Este documento descreve os principais tipos de biocatalisadores imobilizados e suas aplicações em processos biotecnológicos. A imobilização de células ou enzimas permite o uso contínuo dos biocatalisadores e aumenta sua estabilidade. Os principais métodos de imobilização incluem a ligação a superfícies, contenção em matrizes porosas e encapsulamento em membranas. Diferentes tipos de suportes são usados dependendo das características do biocatalisador e das condições do processo.
1. BIOCATALIZADORES
Pesquisa IMOBILIZADOS
Uso de células e enzimas imobilizadas em processos biotecnológicos
Larissa Canilha cipais vantagens propiciadas pela
Engenheira Química, Mestre e Doutora em 1 RESUMO
Biotecnologia Industrial imobilização (VITOLO, 1988; CAR-
Departamento de Biotecnologia VALHO, CANILHA e SILVA, 2006).
Escola de Engenharia de Lorena (EEL) A imobilização de células ou Existem dois tipos de leito para
Universidade de São Paulo (USP)
larissa@debiq.faenquil.br
enzimas representa uma alternativa a imobilização de células, os que as
para a condução de bioprocessos aprisionam fisicamente e os que as
Walter de Carvalho uma vez que, teoricamente, os aderem à superfície. No primeiro
Farmacêutico, Mestre e Doutor em Biotecnologia biocatalisadores imobilizados ficam caso, são encapsuladas em glóbulos
Industrial - Professor e pesquisador retidos para serem utilizados por tem-
Departamento de Biotecnologia ou fibras feitas de polissacarídeos, de
Escola de Engenharia de Lorena (EEL) po indefinido. proteínas ou de polímeros sintéti-
Universidade de São Paulo (USP) É difícil definir quais os melho- cos. No segundo, as células são fixa-
carvalho@debiq.faenquil.br
res suportes e técnica de imobiliza- das ao suporte de imobilização dire-
ção a serem utilizados na imobiliza- tamente por ligações químicas
João Batista de Almeida e Silva ção de células ou enzimas específi- (iônicas ou covalentes) (MEERSMAN,
Engenheiro Químico, Mestre em Ciência e
Tecnologia de Alimentos , Doutor em Tecnologia
cas, pois há uma ampla variação não 1992). Como exemplo de um mate-
Bioquímico-Farmacêutica só nas características dos materiais a rial para adesão superficial de células
Professor e pesquisador serem imobilizados, mas também nas
Departamento de Biotecnologia destaca-se DEAE celulose (dietil
Escola de Engenharia de Lorena (EEL) condições prevalecentes durante o amino etil celulose), material durá-
Universidade de São Paulo (USP) processo. vel, inerte e não poroso, além de
joaobatista@debiq.faenquil.br
A presente revisão busca deta- fraco trocador iônico. Suas partículas
Imagens cedidas pelos autores lhar alguns dos principais suportes têm superfície suficientemente irre-
utilizados para a imobilização de cé- gular para formar um traçado perme-
lulas ou enzimas, visando à produção ável de alta resistência ao entupi-
de insumos de interesse industrial a mento. Este material tem mais afini-
partir de diferentes matérias-primas. dade com leveduras do que com
bactérias. As leveduras imobilizadas
2 INTRODUÇÃO em DEAE celulose são aplicadas na
maturação contínua de cerveja e na
2.1 O que é imobilização? produção de cerveja livre de álcool
A imobilização pode ser defini- ou de baixo teor alcoólico
da como o movimento não indepen- (MEERSMAN, 1992; Van IERSEL et
dente das células ou enzimas na al., 2000). Como exemplos de mate-
parte aquosa do sistema, por esta- rial usado para o aprisionamento físi-
rem alojadas dentro ou na superfície co de células, destacam-se as mem-
do agente imobilizador (TAMPION e branas de alumina, que promovem o
TAMPION, 1988). A imobilização tam- alojamento das células no interior de
bém é definida como a fixação de seus poros irregulares, formando uma
enzimas ou células vivas em um trama permeável de alta resistência
ambiente, de maneira que sua ativi- ao entupimento e reduzindo ao mí-
dade catalítica não seja afetada ne- nimo as contaminações
gativamente (CANTARELLI, 1989). (BORENSTEIN, 2003).
