1) O documento descreve o frenesi em torno do caderno Moleskine e como ele se tornou um símbolo de status.
2) Um designer gaúcho criou o "Molespobre", um caderno caseiro e mais acessível similar ao Moleskine para democratizar o acesso.
3) O texto também apresenta pessoas que usam Moleskines para anotações em seus trabalhos criativos.
1. HOJE EM DIA - BELO HORIZONTE, DOMINGO, 4/9/2011
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Declaraçãodeamorcorreomundo
Objeto é tão ligado ao dono que traz na primeira página informações sobre quanto será a recompensa em caso de perda
TONINHO ALMADA
Semquerer,oMoleskinega- te. Em um, prometi um bi-
nhou uma divulgação impor- lhão de dólares, em outro um
tanteem2008,quandofoilança- abraço. Mas graças a Deus
do o videoclipe “Noites de um nunca perdi um moleskine.
Verão Qualquer”, do Skank. Não sei nem imaginar como
Realizadocomatécnicadestop seria isso”, admite.
motion, o belo vídeo tem o ca- Se render a um produto
derninhodecantosarredonda- importado pode parecer bo-
doscomoprotagonista. bagem, mas há quem garan-
O sucesso desse trabalho te que faz diferença se ele
foi tão grande que foi visto, pe- for produzido na Itália. O es-
lo Youtube, por pessoas de vá- tilista Ronaldo Fraga é um
rios outros países. Gente que exemplo de quem ficou resis-
nunca tinha ouvido falar na tente durante um tempo à
banda brasileira mas que fi- modinha, mas acabou se
cou interessado depois de as- rendendo.
sistir a essa declaração de “No início, fiquei com
amor aos caderninhos. muita preguiça de toda a his-
A ideia partiu de Conrado teria coletiva que aconteceu
Almada, diretor do vídeo e do em torno da marca. Sou da-
também impactante clipe de queles que acham que o artis-
“Sutilmente”. “Sempre apre- ta tem que saber desenhar
sento aos clientes as minhas em qualquer tipo de papel,
ideias impressas no moleski- até mesmo no papel de pão.
ne. Os integrantes da banda Mas acabei me rendendo por
sempre gostaram do caderni- causa da encadernação. Eu jo-
nho em si e, num dia, vimos go o meu moleskine na mochi-
que ele poderia ser a estrela la e até hoje não passei pela
do clipe”, lembra Conrado, história de ver alguma página
acrescentando que a reper-
cussão com o vídeo (que che-
gou a ser postado no site da
empresa italiana) foi muito
além do que ele e o Skank es- “Compro quando vou
peravam.
Antes de descobrir os be- à Europa ou peço a
nefícios do pequeno objeto
de anotações, Conrado fazia um amigo que está
seus desenhos em folhas sol-
tas, que ficavam espalhadas indo: não se esqueça
em bolsas e gavetas. Chegou a
tentar usar cadernos tradicio- do meu moleskine”
nais, mas não se adaptou.
Seu processo de criação
se transformou quando foi
morar na Itália. “Um amigo descolada”, conta o estilista.
disse que era para parar de de- Ronaldo diz que no início
senhar em folhas soltas e ex- desenhava em qualquer can-
perimentar o moleskine por to, mas agora tem que esperar
ser um caderno mais resisten- a solidão de um quarto de ho-
te, de bom papel e que não dei- tel para dar asas à sua imagi-
xa soltar as folhas. Fui resis- nação. “Hoje, se eu abrir meu
tente por um momento até caderninho no avião e come-
que experimentei e nunca çar a desenhar algo, logo vem
mais deixei de ter um”, conta alguém olhar e perguntar se é
Conrado, que desde 2004 já a nova coleção”.
