Este documento apresenta o projeto de um jornal humorístico chamado Barriga para Blumenau. Inicialmente, discute a história do jornalismo humorístico no Brasil e em Blumenau, destacando que poucos jornais humorísticos circularam na cidade. Em seguida, justifica a criação do Barriga para preencher essa lacuna e fornecer uma perspectiva humorística sobre os assuntos locais, além de promover o debate público. Finalmente, descreve o processo de produção do jornal, incluindo a
1. CRISTIAN EDEL WEISS
TIAGO RIBEIRO SANTOS
JORNAL BARRIGA:
o jornalismo humorístico chegando de barriga em Blumenau
BLUMENAU - SC
2009
2. 2
INSTITUTO BLUMENAUENSE DE ENSINO SUPERIOR IBES SOCIESC
CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL COM HABILITAÇÃO EM JORNALISMO
PROJETO: PRÁTICA EDITORIAL IMPRESSA
CRISTIAN EDEL WEISS
TIAGO RIBEIRO SANTOS
JORNAL BARRIGA:
o jornalismo humorístico chegando de barriga em Blumenau
Disciplina: Projeto Experimental em
Comunicação
Coordenadora do Projeto Experimental
habilitação em Jornalismo: Ofélia Elisa Torres
Morales, Dra.
Linha de Pesquisa: Mídia Regional
Professor Orientador: Airton Almeida, Ms.
BLUMENAU - SC
2009
3. 3
CRISTIAN EDEL WEISS
TIAGO RIBEIRO SANTOS
JORNAL BARRIGA
Projeto Experimental em Comunicação aprovado para a conclusão da matéria Projeto Experimental em
Comunicação, do sétimo semestre do Curso de Comunicação Social do Habilitação em Jornalismo IBES
SOCIESC, pela banca examinadora com nota: ______ (____________________)
______________________________________________________________________
Presidente: Prof. Airton Almeida, Ms. (Orientador)
_____________________________________________________________________
Membro: Prof. Carlos Silva, Ms.
______________________________________________________________________
Membro: Valther Ostermann
______________________________________________________________________
Coordenadora do Projeto Experimental em Comunicação: Profa.Ofélia Torres Morales
4. 4
RESUMO
O estudo apresentado ao longo deste Projeto Experimental em Comunicação (PEC)
refere-se à criação de um jornal humorístico para o público-leitor blumenauense. Inicialmente,
este memorial apresenta uma fundamentação histórica como forma de compreender a origem
do jornalismo humorístico no Brasil, chegando até à cidade de Blumenau, como mercado a
ser focado pelo presente produto jornalístico que será descrito. O documento ressalta a
importância de um meio humorístico e opinativo circulante na região capaz de fornecer à
sociedade um ponto de vista diferenciado sobre assuntos possivelmente já tratados, ou não,
pela imprensa local.
Palavras-chaves: humor; jornalismo opinativo; Blumenau
5. 5
ABSTRACT
This Trial Communication Project presents a study that refers to the creation of a
humorous newspaper dedicated to readers from Blumenau city, in Santa Catarina state.
Firstly, this memorial presents a historical base as a way to comprehend and to reflect about
the origin of humorous journalism in Brazil, especially in Blumenau city, which is the aimed
market by the journalistic product that will be described soon afterwards. The document
emphasizes the importance of a humorous and argumentative publication, distributed around
the Vale do Itajaí, able to provide different points of view about subjects that the local press
have already accosted, or not.
Key-words: humour, opinionative journalism, Blumenau City
6. 6
SUMÁRIO
1 APRESENTAÇÃO ..................................................................................................................8
2 INTRODUÇÃO .......................................................................................................................9
3 JUSTIFICATIVA ..................................................................................................................10
4 OBJETIVOS ..........................................................................................................................12
4.1 OBJETIVO GERAL ...........................................................................................................12
4.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS .............................................................................................12
5 HUMOR EM FOCO NO JORNALISMO IMPRESSO BRASILEIRO................................13
5.1 BARÃO DE ITARARÉ: AUDAZ JORNALISTA, ASSAZ HUMORISTA .....................13
5.2 O PASQUIM: O HUMOR NO JORNALISMO CONTRA A DITADURA MILITAR....16
5.2.1 O Fim de O Pasquim........................................................................................................18
6 O JORNALISMO HUMORÍSTICO EM BLUMENAU.......................................................20
6.1. OS JORNAIS CARNAVALESCOS .................................................................................21
6.1.1. Altonaer Fastnachts-Umzug-Zeitung..............................................................................21
6.1.2 Teutônia Faschingsnumer ................................................................................................21
6.1.3 Bummelauer Fastnachts ...................................................................................................22
6.1.4 Schuetsenliesel.................................................................................................................22
6.1.5 Kiriri.................................................................................................................................22
6.1.6 Die Schnauze ...................................................................................................................23
6.1.7 A Ortiga ...........................................................................................................................24
6.1.8 Die Mistgabel...................................................................................................................24
6.1.9 Sudarm-Glocken ..............................................................................................................25
6.1.10 Der Mosquito .................................................................................................................25
6.1.11 Die Quasselbude ............................................................................................................25
6.1.12 Die Gurke.......................................................................................................................26
6.1.13 Antesiriprospético ..........................................................................................................26
6.1.14 A Folia ...........................................................................................................................27
6.2 OS JORNAIS HUMORÍSTICOS .......................................................................................27
6.2.1 O Quebra-Nozes ..............................................................................................................27
6.2.2 Bem-Te-Vi .......................................................................................................................28
6.2.3 Zé Pereira .........................................................................................................................28
6.2.4 O Bisturi...........................................................................................................................28
6.2.5 O KCT..............................................................................................................................28
7. 7
6.2.6 Piranha .............................................................................................................................29
6.2.7 O Tinhoso ........................................................................................................................29
7 O JORNALISMO OPINATIVO E O HUMOR ....................................................................30
7.1 A influência Pasquim, o estilo Barriga ...............................................................................33
8 HUMOR E INFORMAÇÃO .................................................................................................35
8.1. O desafio do jornalismo com humor..................................................................................36
8.2 Como o humor é apresentado nos jornais ...........................................................................38
8.3 O papel do humor no jornalismo ........................................................................................40
8.4 O humor sob o prisma ético ................................................................................................42
9 RELATO DE PRODUÇÃO ..................................................................................................45
9.1 PRÉ-PRODUÇÃO..............................................................................................................45
9.1.1 iBZ: o independente início de um projeto .......................................................................45
9.1.2 Barriga: o único sentido de ser ........................................................................................46
9.2 PRODUÇÃO ......................................................................................................................47
9.2.1 A inspiração humorística .................................................................................................47
9.2.2 Recursos para a produção do jornal .................................................................................48
9.2.3 O Projeto Gráfico.............................................................................................................48
9.2.3.1 Formato tablóide ...........................................................................................................49
9.2.3.3 Distribuição das Matérias .............................................................................................51
9.2.4 As imagens e o humor .....................................................................................................52
9.2.5 Uso da Cor .......................................................................................................................53
9.2.8 Fontes Utilizadas..............................................................................................................54
9.7 Logotipia .............................................................................................................................55
9.3 PÓS-PRODUÇÂO..............................................................................................................55
9.3.1 A Impressão .....................................................................................................................55
CONCLUSÃO ..........................................................................................................................56
APÊNDICE A...........................................................................................................................57
APÊNDICE B ...........................................................................................................................58
ANEXO A Zonas de visualização da página.........................................................................59
ANEXO B Esboços do Orientador ........................................................................................59
ANEXO C Evolução da logotipiaANEXO D........................................................................61
ANEXO D.................................................................................................................................64
ANEXO E .................................................................................................................................65
REFERÊNCIAS........................................................................................................................66
8. 8
1 APRESENTAÇÃO
Um jornal de humor, crítico e com abrangência regional. O Barriga é uma proposta
alternativa às mídias existentes no município. Deve circular em Blumenau e ter periodicidade
quinzenal. A inovação proposta é a espirituosidade intrínseca no discurso da notícia.
O jornal possui 12 páginas distribuídas entre as editorias de opinião, política,
economia, geral, esportes, cultura e um espaço dedicado às personalidades comuns que
ajudam a construir a história da cidade. Em formato tablóide e cor padrão em tonalidades
verdes, o layout acompanha o estilo irreverente da publicação.
O nome Barriga foi inspirado no histórico apelido aferido aos catarinenses: barriga-
verde. A riqueza léxica do termo também permite diversas combinações frasais, que
contribuem para a criação de expressões bem-humoradas, tais como: de barriga cheia, barriga
d água, cair de barriga, barriga tanquinho e inúmeros outros.
Trata-se de um projeto que investe no estilo literário diferenciado e na crítica para
mostrar que é possível ir além da notícia.
9. 9
2 INTRODUÇÃO
Registros apontam que somente sete jornais de caráter humorístico tenham surgido na
história da imprensa em Blumenau, Santa Catarina. Ainda que tenha existido um número
considerável de jornais carnavalescos, editados anualmente, a fim de entreter o público no
tempo festivo que antecedia a quarta-feira de cinzas, ambos os tipos de jornais não
ultrapassaram o ano de 1938, quando a II Guerra Mundial pairou sobre o mundo.
Apesar de desconhecida esta informação por nós quando demos início a este Projeto
Experimental em Comunicação (PEC)1, dispusemo-nos mesmo assim à criação de um jornal
humorístico cuja proposta está em levar informação com estilo irreverente ao público-leitor
blumenauense. Mas, através do dado histórico que apontamos, uma outra missão surgiu a
nossa frente: trazer de volta à Blumenau sua veia humorística, talvez apagada pela própria
auto-censura dos habitantes após o período de guerras.
Embora o humor seja considerado, por nós, o principal atrativo aos leitores ao jornal
humorístico que propomos, é válido frisar que a publicação é estruturada através das
características de um produto jornalístico. Portanto, exemplos dos critérios de noticiabilidade
propostos por Erbolato (2004) como a Proximidade; que é capaz de tornar o leitor como parte
do contexto explorado; o Interessa Pessoal; que dá sentido de relevância à matéria sob olhos
do público consumidor e, evidentemente, o Humor; vão ao encontro da proposta deste PEC,
além de temas como o jornalismo opinativo e a ética jornalística.
