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Câmara dos Deputados
ROMÁRIO
Deputado Federal
Dia Mundial das Doenças Raras
2013
Ação do Deputado Federal Romário
na Câmara Federal.
Centro de Documentação e Informação
Coordenação Edições Câmara
Brasília – 2013
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CÂMARA DOS DEPUTADOS
54a
Legislatura – 3a
Sessão Legislativa
SÉRIE
SEPARATAS DE DISCURSOS, PARECERES E PROJETOS
No
21/2013
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Sumário
Apresentação   5
O Raro em um dia de conscientização mundial  7
Questões Bioéticas sobre Doenças Genéticas Raras  17
Para um começo de reflexão sobre o cuidado das
Doenças Raras  25
Notas taquigráficas do Dia das doenças Raras 2013  29
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| 5Dia Mundial das Doenças Raras
Apresentação
Você recebe em suas mãos o resultado de um dia de ação que foi
realizado na Câmara dos Deputados, em fevereiro de 2013.
Ao ler as notas taquigráficas poderá perceber o quanto o momento
foi permeado de palavras fortes, incisivas e urgentes. Palavras que pos-
suem esta característica são formuladas somente quando o sentimento
de urgência e de abandono de toda e qualquer ajuda coexistem.
O tema que apresento, doenças raras, é novo para mim. E corro o
risco de dizer, sem medo de errar, que o é para muitos de nós. Quando
comecei a me interar sobre o assunto, devido a procura inicial do Sr.
Rogério Lima Barbosa, percebi que a angústia desse pai não era uma
exclusividade e mais de 15 milhões de famílias brasileiras poderiam
sofrer do mesmo sentimento de abandono do Estado e descriminação
da sociedade.
Por isso, comecei a dedicar-me a apoiar as pessoas com doenças
raras. Em 2012 e 2013 fiz questão de promover o Dia das Doenças Raras
no maior auditório da Câmara dos Deputados, o Nereu Ramos.
Ainda não temos a tecnologia para repassar os sentimentos mas ao
ler as notas que serão apresentadas aqui, você poderá sentir um pouco
da emoção que eu e mais de 700 pessoas sentimos no dia 28 de fevereiro
de 2013, quando a voz do povo se fez presente em sua casa.
Além das notas taquigráficas, apresento três textos que buscam cla-
rear a realidade de quem convive com as doenças raras.
O primeiro texto, escrito pelo amigo Rogério Lima Barbosa, divulga
a origem do Dia das Doenças Raras, seus objetivos, avanços conseguidos
em nosso país, embasa a necessidade de transformação do olhar para o
paciente e, por fim, defende a criação de um programa para doenças
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6 | Romário • Deputado Federal
raras, dentro do Ministério da Saúde, capaz de gerar as informações
necessárias e suficientes para toda a população brasileira.
O prof. Dr. Natan Monsores, do departamento de saúde coletiva da
Universidade de Brasília, centra sua discussão na importância da pes-
soa e como são afetas a biociência. O professor ainda esclarece que as
pessoas que convivem com alguma doença rara, na concepção do outro,
acabam se tornando invisíveis às outras pessoas, intocáveis nas relações
sociais e incapazes por precisarem de tecnologias assistivas. Por fim,
aborda que a informação é o grande entrave das pessoas que convivem
com essa realidade.
Dentro da perspectiva de um problema vivido nos mais diferentes
países, a prof. Dra. Sílvia Portugal, da Universidade de Coimbra - Por-
tugal, contribui com um texto que esmiúça o conceito de raro onde a
pessoa ou o paciente deve se tornar agente ativo e ouvido por qualquer
interessado na temática. Esclarece que o volume de ações que vem acon-
tecendo em nosso país o coloca como referência na América Latina.
Ao conhecer os textos percebi que a geração de informação é a linha
estrutural que os une. A publicação desses trabalhos é uma forma de
gerar informação sobre as doenças raras. E, também, um mecanismo
que utilizo para cumprir a minha função parlamentar de ouvir e atender
as demandas que me chegam.
Com muito orgulho entrego esse material à toda sociedade brasi-
leira que, até onde fui informado, é o primeiro a possuir o olhar especí-
fico sobre o envolvimento social e as doenças raras em nosso país. Que
ele seja a inspiração de muitas outras ações que virão pela frente que,
com certeza, estarei disposto a defender e apoiar.
ROMÁRIO
Deputado Federal
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| 7Dia Mundial das Doenças Raras
O Raro em um dia de
conscientização mundial
Rogério Lima Barbosa
Mestrando em sociologia pela Universidade de Coimbra
Diretor Presidente da Associação AMAVI
rogeriolima@amavi.org
O Dia das Doenças Raras (DDR), celebrado no último dia de feve-
reiro, é uma iniciativa da Eurordis1
que desde 2008 promove uma ação
de sensibilização nos mais variados países. Em sua primeira edição
aconteceu em 18 países. Cinco anos após o seu início, em 2013, sob o
tema “Doenças Raras sem Fronteiras”, o DDR chega em mais de 70 paí-
ses e em todos os continentes. Seguramente, um crescimento de 394%
somente pode acontecer nas mais variadas formas porque existe uma
necessidade comum e, principalmente, um problema a ser resolvido por
toda a sociedade.
O tema do DDR para 2013 leva à comunidade a importância do
trabalho e atuação em rede para o atendimento a pessoa com alguma
doença rara. Os seus organizadores consideram que por se tratar de
poucas pessoas (em números relativos) e, principalmente, por haver
pouco tratamento disponível, somente pelo esforço conjunto e inte-
grado pode ser possível atender os pacientes e suas famílias2
.
1  Europe Rare Disease, www.eurordis.org, associação de pacientes que atua no desen-
volvimento de políticas públicas para Europa e realiza diversos estudos para conhecer as
comunidades que convivem com alguma doença rara. Atualmente, se posiciona como
uma fonte de dados estatísticos sobre esse tema, sendo reconhecida por associações de
pacientes, pesquisadores e agentes públicos.
2  A Eurordis mantém um espaço contínuo na internet para divulgar o DDR. As in-
formações sobre os temas, slogans, fotos, vídeos de sensibilização e todo material de
divulgação podem ser encontrados em http://www.rarediseaseday.org/
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8 | Romário • Deputado Federal
As ações promovidas pelo evento possuem grande foco na sensibili-
zação e comunicação de uma realidade que, ainda como base os estudos
da Eurordis, atinge de 6% a 8% de toda população. Trazendo as estatís-
ticas para nossa realidade e considerando o censo de 2010 são 13 a 16
milhões de famílias brasileiras que sofrem com as restrições impostas
pelas doenças raras.
Em busca de uma identidade visual comum, o DDR possui uma
figura característica criada pela superposição de três mãos onde, no
meio, percebe-se a figura de uma pessoa ou criança3
. Desta maneira, a
Eurordis incentiva a criação de banners, camisas, braceletes, bottons e
todo o tipo de material de divulgação com essa figura. Importante res-
saltar que não há qualquer forma de incentivo financeiro, por parte da
Eurordis, para realização do evento.
Com o propósito de criar uma identidade específica para o DDR e
considerando outras ações que a associação promove, como a proposi-
ção de políticas públicas, realização de pesquisas, formação de parcerias
e criação de redes de apoio, recorrendo a Boltanski quando aborda a
cité de projetos4
, a Eurordis atua como um mediador tanto na formação
das redes como, também, no incentivo para que outras organizações se
tornem mediadores em sua própria região.
“Esta cité apoia-se na atividade do mediador que lança as mãos na
formação das redes, de maneira a dotar-lhe de um valor próprio, inde-
pendente dos objetivos procurados e das propriedades fundamentais das
entidades entre as quais a mediação se realiza. Nesta perspectiva, a media-
ção é um valor em si mesmo, ou melhor uma grandeza específica da qual
qualquer ator se pode fazer valer quando põe em relação, estabelece laços
e contribui por seu intermédio para tecer redes.” (Boltanski, n.d.)
3  Considerando que 80% das doenças raras são de causa genética, há uma grande in-
fluência da biotecnologia sobre esse ambiente. A criação da identidade promovida pela
Eurordis somado, principalmente, a influência da biotecnologia faz com que, conforme
abordado pelo prof. Dr. Arriscado Nunes, se crie “novas formas de divisão e classifi-
cação social ou, mais precisamente, biosocial, em função da pertença a certos grupos
caracterizados pelos seus perfis genéticos.”
4  O termo cité por projetos é uma analogia com a literatura dos anos 90 relacionado
as organizações por projetos. Por analogia o autor conclui que existe uma organização
geral da sociedade por projetos.
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| 9Dia Mundial das Doenças Raras
Posta a grande influência da Eurordis na realização do DDR, sua
articulação com as associações e interessados nos mais diferentes países
e o incentivo para formação dos agentes mediadores locais, podendo até
ser de maneira involuntária, voltamos o foco de nossa atenção para os
acontecimentos em nosso país.
No Brasil, de acordo com o blog Deficiente Alerta5
, a primeira ação
relacionada ao DDR aconteceu em São Paulo, em 2010, por meio do
evento 1º Caminhada de apoio aos pacientes com doenças raras. Con-
forme as informações do blog a organização dessa atividade ficou ao
cargo da Fundação GEISER, Grupo de Estudos de Doenças Raras , Ins-
tituto Canguru, Aliança Brasileira de Genética e FOPPESP –Com apoio
de Secretaria Municipal da Pessoa com Deficiência e Mobilidade Redu-
zida e Subprefeitura Santana Tucuruvi.
A partir do final de 2010, em Brasília, inicia a execução de uma série
de atividades realizadas pela Associação AMAVI, de atenção aos fami-
liares e pacientes com doenças raras, que busca atingir a sociedade nos
mesmos moldes da Eurordis.
Em 2011, como primeiro evento dessa associação, aconteceu no
Clube da Associação dos Servidores do Banco Central, sob o slogan
Porque Raro é ser IGUAL!!! - Nossa Ação Afirmativa!, o 1º Dia das
Doenças Raras que contou com a participação de 300 pessoas dentre
parlamentares, pesquisadores, pacientes e familiares de pessoas com
alguma doença rara. Deste evento, foi formada a primeira diretoria da
AMAVI com pessoas que tinham em comum apenas a convivência com
a realidade das doenças raras por meio de um familiar, filho, pai ou a
própria pessoa. A história de criação da AMAVI não faz parte do escopo
desse trabalho sendo assunto de outro texto6
. Aqui serão abordadas,
não de maneira profunda, as questões no contexto do DDR, articulado
5  A primeira informação sobre realização do evento consta desse blog. O blog possui
uma postagem que sinaliza ser o release do Dia das Doenças Raras. http://deficientealer-
ta.blogspot.com.br/2010/02/primeira-caminhada-de-apoio-ao-paciente.html
6  As motivações que me levaram a criar a AMAVI, as ações realizadas para mobiliza-
ção e análise das redes criadas a partir de sua criação podem ser encontradas no artigo
Uma análise sobre a teoria das redes – O caso da AMAVI, publicado pela Universidade
de Coimbra, na séria Oficina do CES sob o n. 386, em julho de 2012.
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10 | Romário • Deputado Federal
e promovido pela associação, uma vez que reforçaram o processo de
mudança no Brasil que, antes de 2012, era realizado de maneira local.
Em 2012 e 2013, com o apoio do Deputado Romário Farias e arti-
culado pela AMAVI, o DDR aconteceu dentro do Congresso Nacional,
no Auditório Nereu Ramos da Câmara dos Deputados, considerado
o maior auditório do local, com aproximadamente 300 lugares. Esse
evento foi motivador para o início de uma visão realmente efetiva para
realidade das doenças raras em nosso país.
Pessoalmente esse tema é de extrema importância porque fui envol-
vido por uma questão familiar e sou um dos fundadores da Associação
AMAVI. O diagnóstico de Neurofibromatose mudou todo o meu enten-
dimento sobre a vida e a associação foi a forma encontrada por mim, e
por outros que passam pela mesma situação, de demonstrar à sociedade
a realidade de exclusão que invade a nossa vida e que muitos ainda acre-
ditam que nunca acontecerá em casa.
Devido a grande influência da maneira de pesquisar do Centro de
Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, esse texto tem o objetivo
de divulgar a ação ainda quando faz sentido no contexto histórico que
se encontra. Desta maneira se enquadra dentro da perspectiva do inves-
tigador militante7
.
O evento realizado em 2012, sob o tema um Dia Raro, aconteceu
sob o apoio de muitos parlamentares e contou com a participação de,
aproximadamente, 600 pessoas circulantes. Nesse evento, as Associa-
ções de Pacientes com doenças raras organizaram um Manifesto8
que
foi entregue nas mãos do Ministro da Saúde (MS), Sr. Dr. Alexandre
Padilha. Dentre as diversas solicitações do Manifesto, houve um grande
enfoque para geração de informação uma vez que definições básicas,
7  O investigador militante, conforme o prof. Dr. Boaventura Souza Santos em palestra
proferida no III Colóquio dos Doutorandos do CES, em novembro de 2012, na Uni-
versidade de Coimbra, deve atentar para não fazer da divulgação da prática social uma
publicação de “jornal velho” uma vez que corre o risco de perder o seu potencial de
apoiar os movimentos sociais com saberes relativos a realidade que se encontram dentro
do espaço histórico que favoreça a mudança requerida pela sociedade.
8  O manifesto bem como o relatório de atividades do evento pode ser encontrado no
site da AMAVI, www.amavi.org, ou encaminhado por email, amavi@amavi.org
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| 11Dia Mundial das Doenças Raras
como o entendimento pelo MS sobre a identificação de doenças raras,
não existia. Também foram listados os principais problemas que aco-
metem as pessoas que convivem com alguma doença rara e, por isso,
faz possível a convergência do diálogo entre as diversas associações de
pacientes:
Falta de um diagnóstico preciso: É comum que as pessoas com
suspeitas de alguma doença rara percorra longos caminhos em toda a
rede de atendimento até conseguirem um diagnóstico conclusivo de sua
condição;
Falta de tratamento: Devido à característica de acometer uma
pequena parcela, em números relativos, muitas doenças não possuem
o tratamento específico e tampouco a medicação. A discussão sobre a
medicação será melhor abordada mais adiante;
Falta de informação: A informação não existe tanto para o profis-
sional de saúde, que não consegue identificar as doenças e quando o faz
tem grandes dificuldades de saber para onde encaminhar o paciente,
quanto para o próprio paciente que não sabe onde encontrar os especia-
listas para o acompanhar.
De acordo com pesquisa mantida pela AMAVI, em sua página ini-
cial, 58% das pessoas que responderam a enquete: Em sua opinião, qual
a situação que possui o maior impacto negativo para quem convive com
alguma doença rara: A falta de informação ou a falta de tratamento?,
até julho de 2013, indicaram que a primeira opção é o maior problema.
Informação precisa e acessível é um princípio básico de comunica-
ção. A sua falta gera uma angústia que, no campo da saúde, gera uma
pergunta individual que, muitas vezes, não há resposta: O que está
acontecendo comigo ou com a pessoa que eu amo?
Em específico as doenças raras, o paciente e seus familiares, acabam
assumindo a tarefa de conseguirem, sozinhos, as respostas das questões
que lhes assolam. Um dado exemplar dessa tarefa pode ser observado
na pesquisa realizada por Schneiders, em 2011, em uma das declarações
de seus entrevistados: Assim que eu soube que meu filho tinha Neuro-
fibromatose eu comecei a pesquisar e descobri que pouca gente sabia da
doença e hoje em dia eu consigo saber mais do que alguns médicos.
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12 | Romário • Deputado Federal
O paciente especialista, como abordado, dentre outros, por Made-
laine Akrich, João Arriscado Nunes, Florence Paterson e Vololona
Rabehariosa, faz parte da nova configuração que as associações de
pacientes de doenças raras se apresentam. Esses pacientes assumem não
só a responsabilidade de entender a doença e toda a nova realidade que
se apresenta a sua frente como, também, iniciam o trabalho de movi-
mentação social para criar políticas públicas que, efetivamente, modi-
fiquem a estrutura equivocada, quando não ausente, que se encontra
disponível para eles.
Atualmente existe o pensamento fincado no entendimento que a
doença é sinônimo de falta de saúde e que o remédio é a sua única solu-
ção. Longe de adentrarmos nos acalorados debates sobre o que é saúde,
por agora, direcionamos o nosso entendimento somente para a conclu-
são que o modelo atual, do ambiente de doenças raras, é centrado na
medicação.
Contudo, o evento realizado em 2012 trouxe a necessidade de mudar
essa percepção. Somente uma pequena parte das mais de 6 mil doenças
raras – por volta de 3% a 8% - possuem algum tipo de medicação. Isso
faz com que mais de 90% das outras doenças, muitas vezes menos raras
que as que possuem medicação específica, deixem os seus pacientes
mais distantes de um tratamento eficaz. Se de um lado as indústrias far-
macêuticas primam pelo modelo econômico da garantia do lucro, com
o discurso que o baixo número de potenciais vendas não justifica os
custos envolvidos para o desenvolvimento das medicações, por outro,
esse argumento naufraga quando percebe-se um grande esforço para o
desenvolvimento das medições para as chamadas doenças ultra-raras.
No mesmo sentido e com argumentos diferentes, o governo insiste em
não desenvolver pesquisas que possam conhecer a realidade das pes-
soas que convivem com alguma doença rara e, portanto, não consegue
gerar dados e ferramentas suficientes que possam justificar o desenvol-
vimento da medicação, quando necessária, e desenvolver políticas de
atendimento para essa população.
Como o discurso, até dentro da academia, possui um grande viés
mercantil, é importante haver uma mudança do modelo da medicação,
onde o paciente é apenas um ponto dentro de tantos interesses, para o
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| 13Dia Mundial das Doenças Raras
da qualidade de vida onde toda e qualquer ação para essa comunidade
tem origem nas demandas do paciente e os resultados são direcionados
para melhoria de sua qualidade de vida sob o forte envolvimento das
associações de pacientes.
Ainda não é possível encontrar publicações robustas que envolvam
as doenças raras no olhar social. Por isso, o modelo acima não tem mais
que a intenção de ser apenas um ponto de partida na discussão sobre o
que, hoje, sinaliza existir.
O resultado concreto do evento de 2012 foi a formalização, pelo
Ministro da Saúde, de criar um Grupo de Trabalho dedicado as doenças
raras.
Em 2013, o dia das doenças raras começa a delinear os contornos de
controle social. Além de aumentar significativamente a quantidade de
pessoas e ações envolvidas, o evento conseguiu mobilizar vários estra-
tos da população e de diferentes locais de atuação. A participação de um
maior número de palestrantes fora da área da saúde e o início da parce-
ria da AMAVI com o Departamento de Saúde Coletiva e o da Cátedra
UNESCO de Bioética da Universidade de Brasília, começam a levar a
discussão para o campo social e não mais centrado na medicação, saúde
e poder médico.
A ausência do Ministro da Saúde ou melhor, a sua participação por
meio de representação, foi sentida por todos os presentes e fez com que
o evento se tornasse, essencialmente, de cobrança.
Tanto os parlamentares quanto os representantes de associações,
pacientes e comunidade em geral, lembraram ao Mistério da Saúde que,
após um ano do compromisso assumido pelo Ministro Padilha, a reali-
dade de atendimento aos pacientes não havia mudado e a portaria pro-
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14 | Romário • Deputado Federal
metida para ser criada pelo grupo de trabalho ainda não estava publi-
cada e, muito menos, disponível para consulta pública.
O evento de 2013 reforça o entendimento social sobre o tema e
impulsiona o Brasil para um novo patamar de discussão sobre as doen-
ças raras. Tanto que no Congresso Mundial para discussão sobre medi-
camentos órfãos9
, realizado nos EUA, houve a participação do Presi-
dente do Conselho Federal de Medicina e dos parlamentares Senador
Eduardo Suplicy e Jean Wyllys. Ainda, em março de 2013, a Interfarma,
Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa, realiza o seminário:
“Doenças Raras: a situação brasileira no contexto global e a necessidade
de implantação de uma política nacional”. E, no mês seguinte, publica o
documento Doenças Raras: Contribuições para uma política nacional10
.
Outra alteração no cenário, inclusive das associações de pacientes,
foi o perceptível aumento do volume de empresas e até associações de
outros países em procurar as associações de pacientes brasileiras.
O grande volume de atividades no ambiente das doenças raras
demonstra o aumento crescente do tema e de sua importância para
comunidade. Ainda em 2013 como um dos resultados do DDR, a
AMAVI realiza em Brasília, o I Congresso Iberoamericano de Doenças
Raras que visa inserir o Brasil, definitivamente, como protagonista no
campo das doenças raras e promover a mudança de percepção sobre as
associações de pacientes: de carentes de atenção e cuidados para asso-
ciações fortes e verdadeiras conhecedoras de sua realidade. É, no que diz
o prof. Boaventura, respeitar a ecologia dos saberes.
Ainda previsto para outubro de 2013, o Ministério da Saúde vai
publicar a portaria de atendimento aos pacientes de doenças raras.11
9   O congresso é voltado para o desenvolvimento de pesquisas e medicação. A propos-
ta de participação brasileira era baseada em como poderia haver uma interação entre
o governo e a indústria para criar um ato dos medicamentos órfãos, como no modelo
estadunidense. O link para essas informações é http://www.terrapinn.com/conference/
world-orphan-drug-congress-usa/index.stm
10   Informações disponíveis em http://www.interfarma.org.br/
11  A portaria foi em consulta pública no dia 11-4-2013 sob o número de consulta
pública n. 7 e a reunião do Grupo de Trabalho para analisar as contribuições ocorreu
no final do semestre.
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| 15Dia Mundial das Doenças Raras
As ondas produzidas pelos dois eventos que aconteceram no Con-
gresso Nacional ainda são sentidas e estão em formação. O fato é que
seguimos para uma nova realidade de atuação e ação, onde os atores
presentes no campo das doenças raras devem, como levantado por
Mouffe e citado por Martins, reconhecer o opositor não mais como um
inimigo mas como um adversário cuja existência é legítima.
O ano de 2014,diante de tanta ação em 2013, será de grande novi-
dade para quem convive com as doenças raras, inclusive, para avaliar a
implantação da portaria que está em elaboração no Ministério da Saúde.
As associações, pacientes, familiares e todas as pessoas envolvidas com
essa temática estarão realizando as ações necessárias para uma constru-
ção efetiva e de real atendimento, porque como abordado por diversos
autores, a longo prazo, as ações do governo acabam se alinhando com os
interesse do próprio mercado.
O presente texto não foge da pretensão informada anteriormente
de apenas contribuir para um olhar mais profundo e que promova o
conhecimento de uma realidade que apesar de envolver 6% a 8% da
população, contribuiu, não de maneira exclusiva, para o aumento do
gasto federal com processos judiciais, entre 2007 e 2011, em mais de
1200%. Chegando a R$ 339,7 milhões de reais até outubro de 201212
. E
mesmo assim, continua a receber menos atenção e recursos que doen-
ças que atingem até 700 mil brasileiros13
, como é o caso do programa
da Aids.
Logicamente, não é intenção promover a área que milito em detri-
mento de outra. O dado somente é relevante se percebermos a importân-
cia de se criar um programa que, como o da AIDS, comece a conhecer
e entender a sua própria realidade para, quem sabe, chegar nos mesmos
patamares de qualidade de atendimento e geração de informação que
esse programa fornece para a sociedade.
12  http://portalsaude.saude.gov.br/portalsaude/noticia/8579/671/noticia-da-folha-de-
-s.-paulo-destaca-gasto-recorde-com-acoes-judiciais..html
13  De 1980 a 2012 foram registrados 656.701 casos registrados de AIDS. http://www.
aids.gov.br/pagina/aids-no-brasil
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16 | Romário • Deputado Federal
REFERÊNCIAS
BALANCO, P. e PINTO, E. C. Dimensões do capitalismo contemporâneo:
alguns aspectos do debate acerca do Estado-nação e do “novo imperialismo”.
