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30 • Cidades • Brasília, quarta-feira, 27 de julho de 2011 • CORREIO BRAZILIENSE
     Gustavo Moreno/CB/D.A Press




                                                                                                     Fábio: “Hoje me
                                                                                                sinto mais confiante,
                                                                                                      mais disposto e
                                                                                                      até mais forte”




                                            Depois de o Correio contar sua história, rapaz tetraplégico viajou aos Estados Unidos para se submeter a
                                          tratamento especializado. Cinco anos após o acidente, ele refaz planos e comemora as pequenas conquistas




                                                                   E Fábio
                                                       reinventou
                             » MARCELO ABREU
                                                 a vida...
                             ESPECIAL PARA O CORREIO
                                                                         Ficou ali por quatro longos meses, para
                                                                         reabilitação. “Eles me ensinaram a vi-
                                                                                                                                                                  Para completar a quantia, a mãe ven-
                                                                                                                                                                  deu o carro e juntou com as econo-
                                                                                                                                                                                                                        Matérias do Correio
                                                                                                                                                                                                                        mobilizaram ajuda



                                                                                                                                                                                                            A mãe intervém: “Isso é respeito”.
                                                                                                                                                                                                                De volta a Brasília há uma semana,
                                                                         ver numa cadeira de rodas”, conta.                       QR code                         mias da família, que havia cortado to-    ao apartamento alugado onde a família
                                      á histórias que são construí-          No meio desse processo, a mãe de                                                     das as despesas.                          mora no Sudoeste, Fábio continua na


                             H        das com tanta determinação
                                      que chegam a doer emocional
                                      e fisicamente. Esta é uma de-
                             las. Um mergulho malsucedido numa
                             piscina alterou para sempre os rumos
                                                                         Fábio, Solange Grando, que contava à
                                                                         época 40 anos, saudável, sem histórico
                                                                         de doença e que deixara tudo para cui-
                                                                         dar dele integralmente, sentiu-se mal.
                                                                         Desmaiou no quarto onde o filho só
                                                                                                                                                                  Superação
                                                                                                                                                                     Dezembro de 2010. Fábio, o pai, a
                                                                                                                                                                  mãe e o irmão caçula embarcaram pa-
                                                                                                                                                                                                            sua cadeira de rodas. Qual o saldo da
                                                                                                                                                                                                            viagem? “Voltei mais independente.
                                                                                                                                                                                                            Hoje, faço algumas coisas sozinho. Sin-
                                                                                                                                                                                                            to meu abdômen e os meus músculos,
                                                                                                                                                                                                            o que me dá mais equilíbrio. Consigo
                             da vida. Fez o personagem desta repor-      mexia o pescoço. Nem gritar Fábio pô-                                                    ra os Estados Unidos. Alugaram um         passar da cama para a cadeira com
                             tagem rever valores, reconstruir etapas     de. “Só ouvi o baque dela no chão.”                                                      pequeno apartamento em Vista, a           mais facilidade.” E comenta: “Alguns
                             e refazer todos os sonhos. E refazer so-    Uma enfermeira passava no local. So-                                                     70km de San Diego. E lá começa a se-      amigos me viram na cadeira e ficaram
                             nhos é, provavelmente, a parte mais di-     correu-a. Solange foi levada ao Institu-                                                 gunda parte desta história. Fábio par-    meio decepcionados. Pensaram que eu
                             fícil da história de cada um. Fábio         to do Coração (Incor-DF). Sofrera sete                                                   tiu em busca de qualquer indepen-         voltaria andando. Eu sempre soube
                             Grando ganhou uma segunda chance.           paradas cardíacas. Fez cateterismo.                  Para conferir o vídeo de Fábio,     dência. Mesmo que fosse apenas se vi-     que isso não ia ser possível, mas hoje
                             E agarrou-se a ela com intensidade          Causa do infarto? Os médicos apontam              fotografe o QR code acima com o        rar na cama nas madrugadas, sem ter       me sinto mais confiante, mais disposto
                             maior que a força de suas pernas e de       o estresse em que se encontrava. Resis-          software leitor de código de barras     que acordar o pai.                        e até mais forte”, alegra-se. Fábio segui-
                                                                                                                          do seu celular e acesse o conteúdo
                             seus braços. Cada movimento hoje é          tiu milagrosamente, sem sequelas. So-            multimídia. Caso você não tenha o          Os seis meses nos Estados Unidos       rá com os exercícios de fisioterapia nu-
                             comemorado como tombo de bebê               breviveu para cuidar de Fábio.“Se eu ti-          programa, envie um SMS com as          viraram sete. A mãe e o irmão ficaram     ma academia no Núcleo Bandeirante.