Ainda que o registro inicial sobre o período curto em que publicações humorísticas
aconteceram em Blumenau não revele bons auspícios, não se é isentada a missão de
transformar o presente PEC, talvez um dia, em um produto jornalístico2. Mesmo diante do
fato deste Projeto não contar com uma pesquisa de mercado sobre a aceitação do produto, é
válido a ressalva que não faz parte de seus objetivos a suposição de um produto bem aceito.
Mas, sim, a demonstração prática de um caminho diferente para a condução da notícia e
opinião. Um caminho exercido através do humor.
1
A partir desta explicação, os acadêmicos optam por usar ao longo deste memorial apenas a sigla PEC como
referência a Projeto Experimental em Comunicação
2
Os acadêmicos tem com isto total consciência de que uma pesquisa de aceitação de mercado se faz necessária
neste caso.
10. 10
3 JUSTIFICATIVA
Como já relatado na Introdução deste PEC, poucos são os registros de jornais
humorísticos que circularam por tempos duradouros na cidade de Blumenau (SC). Dentro da
mídia impressa, o humor esteve dentro de jornais estudantis, políticos e publicações
carnavalescas que, durante o início do século XX, surgiram e desapareceram entre um trocar
de ano e outro. Mas, efêmeros ou não, como o Die Shnauze, surgido na década de 1920, em
Blumenau, publicações como estas funcionavam como eficiente meio opinativo e de
entretenimento ao público leitor, conforme é descrito por Silva (1970, p.44)
Êste foi, sem dúvida, o mais interessante, o de vida mais longa e mais temido jornal
carnavalesco publicado em Blumenau [....] Muito bem escrito e bem impresso, o seu
aparecimento era sempre ansiosamente esperado. Suas críticas, feitas com muita
graça, eram ferinas e, por isso mesmo, temidas. Criticava, inclusive, com muito bom
humor, a própria administração municipal e as autoridades constituídas [...]
Como o Die Schnauze que prezava por bons textos, críticas concretas e o bom-humor,
o jornal Barriga surge a partir da idéia de investir em um produto jornalístico diferenciado e,
ainda, através do humor, revelar possibilidades de ir além da notícia factual, pertencente à
linha editorial dos jornais blumenauenses. Como um meio de comunicação diferente na
região, o Barriga nasce para preencher a lacuna de um mercado inexistente, o do humor, que é
ausente no Vale do Itajaí, e, ainda, sem se limitar às pequenas charges e colunas satíricas,
conforme podem ser acompanhadas em editorias específicas dos principais jornais da cidade.
Atualmente, o espaço para o humor é restrito nestes jornais. Quando encontrado, o
humor está presente nas charges e nos espaços dedicados aos colunistas. Entre os colunistas,
citamos Ostermann (2009, p. 3) como um dos que mais comumente se utiliza do humor em
suas notas, geralmente acompanhadas de certa ironia.
Nossos políticos federais pretendem acabar com a tal verba indenizatória, um salário
(dos bons) que recebem por fora a título do ressarcimento de despesas com
aluguel, manutenção de escritórios e locação, entre outras. O jeito de acabar com o
privilégio, porém, dá nos nervos: a sugestão mais em voga é de incorporá-la aos seus
salários. Não são umas gracinhas?
Diferente destes jornais que utilizam o humor de maneira setorizada, o PEC de um
jornal humorístico como o Barriga se diferencia dos mesmos devido à sua característica de
retratar o humor por entre todas as páginas de produção textual. Mas, como possivelmente
também é de objetivo dos atuais jornais circulantes em Blumenau, um de seus propósitos está
11. 11
em fomentar o debate público sobre os acontecimentos circulantes na região, fornecendo ao
público um ponto de vista humorístico ao tratar os assuntos além da banalidade. Assuntos
que, possivelmente, já circularam na mídia em geral ou não.
E é sobre a banalidade que se encontra um desafio. A idéia de desenvolver o Barriga
jamais teria chegado até aqui se a experiência de um jornal humorístico anterior, o iBZ o
jornal da língua solta, desenvolvido pelos próprios acadêmicos deste PEC, não resultasse de
maneira positiva. Criado em maio de 2007 e ainda em circulação mensal, o iBZ inseriu-se no
meio acadêmico para utilizar o humor dentro do jornalismo, trazendo a partir da banalidade de
assuntos tão corriqueiros do dia-a-dia de uma faculdade, pontos de vistas satíricos,
humorísticos e críticos que despertaram atenção e assiduidade do público leitor. Aos poucos
o iBZ foi ganhou um público fiel até receber indicações para o prêmio na categoria de
Jornalismo Opinativo, na edição 2008 do Intercom Sul. E sem estes avanços e resultados, o
jornal Barriga hoje não estaria no papel como PEC.
É sobre este pensamento, na tentativa de corromper a banalidade dos acontecimentos e
converte-los em opinião, crítica humorística e principalmente o humor3 por si só, o Barriga
surge como um produto jornalístico diferenciado em Blumenau. Um veículo que, como os
jornais da cidade, têm o objetivo de estar sempre à procura da verdade, mas, que ainda não
está exposta de maneira humorística.
3
Para o emprego da palavra humor que percorrerá por este projeto acadêmico, temos como principal
referência Torelly (apud SOÓ 1984, p. 90) onde cita que o humor consiste em mostrar o outro lado das coisas. O
lado que a sociedade não vê, porém sente. Ainda, não usando o humor apenas sobre assuntos fúteis, mas, sim,
covertendo-o à capacidade de retratar até e miséria com leveza.
12. 12
4 OBJETIVOS
4.1 OBJETIVO GERAL
Este presente projeto acadêmico tem como objetivo geral, primeiramente, se
contextualizar dentro de uma breve história sobre o jornalismo humorístico no Brasil que
influenciaram de certo modo sua criação. Após a contextualização, representar o humor
dentro do jornalismo opinativo dando aos fatos um novo ponto vista.
4.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Fornecer aos leitores da mídia impressa blumenauense uma alternativa sobre as
publicações existentes no município.
Inovar como produto jornalístico dentre os que circulam na região, criando um
ponto de vista singular sobre acontecimentos já divulgados, ou não, pela mídia.
Trazer novos assuntos a público de maneira humorística.
13. 13
5 HUMOR EM FOCO NO JORNALISMO IMPRESSO BRASILEIRO
"O bom humor é incompatível com a crueldade."
(Voltaire)
Para que seja compreendida a existência de um jornal humorístico em Blumenau, é
inegável a necessidade um resgate histórico sobre os principais expoentes desta diferente
maneira de transformar acontecimentos em opinião e ainda transmitir o humor. Porém, não
cabe a este PEC a função de um minucioso detalhamento sobre a infinidade de publicações
jornalísticas e humorísticas que já circulam ou ainda estão circulantes no Brasil. Cabe a ele, o
dever de retratar suas principais influências e inspirações que deixaram no jornal Barriga a
certeza de que, assim como outros meios humorísticos que ganham notabilidade entre o
público, ele, como jornal humorístico, também pode conseguir o seu espaço na mídia local.
5.1 BARÃO DE ITARARÉ: AUDAZ JORNALISTA, ASSAZ HUMORISTA
Fernando Aparício Brinkerhoff Torelly nasceu em São Leopoldo, no Rio Grande do
Sul, em 1895. Torelly estudou medicina por dois anos, mas seu descomprometimento com as
disciplinas fariam dele um aluno repetente duas vezes num mesmo período. Aos 21 anos,
publicou seu primeiro livro (Pontas de Cigarros) com poesias satíricas sobre a falta de
dinheiro4. Mas, a própria falta de dinheiro o acabaria obrigando a procurar emprego no
jornalismo do Rio de Janeiro. Lá, com um exemplar de O Globo no bolso, apresentou-se a
Irineu Marinho, que lhe perguntou o que sabia fazer. Tudo , respondeu Aparício, desde
varrer redação até dirigir jornal 5. Marinho se simpatizou com o jovem gaúcho depois de ler
umas de suas crônicas humorísticas e o contratou. A primeira dessas crônicas foi publicada
logo no dia seguinte, na capa de O Globo (SOÓ, 1984).
Em 1926, parodiando o jornal A Manhã, que era um dos mais influentes da época,
Torelly resolveu lançar A Manha, um singularíssimo jornal humorístico , como aponta
Sodré (2004, p. 372).
A linguagem do semanário de cunho altamente satírico prezava pela diversidade
literária, utilizando-se de sotaques para a produção dos textos, como o exemplo da cidade dos
4
No registro de Konder (1986) o fator dinheiro era desprezado pelos poetas da época.
5
Diálogo reproduzido do jornal digital da ABI (Orgão oficial da Associação Brasileira da Impresa), set. 2007
14. 14
colaboradores que constavam no final do jornal: Sand Cadrin (Santa Catarina) e Bordlegro
(Porto Alegre). Sôo (1984, p. 46) afirma que este jornal de estilo humorístico foi o primeiro a
ser publicado: A Manha era a caricatura dos jornais da época e por tabela da própria época.
Esse tipo de jornalismo nunca fora feito em lugar nenhum. Só muito mais tarde, nos Estados
Unidos, no Mad de Harvey Kurztman e no National Lampoon .
Devido ao uso do humor, o risco maior do jornal estava na produção de sua editoria
política através da satirização de grandes nomes do atual poder da época. Um exemplo disso
era o Ministro das Relações Exteriores, Felix Pacheco, que Torelly apelidou-o de Infélix
Péchic, por usar sempre botinhas bem lustrosas e aparentar um rosto tristonho. E com
brincadeiras assim, eram corriqueiras as visitas de policiais à redação de A Manha, na rua 13
de Maio, no Rio de Janeiro, fazendo ameaças com o fechamento do jornal. Por dificuldades
financeiras, entre 1929 e 1930, Torelly se viu obrigado a circular seu jornal como anexo do
Diário da Noite, de Assis Chateaubriand, gozando a popularidade que alcançara, mesmo antes
de ser autonomeado como Barão de Itararé, nome que marcaria sua carreira, conforme explica
Konder (1983, p.17)
Em outubro de 1930, as forças reunidas em torno da Aliança Liberal se sublevaram
sob a liderança de Getúlio Vargas. A Batalha decisiva deveria se travar em Itararé,
mas não chegou a ocorrer, porque Washington Luís foi deposto por seus próprios
auxiliares. [...] Um ano após a revolução vitoriosa, o humorista se concedeu o
título de Duque de Itararé, anunciando em seu jornal que a concessão estava sendo
feita a uma personalidade de excepcional valor, que se distinguiu no campo de
batalha . Algumas semanas depois rebaixou seu título para Barão de Itararé, como
prova de modéstia .
