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O verdadeiro Mário Soares ...



Reencaminho como recebi !!!

Agora que todos devemos pensar um pouco na escolha dos que
nos devem governar, vai sendo tempo de ler e meditar sobre
quem já nos governou, GOVERNANDO-SE.




Só espero que quem receba estes escritos e não os deixem
morrer na memória do vosso computador. E mais ainda, que não
deixem de os fazer chegar ao maior número possível de pessoas.

*Mário Soares*

Outra faceta distingue a candidatura de Mário Soares a Belém
das anteriores, surge após a edição de Contos Proibidos -
Memórias de um PS desconhecido, do seu ex-companheiro de
partido Rui Mateus.

O livro, que noutra democracia europeia daria escândalo e
inquérito judicial veio a público nos últimos meses do segundo
mandato presidencial de Soares e foi ignorado pelos poderes da
República.



Em síntese, que diz Mateus ?

Que, após ganhar as primeiras presidenciais, 1986, Soares
fundou com alguns amigos políticos um grupo empresarial
destinado a usar os fundos financeiros remanescentes da
campanha.

Que a esse grupo competia canalizar apoios monetários antes
dirigidos ao PS, tanto mais que Soares detestava quem lhe
sucedeu no partido, Vítor Constâncio (um anti-soarista),

e procurava uma dócil alternativa a essa liderança.

Que um dos objectivos da recolha de dinheiros era para financiar
a reeleição de Soares.
Que, não podendo presidir ao grupo por razões óbvias, Soares
colocou os amigos como testas-de-ferro, embora reunisse
amiúde com eles para orientar a estratégia das empresas, tanto
em Belém como nas suas residências particulares.

Que, no exercício do seu "magistério de influência" (palavras
suas    noutro   contexto),  convocou      alguns   magnatas
internacionais - Rupert Murdoch, Sílvio Berlusconi, Robert
Maxwell e Stanley Ho - para o visitarem na Presidência da
República e se associarem ao grupo, a troco de avultadas
quantias que pagariam para facilitação dos seus investimentos
em Portugal.

Note-se que o "Presidente de todos os portugueses" não
convidou os empresários a investir na economia nacional, mas
apenas no seu grupo, apesar dos contribuintes suportarem
despesas de estada.

Que moral tem um país para criticar Avelino Ferreira Torres,
Isaltino Morais, Valentim Loureiro ou Fátima Felgueiras se acha
normal uma candidatura presidencial manchada por estas
revelações ?

E que foi feito dos negócios do Presidente Soares ?




Pela relevância do tema, ficará para próximo desenvolvimento.



*Parte 2*

publicado a 10 de Setembro de 2005, na Grande Reportagem nº
244 A rede de negócios que Soares dirigiu enquanto Presidente
foi sedeada na empresa Emaudio, agrupando um núcleo de
próximos seus, dos quais António Almeida Santos eterna ponte
entre política e vida económica, Carlos Melancia seu ex-ministro,
e o próprio filho, João.

A figura central era Rui Mateus, que detinha 60 mil acções da
Fundação de Relações Internacionais (subtraída por Soares à
influência do PS após abandonar a sua liderança),

as quais eram do Presidente mas de que fizera o outro fiel
depositário na sua permanência em Belém, relata Mateus em
Contos Proibidos.
Soares controlaria assim a Emaudio pelo seu principal testa-de-
ferro no grupo empresarial.

Diz Mateus que o Presidente queria investir nos média: daí o
convite inicial para Sílvio Berlusconi (o grande senhor da TV
italiana, mas ainda longe de conquistar o governo) visitar
Belém.

Acordou-se a sua entrada com 40% numa empresa em que o
grupo de Soares reteria o resto, mas tudo se gorou por
divergências no investimento.

Soares tentou então a sorte com Rupert Murdoch, que chegou a
Lisboa munido de um memorando interno sobre a associação a
"amigos íntimos e apoiantes do Presidente Soares",

com vista a "garantir o controlo de interesses nos média
favoráveis ao Presidente Soares e, assumimos, apoiar a sua
reeleição".

