SlideShare uma empresa Scribd logo
1 de 3
Baixar para ler offline
ESCOLA ESTADUAL FERNANDO MELO VIANA
Pluralidade Cultural
Abaporu: o homem que come...
Disciplina: Temas Transversais – 4º bimestre
As artes plásticas
também sinalizavam
essa mudança de
valores. O quadro de
Tarsila do Amaral, O
abaporu, causou
grande impacto na
época. O nome
"abaporu" é indígena
e significa: aba
(homem) e peru
(come). juntando os
dois significados,
temos "o homem que
come".
O quadro causou
forte impressão na
época.
Suas
perspectivas
eram
inovadoras.
Tarsila
rompia com a chamada arte figurativa e com a descrição da
natureza. Como se pode ver, ela construiu uma imagem bem
original.
Em primeiro plano, o pé enorme. A mão também. O rosto lá em
cima, bem pequeno. O braço sustentando o rosto sugeria um
gesto de meditação. O que chama a atenção é a desproporção
com que foi pintado o corpo - um recurso proposital. Tarsila
queria destacar os traços que considerava mais significativos. Os
pés lembravam o chão, as raízes. Já vimos o quanto era
importante para os modernistas a idéia das raízes culturais
brasileiras. O que significava pôr-se em contato direto com a terra,
sorver suas influências como seiva.
Ao lado do abaporu, Tarsila pintou um sol ardente. Queria passar
a impressão de clima tropical e de calor. A figura é morena,
cabocla, mas é também algo que escapole a classificações. Não
usa nenhuma roupa. Parece plenamente integrada à paisagem.
Para alguns modernistas, a imagem do abaporu passou a significar
a imagem do homem brasileiro. A cara do homem brasileiro. Caía
a máscara do pierrô francês para aparecer o abaporu: o homem
que come. Mas por que essa ideia do homem que come?
A imagem simbolizava a capacidade do brasileiro de absorver as
mais variadas culturas. O quadro de Tarsila do Amaral era a
expressão de uma corrente do pensamento modernista: a
antropofágica. Liderado por Oswald de Andrade, o grupo
antropofágico oferecia uma interpretação específica do Brasil.
Por que a antropofagia? Vejamos a explicação dada por Oswald:
os índios, nossos ancestrais, tinham por hábito comer seus
semelhantes para reter suas qualidades. A idéia era mostrar que o
abaporu era um "comedor de culturas". Só que agora, na década
de 1920, ele não comia mais indistintamente. Sabia escolher o que
lhe interessava. Era urna crítica à absorção desenfreada de
modelos culturais europeus.
No Manifesto antropofágico, publicado em maio de 1928, Oswald
desafiava:

Professor: Mailon Maciel

Data: ____/____/2013

Tupi or not tupi, that is the questiono
Reparem a sonoridade e também a solenidade contida nessa
frase.
Ela é urna paráfrase da fala de um personagem de Shakespeare:
"To be or not to bel" Ao retornar a frase, Oswald comete
propositalmente um ato antropofágico. Ele vai até a obra de
Shakespeare, seleciona a frase, mas não a transcreve tal como ela
está lá. Ele a recria de acordo com nosso contexto histórico. E
nossa questão é: ser ou não ser tupi!
Em outras palavras: não há como negar nossas raízes ancestrais!
Com isso, o grupo antropofágico não estava simplesmente
recusando a influência das idéias européias aqui no Brasil. Não
fechava as portas ao que vinha de fora. Mostrava apenas a
impossibilidade de receber essas influências sem criticá-las. Era
preciso adequar as idéias ao nosso contexto e às nossas vivências.
Esse era o grande recado para o qual se chamava a atenção.
Absorver influências externas sim, mas de maneira seletiva.
O próprio movimento modernista paulista se inspirou nos
movimentos da vanguarda européia, como o expressionismo, o
futurismo, o dadaísmo, o cubismo e o surrealismo. Mas procurou
absorver essas influências de forma crítica, vendo o que elas
tinham em comum com nossa realidade histórica.
Por isso a imagem do abaporu, o homem que come, ou seja, que
rumina e absorve. Mas só absorve as coisas que interessam, que
podem ajudar a construir a nacionalidade. O abaporu foi
claramente inspirado em nossa mistura étnica e cultural. Antes do
modernismo, era problemático reconhecer a imagem de um Brasil
negro e índio. A maior parte de nossos intelectuais preferia negar
o fato ou, então, narrar a realidade de uma maneira ufanista e
idealizada, como já vimos.
Antes de as frotas portuguesas chegarem aqui, essas terras
tinham o nome de Pindorama. Nela habitavam aproximadamente
5 milhões de índios. Existia vida, existia toda uma cultura que foi e
continua sendo dizimada.
Desde o momento em que Pedro Álvares Cabral chegou ao Brasil,
o índio deixou de ser o dono destas terras. Sua cultura foi
considerada primitiva e inferior. Com o negro aconteceu a mesma
coisa. Foi feito escravo e, durante o período colonial e o Império,
trabalhou nas plantações de cana-de-açúcar, na extração do ouro
e também nas lavouras cafeeiras.
Para justificar tal feito, criou-se uma ideologia segundo a qual o
"negro não tinha alma". Transformando o negro em uma espécie
de "animal doméstico", podia-se escravizá-lo. Sua cultura foi
perseguida como selvageria, ignorância, expressão de um mundo
não-civilizado. No entanto, hoje reconhecemos a influência
decisiva da cultura afro-brasileira em nossa história. Mas, na
década de 1920, esses valores estavam apenas começando a se
impor. Os modernistas faziam questão de valorizar nossas
tradições culturais.