XXXIII Encontro Nacional de Economia. 2005
BOLTANSKI, L. (n.d.). A moral da rede? críticas e justificações nas recentes
evolvuções do capitalismo.pdf. Fórum Sociológico. Forum Sociológico, n.o
5/6
(2o
Série).
MARTINS, P. H. O dom como fundamento de uma cultura democrática e
associativa. In: PORTUGAL, Sílvia; MARTINS, Paulo Henrique (Eds.). Cida-
dania, políticas públicas e redes sociais. Coimbra, Portugal: Imprensa da Uni-
versidade de Coimbra, 2011. p. 13-28
NUNES, J. A., Matias M. e Filipe, A. M. As organizações de pacientes
como atores emergentes no espaço da saúde: o caso de Portugal. Reciis. 2007.
p. 107-110
NUNES, J. A. “A pesquisa em saúde nas ciências sociais e humanas: tendên-
cias contemporâneas”, Oficina do CES, 253. 2006.
RABEHARISOA, V., Callon, M. Nunes, J. A. et al. The dynamics of causes
and conditions : the rareness of diseases in French and Portuguese patients ’ orga-
nizations ’ engagement in research. Centre de Sociologie de L’innovation. May,
2012.
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SCHNEIDERS, J. (2011). Percepção dos pais sobre o filho portador de Neu-
rofibromatose. Universidade Feevale.
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| 17Dia Mundial das Doenças Raras
Questões Bioéticas sobre
Doenças Genéticas Raras
Prof. Dr. Natan Monsores
Departamento de Saúde Coletiva
Cátedra UNESCO de Bioética
Universidade de Brasília
monsores@unb.br
Como um campo agregador de reflexões sobre o impacto da biotec-
nociência nos modos de vida, a bioética é um bom lugar de partida para
se discutir questões relacionadas às doenças raras. Os temas da determi-
nação e da manipulação genéticas têm sido amplamente debatidos por
bioeticistas, tendo resultado em reflexões que podem lançar um pouco
de luz à discussão dos direitos à saúde e aos dilemas do descobrir-se
portador de uma doença genética rara. Em linhas gerais, a bioética pode
ser compreendida como:
(...) um espaço de encontro, mais ou menos conflituoso,
de ideologias, morais, religiões e filosofias, e de desafios para
uma multidão de grupos de interesse e de poderes consti-
tutivos da sociedade civil: associações de pacientes, corpo
médico, defensores dos animais, associações paramédicas,
agronegócios, indústria farmacêutica e de tecnologias médi-
cas em geral, bioindústria em geral (1).
Essa definição de Hottois é concreta neste seminário, pois temos
aqui pessoas com doenças raras, seus familiares, profissionais de saúde,
políticos, juristas, representantes da indústria e mídia. Apesar da varie-
dade de interesses e de perspectivas aqui reunidos, gostaria de ater-me
ao elemento central de todo esse processo que, pelo cálculo atuarial de
riscos e de impactos orçamentários ou pela litigiosidade em busca de
garantias constitucionais de tratamento e acesso à saúde, tem saído do
foco destas discussões – utilitaristas - de custos e benefícios: as pessoas.
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18 | Romário • Deputado Federal
As pessoas com doenças raras precisam ser garantidas, pelo Estado
Brasileiro, a igualdade de oportunidades, sem avaliações equivocadas
de merecimento ou de responsabilidade pessoal, já que são vulneradas
por eventos genéticos, aleatórios ou herdados, que originam uma per-
versa equação de exclusão social, independente da classe social ou de
local de nascimento: (a) se tornam invisíveis às outras pessoas, já que
a deficiência resultante da doença é sobredeterminante ao seu status
de pessoa ou indivíduo; (b) se tornam intocáveis, já que o estigma que
portam, isto é, as mudanças em seus corpos, causam estranheza, pavor
ou repulsa naqueles que fortuitamente atravessam seus caminhos; (c)
são rotulados como incapazes por precisarem de tecnologias assistivas,
por terem convalescença súbita ou longa e por terem limitações ao que
é convencionado de “vida comum”. A resultante desta equação é uma
incerteza social, sanitária e psicológica, já que são segregados em múlti-
plos aspectos. Isto significa que direitos humanos são violados ou relati-
vizados para estas pessoas que, depois de percorrerem longos itinerários
diagnósticos e terapêuticos, começam a encarar a doença como destino,
já que não podem contar com os aparelhos sociais de proteção.
Parte da segregação ou invisibilidade, principalmente para o Estado
Brasileiro, tem sua origem no paradoxo nosológico que são as doen-
ças raras: elas têm baixa prevalência na população, isto é, atingem gru-
pos familiares e minoritários, que no dimensionamento utilitarista das
ações de bem-estar social (maior bem para o maior número possível
de pessoas) ficam alijados de seus direitos. Por isso é importante frisar
que, apesar de cada doença ter poucos casos na população, em conjunto
constituem um grupo de mais de 5000 diferentes síndromes, em sua
maioria de etiologia genética, que afetam um contingente populacional
estimado em 6-8% na Europa e Estados Unidos (2-4), mas não há dados
que confirmem esta prevalência no Brasil, salvo estudos pontuais sobre
patologias específicas (5).
Esta última informação aponta uma fragilidade para a estruturação
de qualquer política pública para doenças raras no Brasil: falta infor-
mação epidemiológica qualificada, pois boa parte do conhecimento
sobre estas doenças surge da congregação de relatos de caso, sem veri-
ficação ampla, junto aos serviços médicos e sociedades científicas de
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| 19Dia Mundial das Doenças Raras
especialidades, da frequência de ocorrência na população em geral. Para
isso seria necessário um esforço coordenado, baseado na notificação e
registro de casos, ou mesmo em um censo nacional inclusivo, o que
demandaria um arranjo de ações entre o Governo Federal e os demais
governos.
Para que a informação seja gerada, é necessário preparo técnico e
científico (além de infraestrutura adequada) das equipes de saúde res-
ponsáveis pelo reconhecimento inicial destas síndromes, geralmente
crônicas e degenerativas (6). Um fator complicador é que, em função
de sua origem genética ou cromossômica, uma mesma condição pode
ter variadas manifestações clínicas (pleiotropia), configurando uma
diversidade de subtipos que afetam, de forma diferenciada, capacidades
físicas, habilidades mentais, comportamentos e percepção sensorial de
seus portadores. Há situações em que muitas desabilidades e deficiên-
cias coexistem em um só indivíduo (polyhandicap), o que leva a varia-
ções em termos de gravidade e expectativa de vida que, na maioria dos
casos, é reduzida (3, 7).
O impacto destas desordens sobre a qualidade de vida de seus por-
tadores varia muito. Entre erros inatos de metabolismo até as doenças
que afetam sistema motor ou mesmo aquelas desfigurantes e deforman-
tes, os efeitos pleiotrópicos geralmente implicam em risco de vida ou em
doenças degenerativas crônicas (8). Em algumas circunstâncias estas
doenças podem ser desencadeadas por multifatores: infecções bacteria-
nas ou virais, alergias ou exposição a produtos químicos ou radiações,
mas na maioria dos casos as doenças são congênitas ou herdadas e afe-
tam, predominantemente, crianças nos primeiros anos da infância.
Deve-se destacar também a grande carga psicossocial a que são sub-
metidos cuidadores e familiares, que seguem de perto o desespero psi-
cológico e falta de esperança terapêutica, bem como a escassez de estra-
tégias inclusivas por parte do Estado ou de governos (3). Um percentual
considerável de doenças raras acomete sistema nervoso e locomotor,
criando um alto nível de dependência aos cuidadores, que sofrem com
estresse e coping (9).
Apesar dos avanços na compreensão de mecanismos genéticos e
gatilhos, menos de 10% dos doentes podem contar com medicamen-
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20 | Romário • Deputado Federal
tos ou tratamentos específicos, tendo somente o aporte multidisciplinar
paliativo. A escassez de pesquisa e de terapêutica se deve a heterogenei-
dade de fisiopatologias, a história natural mal compreendida das doen-
ças, a variação na progressão das doenças, pela baixa disponibilidade de
voluntários para realização de ensaios clínicos, assim como pela falta de
marcadores patognomônicos e indicadores epidemiológicos (8).
Terapias avançadas, tais como os tratamentos com células-tronco
(10), os medicamentos biológicos e as terapias gênicas (11) têm sido
tentados para estes pacientes, no entanto o progresso das pesquisas se
dá em passos lentos e arriscados, não atendendo às curtas expectativas
de vida destes indivíduos. O resultado deste quadro é que as pessoas
com doenças raras e seus familiares, pela escassez de recursos médi-
cos, acabam tornando-se especialistas em sua própria condição (12),
gerando informações novas que são compartilhadas em comunidades
de internet, blogs e até em congressos da área biomédica (13).
Iniciativas internacionais, como a EURODIS (3), têm identificado
problemas recorrentes. Resumidamente, pode-se apontar:
(a)	 A falta de acesso a diagnóstico correto, com longos itinerários
diagnósticos, muitas vezes equivocados e imprecisos;
(b)	 A falta de informação sobre a doença e sobre onde obter ajuda
de profissionais de saúde;
(c)	 A falta de conhecimento científico com escassez de estratégias
diagnósticas e terapêuticas;
(d)	 A falta de cuidados multiprofissionais de saúde após o diagnós-
tico inicial;
(e)	 As consequências sociais das manifestações das doenças, já que
muitos destes pacientes são pessoas com necessidades especiais,
o que gera estigmatização, isolamento, exclusão e discrimina-
ção, bem como redução das oportunidades profissionais;
(f)	 O alto custo dos poucos medicamentos disponíveis e o custo do
cuidado continuado que, combinado com a falta de benefícios
sociais e reembolso, causam a pauperização das famílias.
No Brasil este panorama é agravado pelo fenômeno de judicializa-
ção da saúde (14, 15) em prol de uso compassivo de drogas ainda não
aprovadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (16), levando a
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| 21Dia Mundial das Doenças Raras
um intensivo assédio de multinacionais farmacêuticas às associações de
pacientes e profissionais de saúde que lidam com este grupo de doenças,
uma vez que os medicamentos são de alto custo. Outra variável nesta
complexa equação é o turismo de saúde. Diversos pacientes e familiares
têm buscado no exterior tratamento para suas doenças, alguns destes
duvidosos e sem bases científicas (17). A consequência disso são even-
tos iatrogênicos que fragilizam ainda mais os pacientes e oneram o Sis-
tema Único de Saúde (SUS), que arca com o processo de recuperação
dos indivíduos após estas incursões terapêuticas.
Em função destas situações, é fundamental que se estabeleçam nor-
mas claras ou um código de ética que balize as relações entre as asso-
ciações de pacientes, os centros de pesquisa e a indústria farmacêutica.
Faz-se necessário também um sistema transparente de recrutamento
para ensaios clínicos, além de esclarecimento à população sobre o que é
tratamento e o que é pesquisa clínica, pois a confusão entre ambos fra-
giliza a capacidade das pessoas de tomarem decisões autônomas, livres e
esclarecidas sobre os procedimentos a que se submetem. O Estado bra-
sileiro não pode permitir que uma parcela vulnerável de sua população
seja alvo de oportunismos, como a venda de curas e tratamentos fictí-
cios ou o aliciamento para tratamentos compassivos sem planejamento
adequado, que podem acelerar a falência orgânica destas pessoas.
Hoje, os avanços para acompanhamento e tratamento de doenças
raras no SUS vinculam-se, precariamente, à Política Nacional de Saúde
da Pessoa com Deficiência, cujo foco é a reabilitação e a acessibilidade.
As dificuldades da sociedade brasileira em dar equânime oportunidade
de acesso às pessoas com necessidades especiais são de amplo conhe-
cimento, restando ações estatais pontuais como o estabelecimento de
cotas, por exemplo. Um estado que têm como marco a igualdade de
direitos e o bem-star social, deve estender suas ações para políticas de
equidade mais amplas.
Há outra iniciativa importante para as famílias com doenças raras,
que se deu em 2001, com o estabelecimento do Programa Nacional de
Triagem Neonatal (PNTN) que, através do “teste do pezinho”, identifica
precocemente algumas doenças raras e permite, quando há celeridade
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22 | Romário • Deputado Federal
no processo, o estabelecimento de ações precoces de cuidados para estas
crianças.
Mais recentemente, em 2009, o Ministério da Saúde (MS) emitiu a
Portaria 81, estabelecendo a Política Nacional de Atenção Integral em
Genética Clínica, cuja meta é organizar a rede de serviços para realizar
ações de promoção, prevenção, diagnóstico, aconselhamento e terapêu-
tica para os casos identificados. Atualmente, há um grupo de traba-
lho, estabelecido pelo MS, para elaborar normas de atenção e diretrizes
para o atendimento de doenças raras no Sistema Único de Saúde – SUS,
algo que torcemos para que se concretize. Mas deve-se destacar que o
diagnóstico não é o único cuidado necessário, bem como o geneticista
clínico não deve ser o único profissional de saúde envolvido nos cuida-
dos às pessoas com doenças raras, o que geraria um enorme gargalo no
atendimento e no segmento do diagnóstico. É preciso reforçar o papel
das ações multiprofissionais, com valorização das outras profissões de
saúde, bem como avançar na atenção básica e em domicílio das pes-
soas com doenças raras, através de programas como o Saúde na Família,
além da ampla veiculação de informação sobre centros de referências e
sobre o segmento da atenção nos diversos níveis de complexidade do
SUS.
A questão da informação é perene em todas as discussões sobre
doenças raras: as pessoas com doenças raras precisam saber onde podem
buscar ajuda, precisam saber quem são os profissionais que podem auxi-
liá-las, sem que tenham o receio de ter sua saúde mais prejudicada por
tratamentos errados ou por diagnóstico equivocados, precisam saber se
têm direito a medicamento e tecnologias assistiva, se podem se aposen-
tar ou receber benefício previdenciário por sua condição. Neste sentido,
a Universidade de Brasília, pelo estabelecimento de um Observatório de
Doenças Raras pretende contribuir com o que lhe cabe neste processo:
a produção de informação técnico-científica para dar suporte à cons-
trução de políticas e para redução das iniquidades para esta parcela da
população brasileira. Enquanto Cátedra de Bioética e Núcleo de Saúde
Pública, estendemos nosso apoio às associações de pacientes, por com-
preendermos que as pessoas com síndromes raras não podem ter seu
corpo ou sua vida transformado em espaços de disputas por interesses
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| 23Dia Mundial das Doenças Raras
escusos a sua autonomia e bem-estar, tendo na mira a concepção de que
nossa missão é cuidar das pessoas e não somente das doenças.
REFERÊNCIAS
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pédie de bioéthique. Bruxelas: De Boeck; 2001. p. 125-6.
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European Organisation for Rare Diseases; 2005 [cited 2013 06-maio]; Available
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14.Sartori Junior D, Leivas PGC, Souza MVd, Krug BC, Balbinotto G,
Schwartz IVD. Judicialização do acesso ao tratamento de doenças genéticas
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| 25Dia Mundial das Doenças Raras
Para um começo de reflexão
sobre o cuidado das Doenças
Raras
Sílvia Portugal
Faculdade de Economia e Centro de Estudos Sociais
Universidade de Coimbra
sp@fe.uc.pt
Quando recebi o convite do Rogério Lima para escrever este texto
e li as notas taquigráficas do Seminário do Dia Mundial das Doenças
Raras, celebrado na Câmara dos Deputados, não pude deixar de pensar
que era um raro privilégio estar associada a este evento. Uma oportu-
nidade para estabelecer pontes entre os dois lados do Atlântico, num
domínio no qual elas não são comuns. A palavra “raro” impôs-se facil-
mente como mote. Como tal, retomando um hábito em desuso, consul-
tei um dicionário para verificar os significados da palavra, em busca de
inspiração – o monumental Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa.
Na página 3088 da edição portuguesa do Círculo de Leitores encontrei
o que pretendia. Este texto segue as definições aí encontradas.
1. que não é comum; que poucas vezes se encontra
A existência de políticas públicas para as Doenças Raras não é
comum, se olharmos para o panorama mundial. Na Europa, a França
é uma excepção, na América Latina, o Brasil torna-se agora uma refe-
rência. Poucas vezes se encontra uma atenção específica do Estado para
este domínio e essa ausência é tanto mais problemática quanto é conhe-
cida a gravidade dos problemas que enfrentam as pessoas com doenças
raras e as suas famílias. A urgência da intervenção pública nesta matéria
é enorme e a capacidade que o Estado brasileiro demonstra em lhe dar
resposta é de louvar e de seguir com atenção, analisando os caminhos
percorridos e os resultados obtidos.
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26 | Romário • Deputado Federal
O universo das doenças raras é plural e complexo e, como tal, repre-
senta um enorme desafio para a definição de políticas estatais e o aten-
dimento público a esta população. A particularidade de cada caso não
pode obscurecer a universalidade dos direitos. A implementação das
políticas tem que atender à especificidade e singularidade das doenças
raras e dos seus portadores, assumindo a difícil tarefa de uma contínua
(re)configuração dos serviços e dos profissionais em função da integra-
lidade do cuidado e das necessidades da pessoa e da sua família.
2. que ocorre de forma infrequente (doença rara)
A doença rara surge como primeiro exemplo do significado de
“raro”. Ela é definida pelo número da sua ocorrência, pelo significado
estatístico da sua incidência na população. A doença rara ocorre de
forma infrequente. Foge, portanto, à norma. É o impacto do significado
médico e social de estar fora da norma que marca a vida das pessoas
com doenças raras e das suas famílias. Estar fora da norma implica que
os diagnósticos tardam, os exames, as consultas e as opiniões se multi-
plicam, as respostas não são adequadas, as necessidades não são aten-
didas, a urgência do cuidado contrasta com o tempo longo da espera.
Estar fora da norma revela-se no corpo, implica olhares furtivos, con-
tatos evitados, oportunidades perdidas, gera estigma, cria vidas escon-
didas, cotidianos que giram em volta da doença. A doença rara é infre-
quente, a exclusão social que lhe está associada frequente.
3. em pequeno número
Aspessoascomdoençasrarassãoumpequenonúmero,umpequeno
grupo, uma minoria. As minorias são facilmente ignoradas. A irrele-
vância estatística é pretexto para o desinteresse e o desconhecimento:
da população, dos governos, da ciência, da indústria farmacêutica. O
conhecimento e a informação são cruciais para lutar contra a invisibi-
lidade, para combater o estigma, para que o raro deixe de ser o outro.
É preciso investigar, conhecer, investir, informar, divulgar. Conhecer as
doenças: os sintomas, os diagnósticos, as pesquisas clínicas, as terapêu-
ticas. Conhecer as pessoas: Quem são? Quantas são? Onde estão? Como
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| 27Dia Mundial das Doenças Raras
lidam com a doença? Como vivem? Saber que elas são mais do que a
doença.
4. de que poucos indivíduos são dotados; admirável;
extraordinário
As histórias das vidas das pessoas com doenças raras, das suas famí-
lias e de pessoas próximas são admiráveis pelo exemplo que oferecem de
luta contra a adversidade. As suas biografias revelam trajetórias extra-
ordinárias de conquista cotidiana de esperança e de vida, contra o des-
conhecimento, o desinteresse, o preconceito, o desespero. À ausência de
respostas e de apoios formais, à escassa garantia de direitos, ao incum-
primento das obrigações societais, contrapõem-se percursos de vida
assentes na solidariedade e na dádiva, que recusam a derrota. O cuidado
das pessoas com doenças raras assenta essencialmente na dedicação e
amor das suas famílias. Quando se reivindica apoio e assistência, muitas
vezes, a primeira leitura orienta-se para a demissão das famílias. Ela não
podia ser mais erronea. As famílias não querem ser substituídas no seu
papel, no entanto, para poderem desempenha-lo da melhor forma, para
não adoecerem conjuntamente com os seus familiares, necessitam de
condições e de meios para a prestação do cuidado. É esse o desafio que
as políticas públicas têm que assumir: tomar as famílias como parceiras.
5. advérbio: raramente
Raramente as pessoas com doenças raras e as suas famílias são ouvi-
das. Raramente elas são consideradas sujeitos ativos e implicados. É
preciso que elas se assumam/sejam assumidas como protagonistas do
seu próprio destino, sujeitos de pleno direito e não objetos passivos de
intervenção social e de tratamento médico.
As pessoas sabem mais sobre a sua doença do que os outros. Sentem
o corpo, as dores, o sofrimento. Sabem o que está certo para elas e o
que está errado. São agentes ativos do seu cuidado. Ouvem, conversam,
pesquisam, fazem opções, definem estratégias, ministram medicação,
desenham itinerários terapêuticos.
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28 | Romário • Deputado Federal
As pessoas são mais do que a doença. Têm vidas para além da
doença. Têm famílias, amigos, sociabilidades, prazeres, gostos e desgos-
tos, crenças, confianças e desconfianças.
O desafio é escutar e dar voz: no consultório, na comunidade, no
espaço público.
6. de raro em raro: uma vez ou outra
Uma vez ou outra faz-se a diferença. Um profissional interessa-se,
um departamento dá seguimento, um tribunal despacha favoravel-
mente, um diretor promove uma ação, uma instituição resolve o caso,
uma comunidade envolve-se. No entanto, a vida das pessoas e das suas
famílias não pode depender do raro da boa prática. A força das políticas
públicas constroem-se no combate à discricionariedade das interven-
ções. A garantia da existência da norma para quem sai dela, de iguais
direitos para quem é diferente.
7. não raro: com frequência
Com frequência o desenho das políticas é excelente e a sua efeti-
vidade limitada. No caso, as definições do objeto da política colocam
inúmeros obstáculos à sua implementação. Construir o universal para
responder ao singular é o desafio que se coloca. Pelo que ouvi na leitura
destas falas só posso acreditar que se está no bom caminho.
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| 29Dia Mundial das Doenças Raras
Notas taquigráficas do Dia das
doenças Raras 2013
DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO
NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES
TEXTO COM REDAÇÃO FINAL
Versão para registro histórico
Não passível de alteração
SEMINÁRIO DIA MUNDIAL DE DOENÇAS RARAS
EVENTO: Seminário N°: 0025/13 DATA: 27/02/2013
INÍCIO: 14h38min TÉRMINO: 18h37min DURAÇÃO: 03h59min
TEMPO DE GRAVAÇÃO: 03h59min PÁGINAS: 78 QUARTOS: 48
DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃO
JOSÉ EDUARDO FOGOLIN PASSOS - Representante do Ministro da Saúde, Alexandre Padilha.
DIRCEU BARBANO - Diretor-Presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária — Anvisa.
GREYCE LOUSANA - Presidenta Executiva da Sociedade Brasileira de Profissionais em Pesquisa
Clínica.
NATAN MONSORES - Departamento de Saúde Coletiva da Universidade de Brasília — UnB.
ROGÉRIO LIMA BARBOSA - Representante da Associação Maria Vitória — AMAV.
CLAUDETE LEMOS RIBEIRO - Esposa de portador de Atrofia de Múltiplos Sistemas — AMS.
ROBERTO SALES - Pai de portador de epidermólise bolhosa.
CAROLINA CORDEIRO ALVARENGA - Diretora de Operações da América do Sul sobre a Síndrome
de Aicardi-Goltieres. Coordenadora do Movimento Eu respeito as vagas. E você?
PATRICK TEIXEIRA PIRES - Portador de Mucopolissacaridose.
THIAGO FELIX MARQUES - Professor da Fundação Educacional do DF. Hemofílico grave.