O uso em processo contínuo, o au-
mento da estabilidade e o 2.2 Imobilização versus
reaproveitamento do material bioló- células livres
gico são considerados como as prin- O uso de sistemas com células
48 Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento ano IX - nº 36 - janeiro/junho 2006
2. imobilizadas tem sido considerado Uma desvantagem é que o estado da por causa do aumento da densida-
como uma alternativa viável para se fisiológico dos organismos não pode de celular. Assim é possível conduzir
aumentar a produtividade em razão ser controlado (BORENSTEIN, 2003). a operação contínua com alta taxa de
das elevadas densidades celulares Isto é particularmente prejudicial nos diluição, atingir rendimento especí-
normalmente obtidas (RAMA- sistemas em que o metabólito se- fico mais alto, eliminar fermentadores
KRISHNA e PRAKASHAM, 1999). cundário é o produto principal, pois mais caros e exercer controle fácil e
A imobilização eleva a atividade é produzido na fase estacionária ou mais eficiente do processo
fermentativa da levedura, promo- de decréscimo de atividade fermentativo (KOLOT, 1980).
vendo a adaptação das células ao (HAMDY, KIM e RUDTKE, 1990). Quando os cofatores são neces-
meio e eliminando a fase lag em Resumidamente, há três moti- sários no processo biotecnológico, o
bateladas sucessivas de fermentação vos básicos para aceitar a imobiliza- uso de células é preferível ao de
(DURAN e BAILEY, 1986). Em siste- ção de células: 1-reutilizar o enzimas imobilizadas, pois as células
mas contínuos, há uma diminuição biocatalisador por mais de um ciclo possuem a capacidade de regenerar
do risco de contaminação em opera- fermentativo; 2- usar um processo os cofatores naturalmente, além de
ções com altas taxas de diluição e contínuo sem reciclo celular; 3- au- não requerer etapas de extração e
alta concentração de células, haven- mentar a estabilidade do purificação, apresentar menor custo
do também redução da formação de biocatalisador em relação às varia- e maior resistência a perturbações
subprodutos por células residuais e ções de pH, temperatura, concen- ambientais. As células podem ser
eliminando a necessidade de remo- tração de nutrientes ou do meio de imobilizadas sem perda significativa
ção das células ou de reciclo, tornan- fermentação (HAMDY, KIM e de sua atividade catalítica e, portan-
do a extração do produto mais efici- RUDTKE, 1990). to, são mais eficazes quando se trata
ente (WILLIAMS e MUNNECKE, Atualmente, a importância e o de catalisar uma série de reações
1981). Em sistemas com células imo- interesse desta tecnologia são ilus- subseqüentes, além de apresenta-
bilizadas consegue-se maior massa trados pelo grande número de publi- rem alta estabilidade operacional e
de células por unidade de volume de cações observadas nos últimos anos de armazenamento (CORCORAN,
trabalho do que em sistemas e também pela estabilização de al- 1985).
descontínuos, contínuos e de recu- guns processos em escala industrial
peração de células trabalhando com (FREEMAN e LILLY, 1998; 3 MÉTODOS DE IMOBILIZAÇÃO
células livres (WILLIAMS e RAMAKRISHNA e PRAKASHAM, E TIPOS DE SUPORTE
MUNNECKE, 1981; PILKINGTON, 1999; Van IERSEL et al., 2000; CAR-
MARGARITIS e MENSOUR, 1998). VALHO et al., 2005). O método e o tipo de suporte a
Outras vantagens do uso de células serem empregados em um determi-
imobilizadas em relação ao uso de 2.3 Células imobilizadas nado processo devem ser estabele-
células em suspensão no meio de versus enzimas imobilizadas cidos empiricamente, recaindo a es-
fermentação são: a facilidade de A dificuldade em se recuperar a colha do binômio suporte-método
reutilização dos biocatalisadores, o enzima do meio reacional ao final da sobre aquele que apresentar maior
aumento da estabilidade destes catálise, aliada à instabilidade e fre- retenção da atividade. A escolha do
biocatalisadores e a redução de cus- qüente inadequabilidade para uso método de imobilização e do tipo de
tos operacionais (PILKINGTON, em determinados solventes e/ou con- suporte dependerá basicamente de
MARGARITIS e MENSOUR, 1998; dições de pH, temperatura e expo- dois fatores: 1- das características
RAMAKRISHNA e PRAKASHAM, sição a agentes desnaturantes, po- peculiares do material biológico; 2-
1999; CARVALHO, CANILHA e SIL- dem ser superadas por meio da imo- das condições de uso do sistema
VA, 2006). O sistema que usa células bilização. A enzima imobilizada pode imobilizado. Face à variabilidade
livres de leveduras em modo contí- ser reutilizada e é normalmente mais destes fatores, pode-se afirmar que
nuo de fermentação é limitado, uma estável em relação à enzima livre, não existe um método geral de imo-
vez que podem ocorrer perdas de com a vantagem adicional de possi- bilização e nem um suporte univer-
células no fermentador. Além disso, bilitar a utilização de um processo sal, adequados para qualquer pro-
as células imobilizadas são mais re- contínuo (CARVALHO, CANILHA e cesso (CORCORAN, 1985; VITOLO,
sistentes a condições adversas, uma SILVA, 2006). Porém, à medida que 1988).
