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Ministério do Meio AMbiente
secretaria de Políticas para o desenvolvimento sustentável




                                                                           CAdernos GestAr nº 4

                                                          Gestar Ariranha–
                                                         Análise Jurídica da
                                                        Atividade Suinícola



                                                         Gestar
                                           viva melhor na sua comunidade
REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL
Luiz Inácio Lula da Silva – Presidente do Brasil
José Alencar Gomes da Silva – Vice-Presidente
MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE
Marina Silva – Ministra do Meio Ambiente
Cláudio Langone – Secretário Executivo
Gilney Amorim Viana – Secretário de Políticas para o Desenvolvimento Sustentável
Roberto Ricardo Vizentin – Diretor de Programa
Sílvio Menezes – Chefe de Gabinete
EQUIPE GESTAR
Carcius Azevedo dos Santos – Coordenador Nacional
Antônio Carlos Rodrigues Cruz
Ivanise Knapp
José Flávio dos Santos
Mário César Batista de Oliveira
EQUIPE DE CONSULTORIA – TCP/3004/FAO/MMA
Horácio Martins de Carvalho – Consultor Principal
Flávio Mesquita da Silva – Gestão
Ademar Ribeiro Romeiro - Economia
Carlos Teodoro José Hugueney Irigaray - Legislação
Gelso Marchioro – PGAR Ariranha
SUPERVISÃO TÉCNICA
Roberto Ricardo Vizentin
Carcius Azevedo dos Santos
Antônio Carlos Rodrigues Cruz
Ivanise Knapp

PROjETO GRáFICO
Fabiano Bastos




                                                                Catalogação na Fonte
                                          Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
                               G393     Gestar Ariranha/SC: análise jurídica da atividade suinícola / Ministério
                                            do Meio Ambiente, Secretaria de Políticas para o Desenvolvimento
                                            Sustentável. – Brasília: MMA, 2006.
                                            52 p. : il. ; 21 x 29,7 cm

                                             Bibliografia


                                            1. I. Ministério do Meio Ambiente. II. Secretaria de Políticas para o
                                         Desenvolvimento Sustentável. III. Título.
                                                                                              CDU (2.ed.)502.35
SUMáRIO


1. APRESENTAÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5
2. INTRODUÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7
1. LEgISLAÇÃO PERTINENTE . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
 1.1 Legislação federal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .11
 1.2 Normas estaduais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .15
2. RESPONSAbILIDADE POR DANOS AmbIENTAIS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
 2.1 O princípio da responsabilização . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .19
 2.2 O princípio do poluidor-pagador . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .21
 2.3 Aspectos da responsabilização na suinocultura . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .24
 2.4 Aspectos legais do ajustamento de conduta firmado . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .26
3. NOvAS DIRETRIzES PARA A SUINOcULTURA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33
 3.1 Definindo responsabilidades . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .33
 3.2 Alternativas para a solução dos problemas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .37
 3.3 Novo marco regulatório . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .43
cONSIDERAÇõES FINAIS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47
REFERêNcIAS bIbLIOgRáFIcAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49
1. APRESENTAÇÃO




                                                          bientais a eles associados. Na perspectiva GESTAR, a
                                                          sustentabilidade está fortemente condicionada pelas
   A Secretaria de Políticas para o Desenvolvimento       formas de organização social das atividades econô-
Sustentável – SDS/MMA – tem como missão promo-            micas no nível local, assim como pela sua inserção
ver políticas e instrumentos que consolidem princí-       no sistema econômico como um todo.
pios e práticas do desenvolvimento sustentável, sem-
pre integrando ações do governo com a sociedade.             Nesse sentido, o GESTAR combina reflexão com
                                                          ação, visão ampla do território com a realidade das
   Um dos objetivos básicos da SDS/MMA é a elabo-         unidades produtivas, mobilização comunitária com
ração e adoção de estratégias que permitam superar        o engajamento e participação de cada família.
problemas ambientais provocados pelo atual modelo
de desenvolvimento econômico e tecnológico, bem              Para a elaboração deste caderno, contamos com a
como o desenvolvimento de alternativas sustentáveis       consultoria do Dr. Teodoro Irigaray, bem como toda
para o relacionamento da sociedade com a natureza.        a equipe técnica envolvida nesse projeto.

   Sob coordenação do Departamento de Gestão                                                  gilney viana
Ambiental e Territorial (DGAT/SDS/MMA) e a par-                                Secretário de Políticas para o
ceria institucional da Organização das Nações Uni-                 Desenvolvimento Sustentável – SDS/MMA
das para Agricultura e Alimentação (FAO/ONU), o
Projeto de Gestão Ambiental Rural – GESTAR dedi-                                                José Tubino
ca-se a difundir e consolidar o desenvolvimento rural                         Representante da FAO/BRASIL
sustentável e a justiça ambiental, por meio de ações
de motivação, capacitação e engajamento das comu-
nidades, em busca da melhoria da qualidade ambien-
tal e das condições de vida nos territórios onde atua.

   O principal objetivo do GESTAR é contribuir para
o desenvolvimento de programas e projetos de de-
senvolvimento rural sustentável. Para tanto, dissemi-
na e coordena atividades ligadas à gestão ambiental
territorial, além de integrar políticas governamentais
que envolvam a participação direta das comunida-
des, motivando o sentimento de pertença no terri-
tório, que fortaleça a capacidade técnica das institui-
ções governamentais e das organizações da socieda-
de civil.

   Este documento sistematiza os procedimentos
para a implantação e desenvolvimento das propostas
do GESTAR/SDS/MMA nas suas diversas unidades
territoriais constituídas no país.

  O fundamental da abordagem territorial adotada
pelo GESTAR é a identificação dos problemas socio-
ambientais e o levantamento das estratégias de solu-
ção disponíveis. O ponto de partida é a compreen-
são dos sistemas de produção e dos problemas am-
2. INTRODUÇÃO



   Embora a poluição anteceda a Revolução Indus-                                              Os sistemas confinados de produção de suínos são
trial, sua ampliação e agravamento são típicos da so-                                         responsáveis pelo aumento de um grande número
ciedade contemporânea. Como resultado do avanço                                               de animais em pequenas áreas. Estas característi-
tecnológico e da mudança dos padrões culturais re-                                            cas exigem maior investimento e especialização por
lacionados ao consumo, ela hoje possui um caráter                                             parte dos produtores.
multifatorial, ou seja, há um crescente número de fa-
                                                                                              A crescente tendência para a adoção de sistemas
tores que ocasionam a degradação ambiental, atuan-
                                                                                              confinados de criação de suínos tem contribuído
do de forma cumulativa e muitas vezes sinergética.
                                                                                              para a produção de quantidades cada vez maiores
                                                                                              de dejetos. A inadequação dos sistemas de manejo
   Assim, como subprodutos de nossa civilização
                                                                                              e armazenamento leva ao lançamento de dejetos em
de consumo, os fatores de poluição se ampliam em                                              rios, sem tratamento adequado.3 Segundo Oliveira
quantidade e em grau de toxicidade, confirmando                                               (1995: 47), a atividade é desenvolvida e incentivada
que vivemos em uma sociedade de risco1, onde os                                               sem dar a devida importância ao impacto ambien-
instrumentos políticos e jurídicos se mostram fre-                                            tal e social decorrente dos dejetos produzidos pelos
qüentemente inadequados para enfrentar proble-                                                animais.
mas que são globais e dizem respeito aos padrões de
consumo e aos sistemas econômicos que promovem                                                O fato é que, apesar do reconhecimento do seu
uma exploração insustentável dos recursos naturais.                                           grande potencial poluidor, por parte de órgãos
                                                                                              oficiais de pesquisas e fiscalização ambiental, a
   A análise da problemática ambiental associada à                                            atividade continua em expansão. O Brasil ocu-
atividade da suinocultura no oeste catarinense cons-                                          pa lugar entre os sete países de maior produção.
titui um exemplo emblemático dos problemas pro-
vocados pela inadequada disposição e tratamento                                         Julia Guivant e Cláudio Miranda destacam os as-
dos dejetos gerados pela atividade bem como dos li-                                   pectos econômicos relacionados à atividade no Esta-
mites à identificação e responsabilização dos agentes                                 do de Santa Catarina:
poluidores.
                                                                                              No Brasil, 4º país produtor mundial de carne suí-
    Introdutoriamente cabe destacar a importância                                             na, com 2,698 milhões de toneladas, contando com
econômica e social da suinocultura que fornece uma                                            um plantel de 34,5 milhões de cabeças em um total
alternativa de renda para os pequenos produtores e                                            de 2,486 milhões de matrizes, o debate sobre os ris-
                                                                                              cos de poluição e sobre as medidas para o controle
nesse sentido constitui atividade que contribui para
                                                                                              da poluição por dejetos suínos tem aumentado na
a fixação do homem no campo.
                                                                                              última década (ABIPESC, 2003). Isto se observa es-
                                                                                              pecialmente no Estado de Santa Catarina, onde se
   Em nosso país essa atividade expandiu-se nos úl-
                                                                                              encontra a maior produção suinícola do país, com
timos anos seguindo uma tendência imposta pelos                                               um plantel 4,5 milhões de animais e um abate de 6
mercados mundiais de especialização e concentra-                                              milhões de cabeças.4 Estes números apresentam cer-
ção, visando conferir-lhe maior produtividade. De                                             ca de 12% do rebanho nacional e aproximadamente
outra parte, o tipo de exploração econômica trou-                                             um terço do total de abates inspecionados no país.
xe consigo os inconvenientes ambientais, conforme                                             Na região Oeste do estado, a poluição, a partir dos
destacado por Débora Brasil:2                                                                 anos 80, passou a ter um caráter mais grave devi-
                                                                                              do à intensificação dos sistemas de produção, à es-
1
  A configuração da sociedade contemporânea, como uma sociedade de risco, tem
como pressuposto a constatação de um quadro de riscos catastróficos, marcados
pela invisibilidade (ameaça nuclear, aquecimento global, etc.) e pela incapacida-     parâmetros da suinocultura em Braço do Norte. Dissertação de Mestrado arquivada
de do Estado de dar respostas eficazes para tais problemas e garantir a segurança     na Biblioteca da UFSC. Florianópolis, 2002, p. 131.
dos cidadãos (irresponsabilidade organizada, estado de segurança e explosividade      3
                                                                                        Segundo KONZEN (1983: 19), cada animal produz cerca de 0,27 m³ de dejetos
                                                     (Risk society toward a new mo-
social). Tais conceitos, elaborados por Ulrich Bec�� (                                por mês, o que apresenta uma produção de, aproximadamente, 35.900 m³ de deje-
dernity.) e analisados por David Golblatt (Teoria social e ambiente, p. 228) podem    tos produzidos diariamente no Estado, dos quais, grande parte é manejada de for-
ser encontrados também em José J. Gomes Canotilho (Direito público do ambiente,       ma inadequada.
Cláudia A. D. Soares (O imposto ecológico. Contributo para o estudo dos instrumen-    4
                                                                                        Dados de 2002 indicam que naquele ano Santa Catarina já possuía um plantel de
tos econômicos de defesa do ambiente.) e José Rubens Morato Leite e Patryc�� de A.    aproximadamente 5,4 milhões de cabeças, com aproximadamente 418 mil matrizes
Ayala (Direito ambiental na sociedade de risco).                                      alojadas em cerca de 12 mil propriedades suinícolas, sendo 2.300 destas indepen-
2
  BRASIL, Débora Magali. Apontamento sobre o valor do prejuízo ecológico. Alguns      dentes e 9.700 integradas a uma grande agroindústria exportadora (Henn: 2005).
cassez de áreas agrícolas em condições de utilizar                               As altas concentrações de nutrientes como nitrogê-
        os dejetos como fertilizante e à baixa capacidade de                             nio (N) e fósforo (P), e a elevada concentração de
        investimentos dos pequenos produtores familiares                                 sólidos voláteis (SV) em relação aos sólidos fixos
        da região em adotar sistemas adequados de arma-                                  (SF), conferem aos dejetos de suínos um elevado
        zenamento e/ ou tratamento dos dejetos. Até mea-                                 potencial poluidor (potencial cerca de 4,2 vezes su-
        dos dos anos 90, apenas 15% dos suinocultores dis-                               perior ao esgoto doméstico, segundo a World Heal-
        punham de sistemas de armazenamento de dejetos                                   th Organization). A fração nitrogenada é a que cau-
        para o posterior aproveitamento como fertilizante.5                              sa maiores danos, como a floração nas águas super-
                                                                                         ficiais, formação de nitritos (NO2-), elemento can-
  Como fator agravante registra-se que nas últimas                                       cerígeno, em meio anaeróbio, e de nitratos (NO3-)
duas décadas ocorreram alterações significativas no sis-                                 em contato com águas subterrâneas. Altas concen-
tema produtivo e estrutura tecnológica, com uma forte                                    trações de nitratos nos lençóis freáticos ( 10 mg/
concentração da produção e aumento na produtividade                                      l) podem causar câncer e metahegoglobinemia em
do rebanho industrial, sem que tais mudanças tenham                                      crianças (síndrome do bebê azul), além de eutrofi-
                                                                                         zação dos corpos d’água, como também causa a pre-
provocado a melhoria das condições econômicas dos
                                                                                         sença de fósforo. O nitrogênio na forma de amônia é
produtores.
                                                                                         extremamente tóxico aos peixes, além de transmitir
                                                                                         importantes fatores patogênicos (Henn, 2005).
   Em pouco mais de duas décadas o aperfeiçoamento
da tecnologia de criação também levou à concentra-                                       A utilização dos dejetos de suínos pode ainda alte-
ção do setor em Santa Catarina, reduzindo em mais                                        rar as propriedades físicas, químicas e biológicas do
de 80% o número de produtores suinícolas. Eram                                           solo. Estas ações podem ser traduzidas em acúmulo
cerca de 67 mil propriedades em 1980, contra aproxi-                                     de elementos tóxicos, principalmente metais pesa-
madamente 13 mil em 2003, segundo dados da ACCS                                          dos como o cobre e zinco, poluentes orgânicos, con-
– Associação Catarinense de Criadores de Suínos.6                                        taminação da água superficial, através da lixiviação
                                                                                         de elementos provenientes da decomposição dos
    Por outro lado, associado a essa produção de es-                                     dejetos no solo, e odores desagradáveis oriundos da
cala, verificou-se também um agravamento dos pro-                                        volatilização de compostos. O uso de cobre e zinco
blemas de poluição com a contaminação do solo e                                          nas rações como promotores do crescimento e con-
dos recursos hídricos na região onde a suinocultura                                      troladores da diarréia podem conferir aos dejetos de
                                                                                         suínos um importante potencial poluidor, poden-
se intensificou.
                                                                                         do causar, em longos períodos, acúmulos destes no
                                                                                         solo e sua transferência para a cadeia alimentar ou
   Em linhas gerais os problemas de poluição decor-
                                                                                         outros sistemas (Pocojes��i et al., 2004).
rem do volume de dejetos produzidos em sistemas
de confinamento onde, freqüentemente, o número                                         Os produtores, de maneira geral, armazenam os
de animais é superior à capacidade de suporte das                                   dejetos em esterqueiras usando-os posteriormente
instalações e o volume de dejetos fica, também, aci-                                na agricultura e na adubação de pastagens ou áreas
ma dos limites naturais de absorção. A ineficiência                                 agrícolas; contudo, a área disponível para absorção
dos sistemas de tratamento faz com que grande parte                                 do volume de dejeto produzido tem se mostrado in-
dos dejetos produzidos seja lançada no solo e carre-                                suficiente.
ada para os corpos hídricos contaminando as águas
superficiais e subterrâneas.                                                           Na bacia do Rio Ariranha, no Oeste Catarinense,
                                                                                    objeto de um estudo mais aprofundado pelo Proje-
   Além dos impactos sobre o meio ambiente, a ex-
                                                                                    to de Gestão Ambiental Rural da Bacia Hidrográ-
cessiva carga de nutrientes (destacando-se o nitrogê-
                                                                                    fica do Rio Ariranha – GESTAR Ariranha - SC, os
nio, o fósforo e os metais zinco e cobre) que contami-
                                                                                    problemas associados à suinocultura não são ape-
na os cursos d’água, constitui séria ameaça à saúde
                                                                                    nas ambientais, mas também econômicos e sociais.
da população, cujas conseqüências não foram ainda
                                                                                    Nessa área a concentração da atividade, incentivada
suficientemente avaliadas. Ademar Romeiro7 enfati-
                                                                                    pela agroindústria, e o manejo inadequado dos deje-
za esse aspecto da poluição destacando:
                                                                                    tos produzidos pelos animais, geraram conseqüên-
                                                                                    cias danosas para o meio ambiente que se pretende,
5
  GUIVANT, Julia S. e MIRANDA, Cláudio (Orgs.). Desafios para o desenvolvi-
mento sustentável da suinocultura: Uma abordagem multidisciplinar. Chapecó: Ar-
                                                                                    agora, reverter através de instrumentos jurídicos de
gos, 2004, p. 11/12.                                                                comando-e-controle (ajustamento de conduta, licen-
6
  Segundo dados citados por Kunz et at.: 2005.
7
  ROMEIRO, Ademar Ribeiro. Análise Econômica: Relatório Final. Relatório de         ciamento, sanções) e também instrumentos econô-
Consultoria apresentado ao Projeto Gestar Ariranha. Texto não publicado. 2006, p.   micos.
17.
O presente relatório inclui uma análise jurídica
dessa problemática iniciando com uma revisão da le-
gislação brasileira e de Santa Catarina aplicável à ges-
tão ambiental, incluindo os instrumentos legais para
a regulação e controle dos impactos ambientais gera-
dos pelos atores da cadeia produtiva de suínos.

