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Universidade Feevale

              Mestrado em Processos e Manifestações Culturais




                    WILLIAN FERNANDES ARAÚJO




“WE OPEN GOVERNMENTS”: UMA ANÁLISE DE DISCURSO DO CIBERATIVISMO
            PRATICADO PELA ORGANIZAÇÃO WIKILEAKS




                             Novo Hamburgo
                                   2013
1



                           Universidade Feevale
              Mestrado em Processos e Manifestações Culturais




                    WILLIAN FERNANDES ARAÚJO




“WE OPEN GOVERNMENTS”: UMA ANÁLISE DE DISCURSO DO CIBERATIVISMO
PRATICADO PELA ORGANIZAÇÃO WIKILEAKS




                                      Trabalho     de   conclusão   apresentado   ao
                                      Mestrado em Processos e Manifestações
                                      Culturais como requisito para a obtenção do
                                      grau de mestre em Processos e Manifestações
                                      Culturais.




              Orientadora: Profª. Drª. Sandra Portella Montardo
                Co-orientador: Prof. Dr. Ernani Cesar Freitas




                              Novo Hamburgo
                                   2013
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                                Universidade Feevale
                   Mestrado em Processos e Manifestações Culturais




                         WILLIAN FERNANDES ARAÚJO




“WE OPEN GOVERNMENTS”: UMA ANÁLISE DE DISCURSO DO CIBERATIVISMO
PRATICADO PELA ORGANIZAÇÃO WIKILEAKS




       Trabalho de Conclusão de mestrado aprovado pela banca examinadora em 15 de
janeiro de 2013, conferindo ao autor o título de mestre em Processos e Manifestações
Culturais.




                                          Componentes da Banca Examinadora:


                                          _______________________________
                                          Prof. Dra. Sandra Portella Montardo
                                          Universidade Feevale


                                          _______________________________
                                          Prof. Dr. Antônio Fausto Neto
                                          Universidade do Vale do Rio dos Sinos
                                          (UNISINOS)


                                          _______________________________
                                          Prof. Dra. Suely Dadalti Fragoso
                                          Universidade Federal do Rio Grande do Sul
                                          (UFRGS)
4



                                         RESUMO


O estudo busca discutir o discurso no ciberativismo, mais especificamente abordando
construções discursivas no ciberativismo praticado pela organização WikiLeaks. Desta
maneira, a pesquisa tem como objetivo geral identificar de que maneira esta organização
constrói seus discursos. Os objetivos específicos são compreender qual o papel do discurso no
ciberativismo, tendo a internet como situação extralinguística; apontar como se dá a
encenação discursiva no âmbito da organização WikiLeaks e quais estratégias são usadas; e
discutir e problematizar o conceito de ciberativismo, apontando uma proposição adequada ao
nosso entendimento deste fenômeno social. A metodologia é qualitativa e apresenta uma
formação híbrida, utilizando a análise do discurso de base semiolinguística para o estudo dos
textos que formam o corpus desta pesquisa, composto pela página inicial do sítio da
organização durante maio de 2012, pela produção audiovisual “What Does it Cost to Change
the World?” publicada no sítio Vímeo em julho de 2011 e por postagens da organização
WikiLeaks em sua página no Facebook de 1° de junho a 5 de julho de 2012. Nesta última
unidade de análise, foi aplicada a metodologia Teoria Fundamentada para identificação dos
principais usos da ferramenta pela WikiLeaks e escolha dos textos a serem analisados
segundo a Semiolinguística. A formação teórica do trabalho é organizada em três capítulos.
No primeiro, discutimos o conceito de ciberativismo com base em diversos autores. A partir
disto, propomos uma conceituação de ciberativismo adequada ao nosso entendimento e
baseada na intersecção de diversos conceitos. No segundo capítulo, apresentamos reflexões
sobre a internet como espaço social de disputas, e por isso, sua estrutura de protocolos que
garante o status de mídia massiva mais controlada conhecida até agora, assim como as formas
que constituem o poder na sociedade em rede e de controle. No terceiro capítulo, são
construídos os principais pontos da Semiolinguística, como disciplina de estudo do discurso
que compreende o dito como um arranjo entre vozes sociais e intencionalidade individual.
Também é apresentada neste trabalho uma revisão bibliográfica de abordagens sobre a
WikiLeaks. Por fim, trazemos as considerações finais em que identificamos, como resultado
da análise, o direcionamento das estratégias discursivas essencialmente para captação dos
interpretantes, buscando com isso garantir aporte colaborativo, visibilidade e legitimação dos
discursos desta organização.

Palavras-chave: Ciberativismo; WikiLeaks; Análise de discurso; Semiolinguística;
Cibercultura.
5



                                          ABSTRACT


The study aims to discuss the discourse in cyberactivism, more specifically addressing the
discursive constructions in the cyberactivism practiced by the organization WikiLeaks. Thus,
the research aims at identifying how this organization builds its discourses. The specific
objectives are to understand the role of discourse in cyberactivism, taking the internet as
extralinguistic situation, to point out how the staging discourse in the ambit of the
organization WikiLeaks is made and which strategies are used, and discuss and problematize
the concept of cyberactivism, indicating a proposition that is adequate to our understanding of
this social phenomenon. The methodology is qualitative and presents a hybrid formation,
using the discourse analysis based on Semiolinguistics as the basis for the study of texts that
form the corpus of this research, consisted by the homepage of the website of the organization
during May of 2012, the audiovisual production “What Does it Cost to Change the World?”
published in the Vimeo website in July of 2011 and by posts of the organization WikiLeaks
on its Facebook page during June 1st and July 5th of 2012. In this last unit of analysis it was
applied the methodological Grounded Theory to identify the main uses of the tool by
WikiLeaks and choose the texts to be analyzed according to Semiolinguistics. The theoretical
framework is organized into three chapters. In the first one, we discuss the concept of
cyberactivism based on several authors. From this, we propose a conceptualization of
cyberactivism suitable to our understanding and based on the intersection of several concepts.
In the second chapter we present reflections on the internet as a social space of disputes, and
therefore its structure of protocols that provides the status of mass media more controlled,
known so far, as well as forms that constitute the power in the networked society and the
control. In the third chapter, the main points of Semiolinguistics are constructed, as a
discipline of study of the discourse which comprehends the dictum as an arrangement
between social voices and individual intentionality. A literature review of approaches about
WikiLeaks is also presented in this work. Lastly, we bring the final considerations where we
identify as a result of the analysis, the targeting of discursive strategies essentially to capture
the interpretants, seeking with it to ensure collaborative contribution, visibility and legitimacy
of the discourses of this organization.


Keywords: Cyberactivism; WikiLeaks; Discourse analysis; Semiolinguistic; Cyberculture.
6



                                                   LISTA DE QUADROS



Quadro 1 – Sistematização das tipologias sobre ciberativismo.............................................. 43

Quadro 2 - Níveis do ato de linguagem.................................................................................. 76

Quadro 3 – Dispositivo de análise........................................................................................ 104

Quadro 4 - Componentes da situação de comunicação na página de web
WikiLeaks.org........................................................................................................................ 111

Quadro 5 - Categorias identificadas na análise das postagens na página de Facebook da
WikiLeaks.............................................................................................................................. 135
7



                                                      LISTA DE FIGURAS



Figura 1 – Representação gráfica do histórico do ciberativismo............................................ 39

Figura 2 – Exemplo de estrutura de “árvore invertida” do DNS.............................................53

Figura 3 – Modelo do Ato de linguagem para semiolinguística............................................. 70

Figura 4 – Modelo do processo de semiotização do mundo de Charaudeau.......................... 72

Figura 5 – Esquema que representa graficamente o percurso metodológico deste estudo... 101

Figura 6 – Página inicial do sítio da WikiLeaks durante paralisação de suas atividades em
2009........................................................................................................................................ 106

Figura 7 – Retrato parcial da página inicial do sítio da WikiLeaks onde estão numerados
diferentes elementos deste ato de linguagem......................................................................... 107

Figura 8 – Página inicial do sítio da WikiLeaks, com marcação nos hiperlinks para página
“doação”................................................................................................................................. 113

Figura 9 – Logomarca da WikiLeaks retirada de sua página de web e com marcação de seus
elementos............................................................................................................................... 115

Figura 10 – Frames retirados da produção audiovisual “Wikileaks needs you”................... 118

Figura 11 – Detalhe retratando unidade de conteúdo retirado do setor 6 (da Figura 7) da
página inicial do sítio da WikiLeaks...................................................................................... 119

Figura 12 – Imagem retirada da página inicial do sítio da WikiLeaks................................. 121

Figura 13 – Captação de tela da página inicial do sítio da WikiLeaks como é vista pelo
usuário.................................................................................................................................... 123

Figura 14 – Frame retirado do vídeo “WikiLeaks needs you!” (1’8’’) que mostra a utilização
da imagem de uma notícia publicada no sítio da revista Forbes sobre o bloqueio bancário
sofrido pela WikiLeaks.......................................................................................................... 126

Figura 15 – Reprodução parcial da página onde está publicada a produção audivisual “What
Does it Cost to Change the World?”...................................................................................... 128

Figura 16 – Reprodução parcial da página onde está publicada a produção audiovisual no
momento em que a identidade psicossocial de Julian Assange é usada neste ato de
linguagem............................................................................................................................... 129

Figura 17 – Reprodução parcial da página onde está publicada a produção audiovisual no
momento em que, através de um efeito gráfico, a logomarca da empresa MasterCard é
transformada na logomarca da WikiLeaks............................................................................. 131
8



Figura 18 – Reprodução parcial de postagem na página de Facebook da WikiLeaks
identificada na categoria “Sugestão de atitude”..................................................................... 136

Figura 19 – Reprodução parcial de postagem na página de Facebook da WikiLeaks
identificada na categoria “Comentário opinativo”................................................................. 137

Figura 20 – Reprodução parcial de postagem na página de Facebook da WikiLeaks
identificada nas categorias “Comentário opinativo” e “Divulgação de conteúdo”................ 138

Figura 21 – Reprodução parcial de postagem na página de Facebook da WikiLeaks
identificada na categoria “Divulgação de conteúdo”........................................................... 139

Figura 22 – Gráficos das interações nas publicações da WikiLeaks em sua página no
Facebook................................................................................................................................ 141

Figura 23 – Representação gráfica dos dados de compartilhamento nas postagens da
WikiLeaks no Facebook da categoria “Divulgação de conteúdo – Opinativo – interno” em
relação aos dados totais.......................................................................................................... 142

Figura 24 – Reprodução parcial de três postagens na página de Facebook da WikiLeaks,
identificadas na categoria “Divulgação de conteúdo – Opinativo – Interno”........................ 143