vez que a matriz de imobilização os estudos com células imobilizadas
geralmente resulta em maior prote- avançaram, observou-se que a imo- 3.1 Métodos de imobilização
ção a estas células. Por este motivo, bilização de células é mais vantajosa Existem vários métodos para a
procura-se produzir etanol com cé- em relação à imobilização de imobilização de biocatalisadores. Es-
lulas imobilizadas (LEE, AHN e RYU, enzimas, pois evita o trabalho de tes métodos podem ser divididos
1983). extraí-las dos microorganismos para em quatro grandes grupos, confor-
Os reatores com células imobili- fixá-las, em seguida, a um suporte me ilustrado na Figura 1.
zadas permitem alto desempenho (CHIBATA, TOSA e SATO, 1983). O método de imobilização por
porque trabalham com altas densida- Nos processos onde há imobilização meio de auto-agregação envolve a
des de células fixadas nos suportes. de células, a fermentação é acelera- agregação ou a floculação das célu-
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3. Figura 1 - Métodos de imobilização de enzimas e células
las de maneira natural ou artificial- utilizados, permitindo a ligação do Como principais desvantagens são
mente induzida. Desta forma, os biocatalisador também à estrutura citadas: o pequeno volume disponí-
biocatalisadores são ligados entre si superficial interna. Por outro lado, a vel para a contenção das células
sem a necessidade de uso de um imobilização por meio de ligações imobilizadas, a perda de células para
suporte de imobilização. A floculação covalentes resulta em uma interação o meio de fermentação e a instabili-
natural é uma propriedade de relati- biocatalisador-suporte mais forte, dade dos suportes normalmente uti-
vamente poucas células. Além disso, sendo a principal desvantagem o lizados, que limita a utilização dos
agregados celulares naturais são ge- risco de danos à membrana celular, agregados por longos períodos (PARK
ralmente instáveis e sensíveis a ten- no caso de imobilização de células e CHANG, 2000; PRADELLA, 2001).
sões de cisalhamento, sendo neces- ( G R O B O I L L O T et al., 1 9 9 4 ; O método de imobilização por
sária a adição de agentes químicos PRADELLA, 2001). meio de contenção por barreiras en-
que formam ligações cruzadas entre A imobilização por meio de apri- volve a utilização de membranas
células, como glutaraldeído, durante sionamento em matrizes porosas, pré-formadas (reatores do tipo
a imobilização (GROBOILLOT et al. , como o alginato e a carragena, nor- hollow fiber) ou a formação in situ
1994). malmente envolve a sintetização in da membrana em torno das células a
O método de imobilização por situ da matriz porosa em torno dos serem imobilizadas (KAREL, LIBICKI
meio de ligação a superfícies pode biocatalisadores a serem imobiliza- e ROBERTSON, 1985). Este método,
ser realizado por meio de interações dos. Os poros da matriz formada são também conhecido como
iônicas ou adsortivas, ou através de menores que as células contidas no encapsulamento, tem sido utilizado
ligações covalentes entre grupos interior (PRADELLA, 2001). Este como uma tecnologia alternativa ao
reativos do suporte e do método tem sido extensivamente aprisionamento em matrizes poro-
biocatalisador. A ligação por meio de estudado para a imobilização de cé- sas, uma vez que oferece vantagens
adsorção e/ou interações iônicas é lulas viáveis, devido à possibilidade como maior capacidade de conten-
um método simples e barato, exis- de uso de polímeros hidrofílicos ção de células e prevenção da perda
tindo a possibilidade de regenerar a biocompatíveis como suportes de de células para o meio de fermenta-
matriz utilizada, porém apresenta imobilização (GROBOILLOT et al., ção. Devido à ausência de núcleo
como desvantagem a vulnerabilidade 1994). Além disso, as células imobi- gelificado, as limitações à transferên-
de perda dos biocatalisadores imobi- lizadas em uma matriz hidrofílica cia de massa também são reduzidas
lizados para o meio reacional impe- podem ser protegidas de condições (PARK e CHANG, 2000).
