SlideShare uma empresa Scribd logo
1 de 3
A CANÇÃO DE ROLANDO

Roland chevauche par le champ de bataille,
Roland cavalga pelo campo de batalha,

Il tient Durendal qui bien tranche et bien taille,
Levando Durendal, que bem corta e bem talha,

Des Sarraisins, il fait moult grand dommage,
Nos sarracenos, ele faz um grande estrago,

Vous l’auriez vu jeter mort l’un sur l’altre,
Se vós tivésseis visto, lancar morto um sobre o outro,

Leur sang tout clair glisser sur cette place,
Seu sangue jorrar abertamente neste lugar,

Couvert de sang le haubert et ses membres,
Com o elmo e seus membros cobertos de sangue,

Et du cheval, col et les épales,
E no cavalo, do pescoço aos ombros,

Et Olivier de férir ne retarde,
E Olivier não tarda para ferir,

Les douze pairs non doivent avoir blâme,
Os doze pares não merecem repreensão,

Et les Français se lancent et se frappent,
E os franceses lançam-se e se chocam,

Meurent païens ! Et bien d’autres se pâment.
Morrem os pagãos ! E muitos desfalecem !
A Canção de Rolando


A Canção de Rolando (La Chanson de Roland ), datada do fim do século XI, início do
século XII, pertence à Gesta do Rei (ou Gesta de Carlos Magno ), um dos três grandes
ciclos das Canções de Gesta . Das cerca de 20 canções que constituem a Gesta do Rei ,
A Canção de Rolando , composta por 4002 versos decassilábicos, em estrofes
assonantes, é a que se destaca pela sua beleza poética e pela lenda romântica criada à
volta da personagem principal, Rolando.
N'A Canção de Rolando , narra-se que Carlos Magno passou sete anos em conquistas na
Hispânia (século VIII) até que Marsílio, rei de Saragoça (a única cidade que até então
não tinha caído nas mãos do imperador), enviou ao rei franco uma proposta de rendição.
Rolando, sobrinho de Carlos Magno e o mais famoso dos seus doze paladinos, em
discussão com outros conselheiros do rei, rejeitou a proposta de rendição, relembrando
as anteriores traições e crueldades de Marsílio. Em oposição ao jovem paladino, surgiu
o seu padrasto, Ganelon, que era a favor da paz. Irritado com Rolando, Ganelon, que
fora o escolhido para negociar os termos do tratado de rendição, urdiu com Marsílio
uma armadilha contra Carlos Magno que, convencido da paz, regressou a França,
deixando Rolando a comandar o exército de retaguarda. O plano resultou e, quando o
Exército de Carlos Magno já estava muito longe, os Sarracenos atacaram o exército de
retaguarda, no desfiladeiro de Roncesvales, e exterminaram-no. Durante o confronto,
Rolando recusava-se a pedir reforços mas, quando se decidiu a soprar no corno do
alarme, era tarde de mais, pois os inimigos já tinham dominado os francos. O esforço do
sopro fez com que brotasse sangue da testa e da boca de Rolando, que já se encontrava
ferido, o que levou à sua consequente morte. Mas antes de morrer, Rolando, não
querendo deixar a sua espada Durindana, famosa pela sua rigidez, nas mãos dos
sarracenos, resolveu destruí-la. Ao tentar partir a espada, esta manteve-se intacta e criou
uma enorme fenda no penhasco, ainda hoje conhecida como a Brecha de Rolando
(situada a 2600 metros de altura nas montanhas pirenaicas). Carlos Magno, quando
ouviu soar o alarme, voltou para se vingar dos Sarracenos e para castigar Ganelon, que
foi condenado e executado por traição. A noiva de Rolando, Aude, quando soube do
acontecimento, morreu de desgosto, num cenário romântico, que tem por objectivo
engrandecer a personagem de Rolando.
Esta história tem um fundo de verdade, já que um comandante de Carlos Magno, de
nome Rolando, foi morto pelos Bascos num combate, em Roncesvales, a 15 de Agosto
de 778. Apesar do acontecimento ter sido pouco glorioso, a lenda fez de Rolando um
mártir cristão contra o Islão. Na lenda, Rolando, filho de Berta (irmã de Carlos Magno)
e do Duque Milo de Aglant, é considerado um modelo de virtude da cavalaria medieval
que se distinguiu, ainda novo, pela sua valentia em guerras contra os Mouros e contra os
Saxões, salvando os exércitos do imperador de desastre.
Quanto à autoria d'A Canção de Rolando , ela é discutível. Há quem considere que
Turoldo é o autor da obra, visto que está reivindicada a sua autoria no último verso;
outros acham que Turoldo terá sido apenas o copista do manuscrito encontrado na
Biblioteca de Bodley de Oxford; e outros, ainda, que a canção, transmitida oralmente,
terá sido escrita por algum trovador da época.