Livro: “Que cara tem o Brasil” As maneiras de pensar e sentir o
nosso país. Monica Velloso Ano: 2000
ESCOLA ESTADUAL FERNANDO MELO VIANA
Pluralidade Cultural
Abaporu: o homem que come...
Disciplina: Temas Transversais – 4º bimestre
As artes plásticas
também sinalizavam
essa mudança de
valores. O quadro de
Tarsila do Amaral, O
abaporu, causou
grande impacto na
época. O nome
"abaporu" é indígena
e significa: aba
(homem) e peru
(come). juntando os
dois significados,
temos "o homem que
come".
O quadro causou
forte impressão na
época.
Suas
perspectivas
eram
inovadoras.
Tarsila
rompia com a chamada arte figurativa e com a descrição da
natureza. Como se pode ver, ela construiu uma imagem bem
original.
Em primeiro plano, o pé enorme. A mão também. O rosto lá em
cima, bem pequeno. O braço sustentando o rosto sugeria um
gesto de meditação. O que chama a atenção é a desproporção
com que foi pintado o corpo - um recurso proposital. Tarsila
queria destacar os traços que considerava mais significativos. Os
pés lembravam o chão, as raízes. Já vimos o quanto era
importante para os modernistas a idéia das raízes culturais
brasileiras. O que significava pôr-se em contato direto com a terra,
sorver suas influências como seiva.
Ao lado do abaporu, Tarsila pintou um sol ardente. Queria passar
a impressão de clima tropical e de calor. A figura é morena,
cabocla, mas é também algo que escapole a classificações. Não
usa nenhuma roupa. Parece plenamente integrada à paisagem.
Para alguns modernistas, a imagem do abaporu passou a significar
a imagem do homem brasileiro. A cara do homem brasileiro. Caía
a máscara do pierrô francês para aparecer o abaporu: o homem
que come. Mas por que essa idéia do homem que come?
A imagem simbolizava a capacidade do brasileiro de absorver as
mais variadas culturas. O quadro de Tarsila do Amaral era a
expressão de uma corrente do pensamento modernista: a
antropofágica. Liderado por Oswald de Andrade, o grupo
antropofágico oferecia uma interpretação específica do Brasil.
Por que a antropofagia? Vejamos a explicação dada por Oswald:
os índios, nossos ancestrais, tinham por hábito comer seus
semelhantes para reter suas qualidades. A idéia era mostrar que o
abaporu era um "comedor de culturas". Só que agora, na década
de 1920, ele não comia mais indistintamente. Sabia escolher o que
lhe interessava. Era urna crítica à absorção desenfreada de
modelos culturais europeus.
No Manifesto antropofágico, publicado em maio de 1928, Oswald
desafiava:

Professor: Mailon Maciel

Data: ____/____/2013

Tupi or not tupi, that is the questiono
Reparem a sonoridade e também a solenidade contida nessa
frase.
Ela é urna paráfrase da fala de um personagem de Shakespeare:
"To be or not to bel" Ao retornar a frase, Oswald comete
propositalmente um ato antropofágico. Ele vai até a obra de
Shakespeare, seleciona a frase, mas não a transcreve tal como ela
está lá. Ele a recria de acordo com nosso contexto histórico. E
nossa questão é: ser ou não ser tupi!
Em outras palavras: não há como negar nossas raízes ancestrais!
Com isso, o grupo antropofágico não estava simplesmente
recusando a influência das idéias européias aqui no Brasil. Não
fechava as portas ao que vinha de fora. Mostrava apenas a
impossibilidade de receber essas influências sem criticá-las. Era
preciso adequar as idéias ao nosso contexto e às nossas vivências.
Esse era o grande recado para o qual se chamava a atenção.
Absorver influências externas sim, mas de maneira seletiva.
O próprio movimento modernista paulista se inspirou nos
movimentos da vanguarda européia, como o expressionismo, o
futurismo, o dadaísmo, o cubismo e o surrealismo. Mas procurou
absorver essas influências de forma crítica, vendo o que elas
tinham em comum com nossa realidade histórica.
Por isso a imagem do abaporu, o homem que come, ou seja, que
rumina e absorve. Mas só absorve as coisas que interessam, que
podem ajudar a construir a nacionalidade. O abaporu foi
claramente inspirado em nossa mistura étnica e cultural. Antes do
modernismo, era problemático reconhecer a imagem de um Brasil
negro e índio. A maior parte de nossos intelectuais preferia negar
o fato ou, então, narrar a realidade de uma maneira ufanista e
idealizada, como já vimos.
Antes de as frotas portuguesas chegarem aqui, essas terras
tinham o nome de Pindorama. Nela habitavam aproximadamente
5 milhões de índios. Existia vida, existia toda uma cultura que foi e
continua sendo dizimada.
Desde o momento em que Pedro Álvares Cabral chegou ao Brasil,
o índio deixou de ser o dono destas terras. Sua cultura foi
considerada primitiva e inferior. Com o negro aconteceu a mesma
coisa. Foi feito escravo e, durante o período colonial e o Império,
trabalhou nas plantações de cana-de-açúcar, na extração do ouro
e também nas lavouras cafeeiras.
Para justificar tal feito, criou-se uma ideologia segundo a qual o
"negro não tinha alma". Transformando o negro em uma espécie
de "animal doméstico", podia-se escravizá-lo. Sua cultura foi
perseguida como selvageria, ignorância, expressão de um mundo
não-civilizado. No entanto, hoje reconhecemos a influência
decisiva da cultura afro-brasileira em nossa história. Mas, na
década de 1920, esses valores estavam apenas começando a se
impor. Os modernistas faziam questão de valorizar nossas
tradições culturais.

Livro: “Que cara tem o Brasil” As maneiras de pensar e sentir o
nosso país. Monica Velloso Ano: 2000
Pluralidade Cultural - Abaporu

Mais conteúdo relacionado

Último

Responde ou passa na HISTÓRIA - REVOLUÇÃO INDUSTRIAL - 8º ANO.pptx
Responde ou passa na HISTÓRIA - REVOLUÇÃO INDUSTRIAL - 8º ANO.pptxResponde ou passa na HISTÓRIA - REVOLUÇÃO INDUSTRIAL - 8º ANO.pptx
Responde ou passa na HISTÓRIA - REVOLUÇÃO INDUSTRIAL - 8º ANO.pptx
AntonioVieira539017
 
Os editoriais, reportagens e entrevistas.pptx
Os editoriais, reportagens e entrevistas.pptxOs editoriais, reportagens e entrevistas.pptx
Os editoriais, reportagens e entrevistas.pptx
TailsonSantos1
 
19- Pedagogia (60 mapas mentais) - Amostra.pdf
19- Pedagogia (60 mapas mentais) - Amostra.pdf19- Pedagogia (60 mapas mentais) - Amostra.pdf
19- Pedagogia (60 mapas mentais) - Amostra.pdf
marlene54545
 

Último (20)

Currículo - Ícaro Kleisson - Tutor acadêmico.pdf
Currículo - Ícaro Kleisson - Tutor acadêmico.pdfCurrículo - Ícaro Kleisson - Tutor acadêmico.pdf
Currículo - Ícaro Kleisson - Tutor acadêmico.pdf
 