dindo o trabalho em condições mui- não adequadas de pH, temperatura, Face ao exposto, todos os mé-
to severas. Para aumentar a massa de solventes orgânicos e/ou compostos todos de imobilização apresentam
biocatalisadores imobilizados, supor- inibidores presentes no meio de fer- vantagens e desvantagens. Embora
tes porosos têm sido geralmente mentação (PARK e CHANG, 2000). a estabilidade das células não possa
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4. Figura 2 - Tipos de reatores para trabalhos com células imobilizadas:
(a) reator de mistura; (b) reator de leito empacotado; (c) reator de leito fluidizado
ser garantida em todos os casos, as custo de imobilização, facilidade de reator para o cultivo de células imo-
seguintes vantagens são citadas: operação em grande escala, não apre- bilizadas são: 1- requerimentos de
inóculo retido no suporte, possibili- sentar toxidez as células, apresentar transferência de massa (principal-
dade de melhor controle das propri- alta capacidade de retenção e ter mente suprimento de oxigênio e
edades reológicas do meio, maior resistência mecânica para uma longa remoção de gases), 2- método de
pureza e rendimento de produtos, vida operacional (NAGASHIMA, imobilização empregado, 3- caracte-
não há necessidade de extração e 1984; PRADELLA, 2001). Os supor- rísticas da matriz de imobilização
purificação das enzimas e podem ser tes inorgânicos são mais vantajosos utilizada, 4- natureza do substrato, 5-
esperados resultados econômicos que os orgânicos pela durabilidade, requerimentos para o cultivo do
mais favoráveis (GROBOILLOT et densidade, estabilidade e controle microorganismo utilizado (FUKUDA,
al., 1994; PRADELLA, 2001). de porosidade (NAGASHIMA, 1984). 1994; PILKINGTON, MARGARITIS e
Segundo MOUEDDEB et al. (1996), MENSOUR, 1998). A escolha inade-
3.2 Tipos de suporte os materiais inorgânicos também quada do reator pode provocar rom-
Na literatura são citados inúme- apresentam como vantagem a facili- pimento do suporte de imobilização.
ros materiais inertes que podem ser dade de esterilização e limpeza. Desta forma, é importante escolher
usados como suportes. A natureza um reator que permita uma adequa-
física destes suportes varia desde 3.3 Tipos de reatores da mistura do meio sem provocar
materiais geliformes (alginato, álco- utilizados com células danos a matriz de imobilização
ol polivinílico, carragena, etc) até imobilizadas (PILKINGTON, MARGARITIS e
superfícies sólidas (vidro poroso, Os reatores para trabalhos com MENSOUR, 1998).
Eupergit C, alumina, etc). Os supor- células imobilizadas podem ser divi- Os reatores de mistura repre-
tes podem ser classificados em cinco didos em três categorias, de acordo sentam o tipo de reator mais ampla-
tipos fundamentais: 1. microporosos com o padrão de fluxo: reatores de mente utilizado para o cultivo de
ou não porosos (vidro, sílica, nylon); mistura, reatores de leito empacota- células em suspensão, seja em esca-
2. microencapsulados (nitrocelulose, do e reatores de leito fluidizado (Fi- la laboratorial, seja em escala indus-
triacetato de celulose); 3. polímeros gura 2). Estes reatores podem tam- trial (BARON, WILLAERT, BACKER,
com moderado grau de ligações cru- bém ser modificados para melhorar 1996). Embora vários tipos de turbi-
zadas (poliacrilamida); 4. polímeros as características de transferência de nas possam ser utilizados, a principal
com baixo grau de ligações cruzadas massa e a capacidade de controle desvantagem relativa ao uso deste
(sephadex, DEAE celulose); 5. das condições de cultivo ou para tipo de reator para o cultivo de
macroporosos (sílica, alumina) minimizar o estresse imposto ao su- células imobilizadas refere-se à ten-
(VITOLO, 1988; GERBSCH e porte de imobilização (FUKUDA, são de cisalhamento imposta a matri-
BUCHHOLZ, 1995). 1994; BARON, WILLAERT e BACKER, zes sensíveis (GROBOILLOT et al.,
Os materiais utilizados como su- 1996). 1994). Este reator apresenta vanta-
portes deveriam idealmente ser en- Os fatores que devem ser leva- gens como fácil controle de tempe-
contrados com facilidade e abundân- dos em consideração quando da es- ratura e pH, e a sua operação em
cia, ter baixo custo, resultar em baixo colha de um determinado tipo de modo contínuo é adequada em casos
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5. de inibição pelo substrato (FUKUDA, as fases líquidas e sólidas podem bém referencia outros trabalhos que
1994). Além disso, oferece as me- estar sendo adequadamente mistu- usaram este suporte para a imobili-
lhores características de mistura e radas ou não. Desta forma, depen- zação de enzimas.