Interpôs-se porém outro magnata, Robert Maxwell, arqui-rival
de Murdoch, que invocou em Belém credenciais socialistas.
Soares daria ordem para se fazer o negócio com este.

O empresário inglês passou a enviar à Emaudio 30 mil euros
mensais.

Apesar de os projectos tardarem, a equipa de Soares garantira o
seu "mensalão".

Só há quatro anos foi criminalizado o tráfico de influências em
Portugal, com a adesão à Convenção Penal Europeia contra a
Corrupção.

Mas a ética política é um valor permanente, e as suas violações
não prescrevem.

Daí a actualidade destes factos, com a recandidatura de Soares.

O então Presidente ficaria aliás nervoso com a entrada em cena
das autoridades judiciais, episódio a merecer análise própria.



*Parte 3*

publicado a 17 de Setembro de 2005, na Grande Reportagem nº
245
A empresa Emaudio, dirigida na sombra pelo Presidente Soares,
arrancou pouco após a sua eleição e, segundo Rui Mateus em
Contos Proibidos, contava "com muitas dezenas de milhares de
contos "oferecidos" por (Robert) Maxwell (...) consideráveis
valores oriundos do "ex-MASP" e uma importante contribuição
de uma empresa próxima de Almeida Santos."
Ao nomear governador de Macau um homem da Emaudio, Carlos
Melancia, Soares permite juntar no território administração
pública e negócios privados.

Acena-se a Maxwell a entrega da estação pública de TV local,
com a promessa de fabulosas receitas publicitárias. Mas, face a
dificuldades técnicas, o inglês, tido por Mateus como "um dos
grandes vigaristas internacionais", recua.

O esquema vem a público, e Soares acusa os gestores da
Emaudio de lhe causarem perda de popularidade, anuncia-lhes
alterações ao projecto e exige a Mateus as acções de que é
depositário e permitem controlar a empresa.

O testa-de-ferro, fiel soarista, será cilindrado - tal como há
semanas sucedeu noutro contexto a Manuel Alegre.

Mas antes resiste, recusando devolver as acções e esperando a
reformulação do negócio.

E, quando uma empresa reclama por não ter contrapartida dos
50 mil contos (250 mil euros) pagos para obter um contrato na
construção do novo aeroporto de Macau, Mateus propõe o envio
do fax a Melancia exigindo a devolução da verba.

O Governador cala-se. Almeida Santos leva a mensagem a
Soares, que também se cala.

Então Mateus dá o documento a 'O Independente, daqui
nascendo o escândalo do fax de Macau".

m plena visita de Estado a Marrocos, ao saber que o Ministério
Público está a revistar a sede da Emaudio, o Presidente envia de
urgência a Lisboa Almeida Santos (membro da sua

comitiva) para   minimizar    os   estragos.   Mas   o   processo   é
inevitável.

Se Melancia acaba absolvido, Mateus e colegas são condenados
como corruptores.

Uma das revelações mais curiosas do seu livro é que o suborno
(sob o eufemismo de dádiva pública") não se destinou de facto a
Melancia mas "à Emaudio ou a quem o Presidente da República
decidisse".

Quem afinal devia ser réu ?
Os factos nem parecem muito difíceis de confirmar, ou
desmentir, e no entanto é mais fácil, mais confortável, ignorá-
los, não se confia na justiça ou porque não se acredita que
funcione em tempo útil, ou por que se tem medo que funcione,
em vida, e as dúvidas, os boatos, os rumores, a 'fama persistem.

E é assim, passo a passo, que lentamente se vai destruindo de
vez a confiança dos portugueses nas instituições.

Por incúria, por medo, por desleixo, até por arrogância,
porventura de fantasmas e até... da própria sombra.