Slides Lição 6, Betel, Ordenança para uma vida de obediência e submissão.pptx
Slides Lição 6, Betel, Ordenança para uma vida de obediência e submissão.pptxSlides Lição 6, Betel, Ordenança para uma vida de obediência e submissão.pptx
Slides Lição 6, Betel, Ordenança para uma vida de obediência e submissão.pptx
 
Aula 1 - Psicologia Cognitiva, aula .ppt
Aula 1 - Psicologia Cognitiva, aula .pptAula 1 - Psicologia Cognitiva, aula .ppt
Aula 1 - Psicologia Cognitiva, aula .ppt
 
Responde ou passa na HISTÓRIA - REVOLUÇÃO INDUSTRIAL - 8º ANO.pptx
Responde ou passa na HISTÓRIA - REVOLUÇÃO INDUSTRIAL - 8º ANO.pptxResponde ou passa na HISTÓRIA - REVOLUÇÃO INDUSTRIAL - 8º ANO.pptx
Responde ou passa na HISTÓRIA - REVOLUÇÃO INDUSTRIAL - 8º ANO.pptx
 
Tema de redação - As dificuldades para barrar o casamento infantil no Brasil ...
Tema de redação - As dificuldades para barrar o casamento infantil no Brasil ...Tema de redação - As dificuldades para barrar o casamento infantil no Brasil ...
Tema de redação - As dificuldades para barrar o casamento infantil no Brasil ...
 
Apresentação ISBET Jovem Aprendiz e Estágio 2023.pdf
Apresentação ISBET Jovem Aprendiz e Estágio 2023.pdfApresentação ISBET Jovem Aprendiz e Estágio 2023.pdf
Apresentação ISBET Jovem Aprendiz e Estágio 2023.pdf
 
APRESENTAÇÃO - BEHAVIORISMO - TEORIA DA APRENDIZAGEM.pdf
APRESENTAÇÃO - BEHAVIORISMO - TEORIA DA APRENDIZAGEM.pdfAPRESENTAÇÃO - BEHAVIORISMO - TEORIA DA APRENDIZAGEM.pdf
APRESENTAÇÃO - BEHAVIORISMO - TEORIA DA APRENDIZAGEM.pdf
 
P P P 2024 - *CIEJA Santana / Tucuruvi*
P P P 2024  - *CIEJA Santana / Tucuruvi*P P P 2024  - *CIEJA Santana / Tucuruvi*
P P P 2024 - *CIEJA Santana / Tucuruvi*
 
classe gramatical Substantivo apresentação..pptx
classe gramatical Substantivo apresentação..pptxclasse gramatical Substantivo apresentação..pptx
classe gramatical Substantivo apresentação..pptx
 
A Revolução Francesa. Liberdade, Igualdade e Fraternidade são os direitos que...
A Revolução Francesa. Liberdade, Igualdade e Fraternidade são os direitos que...A Revolução Francesa. Liberdade, Igualdade e Fraternidade são os direitos que...
A Revolução Francesa. Liberdade, Igualdade e Fraternidade são os direitos que...
 
Introdução às Funções 9º ano: Diagrama de flexas, Valor numérico de uma funçã...
Introdução às Funções 9º ano: Diagrama de flexas, Valor numérico de uma funçã...Introdução às Funções 9º ano: Diagrama de flexas, Valor numérico de uma funçã...
Introdução às Funções 9º ano: Diagrama de flexas, Valor numérico de uma funçã...
 
6ano variação linguística ensino fundamental.pptx
6ano variação linguística ensino fundamental.pptx6ano variação linguística ensino fundamental.pptx
6ano variação linguística ensino fundamental.pptx
 
3 2 - termos-integrantes-da-oracao-.pptx
3 2 - termos-integrantes-da-oracao-.pptx3 2 - termos-integrantes-da-oracao-.pptx
3 2 - termos-integrantes-da-oracao-.pptx
 
Os editoriais, reportagens e entrevistas.pptx
Os editoriais, reportagens e entrevistas.pptxOs editoriais, reportagens e entrevistas.pptx
Os editoriais, reportagens e entrevistas.pptx
 
Aula prática JOGO-Regencia-Verbal-e-Nominal.pdf
Aula prática JOGO-Regencia-Verbal-e-Nominal.pdfAula prática JOGO-Regencia-Verbal-e-Nominal.pdf
Aula prática JOGO-Regencia-Verbal-e-Nominal.pdf
 
Apresentação | Dia da Europa 2024 - Celebremos a União Europeia!
Apresentação | Dia da Europa 2024 - Celebremos a União Europeia!Apresentação | Dia da Europa 2024 - Celebremos a União Europeia!
Apresentação | Dia da Europa 2024 - Celebremos a União Europeia!
 