   O tema da responsabilidade civil por danos am-
bientais é identificado no item 2 com uma aborda-
gem das especificidades da responsabilização pe-
los impactos ambientais gerados pela atividade sui-
nícola. A aplicação do princípio do poluidor-paga-
dor e as limitações ao ajustamento de conduta são
enfocados na identificação dos responsáveis pe-
los custos ambientais decorrentes dessa atividade.

   No item 3 são apresentadas alternativas parta a so-
lução dos problemas, a partir de uma definição de
responsabilidades que implica na revisão do ajusta-
mento de conduta firmado e definição de um novo
marco regulatório proposto.

   Este Relatório não pretende esgotar a aborda-
gem dos temas jurídicos correlatos, como as inúme-
ras possibilidade de instrumentos econômicos para
uma gestão ambiental eficaz na Bacia do Ariranha,
mas concentra-se na definição da responsabilidade
de cada um dos atores envolvidos, propondo uma
matriz regulatória que deve ser amplamente debati-
da visando obter uma base normativa que possa ser
usada em outras regiões que convivem com proble-
mas ambientais similares.

   Ainda introdutoriamente cumpre assinalar o inte-
resse e a preocupação dos organismos governamen-
tais e não governamentais com a sustentabilidade da
atividade e o bem-estar social das populações produ-
toras e moradores nessa região, onde se concentra a
produção; contudo, é possível antecipar que grande
parte dos problemas ambientais já identificados te-
riam sido prevenidos e mitigados se houvesse orien-
tação, incentivo financeiro e fiscalização por parte
das empresas integradoras e dos órgãos ambientais.
1. LEgISLAÇÃO PERTINENTE




1.1 LEGISLAçÃO FEDERAL                                       2) de 50 (cinqüenta) metros para os cursos d’água
                                                                que tenham de 10 (dez) a 50 (cinqüenta) metros
   Na legislação federal, inúmeras normas podem                 de largura;
ser invocadas para tutelar o meio ambiente, especial-        (...)
mente no controle da poluição e responsabilização
dos poluidores.                                              b) ao redor das lagoas, lagos ou reservatórios
                                                                d’água naturais ou artificiais;1
   Dada a extensão do quadro normativo, neste Re-            c) nas nascentes, ainda que intermitentes e nos
latório serão indicados apenas os dispositivos que              chamados “olhos d’água”, qualquer que seja a
podem ser correlacionados com a matéria em exa-                 sua situação topográfica, num raio mínimo de
me, qual seja, a poluição causada pela suinocultura e           50 (cinqüenta) metros de largura;
as medidas corretivas e reparatórias a cargo dos res-        d) no topo de morros, montes, montanhas e serras;
ponsáveis.
                                                             e) nas encostas ou parte destas com declividade
   Observada a ordem cronológica impõe-se a análi-              superior a 45º, equivalente a 100% na linha de
se, inicialmente, do Código Florestal:                          maior declive;
                                                             (...)
Lei n° 4.1, de 1/0/6
                                                            Entre as áreas de preservação permanente desta-
   O Código Florestal (Lei n° 4.771/65) constitui        cam-se as matas ciliares, também conhecidas como
norma de grande relevância na tutela do meio am-         matas ripárias ou de galeria. Elas recebem o nome
biente, na medida em que nele se inserem importan-       ciliar porque funcionam como cílios protegendo os
tes institutos voltados para a proteção da flora e de    corpos hídricos e regulando os fluxos de água super-
áreas especialmente protegidas.                          ficiais e subterrâneos e contribuindo para a fixação
                                                         do carbono. Ana Maria Marchesan2 assinala que os
  Entre os espaços territoriais que gozam de especial    principais objetivos dessas matas são:
proteção no citado diploma legal, estão as áreas de         a) reduzir as perdas do solo e os processos de ero-
preservação permanente e a reserva florestal legal.            são e, por via reflexa,evitar o assoreamento (ar-
                                                               rastamento de partículas do solo) das margens
áreas de preservação permanente                                dos corpos hídricos.
   O Código Florestal define as APPs como “área             b) garantir o aumento de fauna silvestre e aquáti-
protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com            ca, proporcionando refúgio e alimento para es-
a função ambiental de preservar os recursos hídricos,          ses animais;
a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversida-       c) manter a perenidade das nascentes e fontes;
de, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e      d) evitar o transporte de defensivos agrícolas para
assegurar o bem-estar das populações humanas na-               os cursos d´água;
tivas” Art. 1º § 2º, II).
                                                            e) possibilitar o aumento de água e dos lençóis
   São APPs pelo efeito da lei (art. 2° do Código Flo-         freáticos, para dessedentação humana e animal
restal) as florestas e demais formas de vegetação na-          e para o uso nas diversas atividades de subsis-
tural situadas:                                                tência e economia;
   a) ao longo dos rios ou de qualquer curso d’água         f) garantir o reaproveitamento de fauna e maior
     desde o seu nível mais alto em faixa marginal             reprodução da flora;
     cuja largura mínima seja:                           1
                                                           A Resolução do CONAMA Resolução n° 302, de 20 de março de 2002 define as
   1) de 30 (trinta) metros para os cursos d’água de     APPs para as áreas de entorno de lagos e reservatórios.
                                                         2
                                                           MARCHESAN, Ana Maria M. Áreas de “degradação permanente”, escassez e ris-
     menos de 10 (dez) metros de largura;                cos. Revista de Direito Ambiental n° 35. São Paulo: RT, 2004. p. 190/216.




                                                                                                                                11
g) controlar a temperatura, propiciando             conforme as peculiaridades, condições ecológicas,
                 um clima mais ameno;                                em cada uma das regiões geopolíticas do País, e que
                                                                     não pode destinar-se à realização de atividade que
                 h) valorização da propriedade rural, e              implique na derrubada da vegetação nativa.

                 i) formar barreiras naturais contra a disse-            No caso da região Sul do país, vinte por cento
                 minação de pragas e doenças na agricultura.         (20%), da propriedade rural situada em área de flo-
                                                                     resta ou outras formas de vegetação nativa, são pro-
  No caso das APPs na região em estudo, além das                     tegidos a título de reserva legal. Isso significa que a
funções acima, elas são imprescindíveis para proteção                limitação administrativa imposta às áreas de reser-
dos corpos hídricos, limitando o carreamento de resí-                va legal impede que a vegetação nativa seja integral-
duos oriundos da suinocultura para o corpo hídrico.                  mente suprimida (corte raso5) não impedindo, po-
                                                                     rém, sua utilização sob regime de manejo florestal
   As APPs encontram-se submetidas a um regime
                                                                     sustentável. Excetuam-se dessa regra, as áreas de re-
jurídico de interesse público com imposição de pre-
                                                                     serva legal em pequena propriedade ou posse rural
servação integral e permanente da flora, vedada sua
                                                                     familiar, nas quais podem ser computados os plan-
supressão. Trata-se de proteção que independe da ti-
                                                                     tios de árvores frutíferas ornamentais ou industriais
tularidade do domínio3 e decorre de limitação admi-
                                                                     com espécies exóticas.
nistrativa com previsão de sanções severas no caso
de descumprimento (administrativas e penais4), es-
                                                                        O Código Florestal exige que a Reserva Legal seja
tando excepcionalizados na lei os casos que podem
                                                                     averbada à margem da inscrição da matrícula do
justificar a supressão da APP (obras de utilidade pú-
                                                                     imóvel junto ao competente Cartório de Registro
blica e interesse social).
                                                                     de Imóveis (Art. 16, §2º, e art. 44, parágrafo único
   A degradação de APP configura crime e enseja a                    – Cód. Florestal), contudo, poucas são as proprieda-
responsabilização administrativa e civil do degrada-                 des que possuem sua reserva legal averbada. Objeti-
dor que é obrigado a promover a recuperação des-                     vando superar esse quadro de omissão, alguns Esta-
sas áreas.                                                           dos estão definindo em leis estaduais essa exigência,
                                                                     como requisito para licenciamento das propriedades
Reserva florestal legal                                              rurais,6 sendo a averbação da reserva uma condição
                                                                     legal para o exercício do direito de exploração.
   A Reserva Florestal Legal, ou simplesmente Re-
serva Legal, compreende uma fração do imóvel rural                      O corte raso da reserva legal é passível de sanção
protegida através de uma limitação administrativa                    administrativa e nos casos em que a mesma tenha
imposta visando assegurar a manutenção de um per-                    sido totalmente desmatada, o proprietário ou pos-
centual que impede a supressão integral da cobertura                 suidor rural deve adotar as seguintes alternativas,
vegetal. Esse percentual é definido em função do bio-                isoladas ou conjuntamente:
ma e da região onde se situa o imóvel rural. Trata-se                   I - recompor a reserva legal de sua propriedade
de uma exigência ditada, sobretudo, pela necessida-                        mediante o plantio, a cada três anos, de no mí-
de de proteção da biodiversidade.                                          nimo 1/10 da área total necessária à sua comple-
                                                                           mentação, com espécies nativas, de acordo com
   O Código Florestal (com a redação dada pela MP                          critérios estabelecidos pelo órgão ambiental es-
nº. 2.166-66 de 2.001) assim define Reserva Legal:                         tadual competente;
          Área localizada no interior de uma propriedade ou             II - conduzir a regeneração natural da reserva le-
          posse rural, excetuada a de preservação permanen-                gal e;
          te, necessária ao uso sustentável dos recursos natu-          III - compensar a reserva legal por outra área
          rais, à conservação e reabilitação dos processos eco-            equivalente em importância ecológica e exten-
          lógicos, à conservação da biodiversidade e ao abrigo
          e proteção de fauna e flora nativas (Art. 1º § 2º, III
                                                                           são, desde que pertença ao mesmo ecossistema
          – Código Florestal).                                             e esteja localizada na mesma microbacia.

   Portanto, a reserva legal é constituída por uma
área, cujo seu percentual é definido em lei, variando                5
                                                                       Aquele “em que são derrubadas todas as árvores ou de parte ou de todo um povo-
                                                                     amento florestal, deixando o terreno momentaneamente livre da cobertura arbó-
                                                                     rea”.
3
    Ocorrem em áreas públicas e privadas com as mesmas restrições.   6
                                                                       Como é o caso do Sistema de Licenciamento de Propriedades Rurais - SLAPR
4
    Ver a propósito os artigos 38, 39 e 44 da Lei n° 9.605/98.       instituído no Estado de Mato Grosso.




12
Lei 6.3, de 31/0/11.                                   das características do meio ambiente, equiparando,
                                                            legalmente, poluição e degradação. De conformida-
   Uma das mais importantes normas ambientais em            de com o inciso II do artigo 3° da lei mencionada,
vigor no país, essa lei estabelece os princípios, objeti-   entende-se por poluição:
vos e instrumentos da política nacional do meio am-
biente e a estrutura do Sistema Nacional constituído           A degradação da qualidade ambiental resultante
para implementá-la, definindo poluição e fixando a          de atividades que direta ou indiretamente:
responsabilidade civil, penal e administrativa do po-          a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar
luidor.                                                          da população;
  Entre os princípios destacam-se, por serem perti-            b) criem condições adversas às atividades sociais
nentes a esta abordagem:                                         e econômicas;
  • ação governamental na manutenção do equilí-                c) afetem desfavoravelmente a biota;
    brio ecológico, considerando o meio ambiente               d) afetam as condições estéticas ou sanitárias do
    como um patrimônio público a ser necessaria-                 meio ambiente;
    mente assegurado e protegido, tendo em vista o             e) lancem matérias ou energia em desacordo com
    uso coletivo;                                                os padrões ambientais estabelecidos.
  • racionalização do uso do silo, do subsolo, da
    água e do ar;                                              Finalmente, um outro aspecto de grande relevân-
  • planejamento e fiscalização do uso dos recursos         cia na citada lei é a fixação da responsabilidade ob-
    ambientais;                                             jetiva por danos ambientais, que será abordada no
                                                            item seguinte.
  • controle e zoneamento das atividades potencial
    ou efetivamente poluidoras;                             Lei nº .34, de 24/0/.
  • recuperação de áreas degradadas (art. 2°, I, II,
    III, V e VIII).                                            Essa Lei disciplina a Ação Civil Pública e contém
                                                            aspectos relevantes na discussão da temática objeto
   Visando promover a compatibilização do desen-            deste Relatório. Trata-se de uma lei de caráter pro-
volvimento econômico-social com a preservação da
                                                            cessual, concebida para proteger os interesses difu-
qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológi-
                                                            sos da sociedade.
co, a lei fixa entre seus objetivos a imposição, ao po-
luidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ ou          O Ministério Público é o titular da ação civil pú-
indenizar os danos causados e, ao usuário, da con-          blica o que não impede que outros co-legitimidados7
tribuição pela utilização de recursos ambientais com        possam propô-la.
fins econômicos (art. 4°, I e VII).
                                                               A lei faculta também ao Ministério Público ins-
   Entre os instrumentos que a citada lei relaciona         taurar o inquérito civil para colher subsídios visando
para consecução desses objetivos destacam-se o es-          instruir eventual ação a ser proposta.
tabelecimento de padrões de qualidade ambiental, o
licenciamento ambiental, a revisão de atividades efe-          Consta também da citada Lei a possibilidade de
tiva ou potencialmente poluidoras e as penalidades          ajustamento de conduta com força de título executi-
disciplinares ou compensatórias ao não cumprimen-           vo, conforme se transcreve:
to das medidas necessárias à preservação ou corre-
ção da degradação ambiental (art. 9°, I, IV e IX); o            Art. 5° (...)
que significa que o Poder Público (que inclui tam-
bém o Estado membro e o próprio município) po-                 § 6° os órgãos públicos legitimados poderão to-
dem definir padrões de emissão de poluentes, visan-         mar dos interessados compromisso de ajustamento
do a restauração do equilíbrio ecológico regional ou        de sua conduta às exigências legais, mediante comi-
local, adequando os licenciamentos ao quadro nor-           nações, que terá eficácia de título executivo extraju-
mativo pré-estabelecido e sancionando aqueles que           dicial.
não se ajustarem aos novos parâmetros de emissão.
                                                            7
                                                              Pela lei possuem legitimidade ativa para proporem ação civil pública o Ministé-
  Cabe assinalar que a Lei nº 6.938/81 considera de-        rio Público e pessoas jurídicas de direito público, incluindo as empresas públicas,
                                                            fundações, sociedades de economia mista, assim como as associações destinadas à
gradação da qualidade ambiental a alteração adversa         proteção do meio ambiente ou à defesa do consumidor, constituídas a pelo menos
                                                            um ano.




                                                                                                                                           13
Oportuno assinalar que frente à indisponibilida-          Lei nº .433, de 0/01/.
de do interesse público (no caso a proteção do meio
ambiente), teoricamente nem o Ministério Público,               A Lei da Política Nacional de Recursos Hídricos
nem o órgão ambiental, ou outro co-legitimado ati-           define objetivos, diretrizes, instrumentos e a estru-
vo poderá transigir, já que não têm eles a disponibi-        tura institucional para o gerenciamento dos recursos
lidade material dos interesses difusos que estão em          hídricos e tem entre suas diretrizes gerais de ação:
jogo (dos quais não são titulares, pois se trata de inte-       • a gestão sistemática dos recursos hídricos, sem
resses metaindividuais). Os tribunais se posicionam                dissociação dos aspectos de quantidade e qua-
favoravelmente à homologação da transação através                  lidade;
da qual se pode conseguir praticamente tudo o que é
                                                                • a adequação da gestão de recursos hídricos às
objeto do pedido, sob forma de autocomposição da
                                                                   diversidades físicas, bióticas, demográficas, eco-
lide.
                                                                   nômicas, sociais e culturais das diversas regiões
                                                                   do País;
Resolução CONAMA nº 23, de 1/12/1.
                                                                • a integração da gestão de recursos hídricos com
                                                                   a gestão ambiental;
  Através dessa resolução o Conselho Nacional do
Meio Ambiente estabeleceu normas para o licencia-               • a articulação da gestão de recursos hídricos com
mento ambiental de atividades poluidoras.                          a do uso do solo.