SUMÁRIO: Seminário Dia Mundial das Doenças Raras, celebrado em 29 de fevereiro, promovido
pela Liderança do Partido Socialista Brasileiro na Câmara dos Deputados.
OBSERVAÇÕES
Houve exibição de imagens.
Houve intervenção fora do microfone. Inaudível.
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30 | Romário • Deputado Federal
O SR. APRESENTADOR (David Rayol) - Srs. Parlamentares e
autoridades presentes, especialistas da área médica, representantes de
entidades ligadas às doenças raras, portadores dessas enfermidades,
familiares, senhoras e senhores, boa tarde!
Inicia-se neste momento a cerimônia de abertura do Seminário
Dia Mundial das Doenças Raras, celebrado em 29 de fevereiro, pro-
movido pela Liderança do Partido Socialista Brasileiro na Câmara dos
Deputados.
Senhoras e senhores, neste momento, abrindo os atos protocolares
desta cerimônia, são convidadas a compor a Mesa as seguintes autori-
dades: o Sr. Deputado Romário, idealizador deste seminário (palmas);
o ator Luciano Szafir, irmão de Alexandra Szafir, portadora de esclerose
lateral amiotrófica (ELA) (palmas); o Sr. José Eduardo Fogolin Passos,
Coordenador-Geral de Média e Alta Complexidade do Ministério da
Saúde, representando nesta oportunidade o Sr. Ministro Alexandre
Padilha (palmas); o Sr. Deputado Maurício Quintella Lessa (palmas);
a Sra. Deputada Mara Gabrilli (palmas); o Sr. Deputado Marçal Filho
(palmas); o Sr. Senador Eduardo Suplicy (palmas); a Sra. Senadora Ana
Amélia Lemos (palmas); o Sr. Senador Cássio Cunha Lima (palmas); o
Sr. Deputado Distrital Joe Valle (palmas) e o Sr. Diretor-Presidente da
Anvisa, Dirceu Barbano (palmas).
Senhoras e senhores, composta a Mesa de Abertura desta
cerimônia, pedimos a todos que se coloquem em posição de respeito
para, neste momento, ouvir o Hino Nacional.
(É executado o Hino Nacional.)
O SR. APRESENTADOR (David Rayol) - Senhoras e senhores, este
seminário tem como objetivo chamar a atenção e ampliar o conheci-
mento das autoridades e da sociedade para as doenças raras, que, na
maioria das vezes, manifestam sintomas crônicos graves e incuráveis,
sendo ainda, com frequência, degenerativas e progressivas, além de
constituírem elevado risco de morte.
O Ministério da Saúde classifica como doenças raras aquelas que
afetam, uma a cada 2 mil pessoas. Cerca de 80% dessas doenças têm ori-
gem genética sendo que a maioria não possuí cura conhecida. Estima-se
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| 31Dia Mundial das Doenças Raras
que de 6% a 8% da população mundial seja atingida por esse grupo de
doenças.
Nós gostaríamos de informar a todos que este evento está sendo
transmitido em tempo real pela internet e pela TV Câmara.
Neste momento, abrindo a sessão de pronunciamentos desta ceri-
mônia de abertura, convidamos para fazer uso da palavra o Sr. Depu-
tado Romário, idealizador deste seminário.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Romário) - Boa tarde, senhoras e
senhores. É com muita honra que presido a Mesa deste Seminário sobre
o Dia Mundial das Doenças Raras.
Antes de meu pronunciamento, gostaria de saudar as pessoas pre-
sentes à Mesa: o ator e amigo Luciano Szafir — muito obrigado pela
presença; o Dr. José Eduardo Fogolin Passos, representando o Minis-
tério da Saúde; o Senador Eduardo Suplicy; o Senador Cássio Cunha
Lima; o Deputado Maurício Quintella Lessa; a Deputada Mara Gabrilli;
o Deputado Marçal Filho; a Senadora Ana Amélia; a Deputada Rosi-
nha da Adefal, que acabou de chegar; o Deputado Distrital Joe Valle e o
Diretor-Presidente da Anvisa, Sr. Dirceu Barbano.
Gostaria de aproveitar a oportunidade e convidar para a Mesa o
Líder do Partido na Câmara, Deputado Beto Albuquerque, do PSB.
(Palmas.)
Senhoras e senhores, hoje é um dia de reflexão e de conscientiza-
ção o qual quero, antes de mais nada, compartilhar com os presentes a
minha decepção pela ausência de uma pessoa que seria uma das mais
importantes aqui: o Ministro da Saúde, Alexandre Padilha, que, infe-
lizmente, não pôde estar presente. Tem o seu representante, mas, como
no ano passado, acredito que a sua presença seria de suma importân-
cia. E de frustração. Frustração por quê? Já enfrentei muitos desafios na
minha vida e, com certeza, nunca me queixei de lutar por aquilo em que
acredito. O que me cansa e me aborrece, e às vezes até me desanima, é
ver que, apesar de todo o esforço meu e daqueles que lutam comigo, os
avanços, em certos casos, demoram muito para acontecer.
No ano passado, nessa mesma data, realizamos na Câmara um
evento memorável, podendo contar com a presença de ninguém menos
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32 | Romário • Deputado Federal
do que a autoridade máxima da saúde pública do nosso País, o Ministro
Alexandre Padilha.
O Ministro veio e falou muito bem. Ele disse que, em relação aos
temas de doenças raras no Brasil, existem três questões fundamentais:
a pesquisa, a informação e o atendimento. Sobre esse último item, o
Ministro declarou que não basta construirmos prédios bonitos e bem
equipados, mas que a alma do bom cuidado da saúde é o profissional
bem qualificado e comprometido.
Porém, o aspecto que quero destacar na fala do Ministro Padilha é
a importância que pareceu dar à questão da informação. Ele disse que
existe um vácuo no nosso sistema de saúde em relação ao cuidado com
as pessoas portadoras de doenças raras. E acrescentou que precisamos,
em primeiro lugar, de dados, pois, sem os dados, é impossível se fazer
política pública.
O Ministro admitiu que ainda não se sabe ao certo quantas pessoas
possuem doenças raras no Brasil e, portanto, quantas famílias são atin-
gidas pelo problema. Não se sabe também onde vivem e como vivem. E
assumiu o compromisso de resolver essa situação.
Eu acho ótimo que o chefe da Pasta da Saúde tenha assumido esse
compromisso justamente aqui, na Casa do povo. E quero acrescentar
que precisamos, em primeiro lugar, saber com que definição de doença
rara o governo trabalha. É difícil saber, e não adianta procurar no dicio-
nário do SUS ou no site do Ministério: a informação, infelizmente, não
existe.
Além disso, a sociedade precisa saber onde buscar informações e
atendimento sobre essa questão. Todo pai e mãe sabem como é aflitivo
não ter a quem recorrer, tenham certeza que isso é a pura verdade.
Mas o que mais eu gostaria de saber neste momento, como Depu-
tado, como cidadão, é o porquê de nada efetivo ter sido realizado nos
últimos anos, apesar de o Ministro Padilha ter tanta clareza sobre o que
precisa ser feito. O Brasil tem o direito e o dever de saber.
Como eu disse aqui há exatamente um ano, um grande obstáculo
que os portadores de doenças raras e suas famílias enfrentam é a falta de
conhecimento sobre o tema, inclusive entre os médicos, o que dificulta
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| 33Dia Mundial das Doenças Raras
bastante o diagnóstico, que, em muitos casos, acaba chegando dolorosa-
mente tarde a algumas famílias.
Nesse meio tempo, enquanto dura aquilo que muitas famílias cha-
mam de odisseia diagnóstica, as pessoas são vítimas de preconceitos
e da desesperança, sem contar que têm que lidar com sintomas que
poderiam, pelo menos, serem aliviados. E como se não bastasse, existe
a dificuldade de se chegar a um diagnóstico, a um acesso ao tratamento
adequado.
Infelizmente, essa é a realidade que vivemos hoje em nosso País.
Falta pesquisa, mas não é pesquisa sobre medicamentos o principal
problema, falta um trabalho social para identificar quantas são, onde e
como vivem as pessoas com doenças raras no Brasil.
Estamos conhecendo essas pessoas hoje por meio das imagens que
estão sendo projetadas — espero que estejam passando aí, acho que deu
um probleminha, vamos tentar passar um pouco depois. Só assim o
Brasil poderá ter, como tem de ter, uma rede eficaz de atendimento.
Talvez a gente possa chegar a isso por meio da criação de um pro-
grama específico no Ministério, voltado para as doenças raras. O Bra-
sil pode ser, com certeza, modelo para outros países em muitas áreas,
inclusive em áreas da Saúde. O SUS e o programa de combate à Aids são
exemplos do que pode ser feito quando o governo ouve a sociedade e ela
se organiza para encaminhar soluções.
Por isso, eu ainda tenho esperanças. Hoje a situação no Brasil em
relação ao atendimento às pessoas com doenças raras é vergonhosa.
Estamos atrasados não apenas em relação aos países mais desenvol-
vidos, mas em relação a muitos de nossos vizinhos. A Argentina saiu
na frente, assim como a Colômbia e o Chile. Nós podemos trabalhar
com eles, podemos criar uma rede regional de atendimento. mas antes
precisamos fazer o nosso dever de casa, precisamos fazer pelo menos o
mínimo. E isso, infelizmente, não estamos fazendo.
Acredito e espero que, mais uma vez, este evento, este seminário,
possa fazer com que as nossas autoridades maiores, como ministros, e até
mesmo a nossa Presidenta, possam começar a olhar diferente para esse
tema, o qual muitas pessoas não têm noção do real sofrimento, da dor
e da angústia que passam os portadores das doenças e seus familiares.
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Étristesaberquesomosumexemploaserseguidoemváriassituações
referentes à própria saúde e, num tema dessa importância, no mundo
moderno em que vivemos, infelizmente, estamos tão despreparados, tão
desprotegidos e tão desinformados sobre o que é preciso para fazer uma
política pública de mínima qualidade.
Está aberto hoje, aqui, este seminário. Agradeço a presença a todos
vocês. Espero que saiam daqui hoje conscientes do que realmente nós,
sociedade, podemos fazer em relação às pessoas com doenças raras e a
seus familiares.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. APRESENTADOR (David Rayol) - O Cerimonial gostaria de
informar que o Sr. Deputado Maurício Quintella Lessa, que se encontra
à Mesa, é o 3º Secretário da Mesa Diretora da Câmara dos Deputados e
também Presidente da Frente em Defesa das Doenças Raras.
O cerimonial cumpre o dever de registrar e agradecer as ilustres
presenças das seguintes autoridades e personalidades que se apresen-
taram ao cerimonial: o Sr. Deputado Ruy Carneiro, o Sr. Deputado
Isaias, a Sra. Deputada Keiko Ota, o Sr. Deputado Beto Albuquerque,
que se encontra à Mesa de Honra, o Sr. Deputado Severino Ninho, o Sr.
Deputado Dr. Ubiali, o Sr. Deputado Tiririca, a Sra. Deputada Carmen
Zanotto, o Sr. Deputado Alexandre Roso, o Sr. Deputado Eurico Júnior,
o Sr. Deputado Maurício Quintella Lessa, que se encontra à Mesa, o Sr.
Deputado Onofre Santo Agostini e o Sr. Deputado estadual Ernani Polo.
Também queremos registrar e agradecer a honrosa presença do Sr.
Deputado Darcísio Perondi, que prestigia este evento, assim como os
demais presentes.
Concluída a fala do Sr. Deputado Romário, neste momento, anun-
ciamos o pronunciamento do Sr. José Eduardo Fogolin Passos, repre-
sentando, neste ato, o Sr. Ministro da Saúde Alexandre Padilha.
O Sr. José Eduardo Fogolin Passos - Boa tarde a todos os presentes
nesta tarde do dia 27 de fevereiro de 2013.
Gostaria de cumprimentar a Senadora Ana Amélia e a todos os Srs.
Senadores presentes, também cumprimento o ilustríssimo Deputado
Federal Romário, Presidente da Mesa referente ao Dia Mundial das
Doenças Raras, e a todos os Deputados no auditório. Gostaria, ainda,
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| 35Dia Mundial das Doenças Raras
de cumprimentar o meu colega, Dr. Dirceu Barbano, Diretor-Presidente
da Agência Nacional de Vigilância Sanitária e, também, o ilustre ator
Luciano Szafir, irmão de Alexandra Szafir, paciente com esclerose lateral
amiotrófica.
Em especial, nesta tarde, quero deixar um grande abraço a todos os
pacientes com doenças raras e a seus familiares.
Fiquei muito contente, Deputado Romário, com a fala de V.Exa. no
início da reunião de hoje. E é com esse entusiasmo que eu trago a fala
do Ministro Alexandre Padilha. Com grande satisfação, retornamos a
esta Casa de Leis para anunciar as ações realizadas referentes à atenção
às pessoas com doenças raras.
Posso dizer a todos os presentes que, durante o ano de 2012, parti-
cularmente, coordenei um grupo técnico responsável pela elaboração
de uma política específica de atenção às pessoas com doenças raras no
Sistema Único de Saúde.
Desde abril de 2012, o Ministério da Saúde e, pela primeira vez, um
grupo conjunto, participativo, com associações de usuários especialistas
na área de doenças raras e doenças genéticas e um grupo de profissio-
nais elaboraram uma política de atenção às pessoas com doenças raras.
Essa elaboração durante o ano de 2012 gerou dois documentos nor-
teadores que já estão para ser publicizados e serão colocados em con-
sulta pública na semana seguinte. E só não estão sendo colocados em
consulta pública hoje porque, durante o mês de fevereiro, ocorreram
vários eventos relacionados às doenças raras. Eu estarei, inclusive, pre-
sente em todos os eventos para os quais fomos convidados pelo Ministé-
rio da Saúde. Sábado estive em São Paulo, amanhã participarei de outro
evento também em São Paulo, contemplando todas as associações de
usuários. Na sequência da apresentação em todos os eventos, faremos
a consulta pública dos dois documentos norteadores que plasmam no
Sistema Único de Saúde a atenção integral aos pacientes com doenças
raras e seus familiares.
É importante salientar que esses documentos geram uma portaria
pactuada na Comissão Intergestora Tripartite, que é a lógica dentro do
Sistema Único de Saúde, para que, verdadeiramente, consigamos imple-
mentar, e não fiquemos apenas no contexto de portaria, uma política
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pública voltada não somente ao tratamento de doenças raras, mas que
englobe uma linha de cuidado e uma rede de atenção às pessoas e fami-
liares de pacientes com doenças raras.
Essa política traz, desde a promoção do contexto da saúde e pre-
venção em algumas doenças raras, fundamentalmente, o diagnóstico
precoce e referências para que os usuários e familiares de pacientes com
doenças raras possam ser encaminhados para serviços e centros espe-
cializados de doenças raras.
Terei oportunidade, ainda nesta tarde, de apresentar a todos os
senhores e às senhoras o contexto da política, todos os seus pontos de
atenção e rede de atendimento. Essa política traz a linha de cuidado, o
fundamental da informação e o cuidar do paciente de doenças raras
e seus familiares. Não se trata apenas de estabelecer tratamento, que é
parte de todo um cuidado, mas, fundamentalmente, de acolher os usu-
ários, pacientes e familiares.
Com essa política, gostaríamos de fazer com que todos os usuários
e seus familiares tenham uma referência para o cuidado em relação às
doenças raras.
É importante salientar que essa política construída é um ponto
de partida e não de chegada na conclusão do cuidado em relação às
doenças raras. Parte desse grupo técnico estabelecido vai acompanhar,
como ator fundamental, o monitoramento e a informação aos usuários
e pacientes com doenças raras no Sistema Único de Saúde.
Temos quase 8 mil doenças raras catalogadas especificamente em
relação a esse cuidado. Em relação a tratamento, hoje é muito pouco. O
que temos de ofertar e o que o Sistema Único de Saúde tem de fazer é
garantir a informação e o cuidado. E posso garantir ao senhor, Depu-
tado Romário, que essa política traz a garantia da informação para que
crianças, como o Pedro aqui presente, possam ter um diagnóstico pre-
coce e referência para cuidado mais organizado.
É importante salientar que, em relação às doenças raras, e eu não
vou me furtar neste momento, existe hoje dentro do contexto, e isso
impacta os gestores e familiares, um grande processo de judicialização
dentro do contexto do tratamento lá na ponta em relação às doenças
raras. E, infelizmente, inclusive os próprios magistrados, em qualquer
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| 37Dia Mundial das Doenças Raras
nível, podem se pronunciar e tomar as decisões sem um especialista
ou técnico adequado nesse processo. Se a solicitação não for adequada,
inclusive dentro de uma demanda judicial, infelizmente não se avalia a
positividade ou negatividade em relação ao cuidado a esses pacientes.
O universo de médicos que pode acionar a Justiça, e a grande maio-
ria deles é desprovida desse conhecimento em relação às doenças raras,
pode impactar inadequadamente a questão do contexto do cuidado.
Sem sombra de dúvida, é preciso organizar as doenças raras no con-
texto, inclusive para deixar todo esse caminho e esse cuidado mais claro
inclusive no contexto da judicialização.
Outro aspecto fundamental a ser considerado é que, embora na
Europa existam algumas iniciativas em relação às doenças raras, com
exceção da França, não existe nenhum país com política de Estado espe-
cífica para doenças raras. E também na América Latina não há notí-
cia de política de Estado universal e gratuita, como o Sistema Único de
Saúde agora propõe, no contexto da atenção às doenças raras.
O Orphanet, portal que traz as informações do contexto em relação
às doenças raras e como tratá-las, informa mas não traz o contexto de
uma política, o contexto de uma linha de cuidado e de um acolhimento
apropriado. A política que o Sistema Único de Saúde traz hoje aos
senhores e às senhoras é a única política de maneira totalitária e pioneira
no contexto das doenças raras.
Repetir o que estava no Orphanet não teria sentido para a nossa
linha de cuidado e para o que é o Sistema Único de Saúde, pois seria
fazer o que já está sendo feito.
O portal serve e vai servir de apoio à nossa rede de serviços como
uma forma de consulta, no contexto das informações. Elas virão como
um reflexo e não para repetir o mesmo que acontece fora do Brasil.
Nesse processo, para determinar o tratamento, o risco de recorrên-
cia e a questão do risco específico em pessoa, nós traremos, nesse con-
texto da política de atenção às doenças raras, o contexto de rede, de
linha de cuidado, e não apenas de tratamento. Ofertaremos, sim, mais
acesso a diagnóstico e, como comentou o Deputado Romário, mais qua-
lidade. E qualidade é um ponto fundamental.
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Durante o ano foram realizadas mensalmente reuniões desse grupo
técnico e durante todo o ano pensou-se qual seria a melhor forma carac-
terística para acolher familiares e pacientes. E o ponto fundamental
dessa política foi, neste Brasil continental e heterogêneo, de que forma,
em cada região, nós poderemos, sim, ofertar qualidade e acesso às pes-
soas com doenças raras e seus familiares.
Não podemos, em hipótese alguma, pautar-nos apenas no trata-
mento, porque, no contexto de doenças raras, se nós tivéssemos de hoje
para amanhã cem doenças tratadas, cem doenças com protocolos, sig-
nificaria tratarmos apenas 1,25% das doenças raras. E dessa lógica o que
importa no contexto da política pública é acolher e gerar uma rede de
cuidados com serviços e centros de referências em doenças raras e gerar
essa informação.
É essa política que trago aos senhores e às senhoras hoje. Foi em
relação a esse trabalho que o Ministério da Saúde, no ano passado,
esteve aqui e se comprometeu. E hoje esse trabalho se apresenta como
produto e resultado para a saúde pública brasileira, para a população e
para os pacientes com doenças raras e seus familiares.
Esse é o grande salto. E o SUS escreve hoje uma nova página em
relação às doenças raras no mundo.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. APRESENTADOR (David Rayol) - Nós agradecemos a pre-
sença e participação nesta cerimônia de abertura do Sr. Deputado José
Stédile.
Agora, com a palavra, o Sr. Senador Eduardo Suplicy.
O SR. SENADOR EDUARDO SUPLICY - Querido Deputado
Federal Romário, é muito importante a iniciativa de V.Exa. Eu tenho me
aproximado bastante da causa. Percebo que o auditório está bem mais
lotado do que no ano passado. Isso quer dizer que as pessoas que têm
contribuído para a conscientização do problema, inclusive V.Exa., estão
conseguindo algo muito significativo.
Quero cumprimentar o Sr. José Eduardo Fogolin, os Senadores Cás-
sio Cunha Lima e Ana Amélia, os Deputados Federais Maurício Quin-
tella e Mara Gabrilli, que muito têm se empenhado, a Deputada Rosinha
da Adefal e o Deputado Marçal Filho, o Sr. Dirceu Barbano, Diretor-Pre-
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| 39Dia Mundial das Doenças Raras
sidente da Anvisa, que muito se tem interessado por este tema, e o caro
ator Luciano Szafir, que, com sua irmã Alexandra Szafir, tem ajudado
nesta causa, o Deputado Distrital Joe Valle, Deputado Beto Albuquer-
que, Líder do PSB, e os queridos Deputados Federais aqui presentes.
Apresentei — sobretudo através de pessoas que me chamaram a
atenção para as doenças raras, como aquelas do Instituto Baresi, coor-
denado por Adriana de Abreu Magalhães Dias e Marcelo Seiko Higa,
em Brasília, e no diálogo sobre essas questões com Rogério Lima Bar-
bosa, Presidente da Associação MariaVitória, e fruto da sensibilização
recebida no Instituto Baresi — três matérias legislativas sobre o tema.
A primeira é o Projeto de Lei nº 159, de abril de 2011, que institui o
último dia do mês de fevereiro como o Dia Nacional de Doenças Raras.
Essa proposição encontra-se na Comissão de Educação do Senado
aguardando que se marque uma audiência pública para a instrução do
projeto.
A segunda é o Projeto de Lei nº 711, de novembro de 2011, que ins-
titui a Política Nacional de Proteção aos Direitos da Pessoa com Doença
Rara. Foi distribuída para análise da Comissão de Assuntos Sociais e da
Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa, sendo termi-
nativa nesta última. Depois poderá vir para a Câmara dos Deputados, se
ali aprovado. O PLS 711, de 2011, encontra-se com o Relator designado
pela Comissão de Assuntos Sociais, Senador Paulo Bauer, desde março
de 2012.
A terceira matéria é o Projeto de Lei nº 231, do Senado, de agosto
de 2011, que cria o Fundo Nacional de Pesquisas para Doenças Raras e
Negligenciadas. Foi distribuída para a instrução de três Comissões do
Senado: Ciência e Tecnologia, Assuntos Sociais e Assuntos Econômicos,
sendo terminativa nesta última.
No momento, a propositura, que já teve parecer pela aprovação na
forma de emenda substitutiva da Comissão de Ciência e Tecnologia,
está na Comissão de
Assuntos Sociais aguardando designação do Relator.
É interessante destacar que uma doença rara é uma patologia
que ocorre com pouca frequência, em geral, na população. Para ser
considerada rara, cada doença específica não pode afetar mais de um
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número limitado de pessoas na população. Na Europa, a definição para
doenças raras abarca as que atingem um em cada 2 mil cidadãos. Nos
Estados Unidos, são consideradas raras as doenças que atingem menos
de 200 mil indivíduos. No Japão, a definição jurídica de uma doença
rara é a que afeta menos de 50 mil pacientes ou cerca de uma em 2.500
pessoas.