transferência de oxigênio dendo das condições hidrodinâmicas
(GROBOILLOT et al., 1994). do sistema, os agregados celulares 3.4.2 Alumina
Nos reatores de leito empacota- podem sofrer limitações de transfe- A alumina é um material
do, os agregados imobilizados são rência de massa, o que irá prejudicar inorgânico, inerte, poroso, transpa-
empacotados em uma coluna, atra- as taxas de produção (GROBOILLOT rente, estável e não tóxico além de
vés da qual o meio de fermentação é et al., 1994). apresentar boa durabilidade
passado. Apesar da simplicidade de (ALBRAS, 2003). Em ensaios que
design e baixo custo, este tipo de 3.4 Suportes utilizados para a fizeram uso da alumina para a imobi-
reator é mais utilizado em fermenta- imobilização de enzimas lização de enzimas, foi constatado
ções anaeróbicas. Para cultivos Existem diversos materiais que que este suporte é um material bas-
aeróbios, entretanto, a aeração do podem ser utilizados como suporte tante resistente a altas temperaturas
meio de fermentação geralmente não para a imobilização de enzimas. En- e pHs (COSTA et al., 2001). Confor-
é suficiente para oxigenar todo o tre eles, Eupergit C, alumina e sílica me descrito por IDA, MATSUYAMA
reator devido à depleção rápida do (Tabela 1) têm sido bastante repor- e YAMAMOTO (2000), a membrana
oxigênio no início da coluna tados na literatura. de alumina pode ser usada como
(GROBOILLOT et al., 1994). Além suporte para a imobilização de
disso, desvios do comportamento 3.4.1 Eupergit C enzimas, pois ela é mecanicamente
ideal de fluxo, do tipo plug flow, são Eupergit C é um suporte que forte e quimicamente estável. Por
constantemente observados durante consiste em microesferas estas e outras características a
as fermentações por motivos diver- macroporosas, desenvolvido através alumina vem sendo utilizada na imo-
sos (acúmulo de gases como de CO 2, da copolimerização de N,N’- bilização de diversas enzimas:
compactação do leito, acúmulo de metileno-bis-metacrilamida, glicidil- catalase de Bacillus sp., para o
biomassa suspensa), levando à for- metacrilato, alil-glicidil-éter e tratamento de efluentes têxteis (COS-
mação de caminhos preferenciais, o metacrilamida. Este suporte é quimi- TA et al., 2001); glicoamilase de A.
que prejudica as taxas de produção camente estável em qualquer valor niger ( I D A , M A T S U Y A M A e
através de limitações à transferência de pH, ou seja, pode imobilizar uma YAMAMOTO, 2000); lipase de
de massa (FUKUDA, 1994). enzima em qualquer faixa de pH Candida antarctica , para síntese de
Os reatores de leito fluidizado entre 0 e 14, na qual ela é estável e butil butirato (LOZANO et al., 2002);
representam um compromisso entre não perde a sua atividade catalítica. amilase de Bacillus subtilis, utiliza-
os reatores de mistura e os reatores Eupergit C também é mecanicamen- da nas indústrias alimentícias e
de leito empacotado, aliando as boas te estável, uma vez que não apre- fermentativas (RESHMI, SANJAY e
condições de mistura (característica sentou nenhum desgaste após 650 SUGUNAN, 2006).
dos reatores de mistura) às baixas ciclos de operação em reatores de A alumina, a quitosana e a celu-
tensões de cisalhamento (caracterís- mistura com volumes de substrato lose também foram utilizadas como
tica dos reatores de leito empacota- de até 1000L (KATCHALSKI-KATZIR suportes na imobilização da enzima
do). Em contraste com os reatores de e KRAEMER, 2000). Este suporte já catalase de A. niger, para a decom-
leito empacotado, os reatores de foi avaliado para a imobilização de posição de peróxido. O sistema que
leito fluidizado facilitam a mistura várias enzimas: β-galactosidase de resultou em maior atividade foi a
entre as fases líquida e sólida, facili- Bacillus circulans, α-galactosidase imobilização em glutaraldeído-celu-
tam a remoção de gases e minimizam de Aspergillus oryzae, para transfor- lose. A atividade da catalase em
a pressão sobre o leito de agregados mar lactose em glicose e galactose, glutaraldeído-celulose foi aumentan-
imobilizados. Para a obtenção de boas ou produzir galacto-oligossacarídeos do após alguns meses de estocagem,
características de fluidização, a dife- (HERNAIZ e CROUT, 2000); provavelmente devido à formação
rença de densidade entre os agrega- ciclodextrina glicosiltransferase de ligações covalentes entre a
dos celulares e o meio de fermenta- (CGTase) de Thermoanaerobacter enzima e o suporte, desenvolvidos
ção deve ser a maior possível. Desta sp., para a formação de ciclodextrina com o tempo. Já a enzima imobiliza-
forma, géis de hidrocolóides (MARTÍN et al., 2003); β-glicosidase da na alumina ficou inativa e a estru-
hidratados, como alginato de cálcio, de Aspergillus niger (Novozyme tura da enzima imobilizada na
não são recomendados devido à se- 188), para produção de etanol a quitosana foi destruída (EBERHARDT
melhança de densidades entre o partir de hidrolisados lignocelulósicos et al. , 2004).