N.A. Como adenda, e perdoem-me o sarcasmo que é preciso por
as coisas no seu devido lugar, talvez conviesse meditar no
generoso silêncio dedicado ao conteúdo destes artigos de Vieira,
e ao livro de Mateus, por parte de alguns dos e (ste) ticistas do
regime quando comparado com a, também ela generosa,
campanha em curso contra alguns 'antros' 'anónimos de
pensamento livre e desalinhado...

Ou, será que as coisas já evoluíram tanto, tanto, que agora só
existem depois de serem tratadas em blog ?

É que a Grande Reportagem tem uma tiragem superior a 100000
exemplares, nós ainda não...
Entretanto, por essas e por outras, do Brasil até gozam...

Como adenda suplementar convém frisar que o problema não é
novo, ou sequer isolado, antes é estrutural e crónico.

Atente-se na GALP e nas maravilhas que por lá se passa (ra) m.

No mínimo, os factos - 'estranhos - mereceriam                 uma
investigação apurada, judicial e jornalística, no entanto...




*O Polvo, Parte 4*

publicado a 24 de Setembro de 2005, na Grande Reportagem nº
246. por Joaquim Vieira.

Ao investigar o caso de corrupção na base do "fax de Macau", o
Ministério Público entreviu a dimensão da rede dos negócios
então dirigidos pelo Presidente Soares desde Belém.

A investigação foi encabeçada por António Rodrigues Maximiano,
Procurador-geral adjunto da República, que a dada altura se
confrontou com a eventualidade de inquirir o próprio Soares.

Questão demasiado sensível, que Maximiano colocou ao então
Procurador-geral da República, Narciso da Cunha Rodrigues. Dar
esse passo era abrir a Caixa de Pandora, implicando uma
investigação ao financiamento dos partidos políticos, não só do
PS mas também do PSD - há quase uma década repartindo os
governos entre si.
A previsão era catastrófica: operação "mãos limpas" à italiana,
colapso do regime, república dos Juízes.

Cunha Rodrigues, envolvido em conciliábulos com Soares em
Belém, optou pela versão mínima: deixar de fora o Presidente e
limitar o caso a apurar se o governador de Macau, Carlos
Melancia, recebera um suborno de 250 mil euros.

Entretanto, já Robert Maxwel abandonara a parceria com o
grupo empresarial de Soares, explicando a decisão em carta ao
próprio Presidente.

Mas logo a seguir surge Stanley Ho a       querer associar-se ao
grupo soarista, intenção que segundo      relata Rui Mateus em
Contos Proibidos, o magnata dos casinos   de Macau lhe comunica
"após consulta ao Presidente da            República, que ele
sintomaticamente apelida de boss.

Só que Mateus cai em desgraça, e Ho negociará o seu apoio com
o próprio Soares, durante uma "presidência aberta" que este
efectua na Guarda.

Acrescenta Mateus no livro que o grupo de Soares queria ligar-
se a Ho e à Interfina (uma empresa portuguesa arregimentada
por Almeida Santos) no gigantesco projecto de a assoreamento
e desenvolvimento urbanístico da baía da Praia Grande, em
Macau, lançado ainda por Melancia, e onde estavam previstos
lucros de milhões de contos".

Com estas operações, esclarece ainda Mateus, o Presidente
fortalecia uma nova instituição:

a Fundação Mário Soares. Inverosímil ?

Nada foi desmentido pelos envolvidos, nem nunca será.

*O Polvo, Parte 5, conclusão* publicado a 1 de Outubro de 2005,
na Grande Reportagem nº 247 Por Joaquim Vieira.



As revelações de Rui Mateus sobre os negócios do Presidente
Soares, em Contos Proibidos, tiveram impacto político nulo e
nenhuns efeitos.

Em vez de investigar práticas porventura ilícitas de um Chefe de
Estado, os jornalistas preferiram crucificar o autor pela "traição"
a Soares (uma tese académica elaborada por Estrela Serrano,
ex-assessora de imprensa em Belém, revelou as estratégias de
sedução do Presidente sobre uma comunicação social que
sempre o tratou com indulgência.)