Individualmente, cada uma das patologias tidas como raras com-
promete menos de uma em cada duas pessoas, mas é preciso salientar:
há mais de 5 mil doenças raras identificadas. A etiologia das doenças
raras é diversificada. A grande maioria delas é de origem genética, mas
doenças degenerativas, autoimunes, infecciosas e oncológicas também
podem originá-las. Apesar das dificuldades causadas pelas doenças
raras, inúmeras pessoas com essas doenças prestaram e prestam gran-
des contribuições para a humanidade. Como exemplo, cito o Presidente
John Fitzgerald Kennedy, com a doença de Crohn; o físico Stephen
Hawkings, com esclerose lateral amiotrófica; o músico Seal, com lúpus
infantil; o ator Michael J. Fox, com a doença de Huntington; o meda-
lhista olímpico Doug Herland, com osteogênese imperfeita; e a aviadora
Jessica Cox, que, com uma doença congênita, nasceu sem os braços.
As sequelas causadas pelas doenças raras são responsáveis pelo sur-
gimento de cerca de 30% das deficiências. A dificuldade no tratamento
médico começa na falta de um mapeamento nacional dessas pessoas. A
baixa incidência das doenças raras no Brasil, quando comparada com
outros países, leva à suspeita de que muitos casos simplesmente não são
diagnosticados, em especial em regiões historicamente não incluídas,
relativamente mais pobres, como Norte e Nordeste.
Dados internacionais apontam que a mortalidade infantil entre pes-
soas com doenças raras chega a 30% em países desenvolvidos. Este per-
centual pode ser ainda mais alto no Brasil, uma vez que essas crianças
não recebem o tratamento adequado.
Dados concretos embasariam o desenvolvimento de uma aborda-
gem coerente das necessidades dessa parcela da população.
Estudos recentes da EURORDIS, organização que auxilia pessoas
com doenças raras na União Europeia, compararam dados de oito
doenças raras em 17 países europeus, num universo de 6 mil doentes e
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familiares, mostrando que 25% dos doentes inquiridos esperou de 5 a 30
anos entre o aparecimento dos sintomas iniciais e o diagnóstico defini-
tivo. Estima-se que, no Brasil, a dificuldade de diagnóstico e tratamento
seja ainda maior.
Eu vou respeitar o horário, Deputado Romário, e peço que depois
seja considerado na íntegra o meu pronunciamento, que também farei
da tribuna do Senado, em homenagem à sua inciativa. Passarei à última
página.
Eu falo aqui das ações do Ministério da Saúde, com relação às doen-
ças negligenciadas, lançadas em 2003, com o primeiro edital temático
em tuberculose, seguido pelos editais de dengue, 2004, e hanseníase,
2005. Em 2006, o Ministério implantou o Programa de Pesquisa e
Desenvolvimento em Doenças Negligenciadas e financiou 82 pesquisas,
com um investimento total de 22,3 milhões de reais.
Em 2008, financiou 58 projetos, mediante investimento conjunto
com o Ministério da Ciência e Tecnologia. Em 2012, anunciou a criação
da Rede de Pesquisas em Doenças Negligenciadas, com financiamento
de 20 milhões de reais.
No caso das doenças raras acontece situação parecida com o das
doenças negligenciadas, pois a decisão das indústrias farmacêuticas
de investir na pesquisa e na comercialização de produtos é largamente
influenciada pela demanda e, principalmente, pelo mercado poten-
cial. Com base nesse raciocínio, a indústria concentra a sua produção
em determinadas linhas de produtos, retirando do mercado drogas de
pouco consumo, utilizadas em doenças raras, de baixo retorno finan-
ceiro ou de preço controlado pelo governo, por ser o maior comprador,
tal como acontece com determinadas doenças endêmicas.
Drogas órfãs são medicamentos usados para o diagnóstico, pre-
venção e tratamento das doenças raras. Para que um medicamento seja
considerado órfão, são utilizados critérios epidemiológicos — baixa
prevalência ou incidência da doença em uma determinada população
— e econômicos — presunção de não rentabilidade do medicamento.
O incremento de investimentos em doenças negligenciadas no Bra-
sil, em face dos sucessos já obtidos, exige, agora, a instituição de meca-
nismos de financiamentos mais perenes, que também contemplem as
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doenças raras. Nesse sentido, a criação do Fundo Nacional de Pesquisas
para Doenças Raras e Negligenciadas, proposto pelo projeto que citei,
pode significar um importante avanço com vistas a ampliar o financia-
mento e o escopo das ações de pesquisa nessa área.
O fundo proposto funcionará sob as formas de apoio a fundo per-
dido ou de empréstimos reembolsáveis. As fontes de recursos incluem
doações, sendo permitidas doações para pesquisa de doença específica;
subvenções e auxílios de entidades de qualquer natureza, inclusive de
organismos internacionais; e reembolso das operações de empréstimo
realizadas por meio do fundo, a título de financiamento reembolsável.
Ademais, contará com recursos orçamentários — essa é a minha pro-
posta — anuais de 50 milhões de reais.
Com essas ideias, quero cumprimentar a Câmara dos Deputados e
principalmente o Deputado Romário pela realização deste seminário
em comemoração ao Dia Mundial das Doenças Raras e à Associação
MariaVitória pelo apoio ao evento.
Devemos todos nós prosseguir nessa luta para fazer valer para as
pessoas com doenças raras o princípo constitucional que assegura o
direito à saúde para todos.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. APRESENTADOR (David Rayol) - Este cerimonial cum-
pre o dever de informar que a Sra. Deputada Rosinha da Adefal, que se
encontra no dispositivo de autoridades, é Presidente da Frente Parla-
mentar da Pessoa com Deficiência e fará uso da palavra após as palestras
temáticas, conforme consta em nossa programação.
Neste momento tem a palavra o Sr. Diretor-Presidente da Agência
Nacional de Vigilância Sanitária — Anvisa, Dirceu Barbano.
O SR. SENADOR EDUARDO SUPLICY - Deputado Romário,
gostaria de entregar aqui, da Patrícia Krug, o livreto Carinhos d’Alma —
a Arte como Terapia. Ela é uma pessoa que tem doença rara mas que tem
conseguido um desenvolvimento notável com a sua arte.
Eu tenho alguns exemplares desse livreto. Eu vou pedir que sejam
distribuídos aqui para os membros da Mesa e para alguns da plateia,
mas são tantos que não haverá para todos. Perdão.
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O SR. DIRCEU BARBANO - Boa tarde a todos. Cumprimento o
Deputado Federal Romário. Parabenizo V.Exa. pela iniciativa de trazer
esse tema para dentro do Congresso Nacional, fazendo com que as auto-
ridades públicas de saúde possam — e devam — estar aqui presentes
para dialogar diretamente com a sociedade.
Eu gostaria de cumprimentar o Senador Eduardo Suplicy, Senador
do meu Estado, São Paulo, que no exercício diário do Parlamento con-
tribui com questões importantes sempre. Esta é uma delas. Quero cum-
primentar a Senadora Ana Amélia, em nome de quem cumprimento os
demais Senadores e Senadoras aqui presentes. Quero cumprimentar a
Deputada Federal Mara Gabrilli, que tive a oportunidade de conhecer
há pouco tempo. Nós nos encontramos com a possibilidade de intera-
ção entre os interesses do seu mandato e o trabalho que a Anvisa realiza.
Cumprimento Luciano Szafir, os familiares, os parentes de todos os por-
tadores de doenças raras e também os representantes de associações de
portadores dessas doenças.
Deputado Romário, quero dizer a V.Exa. que o dia 27 de fevereiro é
marcado na minha história, na minha vida, por duas coisas importan-
tes, e esse é um dia de uma dupla reflexão: primeiro, porque, nas minhas
atividades como gestor na área da saúde ao longo do tempo, no Minis-
tério da Saúde e agora na Anvisa, e como professor na universidade,
trabalhando com alunos, com pacientes, sempre convivi com o tema
das doenças raras, com os desafios de oferecer tratamento às pessoas
como algo do dia a dia; e, segundo, porque o dia 27 fevereiro é o dia
em que minha filha nasceu — completa hoje 16 anos. E todos nós que
somos pais, filhos, sabemos que nós temos muita dificuldade em lidar
com a doença do pai, da mãe, com a doença do filho, da filha e muito
mais dificuldade de lidar com aquelas doenças sobre as quais nós pouco
sabemos e que nós de uma coisa temos certeza, de que são doenças cujo
tratamento normalmente é difícil. É difícil, por vezes, porque nós não
aprendemos a lidar com tais doenças; é difícil, por vezes, porque a ciên-
cia ainda não ofereceu conhecimento suficiente sobre a doença para
que nós tenhamos remédios para melhorar ou para amenizar a dor das
pessoas; é difícil porque o sistema de saúde lida com um conjunto de
demandas e, por vezes, não consegue acolher de forma apropriada as
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pessoas que sofrem essas doenças. Então, o dia 27 de fevereiro é mar-
cado, para mim, sempre por essa dupla reflexão.
E acredito que se o projeto de lei do Senador Eduardo Suplicy for
aprovado, criando aqui no Brasil a obrigação de pararmos no dia 27
fevereiro, menos para comemorar, mais para refletir sobre o significado
e os desafios que essas doenças impõem, teremos certamente, daqui
para frente, um momento sempre oportuno para isso.
A Anvisa executa uma atividade que, perante o público aqui pre-
sente — Parlamentares, parentes de pessoas portadoras de doenças,
representantes de associações — é sempre uma atividade muito difícil
e muito complexa. Regular na área da saúde impõe decisões diárias, as
mais complexas e as mais difíceis todos os dias. Não é fácil lidar com o
conjunto de desafios impostos a todos nós e que implicam regulação.
De um lado, há a demanda por registros de medicamentos, muitos
dos quais importantíssimos, usados para tratamento de doenças de difí-
cil manejo, como essas doenças raras, produtos dos quais a ciência ainda
não desvendou todas as suas características de eficácia e de segurança;
há a responsabilidade de tomar a decisão de colocar ou não esses pro-
dutos no mercado; há a responsabilidade de pensar, de um lado, com a
cabeça de quem regula o mercado, mas, de outro lado, com a cabeça de
quem tem de oferecer acesso das pessoas às tecnologias, com a preocu-
pação de que essas tecnologias não gerem danos e, ainda mais, agravem
a saúde de todo mundo. E a Anvisa vive esse contexto diariamente, os
seus diretores, os seus gerentes, os seus técnicos.
Há desafios de se regularem questões complicadas. Há uma decisão,
tomada pela direção da Anvisa, que gera impacto na vida de mais de 20
milhões de brasileiros que são fumantes, de acabar com os aditivos que
atraem os jovens para o uso do cigarro. Houve uma primeira decisão
na Justiça barrando a norma da Anvisa. Ontem à noite, essa liminar foi
cassada e volta a valer a norma.
Nós sabemos que, aqui dentro do Congresso Nacional, há um pro-
jeto de decreto legislativo para anular essa norma da Anvisa, e nós vamos
continuar entendendo que a regulação na área do tabaco é importante
porque protege a vida das pessoas, porque evita que novas pessoas pas-
sem a ser viciadas em cigarro, principalmente os jovens do nosso País.
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| 45Dia Mundial das Doenças Raras
Temos uma briga com a questão da propaganda de alimentos. Per-
demos na Justiça essa semana a validade de uma norma que impunha
obrigações às empresas de alimentos para informarem pais e mães sobre
os elevados teores de sal e de açúcar nesses produtos. E a Justiça disse
que a Anvisa não pode fazer isso. Então, regular não é algo simples, não
é algo fácil.
No que se refere às doenças raras, eu trago, Deputado, primeiro uma
mensagem clara, que foi orientação do Ministro da Saúde Alexandre
Padilha: a Anvisa está e estará à disposição e tem trabalhado diaria-
mente para que nós tenhamos um ambiente menos difícil no manejo e
no tratamento dessas doenças.
Nós temos uma norma na Anvisa, de 2007, que está passando por
revisão agora, que prevê prioridade máxima na análise de registros de
produtos que são dirigidos a essas doenças. Isso é importante, porque
nós sabemos que diariamente são demandados à Anvisa registros de
milhares de produtos, e nós não podemos tratar coisas diferentes de
forma igual. Produtos que são de interesse para a saúde pública, nota-
damente aqueles que não têm disponibilidade de terapêuticas no mer-
cado, precisam ser tratados com prioridades. Já havia uma norma de
2007, que está sendo mudada agora. Isso vai ficar ainda mais claro nessa
norma, que concluiu a consulta pública agora. E, nas próximas semanas,
no máximo no próximo mês, essa nova norma estará já vigendo, e nós
vamos ter muito mais agilidade no registro de medicamentos para essas
doenças.
Outra questão importante é que nós temos uma discussão aberta,
em fase de conclusão, sobre o que nós chamamos de uso compassivo.
É uma metodologia e um modelo de regulação sanitária que permitem
que pacientes possam se utilizar de medicamentos que são estudados
para essas doenças raras ainda nas etapas mais preliminares dos estudos
clínicos — estudos em Fase II — que indiquem alguma possibilidade de
uso de produtos para doenças que não têm tratamento. A Anvisa vai ter
uma norma que facilita a inserção desses pacientes nos programas de
uso compassivo que as indústrias que pesquisam esses medicamentos
disponibilizam.
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46 | Romário • Deputado Federal
Por fim, Deputado, queria enaltecer e chamar atenção para a impor-
tância do Projeto de Lei nº 4.411, de 2012, de sua autoria, que trata da
importação de insumos para pesquisa no Brasil. De fato, nós temos
já um modelo que tem sido trabalhado pelo CNPq, pela Anvisa, pela
Receita Federal, com alguns resultados muito significativos para aquelas
pesquisas que acontecem sob a égide do CNPq. Nesses casos, no ano de
2012, mais de 99% dos produtos importados para pesquisa foram libe-
rados pela Anvisa em menos de 24 horas.
Nós temos o desafio de verificar como vamos fazer com as pesquisas
que muitas vezes são feitas fora do sistema de financiamento do CNPq.
E, aí, o seu projeto vai trazer para a lei algo que vimos produzindo ao
longo do tempo, criando obrigações para os órgãos públicos. Isso é
muito bom. E, mais do que isso — eu vi o projeto —, ele cria obrigações
e responsabilidades para os pesquisadores, porque muitas vezes, aqui no
Brasil, a necessidade de regulação ocorre porque nós nos acostumamos
a colocar toda a responsabilidade na mão do Estado e a tirá-la da mão
das pessoas que operam. Então, o projeto trata também de responsabi-
lizar os pesquisadores. Isso é fundamental, porque compartilha o papel
que o Estado tem de fazer, de evitar a entrada de produtos que possam
colocar em risco a vida das pessoas, com a responsabilidade dos pesqui-
sadores quando desenham o seu protocolo clínico e decidem incorporar
e usar pacientes como voluntários para suas pesquisas.
Sei que a Deputada Mara Gabrilli é a Relatora do projeto e já me
coloquei à disposição. Devemos ter uma reunião nos próximos dias
para debater o tema, porque a Anvisa dá todo o apoio ao projeto de
lei de sua autoria. Se precisar da Anvisa, nós estamos à disposição para
facilitar a tramitação e a aprovação. Nós só não votamos, mas nós pode-
mos ajudar.
Por isso é que eu estou aproveitando para chamar a atenção para
estas duas questões importantes que, aí, sim, os senhores votam: o
projeto de decreto legislativo que retira da Anvisa o poder de fazer a
regulação dos aditivos do tabaco — nós entendemos que a Anvisa não
extrapolou a sua competência legal e vamos ficar muito preocupados se
esse projeto de decreto for aprovado, porque vai recolocar no mercado
o cigarro com sabor de menta, sabor de canela, que mascara o gosto
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| 47Dia Mundial das Doenças Raras
ruim do cigarro e atrai o jovem para o vício —; e os projetos de lei que
tramitam aqui e que tratam de obrigar as empresas que fazem propa-
gandas de alimentos com altos teores de sal e de açúcar a informar para
nós, que somos pais e mães, que aqueles alimentos têm altos teores de
sal e de açúcar, para que possam ser chamadas as atenções devidas para
os problemas que esses produtos causam à saúde. Isto está nas mãos dos
senhores.
No que nós pudermos apoiar, em relação à questão da pesquisa clí-
nica, em relação a essas doenças, os senhores podem contar conosco.
Muito obrigado e parabéns pelo evento. (Palmas.)
(Apresentação de flash mob.)
(Palmas.)
O SR. APRESENTADOR (David Rayol) - Senhoras e Senho-
res, após esses momentos de descontração, nós gostaríamos de dar
prosseguimento ao evento, mais uma vez, pedindo aplausos ao Flash
Mob., esse grupo que esteve aqui à frente (palmas.), enriquecendo e
abrilhantando esse evento, assim como os demais presentes.
Vamos dar continuidade ao evento.
Em cumprimento a nossa programação, teremos, a partir deste
momento, as palestras temáticas.
Neste momento, convidamos a se dirigir a esta tribuna, para proferir
a palestra sobre As Particularidades da Pesquisa Clínica para Doenças
Raras, a Dra. Greyce Lousana, Presidenta Executiva da Sociedade Brasi-
leira de Profissionais em Pesquisa Clínica.
Esse cerimonial cumpre o dever de informar que o Senador Cás-
sio Cunha Lima, devido ao cumprimento oficial da agenda de trabalho,
precisou se retirar do recinto e nomeou para representá-lo à Mesa de
honra o jovem Patrick Teixeira Pires, ele que é portador de mucopolis-
sacaridose. Seja bem-vindo, Patrick. (Palmas.)
Senhoras e Senhores, com a palavra a Dra. Greyce Lousana.
A SRA. GREYCE LOUSANA – Muito obrigada. Nós estivemos
aqui no ano passado e é um prazer voltar a esta Casa. Parabéns a todos
os políticos da Mesa, Deputados e Senadores.
A ideia é que falemos um pouco de pesquisa e das particularidades
em se fazer pesquisa clínica em doenças raras. Quando falamos em fazer
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48 | Romário • Deputado Federal
pesquisa, a pesquisa clínica especificamente — estivemos há pouco com
o Presidente da Anvisa —, e pela manhã parece que houve alguma dis-
cussão nesse sentido, quero dizer que pesquisa clínica é uma coisa que
se faz não só com medicamento. As pessoas têm insistido nisso, e nós
insistimos bastante, ou seja, pesquisa clínica é uma coisa que se faz para
medicamentos, para cosméticos, para procedimentos, para produtos
para a saúde. Então, nós fazemos pesquisa com tudo aquilo que estará
sujeito à vigilância, mas também com outras ações, por exemplo, na
parte de comportamento, na parte de procedimentos.
Então, pesquisa clínica é uma coisa bastante ampla. Nesse sentido,
além de fazer pesquisa com muitas coisas, o grande objetivo de todos é
a qualidade de vida. Ninguém faz pesquisa porque quer fazer pesquisa
para nada. Queremos fazer pesquisa porque de alguma forma queremos
contribuir com a qualidade de vida das pessoas.
Um dado importante, quando falamos em doenças raras, mostra
que o mundo hoje conduz 141 mil estudos. Dos 141 mil estudos que
estão sendo conduzidos no mundo, o Brasil consegue fazer só 3.200 des-
sas pesquisas. O Brasil faz muito pouca pesquisa frente ao potencial que
nós teríamos para conduzir mais estudos.
Com relações às doenças raras, no Brasil nós temos hoje cadastra-
dos, numa base de dados internacionais, só 16 estudos sendo conduzi-
dos. Isso é muito pouco se imaginarmos o contingente de pessoas aco-
metidas por doenças raras. Seguramente, o Brasil poderia fazer muito
mais pesquisa do que fazemos hoje.
Nesse sentido, o que precisamos para fazer pesquisa? Primeiro, pre-
cisamos de conhecimento. Não é fácil fazer pesquisa clínica. As pessoas
imaginam... Inclusive, uns dos grandes problemas no Brasil, hoje, são
as incubadoras financiadas muitas vezes por empresas privadas e pelo
governo. Esses meninos que estão nessas incubadoras de grandes ins-
tituições universitárias desenvolvem pesquisas durante 1 ano, 2 anos,
3 anos, 4 anos. No momento em que eles terminam suas pesquisas e
tentam fazer o registro desses produtos originários nessas incubadoras,
eles não conseguem registrar porque descobrem que não fizeram pes-
quisa clínica ou não fizeram um planejamento adequado para conseguir
registro para essas pesquisas.
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| 49Dia Mundial das Doenças Raras
Temos tentado discutir com o pessoal das incubadoras que esses
jovens precisam ser melhores orientados. Eles precisam conhecer as
regras para não perder dinheiro que está sendo investido nessas incu-
badoras e em muitas empresas, e depois esses estudos não conseguem
seguir por falta de conhecimento.
Para fazer pesquisa, eu preciso de recurso, mas não é só de dinheiro.
Sempre que falamos de recursos, as pessoas pensam: vocês querem
dinheiro. Não necessariamente. Não queremos só prédio bonito. Que-
remos equipe treinada. Treinamento é alguma coisa que não se faz em
um dia, treinamento é uma coisa continuada. Demora muito para for-
mar um pesquisador.
Às vezes, as pessoas não têm ideia do tempo que se leva não para
formar um médico, mas um médico que saiba fazer pesquisa. Não são
todos os médicos que são bons pesquisadores, assim como não são todos
os farmacêuticos que são bons pesquisadores. Formar um pesquisador é
alguma coisa que demanda muito tempo.
Evidente que precisamos de estrutura física, estrutura de equipa-
mento. Hoje visitamos serviços que se dizem serviços que conduzem
pesquisas em doenças raras que são, do ponto de vista sanitário, lamen-
táveis, não teriam condições sequer de fazer assistência, quanto mais de
conduzir pesquisa.
Do que mais precisamos? Precisamos de regulatório, precisamos
da Anvisa, mas também precisamos de um ambiente ético. Há um ano
estivemos nesta Casa, e uma coisa me preocupa: várias pessoas da Mesa,
o representante do ilustríssimo Ministro da Saúde disse que durante
o último ano trabalharam muito num grupo de discussão e que será
colocada em consulta pública uma norma que seguramente vai fazer do
Brasil um País diferente com relação às doenças raras. O Presidente da
Anvisa disse que existe uma norma que deve ser colocada em prática,
que fala sobre acesso expandido, sobre uso compassivo. O que me pre-
ocupa é que existem consultas públicas, existem normas, mas elas ainda
não estão funcionando.
Com relação a acesso expandido e uso compassivo, essa norma é
uma consulta pública de 2011, foi amplamente discutida, mas até hoje
não saiu do papel.