Em 1934 surge, ao já Barão de Itararé, a possibilidade de dirigir o Jornal do Povo. O
período era conturbado pelo movimento intregralista6. Sodré (2004, p. 379) reforça esta
posição política da época: Tratava-se, aqui, de seguir a receita amarga, e por isso surgira o
integralismo, cujo palavroso e falso apelo ao nacionalismo embalava os incautos. O
tratamento dado aos assalariados era duro: inclusive na imprensa. [...]
Diante desta censura, o Barão ainda sofreu severas repressões. Em entrevista, Morel (
apud SODRE, 2004, p. 379) esclarece um dos casos.
6
Movimento político brasileiro baseado nos moldes fascistas, fundado em 1932 in Dicionário Aurélio
15. 15
Um jornalista imperava na cidade. Era Aparício Torelly, o popular Barão de
Itararé , à frente de valente equipe, no jornal do Povo. Anunciou dez reportagens
sensacionais sobre a vida de João Cândido7. Saíram duas. Na terceira, o conhecido
homem da imprensa foi seqüestrado por oficiais da Marinha e conduzido até a Barra
da Tijuca, onde sofreu vexames. Foi por isto, certamente, que o Barão mandou
escrever na porta da redação: Entre sem bater
Em 1935, o Barão de Itararé é preso na colheita pela onda de repressão que se
desencadeou pelo golpe militar comunista. A partir deste período, Torelly acabou passando
um ano e meio preso, chegando a conhecer o escritor alagoano Graciliano Ramos, sendo
citado em Memórias do Cárcere como aparentemente alegre .
A Manha apenas reaparece em 1945, trazendo o mesmo sucesso de público que
alcançara em 1926 e 1935. O jornal contava somente com a ajuda financeira de Arnon de
Melo8, como também a colaboração de grandes escritores como o maior expoente da literatura
regionalista, José Lins do Rego e nomes como Álvaro Moreyra9, Marques Rebelo10 e Rubem
Braga11.
O sucesso da republicação foi tamanho que, dois anos após, em 1947, o Barão foi o
oitavo12 vereador mais votado do Rio de Janeiro, assumindo a Câmara pelo Partido
Comunista Brasileiro.
Novamente sem conseguir manter o seu jornal por questões financeiras e agora com o
agravamento de seu estado de saúde13, o Barão de Itararé publicou, entre 1949 e 1955, três
almanaques de o A Manha: o Almanhaque.
Doente, o Barão viveu em um pequeno apartamento no Rio de Janeiro para estudar
matemática e se dedicar à biônica, que aparecera como nova ciência, até falecer, em 27 de
novembro de 1971, aos 76 anos. Apesar do pioneirismo do Barão de Itararé no humor dentro
do jornalismo, Konder (1986: p.81), afirma o esquecimento popular sobre o humorista:
Hoje o Barão está praticamente esquecido. Apenas meia dúzia de baranófilos e
plagiários sabem dele. Numa dessas injustiças tão comuns, é mais conhecido pelo
que há de pior nos seus livros. O Barão precisaria duma antologia cuidadosa. Edmar
Morel pensou em fazer. O Forturna e o Jaguar também. Mas não deu certo.
7
Militar brasileiro líder da Revolta da Chibata. Para mais informações, sugerimos o acesso ao
http://www.overmundo.com.br/overblog/joao-candido-o-almirante-negro, site colaborativo gerenciado pelo
sociólogo Hermano Vianna.
8
Ex-governador de Alagoas, pai do ex-presidente Fernando Collor de Melo
9
Poeta, cronista e jornalista brasileiro
10
Escritor e jornalista brasileiro
11
Escritor brasileiro e lembrado como um dos melhores cronistas brasileiros
12
Naquele momento, denúncias na imprensa apontavam atos criminosos de alguns comerciantes que misturavam
água ao leite, aumentando a quantidade do produto a ser vendido. Dentro desse contexto, o Barão fez sua
campanha vitoriosa e bem-humorada com o slogan: Mais água e mais leite. Mas menos àgua no leite.
13
Neste caso, se deve às complicações respiratórias.
16. 16
Mesmo diante do esquecimento popular, é merecido ressaltar dentro deste PEC a
importância das publicações, empenho e dedicação do Barão de Itararé em dar a população
olhos capazes de ler o que nem todos veem. Olhos que, através do humor, enxergavam
princípios democráticos e do mais legítimo direito à expressão.
5.2 O PASQUIM: O HUMOR NO JORNALISMO CONTRA A DITADURA MILITAR
Por sua própria natureza, o humor é uma força desinibidora,
libertária. Em suas expressões mais desenvolvidas, ele nos
ajuda a perceber as ambigüidades da condição humana, as
contradições disfarçadas, os anseios e insatisfações.
(Leandro Konder)
Entre 1964 e 1980, período em que a ditadura militar governou o Brasil dentro do mais
duro regime político, cerca de 150 jornais alternativos foram criados como forma de oposição
ao poder (KUCINSKI, 2003). Mas, mesmo entre todo este montante de periódicos, poucos
sobreviveram a tempo de se tornarem nacionalmente conhecidos.
Entre eles, alguns se destacaram por seu humor: a revista Pif-Paf14 de Millôr
Fernandes; o jornal O Pato Macho15, de Luiz Fernando Veríssimo; e, O Pasquim, de Tarso de
Castro, que atingiu dentro da linha do jornalismo humorístico picos com tiragem de até 225
mil exemplares, marcando-o como jornal expoente na classe tida como imprensa alternativa
ou nanica16. Para Kucinski (2003, p. 15), o jornal ainda foi além do humor: O Pasquim
mudou hábitos e valores, empolgando jovens e adolescentes nos anos 1970, em especial nas
cidades interioranas que haviam florescido durante o milagre econômico, encapsuladas numa
moral provinciana.
Para se opor à ditadura militar, à classe média regida por conceitos morais e à grande
imprensa17 devido à censura, o espírito de O Pasquim seguia por correntes filosóficas como o
existencialismo de Jean Paul-Sartre e a contra-cultura norte-americana do fim dos anos
14
Nos registros de Strelow (2009, p. 11) o Pato Macho foi o primeiro jornal rio-grandense a sofrer a censura
prévia.
15
No registro histórico de Kucinski (2003, p. 437 ), Pif-Paf foi o primeiro periódico a ser criado como oposição
à ditadura militar no Brasil.
16
BELTRÃO, Luiz (1980, p. 37) cita o nome de nanica pelo motivo de a maioria dos jornais alternativos
possuírem, na época, o tamanho tablóide.
17
Sodré (2004, p. 275) afirma que o surgimento da grande imprensa no Brasil ocorre de maneira natural devido a
ascensão burguesa, ao avanço das relações capitalistas, tornando o jornal capitalista e, claramente, objetivando a
lucratividade.
17. 17
196018. Na mistura destas duas influências, mais o desejo ser um jornal independente, O
Pasquim alcançava o populismo de maneira rápida já na sua 26° edição com a marca de 200
mil exemplares vendidos.
Com este avanço, em 1969, o jornal começava a tomar o espaço das revistas nas
bancas, trazendo longas reportagens e entrevistas. Entre elas, o marcante entrevista da atriz
Leila Diniz que falava abertamente sobre sexo, resultando não só na edição mais vendido da
história do jornal, mas também no decreto que instalou a censura prévia19 no país.
Mas, mesmo sob as normas da censura prévia já instalada no país, a continuidade das
publicações de O Pasquim não foram interrompidas nem após a invasão dos policiais do DOI-
CODI20 na redação do jornal, em 1° de novembro de 1970. Na ocasião, Tarso de Castro
conseguiu fugir e continuou editando o jornal clandestinamente, refugiado em uma casa ao
lado da redação e a usando como escritório. Ziraldo (1977 apud KUCINSKI, 2003, p. 218)
um dos editores do Pasquim na época, dá mais detalhes sobre o acontecimento:
Houve várias batidas em O Pasquim e a polícia levou muitos documentos, mas a
mais séria foi a que os levou presos ao departamento aéreo terrestre da Vila Militar,
ocupado pelo DOI-CODI. Foram presos no fechamento, de madrugada: José Grossi,
Ziraldo, Paulo Garcez, Fortuna e Luís Carlos Maciel. Prenderam em casa o Francis.
Millôr não estava em casa quando foram prendê-lo. Os outros receberam proposta
da polícia para se entregarem em troca de libertação dos que já estavam presos.
Numa reunião, Jaguar e Sérgio Cabral concordaram em se entregar. Millôr não
estava presente. Queriam prender também a Leila Diniz. Quem abrigou-a foi o
Flávio Cavalcanti. Era tudo coisa do falso puritanismo. Achavam que a entrevista da
Leila visava destruir a família. Quando os militares viram a grana nos talões de
cheque, pensaram que O Pasquim recebia dinheiro de Cuba
Não seriam acontecimentos como este que dariam fim ao O Pasquim, porém, as
tiragens caíram de maneira preocupante devido à censura, e muitos jornaleiros se recusaram a
continuar vendendo O Pasquim, já que sofriam ameaças do governo militar, que podiam
fechar o estabelecimento se assim o vissem necessários. A publicidade dentro de O Pasquim
também caiu, chegando à zero.
18
Op. cit. Kucinski (2003, p. 209)
19
A censura prévia não só foi executada sobre O Pasquim, mas por todos os jornais em que o regime militar
visse necessário no país.