polímero e o meio de fermentação (TU et al., 2006); lipase de Candida
aquoso. Dependendo do tamanho e rugosa, para produção de glicerol 3.4.3 Sílica
densidade do suporte, das taxas de (KNEZEVIC et al., 2006). A revisão Sílica é um produto sintético,
fluxos de gases e líquidos e da geo- elaborada por KATCHALSKI-KATZIR produzido pela reação de silicato de
metria do leito, diversos padrões de e KRAEMER (2000) apresenta uma sódio e ácido sulfúrico. Ao serem
mistura podem ser obtidos nos quais visão detalhada do assunto e tam- misturados, forma-se um hidrosol que
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6. Tabela 1 - Exemplos de suportes utilizados para a imobilização de enzimas
lentamente se contrai para formar
uma estrutura sólida de sílica gel,
Suporte Microorganismo E nz ima Referência também chamada hidrogel. A sílica
gel é bastante utilizada como supor-
Bacillus circulans ß-galactosidase Hernaiz e Crout (2000)
te para a imobilização de enzimas
Aspergillus oryzae α -galactosidase Hernaiz e Crout (2000) por apresentar as seguintes vanta-
Ciclodextrina
gens: possui alta resistência mecâni-
Eupergit C Thermoanaer obacter sp. Martín et al. (2003)
glicosiltransferase ca, estabilidade térmica e química;
possui alta resistência à contamina-
Aspergillus niger ß-glicosidase Tu et al. (2006)
ção e à degradação microbiana; apre-
Candida rugosa Lipase Knezevic et al. ( 2006) senta elevada área superficial poro-
Bacillus sp. Catalase Costa et al. (2001) sa (PEREIRA e KUBOTA, 2004;
DAVID et al., 2006). Conforme des-
Ida, Matsuyama e
A. niger Glucoamilase
Y amamoto (2000)
crito na Tabela 1, sílica gel foi utili-
Alumina zada como suporte na imobilização
Candida antarctica Lipase Lozano et al. ( 2002) das seguintes enzimas: lipase de
Reshmi, Sanjay e Candida cylindracea, que catalisa a
Bacillus subtilis Amilase
Sugunan (2006) hidrólise de triacilglicerol em ácidos
Alumina, Quitosana graxos livres e glicerol (MORENO e
A. niger Catalase Eberhardt et al. (2004)
e Celulose SINISTERRA, 1994; CARVALHO et
Saccharomyces cerevisiae Invertase David et al. (2006) al., 2003); cloroperoxidase de
Sílica gel Caldariomyces fumago, que podem
Petr i, Gambicorti e
Caldariomyces fumago Cloroperoxidase
Salvadori (2004)
ser usadas na degradação oxidativa
de clorofenóis e compostos fenólicos
Moreno e Sinister ra presentes em águas residuais de
Sílica gel eAlumina Candida cylindr acea Lipase
(1994)
refinaria (PETRI, GAMBICORTI e
Tabela 2 - Exemplos de suportes utilizados na imobilização de células. SALVADORI, 2004; HERNANDEZ,
2005); invertase de S. cerevisiae,
Suporte Microorganismo Referência utilizada em indústrias alimentícias
C andida tropicalis e para produção de adoçantes (DAVID
Jamai et al. (2001)
Saccharomyces cerevisiae et al., 2006).
Alginato de cálcio Kluyveromyces lactis Becerra et al. (2001)
3.5 Suportes utilizados para a
C andida guilliermondii
Carvalho et al. (2005) imobilização de células
Existem diversos materiais que
- López, Lázaro e Marques (1997) podem ser utilizados como suporte
para a imobilização de células. Géis
S. cerevisiae Nigam (2000)
Carragena de alginato, carragena e
Pseudomonas dacunhae Çahk et al. (1999) poliacrilamida, alumina, terra de
Kanuma, caule de cana e sílica são
Escherichia coli Leng, Zheng e Sun (2006)
