existe um desvirtuamento do estilo nessa época ou se os elementos da gênese do rock ainda se fazem presente nos anos 2000. Tendo isto como objetivo geral, delimitamos essa análise de imagem ao seguinte: verificar através de fotografias de divulgação, produzidas entre 2000 e 2009, quais são os padrões visuais que se repetem nas bandas Arctic Monkeys, The Libertines e The Strokes e que fazem parte da construção simbólica do rock nas bandas do passado. A referida escolha dessas bandas não foi efetuada de maneira aleatória. O critério utilizado teve como referência a lista dos 100 melhores álbuns da década22 de acordo com a revista NME23 americana, especializada em música. Usando como recorte bandas com álbum de estreia lançado entre 2000 e 2009, que ocupam as primerias posições da lista24. São as três bandas, de acordo com suas posições: The Strokes, (1°), com “Is This It” (RCA, 2001), Libertines, (2°), com “Up the Bracket” (ROUGH TRADE, 2002) e Arctic Monkeys, (4º), com “Whatever People Say I Am, That's What I'm Not, Not” (DOMINO, 2006). Na sequência efetuaremos uma breve revisão bibliográfica de cada uma dessas bandas, bem como aspectos da crítica às mesmas. 22 Lançada em 2009, a lista é resultado de uma votação que inclui colaboradores da revista e uma seleção de músicos e figuras da indústria musical. Fonte: <http://www.nme.com/list/the-top-100- greatest-albums-of-the-decade/158049/page/10> Último acesso em 15 de outubro de 2013. 23 Abreviatura de New Music Express. A revista estabeleceu a “primeira lista regular de modo lógico e exato referente à vendagem de gravações na Grã-Bretanha” (FRITH, 1981, p. 167). Hoje o veículo se autointitula a fonte de notícias sobre música número um no mundo. Possui publicação mensal com foco no rock e na música alternativa. Para mais informações: <http://www.nme.com> Último acesso em 15 de outubro de 2013. 24 Na 3° posição temos a banda Primal Screm, que teve seu primeiro álbum lançado em 1987.
  • 53. 52 4.3 THE STROKES, THE LIBERTINES E ARCTIC MONKEYS: UM BREVE HISTÓRICO Para compreender, ainda que brevemente, estas três bandas utilizaremos como referência a biografia de cada uma e a crítica desses três álbuns no site da própria NME (2009), empregando também como referência o guia da música independente, a Pitchfork25. De acordo com a NME (2013c), The Strokes (Fig. 17) é uma banda americana formada em 1998 em Nova Iorque, composta por cinco integrantes: Julian Casablancas (vocais), Nick Valensi (guitarra/vocais), Albert Hammond, Jr. (guitarra/backing vocal), Nikolai Fraiture (baixo) e Fabrizio Moretti (bateria/percussão). É uma das bandas que contribuíram para a revitalização do rock de garagem no século XXI. O álbum de estreia da banda foi lançado em 2001 e foi aclamado pela crítica. A banda foi classificada como número 199 na Rolling Stones “500 Maiores Álbuns de Todos os Tempos” e número 8 na revista Rolling Stone “100 melhores álbuns estreia de todos os tempos”26. Figura 17 – O estilo do The Strokes Fonte: <http://www.lastfm.com.br/music/The+Strokes/+images/27554>. Último acesso em 3 de outubro de 2013 25 Publicação online estadunidense. Fonte: <http://pitchfork.com/> Acesso em: 15/10/2013. 26 Fonte: <http://www.nme.com/artists/the-strokes#biography> Acesso em: 19/10/2013.
  • 54. 53 Segundo Schreiber (2001, tradução nossa), “eles são uma banda de rock, puro e simples”. De acordo com o autor, o álbum de estreia dos Strokes atingiu um equilíbrio entre os dois extremos da música rock: sentimentalismo e apatia. Para Robinson (2005, tradução nossa): “o álbum traz canções tocantes, comoventes engraçadas, melodiosas, bem escritas e tocadas por pessoas em ótimos trajes”. Por sua vez a banda The Libertines (Fig. 18) é uma banda britânica formada em 1997 em Londres, de acordo com NME (2013b). Centrada na dupla: Carl Barat (vocais/guitarra) e Pete Doherty (vocais/guitarra), a banda também conta com John Hassall (baixo) e Gary Powell (bateria), e teve seus dois álbuns produzidos por Mick Jones, da banda punk britânica The Clash. Assim como o The Strokes, a banda fez parte da revitalização do rock de garagem e foi responsável por liderar o movimento no Reino Unido.
  • 55. 54 Figura 18 - Atitude junkie do Libertines Fonte: <http://www.nme.com/reviews/the-libertines/7537/photo/2#28>. Último acesso em 3 de outubro de 2013 Seu álbum de estreia foi lançado em 2002, segundo Carr (2003) carrega décadas de tradição rock, se valendo do blues e de alguns riffs ao estilo de Chuck Berry. Na opinião do autor, eles geraram uma riqueza para o rock, sendo responsáveis por abordar um vasto leque de atitudes com igual proficiência. Intercalando emoção, explosão e rebeldia em músicas que se fragmentam e ao mesmo tempo, parecem se encaixar. Segundo a NME (2013a), diante de inúmeros conflitos internos decorrentes de vícios de Doherty em drogas e de problemas de relacionamento entre os integrantes, a banda se dissolveu em 2004, reunindo-se para alguns shows em 2010. Já a banda Arctic Monkeys (Fig. 19) foi formada em 2002 em Sheffield, na Inglaterra, conforme a NME (2013a). O grupo é composto por Alex Turner (vocais/guitarra), Jamie Cook (guitarra), Nick O'Malley (baixo/backing vocals) e Matt