                             que começa a engatinhar.                    vesse tido o infarto em casa ou na rua,            letras QR para o número 50035.        com ele em San Diego. O pai voltou,       É lá que foi inaugurada, há poucos dias,
                                Em fevereiro de 2010, o Correio          provavelmente não teria sobrevivido.              Você receberá um link para fazer       para tocar o comércio da família. A fi-   uma filial do ProjectWalk no DF.
                                                                                                                           o download gratuito do software.
                             contou, com exclusividade, o drama          Só me salvei porque estava dentro do                 O custo do SMS é de R$ 0,31 +
                                                                                                                                                                  sioterapia foi intensa — três vezes por       A proprietária, Karen Sakayo, 23
                             de Fábio. Quatro anos antes, aos 21,        hospital e fui socorrida imediatamen-               impostos. Só é preciso baixar o      semana, durante três horas a cada dia.    anos, ficou paraplégica depois de cair
                             ele ficara tetraplégico, depois de pular    te”, resigna-se.                                   software uma vez. O Correio não       “Era muito pesado. No começo, eu ia à     durante uma apresentação circense da
                             de ponta. Era Copa do Mundo. Brasil e                                                         cobra nada pelo conteúdo, mas, a       tarde para o Project, mas, no dia se-     lira (“bambolê suspenso”), de uma al-
                             Austrália faziam a segunda partida. A       Dependência                                      cada vez que você o acessar, estará
                                                                                                                         navegando na internet e pagará pelo
                                                                                                                                                                  guinte, dormia a manhã toda, de tão       tura de 6 metros, quando a corda se
                             reunião era na casa de um amigo, no                                                          tráfego de dados à sua operadora.       cansado”, lembra.                         rompeu. Ela foi paciente do Project nos
                             Lago Sul. A partida prosseguia. Fábio          Passaram-se os anos. Em 2008, sen-                                                       Na fisioterapia americana, Fábio       Estados Unidos e trouxe a técnica para
                             resolveu entrar na piscina. A festa es-     tado numa cadeira de rodas, todo                                                         andou, em esteiras preparadas. Era        Brasília. Os fisioterapeutas que lá tra-
                             tava apenas começando. “Só me lem-          imobilizado, o rapaz tetraplégico for-                                                   como se tivesse engatinhando. Foi a       balham foram treinados em San Diego.
                             bro do barulho da minha cabeça no           mou-se em jornalismo. Chegou em-           pai, proprietário de um pequeno self-         melhor sensação dos últimos cinco         É lá que Fábio seguirá suas atividades.
                             fundo.” A água ficou escura. Era o san-     purrado pelos amigos. A vida precisa-      service no Sudoeste, não teria como           anos. “Aqui, ficava em pé com talas.      E assim poderá tocar seus novos proje-
                             gue dele que jorrava.                       va seguir, mesmo daquela forma, mes-       arrumar a quantia.                            Lá, fiquei sem talas, no simulador de     tos. Com gosto de vida, ele diz: “Quero
                                Os amigos chamaram o Corpo de            mo mexendo apenas a cabeça. Ele sa-           Depois que a história de Fábio foi         caminhada.” E mais um aprendizado:        voltar a trabalhar. Posso fazer alguma
                             Bombeiros. Imobilizado, Fábio foi leva-     bia disso. “Passei a ser dependente de     contada pelo Correio, a ajuda veio de         “Precisei preparar o pensamento.          coisa com jornalismo de internet. Que-
                             do para o Hospital de Base (HBDF). Lá,      tudo. Meu pai, há quatro anos, todas       todos os lados. “Teve gente que fez de-       Meu cérebro desaprendeu a andar. Ti-      ro dar cada vez menos trabalho à mi-
                             encontrou os pais, desesperados. Sou-       as madrugadas, acorda para me mu-          pósito de R$ 1 e de R$ 5 mil”, conta Fá-      nha que ter concentração total”. E        nha família”. O pai, Éder Grando, 48
                             be que havia tido uma lesão medular.        dar de posição na cama. Isso não é jus-    bio. “Um comerciante chegou aqui em           brinca: “Saía de lá com mais dor de       anos, ouve. Emociona-se em silêncio. A
                             Esperou por quatro dias para fazer          to com ele”, disse ao Correio, em feve-    casa com um envelope e havia dentro           cabeça do que nas pernas”.                mãe serve um copo com água para o fi-
                             uma cirurgia. Não conseguiu. Uma fe-        reiro do ano passado.                      dele 8 mil euros”, lembra, ainda emo-            Nos sete meses nos Estados Uni-        lho. E também se comove.