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Livro de Romário sobre Doenças Raras
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  • 1. Câmara dos Deputados ROMÁRIO Deputado Federal Dia Mundial das Doenças Raras 2013 Ação do Deputado Federal Romário na Câmara Federal. Centro de Documentação e Informação Coordenação Edições Câmara Brasília – 2013 03345.indd 1 26/07/2013 09:29:34
  • 2. CÂMARA DOS DEPUTADOS 54a Legislatura – 3a Sessão Legislativa SÉRIE SEPARATAS DE DISCURSOS, PARECERES E PROJETOS No 21/2013 03345.indd 2 26/07/2013 09:29:34
  • 3. Sumário Apresentação   5 O Raro em um dia de conscientização mundial  7 Questões Bioéticas sobre Doenças Genéticas Raras  17 Para um começo de reflexão sobre o cuidado das Doenças Raras  25 Notas taquigráficas do Dia das doenças Raras 2013  29 03345.indd 3 26/07/2013 09:29:34
  • 5. | 5Dia Mundial das Doenças Raras Apresentação Você recebe em suas mãos o resultado de um dia de ação que foi realizado na Câmara dos Deputados, em fevereiro de 2013. Ao ler as notas taquigráficas poderá perceber o quanto o momento foi permeado de palavras fortes, incisivas e urgentes. Palavras que pos- suem esta característica são formuladas somente quando o sentimento de urgência e de abandono de toda e qualquer ajuda coexistem. O tema que apresento, doenças raras, é novo para mim. E corro o risco de dizer, sem medo de errar, que o é para muitos de nós. Quando comecei a me interar sobre o assunto, devido a procura inicial do Sr. Rogério Lima Barbosa, percebi que a angústia desse pai não era uma exclusividade e mais de 15 milhões de famílias brasileiras poderiam sofrer do mesmo sentimento de abandono do Estado e descriminação da sociedade. Por isso, comecei a dedicar-me a apoiar as pessoas com doenças raras. Em 2012 e 2013 fiz questão de promover o Dia das Doenças Raras no maior auditório da Câmara dos Deputados, o Nereu Ramos. Ainda não temos a tecnologia para repassar os sentimentos mas ao ler as notas que serão apresentadas aqui, você poderá sentir um pouco da emoção que eu e mais de 700 pessoas sentimos no dia 28 de fevereiro de 2013, quando a voz do povo se fez presente em sua casa. Além das notas taquigráficas, apresento três textos que buscam cla- rear a realidade de quem convive com as doenças raras. O primeiro texto, escrito pelo amigo Rogério Lima Barbosa, divulga a origem do Dia das Doenças Raras, seus objetivos, avanços conseguidos em nosso país, embasa a necessidade de transformação do olhar para o paciente e, por fim, defende a criação de um programa para doenças 03345.indd 5 26/07/2013 09:29:34
  • 6. 6 | Romário • Deputado Federal raras, dentro do Ministério da Saúde, capaz de gerar as informações necessárias e suficientes para toda a população brasileira. O prof. Dr. Natan Monsores, do departamento de saúde coletiva da Universidade de Brasília, centra sua discussão na importância da pes- soa e como são afetas a biociência. O professor ainda esclarece que as pessoas que convivem com alguma doença rara, na concepção do outro, acabam se tornando invisíveis às outras pessoas, intocáveis nas relações sociais e incapazes por precisarem de tecnologias assistivas. Por fim, aborda que a informação é o grande entrave das pessoas que convivem com essa realidade. Dentro da perspectiva de um problema vivido nos mais diferentes países, a prof. Dra. Sílvia Portugal, da Universidade de Coimbra - Por- tugal, contribui com um texto que esmiúça o conceito de raro onde a pessoa ou o paciente deve se tornar agente ativo e ouvido por qualquer interessado na temática. Esclarece que o volume de ações que vem acon- tecendo em nosso país o coloca como referência na América Latina. Ao conhecer os textos percebi que a geração de informação é a linha estrutural que os une. A publicação desses trabalhos é uma forma de gerar informação sobre as doenças raras. E, também, um mecanismo que utilizo para cumprir a minha função parlamentar de ouvir e atender as demandas que me chegam. Com muito orgulho entrego esse material à toda sociedade brasi- leira que, até onde fui informado, é o primeiro a possuir o olhar especí- fico sobre o envolvimento social e as doenças raras em nosso país. Que ele seja a inspiração de muitas outras ações que virão pela frente que, com certeza, estarei disposto a defender e apoiar. ROMÁRIO Deputado Federal 03345.indd 6 26/07/2013 09:29:34
  • 7. | 7Dia Mundial das Doenças Raras O Raro em um dia de conscientização mundial Rogério Lima Barbosa Mestrando em sociologia pela Universidade de Coimbra Diretor Presidente da Associação AMAVI rogeriolima@amavi.org O Dia das Doenças Raras (DDR), celebrado no último dia de feve- reiro, é uma iniciativa da Eurordis1 que desde 2008 promove uma ação de sensibilização nos mais variados países. Em sua primeira edição aconteceu em 18 países. Cinco anos após o seu início, em 2013, sob o tema “Doenças Raras sem Fronteiras”, o DDR chega em mais de 70 paí- ses e em todos os continentes. Seguramente, um crescimento de 394% somente pode acontecer nas mais variadas formas porque existe uma necessidade comum e, principalmente, um problema a ser resolvido por toda a sociedade. O tema do DDR para 2013 leva à comunidade a importância do trabalho e atuação em rede para o atendimento a pessoa com alguma doença rara. Os seus organizadores consideram que por se tratar de poucas pessoas (em números relativos) e, principalmente, por haver pouco tratamento disponível, somente pelo esforço conjunto e inte- grado pode ser possível atender os pacientes e suas famílias2 . 1  Europe Rare Disease, www.eurordis.org, associação de pacientes que atua no desen- volvimento de políticas públicas para Europa e realiza diversos estudos para conhecer as comunidades que convivem com alguma doença rara. Atualmente, se posiciona como uma fonte de dados estatísticos sobre esse tema, sendo reconhecida por associações de pacientes, pesquisadores e agentes públicos. 2  A Eurordis mantém um espaço contínuo na internet para divulgar o DDR. As in- formações sobre os temas, slogans, fotos, vídeos de sensibilização e todo material de divulgação podem ser encontrados em http://www.rarediseaseday.org/ 03345.indd 7 26/07/2013 09:29:34
  • 8. 8 | Romário • Deputado Federal As ações promovidas pelo evento possuem grande foco na sensibili- zação e comunicação de uma realidade que, ainda como base os estudos da Eurordis, atinge de 6% a 8% de toda população. Trazendo as estatís- ticas para nossa realidade e considerando o censo de 2010 são 13 a 16 milhões de famílias brasileiras que sofrem com as restrições impostas pelas doenças raras. Em busca de uma identidade visual comum, o DDR possui uma figura característica criada pela superposição de três mãos onde, no meio, percebe-se a figura de uma pessoa ou criança3 . Desta maneira, a Eurordis incentiva a criação de banners, camisas, braceletes, bottons e todo o tipo de material de divulgação com essa figura. Importante res- saltar que não há qualquer forma de incentivo financeiro, por parte da Eurordis, para realização do evento. Com o propósito de criar uma identidade específica para o DDR e considerando outras ações que a associação promove, como a proposi- ção de políticas públicas, realização de pesquisas, formação de parcerias e criação de redes de apoio, recorrendo a Boltanski quando aborda a cité de projetos4 , a Eurordis atua como um mediador tanto na formação das redes como, também, no incentivo para que outras organizações se tornem mediadores em sua própria região. “Esta cité apoia-se na atividade do mediador que lança as mãos na formação das redes, de maneira a dotar-lhe de um valor próprio, inde- pendente dos objetivos procurados e das propriedades fundamentais das entidades entre as quais a mediação se realiza. Nesta perspectiva, a media- ção é um valor em si mesmo, ou melhor uma grandeza específica da qual qualquer ator se pode fazer valer quando põe em relação, estabelece laços e contribui por seu intermédio para tecer redes.” (Boltanski, n.d.) 3  Considerando que 80% das doenças raras são de causa genética, há uma grande in- fluência da biotecnologia sobre esse ambiente. A criação da identidade promovida pela Eurordis somado, principalmente, a influência da biotecnologia faz com que, conforme abordado pelo prof. Dr. Arriscado Nunes, se crie “novas formas de divisão e classifi- cação social ou, mais precisamente, biosocial, em função da pertença a certos grupos caracterizados pelos seus perfis genéticos.” 4  O termo cité por projetos é uma analogia com a literatura dos anos 90 relacionado as organizações por projetos. Por analogia o autor conclui que existe uma organização geral da sociedade por projetos. 03345.indd 8 26/07/2013 09:29:34
  • 9. | 9Dia Mundial das Doenças Raras Posta a grande influência da Eurordis na realização do DDR, sua articulação com as associações e interessados nos mais diferentes países e o incentivo para formação dos agentes mediadores locais, podendo até ser de maneira involuntária, voltamos o foco de nossa atenção para os acontecimentos em nosso país. No Brasil, de acordo com o blog Deficiente Alerta5 , a primeira ação relacionada ao DDR aconteceu em São Paulo, em 2010, por meio do evento 1º Caminhada de apoio aos pacientes com doenças raras. Con- forme as informações do blog a organização dessa atividade ficou ao cargo da Fundação GEISER, Grupo de Estudos de Doenças Raras , Ins- tituto Canguru, Aliança Brasileira de Genética e FOPPESP –Com apoio de Secretaria Municipal da Pessoa com Deficiência e Mobilidade Redu- zida e Subprefeitura Santana Tucuruvi. A partir do final de 2010, em Brasília, inicia a execução de uma série de atividades realizadas pela Associação AMAVI, de atenção aos fami- liares e pacientes com doenças raras, que busca atingir a sociedade nos mesmos moldes da Eurordis. Em 2011, como primeiro evento dessa associação, aconteceu no Clube da Associação dos Servidores do Banco Central, sob o slogan Porque Raro é ser IGUAL!!! - Nossa Ação Afirmativa!, o 1º Dia das Doenças Raras que contou com a participação de 300 pessoas dentre parlamentares, pesquisadores, pacientes e familiares de pessoas com alguma doença rara. Deste evento, foi formada a primeira diretoria da AMAVI com pessoas que tinham em comum apenas a convivência com a realidade das doenças raras por meio de um familiar, filho, pai ou a própria pessoa. A história de criação da AMAVI não faz parte do escopo desse trabalho sendo assunto de outro texto6 . Aqui serão abordadas, não de maneira profunda, as questões no contexto do DDR, articulado 5  A primeira informação sobre realização do evento consta desse blog. O blog possui uma postagem que sinaliza ser o release do Dia das Doenças Raras. http://deficientealer- ta.blogspot.com.br/2010/02/primeira-caminhada-de-apoio-ao-paciente.html 6  As motivações que me levaram a criar a AMAVI, as ações realizadas para mobiliza- ção e análise das redes criadas a partir de sua criação podem ser encontradas no artigo Uma análise sobre a teoria das redes – O caso da AMAVI, publicado pela Universidade de Coimbra, na séria Oficina do CES sob o n. 386, em julho de 2012. 03345.indd 9 26/07/2013 09:29:34
  • 10. 10 | Romário • Deputado Federal e promovido pela associação, uma vez que reforçaram o processo de mudança no Brasil que, antes de 2012, era realizado de maneira local. Em 2012 e 2013, com o apoio do Deputado Romário Farias e arti- culado pela AMAVI, o DDR aconteceu dentro do Congresso Nacional, no Auditório Nereu Ramos da Câmara dos Deputados, considerado o maior auditório do local, com aproximadamente 300 lugares. Esse evento foi motivador para o início de uma visão realmente efetiva para realidade das doenças raras em nosso país. Pessoalmente esse tema é de extrema importância porque fui envol- vido por uma questão familiar e sou um dos fundadores da Associação AMAVI. O diagnóstico de Neurofibromatose mudou todo o meu enten- dimento sobre a vida e a associação foi a forma encontrada por mim, e por outros que passam pela mesma situação, de demonstrar à sociedade a realidade de exclusão que invade a nossa vida e que muitos ainda acre- ditam que nunca acontecerá em casa. Devido a grande influência da maneira de pesquisar do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, esse texto tem o objetivo de divulgar a ação ainda quando faz sentido no contexto histórico que se encontra. Desta maneira se enquadra dentro da perspectiva do inves- tigador militante7 . O evento realizado em 2012, sob o tema um Dia Raro, aconteceu sob o apoio de muitos parlamentares e contou com a participação de, aproximadamente, 600 pessoas circulantes. Nesse evento, as Associa- ções de Pacientes com doenças raras organizaram um Manifesto8 que foi entregue nas mãos do Ministro da Saúde (MS), Sr. Dr. Alexandre Padilha. Dentre as diversas solicitações do Manifesto, houve um grande enfoque para geração de informação uma vez que definições básicas, 7  O investigador militante, conforme o prof. Dr. Boaventura Souza Santos em palestra proferida no III Colóquio dos Doutorandos do CES, em novembro de 2012, na Uni- versidade de Coimbra, deve atentar para não fazer da divulgação da prática social uma publicação de “jornal velho” uma vez que corre o risco de perder o seu potencial de apoiar os movimentos sociais com saberes relativos a realidade que se encontram dentro do espaço histórico que favoreça a mudança requerida pela sociedade. 8  O manifesto bem como o relatório de atividades do evento pode ser encontrado no site da AMAVI, www.amavi.org, ou encaminhado por email, amavi@amavi.org 03345.indd 10 26/07/2013 09:29:34
  • 11. | 11Dia Mundial das Doenças Raras como o entendimento pelo MS sobre a identificação de doenças raras, não existia. Também foram listados os principais problemas que aco- metem as pessoas que convivem com alguma doença rara e, por isso, faz possível a convergência do diálogo entre as diversas associações de pacientes: Falta de um diagnóstico preciso: É comum que as pessoas com suspeitas de alguma doença rara percorra longos caminhos em toda a rede de atendimento até conseguirem um diagnóstico conclusivo de sua condição; Falta de tratamento: Devido à característica de acometer uma pequena parcela, em números relativos, muitas doenças não possuem o tratamento específico e tampouco a medicação. A discussão sobre a medicação será melhor abordada mais adiante; Falta de informação: A informação não existe tanto para o profis- sional de saúde, que não consegue identificar as doenças e quando o faz tem grandes dificuldades de saber para onde encaminhar o paciente, quanto para o próprio paciente que não sabe onde encontrar os especia- listas para o acompanhar. De acordo com pesquisa mantida pela AMAVI, em sua página ini- cial, 58% das pessoas que responderam a enquete: Em sua opinião, qual a situação que possui o maior impacto negativo para quem convive com alguma doença rara: A falta de informação ou a falta de tratamento?, até julho de 2013, indicaram que a primeira opção é o maior problema. Informação precisa e acessível é um princípio básico de comunica- ção. A sua falta gera uma angústia que, no campo da saúde, gera uma pergunta individual que, muitas vezes, não há resposta: O que está acontecendo comigo ou com a pessoa que eu amo? Em específico as doenças raras, o paciente e seus familiares, acabam assumindo a tarefa de conseguirem, sozinhos, as respostas das questões que lhes assolam. Um dado exemplar dessa tarefa pode ser observado na pesquisa realizada por Schneiders, em 2011, em uma das declarações de seus entrevistados: Assim que eu soube que meu filho tinha Neuro- fibromatose eu comecei a pesquisar e descobri que pouca gente sabia da doença e hoje em dia eu consigo saber mais do que alguns médicos. 03345.indd 11 26/07/2013 09:29:34
  • 12. 12 | Romário • Deputado Federal O paciente especialista, como abordado, dentre outros, por Made- laine Akrich, João Arriscado Nunes, Florence Paterson e Vololona Rabehariosa, faz parte da nova configuração que as associações de pacientes de doenças raras se apresentam. Esses pacientes assumem não só a responsabilidade de entender a doença e toda a nova realidade que se apresenta a sua frente como, também, iniciam o trabalho de movi- mentação social para criar políticas públicas que, efetivamente, modi- fiquem a estrutura equivocada, quando não ausente, que se encontra disponível para eles. Atualmente existe o pensamento fincado no entendimento que a doença é sinônimo de falta de saúde e que o remédio é a sua única solu- ção. Longe de adentrarmos nos acalorados debates sobre o que é saúde, por agora, direcionamos o nosso entendimento somente para a conclu- são que o modelo atual, do ambiente de doenças raras, é centrado na medicação. Contudo, o evento realizado em 2012 trouxe a necessidade de mudar essa percepção. Somente uma pequena parte das mais de 6 mil doenças raras – por volta de 3% a 8% - possuem algum tipo de medicação. Isso faz com que mais de 90% das outras doenças, muitas vezes menos raras que as que possuem medicação específica, deixem os seus pacientes mais distantes de um tratamento eficaz. Se de um lado as indústrias far- macêuticas primam pelo modelo econômico da garantia do lucro, com o discurso que o baixo número de potenciais vendas não justifica os custos envolvidos para o desenvolvimento das medicações, por outro, esse argumento naufraga quando percebe-se um grande esforço para o desenvolvimento das medições para as chamadas doenças ultra-raras. No mesmo sentido e com argumentos diferentes, o governo insiste em não desenvolver pesquisas que possam conhecer a realidade das pes- soas que convivem com alguma doença rara e, portanto, não consegue gerar dados e ferramentas suficientes que possam justificar o desenvol- vimento da medicação, quando necessária, e desenvolver políticas de atendimento para essa população. Como o discurso, até dentro da academia, possui um grande viés mercantil, é importante haver uma mudança do modelo da medicação, onde o paciente é apenas um ponto dentro de tantos interesses, para o 03345.indd 12 26/07/2013 09:29:34
  • 13. | 13Dia Mundial das Doenças Raras da qualidade de vida onde toda e qualquer ação para essa comunidade tem origem nas demandas do paciente e os resultados são direcionados para melhoria de sua qualidade de vida sob o forte envolvimento das associações de pacientes. Ainda não é possível encontrar publicações robustas que envolvam as doenças raras no olhar social. Por isso, o modelo acima não tem mais que a intenção de ser apenas um ponto de partida na discussão sobre o que, hoje, sinaliza existir. O resultado concreto do evento de 2012 foi a formalização, pelo Ministro da Saúde, de criar um Grupo de Trabalho dedicado as doenças raras. Em 2013, o dia das doenças raras começa a delinear os contornos de controle social. Além de aumentar significativamente a quantidade de pessoas e ações envolvidas, o evento conseguiu mobilizar vários estra- tos da população e de diferentes locais de atuação. A participação de um maior número de palestrantes fora da área da saúde e o início da parce- ria da AMAVI com o Departamento de Saúde Coletiva e o da Cátedra UNESCO de Bioética da Universidade de Brasília, começam a levar a discussão para o campo social e não mais centrado na medicação, saúde e poder médico. A ausência do Ministro da Saúde ou melhor, a sua participação por meio de representação, foi sentida por todos os presentes e fez com que o evento se tornasse, essencialmente, de cobrança. Tanto os parlamentares quanto os representantes de associações, pacientes e comunidade em geral, lembraram ao Mistério da Saúde que, após um ano do compromisso assumido pelo Ministro Padilha, a reali- dade de atendimento aos pacientes não havia mudado e a portaria pro- 03345.indd 13 26/07/2013 09:29:35
  • 14. 14 | Romário • Deputado Federal metida para ser criada pelo grupo de trabalho ainda não estava publi- cada e, muito menos, disponível para consulta pública. O evento de 2013 reforça o entendimento social sobre o tema e impulsiona o Brasil para um novo patamar de discussão sobre as doen- ças raras. Tanto que no Congresso Mundial para discussão sobre medi- camentos órfãos9 , realizado nos EUA, houve a participação do Presi- dente do Conselho Federal de Medicina e dos parlamentares Senador Eduardo Suplicy e Jean Wyllys. Ainda, em março de 2013, a Interfarma, Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa, realiza o seminário: “Doenças Raras: a situação brasileira no contexto global e a necessidade de implantação de uma política nacional”. E, no mês seguinte, publica o documento Doenças Raras: Contribuições para uma política nacional10 . Outra alteração no cenário, inclusive das associações de pacientes, foi o perceptível aumento do volume de empresas e até associações de outros países em procurar as associações de pacientes brasileiras. O grande volume de atividades no ambiente das doenças raras demonstra o aumento crescente do tema e de sua importância para comunidade. Ainda em 2013 como um dos resultados do DDR, a AMAVI realiza em Brasília, o I Congresso Iberoamericano de Doenças Raras que visa inserir o Brasil, definitivamente, como protagonista no campo das doenças raras e promover a mudança de percepção sobre as associações de pacientes: de carentes de atenção e cuidados para asso- ciações fortes e verdadeiras conhecedoras de sua realidade. É, no que diz o prof. Boaventura, respeitar a ecologia dos saberes. Ainda previsto para outubro de 2013, o Ministério da Saúde vai publicar a portaria de atendimento aos pacientes de doenças raras.11 9   O congresso é voltado para o desenvolvimento de pesquisas e medicação. A propos- ta de participação brasileira era baseada em como poderia haver uma interação entre o governo e a indústria para criar um ato dos medicamentos órfãos, como no modelo estadunidense. O link para essas informações é http://www.terrapinn.com/conference/ world-orphan-drug-congress-usa/index.stm 10   Informações disponíveis em http://www.interfarma.org.br/ 11  A portaria foi em consulta pública no dia 11-4-2013 sob o número de consulta pública n. 7 e a reunião do Grupo de Trabalho para analisar as contribuições ocorreu no final do semestre. 03345.indd 14 26/07/2013 09:29:35
  • 15. | 15Dia Mundial das Doenças Raras As ondas produzidas pelos dois eventos que aconteceram no Con- gresso Nacional ainda são sentidas e estão em formação. O fato é que seguimos para uma nova realidade de atuação e ação, onde os atores presentes no campo das doenças raras devem, como levantado por Mouffe e citado por Martins, reconhecer o opositor não mais como um inimigo mas como um adversário cuja existência é legítima. O ano de 2014,diante de tanta ação em 2013, será de grande novi- dade para quem convive com as doenças raras, inclusive, para avaliar a implantação da portaria que está em elaboração no Ministério da Saúde. As associações, pacientes, familiares e todas as pessoas envolvidas com essa temática estarão realizando as ações necessárias para uma constru- ção efetiva e de real atendimento, porque como abordado por diversos autores, a longo prazo, as ações do governo acabam se alinhando com os interesse do próprio mercado. O presente texto não foge da pretensão informada anteriormente de apenas contribuir para um olhar mais profundo e que promova o conhecimento de uma realidade que apesar de envolver 6% a 8% da população, contribuiu, não de maneira exclusiva, para o aumento do gasto federal com processos judiciais, entre 2007 e 2011, em mais de 1200%. Chegando a R$ 339,7 milhões de reais até outubro de 201212 . E mesmo assim, continua a receber menos atenção e recursos que doen- ças que atingem até 700 mil brasileiros13 , como é o caso do programa da Aids. Logicamente, não é intenção promover a área que milito em detri- mento de outra. O dado somente é relevante se percebermos a importân- cia de se criar um programa que, como o da AIDS, comece a conhecer e entender a sua própria realidade para, quem sabe, chegar nos mesmos patamares de qualidade de atendimento e geração de informação que esse programa fornece para a sociedade. 12  http://portalsaude.saude.gov.br/portalsaude/noticia/8579/671/noticia-da-folha-de- -s.-paulo-destaca-gasto-recorde-com-acoes-judiciais..html 13  De 1980 a 2012 foram registrados 656.701 casos registrados de AIDS. http://www. aids.gov.br/pagina/aids-no-brasil 03345.indd 15 26/07/2013 09:29:35