Monoteísmo, Politeísmo, Panteísmo 7 ANO2.pptx
Monoteísmo, Politeísmo, Panteísmo 7 ANO2.pptxMonoteísmo, Politeísmo, Panteísmo 7 ANO2.pptx
Monoteísmo, Politeísmo, Panteísmo 7 ANO2.pptx
 
Cartão de crédito e fatura do cartão.pptx
Cartão de crédito e fatura do cartão.pptxCartão de crédito e fatura do cartão.pptx
Cartão de crédito e fatura do cartão.pptx
 
O que é arte. Definição de arte. História da arte.
O que é arte. Definição de arte. História da arte.O que é arte. Definição de arte. História da arte.
O que é arte. Definição de arte. História da arte.
 
19- Pedagogia (60 mapas mentais) - Amostra.pdf
19- Pedagogia (60 mapas mentais) - Amostra.pdf19- Pedagogia (60 mapas mentais) - Amostra.pdf
19- Pedagogia (60 mapas mentais) - Amostra.pdf
 

Destaque

How Race, Age and Gender Shape Attitudes Towards Mental Health
How Race, Age and Gender Shape Attitudes Towards Mental HealthHow Race, Age and Gender Shape Attitudes Towards Mental Health
How Race, Age and Gender Shape Attitudes Towards Mental Health
ThinkNow
 
Social Media Marketing Trends 2024 // The Global Indie Insights
Social Media Marketing Trends 2024 // The Global Indie InsightsSocial Media Marketing Trends 2024 // The Global Indie Insights
Social Media Marketing Trends 2024 // The Global Indie Insights
Kurio // The Social Media Age(ncy)
 

Destaque (20)

Product Design Trends in 2024 | Teenage Engineerings
Product Design Trends in 2024 | Teenage EngineeringsProduct Design Trends in 2024 | Teenage Engineerings
Product Design Trends in 2024 | Teenage Engineerings
 
How Race, Age and Gender Shape Attitudes Towards Mental Health
How Race, Age and Gender Shape Attitudes Towards Mental HealthHow Race, Age and Gender Shape Attitudes Towards Mental Health
How Race, Age and Gender Shape Attitudes Towards Mental Health
 
AI Trends in Creative Operations 2024 by Artwork Flow.pdf
AI Trends in Creative Operations 2024 by Artwork Flow.pdfAI Trends in Creative Operations 2024 by Artwork Flow.pdf
AI Trends in Creative Operations 2024 by Artwork Flow.pdf
 
Skeleton Culture Code
Skeleton Culture CodeSkeleton Culture Code
Skeleton Culture Code
 
PEPSICO Presentation to CAGNY Conference Feb 2024
PEPSICO Presentation to CAGNY Conference Feb 2024PEPSICO Presentation to CAGNY Conference Feb 2024
PEPSICO Presentation to CAGNY Conference Feb 2024
 
Content Methodology: A Best Practices Report (Webinar)
Content Methodology: A Best Practices Report (Webinar)Content Methodology: A Best Practices Report (Webinar)
Content Methodology: A Best Practices Report (Webinar)
 
How to Prepare For a Successful Job Search for 2024
How to Prepare For a Successful Job Search for 2024How to Prepare For a Successful Job Search for 2024
How to Prepare For a Successful Job Search for 2024
 
Social Media Marketing Trends 2024 // The Global Indie Insights
Social Media Marketing Trends 2024 // The Global Indie InsightsSocial Media Marketing Trends 2024 // The Global Indie Insights
Social Media Marketing Trends 2024 // The Global Indie Insights
 
Trends In Paid Search: Navigating The Digital Landscape In 2024
Trends In Paid Search: Navigating The Digital Landscape In 2024Trends In Paid Search: Navigating The Digital Landscape In 2024
Trends In Paid Search: Navigating The Digital Landscape In 2024
 
5 Public speaking tips from TED - Visualized summary
5 Public speaking tips from TED - Visualized summary5 Public speaking tips from TED - Visualized summary
5 Public speaking tips from TED - Visualized summary
 