Figura 25 – Reprodução parcial de postagem na página de Facebook da WikiLeaks na qual se
vê texto iconográfico, representado pela logomarca da WikiLeaks estilizada, e também texto
escrito e hiperlink................................................................................................................... 147

Figura 26 – Reprodução parcial de postagem na página de Facebook da WikiLeaks sobre
suposta tentativa de extradição de Assange para os EUA..................................................... 150

Figura 27 – Reprodução parcial de postagem na página de Facebook da WikiLeaks que fala
sobre asilo de Assange no Equador........................................................................................ 151

Figura 28 – Reprodução parcial das duas postagem na página de Facebook da WikiLeaks
com maior número de interação............................................................................................. 152

Figura 29 – Reprodução parcial de postagem na página de Facebook da WikiLeaks onde são
apresentados efeitos de saber que buscam comprovar a assertiva de que Assange precisa ser
protegido................................................................................................................................ 153

Figura 30 – Reprodução parcial de duas postagem na página de Facebook da WikiLeaks onde
são apresentadas composições gráficas que demonstram saberes avaliativos do
enunciador.............................................................................................................................. 154
9



                                                          SUMÁRIO


INTRODUÇÃO...................................................................................................................... 11

1. CIBERATIVISMO: FENÔMENO IMANENTE À REDE........................................... 21
   1.1 O CONCEITO DE CIBERATIVISMO........................................................................ 21
   1.2 BREVE HISTÓRICO DO CIBERATIVISMO............................................................ 27
      1.2.1 Das listas de discussão à Desobediência Civil Eletrônica................................. 28
      1.2.2 Zapatistas e as possibilidades do ciberativismo na origem da Web................ 30
      1.2.3 Colapso da primeira Web e a ampliação das mídias digitais.......................... 33
   1.3 TIPOLOGIAS DE CIBERATIVISMO........................................................................ 40

2. INTERNET: AMBIENTE DO CIBERATIVISMO, SÍMBOLO DA SOCIEDADE DE
CONTROLE.......................................................................................................................... 45
   2.1 A CONCEPÇÃO DA REDE DISTRIBUÍDA............................................................. 45
   2.2 PROTOCOLO: O ESTILO DA SOCIEDADE DE CONTROLE............................... 49
   2.3 A BIOPOLÍTICA E O BIOPODER NA ERA DO PROTOCOLO............................. 55
   2.4 O PODER EM REDE................................................................................................... 60

3. SEMIOLINGUÍSTICA..................................................................................................... 66
   3.1 O ATO DE LINGUAGEM COMO ENCENAÇÃO................................................... 68
      3.1.1 Os sujeitos da linguagem..................................................................................... 69
      3.1.2 O duplo processo de semiotização do mundo.................................................... 71
      3.1.3 Contrato de comunicação................................................................................... 73
   3.2 MODOS DE ORGANIZAÇÃO DO DISCURSO....................................................... 77
      3.2.1 Enunciativo........................................................................................................... 77
      3.2.2 Descritivo.............................................................................................................. 78
      3.2.3 Narrativo.............................................................................................................. 78
      3.2.4 Argumentativo..................................................................................................... 79
   3.3 VISADAS DISCURSIVAS........................................................................................ 80
   3.4 O DISCURSO MIDIÁTICO....................................................................................... 82

4. OBJETO E CONSTRUÇÃO METODOLÓGICA......................................................... 86
   4.1 WIKILEAKS: A CONSTRUÇÃO DE UM OBJETO DE ESTUDO
   INTERDISCIPLINAR........................................................................................................ 86
      4.1.1 Colaboração e visibilidade: desvendando as dinâmicas da WikiLeaks.......... 87
   4.2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS.................................................................. 95

5. ANÁLISE DOS CORPORA .......................................................................................... 103
   5.1 PÁGINA INICIAL DO SÍTIO WIKILEAKS.ORG................................................... 104
      5.1.1 O sítio de web como ato de linguagem............................................................. 109
      5.1.2 Nível situacional: o contrato de comunicação em páginas de web................ 110
      5.1.3 Sujeitos do ato de linguagem............................................................................ 114
      5.1.4 Sobre o quê? A semiotização do mundo.......................................................... 117
      5.1.5 Nível discursivo: o espaço do mise-en-scène.................................................... 120
   5.2 “WHAT DOES IT COST TO CHANGE THE WORLD?”............................................ 127
   5.3 PÁGINA DA WIKILEAKS NO FACEBOOK........................................................... 132
      5.3.1 Análise dos dados levantados............................................................................ 134
      5.3.2 Sugestão de Atitude........................................................................................... 135
10



        5.3.3 Comentário Opinativo....................................................................................... 137
        5.3.4 Divulgação de conteúdo..................................................................................... 138
        5.3.5 A resposta do interpretante: os dados de participação/interação nas
        postagens analisadas................................................................................................... 140
        5.3.6 Análise dos textos iconográficos da subcategoria “Divulgação de conteúdo –
        Opinativo – Interno”.................................................................................................. 144

CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................. 156

REFERÊNCIAS................................................................................................................... 161

APÊNDICES......................................................................................................................... 174

ANEXOS............................................................................................................................... 196
11



INTRODUÇÃO


       Como enfatizou Walter J. Ong (1998), as tecnologias nunca são recursos
essencialmente externos à condição humana. Ao contrário, elas representam aplicações
pragmáticas de transformações da consciência interior ao ser humano. Ou melhor, como
propõe Neil Postman (1998), as tecnologias carregam consigo as formas filosóficas de
interpretação do mundo nas quais foram forjadas. Assim, assumindo essa perspectiva
ecológica de abordagem da mídia, o presente estudo, que tem como tema o discurso no
ciberativismo, presume que as mudanças nas práticas sociais aqui enquadradas não advêm da
adição de uma nova tecnologia, mas sim da interação dos atores sociais com estes meios,
moldando tanto a cultura de ativismo, quanto o próprio meio tecnológico de ação, a internet.
       Por isso, ao abordar, mais especificamente, as construções discursivas no
ciberativismo praticado pela organização WikiLeaks, o fazemos considerando esta prática
imanente às redes temáticas como a internet, em uma perspectiva que a compreende também
como fator de mutação tecnológica. É sob esta ótica que observamos as ações que tornaram
esta organização mundialmente conhecida. Seus “vazamentos”, como nomearam a divulgação
de documentos, tornaram público, por exemplo, um grande volume de informações
consideradas sigilosas pelo governo norte-americano.
       Apesar de sua fama ter se espalhado pelo mundo inteiro, tornando-se assunto
recorrente na cobertura midiática, poucos são os fatos aceitos unanimemente sobre a história
da WikiLeaks. Mesmo o sítio da organização, repleto de informações sobre seus vazamentos,
apresenta dados limitados sobre sua trajetória, organização interna e identidade dos
integrantes.
       Sabe-se que a origem desta organização é baseada na figura do ativista australiano
Julian Assange. Hacker de reconhecida reputação entre seus pares, Assange tornou-se um
ativista da livre informação, intitulando-se, por diversas vezes, como jornalista investigativo.
Capa de quase todos os grandes periódicos do mundo (revistas como Time, Rolling Stone,
Forbes, etc), além de criador, Assange tornou-se também a figura pública da WikiLeaks.
       A primeira versão do sítio da organização foi colocada na rede no fim de 2006.
Conforme os primeiros textos disponíveis neste espaço, o objetivo inicial era ser uma
enciclopédia de documentos censurados, em que todos seriam editores, ao estilo consagrado
pela Wikipédia. O foco inicial de ação seriam os regimes opressores na Ásia, África e países
do desfeito bloco soviético. “A WikiLeaks irá proporcionar um fórum para toda a comunidade
global examinar a credibilidade, plausibilidade, veracidade e falsidade de qualquer
12



documento”1 (WIKILEAKS, 2007, online, tradução nossa). Todo o material recebido pela
WikiLeaks seria vazado e a avaliação da veracidade seria feita por qualquer um que se
interessasse pela iniciativa, colaborativamente. Na prática, o modelo de colaboração aberta da
WikiLeaks não teve êxito e acabou nunca funcionando.
        As consequências do que podemos chamar de “efeito WikiLeaks” podem ser notadas
em diversos aspectos políticos, sociais e tecnológicos, observando a questão de um ponto de
vista geral. O mais evidente está relacionado ao conteúdo dos documentos divulgados por esta
organização. Entre os vazamentos mais destacados pela mídia institucional, por exemplo, está
a divulgação de um vídeo gravado durante uma ação norte-americana no Iraque, onde um
helicóptero modelo Apache bombardeia uma região urbana e mata mais de uma dezena de
civis. Entre eles, dois funcionários da agência de notícias Reuters.
          Sob o slogan “Nós abrimos governos”2, em 28 de novembro de 2010, a organização
divulgou documentos confidenciais da diplomacia norte-americana. Intitulado pela WikiLeaks
como o maior vazamento de documentos confidenciais da história, o fato ganhou o nome de
Cablegate3. Segundo a WikiLeaks (2010), no total são 251.287 documentos, sendo 15.652
classificados como secretos e 101.748 como confidenciais, que datam de 1966 até o final de
fevereiro de 2010 e abrangem comunicações entre 274 embaixadas em países de todo o
mundo e do próprio Departamento de Estado em Washington.
        Tais fatos, além de causarem imensa repercussão na mídia internacional, levaram o
governo norte-americano a tomar uma série de medidas contra a WikiLeaks, como ações
judiciais, bloqueio do acesso ao sítio da organização em órgãos públicos e a prisão do soldado
analista de inteligência, Bradley Manning, acusado de ser o responsável por repassar
documentos confidenciais à WikiLeaks. Além destas repercussões diretas, o conteúdo dos
vazamentos também causou reações em diversas partes do mundo, afetando as relações da
diplomacia norte-americana. Conforme Trevor Timm (2011), ativista do Electronic Frontier
Foundation, algumas das informações divulgadas neste vazamento influenciaram diretamente,
por exemplo, na Revolução de Jasmim, manifestações insurrecionais na Tunísia, que
causaram a queda do presidente Zine el-Abidine Ben Ali, no poder desde 1987.


1
  Texto original: “Wikileaks Will provide a forum for the entire global community to examine any document for
credibility, plausibility, veracity and falsifiability”.
2
  O texto original é “We open governments”.
3
  O nome Cablegate faz alusão ao episódio de “Watergate”, deflagrado por jornalistas do Washington Post, que
causou a renúncia do presidente norte-americano da época, Richard Nixon, por envolvimento em esquemas de
corrupção (MARCONDES FILHO, 1989). Thompson (2002, p. 239) considera que o ‘Watergate’ “adquiriu um
tipo de status paradigmático, tornando-se ponto de referência (exemplificado pelo uso disseminado do sufixo
gate) para muitos escândalos subseqüentes”.
13



                           Nos estágios iniciais dos protestos políticos de massa na Tunísia, o influente grupo
                           de blogueiros tunisianos Nawaat criou um site chamado Tunileaks e divulgou
                           amplamente os telegramas para os cidadãos do país. Os telegramas confirmaram que
                           os EUA viam o Presidente tunisiano Ben Ali como um tirano corrupto e brutal, o
                           que acendeu as chamas da revolução que já estava inflamada. A Amnistia
                           Internacional creditou a WikiLeaks e seus parceiros na mídia como "catalisadores"
                           do movimento que derrubou Ali (TIMM, 2011, online, tradução nossa)4.