alguns exemplos de suportes des-
S. cerevisiae Siess e Divies (1981) critos na literatura (Tabela 2).
Pundle, Prabhume e Sivaraman
Poliacrilamida S. uvarum
(1988)
3.5.1 Alginato de cálcio
O método de aprisionamento
S. cerevisiae Norouzian et al. (2003) em gel de alginato de cálcio é uma
Hamdy Kim e Rudtke (1990)
, técnica extensivamente utilizada
para a imobilização de células viá-
S. cerevisiae Santos et al. (1998) veis (RAMAKRISHNA e
Borenstein (2003) PRAKASHAM, 1999). Como a for-
mação do gel ocorre rapidamente
Alumina Zymomonas mobilis Bekers et al. (2001) na presença de íons cálcio, sem
Lactobacillus rham nosus Moueddeb et al. (1996) alterações drásticas de temperatura,
pH e pressão osmótica, a atividade
Bactérias redutoras de sulfato e
Bactérias metanogênicas
Silva et al. (2006) e a viabilidade dos microorganismos
imobilizados são conservadas
Levedura/fabricação de vinhos Kourkoutas et al. (2006) (CORCORAN, 1985). Vantagens
Terra de Kanuma, Carvão como baixo custo, grande disponibi-
Levedura/produção de etanol Kumakura, Yoshida e Asano (1992)
ativado, Celulose em pó lidade no mercado, possibilidade de
Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento ano IX - nº 36 - janeiro/junho 2006 53
7. ampliação de escala de produção e a poliacrilamida. A poliacrilamida é um Lactobacillus rhamnosus, para a pro-
aceitação das substâncias utilizadas polímero formado pela mistura de dução de ácido lático (MOUEDDEB
para a imobilização (alginato e cloreto dois monômeros, acrilamida e et al., 1996). Segundo BEKERS et al.
de cálcio) como aditivos na produ- bisacrilamida, formando uma espé- (2001), desde 1982 a alumina vem
ção de alimentos têm sido citadas na cie de rede. Células de sendo amplamente utilizada como
literatura (CORCORAN, 1985; Saccharomyces cerevisiae foram suporte para a imobilização de
CHAMPAGNE, BLAHUTA e imobilizadas em gel de poliacrilamida enzimas e microorganismos. A revi-
GAGNON, 2000). Entre as desvanta- e foi verificado que dentro das partí- são elaborada por estes autores
gens do uso deste polímero como culas do gel a viabilidade celular se referencia diversos trabalhos que uti-
suporte destacam-se a instabilidade comportou de forma heterogênea, lizaram este suporte para imobiliza-
química na presença de agentes com um elevado número de células ção de biocatalisadores.
quelantes do íon cálcio (como fosfato, não-viáveis. Por outro lado, as célu- SILVA et al. (2006) avaliaram
lactato e citrato), a tendência das las que se encontravam na superfície vários tipos de suportes, inclusive a
esferas em sofrer dilatação na pre- do gel mantiveram a capacidade de alumina, na imobilização de bactéri-
sença de cátions monovalentes e as formar colônias com boa atividade as redutoras de sulfato e bactérias
limitações impostas à transferência fermentativa (SIESS e DIVIES, 1981). metanogênicas. Espuma de
de substratos e produtos (FREEMAN Também foi avaliada a estabilidade poliuretano e carbono vegetal foram
e LILLY, 1998). Este suporte já foi desse suporte para imobilização de os suportes mais indicados para a
utilizado para a imobilização de célu- células de Saccharomyces uvarum imobilização das bactérias redutoras
l a s d e Candida tropicalis e na produção de etanol. A estabilida- de sulfato enquanto que a cerâmica
Saccharomyces cerevisiae, na pro- de das células imobilizadas em gel de alumina apresentou-se como o
dução de etanol (JAMAI et al., 2001); de poliacrilamida foi maior que as suporte mais indicado para as
Kluyveromyces lactis, na produção das células imobilizadas em alginato archaea metanogênicas. Estes auto-
de lactose (BECERRA et al ., 2001); de cálcio (PUNDLE, PRABHUME e res afirmam que o sucesso de um
Candida guilliermondii, na produ- SIVARAMAN, 1988). A poliacrilamida reator anaeróbico está diretamente
ção de xilitol (CARVALHO et al., também foi utilizada na imobilização associado com o material usado como
2005). de S. cerevisiae, para a bioconversão suporte da imobilização. Já,
de etanol e butanol em aldeídos KOURKOUTAS et al. (2006) avalia-
3.5.2 Carragena (NOROUZIAN et al., 2003). ram o efeito de armazenamento e
A carragena é um polímero na- reuso das células imobilizadas de
tural presente na estrutura celular de 3.5.4 Alumina levedura em alumina, “kissiris” e
algas do tipo Rodophyceae. Este Conforme visto anteriormen- pedaços de maçã, durante a fabrica-
polissacarídeo tem a particularidade te, a alumina é um material inorgânico ção do vinho. As células imobilizadas
de formar colóides e géis em meios que apresenta diversas vantagens apresentaram maior estabilidade que
aquosos a concentrações muito bai- para ser utilizada como suporte de as células livres quanto ao período
xas (CREDIDIO, 2006). O sistema imobilização. Sua vida útil, se não de estocagem e atividade, indepen-
de imobilização de células em ilimitada, é mais longa do que a dos dentemente do suporte utilizado. Os
carragena é promissor para a produ- suportes orgânicos mais comumente resultados também mostraram que
ção industrial de etanol. Quando foi usados em testes com fermentação as células imobilizadas não apresen-
utilizado gel de alginato de cálcio alcoólica (SANTOS et al ., 1998; taram efeito negativo na composi-
para a imobilização de células, o BEKERS et al., 2001; RESHMI, SANJAI ção dos produtos responsáveis pelo
suporte não apresentou boa estabili- e SUGUNAN, 2006). NAVARRO, aroma dos vinhos, durante a
dade operacional quando compara- LUCCA e ALLIERI (1982) também estocagem. Estes autores também
do ao uso de células imobilizadas em assinalaram que o baixo custo da destacam outros trabalhos da litera-
carragena (CHIBATA, TOSA e SATO, alumina torna-a mais atrativa para tura que utilizam alumina, “kissiris” e
1986). Este suporte já foi então uti- imobilizar células de leveduras. pedaços de maçã como suporte para
lizado para a imobilização de células MOUEDDEB et al. (1996) ressalta- a imobilização na produção de vi-
de S. cerevisiae, visando à produção ram que a alumina apresenta algu- nhos.