20
Órgão de inteligência e repressão do governo brasileiro na época
18. 18
5.2.1 O Fim de O Pasquim
O fim da censura prévia sobre O Pasquim terminou em 24 de março de 1975, às
vésperas de sua edição de n° 300. Para a mesma edição, Millôr Fernandes preparou o editorial
em tom de provocação, resultando no seu fichamento pelo DOPS21. Depois do fato, Millôr
Fernandes (1990 apud Kucinski 2003, p. 227) decide deixar a redação de O Pasquim e explica
o motivo: No dia seguinte eu teria que escrever um artigo ainda mais violento. Iria escrever
um artigo violento no número 301 contra o Armando Falcão22. Aí não quiseram. Por isso, no
número 300, todos entram com um galho dentro da redação.
O ciclo de resistência de O Pasquim começava a se encerrar com o fim da censura
prévia, fazendo as vendas do jornal novamente subirem até atingirem o pico de 83 mil
exemplares no final de 1978, quando a campanha de Anistia23 alcançava seu máximo apogeu.
Mas o clima de calmaria aos poucos não favorecia as vendagens de O Pasquim. Chegando na
tiragem de 44 mil exemplares em 1982, o cenário político do período não favorecia a
criatividade, o deboche e o esquerdismo do jornal, igualando-se às pequenas publicações
alternativas semelhantes no período.
Com o fracasso de Ziraldo em tentar produzir um Pasquim remodelado, em tamanho
standart e que nunca aconteceu, Millôr e Jaguar levaram O Pasquim a favor do partidarismo,
propondo-se ao apoio à candidatura de Miro Texeira, no Rio de Janeiro. Por outro lado,
Jaguar, que desacreditava na potencialidade de Teixeira como possível governador do estado,
passou a apoiar Leonel Brizola que também concorria à eleição. Com este impasse editorial, a
tentativa de reerguer O Pasquim rompia com a tradição do próprio jornal altamente contrário
à política, o que podia denotar a falência e o esgotamento de sua proposta inicial,
desmoralizando-se diante de seu público24.
21
Departamento de Ordem Política e Social, órgão do governo brasileiro criado durante a ditadura militar em
que o objetivo era controlar e reprimir movimentos contrários ao poder
22
Ministro da justiça dentro do governo Ernesto Geisel
23
Anistia deve-se a lei n° 6.683 promulgada pelo então João Figueiredo em 1979 durante a ditadura militar. A
lei dizia: Art. 1º É concedida anistia a todos quantos, no período compreendido entre 2 de setembro de 1961 e 15
de agosto de 1979, cometeram crimes políticos ou conexo com estes, crimes eleitorais, aos que tiveram seus
direitos políticos suspensos e aos servidores da Administração Direta e Indireta, de fundações vinculadas ao
poder público, aos Servidores dos Poderes Legislativo e Judiciário, aos Militares e aos dirigentes e
representantes sindicais, punidos com fundamento em Atos Institucionais e Complementares (vetado). § 1º -
Consideram-se conexos, para efeito deste artigo, os crimes de qualquer natureza relacionados com crimes
políticos ou praticados por motivação política.
24
Em vista disso, é razoável afirmar que o erro que daria inicio à falência de O Pasquim esteve em contratariar
sua própria ideologia.
19. 19
No final das eleições, com a vitória do concorrente à candidatura do Rio de Janeiro,
Leonel Brizola, o Pasquim somava uma dívida de 200 mil dólares, na qual falhas
administrativas contribuíram para o endividamento, conforme Kucinski (2003, p. 208)
Durante toda a sua existência como imprensa alternativa, o Pasquim foi uma
sociedade por cotas instável, que mudava a composição acionária a cada crise. Mas
não foram obedecidas regas básicas de administração, controle financeiro e de
estoques, o que levou ao estrangulamento de um projeto editorialmente bem-
sucedido. O grupo não se via como uma empresa, nem mesmo como uma redação
convencional, mas como uma patota, um grupo de amigos que tinha prazer de fazer
de suas relações pessoais e idiossincrasias matéria de jornal.
Com o enfraquecimento das vendas do jornal, devido aos fatores como o citado
contexto político desfavorável; a repetição de linguajem; e concorrentes humorísticos que
começavam a surgir no mercado, O Pasquim deixou evidente a sua falência em 1988, quando
foi comprado pelo empresário João Carlos Rabello que anulou o estilo pasquiniano de
escrever, sua linguagem, como acredita Queiroz (2007): Acredito que o término do
semanário se consolidou por uma série de sintomas, mas, principalmente, pelo esgotamento
de sua linguagem com uma conseqüente ausência de renovação e pela perda de sua
identidade.
Após este período, nenhum outro jornal de caráter humorístico fora capaz de se igualar
a popularidade conquistada pelo O Pasquim.
20. 20
6 O JORNALISMO HUMORÍSTICO EM BLUMENAU
O humorismo consiste em mostrar o outro lado das coisas, o
lado que o povo não vê. Não vê, mas sente. Além disso, o
humorismo não deve ser usado apenas em assuntos fúteis. Eu
quero mostrar a miséria de forma leve.
(Aparício Torelly)
Após a imigração alemã, os colonizadores que aqui se situaram não deixaram de
herdar algumas culturas européias. Entre elas estavam os festejos carnavalescos que
aconteciam pelas ruas e clubes da cidade. Dentro do período de carnaval, pequenos jornais
carnavalescos começaram a fazer parte da festa a partir do século XX25. Candena (2009)
descreve sobre a singularidade do tratamento destes jornais no Brasil:
O fato é que o nosso país foi o único no mundo a desenvolver uma mídia específica
para as festas de momo. Os jornais carnavalescos, segundo José Ramos Tinhorão
que catalogou 176 títulos no seu livro A imprensa carnavalesca no Brasil , é um
fenômeno exclusivamente brasileiro; o pesquisador faz a ressalva em relação a
Portugal onde os encontrou editados em linguagem e folhas de cordel durante o
século XVIII, com o entrudo como tema. Muito distantes, contudo, quanto à forma,
conteúdo e intenção da imprensa periódica tupiniquim, caracterizada justamente pela
variedade temática.
Como estas publicações carnavalescas não poderiam ficar ausentes nesta pequena
recuperação historiográfica que antecede o PEC do jornal Barriga, apresentaremos a seguir os
periódicos anuais que, através do humor, levavam crítica e informação à sociedade
blumenauense da época. Os jornais propriamente ditos como humorísticos26 dão seqüência ao
resgate27.
25
Com base na entrevista à historiadora Sueli Petry, atualmente, os carnavais de ruas e clubes não são visíveis na
sociedade blumenauense devido à mudanças de hábito como a preferência por estadias litorâneas durante o
feriado carnavalesco.
26
Classificação de estilos conceituados por Petry (2006, p. 11) in caderno 1° Seminário sobre a História da
Comunicação em Santa Catarina.
27
É relevante a ressalva sobre o trabalho historiográfico de José Ferreira da Silva in A Imprensa em Blumenau
sobre as folhas carnavalescas e jornais humorísticos que é tomado como referência única neste resgate, devido ao
assunto ter recebido pouca exploração por parte de outros pesquisadores locais. Ressalvamos também que o tema
jornais humorísticos , inicialmente, é um pré-projeto de Teoria de Conclusão de Curso do acadêmico Tiago
Ribeiro, presente neste trabalho, afim de sistematizar este estilo de suporte midiático ainda pouco estudado em
Blumenau.
21. 21
6.1. OS JORNAIS CARNAVALESCOS
6.1.1. Altonaer Fastnachts-Umzug-Zeitung
O Altonaer Fastnachts-Umzug-Zeitung surgiu em 17 de fevereiro de 1901 como um
jornal carnavalesco de humorismo e crítica, no bairro Itoupava Seca de Blumenau. Com o
pequeno formato de 23 x 31 cm e 4 páginas, o jornal era impresso em papel colorido e
praticamente todo ele escrito na língua alemã. Em português eram publicados apenas alguns
versos que eram dispostos na última página.
A publicação tinha como ponto forte críticas aos políticos da época, principalmente
devido à ideologia partidária de seus editores a fim de atuarem na política e administração da
cidade no período. O jornal teve um único exemplar publicado, mas Silva (1977, p. 40) afirma
a possível continuidade com outro nome: Embora não possamos afirmá-lo com segurança, é
de todo provável que este jornalzinho tenha sido publicado também anos seguinte mas sob o
título de Bummelauer Fastnachts-Zeitung [...] ..
6.1.2 Teutônia Faschingsnumer
O Teutônia Faschingsnumer surge no dia 14 de fevereiro de 1904, como outro jornal
carnavalesco. No formato de 20 x 30,5 cm, era composto por quatro páginas e com letras de
impressão gótica alemã na maior parte do jornal.
Diferente do Altonaer Fastnachts-Umzug-Zeitung, o Teutônia Faschingsnumer não era
composto de muita graça, nem interessante aos leitores, pela conotação de que a publicação
apenas surgira para mexer com integrantes da Sociedade Recreativa de Itoupava. Carente de
mais informações sobre o assunto, o historiador Silva (1977, p. 41) deixa incerto a
continuidade do jornal: Acreditamos que o número de que tratamos, foi o único publicado,
pois não temos, nem mesmo notícia de outros que tivessem surgido
22. 22
6.1.3 Bummelauer Fastnachts
Como citado por Silva (197, p. 40) de que este jornal provavelmente tivera sido o
mesmo que anteriormente se chamava Altonaer Fastnachts-Umzug-Zeitung, é sabido
historicamente que Bummelauer Fastnachts, Jornal Carnavalesco de Pândega em português,
teve apenas mais três edições, nos respectivos anos de 1903, 1904 e 1906.
Como na versão anterior, o Bummelauer Fastnachts dirigia suas críticas
principalmente aos políticos em evidência da época, como explica Silva (1977, p. 48)
[...] essa folha carnavalesca foi das mais temíveis que apareceram em Blumenau.
Esse jornalzinho, apesar do rótulo de carnavalesco, deve ter dado muitas dores de
cabeça aos homens da política e da administração municipal, pois, sob o pretexto de
troça trouxe à público muitas das suas mazelas. Soube bem encarnar o dito latino
ridendo castigat mores
6.1.4 Schuetsenliesel
Apenas dois exemplares fazem parte da curta vida do Schuetsenliesel. Publicado nos
anos de 1911 e 1912, ambas edições tiveram tamanhos diferentes entre si. A primeira foi
impressa em papel branco, com o formato 16 x 24 cm e oito páginas. Já a segunda edição, esta
teve o formato 18 x 25,5 cm com apenas quatro páginas, em papel azul.