ChatGPT and the Future of Work - Clark Boyd
ChatGPT and the Future of Work - Clark Boyd ChatGPT and the Future of Work - Clark Boyd
ChatGPT and the Future of Work - Clark Boyd
 
Getting into the tech field. what next
Getting into the tech field. what next Getting into the tech field. what next
Getting into the tech field. what next
 
Google's Just Not That Into You: Understanding Core Updates & Search Intent
Google's Just Not That Into You: Understanding Core Updates & Search IntentGoogle's Just Not That Into You: Understanding Core Updates & Search Intent
Google's Just Not That Into You: Understanding Core Updates & Search Intent
 
How to have difficult conversations
How to have difficult conversations How to have difficult conversations
How to have difficult conversations
 
Introduction to Data Science
Introduction to Data ScienceIntroduction to Data Science
Introduction to Data Science
 
Time Management & Productivity - Best Practices
Time Management & Productivity -  Best PracticesTime Management & Productivity -  Best Practices
Time Management & Productivity - Best Practices
 
The six step guide to practical project management
The six step guide to practical project managementThe six step guide to practical project management
The six step guide to practical project management
 
Beginners Guide to TikTok for Search - Rachel Pearson - We are Tilt __ Bright...
Beginners Guide to TikTok for Search - Rachel Pearson - We are Tilt __ Bright...Beginners Guide to TikTok for Search - Rachel Pearson - We are Tilt __ Bright...
Beginners Guide to TikTok for Search - Rachel Pearson - We are Tilt __ Bright...
 
Unlocking the Power of ChatGPT and AI in Testing - A Real-World Look, present...
Unlocking the Power of ChatGPT and AI in Testing - A Real-World Look, present...Unlocking the Power of ChatGPT and AI in Testing - A Real-World Look, present...
Unlocking the Power of ChatGPT and AI in Testing - A Real-World Look, present...
 
12 Ways to Increase Your Influence at Work
12 Ways to Increase Your Influence at Work12 Ways to Increase Your Influence at Work
12 Ways to Increase Your Influence at Work
 