  • 16. 16 | Romário • Deputado Federal REFERÊNCIAS BALANCO, P. e PINTO, E. C. Dimensões do capitalismo contemporâneo: alguns aspectos do debate acerca do Estado-nação e do “novo imperialismo”. XXXIII Encontro Nacional de Economia. 2005 BOLTANSKI, L. (n.d.). A moral da rede? críticas e justificações nas recentes evolvuções do capitalismo.pdf. Fórum Sociológico. Forum Sociológico, n.o 5/6 (2o Série). MARTINS, P. H. O dom como fundamento de uma cultura democrática e associativa. In: PORTUGAL, Sílvia; MARTINS, Paulo Henrique (Eds.). Cida- dania, políticas públicas e redes sociais. Coimbra, Portugal: Imprensa da Uni- versidade de Coimbra, 2011. p. 13-28 NUNES, J. A., Matias M. e Filipe, A. M. As organizações de pacientes como atores emergentes no espaço da saúde: o caso de Portugal. Reciis. 2007. p. 107-110 NUNES, J. A. “A pesquisa em saúde nas ciências sociais e humanas: tendên- cias contemporâneas”, Oficina do CES, 253. 2006. RABEHARISOA, V., Callon, M. Nunes, J. A. et al. The dynamics of causes and conditions : the rareness of diseases in French and Portuguese patients ’ orga- nizations ’ engagement in research. Centre de Sociologie de L’innovation. May, 2012. SANTOS, B. S. É a Saúde. Estúpido!. Revista Visão. 14 de fevereiro de 2008. SCHNEIDERS, J. (2011). Percepção dos pais sobre o filho portador de Neu- rofibromatose. Universidade Feevale. 03345.indd 16 26/07/2013 09:29:35
  • 17. | 17Dia Mundial das Doenças Raras Questões Bioéticas sobre Doenças Genéticas Raras Prof. Dr. Natan Monsores Departamento de Saúde Coletiva Cátedra UNESCO de Bioética Universidade de Brasília monsores@unb.br Como um campo agregador de reflexões sobre o impacto da biotec- nociência nos modos de vida, a bioética é um bom lugar de partida para se discutir questões relacionadas às doenças raras. Os temas da determi- nação e da manipulação genéticas têm sido amplamente debatidos por bioeticistas, tendo resultado em reflexões que podem lançar um pouco de luz à discussão dos direitos à saúde e aos dilemas do descobrir-se portador de uma doença genética rara. Em linhas gerais, a bioética pode ser compreendida como: (...) um espaço de encontro, mais ou menos conflituoso, de ideologias, morais, religiões e filosofias, e de desafios para uma multidão de grupos de interesse e de poderes consti- tutivos da sociedade civil: associações de pacientes, corpo médico, defensores dos animais, associações paramédicas, agronegócios, indústria farmacêutica e de tecnologias médi- cas em geral, bioindústria em geral (1). Essa definição de Hottois é concreta neste seminário, pois temos aqui pessoas com doenças raras, seus familiares, profissionais de saúde, políticos, juristas, representantes da indústria e mídia. Apesar da varie- dade de interesses e de perspectivas aqui reunidos, gostaria de ater-me ao elemento central de todo esse processo que, pelo cálculo atuarial de riscos e de impactos orçamentários ou pela litigiosidade em busca de garantias constitucionais de tratamento e acesso à saúde, tem saído do foco destas discussões – utilitaristas - de custos e benefícios: as pessoas. 03345.indd 17 26/07/2013 09:29:35
  • 18. 18 | Romário • Deputado Federal As pessoas com doenças raras precisam ser garantidas, pelo Estado Brasileiro, a igualdade de oportunidades, sem avaliações equivocadas de merecimento ou de responsabilidade pessoal, já que são vulneradas por eventos genéticos, aleatórios ou herdados, que originam uma per- versa equação de exclusão social, independente da classe social ou de local de nascimento: (a) se tornam invisíveis às outras pessoas, já que a deficiência resultante da doença é sobredeterminante ao seu status de pessoa ou indivíduo; (b) se tornam intocáveis, já que o estigma que portam, isto é, as mudanças em seus corpos, causam estranheza, pavor ou repulsa naqueles que fortuitamente atravessam seus caminhos; (c) são rotulados como incapazes por precisarem de tecnologias assistivas, por terem convalescença súbita ou longa e por terem limitações ao que é convencionado de “vida comum”. A resultante desta equação é uma incerteza social, sanitária e psicológica, já que são segregados em múlti- plos aspectos. Isto significa que direitos humanos são violados ou relati- vizados para estas pessoas que, depois de percorrerem longos itinerários diagnósticos e terapêuticos, começam a encarar a doença como destino, já que não podem contar com os aparelhos sociais de proteção. Parte da segregação ou invisibilidade, principalmente para o Estado Brasileiro, tem sua origem no paradoxo nosológico que são as doen- ças raras: elas têm baixa prevalência na população, isto é, atingem gru- pos familiares e minoritários, que no dimensionamento utilitarista das ações de bem-estar social (maior bem para o maior número possível de pessoas) ficam alijados de seus direitos. Por isso é importante frisar que, apesar de cada doença ter poucos casos na população, em conjunto constituem um grupo de mais de 5000 diferentes síndromes, em sua maioria de etiologia genética, que afetam um contingente populacional estimado em 6-8% na Europa e Estados Unidos (2-4), mas não há dados que confirmem esta prevalência no Brasil, salvo estudos pontuais sobre patologias específicas (5). Esta última informação aponta uma fragilidade para a estruturação de qualquer política pública para doenças raras no Brasil: falta infor- mação epidemiológica qualificada, pois boa parte do conhecimento sobre estas doenças surge da congregação de relatos de caso, sem veri- ficação ampla, junto aos serviços médicos e sociedades científicas de 03345.indd 18 26/07/2013 09:29:35
  • 19. | 19Dia Mundial das Doenças Raras especialidades, da frequência de ocorrência na população em geral. Para isso seria necessário um esforço coordenado, baseado na notificação e registro de casos, ou mesmo em um censo nacional inclusivo, o que demandaria um arranjo de ações entre o Governo Federal e os demais governos. Para que a informação seja gerada, é necessário preparo técnico e científico (além de infraestrutura adequada) das equipes de saúde res- ponsáveis pelo reconhecimento inicial destas síndromes, geralmente crônicas e degenerativas (6). Um fator complicador é que, em função de sua origem genética ou cromossômica, uma mesma condição pode ter variadas manifestações clínicas (pleiotropia), configurando uma diversidade de subtipos que afetam, de forma diferenciada, capacidades físicas, habilidades mentais, comportamentos e percepção sensorial de seus portadores. Há situações em que muitas desabilidades e deficiên- cias coexistem em um só indivíduo (polyhandicap), o que leva a varia- ções em termos de gravidade e expectativa de vida que, na maioria dos casos, é reduzida (3, 7). O impacto destas desordens sobre a qualidade de vida de seus por- tadores varia muito. Entre erros inatos de metabolismo até as doenças que afetam sistema motor ou mesmo aquelas desfigurantes e deforman- tes, os efeitos pleiotrópicos geralmente implicam em risco de vida ou em doenças degenerativas crônicas (8). Em algumas circunstâncias estas doenças podem ser desencadeadas por multifatores: infecções bacteria- nas ou virais, alergias ou exposição a produtos químicos ou radiações, mas na maioria dos casos as doenças são congênitas ou herdadas e afe- tam, predominantemente, crianças nos primeiros anos da infância. Deve-se destacar também a grande carga psicossocial a que são sub- metidos cuidadores e familiares, que seguem de perto o desespero psi- cológico e falta de esperança terapêutica, bem como a escassez de estra- tégias inclusivas por parte do Estado ou de governos (3). Um percentual considerável de doenças raras acomete sistema nervoso e locomotor, criando um alto nível de dependência aos cuidadores, que sofrem com estresse e coping (9). Apesar dos avanços na compreensão de mecanismos genéticos e gatilhos, menos de 10% dos doentes podem contar com medicamen- 03345.indd 19 26/07/2013 09:29:35
  • 20. 20 | Romário • Deputado Federal tos ou tratamentos específicos, tendo somente o aporte multidisciplinar paliativo. A escassez de pesquisa e de terapêutica se deve a heterogenei- dade de fisiopatologias, a história natural mal compreendida das doen- ças, a variação na progressão das doenças, pela baixa disponibilidade de voluntários para realização de ensaios clínicos, assim como pela falta de marcadores patognomônicos e indicadores epidemiológicos (8). Terapias avançadas, tais como os tratamentos com células-tronco (10), os medicamentos biológicos e as terapias gênicas (11) têm sido tentados para estes pacientes, no entanto o progresso das pesquisas se dá em passos lentos e arriscados, não atendendo às curtas expectativas de vida destes indivíduos. O resultado deste quadro é que as pessoas com doenças raras e seus familiares, pela escassez de recursos médi- cos, acabam tornando-se especialistas em sua própria condição (12), gerando informações novas que são compartilhadas em comunidades de internet, blogs e até em congressos da área biomédica (13). Iniciativas internacionais, como a EURODIS (3), têm identificado problemas recorrentes. Resumidamente, pode-se apontar: (a) A falta de acesso a diagnóstico correto, com longos itinerários diagnósticos, muitas vezes equivocados e imprecisos; (b) A falta de informação sobre a doença e sobre onde obter ajuda de profissionais de saúde; (c) A falta de conhecimento científico com escassez de estratégias diagnósticas e terapêuticas; (d) A falta de cuidados multiprofissionais de saúde após o diagnós- tico inicial; (e) As consequências sociais das manifestações das doenças, já que muitos destes pacientes são pessoas com necessidades especiais, o que gera estigmatização, isolamento, exclusão e discrimina- ção, bem como redução das oportunidades profissionais; (f) O alto custo dos poucos medicamentos disponíveis e o custo do cuidado continuado que, combinado com a falta de benefícios sociais e reembolso, causam a pauperização das famílias. No Brasil este panorama é agravado pelo fenômeno de judicializa- ção da saúde (14, 15) em prol de uso compassivo de drogas ainda não aprovadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (16), levando a 03345.indd 20 26/07/2013 09:29:35
  • 21. | 21Dia Mundial das Doenças Raras um intensivo assédio de multinacionais farmacêuticas às associações de pacientes e profissionais de saúde que lidam com este grupo de doenças, uma vez que os medicamentos são de alto custo. Outra variável nesta complexa equação é o turismo de saúde. Diversos pacientes e familiares têm buscado no exterior tratamento para suas doenças, alguns destes duvidosos e sem bases científicas (17). A consequência disso são even- tos iatrogênicos que fragilizam ainda mais os pacientes e oneram o Sis- tema Único de Saúde (SUS), que arca com o processo de recuperação dos indivíduos após estas incursões terapêuticas. Em função destas situações, é fundamental que se estabeleçam nor- mas claras ou um código de ética que balize as relações entre as asso- ciações de pacientes, os centros de pesquisa e a indústria farmacêutica. Faz-se necessário também um sistema transparente de recrutamento para ensaios clínicos, além de esclarecimento à população sobre o que é tratamento e o que é pesquisa clínica, pois a confusão entre ambos fra- giliza a capacidade das pessoas de tomarem decisões autônomas, livres e esclarecidas sobre os procedimentos a que se submetem. O Estado bra- sileiro não pode permitir que uma parcela vulnerável de sua população seja alvo de oportunismos, como a venda de curas e tratamentos fictí- cios ou o aliciamento para tratamentos compassivos sem planejamento adequado, que podem acelerar a falência orgânica destas pessoas. Hoje, os avanços para acompanhamento e tratamento de doenças raras no SUS vinculam-se, precariamente, à Política Nacional de Saúde da Pessoa com Deficiência, cujo foco é a reabilitação e a acessibilidade. As dificuldades da sociedade brasileira em dar equânime oportunidade de acesso às pessoas com necessidades especiais são de amplo conhe- cimento, restando ações estatais pontuais como o estabelecimento de cotas, por exemplo. Um estado que têm como marco a igualdade de direitos e o bem-star social, deve estender suas ações para políticas de equidade mais amplas. Há outra iniciativa importante para as famílias com doenças raras, que se deu em 2001, com o estabelecimento do Programa Nacional de Triagem Neonatal (PNTN) que, através do “teste do pezinho”, identifica precocemente algumas doenças raras e permite, quando há celeridade 03345.indd 21 26/07/2013 09:29:35
  • 22. 22 | Romário • Deputado Federal no processo, o estabelecimento de ações precoces de cuidados para estas crianças. Mais recentemente, em 2009, o Ministério da Saúde (MS) emitiu a Portaria 81, estabelecendo a Política Nacional de Atenção Integral em Genética Clínica, cuja meta é organizar a rede de serviços para realizar ações de promoção, prevenção, diagnóstico, aconselhamento e terapêu- tica para os casos identificados. Atualmente, há um grupo de traba- lho, estabelecido pelo MS, para elaborar normas de atenção e diretrizes para o atendimento de doenças raras no Sistema Único de Saúde – SUS, algo que torcemos para que se concretize. Mas deve-se destacar que o diagnóstico não é o único cuidado necessário, bem como o geneticista clínico não deve ser o único profissional de saúde envolvido nos cuida- dos às pessoas com doenças raras, o que geraria um enorme gargalo no atendimento e no segmento do diagnóstico. É preciso reforçar o papel das ações multiprofissionais, com valorização das outras profissões de saúde, bem como avançar na atenção básica e em domicílio das pes- soas com doenças raras, através de programas como o Saúde na Família, além da ampla veiculação de informação sobre centros de referências e sobre o segmento da atenção nos diversos níveis de complexidade do SUS. A questão da informação é perene em todas as discussões sobre doenças raras: as pessoas com doenças raras precisam saber onde podem buscar ajuda, precisam saber quem são os profissionais que podem auxi- liá-las, sem que tenham o receio de ter sua saúde mais prejudicada por tratamentos errados ou por diagnóstico equivocados, precisam saber se têm direito a medicamento e tecnologias assistiva, se podem se aposen- tar ou receber benefício previdenciário por sua condição. Neste sentido, a Universidade de Brasília, pelo estabelecimento de um Observatório de Doenças Raras pretende contribuir com o que lhe cabe neste processo: a produção de informação técnico-científica para dar suporte à cons- trução de políticas e para redução das iniquidades para esta parcela da população brasileira. Enquanto Cátedra de Bioética e Núcleo de Saúde Pública, estendemos nosso apoio às associações de pacientes, por com- preendermos que as pessoas com síndromes raras não podem ter seu corpo ou sua vida transformado em espaços de disputas por interesses 03345.indd 22 26/07/2013 09:29:35
  • 23. | 23Dia Mundial das Doenças Raras escusos a sua autonomia e bem-estar, tendo na mira a concepção de que nossa missão é cuidar das pessoas e não somente das doenças. REFERÊNCIAS 1.Hottois G. Bioétique. In: Hottois G, Missa JN, editors. Nouvelle encyclo- pédie de bioéthique. Bruxelas: De Boeck; 2001. p. 125-6. 2.Wästfelt M, Fadeel B, Henter JI. A journey of hope: lessons learned from studies on rare diseases and orphan drugs. Journal of internal medicine. 2006;260(1):1-10. 3.EURORDIS. Rare Diseases: understanding this Public Health Priority. European Organisation for Rare Diseases; 2005 [cited 2013 06-maio]; Available from: http://www.eurordis.org/IMG/pdf/princeps_document-EN.pdf. 4.Denis A, Mergaert L, Fostier C, Cleemput I, Simoens S. A comparative study of European rare disease and orphan drug markets. Health policy (Amster- dam, Netherlands). 2010;97(2-3):173-9. 5.DIETRICH-NETO F, CALLEGARO D, DIAS-TOSTA E, SILVA HA, FERRAZ ME, LIMA JMBD, et al. Amyotrophic lateral sclerosis in Brazil: 1998 national survey. Arquivos de Neuro-Psiquiatria. 2000;58:607-15. 6.Maiella S, Rath A, Angin C, Mousson F, Kremp O. Orphanet and its con- sortium: where to find expert-validated information on rare diseases. Revue neu- rologique. 2013;169 Suppl 1:8. 7.Knight A, Senior T. The common problem of rare disease in general prac- tice. The Medical journal of Australia. 2006;185(2):82-3. 8.Melnikova I. Rare diseases and orphan drugs. Nat Rev Drug Discov. 2012;11(4):267-8. 9.Neves ET, Cabral IE. Empoderamento da mulher cuidadora de crian- ças com necessidades especiais de saúde. Texto & Contexto - Enfermagem. 2008;17:552-60. 10.Li S, Yin H, Loudon W, Weiss J. Cultivating stem cells for treating amyo- trophic lateral sclerosis. World journal of stem cells. 2012;4(12):117-9. 11.Wirth T, Ylä-Herttuala S. History of gene therapy. Gene. 2013. 03345.indd 23 26/07/2013 09:29:35
  • 24. 24 | Romário • Deputado Federal 12.Kent A, Oosterwijk C. A patient and family perspective on gene therapy for rare diseases. The journal of gene medicine. 2007;9(10):922-3. 13.Aymé S, Kole A, Groft S. Empowerment of patients: lessons from the rare diseases community. Lancet. 2008;371(9629):2048-51. 14.Sartori Junior D, Leivas PGC, Souza MVd, Krug BC, Balbinotto G, Schwartz IVD. Judicialização do acesso ao tratamento de doenças genéticas raras: a doença de Fabry no Rio Grande do Sul. Ciência & Saúde Coletiva. 2012;17:2717-28. 15.Boy R, Schwartz I, Krug B, Santana-da-Silva L, Steiner C, Acosta A, et al. Ethical issues related to the access to orphan drugs in Brazil: the case of muco- polysaccharidosis type I. J Med Ethics. 2011;37(4):233-9. 16.Goldim JR. O uso de drogas ainda experimentais em assistência: extensão de pesquisa, uso compassivo e acesso expandido. Revista Panamericana de Salud Pública. 2008;23:198-206. 17.Master Z, Resnik D. Stem-cell tourism and scientific responsibility. Stem- cell researchers are in a unique position to curb the problem of stem-cell tourism. Embo Rep. 2011;12(10):992-5. 03345.indd 24 26/07/2013 09:29:35
  • 25. | 25Dia Mundial das Doenças Raras Para um começo de reflexão sobre o cuidado das Doenças Raras Sílvia Portugal Faculdade de Economia e Centro de Estudos Sociais Universidade de Coimbra sp@fe.uc.pt Quando recebi o convite do Rogério Lima para escrever este texto e li as notas taquigráficas do Seminário do Dia Mundial das Doenças Raras, celebrado na Câmara dos Deputados, não pude deixar de pensar que era um raro privilégio estar associada a este evento. Uma oportu- nidade para estabelecer pontes entre os dois lados do Atlântico, num domínio no qual elas não são comuns. A palavra “raro” impôs-se facil- mente como mote. Como tal, retomando um hábito em desuso, consul- tei um dicionário para verificar os significados da palavra, em busca de inspiração – o monumental Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Na página 3088 da edição portuguesa do Círculo de Leitores encontrei o que pretendia. Este texto segue as definições aí encontradas. 1. que não é comum; que poucas vezes se encontra A existência de políticas públicas para as Doenças Raras não é comum, se olharmos para o panorama mundial. Na Europa, a França é uma excepção, na América Latina, o Brasil torna-se agora uma refe- rência. Poucas vezes se encontra uma atenção específica do Estado para este domínio e essa ausência é tanto mais problemática quanto é conhe- cida a gravidade dos problemas que enfrentam as pessoas com doenças raras e as suas famílias. A urgência da intervenção pública nesta matéria é enorme e a capacidade que o Estado brasileiro demonstra em lhe dar resposta é de louvar e de seguir com atenção, analisando os caminhos percorridos e os resultados obtidos. 03345.indd 25 26/07/2013 09:29:36
  • 26. 26 | Romário • Deputado Federal O universo das doenças raras é plural e complexo e, como tal, repre- senta um enorme desafio para a definição de políticas estatais e o aten- dimento público a esta população. A particularidade de cada caso não pode obscurecer a universalidade dos direitos. A implementação das políticas tem que atender à especificidade e singularidade das doenças raras e dos seus portadores, assumindo a difícil tarefa de uma contínua (re)configuração dos serviços e dos profissionais em função da integra- lidade do cuidado e das necessidades da pessoa e da sua família. 2. que ocorre de forma infrequente (doença rara) A doença rara surge como primeiro exemplo do significado de “raro”. Ela é definida pelo número da sua ocorrência, pelo significado estatístico da sua incidência na população. A doença rara ocorre de forma infrequente. Foge, portanto, à norma. É o impacto do significado médico e social de estar fora da norma que marca a vida das pessoas com doenças raras e das suas famílias. Estar fora da norma implica que os diagnósticos tardam, os exames, as consultas e as opiniões se multi- plicam, as respostas não são adequadas, as necessidades não são aten- didas, a urgência do cuidado contrasta com o tempo longo da espera. Estar fora da norma revela-se no corpo, implica olhares furtivos, con- tatos evitados, oportunidades perdidas, gera estigma, cria vidas escon- didas, cotidianos que giram em volta da doença. A doença rara é infre- quente, a exclusão social que lhe está associada frequente. 3. em pequeno número Aspessoascomdoençasrarassãoumpequenonúmero,umpequeno grupo, uma minoria. As minorias são facilmente ignoradas. A irrele- vância estatística é pretexto para o desinteresse e o desconhecimento: da população, dos governos, da ciência, da indústria farmacêutica. O conhecimento e a informação são cruciais para lutar contra a invisibi- lidade, para combater o estigma, para que o raro deixe de ser o outro. É preciso investigar, conhecer, investir, informar, divulgar. Conhecer as doenças: os sintomas, os diagnósticos, as pesquisas clínicas, as terapêu- ticas. Conhecer as pessoas: Quem são? Quantas são? Onde estão? Como 03345.indd 26 26/07/2013 09:29:36
  • 27. | 27Dia Mundial das Doenças Raras lidam com a doença? Como vivem? Saber que elas são mais do que a doença. 4. de que poucos indivíduos são dotados; admirável; extraordinário As histórias das vidas das pessoas com doenças raras, das suas famí- lias e de pessoas próximas são admiráveis pelo exemplo que oferecem de luta contra a adversidade. As suas biografias revelam trajetórias extra- ordinárias de conquista cotidiana de esperança e de vida, contra o des- conhecimento, o desinteresse, o preconceito, o desespero. À ausência de respostas e de apoios formais, à escassa garantia de direitos, ao incum- primento das obrigações societais, contrapõem-se percursos de vida assentes na solidariedade e na dádiva, que recusam a derrota. O cuidado das pessoas com doenças raras assenta essencialmente na dedicação e amor das suas famílias. Quando se reivindica apoio e assistência, muitas vezes, a primeira leitura orienta-se para a demissão das famílias. Ela não podia ser mais erronea. As famílias não querem ser substituídas no seu papel, no entanto, para poderem desempenha-lo da melhor forma, para não adoecerem conjuntamente com os seus familiares, necessitam de condições e de meios para a prestação do cuidado. É esse o desafio que as políticas públicas têm que assumir: tomar as famílias como parceiras. 5. advérbio: raramente Raramente as pessoas com doenças raras e as suas famílias são ouvi- das. Raramente elas são consideradas sujeitos ativos e implicados. É preciso que elas se assumam/sejam assumidas como protagonistas do seu próprio destino, sujeitos de pleno direito e não objetos passivos de intervenção social e de tratamento médico. As pessoas sabem mais sobre a sua doença do que os outros. Sentem o corpo, as dores, o sofrimento. Sabem o que está certo para elas e o que está errado. São agentes ativos do seu cuidado. Ouvem, conversam, pesquisam, fazem opções, definem estratégias, ministram medicação, desenham itinerários terapêuticos. 03345.indd 27 26/07/2013 09:29:36