        Assim como na Tunísia, Timm (2011) considera que os telegramas divulgados tiveram
influência evidente na política de países em convulsão social como Líbia, Paquistão, Iêmem,
Egito e Iraque. Na América Latina, além da repercussão direta dos telegramas pela mídia
institucional, podemos apontar com destaque o livro “Wiki Media Leaks”, dos jornalistas
argentinos Martín Becerra e Sebastián Lancunza (2012). Nesta publicação, os autores buscam
construir, a partir dos telegramas divulgados pela WikiLeaks, uma espécie de radiografia das
relações entre mídia e os governos em países latino-americanos:

                           Como os despachos diplomáticos se concentram especialmente no período de 2004-
                           2009, o material liberado proporciona uma excelente oportunidade para analisar a
                           perspectiva que, a partir dos EUA, se constrói sobre a nova e heterogênea realidade
                           político a econômica da América Latina. Fica exposta uma irresistível trama a ser
                           contada, apesar de que, alguns “diques”5 vinculados aos meios de comunicação têm
                           resistido ao bombardeio de informações com extraordinária eficiência (BECERRA,
                           LANCUNZA, 2012, p. 7, tradução nossa, grifo dos autores). 6

        Desta forma, no campo da diplomacia e relações internacionais, esses vazamentos
foram recebidos como uma “bomba” que ameaça reconfigurar não só o fazer da diplomacia,
mas também a construção histórica a partir dela, como defende o diplomata brasileiro e doutor
em ciências sociais, Paulo Roberto de Almeida (2011). Segundo ele, esses vazamentos
tendem a fazer com que as informações sobre relações diplomáticas se tornem de mais difícil
acesso, dificultando o trabalho de historiadores e jornalistas.
        A relação desta organização com o campo midiático também faz parte do nomeado
“efeito WikiLeaks”. Através de parceria com grandes conglomerados de mídia como The
New York Times, The Guardian, Le Monde, Al Jazeera e Der Spiegel, entre outros, os
vazamentos realizados pela organização alcançaram maior visibilidade, colocando os assuntos

4
  Texto original: “In the early stages of mass political protests in Tunisia, Nawaat—the influential Tunisian
blogging group—set up a website called Tunileaks and widely distributed the cables to Tunisian citizens. The
cables confirmed that the U.S. viewed Tunisian President Ben Ali as a corrupt and brutal tyrant and fanned the
flames of the already smoldering revolution. Amnesty International would credit WikiLeaks and its media
partners as ‘catalysts’ in the people’s successful ouster of Ali”.
5
  Este termo apresenta um uso figurado, no sentido de ‘reserva de informação’, ao invés do seu sentido literal
como mecanismo para represar águas correntes.
6
  Texto original: “Como los despachos diplomáticos se concentran especialmente en el lapso 2004-2009, el
material liberado brinda una magnífica oportunidad para analizar la perspectiva que, desde Estados Unidos, se
construye sobre la novedosa y heterogénea realidad política y económica de América Latina. Queda expuesta
una trama irresistible a ser contada, pese a lo cual, algunos diques vinculados a los medios de comunicación
han resistido el aluvión de información con extraordinaria eficacia”.
14



na cobertura jornalística de âmbito internacional. Conforme levantamento publicado no sítio
da revista norte-americana The Atlantic Wire (2011), até 25 de abril de 2011 metade dos
assuntos tratados no The New York Times naquele ano se baseavam em documentos vazados
pela WikiLeaks. O fato da associação de vários conglomerados de informação em torno de
uma organização de mídia independente é algo novo na história dos meios de comunicação.
        Outro reflexo observado no campo da mídia é a apropriação do formato popularizado
por esta organização. É o caso do Wall Street Journal que lançou o sítio “Safehouse” que,
assim como a WikiLeaks, é uma plataforma em rede de submissão de documentos e
informações com a garantia do anonimato à fonte. No Brasil, o jornal Folha de São Paulo
apropriou-se inclusive de parte do nome da organização e criou o “Folhaleaks”.
        Outras iniciativas fora do campo das mídias institucionalizadas também replicam o
modelo consagrado pela WikiLeaks, como o caso do Openleaks, sítio criado por dissidentes
da WikiLeaks e que tem como objetivo oferecer uma plataforma segura de submissão de
documentos a organizações não-governamentais. No Brasil, um sítio denominado WikiLeaks
Brasil, aparentemente sem ligação com a organização capitaneada pelo australiano Julian
Assange, mas uma espécie de homenagem, vazou no início de 2011 dados sigilosos sobre a
Operação Satiagraha7, na qual o banqueiro Daniel Dantas foi preso pela Polícia Federal.
        A grande repercussão na mídia internacional é comprovada por pesquisa realizada no
primeiro semestre de 2011 pelo instituto Ipsos, na qual 79% da amostra de cidadãos
entrevistados já ouviram falar da WikiLeaks. A pesquisa, realizada em 24 países e com uma
amostra de 18.829 adultos de 16 a 64 anos, demonstrou que no Brasil 54% afirmaram já ter
ouvido falar da organização (IPSOS, 2011). Já em países como Suécia, Índia, Turquia,
Austrália, Inglaterra, o índice fica acima dos 90%. Sobre o posicionamento dos entrevistados
em relação às ações da WikiLeaks, 74% da amostra se diz a favor da organização. No Brasil,
este número chega a 78%. Já nos Estados Unidos, apenas 34% apoiam a WikiLeaks.
        Da mesma forma, em sondagem aplicada no 12° Fórum Internacional do Software
Livre (FISL)8, realizado na PUC-RS, em Porto Alegre, de 29 de junho a dois de julho de
2011, constatou-se que mais de 70% das 61 pessoas escolhidas, por acessibilidade não
probabilística, para responder ao questionário, conheceram a WikiLeaks por empresas de
comunicação, ou seja, através da mídia institucionalizada ou por sítios de conteúdos


7
  Operação da Polícia Federal brasileira realizada em de julho de 2008. Foram presas mais de 20 pessoas
acusadas de crimes financeiros, como lavagem de dinheiro, gestão fraudulenta, evasão de divisas e formação de
quadrilha (G1, 2008).
8
  Os dados completos podem ser conferidos no apêndice A.
15



noticiosos9. Entretanto, dos mais de 45% que afirmaram acompanhar informações sobre a
WikiLeaks frequentemente, 60% o fazem através de blogs ou sítios colaborativos10.
        É possível depreender destas estatísticas a importância da mídia institucionalizada na
popularização da WikiLeaks. Em contrapartida, os dados também apontam que, entre a
amostra determinada, boa parte do acompanhamento das informações sobre a organização se
dá fora do eixo midiático tradicional. A amostra desta sondagem, como referido, foi composta
aleatoriamente e é formada predominantemente por profissionais e estudantes da área de
tecnologia da informação, de diversas nacionalidades, sendo que mais de 80% respondeu ter
entre 21 e 35 anos de idade.
        Sobre a imagem que a organização detém, mais de 80% da amostra disse ter uma visão
positiva, 18% afirmaram ser indiferentes e apenas 1,6% disse ter uma visão negativa da
organização. Outro dado interessante desta sondagem é que mais de 80% da amostra se disse
disposta a colaborar com a WikiLeaks e 54% fariam algum tipo de doação à organização. Os
dados citados apontam que, dentro da referida amostra, a organização goza de boa imagem, a
ponto de alcançar um elevado número de possíveis colaboradores. A colaboração é um dos
pilares das ações diretas (realizadas por ela própria) e indiretas (manifestações de apoio) da
WikiLeaks.
        Quando questionados sobre quais termos melhor qualificariam as ações realizadas pela
organização, “liberdade de informação” foi marcado em 80% dos questionários,
“ciberativismo” em 29%, “jornalismo” também em 29%, “hackativismo” em 18% e
“espetacularização” em menos de 5%. O termo “crime”, que também estava disponível no
questionário de múltipla escolha, não foi assinalado. Esses dados mostram uma associação
muito forte do nome da organização com o termo abstrato de “liberdade de informação”.
        Tal assertiva também pode ser observada nas vozes sociais captadas pelos noticiários.
Duas figuras representativas da política brasileira utilizaram o nome da organização para
ilustrar “divulgação de documentos sigilosos”. Em 14 de junho de 2011, o presidente do
Senado brasileiro, José Sarney, ao se posicionar contra a Lei de Acesso à Informação Pública,
afirmou: “Acho que nós não podemos fazer o WikiLeaks da história do Brasil, da construção
das nossas fronteiras” (BONIN, 2011, online).
         Tratando sobre esse assunto, o ex-presidente da República e atual senador pelo estado
de Alagoas, Fernando Collor, declarou da tribuna do Parlamento em 22 de agosto de 2011:


9
 O questionário aplicado pode ser consultado no apêndice B.
10
  Publicações na rede desvinculadas e alternativas aos grandes portais noticiosos, geralmente alimentadas por
um ou mais indivíduos.
16



“Trata-se, na prática, de uma espécie de oficialização do WikiLeaks, com todos os seus
inconvenientes e perigos, inclusive diante de possíveis e prováveis ações de hackers”
(SENADO FEDERAL, 2011, online). Os dois trechos reproduzidos demonstram uma
consonância com os dados da amostra da sondagem, apesar de suas motivações parecerem
opostas.
           No caso das afirmações de Collor e Sarney, a utilização do termo carrega um tom
pejorativo. Entretanto, tais dados demonstram uma possível cristalização da associação entre
vazamentos de documentos e a organização WikiLeaks. No caso da amostra da sondagem,
esta associação também está diretamente ligada ao potencial de colaboração, demonstrando
uma visão positiva ao associar majoritariamente a organização com o termo abstrato
“liberdade de informação”.
           Outro reflexo evidente do “efeito WikiLeaks” é a popularização de mobilizações
ciberativistas descentralizadas, diversas delas em apoio à organização11. A Revista Info
(2011) afirmou que a onda de ataques a sites por grupos determinados, que teve seu auge no
meio de 2011, começou em 2010 com a prisão de Assange. O grupo de difícil definição
autointitulado “Anonymous”12 realizou uma série de ataques em favor da WikiLeaks. Os
alvos principais foram entidades financeiras como PayPal, Visa e MasterCard, que
bloquearam as contas da WikiLeaks, inviabilizando as doações que mantêm a organização.
           O “Anonymous” surgiu e passou a atuar antes da WikiLeaks ganhar notoriedade no
cenário internacional. Entretanto, segundo a Revista Info (2011), após os acontecimentos com
a WikiLeaks o grupo passou a ter um posicionamento mais político. No Brasil, estas
manifestações encontraram principal alvo nos sites governamentais e tiveram autoria
assumida pelo grupo LulzSec Brasil. Não se pode fazer uma ligação direta entre estas
manifestações, que atingiram diversas partes do mundo, e as ações da WikiLeaks, mas é
evidente que este tipo de ciberativismo ganhou notoriedade e se popularizou com os protestos
em favor da organização comandada por Julian Assange.
           Estas três faces do que optamos por chamar de “efeito WikiLeaks” demonstram a
importância deste objeto de pesquisa. Trata-se de uma problemática nova e complexa,
exigindo do pesquisador maior cuidado ao abordá-la. De outra maneira, acreditamos que este
estudo, ao analisar um tipo emergente de prática social, pode contribuir com construções
teóricas que venham a fomentar o crescente debate em torno do ciberativismo dentro do