                             rida enorme (escara) se alastrava pelas        Fábio queria chegar a San Diego,        cionada, a mãe. Ele ainda disse por que       dos, Fábio deparou-se com um país             A vida e os sonhos de Fábio seguem.
                             costas. De lá, seguiu para o Hospital Sa-   nos Estados Unidos. Lá, soube que ha-      guardava o dinheiro: “Era para uma            preparado para receber e conviver         Ele quer mais. E tem direito de querer
                             rah do Aparelho Locomotor, na Asa Sul,      via um tratamento de fisioterapia ex-      eventual doença na minha família”.            com gente que tem pernas e braços         mais. Um pulo numa piscina modifi-
                             para tentar, finalmente, ser operado.       clusivamente para pacientes com le-           Os amigos se mobilizaram na cam-           emprestados. “Tô em cadeira de rodas      cou rumos. Alterou todos os sentidos.
                                Lá, no Sarah, a certeza que lhe inva-    são medular. Era o Project Walk — ba-      panha Bora, Fabito! . Teve festival de        há cinco anos. Lá, pela primeira vez,     Mas ele os reinventou. A vida é sempre
                             diu a alma: ficara tetraplégico. O mun-     seado na repetição dos exercícios, em      tortas, artistas da cidade se juntaram        não precisei empinar minha cadeira        uma grande reinvenção. E esse talvez
                             do desabou. Era a pior notícia que ou-      aparelhos desenvolvidos para cada ti-      para shows beneficentes, vendas de            pra nada. Todos os lugares são adapta-    seja o segredo de viver. Hoje, quarta-
                             vira nos seus 21 anos de vida. Esperou      po de lesão. Mas era caro chegar ali.      camisetas. Em 11 meses, a família             dos. As vagas para deficientes são res-   feira, 27de julho, ele tem tudo para es-
                             por 22 dias pela cirurgia. Colocaram-       Ano passado, pelos seis meses (tempo       contabilizou R$ 80 mil. “Se não fosse         peitadas sem discussão. Nos bancos, a     tar mais certo disso. Completa 27 anos.
                             lhe quatro parafusos no pescoço e uma       mínimo de tratamento), ele teria que       essa ajuda, nunca teria chegado lá.           adaptação é tão grande que os cadei-      Uma vida inteira o espera pela frente.
                             placa de titânio para fixar a vértebra.     desembolsar U$ 55 mil (R$ 110 mil). O      Sou grato a todas as pessoas”, diz ele.       rantes nem precisam de fila especial.”    Parabéns, Fabito!



                                                                                           Conheça mais//Fábio conta suas histórias no blog: fabiogrando.blogspot.com




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Reabilitação nos EUA deu nova esperança a jovem tetraplégico após acidente

  • 1. CMYK 30 • Cidades • Brasília, quarta-feira, 27 de julho de 2011 • CORREIO BRAZILIENSE Gustavo Moreno/CB/D.A Press Fábio: “Hoje me sinto mais confiante, mais disposto e até mais forte” Depois de o Correio contar sua história, rapaz tetraplégico viajou aos Estados Unidos para se submeter a tratamento especializado. Cinco anos após o acidente, ele refaz planos e comemora as pequenas conquistas E Fábio reinventou » MARCELO ABREU a vida... ESPECIAL PARA O CORREIO Ficou ali por quatro longos meses, para reabilitação. “Eles me ensinaram a vi- Para completar a quantia, a mãe ven- deu o carro e juntou com as econo- Matérias do Correio mobilizaram ajuda A mãe intervém: “Isso é respeito”. De volta a Brasília há uma semana, ver numa cadeira de rodas”, conta. QR code mias da família, que havia cortado to- ao apartamento alugado onde a família á histórias que são construí- No meio desse processo, a mãe de das as despesas. mora no Sudoeste, Fábio continua na H das com tanta determinação que chegam a doer emocional