Mais conteúdo relacionado

Mais procurados

Globalisation and it's impact on education
Globalisation and it's impact on educationGlobalisation and it's impact on education
Globalisation and it's impact on educationJaseel CM
 
Cultural Reproduction and Social Reproduction-
Cultural Reproduction and Social Reproduction-Cultural Reproduction and Social Reproduction-
Cultural Reproduction and Social Reproduction-elma22
 
EXAMINE THE ROLE OF TECHNOLOGY IN FOSTERING THE GLOBALIZATION
EXAMINE THE ROLE OF TECHNOLOGY IN FOSTERING THE GLOBALIZATIONEXAMINE THE ROLE OF TECHNOLOGY IN FOSTERING THE GLOBALIZATION
EXAMINE THE ROLE OF TECHNOLOGY IN FOSTERING THE GLOBALIZATIONSheryl Mehra
 
What is Multiculturalism?
What is Multiculturalism?   What is Multiculturalism?
What is Multiculturalism? paul_ilsley
 
Bm Chapter 1.9 Globalization
Bm Chapter 1.9 GlobalizationBm Chapter 1.9 Globalization
Bm Chapter 1.9 GlobalizationMr. D. .
 
Critical pedagogy group presentation
Critical pedagogy group presentationCritical pedagogy group presentation
Critical pedagogy group presentationsykeshea
 
Economics of the Natural Resource Trap
Economics of the Natural Resource TrapEconomics of the Natural Resource Trap
Economics of the Natural Resource Traptutor2u
 
Ch7 Deviance and Social Control
Ch7 Deviance and Social ControlCh7 Deviance and Social Control
Ch7 Deviance and Social ControlMBurke1621
 
Globalisation and society
Globalisation and societyGlobalisation and society
Globalisation and societyVivek Kumar
 
Globalization presentation
Globalization presentationGlobalization presentation
Globalization presentationprakatkafle
 
Human Capital : Theory And Application
Human Capital : Theory And ApplicationHuman Capital : Theory And Application
Human Capital : Theory And ApplicationSD Paul
 

Mais procurados (12)

Globalisation and it's impact on education
Globalisation and it's impact on educationGlobalisation and it's impact on education
Globalisation and it's impact on education
 
Cultural Reproduction and Social Reproduction-
Cultural Reproduction and Social Reproduction-Cultural Reproduction and Social Reproduction-
Cultural Reproduction and Social Reproduction-
 
EXAMINE THE ROLE OF TECHNOLOGY IN FOSTERING THE GLOBALIZATION
EXAMINE THE ROLE OF TECHNOLOGY IN FOSTERING THE GLOBALIZATIONEXAMINE THE ROLE OF TECHNOLOGY IN FOSTERING THE GLOBALIZATION
EXAMINE THE ROLE OF TECHNOLOGY IN FOSTERING THE GLOBALIZATION
 
What is Multiculturalism?
What is Multiculturalism?   What is Multiculturalism?
What is Multiculturalism?
 
Bm Chapter 1.9 Globalization
Bm Chapter 1.9 GlobalizationBm Chapter 1.9 Globalization
Bm Chapter 1.9 Globalization
 
Critical pedagogy group presentation
Critical pedagogy group presentationCritical pedagogy group presentation
Critical pedagogy group presentation
 
Economics of the Natural Resource Trap
Economics of the Natural Resource TrapEconomics of the Natural Resource Trap
Economics of the Natural Resource Trap
 
Ch7 Deviance and Social Control
Ch7 Deviance and Social ControlCh7 Deviance and Social Control
Ch7 Deviance and Social Control
 
Globalisation and society
Globalisation and societyGlobalisation and society
Globalisation and society
 
Globalization presentation
Globalization presentationGlobalization presentation
Globalization presentation
 
Economic Globalization
Economic GlobalizationEconomic Globalization
Economic Globalization
 
Human Capital : Theory And Application
Human Capital : Theory And ApplicationHuman Capital : Theory And Application
Human Capital : Theory And Application
 

Destaque

NOVELAS DE CAVALARIA
NOVELAS DE CAVALARIANOVELAS DE CAVALARIA
NOVELAS DE CAVALARIAKarina Lima
 
Revisão literatura - realismo - naturalismo
Revisão   literatura - realismo - naturalismoRevisão   literatura - realismo - naturalismo
Revisão literatura - realismo - naturalismojasonrplima
 
Lingua em uso linguagem e lingua
Lingua em uso   linguagem e linguaLingua em uso   linguagem e lingua
Lingua em uso linguagem e linguaMoises Ribeiro
 
Realismo x Naturalismo
Realismo x NaturalismoRealismo x Naturalismo
Realismo x Naturalismoadenicio
 