O jornal foi publicado por integrantes da Sociedade de Atiradores de Blumenau, mas,
como jornal humorístico, carecia de boas piadas e críticas, certamente deixando o público
leitor desinteressado pela publicação (SILVA, 1977).
6.1.5 Kiriri
Uma única edição do Kiriri surgiu no sábado de Carnaval do dia 14 de fevereiro, em
1920. Suas quatro páginas foram redigidas em português e alemão, no formato 28 x 38 cm.
Mas, como folha carnavalesca, deixou a desejar conforme Silva (1970, p. 44)
Pouca graça e poesias mal feitas, como esta que transcrevemos como amostra:
Olhando sempre pro chão
23. 23
No meu passo vagaroso
Tropeço às vezes em vão
Pensando no bem ditoso
Ó que graça, que delícia
Naquele olhar piedoso!
Que palidez tão sublime
28
No seu rosto tão sedoso.
A partir deste recorte, é possível compartilharmos da mesma opinião de Silva
reafirmando o que disse através da notável ausência de uma característica marcante a cerca do
humor.
6.1.6 Die Schnauze
O primeiro número do Die Schnauze foi publicado em 28 de fevereiro de 1920. A
tradução literal do nome Die Schnauze significa focinho , mas que também pode ser boca
no sentido mais vulgar. Neste caso, o jornal deveria ser traduzido como O Boca Grande .
Dentro do formato 23,5 x 32,5 cm, de quatro ou seis páginas, o jornal possuía estilo de
escrita e impressão de ótima qualidade, causando ansiedade no público leitor antes de sua
publicação. Além de engraçado, o jornal era temido por algumas classes blumenauenses,
como explica Silva (1970, p. 44)
Suas críticas, feitas com muita graça, eram ferinas e, por isso mesmo temidas.
Criticava, inclusive, com muito bom humor, a própria administração municipal e as
autoridades constituídas, como por exemplo, neste tópico: Estatística. No
município de Blumenau são fabricados, anualmente, 1.485.923 tijolos. Sobre a
cabeça de cada um de seus habitantes caem, exatamente, 23 e meio tijolos por ano.
Muitas caricaturas ainda ilustravam quase todas as páginas do jornal, algumas de
cunho mais satírico, outras de cunho mais irônico, sempre fornecendo um aspecto de material
agradável, além de sua parte literária.
Mas, assim como outros jornais de cunho humorístico e crítico, o Die Schnauze não
escapou de intervenções policiais e de processos judiciais como conseqüência de seu material
publicado. Mesmo nestas condições, ele foi editado interruptamente em todos os carnavais
28
Por uma preferência estética, mantivemos na citação a diagramação encontrada em Silva (1970, p. 44)
24. 24
pelos 17 anos seguintes, desde seu surgimento, em 1920, consagrando-se como o jornal
carnavalesco humorístico de maior número de edições já publicadas em Blumenau.
6.1.7 A Ortiga
O A Ortiga surgiu no Carnaval de 1924, com o nome realmente grafado da maneira
errada, como um pequeno jornal de 4 página, no formato de 22,5 x 32 cm. O jornal denotava
pouco senso do humor, se atendo apenas a criticar pessoas que faziam parte da sociedade
local. Somente um exemplar do deste jornal circulou na cidade.
6.1.8 Die Mistgabel
Die Mistgabel, O Forcado em português, surgiu em Pomerode, então parte integrante
do município de Blumenau, no carnaval de 1929 em formato 32 x 32 cm, com quatro ou seis
páginas. O período de publicação deste jornal foi irregular, tendo sua segunda aparição em
1930; a terceira em 1934; e a quarta edição em 1938, mas, sempre com muita graça e humor.
Silva (1970, p. 88) traz um recorte onde o jornal se dirige aos leitores, falando sobre sua
ausência:
Como editorial do n° 3, aparece, por exemplo, o seguinte: Pela terceira vez Der
Mistgabel vem visitar-te. Tu podes examiná-lo por fora e por dentro, por trás e
pela frente, ele responderá ao teu minucioso exame: tudo é estrume . Durante
cinco anos o jornal mão apareceu por causa da forte censura. Mas, nesse meio
tempo juntou-se tanto lixo, que nós fomos obrigados a arranjar um novo redator .
Para melhor ilustrar a citação acima, o estrume comentado é uma referência ao
forcado , que na tradição portuguesa significa garfo de apanhar lixo ou estrume . Registros
históricos reunidos por Silva (1977) apontam que este jornal foi publicado até a quarta edição.
25. 25
6.1.9 Sudarm-Glocken
O Sudarm Gloken, Sinos de Rio do Sul em português, surgiu em 1929, no formato 23
x 28,5 cm em quatro páginas. Por circular no distrito de Bela Aliança, o quinto em Blumenau,
o jornal publicava em forma de versos críticas pesadas às autoridades do distrito. Silva (1970,
p. 88) dá mais detalhes sobre este contexto:
Essa publicação foi mais um verdadeiro pasquim que folha carnavalesca, e, pelo
que se deduz, tinha a finalidade de, desmoralizando os vários funcionários do
distrito, evitar a emancipação do mesmo e a sua elevação do mesmo e a sua
elevação à sua categoria de município, o que se daria no ano seguinte.
Registros históricos também apontam de que este pequeno jornal não ultrapassou sua
primeira edição.
6.1.10 Der Mosquito
Patrocinado pela Sociedade de Atiradores Nova Velha, o Der Mosquito (O Mosquito)
surge em 22 de fevereiro de 1930 como outra folha carnavalesca entre as já apresentadas. O
formato do jornal era de 23 x 32 cm, com quatro páginas e até onde existem registros
históricos, chegou apenas até sua quinta edição.
O jornal era composto por críticas leves aos acontecimentos da região e às
personalidades da cidade de Blumenau. Através de boas piadas e um bom espírito
humorístico, o jornal marcou época no meio onde circulava.
6.1.11 Die Quasselbude
A primeira edição do jornal carnavalesco Die Quasselbude surgiu em 23 de janeiro de
1932, no formato 22,5 x 32,5. Divido em quatro páginas completamente redigidas em alemão,
o jornal aproveitava sua veia humorística para deixar registrado em sua capa o dizer: Wem es
juckt, der kratze sich. Wir sind nicht verantwortlich , que em português significa Quem
sentir coceiras, que coce. Nós não somos os responsáveis.
26. 26
Como outros jornais carnavalescos mais amenos, o Die Quasselbude criticava as
pessoas de destaque na cidade sem partir para textos com agressões pessoais.
6.1.12 Die Gurke
Apesar de ter sido criado no distrito de Indaial, 3° do Município de Blumenau, o Die
Gurke (O Pepino) destacou-se por seu interessante bom humor, como explica Silva (1977, p.
94):
A maior parte da matéria é composta em versos, às vezes bem feitos e cheios de
humor. Anúncios muito cômicos, avisos repletos de verve, críticas alegres
distribuíam-se pelas várias colunas, tornando o jornalzinho verdadeiramente
interessante e, naturalmente, também irritante para os atingidos por algumas das
suas muitas pilhérias.
Escrito inteiramente em alemão, no editorial do jornal estava a explicação do porquê
de o jornal se chamar O Pepino, como ainda aponta Silva (1977 p. 94):
[...] porque certos narizes de apreciável volume e de não menor capacidade de
cheirar as coisas, também são conhecidos pela mesma designação do indigesto, mas
saborosíssimo fruto, tão usado para saladas e conservas.
Assim, O Pepino prometia meter o nariz mesmo onde não fosse chamado e marcou
época no distrito Indaial mexendo com a população em geral, mas sem os excessos de outros
jornais carnavalescos já citados que fomentavam inimizades nas comunidades que surgiam.
Em Silva (1977), acredita-se que o exemplar número 4, de 1935, tenha sido o último a ser
publicada.
6.1.13 Antesiriprospético
Foi com este nome que surgiu entre 1935 e 1938, o Antesiriprospético, um jornal
carnavalesco que, devido à ausência de registros históricos, não é possível afirmar sua data de
publicação com precisão. A publicação teve apenas um único número, conforme aponta o
registro histórico de Silva (1970).
27. 27
6.1.14 A Folia
A Folia surge no carnaval de 1934, com o formato 23 X 31,5cm e quatro 4páginas. De
caráter crítico e humorístico, o jornal não ressaltava grande tópicos. A publicação se limitava
às piadas sobre os grupos de diversas rodas de Blumenau. Sua edição foi única.
6.2 OS JORNAIS HUMORÍSTICOS
É incontestável a superioridade em relação aos números de jornais carnavalescos sobre
os jornais humorísticos que virão a seguir. Diferente destas publicações carnavalescas citadas
anteriormente que comumente tinha apenas uma edição por ano, os jornais humorísticos
estavam desatrelados ao contexto carnavalesco, surgindo a partir da ideia de seus fundadores
de exercer a crítica e o humor.
Será possível notar que as publicações dos jornais humorísticos, e também
carnavalescos, não permearam após o ano de 1938, ano antecedente à II Guerra Mundial que
inibiria quaisquer publicações do tipo. Beltrão (1980, p. 35) reforça esta afirmação: Os
jornalecos efêmeros, de duas ou quarto folhas de reduzido formato e limitada penetração,
desapareceram não como por encanto, porém, como resultado das novas condições sociais... .
Entre estas condições propostas por Beltrão, pressupomos que a cidade de Blumenau
tenha se enquadrado dentro delas devido a sua origem alemã que mantinha relação com a II
Guerra Mundial.
6.2.1 O Quebra-Nozes
O Quebra-Nozes nasce em setembro de 1905, como uma folha humorística e crítica,
de pequeno formato, como órgão do Clube de Bolão Nussknacker. Até onde se tem
conhecimento registrado, o jornal foi até sua terceira edição, o que sustenta a afirmação de
Silva (1970, p. 45) sobre a vida curta de publicações de cunho crítico e humorístico na região:
Foi, como muitos outros jornais críticos e humorísticos que surgiram,
posteriormente, em Blumenau, de vida efêmera, frutos, quase sempre, de
entusiasmos passageiros, que esmoreceram ao encontro dos primeiros percalços
encontrados, principalmente os da ordem financeira.