e fisicamente. Esta é uma de- las. Um mergulho malsucedido numa piscina alterou para sempre os rumos Fábio, Solange Grando, que contava à época 40 anos, saudável, sem histórico de doença e que deixara tudo para cui- dar dele integralmente, sentiu-se mal. Desmaiou no quarto onde o filho só Superação Dezembro de 2010. Fábio, o pai, a mãe e o irmão caçula embarcaram pa- sua cadeira de rodas. Qual o saldo da viagem? “Voltei mais independente. Hoje, faço algumas coisas sozinho. Sin- to meu abdômen e os meus músculos, o que me dá mais equilíbrio. Consigo da vida. Fez o personagem desta repor- mexia o pescoço. Nem gritar Fábio pô- ra os Estados Unidos. Alugaram um passar da cama para a cadeira com tagem rever valores, reconstruir etapas de. “Só ouvi o baque dela no chão.” pequeno apartamento em Vista, a mais facilidade.” E comenta: “Alguns e refazer todos os sonhos. E refazer so- Uma enfermeira passava no local. So- 70km de San Diego. E lá começa a se- amigos me viram na cadeira e ficaram nhos é, provavelmente, a parte mais di- correu-a. Solange foi levada ao Institu- gunda parte desta história. Fábio par- meio decepcionados. Pensaram que eu fícil da história de cada um. Fábio to do Coração (Incor-DF). Sofrera sete tiu em busca de qualquer indepen- voltaria andando. Eu sempre soube Grando ganhou uma segunda chance. paradas cardíacas. Fez cateterismo. Para conferir o vídeo de Fábio, dência. Mesmo que fosse apenas se vi- que isso não ia ser possível, mas hoje E agarrou-se a ela com intensidade Causa do infarto? Os médicos apontam fotografe o QR code acima com o rar na cama nas madrugadas, sem ter me sinto mais confiante, mais disposto maior que a força de suas pernas e de o estresse em que se encontrava. Resis- software leitor de código de barras que acordar o pai. e até mais forte”, alegra-se. Fábio segui- do seu celular e acesse o conteúdo seus braços. Cada movimento hoje é tiu milagrosamente, sem sequelas. So- multimídia. Caso você não tenha o Os seis meses nos Estados Unidos rá com os exercícios de fisioterapia nu- comemorado como tombo de bebê breviveu para cuidar de Fábio.“Se eu ti- programa, envie um SMS com as viraram sete. A mãe e o irmão ficaram ma academia no Núcleo Bandeirante. que começa a engatinhar. vesse tido o infarto em casa ou na rua, letras QR para o número 50035. com ele em San Diego. O pai voltou, É lá que foi inaugurada, há poucos dias, Em fevereiro de 2010, o Correio provavelmente não teria sobrevivido. Você receberá um link para fazer para tocar o comércio da família. A fi- uma filial do ProjectWalk no DF. o download gratuito do software. contou, com exclusividade, o drama Só me salvei porque estava dentro do O custo do SMS é de R$ 0,31 + sioterapia foi intensa — três vezes por A proprietária, Karen Sakayo, 23 de Fábio. Quatro anos antes, aos 21, hospital e fui socorrida imediatamen- impostos. Só é preciso baixar o semana, durante três horas a cada dia. anos, ficou paraplégica depois de cair ele ficara tetraplégico, depois de pular te”, resigna-se. software uma vez. O Correio não “Era muito pesado. No começo, eu ia à durante uma apresentação circense da de ponta. Era Copa do Mundo. Brasil e cobra nada pelo conteúdo, mas, a tarde para o Project, mas, no dia se- lira (“bambolê suspenso”), de uma al- Austrália faziam a segunda partida. A Dependência cada vez que você o acessar, estará navegando na internet e pagará pelo guinte, dormia a manhã toda, de tão tura de 6 metros, quando a corda se reunião era na casa de um amigo, no tráfego de dados à sua operadora. cansado”, lembra. rompeu. Ela foi paciente do Project nos Lago Sul. A partida prosseguia. Fábio Passaram-se os anos. Em 2008, sen- Na fisioterapia americana, Fábio Estados Unidos e trouxe a técnica para resolveu entrar na piscina. A festa es- tado numa cadeira de rodas, todo andou, em esteiras preparadas. Era Brasília. Os fisioterapeutas que lá tra- tava apenas começando. “Só me lem- imobilizado, o rapaz tetraplégico for- como se