de etanol (LÓPEZ, LÁZARO e MAR- mas vantagens sobre os materiais
QUES, 1997; NIGAM, 2000); orgânicos, destacando-se a facilida- 3.5.5 Outros tipos de suportes
Pseudomonas dacunhae , visando à de de esterilização e limpeza. Por Células de levedura também fo-
produção de L-alanina (ÇAHK et al., estas características, este material ram imobilizadas em suportes poro-
1999); Escherichia coli, visando à vem sendo utilizado na imobilização sos de terra de Kanuma (solo prove-
produção de L-fenilalanina (LENG, de células de S. cerevisiae, para a niente do Japão), carvão ativado e
ZHENG e SUN, 2006). produção de etanol (HAMDY, KIM e celulose em pó, por polimerização e
RUDTKE, 1990; SANTOS et al., 1998; por irradiação a baixa temperatura.
3.5.3 Poliacrilamida BORENSTEIN, 2003); Zymomonas As fermentações alcoólicas foram
Um outro tipo de suporte utili- mobilis , para produção de levânio e realizadas em reatores com células
zado em fermentação alcoólica é a etanol (BEKERS et al ., 2001); imobilizadas ou com recuperação de
54 Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento ano IX - nº 36 - janeiro/junho 2006
8. células. Os reatores com células imo- GONZÁLEZ, M.I.S. Lactose VA, S.S. Uso de biocatalisadores
bilizadas se apresentaram como a bioconversion by calcium- imobilizados: uma alternativa
melhor alternativa nesse bioprocesso alginate immobilization of para a condução de
quanto ao custo e complexidade, Kluyveromyces lactis cells. bioprocessos. Revista Analytica,
além de terem produzido mais etanol. Microbial Technology, v.29, n.23, p.60-70, 2006.
A terra de Kanuma foi mais efetiva p.506-512, 2001.
que a celulose em pó, pois a ativida- CHAMPAGNE, C.P.; BLAHUTA, N.;
de das suas células imobilizadas per- BEKERS, M.; LAUKEVICS, J.; GAGNON, C. A vortex-bowl disk
maneceu constante por longos perí- KARSAKEVICH, A.; VENTINA, atomizer system for the
odos. Ao final, células imobilizadas E.; KA MINSKA, E.; UPITE, D.; production of alginate beads in
obtidas por copolimerização de dois VINA, I.; LINDE, R.; a 1500-liter fermentor.
monômeros (10% de metoxi SCHERBAKA, R. Levan-ethanol Biotechnology and
nonaetilenoglicol metacrilato e 10% biosynthesis using Zymomonas Bioengineering, v.68, p.681-
de hidroxietil metacrilato) usando mobilis cells immobilized by 688, 2000.
30% de terra de Kanuma apresenta- attachment and entrapment.
ram a mais alta produtividade em Process Biochemistry, v.36, CHIBATA, I.; TOSA, T.; SATO, T.
etanol (KUMAKURA, YOSHIDA e p.979-986, 2001. Immobilized biocatalysts to
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bilizados (enzimas e células) é uma cêuticas, 2003 (Dissertação de U.S.A., 1983.
estratégia a ser utilizada para a con- Mestrado).
dução de bioprocessos em várias CHIBATA, I.; TOSA, T.; SATO, T.
situações. Aliada à engenharia, bio- ÇAHK, G.; SAVASÇI, H.; ÇAHK, P.; Methods of cells immobilization.
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