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DONA FLORINDA
         DAS SETE
          CHAVES
   Em casa da Dona Florinda não havia nada aberto.
  Claro que a porta da rua estava sempre fechada. E a sete
chaves. Até aqui tudo certo.
  Mas fechadas também estavam a porta da despensa, a
porta do quarto de arrumações, a porta do quarto da Dona
Florinda, a porta da casa de banho, a porta da cozinha, a
porta da salinha, a porta do salão.
  A Dona Florinda andava sempre com um molho de
chaves à cinta. Por cada porta que fechava, por cada volta
que dava a uma fechadura, a Dona Florinda dizia "Trru,
está fechada!" Muito contente.

                            1
A gente nem percebia qual o motivo de tanto cuidado.
Seria que a Dona Florinda não queria deixar entrar o ar lá
em casa? Seria que a Dona Florinda não queria deixar sair
o ar lá de casa? Ou seria que a Dona Florinda tinha medo
que o ar lá de casa apanhasse correntes de ar?
  Vivia sozinha a Dona Florinda. Com aquele feitio de
tudo fechar, de tudo guardar bem fechado, a Dona Florinda
claro que não podia viver acompanhada.
  Para as gavetas tinha outro molho com todas as
chavinhas. E por cada gaveta fechada a Dona Florinda tam-
bém dizia: "Trru, está fechada!"
  Mas onde é que a Dona Florinda guardava as chaves,
quando à noite se deitava? Guardava numa caixinha, que
fechava e metia dentro de uma caixa, que fechava e metia
dentro de uma gaveta, que fechava e... "Trru, está fecha-
da!", mais nada. As três chaves, a da gaveta, a da caixa e a
da caixinha, pendurava-as num fio que usava sempre ao
pescoço, quer de dia quer de noite. Coitada!
  Um dia, como se está mesmo a ver, o fio partiu-se e a
Dona Florinda perdeu as chaves. Sumiram-se as três
chaves que abriam a gaveta, a caixa e a caixinha, a tal
caixinha onde estavam guardadas todas as outras chaves.
Que fazer? E tudo fechado...
  Sim, que fazer? Arrombar a gaveta, rebentar a caixa,
partir a caixinha e recuperar as outras chaves. Depois abrir
as portas, as gavetas, os armários, de par em par. Isto faria
qualquer pessoa, que não fosse a Dona Florinda.
  Desesperada de procurar as três chaves, mães das outras
todas, a Dona Florinda abriu a única porta que tinha à mão.
A da varanda. E pôs-se a gritar:
  – Estou fechada. Socorro. Estou fechada.

                             2
Vieram os bombeiros, lançaram a escada e trouxeram a
Dona Florinda da varanda à rua.
   E agora? Agora a Dona Florinda anda à procura de um
nova casa onde morar – uma casa com novas fechaduras,
novas chaves.
   E a casa antiga da Dona Florinda? Essa, definitivamente,
trru, está fechada.

  FIM




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79709645 01-31-d-florinda-das-sete-chaves

  • 1. DONA FLORINDA DAS SETE CHAVES Em casa da Dona Florinda não havia nada aberto. Claro que a porta da rua estava sempre fechada. E a sete chaves. Até aqui tudo certo. Mas fechadas também estavam a porta da despensa, a porta do quarto de arrumações, a porta do quarto da Dona Florinda, a porta da casa de banho, a porta da cozinha, a porta da salinha, a porta do salão. A Dona Florinda andava sempre com um molho de chaves à cinta. Por cada porta que fechava, por cada volta que dava a uma fechadura, a Dona Florinda dizia "Trru, está fechada!" Muito contente. 1
  • 2. A gente nem percebia qual o motivo de tanto cuidado. Seria que a Dona Florinda não queria deixar entrar o ar lá em casa? Seria que a Dona Florinda não queria deixar sair o ar lá de casa? Ou seria que a Dona Florinda tinha medo que o ar lá de casa apanhasse correntes de ar? Vivia sozinha a Dona Florinda. Com aquele feitio de tudo fechar, de tudo guardar bem fechado, a Dona Florinda claro que não podia viver acompanhada. Para as gavetas tinha outro molho com todas as chavinhas. E por cada gaveta fechada a Dona Florinda tam- bém dizia: "Trru, está fechada!" Mas onde é que a Dona Florinda guardava as chaves, quando à noite se deitava? Guardava numa caixinha, que fechava e metia dentro de uma caixa, que fechava e metia dentro de uma gaveta, que fechava e... "Trru, está fecha- da!", mais nada. As três chaves, a da gaveta, a da caixa e a da caixinha, pendurava-as num fio que usava sempre ao pescoço, quer de dia quer de noite. Coitada! Um dia, como se está mesmo a ver, o fio partiu-se e a Dona Florinda perdeu as chaves. Sumiram-se as três chaves que abriam a gaveta, a caixa e a caixinha, a tal caixinha onde estavam guardadas todas as outras chaves. Que fazer? E tudo fechado... Sim, que fazer? Arrombar a gaveta, rebentar a caixa, partir a caixinha e recuperar as outras chaves. Depois abrir as portas, as gavetas, os armários, de par em par. Isto faria qualquer pessoa, que não fosse a Dona Florinda. Desesperada de procurar as três chaves, mães das outras todas, a Dona Florinda abriu a única porta que tinha à mão. A da varanda. E pôs-se a gritar: – Estou fechada. Socorro. Estou fechada. 2
  • 3. Vieram os bombeiros, lançaram a escada e trouxeram a Dona Florinda da varanda à rua. E agora? Agora a Dona Florinda anda à procura de um nova casa onde morar – uma casa com novas fechaduras, novas chaves. E a casa antiga da Dona Florinda? Essa, definitivamente, trru, está fechada. FIM 3