tivesse engatinhando. Foi a balham foram treinados em San Diego. bro do barulho da minha cabeça no mou-se em jornalismo. Chegou em- pai, proprietário de um pequeno self- melhor sensação dos últimos cinco É lá que Fábio seguirá suas atividades. fundo.” A água ficou escura. Era o san- purrado pelos amigos. A vida precisa- service no Sudoeste, não teria como anos. “Aqui, ficava em pé com talas. E assim poderá tocar seus novos proje- gue dele que jorrava. va seguir, mesmo daquela forma, mes- arrumar a quantia. Lá, fiquei sem talas, no simulador de tos. Com gosto de vida, ele diz: “Quero Os amigos chamaram o Corpo de mo mexendo apenas a cabeça. Ele sa- Depois que a história de Fábio foi caminhada.” E mais um aprendizado: voltar a trabalhar. Posso fazer alguma Bombeiros. Imobilizado, Fábio foi leva- bia disso. “Passei a ser dependente de contada pelo Correio, a ajuda veio de “Precisei preparar o pensamento. coisa com jornalismo de internet. Que- do para o Hospital de Base (HBDF). Lá, tudo. Meu pai, há quatro anos, todas todos os lados. “Teve gente que fez de- Meu cérebro desaprendeu a andar. Ti- ro dar cada vez menos trabalho à mi- encontrou os pais, desesperados. Sou- as madrugadas, acorda para me mu- pósito de R$ 1 e de R$ 5 mil”, conta Fá- nha que ter concentração total”. E nha família”. O pai, Éder Grando, 48 be que havia tido uma lesão medular. dar de posição na cama. Isso não é jus- bio. “Um comerciante chegou aqui em brinca: “Saía de lá com mais dor de anos, ouve. Emociona-se em silêncio. A Esperou por quatro dias para fazer to com ele”, disse ao Correio, em feve- casa com um envelope e havia dentro cabeça do que nas pernas”. mãe serve um copo com água para o fi- uma cirurgia. Não conseguiu. Uma fe- reiro do ano passado. dele 8 mil euros”, lembra, ainda emo- Nos sete meses nos Estados Uni- lho. E também se comove. rida enorme (escara) se alastrava pelas Fábio queria chegar a San Diego, cionada, a mãe. Ele ainda disse por que dos, Fábio deparou-se com um país A vida e os sonhos de Fábio seguem. costas. De lá, seguiu para o Hospital Sa- nos Estados Unidos. Lá, soube que ha- guardava o dinheiro: “Era para uma preparado para receber e conviver Ele quer mais. E tem direito de querer rah do Aparelho Locomotor, na Asa Sul, via um tratamento de fisioterapia ex- eventual doença na minha família”. com gente que tem pernas e braços mais. Um pulo numa piscina modifi- para tentar, finalmente, ser operado. clusivamente para pacientes com le- Os amigos se mobilizaram na cam- emprestados. “Tô em cadeira de rodas cou rumos. Alterou todos os sentidos. Lá, no Sarah, a certeza que lhe inva- são medular. Era o Project Walk — ba- panha Bora, Fabito! . Teve festival de há cinco anos. Lá, pela primeira vez, Mas ele os reinventou. A vida é sempre diu a alma: ficara tetraplégico. O mun- seado na repetição dos exercícios, em tortas, artistas da cidade se juntaram não precisei empinar minha cadeira uma grande reinvenção. E esse talvez do desabou. Era a pior notícia que ou- aparelhos desenvolvidos para cada ti- para shows beneficentes, vendas de pra nada. Todos os lugares são adapta- seja o segredo de viver. Hoje, quarta- vira nos seus 21 anos de vida. Esperou po de lesão. Mas era caro chegar ali. camisetas. Em 11 meses, a família dos. As vagas para deficientes são res- feira, 27de julho, ele tem tudo para es- por 22 dias pela cirurgia. Colocaram- Ano passado, pelos seis meses (tempo contabilizou R$ 80 mil. “Se não fosse peitadas sem discussão. Nos bancos, a tar mais certo disso. Completa 27 anos. lhe quatro parafusos no pescoço e uma mínimo de tratamento), ele teria que essa ajuda, nunca teria chegado lá. adaptação é tão grande que os cadei- Uma vida inteira o espera pela frente. placa de titânio para fixar a vértebra. desembolsar U$ 55 mil (R$ 110 mil). O Sou grato a todas as pessoas”, diz ele. rantes nem precisam de fila especial.” Parabéns, Fabito! Conheça mais//Fábio conta suas histórias no blog: fabiogrando.blogspot.com CMYK