28. 28
6.2.2 Bem-Te-Vi
O Bem-te-vi surgiu em maio de 1923, através de alunos da Escola Complementar,
anexa ao Grupo Escolar Luiz Delfino, dizendo-se periódico semanal, jornal crítico e
humorístico . O jornal tinha formado 23 x 32 e era manuscrito e mimeografado, e não existem
registros de edições superiores além da quarta edição que possivelmente foi a última. (SILVA,
1977).
6.2.3 Zé Pereira
O Zé Pereira, um jornalzinho crítico e humorístico (BLUMENAU EM CADERNOS
1956, p. 36), surgiu no carnaval de 1917 em Blumenau, no formato 22 x 31 cm e quatro
páginas. Através de críticas sem malícia, o jornal era composto basicamente por críticas,
anedotas e versos brincalhões. Somente uma edição de Zé Pereira foi publicada.
6.2.4 O Bisturi
O Bisturi surge em maio de 1931 no formato 23 x 35 cm, com quatro páginas. No
cabeçalho, a criatividade no Expediente dava caras do estilo de humor do jornal: Expediente:
depois das dez. Distribuímos esmolas só aos sábados e aceitamos donativos monetários .
Mas, apesar do começo bastante irônico, o jornal compunha pequenas brincadeiras e piadas
inofensivas. Este, diferente da maioria dos jornais humorísticos pesquisados, teve maior
longevidade, chegando até sua 16° edição, em julho do mesmo ano.
6.2.5 O KCT
Lançado em 1934, O KCT tinha o formato 22,5 x 33 cm e era bimensal. Mas, como
outras publicações humorísticas já citadas, também teve uma vida curta, não passando de sua
sétima edição (SILVA, 1977).
29. 29
6.2.6 Piranha
Ainda em 1934, aparece o Piranha, também um jornal humorístico e crítico no mesmo
formato de O KCT e impresso nas oficinas do Correio de Blumenau. O jornal atingiu somente
até sua 5° edição, confirmando mais uma vez a efemeridade destas publicações em que aponta
Silva (1977).
6.2.7 O Tinhoso
Após fazer ataques editoriais às autoridades de Blumenau, o jornal Cidade de
Blumenau teve sua publicação suspensa, fazendo seus ex-diretores publicarem O Tinhoso, um
jornal crítico que satirizava principalmente as autoridades da época, ainda em 1934. Em
formato 28,5 x 38,5 cm, com quatro páginas e contando com quatro colunas sob caricaturas
ridicularizante, o jornal prezava por sua arte singular e crítica através de desenhos como no
O inicial do título do jornal que apresentava o rosto de um diabo. No expediente: órgão
diabólico brincalhão. Só sai aos domingos. A responsabilidade vai por conta do diabo .
Somente dois números de O Tinhoso foram publicados, como resultado das pesadas
brincadeiras sobre autoridades, fazendo com que a polícia proibisse sua publicação.
30. 30
7 O JORNALISMO OPINATIVO E O HUMOR
O homem não é tão ferido pelo que acontece, e sim por
sua opinião sobre o que acontece."
(Montagne)
A opinião sempre esteve presente dentro de nós, seres humanos críticos por natureza, a
partir de julgamentos sobre as informações que absorvemos. Seja na leitura de diferentes
significados que podem ser encontrados em O Pequeno Príncipe29; seja adjetivando definições
para as formas nas pinturas de Tarsila do Amaral30; ou nos sentimentos registrados a cada
poesia de Cruz e Souza.31 Diante desta exposição, é possível concordar com TÒBIO32 (1967
apud 1980 BELTRÃO, p. 16 ) acerca deste caráter humano e sua naturalidade em exercer
julgamentos:
Todo ser humano, naturalmente, se inclina a criticar dentro da atividade mental
elaborada de juízos. Todos criticamos diariamente o que contemplamos e que de
uma maneira ou de outra nos afeta... Criticar responde à natureza do homem e se
eleva com seu nível cultural. Dado o fato ou acontecimento, em processo natural e
automático segue a crítica. Como a vista distingue o que vê, o entendimento
discrimina o que entende e o qualifica logo. Todo homem conhece, todo homem
julga e critica. Fundamenta-se na crítica na imperfeição de todo o humano e tem
sentido porque o humano é suscetível de correção e melhoramento.
A partir desta afirmação, é inegável a reflexão sobre a formação das produções
jornalísticas e sua passividade em exercer julgamentos, uma vez que são produzidas por seres
humanos. Pessoas que, como nós, carregam dentro de si bagagens culturais, experiências de
vida e preferências religiosas, esportivas e políticas.
Ainda em Beltrão (1980, p. 36) e partindo deste princípio humano, temos acesso ao
registro histórico que evidencia o uso da opinião já no primeiro jornal a circular no Brasil:
[...] o primeiro periódico a circular no Brasil o Correio Brasiliense editorializava
desde o número um, definindo o caráter opinativo de sua publicação: mostrar, com
evidência, os acontecimentos do presente e desenvolver as sombras do futuro , pois
concebia o trabalho dos redatores das folhas públicas não apenas como o de meros
informares, mas de elementos que, munidos de uma crítica sã e de uma censura
29
Livro francês mais vendido no mundo, com cerca de 80 milhões de exemplares, de Antoine de Saint-Exupéry
publicado em 1943. Aparentemente um livro infantil, sua mensages revelam sentidos filosóficos e poéticos sobre
a vida.
30
Pintora modernista brasileira
31
Poeta catarinense entre os percussores do simbolismo no Brasil, como oposição ao Realismo e o Naturalismo.
32
TÓBIO FERNANDES, Jesus. El periodicista como crítico. In: Estúdios de Información. Madrid, n. 1,
Jan/Mar 67.
31. 31
adequada, representam os fatos do momento, as reflexões sobre o passado e as
sólidas conjecturas sobre o futuro
Rabaça (2001, p. 405), define a opinião como o ponto de vista expresso e, ainda, o
juízo que se faz do assunto. , o que, colocando em prática dentro da profissão jornalística,
caracteriza-se como jornalismo opinativo, onde conceituaremos seus gêneros no decorrer
desta pesquisa. Mas, antes de darmos maiores aprofundamentos sobre a opinião jornalística
usada dentro do jornal Barriga, nos remetemos a Melo (2003, p. 25) para esclarecer os limites
que permeiam a opinião e a informação no que tange a profissão jornalística, evidenciando
que estes dois fatores dependem de um contexto profissional e político para serem definidos:
.
[...] a categoria informativa e a opinativa corresponde a um artifício profissional e
também político. Profissional no sentido contemporâneo, significando o limite que o
jornalista se move, circulando entre o dever de informar (registrando
honestamente o que observa) e o poder de opinar, que constitui uma concessão
que lhe é facultada ou não pela instituição em que atua. Político no sentido
histórico: ontem, o editor burlando a vigilância do estado, assumindo riscos
calculados nas matérias cuja autoria era revelada (comments); desviando a vigilância
do publico leitor em relação às matérias que aparecem como informativas (nes), mas
na prática possuem vieses ou conotações. [grifos nossos]
Tomando como parte os grifos nossos da citação de Melo, ressaltamos que a
instituição referida pelo autor, no caso deste presente PEC, é o próprio jornal Barriga que,
devido a sua linha editorial humorística, permite a seus editores o uso da opinião de maneira
satírica sobre a matéria produzida sem se distanciar da característica de um produto
jornalístico. Torely (apud SOÓ 1984, p. 90), cuja já teve neste trabalho sua história biográfica
resgatada, traz uma interessante idéia sobre o objetivo do humor praticado no jornal A Manha:
O humorismo consiste em mostrar o outro lado das coisas, o lado que o povo não vê. Não
vê, mas sente. Além disso, o humorismo não deve ser usado apenas em assuntos fúteis.
Baseada nas citações de Torelly e Melo, pressupomos uma semelhança no objetivo
final de ambos, do jornalismo opinativo e do humorismo, de trazer ao público um diferente
ponto de vista sobre os fatos em circulação midiática, elucidando-os. Ambos objetivos
também transpassam a factualidade de uma notícia, seja ela rasa ou de profundidade, podendo
despertar no leitor o interesse pelo debate público acerca da opinião emitida pelo veículo.
Tendo em vista estes dois apontamentos, reconhece-se no objetivo do jornal Barriga, o
ofício de exercer a opinião, legitimamente humorística, sobre os fatos decorrentes na região
de Blumenau, e sejam eles atemporais ou não. Diferente de Martins (2005, p.20), o jornal
Barriga retoma a predominância opinativa no produto jornalístico impresso, o que, para este
32. 32
autor, não mais predomina, remetendo-se ao webjornalismo33 como um novo meio de
disseminação da opinião:
[...] longe de estar desaparecendo, a imprensa de opinião tende a florescer no meio
eletrônico da internet, em que custos são compatíveis com a envergadura de seu
público. Mas, nos jornais diários, dificilmente ela voltará a dar o tom. Essa fase
acabou.
Como complemento, Martins (2005, p. 20) ainda levanta a questão sobre o espaço da
opinião na mídia impressa que hoje se articulada em outros produtos jornalísticos, antes de
tender ao webjornalismo referido acima.
Quer dizer, então, que atualmente não há mais espaço para a imprensa de opinião,
partidária ou segmentada? Claro que há. Mas esse espaço vem se deslocando
progressivamente do terreno dos jornais diários, em que custos de produção são
altíssimos, para o das publicações de periodicidade mais longa, como semanários,
quinzenários e revistas.
Para compreender o espaço citado por Martins, recorrermos à Beltrão (apud Melo
2003, p. 60), citado como o único pesquisador a se preocupar sistematicamente com o
fenômeno de classificação de gêneros jornalísticos, para conceituar dentro do jornalismo
opinativo, as cinco classificações ditas como opinativas.
São elas: o editorial, um espaço em que próprio veículo de comunicação se utiliza
para expressar sua opinião; o artigo, onde especialistas ou leitores comuns dissertam a cerca
de algum tema e expõe sua opinião; a crônica, espaço com predomínio literário para a
exposição de algum fato cotidiano regido por uma questão cronológica; a opinião ilustrada,
charges; e a opinião do leitor, onde contem comentários de leitores que, comumente, fazem
comentários sobre as publicações anteriores.