Da parte dos soaristas, imperou a lei do silêncio: comentar o
tema era dar o flanco a uma fragilidade imprevisível. Quando o
livro saiu, a RTP procurou um dos visados para um frente-a-
frente com Mateus - todos recusaram.

A oferta mantém-se: o desejo dos apoiantes de Soares é varrer
para debaixo do tapete esta história (i) moral da III República, e
o próprio, se interrogado sobre o assunto, dirá que não fala
sobre minudências, mas sobre os grandes problemas da Nação.

Com a questão esquecida, Soares terminou em glória uma
histórica carreira política, mas o anúncio da sua recandidatura
veio acordar velhos fantasmas.

O mandatário, Vasco Vieira de Almeida, foi o autor do acordo
entre a Emaudio e Robert Maxwell.

Na cerimónia do Altis, viram-se figuras centrais dos negócios
soaristas, como Almeida Santos ou Ilídio Pinho, que o Presidente
fizera aliar a Maxwell.

Dos notáveis próximos da candidatura do "pai da pátria", há
também homens da administração de Macau sob a tutela de
Soares, como António Vitorino e Jorge Coelho, actuais
eminências pardas do PS, ou Carlos Monjardino, conselheiro
para a gestão dos fundos soaristas e presidente de uma
fundação formada com os dinheiros de Stanley Ho.

Outros ex-"macaenses" influentes são o ministro da Justiça
Alberto Costa, que, como director do Gabinete da Justiça do
território, interveio para minorar os estragos entre o soarismo e
a Emaudio, ou o presidente da CGD por nomeação de Sócrates,
que o Governador Melancia pôs à frente das obras do aeroporto
de Macau.

Será o Polvo apenas uma teoria de conspiração ?

E depois, Macau, sempre Macau...

2005-10-27 - 02:45:00 Joaquim Vieira, despedido
Joaquim Vieira, director da 'Grande Reportagem', detida pelo
grupo Controlinveste, foi despedido.

O jornalista foi igualmente informado de que a revista será
fechada.

As razões de tais medidas são desconhecidas.

Recorde-se que Vieira tem vindo a escrever sobre o polémico
livro de Rui Mateus, onde se aludia a ligações do PS de Soares ao
caso Emáudio.