Pluralidade Cultural - Abaporu

  • 1. ESCOLA ESTADUAL FERNANDO MELO VIANA Pluralidade Cultural Abaporu: o homem que come... Disciplina: Temas Transversais – 4º bimestre As artes plásticas também sinalizavam essa mudança de valores. O quadro de Tarsila do Amaral, O abaporu, causou grande impacto na época. O nome "abaporu" é indígena e significa: aba (homem) e peru (come). juntando os dois significados, temos "o homem que come". O quadro causou forte impressão na época. Suas perspectivas eram inovadoras. Tarsila rompia com a chamada arte figurativa e com a descrição da natureza. Como se pode ver, ela construiu uma imagem bem original. Em primeiro plano, o pé enorme. A mão também. O rosto lá em cima, bem pequeno. O braço sustentando o rosto sugeria um gesto de meditação. O que chama a atenção é a desproporção com que foi pintado o corpo - um recurso proposital. Tarsila queria destacar os traços que considerava mais significativos. Os pés lembravam o chão, as raízes. Já vimos o quanto era importante para os modernistas a idéia das raízes culturais brasileiras. O que significava pôr-se em contato direto com a terra, sorver suas influências como seiva. Ao lado do abaporu, Tarsila pintou um sol ardente. Queria passar a impressão de clima tropical e de calor. A figura é morena, cabocla, mas é também algo que escapole a classificações. Não usa nenhuma roupa. Parece plenamente integrada à paisagem. Para alguns modernistas, a imagem do abaporu passou a significar a imagem do homem brasileiro. A cara do homem brasileiro. Caía a máscara do pierrô francês para aparecer o abaporu: o homem que come. Mas por que essa ideia do homem que come? A imagem simbolizava a capacidade do brasileiro de absorver as mais variadas culturas. O quadro de Tarsila do Amaral era a expressão de uma corrente do pensamento modernista: a antropofágica. Liderado por Oswald de Andrade, o grupo antropofágico oferecia uma interpretação específica do Brasil. Por que a antropofagia? Vejamos a explicação dada por Oswald: os índios, nossos ancestrais, tinham por hábito comer seus semelhantes para reter suas qualidades. A idéia era mostrar que o abaporu era um "comedor de culturas". Só que agora, na década de 1920, ele não comia mais indistintamente. Sabia escolher o que lhe interessava. Era urna crítica à absorção desenfreada de modelos culturais europeus. No Manifesto antropofágico, publicado em maio de 1928, Oswald desafiava: Professor: Mailon Maciel Data: ____/____/2013 Tupi or not tupi, that is the questiono Reparem a sonoridade e também a solenidade contida nessa frase. Ela é urna paráfrase da fala de um personagem de Shakespeare: "To be or not to bel" Ao retornar a frase, Oswald comete propositalmente um ato antropofágico. Ele vai até a obra de Shakespeare, seleciona a frase, mas não a transcreve tal como ela está lá. Ele a recria de acordo com nosso contexto histórico. E nossa questão é: ser ou não ser tupi! Em outras palavras: não há como negar nossas raízes ancestrais! Com isso, o grupo antropofágico não estava simplesmente recusando a influência das idéias européias aqui no Brasil. Não fechava as portas ao que vinha de fora. Mostrava apenas a impossibilidade de receber essas influências sem criticá-las. Era preciso adequar as idéias ao nosso contexto e às nossas vivências. Esse era o grande recado para o qual se chamava a atenção. Absorver influências externas sim, mas de maneira seletiva. O próprio movimento modernista paulista se inspirou nos movimentos da vanguarda européia, como o expressionismo, o futurismo, o dadaísmo, o cubismo e o surrealismo. Mas procurou absorver essas influências de forma crítica, vendo o que elas tinham em comum com nossa realidade histórica. Por isso a imagem do abaporu, o homem que come, ou seja, que rumina e absorve. Mas só absorve as coisas que interessam, que podem ajudar a construir a nacionalidade. O abaporu foi claramente inspirado em nossa mistura étnica e cultural. Antes do modernismo, era problemático reconhecer a imagem de um Brasil negro e índio. A maior parte de nossos intelectuais preferia negar o fato ou, então, narrar a realidade de uma maneira ufanista e idealizada, como já vimos. Antes de as frotas portuguesas chegarem aqui, essas terras tinham o nome de Pindorama. Nela habitavam aproximadamente 5 milhões de índios. Existia vida, existia toda uma cultura que foi e continua sendo dizimada. Desde o momento em que Pedro Álvares Cabral chegou ao Brasil, o índio deixou de ser o dono destas terras. Sua cultura foi considerada primitiva e inferior. Com o negro aconteceu a mesma coisa. Foi feito escravo e, durante o período colonial e o Império, trabalhou nas plantações de cana-de-açúcar, na extração do ouro e também nas lavouras cafeeiras. Para justificar tal feito, criou-se uma ideologia segundo a qual o "negro não tinha alma". Transformando o negro em uma espécie de "animal doméstico", podia-se escravizá-lo. Sua cultura foi perseguida como selvageria, ignorância, expressão de um mundo não-civilizado. No entanto, hoje reconhecemos a influência decisiva da cultura afro-brasileira em nossa história. Mas, na década de 1920, esses valores estavam apenas começando a se impor. Os modernistas faziam questão de valorizar nossas tradições culturais. Livro: “Que cara tem o Brasil” As maneiras de pensar e sentir o nosso país. Monica Velloso Ano: 2000