preencheu todas as páginas A tal histeria contada pelo
de dez moleskines. estilista acontece no início
Ele é da turma que faz desse século, quando andar
questão do produto original, com um caderninho se tor-
por atestar a qualidade da ca- nou uma maneira de se dife-
pa e do papel. “Prefiro me renciar da banalidade das no-
manter fiel. Compro quando vidades tecnológicas. Em vez
vou à Europa ou peço a um de desfilar um celular de no-
amigo que está indo: ‘não se víssima geração, algumas pes-
esqueça do meu moleskine’”, soas passaram a carregar ca-
diz o videomaker, que prefe- derninhos que lembram gran-
re os tradicionais de capa pre- des intelectuais.
ta, que depois são customiza- A forte propaganda da
dos para facilitar o arquiva- empresa italiana, criada por
mento dos já preenchidos. um esperto empreendedor
O moleskine é um objeto milanês em 1997, reforça is-
tão ligado a seu dono que o ori- so em todos os detalhes de
ginal traz na primeira página seu site. Afinal, alguém pode
as informações básicas da garantir que a encadernação
pessoa, acrescido de quanto que Van Gogh carregava con-
será a recompensa em caso sigo tinha as mesmas caracte-
de perda. “Em cada um escre- rísticas do objeto vendido ho-
vo uma recompensa diferen- Moleskine do videomaker Conrado Almada: rabiscos foram uma prévia do que seria o clipe de “Noites de um Verão Qualquer” je? (CO)
PEDRO BIZ/DIVULGAÇÃO
Gaúchoensinaafazero‘molespobre’
Como todo objeto de dese- espero um terminar para com- mas feito em casa, com capa acessíveis”, afirma o desig-
jo, o preço do moleskine está prar outro”, explica Ana Paula. de papelão (veja passo a pas- ner, que criou o Molespobre
longe de ser acessível. No Bra- A paixão pelos caderni- so em (www.pedrobiz.com). numa época em que estava
sil, custa em média R$ 70. nhos foi tão cantada aos sete “Virou um artigo de sta- fazendo experimentações
Mas para se ter na bolsa um ventos pelos moleskiners (co- tus. Ter um moleskine é afir- em papelão.
bom caderninho, bonitinho e mo os fãs do objeto costu- mar ter um caderno que o “A repercussão foi muito
bem feito, não é preciso recor- mam se chamar) que já virou Van Gogh usava (a própria legal. Até hoje, eu descubro al-
rer ao objeto importado. Mar- motivo de piada na internet. marca se vende assim). Não gum blog que divulgou o Mo-
cas brasileiras, como Cicero e O designer gaúcho Pedro Biz só isso, mas é afirmar que a lespobre em algum lugar do
Moleco, perceberam o frene- conseguiu boa visibilidade pessoa pagou pelo menos R$ mundo. A coisa foi longe. E
si em torno do produto e fize- na web com uma criação inu- 40 por um caderninho. O pre- ainda recebi e-mails de pes-
ram suas próprias criações. sitada e questionadora: o Mo- ço, ao menos aqui no Brasil, soas agradecendo pelo tuto-
Hoje já é possível entrar nu- lespobre, um caderninho que não justifica seu uso. Exis- rial e mandando fotos do seu
ma grande livraria e encon- segue algumas característi- tem várias opções no merca- Molespobre”, afirma Pedro
trar opções variadas. cas do moleskine original, do por preços muito mais Biz. (CO)
Essa acessibilidade dos
produtos nacionais é impor-
tante para pessoas como a jor-
nalista e videomaker Ana Pau-
la Valois, que sempre carrega
três em sua bolsa. “Tenho um
caderninho para cada assun-
to – trabalho, assuntos e proje-
tos pessoais – e ainda uma
agenda em formato de mo-
leskine em que anoto os horá-
rios das reuniões e compro-
missos do dia”, afirma.
Para ela, o importante é
que o produto tenha pautas –
“fico nervosa com um cader-
no sem pauta” – e seja bem bo-
nitinho e colorido. Seu mo-
leskine original fica guarda-
do, para a coleção.
“Tenho muitos caderni-
nhos na minha casa cheio de
Molespobre: designer gaúcho brinca com o frenesi intelectual escritos, completinhos. Não Na internet: é possível ter uma página com cara de moleskine no site do Blogger.com