                                                                A gestão dos recursos hídricos, na região do rio
   De conformidade com essa resolução o órgão am-
                                                             Ariranha constitui um desafio que não pode ser en-
biental poderá definir, se necessário, “procedimentos
                                                             frentado sem a solução dos problemas ambientais
específicos para as licenças ambientais, observadas a
                                                             que envolvem a supressão da mata ciliar e a contami-
natureza, características e peculiaridades da ativida-
                                                             nação das águas superficiais e subterrâneas.
de ou empreendimento e, ainda, a compatibilização
do processo de licenciamento com as etapas de pla-              Como analisado no item 1 as altas concentrações
nejamento, implantação e operação”, admitindo-se o           de nutrientes como nitrogênio (N) e fósforo (P), con-
licenciamento ambiental para pequenos empreendi-             ferem aos dejetos de suínos um potencial poluidor
mentos e atividades similares em um único processo           4,2 vezes superior ao esgoto doméstico, provocando
desde que definida a responsabilidade legal pelo con-        a eutrofização do corpo hídrico e contaminação das
junto de empreendimentos ou atividades (art. 12).            águas superficiais por metais pesados como o cobre
                                                             e zinco. Da mesma forma, o acúmulo de dejetos no
   Outro aspecto importante nessa Resolução e que            solo acaba por contaminar também o lençol freáti-
guarda relação com o tema deste Relatório encontra-          co, o que constitui problema de oneroso e complexo
se estabelecido no art. 19, a seguir transcrito:             tratamento.
     Art. 19 O órgão ambiental competente, mediante
     decisão motivada, poderá modificar os condicio-
                                                                Destaca-se, na citada Lei, a importância dos Co-
     nantes e as medidas de controle e adequação, sus-       mitês de Bacia como órgãos colegiados que exer-
     pender ou cancelar uma licença expedida, quando         cem a função de “parlamentos da água” competin-
     ocorrer:                                                do-lhes, entre outras atribuições, promover o debate
                                                             das questões relacionadas a recursos hídricos e arti-
     I - Violação ou inadequação de quaisquer condicio-      cular a atuação das entidades intervenientes; aprovar
     nantes ou normas legais.                                e acompanhar a execução do Plano de Recursos Hí-
                                                             dricos da bacia e sugerir as providências necessárias
     II - Omissão ou falsa descrição de informações rele-    ao cumprimento de suas metas (art. 38, I, III e IV).
     vantes que subsidiaram a expedição da licença.

     III - superveniência de graves riscos ambientais e de   Lei nº .60, de 12/02/1.
     saúde.
                                                                A Lei dos Crimes Ambientais representa um im-
                                                             portante marco na criminalização das condutas lesi-
                                                             vas ao meio ambiente, sobretudo porque atualizou e
                                                             sistematizou as infrações que constavam em leis es-
                                                             parsas, traduzindo em um único documento o diplo-




14
ma legal que permite a atuação repressiva do Poder                                     1.2 NORMAS ESTADUAIS
Público relativamente aos crimes ambientais.
                                                                                         Lei nº 5.793 de 15 de outubro de 1980.
    Entre as condutas consideradas criminosas, iden-
tificadas na Bacia do Ariranha, podem ser citadas:                                        Com apenas 23 artigos a Lei de Proteção e Melho-
                                                                                       ria da Qualidade Ambiental do Estado de Santa Ca-
        Art. 33. Provocar, pela emissão de efluentes ou car-                           tarina estabelece diretrizes para a proteção ambien-
        reamento de materiais, o perecimento de espécimes                              tal, atribuindo ao Poder Executivo a regulamentação
        da fauna aquática existentes em rios, lagos, açudes,                           dos inúmeros aspectos da proteção ambiental, trata-
        lagoas, baías ou águas jurisdicionais brasileiras;                             dos apenas de forma genérica pela lei estadual.
        Art. 38. Destruir ou danificar floresta considerada                               Destaca-se na citada Lei, a expressa referencia à
        de preservação permanente, mesmo que em forma-                                 criação de linhas de crédito para a instalação de obras
        ção, ou utilizá-la com infringência das normas de
                                                                                       e equipamentos voltados para o controle da poluição
        proteção;
                                                                                       e à racionalização do uso dos recursos ambientais,
        Art. 54. Causar poluição, de qualquer natureza em                              nos dispositivos a seguir transcritos:
        níveis tais que resultem ou possam resultar em da-
        nos à saúde humana ou que provoquem a mortanda-                                     Art. 14 O Governo do Estado promoverá a criação
        de de animais ou a destruição significativa da flora;                               de linhas especiais de crédito no seu Sistema Finan-
                                                                                            ceiro para financiar o desenvolvimento da pesquisa,
        Art. 60. Construir, reformar, ampliar, instalar ou fa-                              execução de obras, aquisição e instalação de equipa-
        zer funcionar, em qualquer parte do território na-                                  mentos que concorram para o controle da degrada-
        cional, estabelecimentos, obras ou serviços poten-                                  ção ambiental, ou melhoria da qualidade do meio
        cialmente poluidores, sem licença ou autorização                                    ambiente.
        dos órgãos ambientais competentes, ou contrarian-
        do as normas legais e regulamentares pertinentes.                                   Art. 15 O Poder Público estabelecerá sistema de be-
                                                                                            nefícios, visando incentivar.
Resolução Conama n° 3, de                                                                 I - o desenvolvimento, no Estado, de pesquisas e
1 de março de 200.                                                                        processos tecnológicos destinados a prevenir ou re-
                                                                                            duzir a degradação ambiental;
   A Resolução Conama n° 357, editada em substi-
tuição à Resolução nº 20/86, dispõe sobre a classi-                                         II - a fabricação de equipamentos antipoluentes;
ficação dos corpos de água e diretrizes ambientais
para seu enquadramento, bem como padrões de lan-                                            II - outras iniciativas que possam conduzir à racio-
çamento de efluentes.                                                                       nalização do uso dos recursos ambientais.

   A nova resolução avança ao exigir o tratamento                                         Na citada lei foi o executivo autorizado a instituir,
de efluentes de qualquer natureza8 e também quan-                                      organizar e regulamentar Fundo Especial para pre-
do introduz novas diretrizes para monitoramento da                                     servação, proteção e melhoria da qualidade do Meio
água, como a exigência de periodicidade no moni-                                       Ambiente, atual Fundo Especial de Proteção ao Meio
toramento, a avaliação por indicadores biológicos e                                    Ambiente – FEPEMA.
a obrigação de investigação a expensas do empreen-
dedor.                                                                                 Decreto nº 14.20, de  de junho de 11.

  De forma geral essa Resolução representa um ga-                                         Este Decreto regulamenta dispositivos da Lei nº
nho em termos de proteção ambiental9 fortalecendo,                                     5.793, de 15 de outubro de 1980, referentes à Prote-
sobretudo a gestão dos recursos hídricos com medi-                                     ção e a Melhoria da Qualidade Ambiental, tomando
das de planejamento e controle.                                                        como referência os parâmetros fixados pela legisla-
                                                                                       ção federal. Assim, embora o citado decreto contem-
                                                                                       ple inúmeras inovações, relativamente à lei que visa
8
   É importante ressaltar que a Lei nº 9433/97 (Política Nacional de Recursos Hídri-   regulamentar, guarda simetria com a legislação fede-
cos) prevê a possibilidade de outorga para o lançamento em corpos hídricos de es-
gotos e resíduos, tratados ou não; prática que se pretende reverter com a exigência    ral sendo, portanto, perfeitamente legal.
do tratamento de efluentes fixadas pela nova resolução do Conama.
9
   Para uma análise mais detida da citada Resolução consultar: Rodrigo A. Agosti-
nho Mendonça. “Interpretando a Resolução Conama 357/2005 – Avanços na Classi-            Referido decreto arrola entre as atribuições da
ficação dos corpos de água e no controle ambiental”. In: Antonio H. Benjamin (org.).
Paisagem, natureza e direito, p. 381 - 392.
                                                                                       Fundação do Meio Ambiente – FATMA, as ativida-



                                                                                                                                               1
des inerentes ao exercício do poder de polícia am-                 Art. 31 É proibida a emissão de substâncias odorí-
biental, incluindo o controle sobre as atividades de               feras na atmosfera em quantidades que possam ser
proteção e conservação dos recursos naturais; a fis-               perceptíveis fora dos limites da área de propriedade
calização ambiental; a expedição de licenças ambien-               da fonte emissora.
tais, e a apreciação de projetos voltados para a dispo-
                                                                   (...)
sição de resíduos sólidos de qualquer natureza. As
licenças ambientais acompanham o parâmetro e a
denominação prevista na legislação federal: Licença              O regulamento falha ao dispor sobre as “áreas de
Ambiental Prévia - LAP; Licença Ambiental de Insta-           formação vegetais defensivas à erosão”, que consti-
lação - LAI, e Licença Ambiental de Operação - LAO.           tuem as chamadas áreas de preservação permanente
                                                              regulamentadas pelo Código Florestal (Lei 4.771/65).
   No que tange a normatização das atividades polui-          Estabelece o mencionado decreto:
doras, entre as quais insere-se a suinocultura, consta
                                                                   Art. 49 Nas áreas de formação vegetais defensivas
do referido decreto a vedação do lançamento, direto
                                                                   à erosão fica proibido o corte de árvores e demais
ou indireto em corpos de água, de qualquer resíduo
                                                                   formas de vegetação natural, obedecidos os seguin-
sólido (art. 8°), proibindo, também, depositar, dis-               tes critérios:
por, descarregar, enterrar, infiltrar ou acumular no
solo resíduos, em qualquer estado da matéria, desde                I - ao longo dos cursos de água, em faixa marginal,
que causem degradação da qualidade ambiental (art.                 cuja largura mínima será:
20). Consta, ainda, do regulamento algumas normas
específicas relativas à disposição de resíduos, a seguir           a) de 10 (dez) metros, para rios de largura inferior a
transcritas:                                                       20 (vinte) metros;

     Art. 21 O solo somente poderá ser utilizado para              b) igual a metade da largura do rio, quando a largu-
     destino final de resíduos de qualquer natureza, des-          ra for superior a 20 (vinte) metros;
     de que sua disposição seja feita de forma adequada,
     estabelecida em projetos específicos, ficando vedada          II - ao redor das lagoas, lagos e reservatórios de água
     a simples descarga ou depósito, seja em propriedade           numa faixa de 100 (cem) metros;
     pública ou particular.
                                                                   III - ao redor das nascentes, numa faixa de 50 (cin-
     (...)                                                         qüenta) metros;

     Art. 22 Os resíduos de qualquer natureza, portado-            IV - nas áreas acima das nascentes, no topo dos
     res de patogênicos ou de alta toxidade, bem como              morros, montes, montanhas e serras;
     inflamáveis, explosivos, radioativos e outros preju-
     diciais, deverão sofrer, antes de sua disposição final        V - nas encostas ou parte destas, com declividade
     no solo, tratamento e/ ou acondicionamento ade-               superior a 45º (quarenta e cinco) graus, equivalen-
     quados fixados em projetos específicos, que aten-             te a 100% (cem por cento) na linha de maior decli-
     dam os requisitos de proteção à saúde pública e ao            ve; (...)
     meio ambiente.
                                                                 Obviamente que a simples mudança na denomi-
     (...)                                                    nação desses espaços territoriais especialmente pro-
                                                              tegidos, não autoriza o executivo estadual estabele-
     Art. 23 Somente será tolerada a acumulação tem-          cer parâmetros menos restritivos que aqueles previs-
     porária de resíduos de qualquer natureza, desde que      tos na norma geral federal, razão pela qual prevale-
     não ofereça risco à saúde pública e ao meio ambien-      cem os limites fixados no Código Florestal para pro-
     te.                                                      teção das áreas de preservação permanente.
     Art. 24 O tratamento, quando for o caso, o trans-
     porte e a disposição de resíduos de qualquer natu-
                                                              Lei nº .4 de 30 de novembro de 14.
     reza de estabelecimentos industriais, comerciais e
                                                                 A Lei nº 9.748/94 dispõe sobre a Política Estadual
     de prestação de serviços quando não forem de res-
     ponsabilidade do Município, deverão ser feitos pela      de Recursos Hídricos e constitui-se em importante
     própria empresa e as suas custas.                        instrumento normativo que oferece algumas alterna-
                                                              tivas para o enfrentamento dos problemas associa-
     (...)                                                    dos à poluição hídrica decorrente da suinocultura.




16
Ressalte-se que entre as diretrizes da política esta-    aqüíferos subterrâneos situados em áreas urbanizadas
dual de recursos hídricos está a promoção de ações          (art. 28 e 29).
integradas nas bacias hidrográficas, tendo em vis-
ta o tratamento de efluentes e esgotos urbanos, in-
                                                            Lei n° .66 de 1 de junho de 12.
dustriais e outros, antes do lançamento nos corpos
d´água e o incentivo à formação de consórcios entre            Outro importante instrumento normativo previs-
os municípios, tendo em vista a realização de progra-       to na esfera estadual é a Lei n° 8.676/92 que dispõe
mas de desenvolvimento e proteção ambiental (art.           sobre a Política Estadual de Desenvolvimento Rural,
3°, X e XII).                                               definindo os pressupostos, objetivos, instrumentos
                                                            e a estrutura institucional para a execução de uma
   Assim como na legislação federal, a lei estadual
contempla os planos de bacia hidrográfica como um           política que concilie o desenvolvimento rural com a
dos instrumentos da política de recursos hídricos,          proteção do meio ambiente.
estabelecendo um conteúdo mínimo para esses pla-
                                                               Nesse sentido, cabe ressaltar que o citado diplo-
nos, que devem incluir programas de recuperação,
                                                            ma legal instituiu o Conselho Estadual de Desenvol-
proteção, conservação e utilização dos recursos hí-
                                                            vimento Rural, vinculado à Secretaria de Estado da
dricos das bacias hidrográficas, inclusive com espe-
                                                            Agricultura e Abastecimento, inserindo entre suas
cificações dos recursos financeiros necessários, a se-
rem captados mediante a cobrança pelo uso da água,          atribuições: compatibilizar as políticas de desenvol-
ou através do rateio de investimentos de interesse co-      vimento rural com a política de proteção do meio
mum, ou ainda mediante dotação orçamentária.                ambiente e conservação dos recursos naturais (art.
                                                            5°, XI). Estabelece ainda que a política de proteção
   Cabe salientar que a lei prevê também a possibili-       do meio ambiente e conservação dos recursos na-
dade da cobrança de contribuições de melhoria, ta-          turais será submetida ao citado Conselho, devendo
rifas e taxas dos beneficiados por obras e serviços de      conter programas específicos de conservação e ma-
aproveitamento e controle dos recursos hídricos, in-        nejo do uso do solo e da água, de desenvolvimento
clusive as decorrentes do rateio de custos referentes a     florestal, de tratamento de dejetos e efluentes, de re-
obras de usos múltiplos dos recursos hídricos, ou de        cuperação de áreas degradadas ou em degradação,
interesses comum ou coletivo, devendo tais recursos         com a participação da iniciativa privada (art. 17).
serem destinados ao Fundo Estadual de Recursos Hí-
dricos – FEHIDRO e utilizados no apoio financeiro à            Consta também dessa lei a criação do Fundo Esta-
instituições públicas e sob a modalidade de emprés-         dual de Desenvolvimento Rural, cuja aplicação será
timo à pessoas jurídicas de direito privado, usuárias       definida pelo Conselho Estadual de Desenvolvimen-
de recursos hídricos, para a realização de serviços e       to Rural, sendo operacionalizado através de progra-
obras com vistas a utilidade pública, ao desenvolvi-        mas que incluem, entre outros, a conservação do solo
mento, conservação, uso racional, controle e prote-         e da água (art. 36, III).
ção dos recursos hídricos superficiais e subterrâneos,
e na realização de programas conjuntos entre o Esta-        Instrução Normativa FATMA n° 11
do e os municípios, relativos a aproveitamento múl-
tiplo, controle, conservação e proteção dos recursos           Nessa IN o órgão estadual de meio ambiente de-
hídricos e defesa contra eventos críticos que ofere-        fine as exigências técnicas para o licenciamento da
çam perigo a saúde e segurança públicas e prejuízos         atividade.
econômicos ou sociais (art. 34, I e III).
                                                              Constam das instruções gerais:
   Consta da citada Lei que o Estado incentivará a for-       • A quantidade máxima de dejetos para a utiliza-
mação de consórcios intermunicipais, nas bacias hidro-          ção em lavouras é de 50 m³/ha/ano, e de acordo
gráficas consideradas prioritárias, nas quais o gerencia-       com recomendações de adubação indicadas por
mento dos recursos hídricos deve ser feito segundo di-
                                                                laudo com base em análise do solo;
retrizes e objetivos especiais e estabelecerá convênios
de mútua cooperação e assistência com os mesmos, po-          • Recomenda-se a instalação de sistemas de ca-
dendo delegar aos municípios, que se organizarem téc-           lhas e cisternas, visando o aproveitamento das
nica e administrativamente, o gerenciamento de recur-           águas pluviais para uso nas pocilgas.
sos hídricos de interesse exclusivamente local, compre-
endendo, entre outros, os de bacias hidrográficas que se      Para a obtenção da Licença de Instalação, entre
situem exclusivamente no território do município e os       outros documentos, a FATMA exige também:



                                                                                                                1
2.3 Projeto do sistema para tratamento dos resíduos
     sólidos e efluentes líquidos, das esterqueiras, bioes-
     terqueiras, sistema de fertirrigação, sistema separa-
     dor de sólidos, sistema de lagoas, outros, contendo
     memorial descritivo, de cálculo, plantas e cortes;

     2.4 Programa de monitoramento do sistema de tra-
     tamento de efluentes.

   Ainda de acordo com a citada Instrução Norma-
tiva, a concessão da Licença de Operação fica con-
dicionada à Demonstração da eficiência do sistema
de controle ambiental através de laudos laboratoriais
dos parâmetros constantes do programa de monito-
ramento aprovado na LAI.