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  • 1. O verdadeiro Mário Soares ... Reencaminho como recebi !!! Agora que todos devemos pensar um pouco na escolha dos que nos devem governar, vai sendo tempo de ler e meditar sobre quem já nos governou, GOVERNANDO-SE. Só espero que quem receba estes escritos e não os deixem morrer na memória do vosso computador. E mais ainda, que não deixem de os fazer chegar ao maior número possível de pessoas. *Mário Soares* Outra faceta distingue a candidatura de Mário Soares a Belém das anteriores, surge após a edição de Contos Proibidos - Memórias de um PS desconhecido, do seu ex-companheiro de partido Rui Mateus. O livro, que noutra democracia europeia daria escândalo e inquérito judicial veio a público nos últimos meses do segundo mandato presidencial de Soares e foi ignorado pelos poderes da República. Em síntese, que diz Mateus ? Que, após ganhar as primeiras presidenciais, 1986, Soares fundou com alguns amigos políticos um grupo empresarial destinado a usar os fundos financeiros remanescentes da campanha. Que a esse grupo competia canalizar apoios monetários antes dirigidos ao PS, tanto mais que Soares detestava quem lhe sucedeu no partido, Vítor Constâncio (um anti-soarista), e procurava uma dócil alternativa a essa liderança. Que um dos objectivos da recolha de dinheiros era para financiar a reeleição de Soares.
  • 2. Que, não podendo presidir ao grupo por razões óbvias, Soares colocou os amigos como testas-de-ferro, embora reunisse amiúde com eles para orientar a estratégia das empresas, tanto em Belém como nas suas residências particulares. Que, no exercício do seu "magistério de influência" (palavras suas noutro contexto), convocou alguns magnatas internacionais - Rupert Murdoch, Sílvio Berlusconi, Robert Maxwell e Stanley Ho - para o visitarem na Presidência da República e se associarem ao grupo, a troco de avultadas quantias que pagariam para facilitação dos seus investimentos em Portugal. Note-se que o "Presidente de todos os portugueses" não convidou os empresários a investir na economia nacional, mas apenas no seu grupo, apesar dos contribuintes suportarem despesas de estada. Que moral tem um país para criticar Avelino Ferreira Torres, Isaltino Morais, Valentim Loureiro ou Fátima Felgueiras se acha normal uma candidatura presidencial manchada por estas revelações ? E que foi feito dos negócios do Presidente Soares ? Pela relevância do tema, ficará para próximo desenvolvimento. *Parte 2* publicado a 10 de Setembro de 2005, na Grande Reportagem nº 244 A rede de negócios que Soares dirigiu enquanto Presidente foi sedeada na empresa Emaudio, agrupando um núcleo de próximos seus, dos quais António Almeida Santos eterna ponte entre política e vida económica, Carlos Melancia seu ex-ministro, e o próprio filho, João. A figura central era Rui Mateus, que detinha 60 mil acções da Fundação de Relações Internacionais (subtraída por Soares à influência do PS após abandonar a sua liderança), as quais eram do Presidente mas de que fizera o outro fiel depositário na sua permanência em Belém, relata Mateus em Contos Proibidos.
  • 3. Soares controlaria assim a Emaudio pelo seu principal testa-de- ferro no grupo empresarial. Diz Mateus que o Presidente queria investir nos média: daí o convite inicial para Sílvio Berlusconi (o grande senhor da TV italiana, mas ainda longe de conquistar o governo) visitar Belém. Acordou-se a sua entrada com 40% numa empresa em que o grupo de Soares reteria o resto, mas tudo se gorou por divergências no investimento. Soares tentou então a sorte com Rupert Murdoch, que chegou a Lisboa munido de um memorando interno sobre a associação a "amigos íntimos e apoiantes do Presidente Soares", com vista a "garantir o controlo de interesses nos média favoráveis ao Presidente Soares e, assumimos, apoiar a sua reeleição". Interpôs-se porém outro magnata, Robert Maxwell, arqui-rival de Murdoch, que invocou em Belém credenciais socialistas. Soares daria ordem para se fazer o negócio com este. O empresário inglês passou a enviar à Emaudio 30 mil euros mensais. Apesar de os projectos tardarem, a equipa de Soares garantira o seu "mensalão". Só há quatro anos foi criminalizado o tráfico de influências em Portugal, com a adesão à Convenção Penal Europeia contra a Corrupção. Mas a ética política é um