  • 2. ESCOLA ESTADUAL FERNANDO MELO VIANA Pluralidade Cultural Abaporu: o homem que come... Disciplina: Temas Transversais – 4º bimestre As artes plásticas também sinalizavam essa mudança de valores. O quadro de Tarsila do Amaral, O abaporu, causou grande impacto na época. O nome "abaporu" é indígena e significa: aba (homem) e peru (come). juntando os dois significados, temos "o homem que come". O quadro causou forte impressão na época. Suas perspectivas eram inovadoras. Tarsila rompia com a chamada arte figurativa e com a descrição da natureza. Como se pode ver, ela construiu uma imagem bem original. Em primeiro plano, o pé enorme. A mão também. O rosto lá em cima, bem pequeno. O braço sustentando o rosto sugeria um gesto de meditação. O que chama a atenção é a desproporção com que foi pintado o corpo - um recurso proposital. Tarsila queria destacar os traços que considerava mais significativos. Os pés lembravam o chão, as raízes. Já vimos o quanto era importante para os modernistas a idéia das raízes culturais brasileiras. O que significava pôr-se em contato direto com a terra, sorver suas influências como seiva. Ao lado do abaporu, Tarsila pintou um sol ardente. Queria passar a impressão de clima tropical e de calor. A figura é morena, cabocla, mas é também algo que escapole a classificações. Não usa nenhuma roupa. Parece plenamente integrada à paisagem. Para alguns modernistas, a imagem do abaporu passou a significar a imagem do homem brasileiro. A cara do homem brasileiro. Caía a máscara do pierrô francês para aparecer o abaporu: o homem que come. Mas por que essa idéia do homem que come? A imagem simbolizava a capacidade do brasileiro de absorver as mais variadas culturas. O quadro de Tarsila do Amaral era a expressão de uma corrente do pensamento modernista: a antropofágica. Liderado por Oswald de Andrade, o grupo antropofágico oferecia uma interpretação específica do Brasil. Por que a antropofagia? Vejamos a explicação dada por Oswald: os índios, nossos ancestrais, tinham por hábito comer seus semelhantes para reter suas qualidades. A idéia era mostrar que o abaporu era um "comedor de culturas". Só que agora, na década de 1920, ele não comia mais indistintamente. Sabia escolher o que lhe interessava. Era urna crítica à absorção desenfreada de modelos culturais europeus. No Manifesto antropofágico, publicado em maio de 1928, Oswald desafiava: Professor: Mailon Maciel Data: ____/____/2013 Tupi or not tupi, that is the questiono Reparem a sonoridade e também a solenidade contida nessa frase. Ela é urna paráfrase da fala de um personagem de Shakespeare: "To be or not to bel" Ao retornar a frase, Oswald comete propositalmente um ato antropofágico. Ele vai até a obra de Shakespeare, seleciona a frase, mas não a transcreve tal como ela está lá. Ele a recria de acordo com nosso contexto histórico. E nossa questão é: ser ou não ser tupi! Em outras palavras: não há como negar nossas raízes ancestrais! Com isso, o grupo antropofágico não estava simplesmente recusando a influência das idéias européias aqui no Brasil. Não fechava as portas ao que vinha de fora. Mostrava apenas a impossibilidade de receber essas influências sem criticá-las. Era preciso adequar as idéias ao nosso contexto e às nossas vivências. Esse era o grande recado para o qual se chamava a atenção. Absorver influências externas sim, mas de maneira seletiva. O próprio movimento modernista paulista se inspirou nos movimentos da vanguarda européia, como o expressionismo, o futurismo, o dadaísmo, o cubismo e o surrealismo. Mas procurou absorver essas influências de forma crítica, vendo o que elas tinham em comum com nossa realidade histórica. Por isso a imagem do abaporu, o homem que come, ou seja, que rumina e absorve. Mas só absorve as coisas que interessam, que podem ajudar a construir a nacionalidade. O abaporu foi claramente inspirado em nossa mistura étnica e cultural. Antes do modernismo, era problemático reconhecer a imagem de um Brasil negro e índio. A maior parte de nossos intelectuais preferia negar o fato ou, então, narrar a realidade de uma maneira ufanista e idealizada, como já vimos. Antes de as frotas portuguesas chegarem aqui, essas terras tinham o nome de Pindorama. Nela habitavam aproximadamente 5 milhões de índios. Existia vida, existia toda uma cultura que foi e continua sendo dizimada. Desde o momento em que Pedro Álvares Cabral chegou ao Brasil, o índio deixou de ser o dono destas terras. Sua cultura foi considerada primitiva e inferior. Com o negro aconteceu a mesma coisa. Foi feito escravo e, durante o período colonial e o Império, trabalhou nas plantações de cana-de-açúcar, na extração do ouro e também nas lavouras cafeeiras. Para justificar tal feito, criou-se uma ideologia segundo a qual o "negro não tinha alma". Transformando o negro em uma espécie de "animal doméstico", podia-se escravizá-lo. Sua cultura foi perseguida como selvageria, ignorância, expressão de um mundo não-civilizado. No entanto, hoje reconhecemos a influência decisiva da cultura afro-brasileira em nossa história. Mas, na década de 1920, esses valores estavam apenas começando a se impor. Os modernistas faziam questão de valorizar nossas tradições culturais. Livro: “Que cara tem o Brasil” As maneiras de pensar e sentir o nosso país. Monica Velloso Ano: 2000