1
2. RESPONSAbILIDADE POR DANOS AmbIENTAIS




2.1 O PRINCíPIO DA RESPONSABILIzAçÃO                                 III – poluição, a degradação da qualidade ambien-
                                                                     tal resultante de atividades que direta ou indireta-
   A responsabilização por danos ambientais, mais                    mente:
do que um princípio do Direito Ambiental, no sis-
tema jurídico nacional, trata-se de um mandamento                    a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem estar
                                                                     da população;
constitucional imprescindível à realização do direito
ao meio ambiente equilibrado. A Constituição Fede-                   b) criem condições adversas às atividades sociais e
ral é expressa ao estabelecer:                                       econômicas;
     Art. 225 Todos têm direito ao meio ambiente ecolo-              c) afetem desfavoravelmente a biota;
     gicamente equilibrado, bem de uso comum do povo
     e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao            d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do
     Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo            meio ambiente;
     e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
                                                                     e) lancem matérias ou energias em desacordo com
     (...)                                                           os padrões ambientais estabelecidos.

     § 3.° As condutas e atividades consideradas lesivas       Assim e ainda nos termos da citada lei, poluidor é a
     ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas      pessoa física ou jurídica, de direito público ou priva-
     físicas ou jurídicas, a sanções penais e administra-
                                                             do, responsável, direta ou indiretamente, por ativida-
     tivas, independente da obrigação de reparar os da-
     nos causados.
                                                             de causadora de degradação ambiental. (Art. 3°, IV)

   De acordo com a norma constitucional, o meio                 Outro aspecto igualmente relevante é que, para
ambiente constitui um bem de uso comum, cabendo              o legislador, poluição e degradação se equivalem e
ao poder público e a coletividade protegê-lo. Nessa          toda poluição, juridicamente relevante implica na al-
tarefa, a Constituição Federal atribui ao Estado al-         teração adversa do meio ambiente, ou seja, em um
gumas responsabilidades, mas define também alguns            dano ambiental.
princípios a que se subordinam o poder público e a
                                                                Bessa Antunes ao citar Francis Caballero assinala
sociedade, incluindo pessoas físicas ou jurídicas.
                                                             que o dano ecológico se distingue em “dano ecológi-
   Dessa forma, a tutela do meio ambiente no orde-           co em sentido amplo, isto é, tudo que degrada o meio
namento jurídico nacional se efetiva através de ações        ambiente, e o dano ecológico em sentido estrito, isto
do Poder Público, limitando ou restringindo direi-           é, a degradação dos elementos naturais”,10 possuindo
tos, e ainda mediante a responsabilização dos infra-         o dano ambiental, ainda na lição de Caballero, uma
tores, responsáveis por danos efetivos ou potenciais         dupla face na medida em que seus efeitos atingem
ao meio ambiente.                                            não só o homem, mas da mesma forma, o ambiente
                                                             que o cerca.
   A Lei 6.938/81 (Política Nacional do Meio Am-
biente), em seu artigo 3°, incisos II e III, delimitou as       Também Morato Leite destaca que o dano ambien-
noções de degradação da qualidade ambiental e de             tal tem uma conceituação ambivalente, “por designar
poluição, estabelecendo:                                     não só a lesão que recaí sobre o patrimônio ambien-
                                                             tal, que é comum à coletividade, mas igualmente por
     Art. 3°. Para os fins previstos nesta Lei, entende-se   se referir ao dano – por intermédio do meio ambien-
     por:                                                    te ou dano ricochete – a interesses pessoais, legiti-

     II – degradação da qualidade ambiental, a alteração
     adversa das características do meio ambiente;             ANTUNES, P. de B. Direito Ambiental. 6º edição, Rio de Janeiro: Lumen Juris,
                                                             10

                                                             2002, p 225.




                                                                                                                                       1
mando os lesados a uma reparação pelo prejuízo pa-                                        e o exercício desse direito fundamental. O trabalho
trimonial ou extrapatrimonial sofrido”.11 Para o cita-                                    do legislador, por conseguinte, visa a garantir a pos-
do autor, pode-se conceituar dano ambiental:                                              sibilidade de fruição e, só excepcionalmente, o res-
                                                                                          sarcimento monetário da lesão.
        Como toda lesão intolerável causada por qualquer
        ação humana (culposa ou não) ao meio ambiente,                              Certamente que a recomposição do dano e a res-
        diretamente, como macrobem de interesse a cole-                          ponsabilização do poluidor enfrenta limitações,
        tividade, em uma concepção totalizante, e indireta-                      como bem ilustra o exemplo da poluição causada
        mente, a terceiros, tendo em vista interesses próprios                   pela suinocultura. Individualmente cada produtor,
        e individualizáveis e que refletem no macrobem.12                        se regularmente licenciado e operando nos limites le-
                                                                                 gais, não constitui um problema, contudo, a criação
   Equivale dizer que o dano ambiental, embora sem-                              de suínos em escala, numa micro-região pode gerar
pre recaia sobre o meio ambiente, causando prejuízo                              impactos significativos, como verificado na Bacia do
à biota e indiretamente à coletividade, pode, em cer-                            rio Ariranha. Diante desse contexto, como assegurar
tos casos, refletir-se, material ou moralmente, sobre                            a recuperação dos danos decorrentes de uma ativida-
o patrimônio, ou a saúde de um grupo de pessoas.                                 de economicamente relevante?

   Outra peculiaridade do dano ambiental decorre                                   Paulo Afonso Frontini,14 aborda a problemática do
do fato de atingir um bem difuso (o meio ambiente)                               dano decorrente da ação de múltiplos agentes:
repercutindo, assim, quase sempre sobre um amplo
rol de vítimas, o que gera dificuldades na sua repa-                                      Se é em princípio lícito o uso do meio ambiente, o
                                                                                          abuso nessa utilização ultrapassa os limites da licitu-
ração, mesmo porque nem sempre é possível valo-
                                                                                          de, entrando na área do antijurídico. Assim, o abuso
rar adequadamente as conseqüências negativas para                                         na utilização de qualquer de seus componentes pas-
o ambiente, de uma conduta ou atividade. Assim,                                           sa a qualificar-se como agressão ao meio ambiente.
por exemplo, no caso da poluição causada à Bacia do                                       Fácil é perceber como essa questão é complexa, por-
Ariranha pela atividade suinícola, qual a extensão do                                     que, não raro, a agressão resulta da ação de múlti-
dano ambiental, como valorá-lo e ainda, quem pode                                         plos agentes, cada qual, a seu turno, agindo na faixa
ser considerado como vítima desse dano?                                                   da utilização. Quer dizer: embora cada agente este-
                                                                                          ja agindo licitamente (simples utilização), o resulta-
   A Lei 6.938/81 estabelece que a Política Nacional                                      do global resulta ilícito (agressão ao meio ambien-
do Meio Ambiente visará, entre outros objetivos, “à                                       te, poluição, dano ambiental). Essa peculiaridade do
imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação                                        problema induz à adoção do princípio da respon-
de recuperar e/ ou indenizar os danos causados e, ao                                      sabilidade objetiva do poluidor (Lei 6.938, art. 14,
usuário, da contribuição pela utilização de recursos                                      § 1.°), em razão de ser, muitas vezes, difícil – senão
ambientais com fins econômicos (art. 4°, VII). As-                                        impossível – enquadrar o ato de poluidor no âmbi-
                                                                                          to da culpa civil.
sim, a recuperação do bem ambiental, eventualmente
lesado, não exclui a indenização, eventualmente ca-                                 A citada Lei da Política Nacional do Meio Am-
bível e, tampouco, a obrigação do poluidor de contri-                            biente (Lei n° 6.938/81), em seu artigo 14, § 1.° con-
buir pela utilização de recursos ambientais com fins                             sagrou, no ordenamento jurídico brasileiro, o princí-
econômicos, como por exemplo, o uso da água ou do                                pio da responsabilidade objetiva por danos ambien-
solo para a diluição ou disposição de efluentes.                                 tais, fundamentada no risco da atividade, dispondo:
     Edis Milaré,13 citando Nicolo Lipari, assinala:                                      Art. 14 (...)

        A regra, pois, é procurar por todos os meios razo-                                § 1° Sem obstar a aplicação das penalidades previs-
        áveis, ir além da ressarcibilidade (indenização) em                               tas neste artigo é o poluidor obrigado, independen-
        seqüência do dano, garantindo-se, ao contrário, a                                 te da existência de culpa, a indenizar ou reparar os
        fruição plena do bem ambiental. Aquela, como já                                   danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afe-
        alertamos, não consegue recompor o dano ambien-                                   tados por sua atividade.
        tal. O valor econômico não tem o condão – sequer
        por aproximação ou ficção - de substituir a existên-                       Divergem os doutrinadores quanto à extensão
        cia do meio ambiente ecologicamente equilibrado                          da responsabilidade objetiva por danos ambientais.
11
   MORATO LEITE, José Rubens, Dano Ambiental: do individual ao coletivo extra-   14
                                                                                   Meio ambiente, sua natureza perante a lei e sua tutela – Anotações jurídicas em
patrimonial. São Paulo: RT, 2000. p. 98-99.                                      temas de agressão ambiental. Legitimidade do Ministério Público, órgão do Estado,
12
   Idem, ibidem. pág. 99.                                                        para agir em juízo. In: Edis Milaré (coord.). Ação Civil Pública: Lei 7.347/85 – Remi-
13
   MILARÉ, Edis. Op. cit. p. 671.                                                niscências e reflexões após dez anos de aplicação. São Paulo: RT, 1995. p. 399.




20
Para alguns a responsabilidade está vinculada a teo-                                  dutores, produzem efeitos externos não assimila-
ria do risco integral, enquanto outros consideram-na                                  dos pelo sistema de preços, identificados pela ciên-
associada à teoria do risco criado, o que é irrelevante                               cia econômica como externalidades. Antonio Eval-
nesta análise, porquanto pelo sistema jurídico pátrio,                                do Comune observa que “uma externalidade surge
o agente assume todo o resultado danoso decorrente                                    sempre que a produção ou o consumo de um bem
de sua atividade, independentemente da culpabilida-                                   tem efeitos paralelos sobre os consumidores ou pro-
de da ação, conforme estabelecido também no Códi-                                     dutores envolvidos, efeitos estes que não são plena-
go Civil em vigor:                                                                    mente refletidos nos preços de mercado”;17 destacan-
                                                                                      do que numa economia de concorrência perfeita,
        Art. 927 (...)                                                                o equilíbrio da alocação de recursos corresponde a
                                                                                      uma situação onde ninguém pode melhorar sua po-
        Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o
                                                                                      sição sem que outro se sinta lesado. Sustenta, porém,
        dano, independentemente de culpa, nos casos espe-
        cificados em lei, ou quando a atividade normalmen-
                                                                                      que na área ambiental essa perfeição somente se veri-
        te desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua                          fica se forem utilizados certos mecanismos de inter-
        natureza, riscos para os direitos de outrem.                                  nalização de efeitos externos, uma vez que o sistema
                                                                                      de preços não é capaz de captá-los.
  De conformidade com esse regime, para respon-
sabilização do agente por danos ambientais basta a                                       Assim no caso em exame, a indústria que conta-
comprovação da ocorrência do evento danoso e do                                       mina um rio, nele lançando, diretamente ou através
nexo de causalidade. Nas palavras de Adalberto Pas-                                   de seus parceiros, grande carga de poluente, além de
qualotto:15                                                                           provocar a redução no bem estar da população ribei-
                                                                                      rinha, afeta a produção de outras empresas a jusante,
        No regime da responsabilidade objetiva, fundada na                            que também necessitem de água. Essa externalidade
        teoria do risco da atividade, para que se possa plei-                         somente será reduzida, se os custos ambientais forem
        tear a reparação do dano, basta a demonstração do                             assumidos pelos agentes produtores e consumidores,
        evento danoso e do nexo de causalidade. A ação, da                            através da intervenção estatal, por meio de instru-
        qual a teoria da culpa faz depender a responsabili-                           mentos econômicos ou de comando-e-controle.
        dade pelo resultado, é substituída, aqui, pela assun-
        ção do risco em provocá-lo.                                                      Essa internalização dos efeitos externos implica
                                                                                      na superação de uma tradição dos estudos econô-
  Outro aspecto igualmente relevante, é destacado                                     micos que enxergam o meio ambiente como inesgo-
por Carlos André Birnfeld,16 quando assinala:                                         tável. Assim, no exemplo citado, a análise do em-
        Observe-se, assim, que a responsabilidade civil ob-                           preendimento, do ponto de vista do proprietário da
        jetiva ambiental permeia, no ordenamento brasilei-                            indústria, considera como inexistente (zero), o cus-
        ro, a aplicação do princípio do poluidor-pagador, o                           to relativo à inadequada disposição de efluentes e
        qual estabelece basicamente que o poluidor haverá                             seu carreamento para o rio. Todavia, o custo des-
        de arcar, ilimitadamente, com todos os custos de sua                          sa diluição, para terceiros usuários que sofrem com
        atitude poluente, tal qual arca, ilimitadamente, com                          a contaminação do citado curso d’água não pode-
        seus benefícios.                                                              ria ser desconsiderado na avaliação do empreendi-
                                                                                      mento poluente. Essa deseconomia externa tem efei-
   No item seguinte examinar-se á o princípio do po-                                  tos sociais que devem ser eliminados ou mitigados.
luidor-pagador, enfocando-se sua aplicação no trata-
mento dos dejetos gerados pela suinocultura e na re-                                     Analisando os efeitos das externalidades sobre o
cuperação dos danos ambientais já identificados.                                      meio ambiente, Vitor Bellia sustenta que as perdas
                                                                                      com a contaminação ambiental atingem as ativida-
2.2 O PRINCíPIO DO POLUIDOR-PAGADOR                                                   des produtivas, a saúde, as propriedades e bens ma-
                                                                                      teriais, a vegetação, o solo, a vida animal, os valores
  As atividades humanas, sobretudo as sócio-eco-                                      estéticos e culturais, e que “todas essas perdas envol-
nômicas, que repercutam sobre consumidores e pro-                                     vem custos sociais e não devem ser ignoradas na ava-
                                                                                      liação de projetos”. Ressalta, porém, que “para que
15
   PASQUALLOTO, Adalberto. Responsabilidade civil por dano ambiental: consi-
derações de ordem material e processual. In: BENJAMIN, Antonio H. V.[Coord.]
Dano Ambiental: prevenção, reparação e repressão. São Paulo: Revista dos Tribunais,
1993, p. 454.                                                                         17
                                                                                        COMUNE, A. E. Meio Ambiente, Economia e Economistas. In MAY, Peter Her-
16
   BIRNFELD, Carlos A. Algumas perspectivas sobre a responsabilidade civil do po-     man e MOTTA, Ronaldo Seroa (Org.) Valorando a Natureza - Análise Econômi-
luidor por danos ambientais. In: LEITE, José Rubens e BELLO FILHO, Ney de B.          ca para o Desenvolvimento Sustentável. Edit. Campus, Rio de Janeiro, 1994, p.
(Orgs.) Direito Ambiental Contemporâneo. Barueri-SP: Manole, 2004, p. 368.            50/51.