  • 28. 28 | Romário • Deputado Federal As pessoas são mais do que a doença. Têm vidas para além da doença. Têm famílias, amigos, sociabilidades, prazeres, gostos e desgos- tos, crenças, confianças e desconfianças. O desafio é escutar e dar voz: no consultório, na comunidade, no espaço público. 6. de raro em raro: uma vez ou outra Uma vez ou outra faz-se a diferença. Um profissional interessa-se, um departamento dá seguimento, um tribunal despacha favoravel- mente, um diretor promove uma ação, uma instituição resolve o caso, uma comunidade envolve-se. No entanto, a vida das pessoas e das suas famílias não pode depender do raro da boa prática. A força das políticas públicas constroem-se no combate à discricionariedade das interven- ções. A garantia da existência da norma para quem sai dela, de iguais direitos para quem é diferente. 7. não raro: com frequência Com frequência o desenho das políticas é excelente e a sua efeti- vidade limitada. No caso, as definições do objeto da política colocam inúmeros obstáculos à sua implementação. Construir o universal para responder ao singular é o desafio que se coloca. Pelo que ouvi na leitura destas falas só posso acreditar que se está no bom caminho. 03345.indd 28 26/07/2013 09:29:36
  • 29. | 29Dia Mundial das Doenças Raras Notas taquigráficas do Dia das doenças Raras 2013 DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES TEXTO COM REDAÇÃO FINAL Versão para registro histórico Não passível de alteração SEMINÁRIO DIA MUNDIAL DE DOENÇAS RARAS EVENTO: Seminário N°: 0025/13 DATA: 27/02/2013 INÍCIO: 14h38min TÉRMINO: 18h37min DURAÇÃO: 03h59min TEMPO DE GRAVAÇÃO: 03h59min PÁGINAS: 78 QUARTOS: 48 DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃO JOSÉ EDUARDO FOGOLIN PASSOS - Representante do Ministro da Saúde, Alexandre Padilha. DIRCEU BARBANO - Diretor-Presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária — Anvisa. GREYCE LOUSANA - Presidenta Executiva da Sociedade Brasileira de Profissionais em Pesquisa Clínica. NATAN MONSORES - Departamento de Saúde Coletiva da Universidade de Brasília — UnB. ROGÉRIO LIMA BARBOSA - Representante da Associação Maria Vitória — AMAV. CLAUDETE LEMOS RIBEIRO - Esposa de portador de Atrofia de Múltiplos Sistemas — AMS. ROBERTO SALES - Pai de portador de epidermólise bolhosa. CAROLINA CORDEIRO ALVARENGA - Diretora de Operações da América do Sul sobre a Síndrome de Aicardi-Goltieres. Coordenadora do Movimento Eu respeito as vagas. E você? PATRICK TEIXEIRA PIRES - Portador de Mucopolissacaridose. THIAGO FELIX MARQUES - Professor da Fundação Educacional do DF. Hemofílico grave. SUMÁRIO: Seminário Dia Mundial das Doenças Raras, celebrado em 29 de fevereiro, promovido pela Liderança do Partido Socialista Brasileiro na Câmara dos Deputados. OBSERVAÇÕES Houve exibição de imagens. Houve intervenção fora do microfone. Inaudível. 03345.indd 29 26/07/2013 09:29:36
  • 30. 30 | Romário • Deputado Federal O SR. APRESENTADOR (David Rayol) - Srs. Parlamentares e autoridades presentes, especialistas da área médica, representantes de entidades ligadas às doenças raras, portadores dessas enfermidades, familiares, senhoras e senhores, boa tarde! Inicia-se neste momento a cerimônia de abertura do Seminário Dia Mundial das Doenças Raras, celebrado em 29 de fevereiro, pro- movido pela Liderança do Partido Socialista Brasileiro na Câmara dos Deputados. Senhoras e senhores, neste momento, abrindo os atos protocolares desta cerimônia, são convidadas a compor a Mesa as seguintes autori- dades: o Sr. Deputado Romário, idealizador deste seminário (palmas); o ator Luciano Szafir, irmão de Alexandra Szafir, portadora de esclerose lateral amiotrófica (ELA) (palmas); o Sr. José Eduardo Fogolin Passos, Coordenador-Geral de Média e Alta Complexidade do Ministério da Saúde, representando nesta oportunidade o Sr. Ministro Alexandre Padilha (palmas); o Sr. Deputado Maurício Quintella Lessa (palmas); a Sra. Deputada Mara Gabrilli (palmas); o Sr. Deputado Marçal Filho (palmas); o Sr. Senador Eduardo Suplicy (palmas); a Sra. Senadora Ana Amélia Lemos (palmas); o Sr. Senador Cássio Cunha Lima (palmas); o Sr. Deputado Distrital Joe Valle (palmas) e o Sr. Diretor-Presidente da Anvisa, Dirceu Barbano (palmas). Senhoras e senhores, composta a Mesa de Abertura desta cerimônia, pedimos a todos que se coloquem em posição de respeito para, neste momento, ouvir o Hino Nacional. (É executado o Hino Nacional.) O SR. APRESENTADOR (David Rayol) - Senhoras e senhores, este seminário tem como objetivo chamar a atenção e ampliar o conheci- mento das autoridades e da sociedade para as doenças raras, que, na maioria das vezes, manifestam sintomas crônicos graves e incuráveis, sendo ainda, com frequência, degenerativas e progressivas, além de constituírem elevado risco de morte. O Ministério da Saúde classifica como doenças raras aquelas que afetam, uma a cada 2 mil pessoas. Cerca de 80% dessas doenças têm ori- gem genética sendo que a maioria não possuí cura conhecida. Estima-se 03345.indd 30 26/07/2013 09:29:36
  • 31. | 31Dia Mundial das Doenças Raras que de 6% a 8% da população mundial seja atingida por esse grupo de doenças. Nós gostaríamos de informar a todos que este evento está sendo transmitido em tempo real pela internet e pela TV Câmara. Neste momento, abrindo a sessão de pronunciamentos desta ceri- mônia de abertura, convidamos para fazer uso da palavra o Sr. Depu- tado Romário, idealizador deste seminário. O SR. PRESIDENTE (Deputado Romário) - Boa tarde, senhoras e senhores. É com muita honra que presido a Mesa deste Seminário sobre o Dia Mundial das Doenças Raras. Antes de meu pronunciamento, gostaria de saudar as pessoas pre- sentes à Mesa: o ator e amigo Luciano Szafir — muito obrigado pela presença; o Dr. José Eduardo Fogolin Passos, representando o Minis- tério da Saúde; o Senador Eduardo Suplicy; o Senador Cássio Cunha Lima; o Deputado Maurício Quintella Lessa; a Deputada Mara Gabrilli; o Deputado Marçal Filho; a Senadora Ana Amélia; a Deputada Rosi- nha da Adefal, que acabou de chegar; o Deputado Distrital Joe Valle e o Diretor-Presidente da Anvisa, Sr. Dirceu Barbano. Gostaria de aproveitar a oportunidade e convidar para a Mesa o Líder do Partido na Câmara, Deputado Beto Albuquerque, do PSB. (Palmas.) Senhoras e senhores, hoje é um dia de reflexão e de conscientiza- ção o qual quero, antes de mais nada, compartilhar com os presentes a minha decepção pela ausência de uma pessoa que seria uma das mais importantes aqui: o Ministro da Saúde, Alexandre Padilha, que, infe- lizmente, não pôde estar presente. Tem o seu representante, mas, como no ano passado, acredito que a sua presença seria de suma importân- cia. E de frustração. Frustração por quê? Já enfrentei muitos desafios na minha vida e, com certeza, nunca me queixei de lutar por aquilo em que acredito. O que me cansa e me aborrece, e às vezes até me desanima, é ver que, apesar de todo o esforço meu e daqueles que lutam comigo, os avanços, em certos casos, demoram muito para acontecer. No ano passado, nessa mesma data, realizamos na Câmara um evento memorável, podendo contar com a presença de ninguém menos 03345.indd 31 26/07/2013 09:29:36
  • 32. 32 | Romário • Deputado Federal do que a autoridade máxima da saúde pública do nosso País, o Ministro Alexandre Padilha. O Ministro veio e falou muito bem. Ele disse que, em relação aos temas de doenças raras no Brasil, existem três questões fundamentais: a pesquisa, a informação e o atendimento. Sobre esse último item, o Ministro declarou que não basta construirmos prédios bonitos e bem equipados, mas que a alma do bom cuidado da saúde é o profissional bem qualificado e comprometido. Porém, o aspecto que quero destacar na fala do Ministro Padilha é a importância que pareceu dar à questão da informação. Ele disse que existe um vácuo no nosso sistema de saúde em relação ao cuidado com as pessoas portadoras de doenças raras. E acrescentou que precisamos, em primeiro lugar, de dados, pois, sem os dados, é impossível se fazer política pública. O Ministro admitiu que ainda não se sabe ao certo quantas pessoas possuem doenças raras no Brasil e, portanto, quantas famílias são atin- gidas pelo problema. Não se sabe também onde vivem e como vivem. E assumiu o compromisso de resolver essa situação. Eu acho ótimo que o chefe da Pasta da Saúde tenha assumido esse compromisso justamente aqui, na Casa do povo. E quero acrescentar que precisamos, em primeiro lugar, saber com que definição de doença rara o governo trabalha. É difícil saber, e não adianta procurar no dicio- nário do SUS ou no site do Ministério: a informação, infelizmente, não existe. Além disso, a sociedade precisa saber onde buscar informações e atendimento sobre essa questão. Todo pai e mãe sabem como é aflitivo não ter a quem recorrer, tenham certeza que isso é a pura verdade. Mas o que mais eu gostaria de saber neste momento, como Depu- tado, como cidadão, é o porquê de nada efetivo ter sido realizado nos últimos anos, apesar de o Ministro Padilha ter tanta clareza sobre o que precisa ser feito. O Brasil tem o direito e o dever de saber. Como eu disse aqui há exatamente um ano, um grande obstáculo que os portadores de doenças raras e suas famílias enfrentam é a falta de conhecimento sobre o tema, inclusive entre os médicos, o que dificulta 03345.indd 32 26/07/2013 09:29:36
  • 33. | 33Dia Mundial das Doenças Raras bastante o diagnóstico, que, em muitos casos, acaba chegando dolorosa- mente tarde a algumas famílias. Nesse meio tempo, enquanto dura aquilo que muitas famílias cha- mam de odisseia diagnóstica, as pessoas são vítimas de preconceitos e da desesperança, sem contar que têm que lidar com sintomas que poderiam, pelo menos, serem aliviados. E como se não bastasse, existe a dificuldade de se chegar a um diagnóstico, a um acesso ao tratamento adequado. Infelizmente, essa é a realidade que vivemos hoje em nosso País. Falta pesquisa, mas não é pesquisa sobre medicamentos o principal problema, falta um trabalho social para identificar quantas são, onde e como vivem as pessoas com doenças raras no Brasil. Estamos conhecendo essas pessoas hoje por meio das imagens que estão sendo projetadas — espero que estejam passando aí, acho que deu um probleminha, vamos tentar passar um pouco depois. Só assim o Brasil poderá ter, como tem de ter, uma rede eficaz de atendimento. Talvez a gente possa chegar a isso por meio da criação de um pro- grama específico no Ministério, voltado para as doenças raras. O Bra- sil pode ser, com certeza, modelo para outros países em muitas áreas, inclusive em áreas da Saúde. O SUS e o programa de combate à Aids são exemplos do que pode ser feito quando o governo ouve a sociedade e ela se organiza para encaminhar soluções. Por isso, eu ainda tenho esperanças. Hoje a situação no Brasil em relação ao atendimento às pessoas com doenças raras é vergonhosa. Estamos atrasados não apenas em relação aos países mais desenvol- vidos, mas em relação a muitos de nossos vizinhos. A Argentina saiu na frente, assim como a Colômbia e o Chile. Nós podemos trabalhar com eles, podemos criar uma rede regional de atendimento. mas antes precisamos fazer o nosso dever de casa, precisamos fazer pelo menos o mínimo. E isso, infelizmente, não estamos fazendo. Acredito e espero que, mais uma vez, este evento, este seminário, possa fazer com que as nossas autoridades maiores, como ministros, e até mesmo a nossa Presidenta, possam começar a olhar diferente para esse tema, o qual muitas pessoas não têm noção do real sofrimento, da dor e da angústia que passam os portadores das doenças e seus familiares. 03345.indd 33 26/07/2013 09:29:36
  • 34. 34 | Romário • Deputado Federal Étristesaberquesomosumexemploaserseguidoemváriassituações referentes à própria saúde e, num tema dessa importância, no mundo moderno em que vivemos, infelizmente, estamos tão despreparados, tão desprotegidos e tão desinformados sobre o que é preciso para fazer uma política pública de mínima qualidade. Está aberto hoje, aqui, este seminário. Agradeço a presença a todos vocês. Espero que saiam daqui hoje conscientes do que realmente nós, sociedade, podemos fazer em relação às pessoas com doenças raras e a seus familiares. Muito obrigado. (Palmas.) O SR. APRESENTADOR (David Rayol) - O Cerimonial gostaria de informar que o Sr. Deputado Maurício Quintella Lessa, que se encontra à Mesa, é o 3º Secretário da Mesa Diretora da Câmara dos Deputados e também Presidente da Frente em Defesa das Doenças Raras. O cerimonial cumpre o dever de registrar e agradecer as ilustres presenças das seguintes autoridades e personalidades que se apresen- taram ao cerimonial: o Sr. Deputado Ruy Carneiro, o Sr. Deputado Isaias, a Sra. Deputada Keiko Ota, o Sr. Deputado Beto Albuquerque, que se encontra à Mesa de Honra, o Sr. Deputado Severino Ninho, o Sr. Deputado Dr. Ubiali, o Sr. Deputado Tiririca, a Sra. Deputada Carmen Zanotto, o Sr. Deputado Alexandre Roso, o Sr. Deputado Eurico Júnior, o Sr. Deputado Maurício Quintella Lessa, que se encontra à Mesa, o Sr. Deputado Onofre Santo Agostini e o Sr. Deputado estadual Ernani Polo. Também queremos registrar e agradecer a honrosa presença do Sr. Deputado Darcísio Perondi, que prestigia este evento, assim como os demais presentes. Concluída a fala do Sr. Deputado Romário, neste momento, anun- ciamos o pronunciamento do Sr. José Eduardo Fogolin Passos, repre- sentando, neste ato, o Sr. Ministro da Saúde Alexandre Padilha. O Sr. José Eduardo Fogolin Passos - Boa tarde a todos os presentes nesta tarde do dia 27 de fevereiro de 2013. Gostaria de cumprimentar a Senadora Ana Amélia e a todos os Srs. Senadores presentes, também cumprimento o ilustríssimo Deputado Federal Romário, Presidente da Mesa referente ao Dia Mundial das Doenças Raras, e a todos os Deputados no auditório. Gostaria, ainda, 03345.indd 34 26/07/2013 09:29:36
  • 35. | 35Dia Mundial das Doenças Raras de cumprimentar o meu colega, Dr. Dirceu Barbano, Diretor-Presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária e, também, o ilustre ator Luciano Szafir, irmão de Alexandra Szafir, paciente com esclerose lateral amiotrófica. Em especial, nesta tarde, quero deixar um grande abraço a todos os pacientes com doenças raras e a seus familiares. Fiquei muito contente, Deputado Romário, com a fala de V.Exa. no início da reunião de hoje. E é com esse entusiasmo que eu trago a fala do Ministro Alexandre Padilha. Com grande satisfação, retornamos a esta Casa de Leis para anunciar as ações realizadas referentes à atenção às pessoas com doenças raras. Posso dizer a todos os presentes que, durante o ano de 2012, parti- cularmente, coordenei um grupo técnico responsável pela elaboração de uma política específica de atenção às pessoas com doenças raras no Sistema Único de Saúde. Desde abril de 2012, o Ministério da Saúde e, pela primeira vez, um grupo conjunto, participativo, com associações de usuários especialistas na área de doenças raras e doenças genéticas e um grupo de profissio- nais elaboraram uma política de atenção às pessoas com doenças raras. Essa elaboração durante o ano de 2012 gerou dois documentos nor- teadores que já estão para ser publicizados e serão colocados em con- sulta pública na semana seguinte. E só não estão sendo colocados em consulta pública hoje porque, durante o mês de fevereiro, ocorreram vários eventos relacionados às doenças raras. Eu estarei, inclusive, pre- sente em todos os eventos para os quais fomos convidados pelo Ministé- rio da Saúde. Sábado estive em São Paulo, amanhã participarei de outro evento também em São Paulo, contemplando todas as associações de usuários. Na sequência da apresentação em todos os eventos, faremos a consulta pública dos dois documentos norteadores que plasmam no Sistema Único de Saúde a atenção integral aos pacientes com doenças raras e seus familiares. É importante salientar que esses documentos geram uma portaria pactuada na Comissão Intergestora Tripartite, que é a lógica dentro do Sistema Único de Saúde, para que, verdadeiramente, consigamos imple- mentar, e não fiquemos apenas no contexto de portaria, uma política 03345.indd 35 26/07/2013 09:29:36
  • 36. 36 | Romário • Deputado Federal pública voltada não somente ao tratamento de doenças raras, mas que englobe uma linha de cuidado e uma rede de atenção às pessoas e fami- liares de pacientes com doenças raras. Essa política traz, desde a promoção do contexto da saúde e pre- venção em algumas doenças raras, fundamentalmente, o diagnóstico precoce e referências para que os usuários e familiares de pacientes com doenças raras possam ser encaminhados para serviços e centros espe- cializados de doenças raras. Terei oportunidade, ainda nesta tarde, de apresentar a todos os senhores e às senhoras o contexto da política, todos os seus pontos de atenção e rede de atendimento. Essa política traz a linha de cuidado, o fundamental da informação e o cuidar do paciente de doenças raras e seus familiares. Não se trata apenas de estabelecer tratamento, que é parte de todo um cuidado, mas, fundamentalmente, de acolher os usu- ários, pacientes e familiares. Com essa política, gostaríamos de fazer com que todos os usuários e seus familiares tenham uma referência para o cuidado em relação às doenças raras. É importante salientar que essa política construída é um ponto de partida e não de chegada na conclusão do cuidado em relação às doenças raras. Parte desse grupo técnico estabelecido vai acompanhar, como ator fundamental, o monitoramento e a informação aos usuários e pacientes com doenças raras no Sistema Único de Saúde. Temos quase 8 mil doenças raras catalogadas especificamente em relação a esse cuidado. Em relação a tratamento, hoje é muito pouco. O que temos de ofertar e o que o Sistema Único de Saúde tem de fazer é garantir a informação e o cuidado. E posso garantir ao senhor, Depu- tado Romário, que essa política traz a garantia da informação para que crianças, como o Pedro aqui presente, possam ter um diagnóstico pre- coce e referência para cuidado mais organizado. É importante salientar que, em relação às doenças raras, e eu não vou me furtar neste momento, existe hoje dentro do contexto, e isso impacta os gestores e familiares, um grande processo de judicialização dentro do contexto do tratamento lá na ponta em relação às doenças raras. E, infelizmente, inclusive os próprios magistrados, em qualquer 03345.indd 36 26/07/2013 09:29:36
  • 37. | 37Dia Mundial das Doenças Raras nível, podem se pronunciar e tomar as decisões sem um especialista ou técnico adequado nesse processo. Se a solicitação não for adequada, inclusive dentro de uma demanda judicial, infelizmente não se avalia a positividade ou negatividade em relação ao cuidado a esses pacientes. O universo de médicos que pode acionar a Justiça, e a grande maio- ria deles é desprovida desse conhecimento em relação às doenças raras, pode impactar inadequadamente a questão do contexto do cuidado. Sem sombra de dúvida, é preciso organizar as doenças raras no con- texto, inclusive para deixar todo esse caminho e esse cuidado mais claro inclusive no contexto da judicialização. Outro aspecto fundamental a ser considerado é que, embora na Europa existam algumas iniciativas em relação às doenças raras, com exceção da França, não existe nenhum país com política de Estado espe- cífica para doenças raras. E também na América Latina não há notí- cia de política de Estado universal e gratuita, como o Sistema Único de Saúde agora propõe, no contexto da atenção às doenças raras. O Orphanet, portal que traz as informações do contexto em relação às doenças raras e como tratá-las, informa mas não traz o contexto de uma política, o contexto de uma linha de cuidado e de um acolhimento apropriado. A política que o Sistema Único de Saúde traz hoje aos senhores e às senhoras é a única política de maneira totalitária e pioneira no contexto das doenças raras. Repetir o que estava no Orphanet não teria sentido para a nossa linha de cuidado e para o que é o Sistema Único de Saúde, pois seria fazer o que já está sendo feito. O portal serve e vai servir de apoio à nossa rede de serviços como uma forma de consulta, no contexto das informações. Elas virão como um reflexo e não para repetir o mesmo que acontece fora do Brasil. Nesse processo, para determinar o tratamento, o risco de recorrên- cia e a questão do risco específico em pessoa, nós traremos, nesse con- texto da política de atenção às doenças raras, o contexto de rede, de linha de cuidado, e não apenas de tratamento. Ofertaremos, sim, mais acesso a diagnóstico e, como comentou o Deputado Romário, mais qua- lidade. E qualidade é um ponto fundamental. 03345.indd 37 26/07/2013 09:29:36
  • 38. 38 | Romário • Deputado Federal Durante o ano foram realizadas mensalmente reuniões desse grupo técnico e durante todo o ano pensou-se qual seria a melhor forma carac- terística para acolher familiares e pacientes. E o ponto fundamental dessa política foi, neste Brasil continental e heterogêneo, de que forma, em cada região, nós poderemos, sim, ofertar qualidade e acesso às pes- soas com doenças raras e seus familiares. Não podemos, em hipótese alguma, pautar-nos apenas no trata- mento, porque, no contexto de doenças raras, se nós tivéssemos de hoje para amanhã cem doenças tratadas, cem doenças com protocolos, sig- nificaria tratarmos apenas 1,25% das doenças raras. E dessa lógica o que importa no contexto da política pública é acolher e gerar uma rede de cuidados com serviços e centros de referências em doenças raras e gerar essa informação. É essa política que trago aos senhores e às senhoras hoje. Foi em relação a esse trabalho que o Ministério da Saúde, no ano passado, esteve aqui e se comprometeu. E hoje esse trabalho se apresenta como produto e resultado para a saúde pública brasileira, para a população e para os pacientes com doenças raras e seus familiares. Esse é o grande salto. E o SUS escreve hoje uma nova página em relação às doenças raras no mundo. Muito obrigado. (Palmas.) O SR. APRESENTADOR (David Rayol) - Nós agradecemos a pre- sença e participação nesta cerimônia de abertura do Sr. Deputado José Stédile. Agora, com a palavra, o Sr. Senador Eduardo Suplicy. O SR. SENADOR EDUARDO SUPLICY - Querido Deputado Federal Romário, é muito importante a iniciativa de V.Exa. Eu tenho me aproximado bastante da causa. Percebo que o auditório está bem mais lotado do que no ano passado. Isso quer dizer que as pessoas que têm contribuído para a conscientização do problema, inclusive V.Exa., estão conseguindo algo muito significativo. Quero cumprimentar o Sr. José Eduardo Fogolin, os Senadores Cás- sio Cunha Lima e Ana Amélia, os Deputados Federais Maurício Quin- tella e Mara Gabrilli, que muito têm se empenhado, a Deputada Rosinha da Adefal e o Deputado Marçal Filho, o Sr. Dirceu Barbano, Diretor-Pre- 03345.indd 38 26/07/2013 09:29:36