Mas, mesmo sob as classificações propostamente dividas por Beltrão, facilmente
identificamos e reconhecemos o uso da opinião em outras construções jornalísticas dentro do
Barriga. Devido à proposta do jornal se utilizar do humor dentro de suas matérias como
notícia, reportagem, história de interesse humano e informação pela imagem, que
também foram classificadas por Beltrão, mas dentro do gênero informativo, é inegável a
presença de julgamentos feitos de maneira humorística pelo editor sobre a matéria. Assim o
33
Designação formulada pelo teórico João Canavilhas. Para mais detalhes sobre o termo, sugerimos a leitura de
CANAVILHAS, João Messias. Do jornalismo on-line ao webjornalismo: formação para a mudança.
Disponível em: <http://bocc.ubi.pt> Acesso em 22 mar. 2009.
33. 33
jornal Barriga registra, explicitamente, o seu cunho opinativo predominante em todo o
produto.
7.1 A influência Pasquim, o estilo Barriga
Em torno da característica opinativa registrada no capítulo anterior e do resgate
histórico feito sobre O Pasquim34 no início deste PEC, é necessário o esclarecimento sobre a
distinção entre o perfil de O Pasquim e do jornal Barriga.
Diferente das características revolucionárias ou ideologistas como as de O Pasquim
que utilizava seu viés humorístico para legitimar o direito à expressão e informação em um
período ditatorial, o Barriga descarta esta aparência revolucionária. Seu objetivo está, como já
citado na Justificativa deste trabalho, em dar ao público leitor um diferente ponto de vista
sobre as situações decorrentes na cidade, mas, sem princípios revolucionários ou políticos.
Aspirado de O Pasquim, está, além do legitimo direito à expressão35, a necessidade de criar
através da opinião um veículo capaz de enxergar além da factualidade. Porém, obviamente, o
período não é mais ditatorial, mas, sim, democrático onde a liberdade sob os direitos
constituídos predomina, podendo tornar a opinião como algo distante do singular. Diante
desta liberdade, o Barriga se propõe a criar a opinião sobre o que pode ser visto como banal e,
não menos importante, também imprescindível à sociedade blumenauense. Neste ponto de
necessidade opinativa, vale-se usar a citação de Julian Maria36 (apud BELTRÃO 1980, p. 16)
para discernir a função do Barriga como um meio opinativo que desperte interesse sobre o
leitor:
Quando alguém declara que não tem opinião, não quer dizer que não sabe e, sim,
que não tomou posição por falta de interesse ou por não ter presente as possibilidade
de opinar ou por não contar com os elementos suficiente para que sua adesão se
mobilize até uma delas. Isso significa que não se ter opinião sobre qualquer coisa,
mas somente sobre certos temas que interessam para orientar a vida.
Concordando com Julian, destacamos que a necessidade de uma publicação alternativa
se faz devido à utilidade deste mesmo produto jornalístico em despertar no leitor sua
34
Jornal de cunho altamente opinativo e humorístico que atingiu seus ápices de vendas durante um período da
ditadura militar.
35
Direito presente na Constituição Brasileira de 1988
36
Julian Maria (1915-2005) era filósofo espanhol, considerado o principal discípulo do filósofo José Ortega y Gasset que
atuou como ativista político e jornalista.
34. 34
capacidade de opinião e julgamentos ainda não abordados de maneira humorística. A partir
desta afirmação, é valido a ressalva de que Beltrão (1980, p. 15) deixa em seus registros a
necessidade de existir um fato questionável para que o mesmo seja capaz de gerar opinião:
Nem todas as ocorrências, porém, são suscetíveis de opinião: é necessário que o
objeto seja questionável, isto é, dê margem a uma opção do sujeito entre duas ou
mais alternativas, igualmente possíveis. Quando o objeto não comporta diferentes
faces, não há lugar para a opinião.
Porém, partindo do princípio de que a opinião se dá após o interesse sobre um assunto,
defendemos nossa aposta editorial em despertar opinião no leitor sobre os fatos mesmos
inquestionáveis, transformando-os em objeto opinativo e produto noticiosamente humorístico.
35. 35
8 HUMOR E INFORMAÇÃO
Contudo, na vida cotidiana, a maioria das pessoas não
questiona aquilo que as faz rir. Ri, e isso basta. Quando
o desfecho de uma situação é o riso ou a gargalhada, a
captação da mensagem parece ter sido imediata ou,
pelo menos, bastante rápida, e a resposta, espontânea.
Rir não é, porém, uma mera reação fisiológica, nem ao
menos uma característica humana desde sempre
(Josimey Costa da Silva)
Em novembro de 2008, durante o seminário acadêmico Jornalismo de
37 38
entretenimento , o jornalista e professor Henrique Moreira definiu a importância de
utilizar o humor como ferramenta para transmitir informação, fugindo do comodismo e da
fôrma que os padrões do mercado impuseram aos jornalistas. Para ele, o impacto da nova
modalidade seduz públicos que as mídias tradicionais habitualmente não abrangem: Quando
aparece alguma coisa nova que desconstrói os formatos tradicionais, a gente vê que, através
do humor, da crítica, da ironia, eles conseguem informar as pessoas e atingem um público que
normalmente não assiste o telejornal tradicional, não lê o jornal e não tem uma visão crítica .
Nessa perspectiva surge o Barriga, cuja pretensão não é ser um periódico revolucionário
como os do período em que Ditadura Militar era o alvo das críticas, como explanado
anteriormente. No entanto, a proposta do Barriga é utilizar o humor como canal de condução
das notícias. Mas, de que maneira o humor pode ser utilizado na transmissão da informação
sem que a credibilidade do veículo seja afetada? Para tanto, primeiro é necessário conhecer as
definições de humor.
Rabaça (2001, p.372) acredita que o humor é mais do que o conceituado nos dicionários
como disposição do espírito . Para ele, trata-se de uma posição do espírito, uma visão
desmistificadora da existência humana . Já Silva (2002) faz uma compilação das mais
diversas acepções do humor, caracterizado no teatro e literatura.
Do ponto de vista da representação literária e teatral, há imensa gama de variações:
humor cômico, humor burlesco, humor ridículo, humor irônico, humor satírico são
algumas, e cada uma representa um tipo particular de humor, nem todas provocando
risos. O cômico se faz comédia, utilizando-se do ridículo para fazer rir francamente.
A ironia provoca apenas sorrisos e é uma das formas mais críticas e ferinas de
humor; consistindo em dizer o contrário do que se pensa, ela adiciona falsidade,
mentira, ao fato que ridiculariza. No extremo da escala, há a sátira, uma composição
37
Nona edição do ciclo de conferências A Imprensa discute a Imprensa, promovido pela Associação dos
Servidores da Imprensa Nacional e pelo jornal Correio Braziliense e apresentado em 13 de novembro de 2008,
em Brasília.
38
Coordenador do Curso de Comunicação Social do Centro Universitário de Brasília (UniCEUB)
36. 36
sarcástica, mordaz, que apela para a inteligência, divertindo uns enquanto estoca
outros. [...] Nem sempre o objetivo da sátira é fazer rir. Às vezes, provoca rejeição
do objeto da ridicularização e, mesmo sendo um ataque fictício, essencialmente tem
um caráter moral que se destina a fazer a sociedade refletir e se rever.
Konder (1986, p.66) vai além e demonstra o impacto do humor sobre a sociedade. O
caráter crítico, a princípio, menos hostil, permite confrontar as incoerências do cotidiano com
sutileza, expondo características da sociedade que a mídia convencional se constrange em
divulgar. O humor, atrevido, critica e toma para si a responsabilidade de desmascarar hábitos
da elite e das esferas do poder. Para o autor, o humor é uma força desinibidora capaz de fazer
entender o caráter ambíguo das situações humanas e das contradições da sociedade. Esse
compromisso em apontar criticamente as situações ainda não percebidas pela sociedade é que
torna o humor uma forma de expressão ousada. Como propriamente Konder define: No nível
mais conseqüente da sua dialética imanente, o humor não poupa nada, não respeita ninguém;
ele não livra a cara sequer do próprio do humorista .
O psicanalista, Sigmund Freud (apud Soó 1984), por sua vez, define o gênero pelo
impacto que imprime no leitor, delimitando três aspectos fundamentais das sensações que
causam riso no ser humano: o chiste, o cômico e o humor.
No chiste o riso se dá por meio dum jogo de palavras ou ideias. No cômico, por
meio de fatos ou objeto lúdicos, alegres, envolvendo a percepção dalgum contraste.
No humor a coisa muda de figura: o humor acontece quando a própria vítima
consegue ver o lado engraçado da sua tragédia, diminuindo-lhe a importância.
Para tanto, há distinção na conjuntura que leva à produção do chiste e da peça cômica.
De acordo com Freud, ambas as modalidades são aceitas caso não existam motivos trágicos
envolvidos na situação. Em outras palavras, não deve haver tristeza para que a fórmula tenha
eficácia. Já o humor, no entanto, é mais abrangente. É um estado de espírito que reflete
otimismo ainda que vivencie situações trágicas. Nesse contexto, o deboche acerca da própria
dor é mais uma das alternativas de abordagem desse estilo.
8.1. O desafio do jornalismo com humor
Se para Freud o humor é visto como artifício sem autocensura, que ri das próprias
angústias, esse é o ponto de ação para o jornalismo que pretenda discorrer uma linguagem
37. 37
otimista para as notícias. Fazer rir em meio a tribulações talvez seja o maior desafio à
sustentação do Barriga.
Muitos podem questionar se é ético abordar de maneira bem-humorada o desenrolar de
uma catástrofe de impacto generalizado, como a enchente39 que sobreveio ao Vale do Itajaí,
em novembro de 2008. Como noticiar espirituosamente o fato? O humor é útil nessas
circunstâncias? A sociedade organizada aceitaria a cobertura? Eis o desafio que emerge frente
ao Barriga, noticiar conhecendo os limites que definem a fronteira entre a tragédia e o cômico.