                                                                                                                                                               21
os efeitos ambientais sejam incluídos nas análises                                      Ramóns Mateo21 reconhece necessária a revisão
econômicas, é preciso reconhecer o meio ambiente                                     dos mecanismos de mercado, assinalando, que os
como insumo sujeito à escassez e, portanto, com cus-                                 poderes públicos devem se responsabilizar, de algu-
to alternativo que não seja nulo”.18                                                 ma maneira, pela internalização dos custos ambien-
                                                                                     tais, mesmo porque, em uma economia mista ou de
    O grande desafio tem sido o de reduzir essas ex-                                 mercado, os comportamentos individuais não le-
ternalidades, internalizando-as no sistema de preços.                                variam em conta o meio ambiente público; ponde-
No caso da suinocultura desenvolvida no oeste cata-                                  ra, contudo, que o procedimento possível, somente
rinense fica evidente que o custo da degradação ve-                                  poderá ser definido, a partir das circunstâncias de
rificada no solo e nos cursos d’água não estão sendo                                 cada país, observando que é aconselhável uma pru-
contabilizados no sistema de preço, ou seja, o pífio                                 dente dosimetria de taxas, penalidades, subsídios
“lucro” dos produtores, ou mesmo o lucro expressi-                                   e normas impositivas; embora insuficiente, quan-
vo das agroindústrias está sendo calculado sem que                                   do a contaminação ultrapassa as fronteiras do país.
considere as medidas corretivas necessárias para re-
verter o quadro de degradação gerado pela ativida-                                      Há um consenso entre os economistas de que essa
de.                                                                                  internalização pode se realizar através da estrutura-
                                                                                     ção jurídica de um sistema que combine o empre-
  Luiz Fernando Krieger Merico observa que                                           go de instrumentos econômicos com a previsão de
a internalização dos custos ambientais não é,                                        sanções e procedimentos eficazes para a reparação e
por si só suficiente para enfrentar a poluição:                                      compensação de danos causados ao meio ambiente.
        a internalização de custos ambientais é um passo                                Entre os institutos jurídicos concebidos para pro-
        importante no controle do uso dos recursos e ser-                            mover a internalização das externalidades destaca-
        viços naturais, mas é também importante percebe-                             se o princípio do poluidor-pagador (PPP) inserido
        rem-se as limitações desses mecanismos para se en-
                                                                                     entre as Recomendações da Organização para a Co-
        frentar a degradação como um todo. Tais mecanis-
        mos devem ser suplementos de ações diretas que li-
                                                                                     operação e Desenvolvimento Econômico - OCDE22,
        mitem a escala da economia em relação à biosfera.                            a partir da constatação de que o mercado não con-
        A internalização dos custos ambientais fará os con-                          segue assimilar, no sistema de preços, os custos in-
        sumidores pagarem o custo real do que adquirirem,                            tegrais dos bens e serviços, o que implica na implí-
        ao invés de repassar estes custos à sociedade. Po-                           cita concessão de subsídios às atividades poluidores,
        derá também conduzir à adoção de meios mais efi-                             acarretando a degradação dos recursos ambientais,
        cientes de se conter a poluição e de uso eficiente de                        reconhecidamente escassos.
        energia e recursos. Mas são, na realidade, comple-
        mentos de ações que levem a sustentabilidade, pois                              Na base desse princípio está o reconhecimento da
        são ineficientes em produzi-la.19                                            existência das externalidades e das falhas do merca-
                                                                                     do que não consegue refletir adequadamente a dete-
   A experiência tem demonstrado que os mecanis-                                     rioração e a escassez dos recursos ambientais limi-
mos de mercado necessitam serem reorientados a                                       tados. A OCDE admite que medidas públicas são
fim de que permitam compatibilizar desenvolvimen-                                    necessárias para reduzir a poluição, assegurar me-
to e sustentabilidade. Pode-se afirmar que predomi-                                  lhor alocação e estimular o uso racional desses re-
na entre os autores que tratam do tema, o entendi-                                   cursos, naturalmente escassos. Com o PPP preten-
mento de que a realização do desenvolvimento sus-                                    deu a OCDE também, evitar distorções no comércio
tentável pressupõe uma combinação do sistema de                                      e nos investimentos.
regulamentação (comando-e-controle) com o em-
prego de instrumentos econômicos. Essa preferência                                      Por força desse princípio, deve estar a cargo do po-
justifica-se, na medida em que, nas hipóteses de da-                                 luidor os custos das medidas da prevenção, contro-
nos ambientais significativos, as medidas mais indi-                                 le e remediação da poluição, como forma de induzir
cadas passam pela adoção de sanções severas combi-                                   que tais custos estejam refletidos nos custos dos bens
nadas com a responsabilização do degradador.20
                                                                                     vários instrumentos, assumindo uma orientação pragmática (ALMEIDA, Luciana
18
   BELLIA, Vitor. Introdução à Economia do Meio Ambiente. Brasília: IBAMA, 1996,     Togeiro. Política Ambiental: Uma análise econômica. Campinas: Papirus, 1998).
p. 89.                                                                               21
                                                                                        MATEO, Ramón Martín. Derecho Ambiental. Madrid: Institutos de estudios de
19
   MERICO, Luiz F. Kieger. Introdução à Economia Ecológica. Blumenau: FURB,          Administracion Local, 1977, p. 39 (Tradução livre).
1996.                                                                                22
                                                                                        Recomendação C(72) 128, do Conselho Diretor da OCDE, de 26/05/72. Do-
20
   Também Luciana Togeiro de Almeida desenvolve uma analise econômica da po-         cumento disponível no site da OCDE (www.oecd.org) sob a denominação: Gui-
lítica ambiental no Brasil, avaliando as experiências com os instrumentos econômi-   ding Principles Concerning Internacional Economic Aspects of Environmental
cos, posicionando-se favorável a uma política que contemple uma combinação de        Policies.