valor permanente, e as suas violações não prescrevem. Daí a actualidade destes factos, com a recandidatura de Soares. O então Presidente ficaria aliás nervoso com a entrada em cena das autoridades judiciais, episódio a merecer análise própria. *Parte 3* publicado a 17 de Setembro de 2005, na Grande Reportagem nº 245 A empresa Emaudio, dirigida na sombra pelo Presidente Soares, arrancou pouco após a sua eleição e, segundo Rui Mateus em Contos Proibidos, contava "com muitas dezenas de milhares de contos "oferecidos" por (Robert) Maxwell (...) consideráveis valores oriundos do "ex-MASP" e uma importante contribuição de uma empresa próxima de Almeida Santos."
  • 4. Ao nomear governador de Macau um homem da Emaudio, Carlos Melancia, Soares permite juntar no território administração pública e negócios privados. Acena-se a Maxwell a entrega da estação pública de TV local, com a promessa de fabulosas receitas publicitárias. Mas, face a dificuldades técnicas, o inglês, tido por Mateus como "um dos grandes vigaristas internacionais", recua. O esquema vem a público, e Soares acusa os gestores da Emaudio de lhe causarem perda de popularidade, anuncia-lhes alterações ao projecto e exige a Mateus as acções de que é depositário e permitem controlar a empresa. O testa-de-ferro, fiel soarista, será cilindrado - tal como há semanas sucedeu noutro contexto a Manuel Alegre. Mas antes resiste, recusando devolver as acções e esperando a reformulação do negócio. E, quando uma empresa reclama por não ter contrapartida dos 50 mil contos (250 mil euros) pagos para obter um contrato na construção do novo aeroporto de Macau, Mateus propõe o envio do fax a Melancia exigindo a devolução da verba. O Governador cala-se. Almeida Santos leva a mensagem a Soares, que também se cala. Então Mateus dá o documento a 'O Independente, daqui nascendo o escândalo do fax de Macau". m plena visita de Estado a Marrocos, ao saber que o Ministério Público está a revistar a sede da Emaudio, o Presidente envia de urgência a Lisboa Almeida Santos (membro da sua comitiva) para minimizar os estragos. Mas o processo é inevitável. Se Melancia acaba absolvido, Mateus e colegas são condenados como corruptores. Uma das revelações mais curiosas do seu livro é que o suborno (sob o eufemismo de dádiva pública") não se destinou de facto a Melancia mas "à Emaudio ou a quem o Presidente da República decidisse". Quem afinal devia ser réu ?
  • 5. Os factos nem parecem muito difíceis de confirmar, ou desmentir, e no entanto é mais fácil, mais confortável, ignorá- los, não se confia na justiça ou porque não se acredita que funcione em tempo útil, ou por que se tem medo que funcione, em vida, e as dúvidas, os boatos, os rumores, a 'fama persistem. E é assim, passo a passo, que lentamente se vai destruindo de vez a confiança dos portugueses nas instituições. Por incúria, por medo, por desleixo, até por arrogância, porventura de fantasmas e até... da própria sombra. N.A. Como adenda, e perdoem-me o sarcasmo que é preciso por as coisas no seu devido lugar, talvez conviesse meditar no generoso silêncio dedicado ao conteúdo destes artigos de Vieira, e ao livro de Mateus, por parte de alguns dos e (ste) ticistas do regime quando comparado com a, também ela generosa, campanha em curso contra alguns 'antros' 'anónimos de pensamento livre e desalinhado... Ou, será que as coisas já evoluíram tanto, tanto, que agora só existem depois de serem tratadas em blog ? É que a Grande Reportagem tem uma tiragem superior a 100000 exemplares, nós ainda não...
  • 6. Entretanto, por essas e por outras, do Brasil até gozam... Como adenda suplementar convém frisar que o problema não é novo, ou sequer isolado, antes é estrutural e crónico. Atente-se na GALP e nas maravilhas que por lá se passa (ra) m. No mínimo, os factos - 'estranhos - mereceriam uma investigação apurada, judicial e jornalística, no entanto... *O Polvo, Parte 4* publicado a 24 de Setembro de 2005, na Grande Reportagem nº 246. por Joaquim Vieira. Ao investigar o caso de corrupção na base do "fax de Macau", o Ministério Público entreviu a dimensão da rede dos negócios então dirigidos pelo Presidente Soares desde Belém. A investigação foi encabeçada por António Rodrigues Maximiano, Procurador-geral adjunto da República, que a dada altura se confrontou com a eventualidade de inquirir o próprio Soares. Questão demasiado sensível, que Maximiano colocou ao então Procurador-geral da República, Narciso da Cunha Rodrigues. Dar esse passo era abrir a Caixa de Pandora, implicando uma investigação ao financiamento dos partidos políticos, não só do PS mas também do PSD - há quase uma década repartindo os governos entre si.