11
     Esta relação será melhor abordada no primeiro e quarto capítulos.
12
     A relação entre WikiLeaks e Anonymous é melhor definida no item 4.1.1, do quarto capítulo.
17



campo da cibercultura. Campo este que se expandiu na última década, alcançando
legitimidade na pesquisa brasileira (AMARAL; MONTARDO, 2012).
       Acreditamos que a contribuição do nosso estudo pode ser mais efetiva ao tratar da
dimensão do discurso nas práticas ciberativistas, abordagem pouco realizada na pesquisa
brasileira sobre o tema. Esse fato foi constatado em levantamento do estado da arte da
pesquisa sobre ciberativismo no Brasil, realizado com o objetivo de mapear as características
deste campo de estudo (ARAÚJO, 2011). Após a análise de conteúdo de três grandes bases de
dados da pesquisa brasileira, constatou-se a predominância de trabalhos com área de origem
no campo da comunicação (ARAÚJO, 2011), tendência em boa parte do campo da
cibercultura, como constatam Amaral e Montardo (2012). Quanto ao período de produção dos
trabalhos, 18,2% foram elaborados entre 2000 e 2003, 45,5% entre 2004 e 2007 e 36,3% entre
2008 e 2010 (AMARAL; MONTARDO, 2012). As porcentagens mostram que realmente o
início e a consolidação da pesquisa em ciberativismo se deram na primeira década do século
XXI, período estudado no levantamento do estado da arte desta pesquisa.
       Em relação ao objeto de pesquisa dos trabalhos analisados, elaboraram-se seis
categorias de acordo com as abordagens realizadas. A maior parte abordou iniciativas
ciberativistas pelas suas ferramentas. Pelo menos oito trabalhos realizaram esta abordagem,
como, por exemplo, o estudo da utilização ciberativista do YouTube (ANTOUN, 2001;
PIMENTA, 2004; RIGITANO, 2004; PIMENTA, SOARES, 2006; DOMINGUES, 2007;
BRESSAN, 2007; ROSAS, 2008). Em seguida, aparecem os trabalhos que estudaram a
utilização da rede por organizações pré-internet (CAMPOS, 2006; PIMENTA, RIVELLO,
2008; FONSECA, 2009; MARZOCHI, 2009) e as discussões teóricas sobre ciberativismo,
cada uma das categorias com quatro trabalhos (BRETAS, 2005; SELAIMEN, 2009;
GUIMARÃES, 2006; PIMENTA, 2005). O estudo de mobilizações específicas, como
protestos e campanhas, representou três trabalhos (CAVALCANTI, 2002; LORENA, 2007;
CAPUTO, 2008), enquanto sobre o estudo das organizações comunitárias ativistas foram
encontrados dois trabalhos (SCHWINGEL, 2003; FREIRE, 2007). O estudo do discurso
ciberativista representou apenas um trabalho (CARVALHO, 2002).
       Os dados encontrados no referido levantamento estão em consonância com as
afirmações de Amaral e Montardo (2010), em estudo exploratório comparativo sobre a
produção científica em cibercultura no Brasil e nos Estados Unidos. Uma das categorias
estudadas foi justamente o ciberativismo. A pesquisa registrou que no corpus de análise
brasileiro foi encontrado um número pequeno e decrescente de artigos sobre o ciberativismo.
No entanto, no corpus de análise de caráter internacional, houve um crescimento significativo
18



de publicações sobre o tema, tornando-se a categoria mais abordada pelos artigos entre os
anos de 2007 e 2009. Segundo as autoras, a razão de tal crescimento pode se dar “em função
das discussões acerca das políticas das tecnologias de comunicação e seu potencial de
democratização ou não” (AMARAL E MONTARDO, 2010, p. 70).
       De outra forma, em estudo recente, em que analisaram as produções científicas nos
quatro anos do Simpósio da Associação Brasileira dos pesquisadores em Cibercultura, Amaral
e Montardo (2012) identificaram um número constante e crescente de artigos sobre
ciberativismo, de diversas áreas do conhecimento.
       Diante do panorama exposto pelos dados encontrados no levantamento citado
(ARAÚJO, 2011) e nos estudos de Amaral e Montardo (2010, 2011, 2012), são possíveis
algumas inferências sobre a pesquisa em ciberativismo no Brasil. Apesar de representar um
número relevante de trabalhos, acreditamos que a produção brasileira sobre o tema está
abaixo do nível constatado no panorama internacional. Parte significativa dos trabalhos
estudados é produzida por pesquisadores já consagrados na temática, demonstrando pouca
renovação e pouco surgimento de novos pesquisadores no assunto. Também nota-se, na
maioria dos trabalhos, fraco debate sobre o conceito de ciberativismo, consagrando uma ideia
comum, mas não problematizada. Cabem também aqui, como justificativas para realização do
presente estudo, as motivações pessoais do pesquisador, que se interessa pelas novas
dinâmicas comunicacionais proporcionadas pela popularização do suporte digital. Tal
interesse se dá desde o trabalho de conclusão do curso de jornalismo, apresentado em
dezembro de 2008 na Universidade Federal de Santa Maria, em que estudou os blogs,
propondo um roteiro de análise baseado na sistematização das ferramentas deste tipo de mídia
digital (ARAÚJO, 2009).
       Por fim, acreditamos que o presente estudo contempla características importantes do
Mestrado em Processos e Manifestações Culturais, como a interdisciplinaridade e a inovação.
A interdisciplinaridade está presente na intersecção de abordagens das ciências sociais
aplicadas com a linguística, através da análise do discurso de base semiolinguística,
procedimento essencialmente interdisciplinar, importante para o desenvolvimento deste
estudo. Da mesma forma, a inovação, caracterizada no estudo através da escolha do objeto e
do ciberativismo como temática de abordagem. Pensamos que nosso estudo pode contribuir
com o campo do ciberativismo, estando de acordo com o objetivo principal de um programa
de pós-graduação, que é fomentar o avanço da ciência através das produções discentes.
       Além disso, consideramos que este estudo está de acordo com a linha de pesquisa em
“Linguagens e processos comunicacionais”, que tem como principal objetivo investigar os
19



fenômenos culturais por meio das linguagens, principalmente das mídias contemporâneas e
das tecnologias da informação e da comunicação. Assim, este estudo, ao deter-se sobre a
utilização do discurso como prática de um fenômeno típico da cibercultura, como o
ciberativismo, encontra-se de acordo com sua linha de pesquisa.
       Então, após listar as justificativas que conduzem este estudo, apresentamos como
objetivo geral analisar de que maneira a organização WikiLeaks constrói seus discursos em
suas ações ciberativistas. Da mesma maneira, buscamos como objetivos específicos
compreender qual o papel do discurso no ciberativismo, tendo a internet como situação
extralinguística; apontar como se dá a encenação discursiva no âmbito da organização
WikiLeaks; e, por fim, discutir e problematizar o conceito de ciberativismo, no sentido de
apontar uma proposição adequada deste fenômeno social, conforme o nosso entendimento.
       Em relação às escolhas metodológicas, como já é claro, esta se trata de um estudo
qualitativo. Optamos por uma perspectiva descritiva composta por três fases integradas de
estudo. Inicialmente, partimos ao estudo bibliográfico (construído pelo levantamento do
estado da arte da pesquisa em ciberativismo e construção do aporto teórico) e às sondagens
empíricas do objeto de pesquisa (pela observação de suas diversas facetas e da sondagem
realizada no 12° Fórum Internacional do Software Livre (FISL), citada neste item
introdutório).
       Em um segundo momento, passamos a seleção intencional do corpus de estudo, onde
foram escolhidas três unidades de análise, que são a página inicial do sítio da WikiLeaks,
durante o mês de maio de 2012; a produção audiovisual “What Does it Cost to Change the
World?” publicada no sítio Vímeo; e a página no Facebook da organização. Para esta última,
em virtude da abundância de possíveis textos a serem analisados, optamos pela aplicação da
metodologia Teoria Fundamentada, buscando criar categorias e assim identificar que
construções discursivas mais acrescentariam a este estudo.
       Por fim, passamos ao estudo dos dados coletados, que é conduzido pela análise do
discurso de base semiolínguística e das demais categorias teóricas que serão apresentadas nos
três primeiros capítulos.
       O primeiro capítulo deste estudo representa uma reflexão sobre os conceitos de
ciberativismo. Ao final do primeiro item deste capítulo, propomos uma conceituação de
ciberativismo baseada na intersecção de diversos conceitos. Também realizamos neste
capítulo uma retomada histórica das ações ciberativistas, agrupando-as em quatro grandes
momentos demarcados pela própria história da internet. Por fim, trazemos as principais
tipologias deste objeto de estudo.
20