22
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Cadernos GESTAR nº 4

  • 1. Ministério do Meio AMbiente secretaria de Políticas para o desenvolvimento sustentável CAdernos GestAr nº 4 Gestar Ariranha– Análise Jurídica da Atividade Suinícola Gestar viva melhor na sua comunidade
  • 2. REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL Luiz Inácio Lula da Silva – Presidente do Brasil José Alencar Gomes da Silva – Vice-Presidente MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE Marina Silva – Ministra do Meio Ambiente Cláudio Langone – Secretário Executivo Gilney Amorim Viana – Secretário de Políticas para o Desenvolvimento Sustentável Roberto Ricardo Vizentin – Diretor de Programa Sílvio Menezes – Chefe de Gabinete EQUIPE GESTAR Carcius Azevedo dos Santos – Coordenador Nacional Antônio Carlos Rodrigues Cruz Ivanise Knapp José Flávio dos Santos Mário César Batista de Oliveira EQUIPE DE CONSULTORIA – TCP/3004/FAO/MMA Horácio Martins de Carvalho – Consultor Principal Flávio Mesquita da Silva – Gestão Ademar Ribeiro Romeiro - Economia Carlos Teodoro José Hugueney Irigaray - Legislação Gelso Marchioro – PGAR Ariranha SUPERVISÃO TÉCNICA Roberto Ricardo Vizentin Carcius Azevedo dos Santos Antônio Carlos Rodrigues Cruz Ivanise Knapp PROjETO GRáFICO Fabiano Bastos Catalogação na Fonte Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis G393 Gestar Ariranha/SC: análise jurídica da atividade suinícola / Ministério do Meio Ambiente, Secretaria de Políticas para o Desenvolvimento Sustentável. – Brasília: MMA, 2006. 52 p. : il. ; 21 x 29,7 cm Bibliografia 1. I. Ministério do Meio Ambiente. II. Secretaria de Políticas para o Desenvolvimento Sustentável. III. Título. CDU (2.ed.)502.35
  • 3. SUMáRIO 1. APRESENTAÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5 2. INTRODUÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7 1. LEgISLAÇÃO PERTINENTE . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11 1.1 Legislação federal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .11 1.2 Normas estaduais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .15 2. RESPONSAbILIDADE POR DANOS AmbIENTAIS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19 2.1 O princípio da responsabilização . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .19 2.2 O princípio do poluidor-pagador . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .21 2.3 Aspectos da responsabilização na suinocultura . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .24 2.4 Aspectos legais do ajustamento de conduta firmado . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .26 3. NOvAS DIRETRIzES PARA A SUINOcULTURA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33 3.1 Definindo responsabilidades . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .33 3.2 Alternativas para a solução dos problemas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .37 3.3 Novo marco regulatório . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .43 cONSIDERAÇõES FINAIS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47 REFERêNcIAS bIbLIOgRáFIcAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49
  • 4.
  • 5. 1. APRESENTAÇÃO bientais a eles associados. Na perspectiva GESTAR, a sustentabilidade está fortemente condicionada pelas A Secretaria de Políticas para o Desenvolvimento formas de organização social das atividades econô- Sustentável – SDS/MMA – tem como missão promo- micas no nível local, assim como pela sua inserção ver políticas e instrumentos que consolidem princí- no sistema econômico como um todo. pios e práticas do desenvolvimento sustentável, sem- pre integrando ações do governo com a sociedade. Nesse sentido, o GESTAR combina reflexão com ação, visão ampla do território com a realidade das Um dos objetivos básicos da SDS/MMA é a elabo- unidades produtivas, mobilização comunitária com ração e adoção de estratégias que permitam superar o engajamento e participação de cada família. problemas ambientais provocados pelo atual modelo de desenvolvimento econômico e tecnológico, bem Para a elaboração deste caderno, contamos com a como o desenvolvimento de alternativas sustentáveis consultoria do Dr. Teodoro Irigaray, bem como toda para o relacionamento da sociedade com a natureza. a equipe técnica envolvida nesse projeto. Sob coordenação do Departamento de Gestão gilney viana Ambiental e Territorial (DGAT/SDS/MMA) e a par- Secretário de Políticas para o ceria institucional da Organização das Nações Uni- Desenvolvimento Sustentável – SDS/MMA das para Agricultura e Alimentação (FAO/ONU), o Projeto de Gestão Ambiental Rural – GESTAR dedi- José Tubino ca-se a difundir e consolidar o desenvolvimento rural Representante da FAO/BRASIL sustentável e a justiça ambiental, por meio de ações de motivação, capacitação e engajamento das comu- nidades, em busca da melhoria da qualidade ambien- tal e das condições de vida nos territórios onde atua. O principal objetivo do GESTAR é contribuir para o desenvolvimento de programas e projetos de de- senvolvimento rural sustentável. Para tanto, dissemi- na e coordena atividades ligadas à gestão ambiental territorial, além de integrar políticas governamentais que envolvam a participação direta das comunida- des, motivando o sentimento de pertença no terri- tório, que fortaleça a capacidade técnica das institui- ções governamentais e das organizações da socieda- de civil. Este documento sistematiza os procedimentos para a implantação e desenvolvimento das propostas do GESTAR/SDS/MMA nas suas diversas unidades territoriais constituídas no país. O fundamental da abordagem territorial adotada pelo GESTAR é a identificação dos problemas socio- ambientais e o levantamento das estratégias de solu- ção disponíveis. O ponto de partida é a compreen- são dos sistemas de produção e dos problemas am-
  • 6.
  • 7. 2. INTRODUÇÃO Embora a poluição anteceda a Revolução Indus- Os sistemas confinados de produção de suínos são trial, sua ampliação e agravamento são típicos da so- responsáveis pelo aumento de um grande número ciedade contemporânea. Como resultado do avanço de animais em pequenas áreas. Estas característi- tecnológico e da mudança dos padrões culturais re- cas exigem maior investimento e especialização por lacionados ao consumo, ela hoje possui um caráter parte dos produtores. multifatorial, ou seja, há um crescente número de fa- A crescente tendência para a adoção de sistemas tores que ocasionam a degradação ambiental, atuan- confinados de criação de suínos tem contribuído do de forma cumulativa e muitas vezes sinergética. para a produção de quantidades cada vez maiores de dejetos. A inadequação dos sistemas de manejo Assim, como subprodutos de nossa civilização e armazenamento leva ao lançamento de dejetos em de consumo, os fatores de poluição se ampliam em rios, sem tratamento adequado.3 Segundo Oliveira quantidade e em grau de toxicidade, confirmando (1995: 47), a atividade é desenvolvida e incentivada que vivemos em uma sociedade de risco1, onde os sem dar a devida importância ao impacto ambien- instrumentos políticos e jurídicos se mostram fre- tal e social decorrente dos dejetos produzidos pelos qüentemente inadequados para enfrentar proble- animais. mas que são globais e dizem respeito aos padrões de consumo e aos sistemas econômicos que promovem O fato é que, apesar do reconhecimento do seu uma exploração insustentável dos recursos naturais. grande potencial poluidor, por parte de órgãos oficiais de pesquisas e fiscalização ambiental, a A análise da problemática ambiental associada à atividade continua em expansão. O Brasil ocu- atividade da suinocultura no oeste catarinense cons- pa lugar entre os sete países de maior produção. titui um exemplo emblemático dos problemas pro- vocados pela inadequada disposição e tratamento Julia Guivant e Cláudio Miranda destacam os as- dos dejetos gerados pela atividade bem como dos li- pectos econômicos relacionados à atividade no Esta- mites à identificação e responsabilização dos agentes do de Santa Catarina: poluidores. No Brasil, 4º país produtor mundial de carne suí- Introdutoriamente cabe destacar a importância na, com 2,698 milhões de toneladas, contando com econômica e social da suinocultura que fornece uma um plantel de 34,5 milhões de cabeças em um total alternativa de renda para os pequenos produtores e de 2,486 milhões de matrizes, o debate sobre os ris- cos de poluição e sobre as medidas para o controle nesse sentido constitui atividade que contribui para da poluição por dejetos suínos tem aumentado na a fixação do homem no campo. última década (ABIPESC, 2003). Isto se observa es- pecialmente no Estado de Santa Catarina, onde se Em nosso país essa atividade expandiu-se nos úl- encontra a maior produção suinícola do país, com timos anos seguindo uma tendência imposta pelos um plantel 4,5 milhões de animais e um abate de 6 mercados mundiais de especialização e concentra- milhões de cabeças.4 Estes números apresentam cer- ção, visando conferir-lhe maior produtividade. De ca de 12% do rebanho nacional e aproximadamente outra parte, o tipo de exploração econômica trou- um terço do total de abates inspecionados no país. xe consigo os inconvenientes ambientais, conforme Na região Oeste do estado, a poluição, a partir dos destacado por Débora Brasil:2 anos 80, passou a ter um caráter mais grave devi- do à intensificação dos sistemas de produção, à es- 1 A configuração da sociedade contemporânea, como uma sociedade de risco, tem como pressuposto a constatação de um quadro de riscos catastróficos, marcados pela invisibilidade (ameaça nuclear, aquecimento global, etc.) e pela incapacida- parâmetros da suinocultura em Braço do Norte. Dissertação de Mestrado arquivada de do Estado de dar respostas eficazes para tais problemas e garantir a segurança na Biblioteca da UFSC. Florianópolis, 2002, p. 131. dos cidadãos (irresponsabilidade organizada, estado de segurança e explosividade 3 Segundo KONZEN (1983: 19), cada animal produz cerca de 0,27 m³ de dejetos (Risk society toward a new mo- social). Tais conceitos, elaborados por Ulrich Bec�� ( por mês, o que apresenta uma produção de, aproximadamente, 35.900 m³ de deje- dernity.) e analisados por David Golblatt (Teoria social e ambiente, p. 228) podem tos produzidos diariamente no Estado, dos quais, grande parte é manejada de for- ser encontrados também em José J. Gomes Canotilho (Direito público do ambiente, ma inadequada. Cláudia A. D. Soares (O imposto ecológico. Contributo para o estudo dos instrumen- 4 Dados de 2002 indicam que naquele ano Santa Catarina já possuía um plantel de tos econômicos de defesa do ambiente.) e José Rubens Morato Leite e Patryc�� de A. aproximadamente 5,4 milhões de cabeças, com aproximadamente 418 mil matrizes Ayala (Direito ambiental na sociedade de risco). alojadas em cerca de 12 mil propriedades suinícolas, sendo 2.300 destas indepen- 2 BRASIL, Débora Magali. Apontamento sobre o valor do prejuízo ecológico. Alguns dentes e 9.700 integradas a uma grande agroindústria exportadora (Henn: 2005).
  • 8. cassez de áreas agrícolas em condições de utilizar As altas concentrações de nutrientes como nitrogê- os dejetos como fertilizante e à baixa capacidade de nio (N) e fósforo (P), e a elevada concentração de investimentos dos pequenos produtores familiares sólidos voláteis (SV) em relação aos sólidos fixos da região em adotar sistemas adequados de arma- (SF), conferem aos dejetos de suínos um elevado zenamento e/ ou tratamento dos dejetos. Até mea- potencial poluidor (potencial cerca de 4,2 vezes su- dos dos anos 90, apenas 15% dos suinocultores dis- perior ao esgoto doméstico, segundo a World Heal- punham de sistemas de armazenamento de dejetos th Organization). A fração nitrogenada é a que cau- para o posterior aproveitamento como fertilizante.5 sa maiores danos, como a floração nas águas super- ficiais, formação de nitritos (NO2-), elemento can- Como fator agravante registra-se que nas últimas cerígeno, em meio anaeróbio, e de nitratos (NO3-) duas décadas ocorreram alterações significativas no sis- em contato com águas subterrâneas. Altas concen- tema produtivo e estrutura tecnológica, com uma forte trações de nitratos nos lençóis freáticos ( 10 mg/ concentração da produção e aumento na produtividade l) podem causar câncer e metahegoglobinemia em do rebanho industrial, sem que tais mudanças tenham crianças (síndrome do bebê azul), além de eutrofi- zação dos corpos d’água, como também causa a pre- provocado a melhoria das condições econômicas dos sença de fósforo. O nitrogênio na forma de amônia é produtores. extremamente tóxico aos peixes, além de transmitir importantes fatores patogênicos (Henn, 2005). Em pouco mais de duas décadas o aperfeiçoamento da tecnologia de criação também levou à concentra- A utilização dos dejetos de suínos pode ainda alte- ção do setor em Santa Catarina, reduzindo em mais rar as propriedades físicas, químicas e biológicas do de 80% o número de produtores suinícolas. Eram solo. Estas ações podem ser traduzidas em acúmulo cerca de 67 mil propriedades em 1980, contra aproxi- de elementos tóxicos, principalmente metais pesa- madamente 13 mil em 2003, segundo dados da ACCS dos como o cobre e zinco, poluentes orgânicos, con- – Associação Catarinense de Criadores de Suínos.6 taminação da água superficial, através da lixiviação de elementos provenientes da decomposição dos Por outro lado, associado a essa produção de es- dejetos no solo, e odores desagradáveis oriundos da cala, verificou-se também um agravamento dos pro- volatilização de compostos. O uso de cobre e zinco blemas de poluição com a contaminação do solo e nas rações como promotores do crescimento e con- dos recursos hídricos na região onde a suinocultura troladores da diarréia podem conferir aos dejetos de suínos um importante potencial poluidor, poden- se intensificou. do causar, em longos períodos, acúmulos destes no solo e sua transferência para a cadeia alimentar ou Em linhas gerais os problemas de poluição decor- outros sistemas (Pocojes��i et al., 2004). rem do volume de dejetos produzidos em sistemas de confinamento onde, freqüentemente, o número Os produtores, de maneira geral, armazenam os de animais é superior à capacidade de suporte das dejetos em esterqueiras usando-os posteriormente instalações e o volume de dejetos fica, também, aci- na agricultura e na adubação de pastagens ou áreas ma dos limites naturais de absorção. A ineficiência agrícolas; contudo, a área disponível para absorção dos sistemas de tratamento faz com que grande parte do volume de dejeto produzido tem se mostrado in- dos dejetos produzidos seja lançada no solo e carre- suficiente. ada para os corpos hídricos contaminando as águas superficiais e subterrâneas. Na bacia do Rio Ariranha, no Oeste Catarinense, objeto de um estudo mais aprofundado pelo Proje- Além dos impactos sobre o meio ambiente, a ex- to de Gestão Ambiental Rural da Bacia Hidrográ- cessiva carga de nutrientes (destacando-se o nitrogê- fica do Rio Ariranha – GESTAR Ariranha - SC, os nio, o fósforo e os metais zinco e cobre) que contami- problemas associados à suinocultura não são ape- na os cursos d’água, constitui séria ameaça à saúde nas ambientais, mas também econômicos e sociais. da população, cujas conseqüências não foram ainda Nessa área a concentração da atividade, incentivada suficientemente avaliadas. Ademar Romeiro7 enfati- pela agroindústria, e o manejo inadequado dos deje- za esse aspecto da poluição destacando: tos produzidos pelos animais, geraram conseqüên- cias danosas para o meio ambiente que se pretende, 5 GUIVANT, Julia S. e MIRANDA, Cláudio (Orgs.). Desafios para o desenvolvi- mento sustentável da suinocultura: Uma abordagem multidisciplinar. Chapecó: Ar- agora, reverter através de instrumentos jurídicos de gos, 2004, p. 11/12. comando-e-controle (ajustamento de conduta, licen- 6 Segundo dados citados por Kunz et at.: 2005. 7 ROMEIRO, Ademar Ribeiro. Análise Econômica: Relatório Final. Relatório de ciamento, sanções) e também instrumentos econô- Consultoria apresentado ao Projeto Gestar Ariranha. Texto não publicado. 2006, p. micos. 17.
  • 9. O presente relatório inclui uma análise jurídica dessa problemática iniciando com uma revisão da le- gislação brasileira e de Santa Catarina aplicável à ges- tão ambiental, incluindo os instrumentos legais para a regulação e controle dos impactos ambientais gera- dos pelos atores da cadeia produtiva de suínos. O tema da responsabilidade civil por danos am- bientais é identificado no item 2 com uma aborda- gem das especificidades da responsabilização pe- los impactos ambientais gerados pela atividade sui- nícola. A aplicação do princípio do poluidor-paga- dor e as limitações ao ajustamento de conduta são enfocados na identificação dos responsáveis pe- los custos ambientais decorrentes dessa atividade. No item 3 são apresentadas alternativas parta a so- lução dos problemas, a partir de uma definição de responsabilidades que implica na revisão do ajusta- mento de conduta firmado e definição de um novo marco regulatório proposto. Este Relatório não pretende esgotar a aborda- gem dos temas jurídicos correlatos, como as inúme- ras possibilidade de instrumentos econômicos para uma gestão ambiental eficaz na Bacia do Ariranha, mas concentra-se na definição da responsabilidade de cada um dos atores envolvidos, propondo uma matriz regulatória que deve ser amplamente debati- da visando obter uma base normativa que possa ser usada em outras regiões que convivem com proble- mas ambientais similares. Ainda introdutoriamente cumpre assinalar o inte- resse e a preocupação dos organismos governamen- tais e não governamentais com a sustentabilidade da atividade e o bem-estar social das populações produ- toras e moradores nessa região, onde se concentra a produção; contudo, é possível antecipar que grande parte dos problemas ambientais já identificados te- riam sido prevenidos e mitigados se houvesse orien- tação, incentivo financeiro e fiscalização por parte das empresas integradoras e dos órgãos ambientais.
  • 10.
  • 11. 1. LEgISLAÇÃO PERTINENTE 1.1 LEGISLAçÃO FEDERAL 2) de 50 (cinqüenta) metros para os cursos d’água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinqüenta) metros Na legislação federal, inúmeras normas podem de largura; ser invocadas para tutelar o meio ambiente, especial- (...) mente no controle da poluição e responsabilização dos poluidores. b) ao redor das lagoas, lagos ou reservatórios d’água naturais ou artificiais;1 Dada a extensão do quadro normativo, neste Re- c) nas nascentes, ainda que intermitentes e nos latório serão indicados apenas os dispositivos que chamados “olhos d’água”, qualquer que seja a podem ser correlacionados com a matéria em exa- sua situação topográfica, num raio mínimo de me, qual seja, a poluição causada pela suinocultura e 50 (cinqüenta) metros de largura; as medidas corretivas e reparatórias a cargo dos res- d) no topo de morros, montes, montanhas e serras; ponsáveis. e) nas encostas ou parte destas com declividade Observada a ordem cronológica impõe-se a análi- superior a 45º, equivalente a 100% na linha de se, inicialmente, do Código Florestal: maior declive; (...) Lei n° 4.1, de 1/0/6 Entre as áreas de preservação permanente desta- O Código Florestal (Lei n° 4.771/65) constitui cam-se as matas ciliares, também conhecidas como norma de grande relevância na tutela do meio am- matas ripárias ou de galeria. Elas recebem o nome biente, na medida em que nele se inserem importan- ciliar porque funcionam como cílios protegendo os tes institutos voltados para a proteção da flora e de corpos hídricos e regulando os fluxos de água super- áreas especialmente protegidas. ficiais e subterrâneos e contribuindo para a fixação do carbono. Ana Maria Marchesan2 assinala que os Entre os espaços territoriais que gozam de especial principais objetivos dessas matas são: proteção no citado diploma legal, estão as áreas de a) reduzir as perdas do solo e os processos de ero- preservação permanente e a reserva florestal legal. são e, por via reflexa,evitar o assoreamento (ar- rastamento de partículas do solo) das margens áreas de preservação permanente dos corpos hídricos. O Código Florestal define as APPs como “área b) garantir o aumento de fauna silvestre e aquáti- protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com ca, proporcionando refúgio e alimento para es- a função ambiental de preservar os recursos hídricos, ses animais; a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversida- c) manter a perenidade das nascentes e fontes; de, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e d) evitar o transporte de defensivos agrícolas para assegurar o bem-estar das populações humanas na- os cursos d´água; tivas” Art. 1º § 2º, II). e) possibilitar o aumento de água e dos lençóis São APPs pelo efeito da lei (art. 2° do Código Flo- freáticos, para dessedentação humana e animal restal) as florestas e demais formas de vegetação na- e para o uso nas diversas atividades de subsis- tural situadas: tência e economia; a) ao longo dos rios ou de qualquer curso d’água f) garantir o reaproveitamento de fauna e maior desde o seu nível mais alto em faixa marginal reprodução da flora; cuja largura mínima seja: 1 A Resolução do CONAMA Resolução n° 302, de 20 de março de 2002 define as 1) de 30 (trinta) metros para os cursos d’água de APPs para as áreas de entorno de lagos e reservatórios. 2 MARCHESAN, Ana Maria M. Áreas de “degradação permanente”, escassez e ris- menos de 10 (dez) metros de largura; cos. Revista de Direito Ambiental n° 35. São Paulo: RT, 2004. p. 190/216. 11