  • 7. A previsão era catastrófica: operação "mãos limpas" à italiana, colapso do regime, república dos Juízes. Cunha Rodrigues, envolvido em conciliábulos com Soares em Belém, optou pela versão mínima: deixar de fora o Presidente e limitar o caso a apurar se o governador de Macau, Carlos Melancia, recebera um suborno de 250 mil euros. Entretanto, já Robert Maxwel abandonara a parceria com o grupo empresarial de Soares, explicando a decisão em carta ao próprio Presidente. Mas logo a seguir surge Stanley Ho a querer associar-se ao grupo soarista, intenção que segundo relata Rui Mateus em Contos Proibidos, o magnata dos casinos de Macau lhe comunica "após consulta ao Presidente da República, que ele sintomaticamente apelida de boss. Só que Mateus cai em desgraça, e Ho negociará o seu apoio com o próprio Soares, durante uma "presidência aberta" que este efectua na Guarda. Acrescenta Mateus no livro que o grupo de Soares queria ligar- se a Ho e à Interfina (uma empresa portuguesa arregimentada por Almeida Santos) no gigantesco projecto de a assoreamento e desenvolvimento urbanístico da baía da Praia Grande, em Macau, lançado ainda por Melancia, e onde estavam previstos lucros de milhões de contos". Com estas operações, esclarece ainda Mateus, o Presidente fortalecia uma nova instituição: a Fundação Mário Soares. Inverosímil ? Nada foi desmentido pelos envolvidos, nem nunca será. *O Polvo, Parte 5, conclusão* publicado a 1 de Outubro de 2005, na Grande Reportagem nº 247 Por Joaquim Vieira. As revelações de Rui Mateus sobre os negócios do Presidente Soares, em Contos Proibidos, tiveram impacto político nulo e nenhuns efeitos. Em vez de investigar práticas porventura ilícitas de um Chefe de Estado, os jornalistas preferiram crucificar o autor pela "traição" a Soares (uma tese académica elaborada por Estrela Serrano, ex-assessora de imprensa em Belém, revelou as estratégias de sedução do Presidente sobre uma comunicação social que sempre o tratou com indulgência.) Da parte dos soaristas, imperou a lei do silêncio: comentar o tema era dar o flanco a uma fragilidade imprevisível. Quando o
  • 8. livro saiu, a RTP procurou um dos visados para um frente-a- frente com Mateus - todos recusaram. A oferta mantém-se: o desejo dos apoiantes de Soares é varrer para debaixo do tapete esta história (i) moral da III República, e o próprio, se interrogado sobre o assunto, dirá que não fala sobre minudências, mas sobre os grandes problemas da Nação. Com a questão esquecida, Soares terminou em glória uma histórica carreira política, mas o anúncio da sua recandidatura veio acordar velhos fantasmas. O mandatário, Vasco Vieira de Almeida, foi o autor do acordo entre a Emaudio e Robert Maxwell. Na cerimónia do Altis, viram-se figuras centrais dos negócios soaristas, como Almeida Santos ou Ilídio Pinho, que o Presidente fizera aliar a Maxwell. Dos notáveis próximos da candidatura do "pai da pátria", há também homens da administração de Macau sob a tutela de Soares, como António Vitorino e Jorge Coelho, actuais eminências pardas do PS, ou Carlos Monjardino, conselheiro para a gestão dos fundos soaristas e presidente de uma fundação formada com os dinheiros de Stanley Ho. Outros ex-"macaenses" influentes são o ministro da Justiça Alberto Costa, que, como director do Gabinete da Justiça do território, interveio para minorar os estragos entre o soarismo e a Emaudio, ou o presidente da CGD por nomeação de Sócrates, que o Governador Melancia pôs à frente das obras do aeroporto de Macau. Será o Polvo apenas uma teoria de conspiração ? E depois, Macau, sempre Macau... 2005-10-27 - 02:45:00 Joaquim Vieira, despedido Joaquim Vieira, director da 'Grande Reportagem', detida pelo grupo Controlinveste, foi despedido. O jornalista foi igualmente informado de que a revista será fechada. As razões de tais medidas são desconhecidas. Recorde-se que Vieira tem vindo a escrever sobre o polémico livro de Rui Mateus, onde se aludia a ligações do PS de Soares ao caso Emáudio.