       Após considerarmos o ciberativismo como fenômeno social imanente à internet,
apresentamos o surgimento e o desenvolvimento desta tecnologia, com o objetivo de
compreender como se tornou uma rede sem centro, distribuída, que ao mesmo tempo em que
diminui as hierarquias, impõe uma regulação nunca antes vista. Abordamos neste capítulo os
conceitos de protocolo, de acordo com os estudos de Alexander Galloway (2004, 2007, 2010).
Ao tentar compreender como o controle se exerce ao ciberativismo, passamos a discussão dos
conceitos de biopoder e biopolítica diante dos novos aparatos de controle, a partir de
Galloway (2004), em uma perspectiva foucaultiana. Após estabelecer esta discussão,
apresentamos a reinterpretação do conceito de biopolítica por Hardt (2005) correlacionando-o
com o ciberativismo.
       Por fim, apresentamos a concepção de poder em rede para Castells (2009) que, a partir
do entendimento de que o formato estrutural da rede passa a permear as formas de
organização social, considera que as formas de poder estão nas capacidades de
criação/programação de redes e a conexão entre elas.
       O terceiro capítulo apresenta a semiolinguística, como disciplina de estudo do discurso
que compreende o dito como um arranjo entre vozes sociais e intencionalidade individual
(CHARAUDEAU, 2004, 2005, 2006, 2008, 2010; BARBISAN et al., 2010; MACHADO,
1996, 1998, 2001; FREITAS, 2009). Desta forma, apresentamos as principais construções
conceituais referentes à semiolinguística, como o ato de linguagem, o contrato de
comunicação, as visadas discursivas, os modos de organização do discurso, o discurso das
mídias, etc.
       No quarto capítulo, o objeto de estudo é apresentado através de uma revisão
bibliográfica e aproximação das categorias teóricas conceituadas nos itens anteriores. Neste
capítulo detalhamos os pressupostos metodológicos deste estudo. Por fim, no quinto capítulo
apresentamos a análise dos corpora de estudo. Após esta análise dos dados, são feitas as
considerações finais da presente pesquisa, norteadas pelo seu objetivo geral e em função das
categorias teóricas apresentadas nos três primeiros capítulos.
21



1. CIBERATIVISMO: FENÔMENO IMANENTE À REDE


         Imbuídos da perspectiva ecológica de pensamento sobre a relação do ser humano com
seus artefatos tecnológicos, consideramos o ativismo como fenômeno social imanente às
redes telemáticas como a internet. Como bem coloca Sérgio Amadeu da Silveira (2010, p.
31), o ativismo “influenciou decisivamente grande parte da dinâmica e das definições sobre os
principais protocolos de comunicação utilizados na conformação da Internet”. Isto é, prática
social e tecnologia se entrelaçam em uma relação de mutua influência, como veremos ao
longo deste capítulo.
         Ao tratá-lo como fenômeno social emergente, mas imanente ao processo que deu
origem a internet, buscamos neste capítulo conceituar exatamente o que compreendemos
como ciberativismo. Apresentamos diversos entendimentos em relação a esse fenômeno
social, condensando, ao fim, uma proposta adequada a este estudo. Para compreender seu
surgimento, assim como os reflexos de suas práticas na evolução da rede, realizamos um
apanhado histórico das principais expressões do ciberativismo. Por fim, apresentamos as
variadas tipologias desse fenômeno social.
         Antes de iniciarmos a discussão sobre o conceito de ciberativismo, é importante
considerar que em nenhum momento a organização objeto deste estudo, a WikiLeaks, se
autointitulou como ciberativista, preferindo predicados como “organização não profissional
de mídia”. Entretanto, ao refletir sobre a definição do que consideramos como ciberativismo,
exposta ao longo deste capítulo, observamos nas ações da WikiLeaks pontos relevantes para a
análise proposta, principalmente em relação à construção coletiva da visibilidade de suas
ações.


1.1 O CONCEITO DE CIBERATIVISMO


         A definição sobre que práticas designa o termo ciberativismo não encontra construção
teórica consolidada no campo de estudos da cibercultura. Apesar do atual crescente número
de trabalhos sobre este tema (AMARAL, MONTARDO, 2012), não é grande o número de
autores que se detêm de alguma forma na discussão do que consideram como ativismo em
rede, webativismo, netativismo ou ciberativismo (termos, neste estudo, adotados como
sinônimos) (ARAÚJO, 2011).
         É possível considerar que um dos entendimentos sobre ciberativismo mais difundido é
o encontrado na obra de McCaughey e Ayers (2003 apud RIGITANO, 2005), que o
22



consideram como a presença do ativismo político na internet. Entretanto, como assevera
Silveira (2010), com a expansão e complexificação do uso da internet – ampliando
possibilidades de atuação em rede –, o leque de causas defendidas, assim como as formas de
apropriação dessas possibilidades, reconfiguram-se e se expandem.
           Por isso, consideramos limitada a compreensão do ciberativismo como a manifestação
do ativismo político através da internet. Esse entendimento traz consigo uma separação entre
práticas sociais online e offline. Ou seja, considera as práticas do ciberativismo como apenas a
migração de fenômenos sociais para as novas formas de comunicação em rede e não a
ressignificação dessas práticas, diante da apropriação realizada pelos atores sociais. Esta
concepção é característica do princípio dos estudos qualitativos sobre a internet, como
retomam Adriana Amaral, Suely Fragoso e Raquel Recuero (2011).
           Conforme já apresentado no princípio deste capítulo, Silveira (2010, p. 31) observa o
ciberativismo na conformação da internet, influenciando decisivamente as definições técnicas
e sociais que a tornaram o que conhecemos hoje. A definição de ciberativismo usada por
Silveira (2010) identifica-o como o conjunto de práticas realizadas em redes cibernéticas em
defesa de causas específicas, sejam elas políticas, ambientais, sociotécnicas, etc. A
abrangência desta conceituação mostra a relevante preocupação de Silveira (2010) em
reconhecer a pluralidade de expressões desta prática, principalmente diante do atual espectro
ideológico, que não mais proporciona definições estanques, como no mundo industrial
(SILVEIRA, 2010).
           Ao colocar o ciberativismo na gênese da própria internet, Silveira (2009, p. 104) se
refere ao processo peculiar que deu origem ao modelo não proprietário pelo qual a
conhecemos atualmente, principalmente por ter sido construída

                             colaborativamente por grupos de voluntários que no decorrer de sua história foram
                             envolvendo, além dos acadêmicos e hackers, engenheiros e especialistas de várias
                             empresas, para construírem os elementos fundamentais do funcionamento da rede, a
                             saber, os seus protocolos de comunicação.

           As características do modelo pelo qual se constitui a internet são justamente o que
proporciona o poder comunicativo que serve ao ciberativismo. Como coloca Silveira (2011a)
em texto posterior, ao mesmo tempo em que o modelo trazido pela internet representa um
grande arranjo de técnicas de controle, apontado como símbolo máximo do patamar social
chamado por Gilles Deleuze (1992) de “Sociedade de controle”13, provê a expansão do poder
comunicacional através da grande interatividade, velocidade e dispersão da comunicação.

13
     Conteúdo melhor explicado no segundo capítulo.
23



Com isso, o ciberativismo age pela utilização radical de possibilidades como as redes
distribuídas, o anonimato, e o novo campo de visibilidade social pela comunicação em rede.
        Esse posicionamento de Silveira (2011a) em relação à tensão entre controle e
liberdade no ciberativismo é semelhante ao apresentado por Henrique Antoun e Fábio Malini
(2010, 2012). Esses autores compreendem a internet como um campo social em que a
liberdade é disputada e que atuação social, mobilização e engajamentos são valores inerente à
rede. Esta liberdade é considerada, pragmaticamente, como os mecanismos e atos autônomos
de cooperação através da rede.
        O que optamos chamar neste trabalho de ciberativismo é tratado por Antoun e Malini
(2010) como a biopolítica da rede, em contraposição ao biopoder, como será melhor abordado
no próximo capítulo. Esse posicionamento remete à reinvenção do conceito de Michel
Foucault por Antonio Negri e o seu aprimoramento por autores posteriores.
        Essa biopolítica evocada por Antoun e Malini (2010) configura-se como a capacidade
da vida governar-se. Ou seja, ela se exerce como uma liberdade positiva na atividade dos
usuários ao construírem de forma singular um campo mais extenso de significados dos
acontecimentos sociais. Isso se entrelaça com novas narrativas que esmiúçam fatos, ideias,
dados, imagens, que ampliam a capacidade da rede de revelar sentidos que até então eram
negociados na lógica do gatekeeper14 da mídia tradicional (ANTOUN; MALINI, 2010).
        Nesta perspectiva, a biopolítica da rede constitui-se como a forma pela qual
manifestações autônomas conseguem exceder os controles e bloqueios da rede (ANTOUN;
MALINI, 2010). Em outras palavras, a biopolítica consiste em fazer uma utilização ativista da
internet, colocando suas ferramentas a favor de disputas travadas neste suporte.
        Apesar de não trabalhar com o termo ciberativismo, a obra de Manuel Castells (1999;
2001; 2003; 2009) é repleta de apontamentos relevantes sobre a utilização da tecnologia em
disputas sociais. Castells (2003) aborda tal utilização pelo viés dos movimentos sociais,
considerando suas mudanças até o momento em que conceitua como “sociedade em rede”15.
A noção de “ativista” como um indivíduo engajado em uma disputa simbólica é contemplada
na obra de Castells (2003), principalmente ao se referir aos movimentos mais recentes.
        Em sua obra “O poder da identidade”, Castells (2001) detalha melhor as características
dos movimentos sociais em atividade no que chama de sociedade em rede. Ao desenhar

14
   Termo largamente usado nos estudos de comunicação para caracterizar a edição dos meios de comunicação de
massa, a escolha do que será veiculado. Segundo Nelson Traquina (1999), o termo foi criado pelo psicólogo Kurt
Lewin, em artigo de 1947. Entretanto, sua aproximação com o campo da comunicação se deve a David Manning
White (TRAQUINA, 1999).
15
   Tal definição será apresentada no item 2.4 do próximo capítulo.
24



conceitualmente o panorama desse novo estágio social, Castells (2001) salienta a premência
da identidade como principal significado em um contexto de desestruturação de instituições e
de manifestações culturais marcadas pela efemeridade. Esse diagnóstico também é
apresentado por Stuart Hall (1999): ele aponta um processo de enfraquecimento das velhas
identidades e o surgimento de novas que fragmentam o antes unificado indivíduo moderno. A
partir disto, as identidades passam a ser construídas pelos indivíduos ao longo de suas vidas.
       Compreender o panorama das identidades no atual estágio social é fundamental para o
entendimento da lógica dos movimentos ciberativistas. Conforme lembra Castells (2001), é
através das práticas, principalmente das práticas discursivas, que estes movimentos constroem
sua autodefinição, ou seja, sua identidade a ser compartilhada entre seus apoiadores.
       Diante disto, Castells (2001) propõe como método de análise destes movimentos a
utilização das categorias da tipologia clássica de Alain Touraine, que já na década de 1970 as
definiu baseada em três fatores principais:

                        identidade do movimento, o adversário do movimento e a visão ou modelo social do
                        movimento, que aqui denomino como meta societal. Em minha adaptação (que
                        acredito estar coerente com a teoria de Touraine), identidade refere-se à
                        autodefinição do movimento, sobre o que ele é, e em nome de quem se pronuncia.
                        [...] Meta societal refere-se à visão do movimento sobre o tipo de ordem ou
                        organização social que almeja no horizonte histórico da ação coletiva que promove
                        (CASTELLS, 2001, p. 95).