  • 12. g) controlar a temperatura, propiciando conforme as peculiaridades, condições ecológicas, um clima mais ameno; em cada uma das regiões geopolíticas do País, e que não pode destinar-se à realização de atividade que h) valorização da propriedade rural, e implique na derrubada da vegetação nativa. i) formar barreiras naturais contra a disse- No caso da região Sul do país, vinte por cento minação de pragas e doenças na agricultura. (20%), da propriedade rural situada em área de flo- resta ou outras formas de vegetação nativa, são pro- No caso das APPs na região em estudo, além das tegidos a título de reserva legal. Isso significa que a funções acima, elas são imprescindíveis para proteção limitação administrativa imposta às áreas de reser- dos corpos hídricos, limitando o carreamento de resí- va legal impede que a vegetação nativa seja integral- duos oriundos da suinocultura para o corpo hídrico. mente suprimida (corte raso5) não impedindo, po- rém, sua utilização sob regime de manejo florestal As APPs encontram-se submetidas a um regime sustentável. Excetuam-se dessa regra, as áreas de re- jurídico de interesse público com imposição de pre- serva legal em pequena propriedade ou posse rural servação integral e permanente da flora, vedada sua familiar, nas quais podem ser computados os plan- supressão. Trata-se de proteção que independe da ti- tios de árvores frutíferas ornamentais ou industriais tularidade do domínio3 e decorre de limitação admi- com espécies exóticas. nistrativa com previsão de sanções severas no caso de descumprimento (administrativas e penais4), es- O Código Florestal exige que a Reserva Legal seja tando excepcionalizados na lei os casos que podem averbada à margem da inscrição da matrícula do justificar a supressão da APP (obras de utilidade pú- imóvel junto ao competente Cartório de Registro blica e interesse social). de Imóveis (Art. 16, §2º, e art. 44, parágrafo único A degradação de APP configura crime e enseja a – Cód. Florestal), contudo, poucas são as proprieda- responsabilização administrativa e civil do degrada- des que possuem sua reserva legal averbada. Objeti- dor que é obrigado a promover a recuperação des- vando superar esse quadro de omissão, alguns Esta- sas áreas. dos estão definindo em leis estaduais essa exigência, como requisito para licenciamento das propriedades Reserva florestal legal rurais,6 sendo a averbação da reserva uma condição legal para o exercício do direito de exploração. A Reserva Florestal Legal, ou simplesmente Re- serva Legal, compreende uma fração do imóvel rural O corte raso da reserva legal é passível de sanção protegida através de uma limitação administrativa administrativa e nos casos em que a mesma tenha imposta visando assegurar a manutenção de um per- sido totalmente desmatada, o proprietário ou pos- centual que impede a supressão integral da cobertura suidor rural deve adotar as seguintes alternativas, vegetal. Esse percentual é definido em função do bio- isoladas ou conjuntamente: ma e da região onde se situa o imóvel rural. Trata-se I - recompor a reserva legal de sua propriedade de uma exigência ditada, sobretudo, pela necessida- mediante o plantio, a cada três anos, de no mí- de de proteção da biodiversidade. nimo 1/10 da área total necessária à sua comple- mentação, com espécies nativas, de acordo com O Código Florestal (com a redação dada pela MP critérios estabelecidos pelo órgão ambiental es- nº. 2.166-66 de 2.001) assim define Reserva Legal: tadual competente; Área localizada no interior de uma propriedade ou II - conduzir a regeneração natural da reserva le- posse rural, excetuada a de preservação permanen- gal e; te, necessária ao uso sustentável dos recursos natu- III - compensar a reserva legal por outra área rais, à conservação e reabilitação dos processos eco- equivalente em importância ecológica e exten- lógicos, à conservação da biodiversidade e ao abrigo e proteção de fauna e flora nativas (Art. 1º § 2º, III são, desde que pertença ao mesmo ecossistema – Código Florestal). e esteja localizada na mesma microbacia. Portanto, a reserva legal é constituída por uma área, cujo seu percentual é definido em lei, variando 5 Aquele “em que são derrubadas todas as árvores ou de parte ou de todo um povo- amento florestal, deixando o terreno momentaneamente livre da cobertura arbó- rea”. 3 Ocorrem em áreas públicas e privadas com as mesmas restrições. 6 Como é o caso do Sistema de Licenciamento de Propriedades Rurais - SLAPR 4 Ver a propósito os artigos 38, 39 e 44 da Lei n° 9.605/98. instituído no Estado de Mato Grosso. 12
  • 13. Lei 6.3, de 31/0/11. das características do meio ambiente, equiparando, legalmente, poluição e degradação. De conformida- Uma das mais importantes normas ambientais em de com o inciso II do artigo 3° da lei mencionada, vigor no país, essa lei estabelece os princípios, objeti- entende-se por poluição: vos e instrumentos da política nacional do meio am- biente e a estrutura do Sistema Nacional constituído A degradação da qualidade ambiental resultante para implementá-la, definindo poluição e fixando a de atividades que direta ou indiretamente: responsabilidade civil, penal e administrativa do po- a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar luidor. da população; Entre os princípios destacam-se, por serem perti- b) criem condições adversas às atividades sociais nentes a esta abordagem: e econômicas; • ação governamental na manutenção do equilí- c) afetem desfavoravelmente a biota; brio ecológico, considerando o meio ambiente d) afetam as condições estéticas ou sanitárias do como um patrimônio público a ser necessaria- meio ambiente; mente assegurado e protegido, tendo em vista o e) lancem matérias ou energia em desacordo com uso coletivo; os padrões ambientais estabelecidos. • racionalização do uso do silo, do subsolo, da água e do ar; Finalmente, um outro aspecto de grande relevân- • planejamento e fiscalização do uso dos recursos cia na citada lei é a fixação da responsabilidade ob- ambientais; jetiva por danos ambientais, que será abordada no item seguinte. • controle e zoneamento das atividades potencial ou efetivamente poluidoras; Lei nº .34, de 24/0/. • recuperação de áreas degradadas (art. 2°, I, II, III, V e VIII). Essa Lei disciplina a Ação Civil Pública e contém aspectos relevantes na discussão da temática objeto Visando promover a compatibilização do desen- deste Relatório. Trata-se de uma lei de caráter pro- volvimento econômico-social com a preservação da cessual, concebida para proteger os interesses difu- qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológi- sos da sociedade. co, a lei fixa entre seus objetivos a imposição, ao po- luidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ ou O Ministério Público é o titular da ação civil pú- indenizar os danos causados e, ao usuário, da con- blica o que não impede que outros co-legitimidados7 tribuição pela utilização de recursos ambientais com possam propô-la. fins econômicos (art. 4°, I e VII). A lei faculta também ao Ministério Público ins- Entre os instrumentos que a citada lei relaciona taurar o inquérito civil para colher subsídios visando para consecução desses objetivos destacam-se o es- instruir eventual ação a ser proposta. tabelecimento de padrões de qualidade ambiental, o licenciamento ambiental, a revisão de atividades efe- Consta também da citada Lei a possibilidade de tiva ou potencialmente poluidoras e as penalidades ajustamento de conduta com força de título executi- disciplinares ou compensatórias ao não cumprimen- vo, conforme se transcreve: to das medidas necessárias à preservação ou corre- ção da degradação ambiental (art. 9°, I, IV e IX); o Art. 5° (...) que significa que o Poder Público (que inclui tam- bém o Estado membro e o próprio município) po- § 6° os órgãos públicos legitimados poderão to- dem definir padrões de emissão de poluentes, visan- mar dos interessados compromisso de ajustamento do a restauração do equilíbrio ecológico regional ou de sua conduta às exigências legais, mediante comi- local, adequando os licenciamentos ao quadro nor- nações, que terá eficácia de título executivo extraju- mativo pré-estabelecido e sancionando aqueles que dicial. não se ajustarem aos novos parâmetros de emissão. 7 Pela lei possuem legitimidade ativa para proporem ação civil pública o Ministé- Cabe assinalar que a Lei nº 6.938/81 considera de- rio Público e pessoas jurídicas de direito público, incluindo as empresas públicas, fundações, sociedades de economia mista, assim como as associações destinadas à gradação da qualidade ambiental a alteração adversa proteção do meio ambiente ou à defesa do consumidor, constituídas a pelo menos um ano. 13
  • 14. Oportuno assinalar que frente à indisponibilida- Lei nº .433, de 0/01/. de do interesse público (no caso a proteção do meio ambiente), teoricamente nem o Ministério Público, A Lei da Política Nacional de Recursos Hídricos nem o órgão ambiental, ou outro co-legitimado ati- define objetivos, diretrizes, instrumentos e a estru- vo poderá transigir, já que não têm eles a disponibi- tura institucional para o gerenciamento dos recursos lidade material dos interesses difusos que estão em hídricos e tem entre suas diretrizes gerais de ação: jogo (dos quais não são titulares, pois se trata de inte- • a gestão sistemática dos recursos hídricos, sem resses metaindividuais). Os tribunais se posicionam dissociação dos aspectos de quantidade e qua- favoravelmente à homologação da transação através lidade; da qual se pode conseguir praticamente tudo o que é • a adequação da gestão de recursos hídricos às objeto do pedido, sob forma de autocomposição da diversidades físicas, bióticas, demográficas, eco- lide. nômicas, sociais e culturais das diversas regiões do País; Resolução CONAMA nº 23, de 1/12/1. • a integração da gestão de recursos hídricos com a gestão ambiental; Através dessa resolução o Conselho Nacional do Meio Ambiente estabeleceu normas para o licencia- • a articulação da gestão de recursos hídricos com mento ambiental de atividades poluidoras. a do uso do solo. A gestão dos recursos hídricos, na região do rio De conformidade com essa resolução o órgão am- Ariranha constitui um desafio que não pode ser en- biental poderá definir, se necessário, “procedimentos frentado sem a solução dos problemas ambientais específicos para as licenças ambientais, observadas a que envolvem a supressão da mata ciliar e a contami- natureza, características e peculiaridades da ativida- nação das águas superficiais e subterrâneas. de ou empreendimento e, ainda, a compatibilização do processo de licenciamento com as etapas de pla- Como analisado no item 1 as altas concentrações nejamento, implantação e operação”, admitindo-se o de nutrientes como nitrogênio (N) e fósforo (P), con- licenciamento ambiental para pequenos empreendi- ferem aos dejetos de suínos um potencial poluidor mentos e atividades similares em um único processo 4,2 vezes superior ao esgoto doméstico, provocando desde que definida a responsabilidade legal pelo con- a eutrofização do corpo hídrico e contaminação das junto de empreendimentos ou atividades (art. 12). águas superficiais por metais pesados como o cobre e zinco. Da mesma forma, o acúmulo de dejetos no Outro aspecto importante nessa Resolução e que solo acaba por contaminar também o lençol freáti- guarda relação com o tema deste Relatório encontra- co, o que constitui problema de oneroso e complexo se estabelecido no art. 19, a seguir transcrito: tratamento. Art. 19 O órgão ambiental competente, mediante decisão motivada, poderá modificar os condicio- Destaca-se, na citada Lei, a importância dos Co- nantes e as medidas de controle e adequação, sus- mitês de Bacia como órgãos colegiados que exer- pender ou cancelar uma licença expedida, quando cem a função de “parlamentos da água” competin- ocorrer: do-lhes, entre outras atribuições, promover o debate das questões relacionadas a recursos hídricos e arti- I - Violação ou inadequação de quaisquer condicio- cular a atuação das entidades intervenientes; aprovar nantes ou normas legais. e acompanhar a execução do Plano de Recursos Hí- dricos da bacia e sugerir as providências necessárias II - Omissão ou falsa descrição de informações rele- ao cumprimento de suas metas (art. 38, I, III e IV). vantes que subsidiaram a expedição da licença. III - superveniência de graves riscos ambientais e de Lei nº .60, de 12/02/1. saúde. A Lei dos Crimes Ambientais representa um im- portante marco na criminalização das condutas lesi- vas ao meio ambiente, sobretudo porque atualizou e sistematizou as infrações que constavam em leis es- parsas, traduzindo em um único documento o diplo- 14
  • 15. ma legal que permite a atuação repressiva do Poder 1.2 NORMAS ESTADUAIS Público relativamente aos crimes ambientais. Lei nº 5.793 de 15 de outubro de 1980. Entre as condutas consideradas criminosas, iden- tificadas na Bacia do Ariranha, podem ser citadas: Com apenas 23 artigos a Lei de Proteção e Melho- ria da Qualidade Ambiental do Estado de Santa Ca- Art. 33. Provocar, pela emissão de efluentes ou car- tarina estabelece diretrizes para a proteção ambien- reamento de materiais, o perecimento de espécimes tal, atribuindo ao Poder Executivo a regulamentação da fauna aquática existentes em rios, lagos, açudes, dos inúmeros aspectos da proteção ambiental, trata- lagoas, baías ou águas jurisdicionais brasileiras; dos apenas de forma genérica pela lei estadual. Art. 38. Destruir ou danificar floresta considerada Destaca-se na citada Lei, a expressa referencia à de preservação permanente, mesmo que em forma- criação de linhas de crédito para a instalação de obras ção, ou utilizá-la com infringência das normas de e equipamentos voltados para o controle da poluição proteção; e à racionalização do uso dos recursos ambientais, Art. 54. Causar poluição, de qualquer natureza em nos dispositivos a seguir transcritos: níveis tais que resultem ou possam resultar em da- nos à saúde humana ou que provoquem a mortanda- Art. 14 O Governo do Estado promoverá a criação de de animais ou a destruição significativa da flora; de linhas especiais de crédito no seu Sistema Finan- ceiro para financiar o desenvolvimento da pesquisa, Art. 60. Construir, reformar, ampliar, instalar ou fa- execução de obras, aquisição e instalação de equipa- zer funcionar, em qualquer parte do território na- mentos que concorram para o controle da degrada- cional, estabelecimentos, obras ou serviços poten- ção ambiental, ou melhoria da qualidade do meio cialmente poluidores, sem licença ou autorização ambiente. dos órgãos ambientais competentes, ou contrarian- do as normas legais e regulamentares pertinentes. Art. 15 O Poder Público estabelecerá sistema de be- nefícios, visando incentivar. Resolução Conama n° 3, de I - o desenvolvimento, no Estado, de pesquisas e 1 de março de 200. processos tecnológicos destinados a prevenir ou re- duzir a degradação ambiental; A Resolução Conama n° 357, editada em substi- tuição à Resolução nº 20/86, dispõe sobre a classi- II - a fabricação de equipamentos antipoluentes; ficação dos corpos de água e diretrizes ambientais para seu enquadramento, bem como padrões de lan- II - outras iniciativas que possam conduzir à racio- çamento de efluentes. nalização do uso dos recursos ambientais. A nova resolução avança ao exigir o tratamento Na citada lei foi o executivo autorizado a instituir, de efluentes de qualquer natureza8 e também quan- organizar e regulamentar Fundo Especial para pre- do introduz novas diretrizes para monitoramento da servação, proteção e melhoria da qualidade do Meio água, como a exigência de periodicidade no moni- Ambiente, atual Fundo Especial de Proteção ao Meio toramento, a avaliação por indicadores biológicos e Ambiente – FEPEMA. a obrigação de investigação a expensas do empreen- dedor. Decreto nº 14.20, de de junho de 11. De forma geral essa Resolução representa um ga- Este Decreto regulamenta dispositivos da Lei nº nho em termos de proteção ambiental9 fortalecendo, 5.793, de 15 de outubro de 1980, referentes à Prote- sobretudo a gestão dos recursos hídricos com medi- ção e a Melhoria da Qualidade Ambiental, tomando das de planejamento e controle. como referência os parâmetros fixados pela legisla- ção federal. Assim, embora o citado decreto contem- ple inúmeras inovações, relativamente à lei que visa 8 É importante ressaltar que a Lei nº 9433/97 (Política Nacional de Recursos Hídri- regulamentar, guarda simetria com a legislação fede- cos) prevê a possibilidade de outorga para o lançamento em corpos hídricos de es- gotos e resíduos, tratados ou não; prática que se pretende reverter com a exigência ral sendo, portanto, perfeitamente legal. do tratamento de efluentes fixadas pela nova resolução do Conama. 9 Para uma análise mais detida da citada Resolução consultar: Rodrigo A. Agosti- nho Mendonça. “Interpretando a Resolução Conama 357/2005 – Avanços na Classi- Referido decreto arrola entre as atribuições da ficação dos corpos de água e no controle ambiental”. In: Antonio H. Benjamin (org.). Paisagem, natureza e direito, p. 381 - 392. Fundação do Meio Ambiente – FATMA, as ativida- 1
  • 16. des inerentes ao exercício do poder de polícia am- Art. 31 É proibida a emissão de substâncias odorí- biental, incluindo o controle sobre as atividades de feras na atmosfera em quantidades que possam ser proteção e conservação dos recursos naturais; a fis- perceptíveis fora dos limites da área de propriedade calização ambiental; a expedição de licenças ambien- da fonte emissora. tais, e a apreciação de projetos voltados para a dispo- (...) sição de resíduos sólidos de qualquer natureza. As licenças ambientais acompanham o parâmetro e a denominação prevista na legislação federal: Licença O regulamento falha ao dispor sobre as “áreas de Ambiental Prévia - LAP; Licença Ambiental de Insta- formação vegetais defensivas à erosão”, que consti- lação - LAI, e Licença Ambiental de Operação - LAO. tuem as chamadas áreas de preservação permanente regulamentadas pelo Código Florestal (Lei 4.771/65). No que tange a normatização das atividades polui- Estabelece o mencionado decreto: doras, entre as quais insere-se a suinocultura, consta Art. 49 Nas áreas de formação vegetais defensivas do referido decreto a vedação do lançamento, direto à erosão fica proibido o corte de árvores e demais ou indireto em corpos de água, de qualquer resíduo formas de vegetação natural, obedecidos os seguin- sólido (art. 8°), proibindo, também, depositar, dis- tes critérios: por, descarregar, enterrar, infiltrar ou acumular no solo resíduos, em qualquer estado da matéria, desde I - ao longo dos cursos de água, em faixa marginal, que causem degradação da qualidade ambiental (art. cuja largura mínima será: 20). Consta, ainda, do regulamento algumas normas específicas relativas à disposição de resíduos, a seguir a) de 10 (dez) metros, para rios de largura inferior a transcritas: 20 (vinte) metros; Art. 21 O solo somente poderá ser utilizado para b) igual a metade da largura do rio, quando a largu- destino final de resíduos de qualquer natureza, des- ra for superior a 20 (vinte) metros; de que sua disposição seja feita de forma adequada, estabelecida em projetos específicos, ficando vedada II - ao redor das lagoas, lagos e reservatórios de água a simples descarga ou depósito, seja em propriedade numa faixa de 100 (cem) metros; pública ou particular. III - ao redor das nascentes, numa faixa de 50 (cin- (...) qüenta) metros; Art. 22 Os resíduos de qualquer natureza, portado- IV - nas áreas acima das nascentes, no topo dos res de patogênicos ou de alta toxidade, bem como morros, montes, montanhas e serras; inflamáveis, explosivos, radioativos e outros preju- diciais, deverão sofrer, antes de sua disposição final V - nas encostas ou parte destas, com declividade no solo, tratamento e/ ou acondicionamento ade- superior a 45º (quarenta e cinco) graus, equivalen- quados fixados em projetos específicos, que aten- te a 100% (cem por cento) na linha de maior decli- dam os requisitos de proteção à saúde pública e ao ve; (...) meio ambiente. Obviamente que a simples mudança na denomi- (...) nação desses espaços territoriais especialmente pro- tegidos, não autoriza o executivo estadual estabele- Art. 23 Somente será tolerada a acumulação tem- cer parâmetros menos restritivos que aqueles previs- porária de resíduos de qualquer natureza, desde que tos na norma geral federal, razão pela qual prevale- não ofereça risco à saúde pública e ao meio ambien- cem os limites fixados no Código Florestal para pro- te. teção das áreas de preservação permanente. Art. 24 O tratamento, quando for o caso, o trans- porte e a disposição de resíduos de qualquer natu- Lei nº .4 de 30 de novembro de 14. reza de estabelecimentos industriais, comerciais e A Lei nº 9.748/94 dispõe sobre a Política Estadual de prestação de serviços quando não forem de res- ponsabilidade do Município, deverão ser feitos pela de Recursos Hídricos e constitui-se em importante própria empresa e as suas custas. instrumento normativo que oferece algumas alterna- tivas para o enfrentamento dos problemas associa- (...) dos à poluição hídrica decorrente da suinocultura. 16