Naturalismo, realismo
Naturalismo, realismo Naturalismo, realismo
Naturalismo, realismo Ana Barreiros
 

Destaque (9)

NOVELAS DE CAVALARIA
NOVELAS DE CAVALARIANOVELAS DE CAVALARIA
NOVELAS DE CAVALARIA
 
Revisão literatura - realismo - naturalismo
Revisão   literatura - realismo - naturalismoRevisão   literatura - realismo - naturalismo
Revisão literatura - realismo - naturalismo
 
Lingua em uso linguagem e lingua
Lingua em uso   linguagem e linguaLingua em uso   linguagem e lingua
Lingua em uso linguagem e lingua
 
Linguagem e língua
Linguagem e línguaLinguagem e língua
Linguagem e língua
 
Realismo x Naturalismo
Realismo x NaturalismoRealismo x Naturalismo
Realismo x Naturalismo
 
Língua e linguagem 1
Língua e linguagem 1Língua e linguagem 1
Língua e linguagem 1
 
Naturalismo, realismo
Naturalismo, realismo Naturalismo, realismo
Naturalismo, realismo
 
Surrealismo
SurrealismoSurrealismo
Surrealismo
 
LÍNGUA & LINGUAGEM
LÍNGUA & LINGUAGEMLÍNGUA & LINGUAGEM
LÍNGUA & LINGUAGEM
 

Semelhante a A canção de rolando

Alexandre herculano o castelo de faria
Alexandre herculano   o castelo de fariaAlexandre herculano   o castelo de faria
Alexandre herculano o castelo de fariaTulipa Zoá
 
Eça de Queirós - A Ilustre Casa de Ramires
Eça de Queirós - A Ilustre Casa de RamiresEça de Queirós - A Ilustre Casa de Ramires
Eça de Queirós - A Ilustre Casa de Ramiresluvico
 
A Ilustre Casa de Ramires - Eça de Queirós.pdf
A Ilustre Casa de Ramires - Eça de Queirós.pdfA Ilustre Casa de Ramires - Eça de Queirós.pdf
A Ilustre Casa de Ramires - Eça de Queirós.pdfCarolina de Castro Cervi
 
Literatura portuguesa
Literatura portuguesaLiteratura portuguesa
Literatura portuguesaEry Pereira
 
47792084 o-visconde-de-bragelonne-01-alexandre-dumas
47792084 o-visconde-de-bragelonne-01-alexandre-dumas47792084 o-visconde-de-bragelonne-01-alexandre-dumas
47792084 o-visconde-de-bragelonne-01-alexandre-dumasAllesandra Melo
 
Destaques Enciclopédia 08-09-2014 a 14-09-2014
Destaques Enciclopédia   08-09-2014 a 14-09-2014Destaques Enciclopédia   08-09-2014 a 14-09-2014
Destaques Enciclopédia 08-09-2014 a 14-09-2014Umberto Neves
 

Semelhante a A canção de rolando (8)

Alexandre herculano o castelo de faria
Alexandre herculano   o castelo de fariaAlexandre herculano   o castelo de faria
Alexandre herculano o castelo de faria
 
Eça de Queirós - A Ilustre Casa de Ramires
Eça de Queirós - A Ilustre Casa de RamiresEça de Queirós - A Ilustre Casa de Ramires
Eça de Queirós - A Ilustre Casa de Ramires
 
A Ilustre Casa de Ramires - Eça de Queirós.pdf
A Ilustre Casa de Ramires - Eça de Queirós.pdfA Ilustre Casa de Ramires - Eça de Queirós.pdf
A Ilustre Casa de Ramires - Eça de Queirós.pdf
 
Literatura portuguesa
Literatura portuguesaLiteratura portuguesa
Literatura portuguesa
 
Reis 5º Ano
Reis 5º AnoReis 5º Ano
Reis 5º Ano
 
Elogio a Don Quixote - Conferências literárias - Gabinete Português de Leitu...
Elogio a  Don Quixote - Conferências literárias - Gabinete Português de Leitu...Elogio a  Don Quixote - Conferências literárias - Gabinete Português de Leitu...
Elogio a Don Quixote - Conferências literárias - Gabinete Português de Leitu...
 