Silva (2002, p.119) explica essa linha contrastante utilizando o teatro para explicar o
fenômeno. Tanto na tragédia quanto na comédia, os princípios de ação são as atribuições
negativas de um fato. A diferença do uso dos pontos negativos ao se contar uma história é
evidenciada pela finalidade dos dois gêneros: a tragédia induz à angústia e a comédia à
hilaridade. Há, em qualquer dos casos, a presença marcada do limite, do extremo, do que
desloca o ser de sua condição de inércia emocional , completa Silva.
É a prudência editorial do Barriga que deve ditar a angulação de notícias que envolvam
fatos pertinentes a tragédias ou situações ásperas. Seguindo a linha de Freud para o humor,
exposta anteriormente, sempre é possível perceber o lado positivo de um acontecimento, pois
ele pode servir como incentivo a reconstruir e restabelecer a ordem.
Deve ser exatamente esse o papel do jornalismo de humor em situações como a
enchente: levantar a auto-estima da população ao enfatizar a criatividade, o senso de
sobrevivência e solidariedade e enaltecer como ponto positivo a reação da sociedade, em
detrimento dos fatos negativos, publicados à exaustão pela mídia convencional.
A prudência é a virtude a ser levada à risca na produção do humor no jornalismo. Silva
(2002, p.123) adverte para a possibilidade de erros na cobertura de tragédias e fatos de
ocorrência súbita, que surpreendem até mesmo o jornalismo tradicional.
Mesmo as partes sérias do jornal são, em muitas ocasiões, influenciadas pela
imprevisibilidade da vida e pe1os movimentos da dinâmica social. Aí surgem os
erros, que nem a mea culpa dos ombudsmans consegue livrar da chacota, e esses
erros são um espaço onde cabem as entrelinhas do humor inadvertido que brinca de
transformar, fustigando os costumes arcaicos, denunciando as injustiças sociais,
cobrando posicionamento e ações políticas renovadoras.
39
Catástrofe natural que atingiu o Vale do Itajaí entre 22 e 23 de novembro de 2008. O fenômeno climático foi o
ápice do período chuvoso que se estendia desde setembro. Ao todo, 60 municípios de Santa Catarina foram
atingidos pela enchente ou deslizamentos de terra, afetando mais de 1,5 milhão de pessoas. A Defesa Civil
contabilizou 135 mortes no estado, apenas em Blumenau foram 24 óbitos. Cerca de 5 mil famílias
blumenauenses perderam suas casas devido a deslizamentos de terra.
38. 38
Assim, o humor é uma carta na manga do jornalista que faz uso do gênero para
apontar os erros da sociedade, das autoridades e dos governantes. Uma espada de dois gumes
portanto, pois permite criticar com ousadia os aspectos negativos abordados e enaltecer
espirituosamente a superação humana.
8.2 Como o humor é apresentado nos jornais
A linguagem humorística não tem espaço garantido no jornalismo tradicional. O gênero
limita-se a aparecer nas colunas de opinião e cadernos de lazer ou cultura dos jornais,
raramente se dispersando pelo conteúdo informativo da publicação. Silva (2002, p.119)
explicita esse aparecimento repentino do humor entre o conteúdo de informação.
Nos veículos, isso é mais apreensível pela setorização do humor em gêneros ou
seções específicas em jornais e revistas, mas há também diluição do humor no todo
das informações veiculadas, seja com a presença da ironia no texto dos articulistas,
com o comentário recheado de sarcasmo de um entrevistado, com a foto que explora
algum ângulo pitoresco, ou ainda com o absurdo de muitas colocações
pretensamente objetivas e sérias.
Normalmente o humor é encarado como jornalismo de entretenimento e difundido como
tal. Rabaça (2001, p. 373), no entanto, acredita que o humor pode, sim, ser infiltrado nas
matérias de cunho especificamente informativo, já que para ele, o próprio entretenimento,
hoje, aparece presente até mesmo nas matérias de teor preponderantemente informativo.
Segundo o autor, o humor segue esta linha e infiltra-se ainda mais nos meios de comunicação,
em virtude de seu apelo ao público. Considerado popularmente como a arte de fazer rir, o
humor consagrou-se como forma altamente comunicativa e de grande alcance popular, com o
desenvolvimento tecnológico e o advento dos meios de comunicação de massa .
Ainda em Silva (2002, p.120), o jornalismo convencional procura contrapor o humor
com a técnica jornalística sob os termos sério e não-sério do conteúdo informativo. A
diferença entre as duas é que o estilo sério é o praticado na grande mídia, proporciona
reflexão e oferece informações novas. Já o humor é enquadrado na estrutura dita não-séria,
pois procura utilizar os fatos para divertir e, em alguns casos, até ridiculariza os personagens
citados.
39. 39
Obviamente, esse é um traço não oficial do humor no jornalismo. Enquanto prática
sócio-cultural cotidiana, o humor é aprisionado pela indústria da comunicação de
massa e apropriado dentro dos limites do lazer como não-sério , como se o que é
sério fosse completa e desejavelmente destituído de humor. O resultado, como se
sabe, é uma estandartização do humor submetido à produção em série, direcionado à
homogeneização de público para que se torne massa, o que coloca as formas mais
refinadas do humor fora do alcance de grande parcela desse público. As charges,
caricaturas e cartoons, publicados em praticamente todos os jornais de circulação
massiva, reproduzem as contradições que essa situação contém. Ao mesmo tempo
em que deixam entrever as suas potencialidades críticas, muitas vezes realizam um
humor de apaziguamento e confirmação política.
Mas Silva (2002, p.121) ainda defende que a diferença entre ambos os estilos
diferenciam-se apenas na forma de veicular a informação e não no conteúdo da matéria. Para
a autora, o que define como prática jornalística é a utilização das características da notícia e
dos critérios de noticiabilidade. A charge e a caricatura um dos poucos representantes do
gênero humorístico presentes nos jornais podem trazer tantas informações quanto a matéria
responsável pela manchete do jornal, já que fazem uso dos critérios de produção de notícias
para embasar o conteúdo abordado pelo gênero. Desse modo, mais próxima da notícia elas
estão.
Para tratar sobre os principais critérios de noticiabilidade a serem utilizados no jornal
Barriga, buscamos apoio em Erbolato (2005, p. 60), que propõe 24 critérios40 que possam
motivar o público ao consumo e leitura da notícia. Entre elas, escolhemos respectivamente a
ordem que começa em: Humor; a de maior relevância devido a adequação ao perfil editorial
do jornal, Proximidade; uma vez que é incomum pessoas e fatos regionais serem tratados de
maneira humorística; e Interesse pessoal; a fim de assegurar o interesse do público-leitor
sobre acontecimentos que interfiram diretamente em sua vida e, principalmente, local.
Destacamos abaixo o humor, que mais caracteriza este PEC:
O homem médio procura não só a informação mas, dentro do possível, algo que o
entretenha. Em meados de 1975 os jornais paulistanos dedicaram razoável espaço
para noticiar o fato de Prefeitura Capital ter mandado colocar em gaiolas um casal
de marrecos que permanecia solto em uma avenida. Motivo: as aves foram acusadas
de provocarem poluição ambiental... No dia seguinte, porém, foram libertadas.
O critério do humor proposto por Erbolato vai de encontro aos objetivos do Barriga, o
que o caracteriza como um produto jornalístico diferenciado dos demais jornais que circulam
40
Op. Cit. Erbolato (2005, p. 60): Proximidade, Marco geográfico, Impacto, Proeminência (ou celebridade),
Aventura e conflito, Conseqüências, Humor, Raridade, Progresso, Sexo e Idade, Interesse pessoal, Interesse
humano, Importância, Rivalidade, Utilidade, Política editorial do jornal, Oportunidade, Dinheiro, Expectativa ou
Suspense, Originalidade, Culto de heróis, Descobertas e invenções, Repercussão, Confidências.
40. 40
em Blumenau, já que por sua vez o Humor possivelmente não seja o primeiro critério a ser
adotado por estes jornais.
8.3 O papel do humor no jornalismo
Logo, se o humor reclama tanto espaço para si no jornalismo, qual a verdadeira
responsabilidade que possui na produção de notícias? Silva (2002, p.121) também mostra que
a jurisdição do humor é bem mais ampla do que o pretendido inicialmente. Seguindo este
conceito, pode-se afirmar que para ser compreendido, e igualmente despertar estado de graça,
o humor precisa ir além da redação da notícia e expor os pormenores da informação.
É aí que se justifica o caráter opinativo da linguagem cômica, explanado anteriormente.
É preciso estar preso a um ponto de vista para descobrir os objetos causadores de risos e
instigar um retorno por parte do leitor. Sobre essas características do humor agregado à
difusão de notícias Silva projeta: O humor dentro do jornalismo poderia ser, deveria ser o
impulso que leva a realizar um esforço de imaginação na tentativa de descobrir o que está
certo através de uma coisa que parece errada, e como esta coisa deveria ser. Ou o que está
errado na coisa aparentemente certa, procurando inclusive as razões daquela coisa errada .
Dada essas peculiaridades, pode-se dizer que o jornalismo feito sob a intenção do humor
determina, além da direção opinativa, a presença da interpretação dos fatos antes de serem
lançados a público. Como um jornal de característica quinzenal, o Barriga precisa garimpar
novidades em relação aos fatos apresentados e depois expô-los sob a linguagem cômica.
Diante dessas atribuições, é inegável a necessidade de se construir um jornalismo que se
preocupa com a interpretação dos fatos noticiados. Martins (2005, p.21) demonstra como essa
carência está presente na mídia impressa.
Na maioria dos casos, não basta apenas dar a notícia, ou seja, transmitir a
informação factual mais recente. É necessário qualificá-la, relacioná-la com outros
fatos, explicar suas causas e avaliar suas possíveis conseqüências. Em suma, é
preciso entregar aos leitores não apenas a notícia, mas também o que está por trás e
em volta da notícia. Dito de outra forma, é preciso explicar, analisar, interpretar o
que aconteceu41.
Na mesma linha de raciocínio, Rabaça (2001, p.405) acredita que há uma sensível
tendência ao gênero interpretativo, em substituição à rigorosa objetividade da notícia presa
41
Este caso pode ser melhor verificado de maneira prática na editoria Poupança do jornal, onde refere-se a
criação de leis de dois vereadores.