  • 17. Ressalte-se que entre as diretrizes da política esta- aqüíferos subterrâneos situados em áreas urbanizadas dual de recursos hídricos está a promoção de ações (art. 28 e 29). integradas nas bacias hidrográficas, tendo em vis- ta o tratamento de efluentes e esgotos urbanos, in- Lei n° .66 de 1 de junho de 12. dustriais e outros, antes do lançamento nos corpos d´água e o incentivo à formação de consórcios entre Outro importante instrumento normativo previs- os municípios, tendo em vista a realização de progra- to na esfera estadual é a Lei n° 8.676/92 que dispõe mas de desenvolvimento e proteção ambiental (art. sobre a Política Estadual de Desenvolvimento Rural, 3°, X e XII). definindo os pressupostos, objetivos, instrumentos e a estrutura institucional para a execução de uma Assim como na legislação federal, a lei estadual contempla os planos de bacia hidrográfica como um política que concilie o desenvolvimento rural com a dos instrumentos da política de recursos hídricos, proteção do meio ambiente. estabelecendo um conteúdo mínimo para esses pla- Nesse sentido, cabe ressaltar que o citado diplo- nos, que devem incluir programas de recuperação, ma legal instituiu o Conselho Estadual de Desenvol- proteção, conservação e utilização dos recursos hí- vimento Rural, vinculado à Secretaria de Estado da dricos das bacias hidrográficas, inclusive com espe- Agricultura e Abastecimento, inserindo entre suas cificações dos recursos financeiros necessários, a se- rem captados mediante a cobrança pelo uso da água, atribuições: compatibilizar as políticas de desenvol- ou através do rateio de investimentos de interesse co- vimento rural com a política de proteção do meio mum, ou ainda mediante dotação orçamentária. ambiente e conservação dos recursos naturais (art. 5°, XI). Estabelece ainda que a política de proteção Cabe salientar que a lei prevê também a possibili- do meio ambiente e conservação dos recursos na- dade da cobrança de contribuições de melhoria, ta- turais será submetida ao citado Conselho, devendo rifas e taxas dos beneficiados por obras e serviços de conter programas específicos de conservação e ma- aproveitamento e controle dos recursos hídricos, in- nejo do uso do solo e da água, de desenvolvimento clusive as decorrentes do rateio de custos referentes a florestal, de tratamento de dejetos e efluentes, de re- obras de usos múltiplos dos recursos hídricos, ou de cuperação de áreas degradadas ou em degradação, interesses comum ou coletivo, devendo tais recursos com a participação da iniciativa privada (art. 17). serem destinados ao Fundo Estadual de Recursos Hí- dricos – FEHIDRO e utilizados no apoio financeiro à Consta também dessa lei a criação do Fundo Esta- instituições públicas e sob a modalidade de emprés- dual de Desenvolvimento Rural, cuja aplicação será timo à pessoas jurídicas de direito privado, usuárias definida pelo Conselho Estadual de Desenvolvimen- de recursos hídricos, para a realização de serviços e to Rural, sendo operacionalizado através de progra- obras com vistas a utilidade pública, ao desenvolvi- mas que incluem, entre outros, a conservação do solo mento, conservação, uso racional, controle e prote- e da água (art. 36, III). ção dos recursos hídricos superficiais e subterrâneos, e na realização de programas conjuntos entre o Esta- Instrução Normativa FATMA n° 11 do e os municípios, relativos a aproveitamento múl- tiplo, controle, conservação e proteção dos recursos Nessa IN o órgão estadual de meio ambiente de- hídricos e defesa contra eventos críticos que ofere- fine as exigências técnicas para o licenciamento da çam perigo a saúde e segurança públicas e prejuízos atividade. econômicos ou sociais (art. 34, I e III). Constam das instruções gerais: Consta da citada Lei que o Estado incentivará a for- • A quantidade máxima de dejetos para a utiliza- mação de consórcios intermunicipais, nas bacias hidro- ção em lavouras é de 50 m³/ha/ano, e de acordo gráficas consideradas prioritárias, nas quais o gerencia- com recomendações de adubação indicadas por mento dos recursos hídricos deve ser feito segundo di- laudo com base em análise do solo; retrizes e objetivos especiais e estabelecerá convênios de mútua cooperação e assistência com os mesmos, po- • Recomenda-se a instalação de sistemas de ca- dendo delegar aos municípios, que se organizarem téc- lhas e cisternas, visando o aproveitamento das nica e administrativamente, o gerenciamento de recur- águas pluviais para uso nas pocilgas. sos hídricos de interesse exclusivamente local, compre- endendo, entre outros, os de bacias hidrográficas que se Para a obtenção da Licença de Instalação, entre situem exclusivamente no território do município e os outros documentos, a FATMA exige também: 1
  • 18. 2.3 Projeto do sistema para tratamento dos resíduos sólidos e efluentes líquidos, das esterqueiras, bioes- terqueiras, sistema de fertirrigação, sistema separa- dor de sólidos, sistema de lagoas, outros, contendo memorial descritivo, de cálculo, plantas e cortes; 2.4 Programa de monitoramento do sistema de tra- tamento de efluentes. Ainda de acordo com a citada Instrução Norma- tiva, a concessão da Licença de Operação fica con- dicionada à Demonstração da eficiência do sistema de controle ambiental através de laudos laboratoriais dos parâmetros constantes do programa de monito- ramento aprovado na LAI. 1
  • 19. 2. RESPONSAbILIDADE POR DANOS AmbIENTAIS 2.1 O PRINCíPIO DA RESPONSABILIzAçÃO III – poluição, a degradação da qualidade ambien- tal resultante de atividades que direta ou indireta- A responsabilização por danos ambientais, mais mente: do que um princípio do Direito Ambiental, no sis- tema jurídico nacional, trata-se de um mandamento a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem estar da população; constitucional imprescindível à realização do direito ao meio ambiente equilibrado. A Constituição Fede- b) criem condições adversas às atividades sociais e ral é expressa ao estabelecer: econômicas; Art. 225 Todos têm direito ao meio ambiente ecolo- c) afetem desfavoravelmente a biota; gicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo meio ambiente; e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. e) lancem matérias ou energias em desacordo com (...) os padrões ambientais estabelecidos. § 3.° As condutas e atividades consideradas lesivas Assim e ainda nos termos da citada lei, poluidor é a ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas pessoa física ou jurídica, de direito público ou priva- físicas ou jurídicas, a sanções penais e administra- do, responsável, direta ou indiretamente, por ativida- tivas, independente da obrigação de reparar os da- nos causados. de causadora de degradação ambiental. (Art. 3°, IV) De acordo com a norma constitucional, o meio Outro aspecto igualmente relevante é que, para ambiente constitui um bem de uso comum, cabendo o legislador, poluição e degradação se equivalem e ao poder público e a coletividade protegê-lo. Nessa toda poluição, juridicamente relevante implica na al- tarefa, a Constituição Federal atribui ao Estado al- teração adversa do meio ambiente, ou seja, em um gumas responsabilidades, mas define também alguns dano ambiental. princípios a que se subordinam o poder público e a Bessa Antunes ao citar Francis Caballero assinala sociedade, incluindo pessoas físicas ou jurídicas. que o dano ecológico se distingue em “dano ecológi- Dessa forma, a tutela do meio ambiente no orde- co em sentido amplo, isto é, tudo que degrada o meio namento jurídico nacional se efetiva através de ações ambiente, e o dano ecológico em sentido estrito, isto do Poder Público, limitando ou restringindo direi- é, a degradação dos elementos naturais”,10 possuindo tos, e ainda mediante a responsabilização dos infra- o dano ambiental, ainda na lição de Caballero, uma tores, responsáveis por danos efetivos ou potenciais dupla face na medida em que seus efeitos atingem ao meio ambiente. não só o homem, mas da mesma forma, o ambiente que o cerca. A Lei 6.938/81 (Política Nacional do Meio Am- biente), em seu artigo 3°, incisos II e III, delimitou as Também Morato Leite destaca que o dano ambien- noções de degradação da qualidade ambiental e de tal tem uma conceituação ambivalente, “por designar poluição, estabelecendo: não só a lesão que recaí sobre o patrimônio ambien- tal, que é comum à coletividade, mas igualmente por Art. 3°. Para os fins previstos nesta Lei, entende-se se referir ao dano – por intermédio do meio ambien- por: te ou dano ricochete – a interesses pessoais, legiti- II – degradação da qualidade ambiental, a alteração adversa das características do meio ambiente; ANTUNES, P. de B. Direito Ambiental. 6º edição, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 10 2002, p 225. 1
  • 20. mando os lesados a uma reparação pelo prejuízo pa- e o exercício desse direito fundamental. O trabalho trimonial ou extrapatrimonial sofrido”.11 Para o cita- do legislador, por conseguinte, visa a garantir a pos- do autor, pode-se conceituar dano ambiental: sibilidade de fruição e, só excepcionalmente, o res- sarcimento monetário da lesão. Como toda lesão intolerável causada por qualquer ação humana (culposa ou não) ao meio ambiente, Certamente que a recomposição do dano e a res- diretamente, como macrobem de interesse a cole- ponsabilização do poluidor enfrenta limitações, tividade, em uma concepção totalizante, e indireta- como bem ilustra o exemplo da poluição causada mente, a terceiros, tendo em vista interesses próprios pela suinocultura. Individualmente cada produtor, e individualizáveis e que refletem no macrobem.12 se regularmente licenciado e operando nos limites le- gais, não constitui um problema, contudo, a criação Equivale dizer que o dano ambiental, embora sem- de suínos em escala, numa micro-região pode gerar pre recaia sobre o meio ambiente, causando prejuízo impactos significativos, como verificado na Bacia do à biota e indiretamente à coletividade, pode, em cer- rio Ariranha. Diante desse contexto, como assegurar tos casos, refletir-se, material ou moralmente, sobre a recuperação dos danos decorrentes de uma ativida- o patrimônio, ou a saúde de um grupo de pessoas. de economicamente relevante? Outra peculiaridade do dano ambiental decorre Paulo Afonso Frontini,14 aborda a problemática do do fato de atingir um bem difuso (o meio ambiente) dano decorrente da ação de múltiplos agentes: repercutindo, assim, quase sempre sobre um amplo rol de vítimas, o que gera dificuldades na sua repa- Se é em princípio lícito o uso do meio ambiente, o abuso nessa utilização ultrapassa os limites da licitu- ração, mesmo porque nem sempre é possível valo- de, entrando na área do antijurídico. Assim, o abuso rar adequadamente as conseqüências negativas para na utilização de qualquer de seus componentes pas- o ambiente, de uma conduta ou atividade. Assim, sa a qualificar-se como agressão ao meio ambiente. por exemplo, no caso da poluição causada à Bacia do Fácil é perceber como essa questão é complexa, por- Ariranha pela atividade suinícola, qual a extensão do que, não raro, a agressão resulta da ação de múlti- dano ambiental, como valorá-lo e ainda, quem pode plos agentes, cada qual, a seu turno, agindo na faixa ser considerado como vítima desse dano? da utilização. Quer dizer: embora cada agente este- ja agindo licitamente (simples utilização), o resulta- A Lei 6.938/81 estabelece que a Política Nacional do global resulta ilícito (agressão ao meio ambien- do Meio Ambiente visará, entre outros objetivos, “à te, poluição, dano ambiental). Essa peculiaridade do imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação problema induz à adoção do princípio da respon- de recuperar e/ ou indenizar os danos causados e, ao sabilidade objetiva do poluidor (Lei 6.938, art. 14, usuário, da contribuição pela utilização de recursos § 1.°), em razão de ser, muitas vezes, difícil – senão ambientais com fins econômicos (art. 4°, VII). As- impossível – enquadrar o ato de poluidor no âmbi- to da culpa civil. sim, a recuperação do bem ambiental, eventualmente lesado, não exclui a indenização, eventualmente ca- A citada Lei da Política Nacional do Meio Am- bível e, tampouco, a obrigação do poluidor de contri- biente (Lei n° 6.938/81), em seu artigo 14, § 1.° con- buir pela utilização de recursos ambientais com fins sagrou, no ordenamento jurídico brasileiro, o princí- econômicos, como por exemplo, o uso da água ou do pio da responsabilidade objetiva por danos ambien- solo para a diluição ou disposição de efluentes. tais, fundamentada no risco da atividade, dispondo: Edis Milaré,13 citando Nicolo Lipari, assinala: Art. 14 (...) A regra, pois, é procurar por todos os meios razo- § 1° Sem obstar a aplicação das penalidades previs- áveis, ir além da ressarcibilidade (indenização) em tas neste artigo é o poluidor obrigado, independen- seqüência do dano, garantindo-se, ao contrário, a te da existência de culpa, a indenizar ou reparar os fruição plena do bem ambiental. Aquela, como já danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afe- alertamos, não consegue recompor o dano ambien- tados por sua atividade. tal. O valor econômico não tem o condão – sequer por aproximação ou ficção - de substituir a existên- Divergem os doutrinadores quanto à extensão cia do meio ambiente ecologicamente equilibrado da responsabilidade objetiva por danos ambientais. 11 MORATO LEITE, José Rubens, Dano Ambiental: do individual ao coletivo extra- 14 Meio ambiente, sua natureza perante a lei e sua tutela – Anotações jurídicas em patrimonial. São Paulo: RT, 2000. p. 98-99. temas de agressão ambiental. Legitimidade do Ministério Público, órgão do Estado, 12 Idem, ibidem. pág. 99. para agir em juízo. In: Edis Milaré (coord.). Ação Civil Pública: Lei 7.347/85 – Remi- 13 MILARÉ, Edis. Op. cit. p. 671. niscências e reflexões após dez anos de aplicação. São Paulo: RT, 1995. p. 399. 20
  • 21. Para alguns a responsabilidade está vinculada a teo- dutores, produzem efeitos externos não assimila- ria do risco integral, enquanto outros consideram-na dos pelo sistema de preços, identificados pela ciên- associada à teoria do risco criado, o que é irrelevante cia econômica como externalidades. Antonio Eval- nesta análise, porquanto pelo sistema jurídico pátrio, do Comune observa que “uma externalidade surge o agente assume todo o resultado danoso decorrente sempre que a produção ou o consumo de um bem de sua atividade, independentemente da culpabilida- tem efeitos paralelos sobre os consumidores ou pro- de da ação, conforme estabelecido também no Códi- dutores envolvidos, efeitos estes que não são plena- go Civil em vigor: mente refletidos nos preços de mercado”;17 destacan- do que numa economia de concorrência perfeita, Art. 927 (...) o equilíbrio da alocação de recursos corresponde a uma situação onde ninguém pode melhorar sua po- Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o sição sem que outro se sinta lesado. Sustenta, porém, dano, independentemente de culpa, nos casos espe- cificados em lei, ou quando a atividade normalmen- que na área ambiental essa perfeição somente se veri- te desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua fica se forem utilizados certos mecanismos de inter- natureza, riscos para os direitos de outrem. nalização de efeitos externos, uma vez que o sistema de preços não é capaz de captá-los. De conformidade com esse regime, para respon- sabilização do agente por danos ambientais basta a Assim no caso em exame, a indústria que conta- comprovação da ocorrência do evento danoso e do mina um rio, nele lançando, diretamente ou através nexo de causalidade. Nas palavras de Adalberto Pas- de seus parceiros, grande carga de poluente, além de qualotto:15 provocar a redução no bem estar da população ribei- rinha, afeta a produção de outras empresas a jusante, No regime da responsabilidade objetiva, fundada na que também necessitem de água. Essa externalidade teoria do risco da atividade, para que se possa plei- somente será reduzida, se os custos ambientais forem tear a reparação do dano, basta a demonstração do assumidos pelos agentes produtores e consumidores, evento danoso e do nexo de causalidade. A ação, da através da intervenção estatal, por meio de instru- qual a teoria da culpa faz depender a responsabili- mentos econômicos ou de comando-e-controle. dade pelo resultado, é substituída, aqui, pela assun- ção do risco em provocá-lo. Essa internalização dos efeitos externos implica na superação de uma tradição dos estudos econô- Outro aspecto igualmente relevante, é destacado micos que enxergam o meio ambiente como inesgo- por Carlos André Birnfeld,16 quando assinala: tável. Assim, no exemplo citado, a análise do em- Observe-se, assim, que a responsabilidade civil ob- preendimento, do ponto de vista do proprietário da jetiva ambiental permeia, no ordenamento brasilei- indústria, considera como inexistente (zero), o cus- ro, a aplicação do princípio do poluidor-pagador, o to relativo à inadequada disposição de efluentes e qual estabelece basicamente que o poluidor haverá seu carreamento para o rio. Todavia, o custo des- de arcar, ilimitadamente, com todos os custos de sua sa diluição, para terceiros usuários que sofrem com atitude poluente, tal qual arca, ilimitadamente, com a contaminação do citado curso d’água não pode- seus benefícios. ria ser desconsiderado na avaliação do empreendi- mento poluente. Essa deseconomia externa tem efei- No item seguinte examinar-se á o princípio do po- tos sociais que devem ser eliminados ou mitigados. luidor-pagador, enfocando-se sua aplicação no trata- mento dos dejetos gerados pela suinocultura e na re- Analisando os efeitos das externalidades sobre o cuperação dos danos ambientais já identificados. meio ambiente, Vitor Bellia sustenta que as perdas com a contaminação ambiental atingem as ativida- 2.2 O PRINCíPIO DO POLUIDOR-PAGADOR des produtivas, a saúde, as propriedades e bens ma- teriais, a vegetação, o solo, a vida animal, os valores As atividades humanas, sobretudo as sócio-eco- estéticos e culturais, e que “todas essas perdas envol- nômicas, que repercutam sobre consumidores e pro- vem custos sociais e não devem ser ignoradas na ava- liação de projetos”. Ressalta, porém, que “para que 15 PASQUALLOTO, Adalberto. Responsabilidade civil por dano ambiental: consi- derações de ordem material e processual. In: BENJAMIN, Antonio H. V.[Coord.] Dano Ambiental: prevenção, reparação e repressão. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993, p. 454. 17 COMUNE, A. E. Meio Ambiente, Economia e Economistas. In MAY, Peter Her- 16 BIRNFELD, Carlos A. Algumas perspectivas sobre a responsabilidade civil do po- man e MOTTA, Ronaldo Seroa (Org.) Valorando a Natureza - Análise Econômi- luidor por danos ambientais. In: LEITE, José Rubens e BELLO FILHO, Ney de B. ca para o Desenvolvimento Sustentável. Edit. Campus, Rio de Janeiro, 1994, p. (Orgs.) Direito Ambiental Contemporâneo. Barueri-SP: Manole, 2004, p. 368. 50/51. 21
  • 22. os efeitos ambientais sejam incluídos nas análises Ramóns Mateo21 reconhece necessária a revisão econômicas, é preciso reconhecer o meio ambiente dos mecanismos de mercado, assinalando, que os como insumo sujeito à escassez e, portanto, com cus- poderes públicos devem se responsabilizar, de algu- to alternativo que não seja nulo”.18 ma maneira, pela internalização dos custos ambien- tais, mesmo porque, em uma economia mista ou de O grande desafio tem sido o de reduzir essas ex- mercado, os comportamentos individuais não le- ternalidades, internalizando-as no sistema de preços. variam em conta o meio ambiente público; ponde- No caso da suinocultura desenvolvida no oeste cata- ra, contudo, que o procedimento possível, somente rinense fica evidente que o custo da degradação ve- poderá ser definido, a partir das circunstâncias de rificada no solo e nos cursos d’água não estão sendo cada país, observando que é aconselhável uma pru- contabilizados no sistema de preço, ou seja, o pífio dente dosimetria de taxas, penalidades, subsídios “lucro” dos produtores, ou mesmo o lucro expressi- e normas impositivas; embora insuficiente, quan- vo das agroindústrias está sendo calculado sem que do a contaminação ultrapassa as fronteiras do país. considere as medidas corretivas necessárias para re- verter o quadro de degradação gerado pela ativida- Há um consenso entre os economistas de que essa de. internalização pode se realizar através da estrutura- ção jurídica de um sistema que combine o empre- Luiz Fernando Krieger Merico observa que go de instrumentos econômicos com a previsão de a internalização dos custos ambientais não é, sanções e procedimentos eficazes para a reparação e por si só suficiente para enfrentar a poluição: compensação de danos causados ao meio ambiente. a internalização de custos ambientais é um passo Entre os institutos jurídicos concebidos para pro- importante no controle do uso dos recursos e ser- mover a internalização das externalidades destaca- viços naturais, mas é também importante percebe- se o princípio do poluidor-pagador (PPP) inserido rem-se as limitações desses mecanismos para se en- entre as Recomendações da Organização para a Co- frentar a degradação como um todo. Tais mecanis- mos devem ser suplementos de ações diretas que li- operação e Desenvolvimento Econômico - OCDE22, mitem a escala da economia em relação à biosfera. a partir da constatação de que o mercado não con- A internalização dos custos ambientais fará os con- segue assimilar, no sistema de preços, os custos in- sumidores pagarem o custo real do que adquirirem, tegrais dos bens e serviços, o que implica na implí- ao invés de repassar estes custos à sociedade. Po- cita concessão de subsídios às atividades poluidores, derá também conduzir à adoção de meios mais efi- acarretando a degradação dos recursos ambientais, cientes de se conter a poluição e de uso eficiente de reconhecidamente escassos. energia e recursos. Mas são, na realidade, comple- mentos de ações que levem a sustentabilidade, pois Na base desse princípio está o reconhecimento da são ineficientes em produzi-la.19 existência das externalidades e das falhas do merca- do que não consegue refletir adequadamente a dete- A experiência tem demonstrado que os mecanis- rioração e a escassez dos recursos ambientais limi- mos de mercado necessitam serem reorientados a tados. A OCDE admite que medidas públicas são fim de que permitam compatibilizar desenvolvimen- necessárias para reduzir a poluição, assegurar me- to e sustentabilidade. Pode-se afirmar que predomi- lhor alocação e estimular o uso racional desses re- na entre os autores que tratam do tema, o entendi- cursos, naturalmente escassos. Com o PPP preten- mento de que a realização do desenvolvimento sus- deu a OCDE também, evitar distorções no comércio tentável pressupõe uma combinação do sistema de e nos investimentos. regulamentação (comando-e-controle) com o em- prego de instrumentos econômicos. Essa preferência Por força desse princípio, deve estar a cargo do po- justifica-se, na medida em que, nas hipóteses de da- luidor os custos das medidas da prevenção, contro- nos ambientais significativos, as medidas mais indi- le e remediação da poluição, como forma de induzir cadas passam pela adoção de sanções severas combi- que tais custos estejam refletidos nos custos dos bens nadas com a responsabilização do degradador.20 vários instrumentos, assumindo uma orientação pragmática (ALMEIDA, Luciana 18 BELLIA, Vitor. Introdução à Economia do Meio Ambiente. Brasília: IBAMA, 1996, Togeiro. Política Ambiental: Uma análise econômica. Campinas: Papirus, 1998). p. 89. 21 MATEO, Ramón Martín. Derecho Ambiental. Madrid: Institutos de estudios de 19 MERICO, Luiz F. Kieger. Introdução à Economia Ecológica. Blumenau: FURB, Administracion Local, 1977, p. 39 (Tradução livre). 1996. 22 Recomendação C(72) 128, do Conselho Diretor da OCDE, de 26/05/72. Do- 20 Também Luciana Togeiro de Almeida desenvolve uma analise econômica da po- cumento disponível no site da OCDE (www.oecd.org) sob a denominação: Gui- lítica ambiental no Brasil, avaliando as experiências com os instrumentos econômi- ding Principles Concerning Internacional Economic Aspects of Environmental cos, posicionando-se favorável a uma política que contemple uma combinação de Policies. 22