47792084 o-visconde-de-bragelonne-01-alexandre-dumas
47792084 o-visconde-de-bragelonne-01-alexandre-dumas47792084 o-visconde-de-bragelonne-01-alexandre-dumas
47792084 o-visconde-de-bragelonne-01-alexandre-dumas
 
Destaques Enciclopédia 08-09-2014 a 14-09-2014
Destaques Enciclopédia   08-09-2014 a 14-09-2014Destaques Enciclopédia   08-09-2014 a 14-09-2014
Destaques Enciclopédia 08-09-2014 a 14-09-2014
 

A canção de rolando

  • 1. A CANÇÃO DE ROLANDO Roland chevauche par le champ de bataille, Roland cavalga pelo campo de batalha, Il tient Durendal qui bien tranche et bien taille, Levando Durendal, que bem corta e bem talha, Des Sarraisins, il fait moult grand dommage, Nos sarracenos, ele faz um grande estrago, Vous l’auriez vu jeter mort l’un sur l’altre, Se vós tivésseis visto, lancar morto um sobre o outro, Leur sang tout clair glisser sur cette place, Seu sangue jorrar abertamente neste lugar, Couvert de sang le haubert et ses membres, Com o elmo e seus membros cobertos de sangue, Et du cheval, col et les épales, E no cavalo, do pescoço aos ombros, Et Olivier de férir ne retarde, E Olivier não tarda para ferir, Les douze pairs non doivent avoir blâme, Os doze pares não merecem repreensão, Et les Français se lancent et se frappent, E os franceses lançam-se e se chocam, Meurent païens ! Et bien d’autres se pâment. Morrem os pagãos ! E muitos desfalecem !
  • 2. A Canção de Rolando A Canção de Rolando (La Chanson de Roland ), datada do fim do século XI, início do século XII, pertence à Gesta do Rei (ou Gesta de Carlos Magno ), um dos três grandes ciclos das Canções de Gesta . Das cerca de 20 canções que constituem a Gesta do Rei , A Canção de Rolando , composta por 4002 versos decassilábicos, em estrofes assonantes, é a que se destaca pela sua beleza poética e pela lenda romântica criada à volta da personagem principal, Rolando. N'A Canção de Rolando , narra-se que Carlos Magno passou sete anos em conquistas na Hispânia (século VIII) até que Marsílio, rei de Saragoça (a única cidade que até então não tinha caído nas mãos do imperador), enviou ao rei franco uma proposta de rendição. Rolando, sobrinho de Carlos Magno e o mais famoso dos seus doze paladinos, em discussão com outros conselheiros do rei, rejeitou a proposta de rendição, relembrando as anteriores traições e crueldades de Marsílio. Em oposição ao jovem paladino, surgiu o seu padrasto, Ganelon, que era a favor da paz. Irritado com Rolando, Ganelon, que fora o escolhido para negociar os termos do tratado de rendição, urdiu com Marsílio uma armadilha contra Carlos Magno que, convencido da paz, regressou a França, deixando Rolando a comandar o exército de retaguarda. O plano resultou e, quando o Exército de Carlos Magno já estava muito longe, os Sarracenos atacaram o exército de retaguarda, no desfiladeiro de Roncesvales, e exterminaram-no. Durante o confronto, Rolando recusava-se a pedir reforços mas, quando se decidiu a soprar no corno do alarme, era tarde de mais, pois os inimigos já tinham dominado os francos. O esforço do sopro fez com que brotasse sangue da testa e da boca de Rolando, que já se encontrava ferido, o que levou à sua consequente morte. Mas antes de morrer, Rolando, não querendo deixar a sua espada Durindana, famosa pela sua rigidez, nas mãos dos sarracenos, resolveu destruí-la. Ao tentar partir a espada, esta manteve-se intacta e criou uma enorme fenda no penhasco, ainda hoje conhecida como a Brecha de Rolando (situada a 2600 metros de altura nas montanhas pirenaicas). Carlos Magno, quando ouviu soar o alarme, voltou para se vingar dos Sarracenos e para castigar Ganelon, que foi condenado e executado por traição. A noiva de Rolando, Aude, quando soube do acontecimento, morreu de desgosto, num cenário romântico, que tem por objectivo engrandecer a personagem de Rolando. Esta história tem um fundo de verdade, já que um comandante de Carlos Magno, de nome Rolando, foi morto pelos Bascos num combate, em Roncesvales, a 15 de Agosto
  • 3. de 778. Apesar do acontecimento ter sido pouco glorioso, a lenda fez de Rolando um mártir cristão contra o Islão. Na lenda, Rolando, filho de Berta (irmã de Carlos Magno) e do Duque Milo de Aglant, é considerado um modelo de virtude da cavalaria medieval que se distinguiu, ainda novo, pela sua valentia em guerras contra os Mouros e contra os Saxões, salvando os exércitos do imperador de desastre. Quanto à autoria d'A Canção de Rolando , ela é discutível. Há quem considere que Turoldo é o autor da obra, visto que está reivindicada a sua autoria no último verso; outros acham que Turoldo terá sido apenas o copista do manuscrito encontrado na Biblioteca de Bodley de Oxford; e outros, ainda, que a canção, transmitida oralmente, terá sido escrita por algum trovador da época.