       Essa tipologia utilizada por Castells (2001) propõe uma análise totalmente calcada nas
construções discursivas destes movimentos. Seja diante da construção de sua máscara
discursiva (autodefinição, identidade) (CHARAUDEAU, 2008), de sua meta de mudança
social ou mesmo pela afirmação do adversário do movimento. Todas essas categorias de
análise retomadas por Castells (2001) podem ser identificadas através da análise das
construções discursivas desses movimentos ciberativistas.
       A definição proposta por Castells (2001) se baseia em um método de estudos de
grupos organizados, principalmente os denominados movimentos sociais. Entretanto, ao
abordar o ciberativismo, vê-se um espectro mais amplo e complexo de formas de mobilização.
Isto pode fazer com que as categorias propostas por Castells (2001) não se apliquem a
determinados movimentos ciberativistas.
       David de Ugarte (2008), em seu livro “O poder das redes”, caracteriza as novas
tecnologias de comunicação como protagonistas de uma mudança de estrutura de poder. Para
o autor (2008), a abertura do polo de emissão no ciberespaço cria um meio global de
comunicação capaz de suplantar a edição da mídia institucionalizada, o gatekeeping. É
marcada na obra do autor a ideia de que a internet devolve aos indivíduos um poder
25



comunicacional monopolizado pela comunicação de massa. Na sua concepção de
ciberativismo, Ugarte (2008) enfatiza-o como uma disputa por visibilidade social, facilitada
pela popularização da conexão à internet e posterior ampliação das possibilidades interativas.
        Ugarte (2008), sem entrar em detalhes técnicos sobre a infraestrutura da rede16, atribui
à forma de comunicação distribuída a força de fenômenos sociais emergentes como o
ciberativismo. Assim, a premissa básica de Ugarte (2008) é que passamos de um fluxo
comunicacional descentralizado para um fluxo distribuído, diminuindo o poder dos
conglomerados de mídia:

                            O ciberativismo é uma estratégia para formar coalizões temporais de pessoas que
                            utilizando ferramentas dessa rede, geram a massa crítica suficiente de informação e
                            debate, para que este debate transcenda à blogosfera e saia a rua, ou modifique, de
                            forma perceptível o comportamento de um número amplo de pessoas (UGARTE,
                            2008, p. 111).

        Assim, para Ugarte (2008, p. 55), esta nova dinâmica comunicativa, formada pela
multiplicidade de agentes autônomos, coordena-se espontaneamente sem necessidade de um
centro. O autor chama tal dinâmica de swarming17, ou seja, uma formação espontânea sem
planificação aparente, considerada “letal para os velhos elefantes organizacionais”.
        Nesse sentido, Ugarte (2008) acredita que fenômenos sociais como o ciberativismo se
potencializam diante da ampliação da autonomia individual. Para isto, o autor atribui à
identidade o status de elemento chave destas mobilizações em redes distribuídas.
        A partir desta compreensão, Ugarte (2008) defende que o ciberativismo, atualmente, é
composto de três vias principais unidas pelo que o autor chama de “empoderamento
individual”: discurso, ferramentas e visibilidade.
        O discurso, chamado por Ugarte (2008, p. 57) de “hacking social18”, além de propiciar
uma gama de significados sociais alternativos à mídia de massa, também é apontado como
responsável pelo estabelecimento dos componentes identitários classificados como
fundamentais diante do ambiente distribuído da internet. Ou seja, a efetividade das ações
ciberativistas diante do diagrama da rede distribuída depende do engajamento de indivíduos
desconhecidos. Esse engajamento se dá quando há identificação com a imagem discursiva
construída através das enunciações ciberativistas:


16
    Ao contrário de Ugarte (2008), consideramos fundamental a abordagem destes ‘detalhes técnicos’.
Proposemos tal reflexão no segundo capítulo.
17
   Podemos traduzir tal termo por “enxameamento”.
18
   O termo hacker será aprofundado neste capítulo. No sentido empregado pelo autor neste momento, hacking
está ligado à ideia de reconfiguração social, ou seja, o discurso ativista em redes distribuídas como uma forma de
reconfiguração das vozes sociais que circulam na sociedade.
26



                           Por isso, toda essa lírica discursiva traz implícito um forte componente identitário
                           que facilita, por sua vez, a comunicação entre pares desconhecidos sem que seja
                           necessária a mediação de um “centro”, ou seja, assegura o caráter distribuído da rede
                           e, portanto, sua robustez de conjunto (UGARTE, 2008, p. 57, grifo do autor).

       Já as ferramentas, apontadas por Ugarte (2008) como uma das três vias fundamentais
do ciberativismo, surgem da ideia do “faça você mesmo”. Baseada no ideário da cultura
hacker, a criação de ferramentas em prol de ações ciberativistas podem ser caracterizadas
como a essência do hacktivismo, uma das tipologias de ciberativismo, como será exposto no
decorrer deste capítulo.
       Por fim, a visibilidade é conceituada por Ugarte (2008) como o objetivo de luta
permanente desses movimentos. Como foi referido, o ciberativismo para Ugarte (2008)
representa uma estratégia de busca da inclusão de determinados temas na pauta do debate
público.
       A partir do entendimento desse tripé de sustentação do ciberativismo (discurso,
ferramentas e visibilidade), Ugarte (2008, p. 58) define o ciberativista como “alguém que
utiliza a Internet [...] para difundir um discurso e colocar à disposição pública ferramentas que
devolvam às pessoas poder e a visibilidade que hoje são monopolizadas pelas instituições”.
Assim o autor retoma e enfatiza a ideia do ciberativismo como disputa pela inclusão de
determinadas pautas no agendamento público.
       Samira Feldman Marzochi (2009), em tese de doutorado em sociologia que teve como
corpus de análise a ONG Greenpeace, vê o ciberativismo sob o prisma da cidadania. Cabe
lembrar, como faz Marzochi (2009), que geralmente este conceito está ligado à participação
dentro de um Estado. Neste caso, a autora frisa que o termo é usado no sentido de
pertencimento a um determinado grupo social.
       Assim, diante das novas formas de mobilização possibilitadas pela rede mundial de
computadores, a autora considera que o ciberativismo pressupõe uma nova cidadania,
chamada por ela de “cibercidadania”. Trata-se de uma ligação social que extrapola as
fronteiras nacionais. Assim, o ciberativismo representa “uma nova cultura de ligação
individual com o mundo [...] O universo deste novo ser político, o cibercidadão, é a Terra em
sua existência material e finita” (MARZOCHI, 2009, p. 286).
       Como apresenta Poster (2004, p. 324), atualmente a figura do cidadão reúne “a
individualidade autônoma da modernidade e o tradicionalismo pós-moderno da política da
identidade”, configurando uma mistura desajeitada e inadequada às novas formas políticas
emergentes na comunicação distribuída em escala global. Nessa perspectiva, Poster (2004) vê
emergir, com a internet, formas políticas pós-nacionais, através de movimentos – muitas
27



vezes – dissociados de identidades geográficas, mas identificados com territorialidades
virtuais.
        Ao compreender os conceitos de ciberativismo explanados anteriormente, propõe-se a
definição a ser adotada para o presente estudo. Dessa maneira, consideramos ciberativismo o
conjunto de práticas realizadas em redes cibernéticas, com o objetivo de ampliar os
significados sociais através da circulação na rede de discursos e ferramentas capazes de
colaborar na defesa de causas específicas. Trata-se de uma nova cultura de mobilização, mais
difusa e abrangente, que tem sua força baseada na ação coletiva.
        Retomaremos a discussão a respeito deste conceito ao final do próximo item, quando
relacionaremos a conceituação proposta com os aspectos contextuais retirados de um
apanhado histórico do ciberativismo. Através da revisão bibliográfica em estudos sobre este
tema, são apresentados os principais episódios que possam colaborar com o entendimento de
como este fenômeno social consolidou-se diante dos avanços da tecnologia que lhe dá
suporte.


1.2 BREVE HISTÓRICO DO CIBERATIVISMO


            Apesar de considerarmos imanente à própria internet (SILVEIRA, 2010), este
fenômeno social passou a ser chamado de ciberativismo19 nas duas últimas décadas.
Conforme Érico Gonçalves de Assis (2006), mesmo o termo “ativismo” passa a figurar
recentemente nos textos acadêmicos. Segundo o autor (2006), baseado nos estudos de Tim
Jordan20, este fato poderia ser explicado pela adoção do termo por grupos norte-americanos e
europeus, com o suposto objetivo de escapar da carga social dos significados de
“revolucionário” e “radical”.
            Já o prefixo ciber, conforme retoma Montardo (2004), vem da cibernética, palavra
popularizada pelos estudos do matemático Norbert Wiener. Desde então, o prefixo vem sendo
utilizado para compor nomes de diversas faces da relação entre a sociedade e suas
tecnologias. É exemplo disto a própria cibercultura, que engloba a diversidade de aspectos
culturais potencializados pelas novas tecnologias.




19
   Ou termos equivalentes como “netativismo”, “webativismo” e “ativismo em rede”, neste estudo tratados como
sinônimos.
20
   Autor da publicação “Activism!: Direct Action, Hacktivism and the Future of Society” de 2002.
28



1.2.1 Das listas de discussão à Desobediência Civil Eletrônica


        Conforme o pesquisador Stefan Wray (1998), as primeiras ações práticas de ativismo
através da utilização de computadores em rede, como conhecemos hoje, surgem em meados
da década de 1980, ao que chama de “pré-história da web”. Wray (1998, online, tradução
nossa) cita como primeira ação concreta de ativismo a criação do PeaceNet, em 1986: “pela
primeira vez - ativistas políticos comunicaram-se uns com os outros através de fronteiras
internacionais com relativa facilidade e velocidade”21. Tratava-se de uma rede internacional
de pacifistas e ativistas políticos que trocavam mensagens através dos mecanismos das redes
telemáticas. Esse ambiente comunicativo baseado em troca de mensagens em texto persistiu,
segundo Wray (1998), até 1995, quando os primeiros programas de navegação na web foram
introduzidos.
        Até então a internet representava apenas um espaço comunicativo, em que
informações eram trocadas de maneiras mais eficiente pelo suporte digital. Como a PeaceNet
e diversas outras redes criadas na mesma época, a tecnologia tornava mais eficiente a
organização e troca de informações entre ativistas de todo o mundo. Wray (1998) destaca que
a comunicação por e-mail, assim como o uso de aparelhos como fax, teve papel importante no
contexto internacional de mobilizações ainda no fim dos anos 1980, sendo destaque nas lutas
de estudantes chineses pró-democracia e no movimento transnacional que levou a dissolução
da União Soviética.
        Entretanto, apenas a partir do fim da década de 1990, surgem as primeiras ações
diretas de ativismo no ambiente de rede. Estas ações estavam ligadas ao que foi chamado de
"Desobediência Civil Eletrônica". Segundo Wray (1998), tal ideário de mobilização através
das novas ferramentas tecnológicas foi baseado na “Desobediência Civil”, termo criado por
Henri David Thoreau, em texto de 1849, que designa a utilização de ações simbólicas
pacíficas nas mobilizações, como ocupações de prédios e trancamento de vias.
        Conforme Wray (1998, online, tradução nossa), a Desobediência Civil Eletrônica,
“como uma massa eletrônica descentralizada de ação direta, utiliza bloqueios e ocupações
virtuais”22. A adaptação das ideias já centenárias de mobilização de Thoreau ao contexto dos
novos ambientes de sociabilidade como a web, segundo Wray (1998), foi realizada em 1994
pelo grupo de artistas e teóricos chamado Critical Art Ensemble. Em dois livros, o grupo