  • 39. | 39Dia Mundial das Doenças Raras sidente da Anvisa, que muito se tem interessado por este tema, e o caro ator Luciano Szafir, que, com sua irmã Alexandra Szafir, tem ajudado nesta causa, o Deputado Distrital Joe Valle, Deputado Beto Albuquer- que, Líder do PSB, e os queridos Deputados Federais aqui presentes. Apresentei — sobretudo através de pessoas que me chamaram a atenção para as doenças raras, como aquelas do Instituto Baresi, coor- denado por Adriana de Abreu Magalhães Dias e Marcelo Seiko Higa, em Brasília, e no diálogo sobre essas questões com Rogério Lima Bar- bosa, Presidente da Associação MariaVitória, e fruto da sensibilização recebida no Instituto Baresi — três matérias legislativas sobre o tema. A primeira é o Projeto de Lei nº 159, de abril de 2011, que institui o último dia do mês de fevereiro como o Dia Nacional de Doenças Raras. Essa proposição encontra-se na Comissão de Educação do Senado aguardando que se marque uma audiência pública para a instrução do projeto. A segunda é o Projeto de Lei nº 711, de novembro de 2011, que ins- titui a Política Nacional de Proteção aos Direitos da Pessoa com Doença Rara. Foi distribuída para análise da Comissão de Assuntos Sociais e da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa, sendo termi- nativa nesta última. Depois poderá vir para a Câmara dos Deputados, se ali aprovado. O PLS 711, de 2011, encontra-se com o Relator designado pela Comissão de Assuntos Sociais, Senador Paulo Bauer, desde março de 2012. A terceira matéria é o Projeto de Lei nº 231, do Senado, de agosto de 2011, que cria o Fundo Nacional de Pesquisas para Doenças Raras e Negligenciadas. Foi distribuída para a instrução de três Comissões do Senado: Ciência e Tecnologia, Assuntos Sociais e Assuntos Econômicos, sendo terminativa nesta última. No momento, a propositura, que já teve parecer pela aprovação na forma de emenda substitutiva da Comissão de Ciência e Tecnologia, está na Comissão de Assuntos Sociais aguardando designação do Relator. É interessante destacar que uma doença rara é uma patologia que ocorre com pouca frequência, em geral, na população. Para ser considerada rara, cada doença específica não pode afetar mais de um 03345.indd 39 26/07/2013 09:29:36
  • 40. 40 | Romário • Deputado Federal número limitado de pessoas na população. Na Europa, a definição para doenças raras abarca as que atingem um em cada 2 mil cidadãos. Nos Estados Unidos, são consideradas raras as doenças que atingem menos de 200 mil indivíduos. No Japão, a definição jurídica de uma doença rara é a que afeta menos de 50 mil pacientes ou cerca de uma em 2.500 pessoas. Individualmente, cada uma das patologias tidas como raras com- promete menos de uma em cada duas pessoas, mas é preciso salientar: há mais de 5 mil doenças raras identificadas. A etiologia das doenças raras é diversificada. A grande maioria delas é de origem genética, mas doenças degenerativas, autoimunes, infecciosas e oncológicas também podem originá-las. Apesar das dificuldades causadas pelas doenças raras, inúmeras pessoas com essas doenças prestaram e prestam gran- des contribuições para a humanidade. Como exemplo, cito o Presidente John Fitzgerald Kennedy, com a doença de Crohn; o físico Stephen Hawkings, com esclerose lateral amiotrófica; o músico Seal, com lúpus infantil; o ator Michael J. Fox, com a doença de Huntington; o meda- lhista olímpico Doug Herland, com osteogênese imperfeita; e a aviadora Jessica Cox, que, com uma doença congênita, nasceu sem os braços. As sequelas causadas pelas doenças raras são responsáveis pelo sur- gimento de cerca de 30% das deficiências. A dificuldade no tratamento médico começa na falta de um mapeamento nacional dessas pessoas. A baixa incidência das doenças raras no Brasil, quando comparada com outros países, leva à suspeita de que muitos casos simplesmente não são diagnosticados, em especial em regiões historicamente não incluídas, relativamente mais pobres, como Norte e Nordeste. Dados internacionais apontam que a mortalidade infantil entre pes- soas com doenças raras chega a 30% em países desenvolvidos. Este per- centual pode ser ainda mais alto no Brasil, uma vez que essas crianças não recebem o tratamento adequado. Dados concretos embasariam o desenvolvimento de uma aborda- gem coerente das necessidades dessa parcela da população. Estudos recentes da EURORDIS, organização que auxilia pessoas com doenças raras na União Europeia, compararam dados de oito doenças raras em 17 países europeus, num universo de 6 mil doentes e 03345.indd 40 26/07/2013 09:29:36
  • 41. | 41Dia Mundial das Doenças Raras familiares, mostrando que 25% dos doentes inquiridos esperou de 5 a 30 anos entre o aparecimento dos sintomas iniciais e o diagnóstico defini- tivo. Estima-se que, no Brasil, a dificuldade de diagnóstico e tratamento seja ainda maior. Eu vou respeitar o horário, Deputado Romário, e peço que depois seja considerado na íntegra o meu pronunciamento, que também farei da tribuna do Senado, em homenagem à sua inciativa. Passarei à última página. Eu falo aqui das ações do Ministério da Saúde, com relação às doen- ças negligenciadas, lançadas em 2003, com o primeiro edital temático em tuberculose, seguido pelos editais de dengue, 2004, e hanseníase, 2005. Em 2006, o Ministério implantou o Programa de Pesquisa e Desenvolvimento em Doenças Negligenciadas e financiou 82 pesquisas, com um investimento total de 22,3 milhões de reais. Em 2008, financiou 58 projetos, mediante investimento conjunto com o Ministério da Ciência e Tecnologia. Em 2012, anunciou a criação da Rede de Pesquisas em Doenças Negligenciadas, com financiamento de 20 milhões de reais. No caso das doenças raras acontece situação parecida com o das doenças negligenciadas, pois a decisão das indústrias farmacêuticas de investir na pesquisa e na comercialização de produtos é largamente influenciada pela demanda e, principalmente, pelo mercado poten- cial. Com base nesse raciocínio, a indústria concentra a sua produção em determinadas linhas de produtos, retirando do mercado drogas de pouco consumo, utilizadas em doenças raras, de baixo retorno finan- ceiro ou de preço controlado pelo governo, por ser o maior comprador, tal como acontece com determinadas doenças endêmicas. Drogas órfãs são medicamentos usados para o diagnóstico, pre- venção e tratamento das doenças raras. Para que um medicamento seja considerado órfão, são utilizados critérios epidemiológicos — baixa prevalência ou incidência da doença em uma determinada população — e econômicos — presunção de não rentabilidade do medicamento. O incremento de investimentos em doenças negligenciadas no Bra- sil, em face dos sucessos já obtidos, exige, agora, a instituição de meca- nismos de financiamentos mais perenes, que também contemplem as 03345.indd 41 26/07/2013 09:29:36
  • 42. 42 | Romário • Deputado Federal doenças raras. Nesse sentido, a criação do Fundo Nacional de Pesquisas para Doenças Raras e Negligenciadas, proposto pelo projeto que citei, pode significar um importante avanço com vistas a ampliar o financia- mento e o escopo das ações de pesquisa nessa área. O fundo proposto funcionará sob as formas de apoio a fundo per- dido ou de empréstimos reembolsáveis. As fontes de recursos incluem doações, sendo permitidas doações para pesquisa de doença específica; subvenções e auxílios de entidades de qualquer natureza, inclusive de organismos internacionais; e reembolso das operações de empréstimo realizadas por meio do fundo, a título de financiamento reembolsável. Ademais, contará com recursos orçamentários — essa é a minha pro- posta — anuais de 50 milhões de reais. Com essas ideias, quero cumprimentar a Câmara dos Deputados e principalmente o Deputado Romário pela realização deste seminário em comemoração ao Dia Mundial das Doenças Raras e à Associação MariaVitória pelo apoio ao evento. Devemos todos nós prosseguir nessa luta para fazer valer para as pessoas com doenças raras o princípo constitucional que assegura o direito à saúde para todos. Muito obrigado. (Palmas.) O SR. APRESENTADOR (David Rayol) - Este cerimonial cum- pre o dever de informar que a Sra. Deputada Rosinha da Adefal, que se encontra no dispositivo de autoridades, é Presidente da Frente Parla- mentar da Pessoa com Deficiência e fará uso da palavra após as palestras temáticas, conforme consta em nossa programação. Neste momento tem a palavra o Sr. Diretor-Presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária — Anvisa, Dirceu Barbano. O SR. SENADOR EDUARDO SUPLICY - Deputado Romário, gostaria de entregar aqui, da Patrícia Krug, o livreto Carinhos d’Alma — a Arte como Terapia. Ela é uma pessoa que tem doença rara mas que tem conseguido um desenvolvimento notável com a sua arte. Eu tenho alguns exemplares desse livreto. Eu vou pedir que sejam distribuídos aqui para os membros da Mesa e para alguns da plateia, mas são tantos que não haverá para todos. Perdão. 03345.indd 42 26/07/2013 09:29:37
  • 43. | 43Dia Mundial das Doenças Raras O SR. DIRCEU BARBANO - Boa tarde a todos. Cumprimento o Deputado Federal Romário. Parabenizo V.Exa. pela iniciativa de trazer esse tema para dentro do Congresso Nacional, fazendo com que as auto- ridades públicas de saúde possam — e devam — estar aqui presentes para dialogar diretamente com a sociedade. Eu gostaria de cumprimentar o Senador Eduardo Suplicy, Senador do meu Estado, São Paulo, que no exercício diário do Parlamento con- tribui com questões importantes sempre. Esta é uma delas. Quero cum- primentar a Senadora Ana Amélia, em nome de quem cumprimento os demais Senadores e Senadoras aqui presentes. Quero cumprimentar a Deputada Federal Mara Gabrilli, que tive a oportunidade de conhecer há pouco tempo. Nós nos encontramos com a possibilidade de intera- ção entre os interesses do seu mandato e o trabalho que a Anvisa realiza. Cumprimento Luciano Szafir, os familiares, os parentes de todos os por- tadores de doenças raras e também os representantes de associações de portadores dessas doenças. Deputado Romário, quero dizer a V.Exa. que o dia 27 de fevereiro é marcado na minha história, na minha vida, por duas coisas importan- tes, e esse é um dia de uma dupla reflexão: primeiro, porque, nas minhas atividades como gestor na área da saúde ao longo do tempo, no Minis- tério da Saúde e agora na Anvisa, e como professor na universidade, trabalhando com alunos, com pacientes, sempre convivi com o tema das doenças raras, com os desafios de oferecer tratamento às pessoas como algo do dia a dia; e, segundo, porque o dia 27 fevereiro é o dia em que minha filha nasceu — completa hoje 16 anos. E todos nós que somos pais, filhos, sabemos que nós temos muita dificuldade em lidar com a doença do pai, da mãe, com a doença do filho, da filha e muito mais dificuldade de lidar com aquelas doenças sobre as quais nós pouco sabemos e que nós de uma coisa temos certeza, de que são doenças cujo tratamento normalmente é difícil. É difícil, por vezes, porque nós não aprendemos a lidar com tais doenças; é difícil, por vezes, porque a ciên- cia ainda não ofereceu conhecimento suficiente sobre a doença para que nós tenhamos remédios para melhorar ou para amenizar a dor das pessoas; é difícil porque o sistema de saúde lida com um conjunto de demandas e, por vezes, não consegue acolher de forma apropriada as 03345.indd 43 26/07/2013 09:29:37
  • 44. 44 | Romário • Deputado Federal pessoas que sofrem essas doenças. Então, o dia 27 de fevereiro é mar- cado, para mim, sempre por essa dupla reflexão. E acredito que se o projeto de lei do Senador Eduardo Suplicy for aprovado, criando aqui no Brasil a obrigação de pararmos no dia 27 fevereiro, menos para comemorar, mais para refletir sobre o significado e os desafios que essas doenças impõem, teremos certamente, daqui para frente, um momento sempre oportuno para isso. A Anvisa executa uma atividade que, perante o público aqui pre- sente — Parlamentares, parentes de pessoas portadoras de doenças, representantes de associações — é sempre uma atividade muito difícil e muito complexa. Regular na área da saúde impõe decisões diárias, as mais complexas e as mais difíceis todos os dias. Não é fácil lidar com o conjunto de desafios impostos a todos nós e que implicam regulação. De um lado, há a demanda por registros de medicamentos, muitos dos quais importantíssimos, usados para tratamento de doenças de difí- cil manejo, como essas doenças raras, produtos dos quais a ciência ainda não desvendou todas as suas características de eficácia e de segurança; há a responsabilidade de tomar a decisão de colocar ou não esses pro- dutos no mercado; há a responsabilidade de pensar, de um lado, com a cabeça de quem regula o mercado, mas, de outro lado, com a cabeça de quem tem de oferecer acesso das pessoas às tecnologias, com a preocu- pação de que essas tecnologias não gerem danos e, ainda mais, agravem a saúde de todo mundo. E a Anvisa vive esse contexto diariamente, os seus diretores, os seus gerentes, os seus técnicos. Há desafios de se regularem questões complicadas. Há uma decisão, tomada pela direção da Anvisa, que gera impacto na vida de mais de 20 milhões de brasileiros que são fumantes, de acabar com os aditivos que atraem os jovens para o uso do cigarro. Houve uma primeira decisão na Justiça barrando a norma da Anvisa. Ontem à noite, essa liminar foi cassada e volta a valer a norma. Nós sabemos que, aqui dentro do Congresso Nacional, há um pro- jeto de decreto legislativo para anular essa norma da Anvisa, e nós vamos continuar entendendo que a regulação na área do tabaco é importante porque protege a vida das pessoas, porque evita que novas pessoas pas- sem a ser viciadas em cigarro, principalmente os jovens do nosso País. 03345.indd 44 26/07/2013 09:29:37
  • 45. | 45Dia Mundial das Doenças Raras Temos uma briga com a questão da propaganda de alimentos. Per- demos na Justiça essa semana a validade de uma norma que impunha obrigações às empresas de alimentos para informarem pais e mães sobre os elevados teores de sal e de açúcar nesses produtos. E a Justiça disse que a Anvisa não pode fazer isso. Então, regular não é algo simples, não é algo fácil. No que se refere às doenças raras, eu trago, Deputado, primeiro uma mensagem clara, que foi orientação do Ministro da Saúde Alexandre Padilha: a Anvisa está e estará à disposição e tem trabalhado diaria- mente para que nós tenhamos um ambiente menos difícil no manejo e no tratamento dessas doenças. Nós temos uma norma na Anvisa, de 2007, que está passando por revisão agora, que prevê prioridade máxima na análise de registros de produtos que são dirigidos a essas doenças. Isso é importante, porque nós sabemos que diariamente são demandados à Anvisa registros de milhares de produtos, e nós não podemos tratar coisas diferentes de forma igual. Produtos que são de interesse para a saúde pública, nota- damente aqueles que não têm disponibilidade de terapêuticas no mer- cado, precisam ser tratados com prioridades. Já havia uma norma de 2007, que está sendo mudada agora. Isso vai ficar ainda mais claro nessa norma, que concluiu a consulta pública agora. E, nas próximas semanas, no máximo no próximo mês, essa nova norma estará já vigendo, e nós vamos ter muito mais agilidade no registro de medicamentos para essas doenças. Outra questão importante é que nós temos uma discussão aberta, em fase de conclusão, sobre o que nós chamamos de uso compassivo. É uma metodologia e um modelo de regulação sanitária que permitem que pacientes possam se utilizar de medicamentos que são estudados para essas doenças raras ainda nas etapas mais preliminares dos estudos clínicos — estudos em Fase II — que indiquem alguma possibilidade de uso de produtos para doenças que não têm tratamento. A Anvisa vai ter uma norma que facilita a inserção desses pacientes nos programas de uso compassivo que as indústrias que pesquisam esses medicamentos disponibilizam. 03345.indd 45 26/07/2013 09:29:37
  • 46. 46 | Romário • Deputado Federal Por fim, Deputado, queria enaltecer e chamar atenção para a impor- tância do Projeto de Lei nº 4.411, de 2012, de sua autoria, que trata da importação de insumos para pesquisa no Brasil. De fato, nós temos já um modelo que tem sido trabalhado pelo CNPq, pela Anvisa, pela Receita Federal, com alguns resultados muito significativos para aquelas pesquisas que acontecem sob a égide do CNPq. Nesses casos, no ano de 2012, mais de 99% dos produtos importados para pesquisa foram libe- rados pela Anvisa em menos de 24 horas. Nós temos o desafio de verificar como vamos fazer com as pesquisas que muitas vezes são feitas fora do sistema de financiamento do CNPq. E, aí, o seu projeto vai trazer para a lei algo que vimos produzindo ao longo do tempo, criando obrigações para os órgãos públicos. Isso é muito bom. E, mais do que isso — eu vi o projeto —, ele cria obrigações e responsabilidades para os pesquisadores, porque muitas vezes, aqui no Brasil, a necessidade de regulação ocorre porque nós nos acostumamos a colocar toda a responsabilidade na mão do Estado e a tirá-la da mão das pessoas que operam. Então, o projeto trata também de responsabi- lizar os pesquisadores. Isso é fundamental, porque compartilha o papel que o Estado tem de fazer, de evitar a entrada de produtos que possam colocar em risco a vida das pessoas, com a responsabilidade dos pesqui- sadores quando desenham o seu protocolo clínico e decidem incorporar e usar pacientes como voluntários para suas pesquisas. Sei que a Deputada Mara Gabrilli é a Relatora do projeto e já me coloquei à disposição. Devemos ter uma reunião nos próximos dias para debater o tema, porque a Anvisa dá todo o apoio ao projeto de lei de sua autoria. Se precisar da Anvisa, nós estamos à disposição para facilitar a tramitação e a aprovação. Nós só não votamos, mas nós pode- mos ajudar. Por isso é que eu estou aproveitando para chamar a atenção para estas duas questões importantes que, aí, sim, os senhores votam: o projeto de decreto legislativo que retira da Anvisa o poder de fazer a regulação dos aditivos do tabaco — nós entendemos que a Anvisa não extrapolou a sua competência legal e vamos ficar muito preocupados se esse projeto de decreto for aprovado, porque vai recolocar no mercado o cigarro com sabor de menta, sabor de canela, que mascara o gosto 03345.indd 46 26/07/2013 09:29:37
  • 47. | 47Dia Mundial das Doenças Raras ruim do cigarro e atrai o jovem para o vício —; e os projetos de lei que tramitam aqui e que tratam de obrigar as empresas que fazem propa- gandas de alimentos com altos teores de sal e de açúcar a informar para nós, que somos pais e mães, que aqueles alimentos têm altos teores de sal e de açúcar, para que possam ser chamadas as atenções devidas para os problemas que esses produtos causam à saúde. Isto está nas mãos dos senhores. No que nós pudermos apoiar, em relação à questão da pesquisa clí- nica, em relação a essas doenças, os senhores podem contar conosco. Muito obrigado e parabéns pelo evento. (Palmas.) (Apresentação de flash mob.) (Palmas.) O SR. APRESENTADOR (David Rayol) - Senhoras e Senho- res, após esses momentos de descontração, nós gostaríamos de dar prosseguimento ao evento, mais uma vez, pedindo aplausos ao Flash Mob., esse grupo que esteve aqui à frente (palmas.), enriquecendo e abrilhantando esse evento, assim como os demais presentes. Vamos dar continuidade ao evento. Em cumprimento a nossa programação, teremos, a partir deste momento, as palestras temáticas. Neste momento, convidamos a se dirigir a esta tribuna, para proferir a palestra sobre As Particularidades da Pesquisa Clínica para Doenças Raras, a Dra. Greyce Lousana, Presidenta Executiva da Sociedade Brasi- leira de Profissionais em Pesquisa Clínica. Esse cerimonial cumpre o dever de informar que o Senador Cás- sio Cunha Lima, devido ao cumprimento oficial da agenda de trabalho, precisou se retirar do recinto e nomeou para representá-lo à Mesa de honra o jovem Patrick Teixeira Pires, ele que é portador de mucopolis- sacaridose. Seja bem-vindo, Patrick. (Palmas.) Senhoras e Senhores, com a palavra a Dra. Greyce Lousana. A SRA. GREYCE LOUSANA – Muito obrigada. Nós estivemos aqui no ano passado e é um prazer voltar a esta Casa. Parabéns a todos os políticos da Mesa, Deputados e Senadores. A ideia é que falemos um pouco de pesquisa e das particularidades em se fazer pesquisa clínica em doenças raras. Quando falamos em fazer 03345.indd 47 26/07/2013 09:29:37
  • 48. 48 | Romário • Deputado Federal pesquisa, a pesquisa clínica especificamente — estivemos há pouco com o Presidente da Anvisa —, e pela manhã parece que houve alguma dis- cussão nesse sentido, quero dizer que pesquisa clínica é uma coisa que se faz não só com medicamento. As pessoas têm insistido nisso, e nós insistimos bastante, ou seja, pesquisa clínica é uma coisa que se faz para medicamentos, para cosméticos, para procedimentos, para produtos para a saúde. Então, nós fazemos pesquisa com tudo aquilo que estará sujeito à vigilância, mas também com outras ações, por exemplo, na parte de comportamento, na parte de procedimentos. Então, pesquisa clínica é uma coisa bastante ampla. Nesse sentido, além de fazer pesquisa com muitas coisas, o grande objetivo de todos é a qualidade de vida. Ninguém faz pesquisa porque quer fazer pesquisa para nada. Queremos fazer pesquisa porque de alguma forma queremos contribuir com a qualidade de vida das pessoas. Um dado importante, quando falamos em doenças raras, mostra que o mundo hoje conduz 141 mil estudos. Dos 141 mil estudos que estão sendo conduzidos no mundo, o Brasil consegue fazer só 3.200 des- sas pesquisas. O Brasil faz muito pouca pesquisa frente ao potencial que nós teríamos para conduzir mais estudos. Com relações às doenças raras, no Brasil nós temos hoje cadastra- dos, numa base de dados internacionais, só 16 estudos sendo conduzi- dos. Isso é muito pouco se imaginarmos o contingente de pessoas aco- metidas por doenças raras. Seguramente, o Brasil poderia fazer muito mais pesquisa do que fazemos hoje. Nesse sentido, o que precisamos para fazer pesquisa? Primeiro, pre- cisamos de conhecimento. Não é fácil fazer pesquisa clínica. As pessoas imaginam... Inclusive, uns dos grandes problemas no Brasil, hoje, são as incubadoras financiadas muitas vezes por empresas privadas e pelo governo. Esses meninos que estão nessas incubadoras de grandes ins- tituições universitárias desenvolvem pesquisas durante 1 ano, 2 anos, 3 anos, 4 anos. No momento em que eles terminam suas pesquisas e tentam fazer o registro desses produtos originários nessas incubadoras, eles não conseguem registrar porque descobrem que não fizeram pes- quisa clínica ou não fizeram um planejamento adequado para conseguir registro para essas pesquisas. 03345.indd 48 26/07/2013 09:29:37
  • 49. | 49Dia Mundial das Doenças Raras Temos tentado discutir com o pessoal das incubadoras que esses jovens precisam ser melhores orientados. Eles precisam conhecer as regras para não perder dinheiro que está sendo investido nessas incu- badoras e em muitas empresas, e depois esses estudos não conseguem seguir por falta de conhecimento. Para fazer pesquisa, eu preciso de recurso, mas não é só de dinheiro. Sempre que falamos de recursos, as pessoas pensam: vocês querem dinheiro. Não necessariamente. Não queremos só prédio bonito. Que- remos equipe treinada. Treinamento é alguma coisa que não se faz em um dia, treinamento é uma coisa continuada. Demora muito para for- mar um pesquisador. Às vezes, as pessoas não têm ideia do tempo que se leva não para formar um médico, mas um médico que saiba fazer pesquisa. Não são todos os médicos que são bons pesquisadores, assim como não são todos os farmacêuticos que são bons pesquisadores. Formar um pesquisador é alguma coisa que demanda muito tempo. Evidente que precisamos de estrutura física, estrutura de equipa- mento. Hoje visitamos serviços que se dizem serviços que conduzem pesquisas em doenças raras que são, do ponto de vista sanitário, lamen- táveis, não teriam condições sequer de fazer assistência, quanto mais de conduzir pesquisa. Do que mais precisamos? Precisamos de regulatório, precisamos da Anvisa, mas também precisamos de um ambiente ético. Há um ano estivemos nesta Casa, e uma coisa me preocupa: várias pessoas da Mesa, o representante do ilustríssimo Ministro da Saúde disse que durante o último ano trabalharam muito num grupo de discussão e que será colocada em consulta pública uma norma que seguramente vai fazer do Brasil um País diferente com relação às doenças raras. O Presidente da Anvisa disse que existe uma norma que deve ser colocada em prática, que fala sobre acesso expandido, sobre uso compassivo. O que me pre- ocupa é que existem consultas públicas, existem normas, mas elas ainda não estão funcionando. Com relação a acesso expandido e uso compassivo, essa norma é uma consulta pública de 2011, foi amplamente discutida, mas até hoje não saiu do papel. 03345.indd 49 26/07/2013 09:29:37