21
   Texto original: “for the first time - political activists to communicate with one another across international
borders with relative ease and speed”.
22
   Texto original: “as a form of mass decentered electronic direct action, utilizes virtual blockades and virtual
sit-ins”.
29



tratou de apresentar hipóteses de como aplicar as práticas de desobediência civil na
infraestrutura da internet.
       No entanto, até 1998 a Desobediência Civil Eletrônica não passava de proposições
teóricas. Desta forma, Wray (1998) afirma que em dezembro de 1997, após o massacre de
Acteal em Chiapas, no México23, pela primeira vez passou-se a um ativismo de posição
híbrida entre a utilização da internet como um meio de comunicação e como um ambiente de
ação direta. Conforme Maria de Lourdes Balbinot de Lamônica Freire (2007), foi realizado
um protesto na internet em que foi construído um monumento virtual às vítimas do massacre.
Freire (2007, p.76) explica o funcionamento do considerado primeiro ato de Desobediência
Civil Eletrônica:

                         Nesse monumento [...] contava quem eram as pessoas que haviam morrido e porque
                         foram massacradas. No servidor que hospedava o site-monumento foi colocado um
                         aplicativo criado por Brett24 para contar o número de pessoas que visitavam o site. A
                         cada visitante que acessava o site o aplicativo enviava um sinal eletrônico à
                         presidência mexicana. Esse sinal batia à porta do endereço virtual do presidente
                         Zedillo e pedia o mesmo documento. Depois de milhares de visitantes fazendo isto,
                         durante quatro horas, o sistema do site presidencial entrou em colapso e travou.

       Assim, no início de 1998 surge uma das primeiras ações realmente diretas no uso da
infraestrutura da internet que, conforme Wray (1998), foi o software FloodNet. Assim como o
protesto contra o massacre de Acteal, este programa de computador foi criado pelo grupo
Electronic Disturbance Theater, um dos primeiros coletivos a se autodenominar
“ciberativista”. O FloodNet consistia na ocupação virtual de sítios “inimigos” através da
sobrecarga de solicitações. Dessa maneira, este grupo convidou usuários da internet a
participaram de uma ocupação virtual contra o governo mexicano.
       Wray (1998) avalia que o FloodNet teve capacidade mais simbólica que prática, já que
raramente alcançou o objetivo de impedir o acesso aos sítios inimigos. Entretanto, estas ações
de Desobediência Civil Eletrônica iniciadas no fim da década de 1990 representam o princípio
de uma forma de ciberativismo recorrente no contexto atual. São exemplos disso os Protestos
de Negação de Serviço (DDOS)25, em que se faz exatamente o que se buscava com o
FloodNet, ou seja, ocupação simbólica de um certo espaço virtual.
       Como define Richard Stallman (2011, online), ativista do software livre fundador da
Free Software Foundation26, tais protestos não buscam invadir um espaço privado, mas sim,

23
   Massacre em que 45 indígenas foram mortos por grupo paramilitar contrário ao Exército Zapatista de
Libertação Nacional (EZLN) (BBC, 2002).
24
   Trata-se de Brett Stalbaum, um dos criadores do Critical Art Ensemble.
25
   Sigla da definição em inglês: Distributed Denial of Service.
26
   Fundação do Software livre.
30



“eles entram pela porta da frente de uma página, que simplesmente não é capaz de suportar
tantos visitantes ao mesmo tempo”. Esta definição de Stallman foi proferida em um contexto
de protestos de negação de serviço que o grupo autointitulado “Anonymous” fez durante o
ano de 2011 em favor da WikiLeaks, após o bloqueio financeiro à organização por empresas
como PayPal, Visa e MasterCard, canais utilizados para realização de doações à organização.
Esses eventos, chamados por Stallman (2011) de “protestos de negação de serviço”, ao invés
de “ataque de negação de serviço”27, causaram problemas na operação destas empresas,
responsáveis por boa parte do mercado de transações monetárias via internet. Logo, tal ação
realmente causou um grande transtorno, chamando a atenção midiática.
        Stallman (2011) compara estas ações do grupo Anonymous com um protesto de rua,
onde os manifestantes trancam e afetam as ações na cidade. Stallman (2011, online) também
critica a ação do Estado neste episódio:

                           A internet não pode funcionar se os sites forem constantemente bloqueados por
                           multidões, assim como uma cidade não funciona se suas ruas estiverem sempre
                           tomadas por protestos. Mas, antes de declarar seu apoio à repressão dos protestos na
                           internet, pense no motivo de tais protestos: na internet, os usuários não têm direitos.
                           Como ficou claramente demonstrado no caso do WikiLeaks, devemos suportar
                           sozinhos as consequências daquilo que fazemos na rede. [...] Desconectar o
                           WikiLeaks equivale a sitiar manifestantes em uma praça. Ataques preventivos da
                           polícia provocam uma reação; então eles usam os pequenos delitos das pessoas
                           enfurecidas para afastar a atenção dos grandes delitos do Estado.

        Esses protestos serão retomados no quarto capítulo, quando o objeto de pesquisa será
apresentado.


1.2.2 Zapatistas e as possibilidades do ciberativismo na origem da web


        Um dos primeiros grupos a usar a internet efetivamente como instrumento de
divulgação de suas causas foi o movimento zapatista, no México. Trata-se até hoje de um
objeto de estudo recorrente nas pesquisas sobre ciberativismo. Surgido em um contexto de
levantes contra a globalização, os Zapatistas chegaram a tomar o poder do estado de Chiapas
em primeiro de janeiro de 1994, data de início da vigência do Acordo Norte-Americano de
Livre-comércio (NAFTA) (PIMENTA; RIVELLO, 2008).
        Formado principalmente por camponeses indígenas que desde a década de 1940
habitavam comunidades estabelecidas próximo a divisa com a Guatemala, o Exército

27
  Stallman (2011, online, grifo do autor) esclarece: “Chamar os protestos organizados por eles de ‘ataques de
negação de serviço’ (DDoS) também está errado. Um ataque DDoS propriamente dito é feito por meio de
milhares de computadores zumbis”. Ou seja, ataque configura, para o autor, a utilização ilegal de outros
computadores sob influência de um vírus.
31



Zapatista de Libertação Nacional (EZLN) também teve a participação de intelectuais oriundos
de regiões urbanas, como a figura pública do grupo paramilitar, o célebre Subcomandante
Marcos (CASTELLS, 2001).
       Castells (2001) afirma que o sucesso deste movimento deveu-se a sua estratégia de
comunicação, que teve como ferramenta fundamental a internet. Como enfatizam Pimenta e
Rivello (2008), na época em que o movimento zapatista alcançou notoriedade, a internet
apresentava possibilidades limitadas como troca de e-mails e sites de armazenamentos de
arquivos, os FTPs. A web, interface gráfica da internet, ainda dava seus primeiros passos. O
primeiro sítio do movimento zapatista só foi vinculado à rede no final de 1996.
       Foi justamente no ambiente comunicativo das listas de discussões e redes formadas
por ONGs e ativistas de todo o mundo que o movimento zapatista alcançou apoio que
garantiu visibilidade às suas ações. Castells (2001, p. 105) considera que a utilização da
internet neste episódio teve papel determinante:

                       A utilização amplamente difundida da Internet permitiu aos zapatistas disseminarem
                       informações e sua causa a todo o mundo de forma praticamente instantânea, e
                       estabelecerem uma rede de grupos de apoio que ajudaram a criar um movimento
                       internacional de opinião pública que praticamente impossibilitou o governo
                       mexicano de fazer uso da repressão em larga escala.

       Desta maneira, com a possibilidade de expor ao mundo as causas em disputa no
território de Chiapas, o movimento zapatista alcançou apoio que lhe garantiu segurança no
enfrentamento com o governo mexicano. Além de ter sido uma das primeiras mobilizações a
usar a internet, o movimento zapatista também, como referido neste item, serviu de motivação
para o desenvolvimento das ações de Desobediência Civil Eletrônica.
       Entretanto, mesmo após relativa popularização da web, a criação de novas ferramentas
capazes de ampliar as possibilidades ciberativistas não ocorreu em grande escala. Francisco
José Paoliello Pimenta (2003), ao estudar as possibilidades de hipermídia no ativismo de
caráter global na primeira década do século XXI, constatou que as novas tecnologias, em sua
maioria, estavam sendo usadas como forma de organização e divulgação dos movimentos
ativistas, em detrimento da criação de novas formas de ação remota pela rede:


                       Os sites se preocupam em fornecer informações sobre diversos tipos de
                       mobilizações, em alguns casos de forma extensiva, incluindo motivações, datas,
                       locais, horários e, até mesmo, recomendações de como participar, onde deixar
                       crianças e como agir em caso de prisão. No entanto, pelo menos aqueles observados,
                       não se propõem a servir, propriamente, como plataformas de ação à distância
                       (PIMENTA, 2003, p. 6)
32



       O apontamento de Pimenta (2003) se refere à criação de novas ferramentas
aproveitando potencialidades da comunicação pela internet. Neste período analisado por
Pimenta (2003), a web apresentava ainda sua estrutura inicial, já mais acessível, mas ainda
com sua construção restrita a usuários com conhecimentos mínimos de sua codificação.
       Nesse contexto, foram destaque iniciativas como Indymedia, formada por ativistas
após série de protestos contra globalização em Seattle (RIGITANO, 2005). Com ramificações
em diversas partes do mundo, estes sítios buscavam proporcionar uma cobertura alternativa,
desvinculada do interesse corporativo dos grandes meios de comunicação.
       A versão brasileira do portal, o Centro de Mídia Independente (CMI), criada em 2001,
até hoje atua como meio alternativo de divulgação noticiosa (RIGITANO, 2005). De acordo
com Rigitano (2005), durante os protestos, a cobertura dos meios de comunicação tradicionais
atribuiu aos manifestantes valores com os quais eles não concordavam, enfocando a violência
e a banalidade das ações. Desta maneira, os sítios serviram para contrapor o discurso
midiático, alimentando um espaço com a visão dos manifestantes, onde era possível
acompanhar fatos como a suposta violência policial (RIGITANO, 2005).
       A ONG internacional Greenpeace também é um dos exemplos de organização ativista
que se apropriou da internet como campo de potencialização de suas práticas. Surgida no
ambiente de contracultura estadunidense na década de 1970, a ONG se expandiu
internacionalmente realizando atos midiáticos em favor de causas ambientais (MARZOCHI,
2009). O Greenpeace viu na internet uma forma de ampliar suas campanhas e, com isso,
aumentar o suporte colaborativo em todo o planeta.
       Como apresenta Marzochi (2009), a utilização pelo Greenpeace das possibilidades da
internet enfatizou busca de apoio às ações da ONG: “Você pode ajudar tanto quanto um
ativista mesmo sem sair de casa” (GREENPEACE apud MARZOCHI, 2009, p. 283). Ou seja,
a ONG cria formas pelas quais seus simpatizantes possam colaborar com a causa ambiental
através da internet, como doações financeiras, fóruns de discussões, cartas pré-escritas a
serem enviadas aos governantes, etc. Desta maneira, Marzochi (2009, p. 287) considera que o
ciberativismo praticado pelo Greenpeace

                       está em relação com conteúdo (informação, conhecimento científico, discursos
                       políticos, ideologias, imagens, sons) organizados ou produzidos pela ONG inserida
                       num sistema técnico, científico e político, que já é, ela mesma, uma tecnologia capaz
                       de economizar esforço intelectual dos indivíduos no conhecimento, interpretação e
                       julgamento da realidade.

       Assim, ao analisar o estilo de ciberativismo e as metas do Greenpeace, Marzochi
(2009) identifica que o indivíduo instado a apoiar a ONG é colocado em uma posição de
33



passividade. A autora chega a essa conclusão ao comparar o ciberativista do Greenpeace com
outras categorias de envolvimento político, como o militante partidário. Dessa maneira, o
suporte ativista é usado em função de metas institucionais com as quais ele não delibera ou
compartilha, como o aumento de apoiadores ou imagem de “marca”. Neste caso, Marzochi
(2009, p. 301) considera que os indivíduos que colaboram com o Greenpeace, entendendo-os
como quem despende parte de seu tempo ou dinheiro em apoio à ONG, são tratados como um
espectador, restando ao “ativista” observar pela mídia como sua contribuição está sendo
empregada.


1.2.3 Colapso da primeira web e a ampliação das mídias digitais


       Desde o princípio, a internet proporcionou a movimentos e atividades sociais força e
robustez diante de seu formato fluido de organização (ANTOUN, 2008). O surgimento da
web facilitou a consolidação da internet como um ambiente interativo e distribuído, que teve
como uma de suas características a capacidade de servir a mobilizações de âmbito mundial.
Assim, a mudança nesta nova dimensão comunicativa também determina mudanças na forma
pela qual o ciberativismo se apropria da infraestrutura da internet.
       Henrique Antoun (2008), ao refletir sobre a evolução da web, considera que
movimentos como o zapatismo e os levantes contra redes globais de regulamentação
representaram o sucesso desta primeira fase da web. Para Antoun (2008), o fim deste primeiro
estágio da web está ligado justamente ao declínio das formas de interação utilizadas nas
mobilizações ativistas, como os grupos de discussões. O autor atribui este declínio a uma
violenta reação de empresas e do Estado após os ataques terroristas de 11 de setembro. Assim,
Antoun (2008, p. 18-19, grifos do autor) aponta a mudança da web, o fim de seu primeiro
estágio diante da desordem participativa:

                        os limites dessa expressão serão apropriados pelas empresas e Estados e voltados
                        violentamente contra esses movimentos a partir do final de 2001. As violentas e
                        intermináveis guerras verbais (flame wars), os palhaços que falam de tudo para
                        aparecer, os ególatras que acham que sabem mais do que ninguém sobre algo, os
                        trogloditas (trolls) que gostam de ofender e humilhar os participantes das discussões
                        dos grupos de interesse, as desconfigurações (defacements) dos sítios por seus
                        antipatizantes, os ataques de negação de serviço (DDOS) aos sítios tornados alvos,
                        as derrubadas e seqüestros de redes, computadores e salas de bate papo (chat rooms)
                        do universo web, tudo isso refluiu no seio dos movimentos da multidão, esfacelando
                        suas práticas. [...] Isso, acrescido aos spams decreta a morte da Web 1.0, abrindo
                        espaço para a nova web e seus filtros eficientes, mineração de dados miraculosa e
                        redes sociais promissoras.
34



        Ou seja, Antoun (2008) acredita que iniciativas colaborativas utilizadas por
movimentos em rede, como os grupos de discussões, entraram em colapso. Segundo o autor,
os atentados de 11 de setembro fazem retroceder os movimentos de multidão em âmbito
internacional. Ao mesmo tempo, a ampliação de acesso a esses espaços de sociabilidade, em
conjunto com as deficitárias formas de regulação das interações, criam a desordem
responsável pelo fim deste primeiro estágio da web.
        Assim, o novo estágio desta tecnologia tem como base justamente a busca pela
organização do público crescente da web e a ampliação dos mecanismos de participação.
Conforme Antoun (2008), esta concepção da web 2.0, nome dado por Tim O’Reilly, emerge
em discussões no sítio Cluetrain Manifest, que posteriormente tornou-se um livro. Cabe aqui
fazer uma ressalva a fim de deixar claro um ponto que seguidamente é tratado de maneira
confusa: a web 2.0 é um rótulo dado a um novo momento tecnológico que influenciou o modo
pelo qual a web evoluiu a caminho de se tornar um ambiente cada vez mais interativo. Então,
não se trata de uma tecnologia implantada, mas sim um pensamento tecnológico que desde o
início do século XXI norteia as iniciativas que sobreviveram à seleção natural da internet.
        Essa nova web fica marcada pela ampliação das possibilidades de interação e de
produção dos seus usuários, projetando novos espaços em que estes indivíduos passam a criar
e compartilhar conteúdos com sua rede social na internet. Ao mesmo tempo, esses ambientes
de utilização gratuita são uma rica fonte de dados sobre seus usuários. Desta maneira, o preço
da utilização destes novos mecanismos é o rastro deixado pelas formas de uso dos indivíduos.
Antoun (2008, p. 23) destaca isso ao apontar características imanentes aos novos mecanismos
surgidos: “tudo na Web 2.0 já nasce com filtro de palhaços, derrubadores de ego,
pesquisadores de opinião, controladores de spam e mineradores de dados – todos os antídotos
contra as mazelas da primeira web”.
        Estas mudanças na web vão modificar fundamentalmente as maneiras pelas quais o
ciberativismo age. Talvez uma das primeiras ferramentas a condensar as características do que
viria a se chamar de web 2.0, os blogs28 serviram, e continuam servindo, como mecanismo
importante em ações ciberativistas. Conforme aponta Antoun (2008, p. 22), “em 2003, essa
nova web mostra seu poder político, auxiliando os movimentos contra a guerra do Iraque a
promoverem a primeira manifestação internacional descentralizadas de massa através do blog
do Move On”.

28
   Surgidos ainda na primeira web, os weblogs, como foram denominados primeiramente, eram sítios de
estrutura simples que, via de regra, funcionavam como selecionadores de links para outros sítios em uma web
ainda sem grandes sistemas de busca. Com a popularização através dos servidores gratuitos, os blogs cresceram
vertiginosamente transformando-se em um espaço utilizado de inúmeras formas (ARAÚJO, 2009).
35



        Mecanismo também surgido sob a égide da web 2.0, os sítios de redes sociais
representam um campo fértil para proliferação das ações ciberativistas. Atualmente, grande
parte do fluxo de navegação dos usuários está em determinados sites de redes sociais (SRS)29.
Danah Boyd e Nicole Ellison (2007, online, tradução nossa) definem sítios de redes sociais
baseados em três aspectos principais:

                            Definimos site de redes sociais como serviços na web que permitem aos indivíduos
                            (1) construir um perfil público ou semi-público, dentro de um sistema limitado, (2)
                            articular uma lista de outros usuários com quem compartilham conexão e (3) poder
                            ver e percorrer sua lista de conexões e aquelas feitas pelos outros dentro do sistema.
                                                                                                          30
                            A natureza e nomenclatura dessas conexões podem variar de local para local.

         Raquel Recuero (2009) lembra que SRS como Facebook, Orkut ou Google + são
apenas o meio técnico que proporciona a emergência destas redes. Desta forma, redes sociais
não são “pré-construídas pelas ferramentas, e, sim, apropriadas pelos atores sociais que lhes
conferem sentido e que as adaptam para suas práticas sociais” (RECUERO, 2009, p. 21).
        A partir desta afirmação, identificamos o ciberativismo como uma das inúmeras
práticas sociais pelas quais são apropriados os SRS. Como apresentam Jandré Batista e
Gabriela Zago (2010), baseados nos estudos de Recuero (2009), estes sítios representam
espaços de trocas entre atores sociais com diversas finalidades. Batista e Zago (2010, p. 131)
destacam a apropriação destas mídias digitais pelo ciberativismo, que, segundo os autores,
encontra nestes novos espaços possibilidades comunicativas que são colocadas em função da
busca de reverberação política, alcançada através da cooperação:

                            Dadas as possibilidades de reinventar as formas de interação social em cada sistema
                            e coordenar-se coletivamente perante o novo em um meio de comunicação em
                            constante transformação – em que se registram formas de cooperação e agregação –,
                            os atores sociais estariam naturalmente convidados à ação coletiva.

         Pelo seu caráter mais horizontal de comunicação, como ressaltam Batista e Zago
(2010), os sítios de redes sociais garantem visibilidade a mobilizações onde se engajam um
número relevante de indivíduos. Estas características foram reforçadas pelos autores em texto
posterior (2011), em que analisaram a mobilização colaborativa de apoiadores da WikiLeaks
no Twitter, onde o objetivo era colocar o nome da organização em posição de visibilidade,


29
   No Brasil, o número de indivíduos que acessam a internet e participam de algum SRS chega a 69%, segundo
pesquisa do Centro de Estudos sobre Tecnologia da Informação e da Comunicação sobre uso de internet nos
domicílios brasileiros (CETIC.BR, 2012).
30
   Texto original: “We define social network sites as web-based services that allow individuals to (1) construct a
public or semi-public profile within a bounded system, (2) articulate a list of other users with whom they share a
connection, and (3) view and traverse their list of connections and those made by others within the system. The
nature and nomenclature of these connections may vary from site to site”.
Análise do discurso da WikiLeaks
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  • 2. 1 Universidade Feevale Mestrado em Processos e Manifestações Culturais WILLIAN FERNANDES ARAÚJO “WE OPEN GOVERNMENTS”: UMA ANÁLISE DE DISCURSO DO CIBERATIVISMO PRATICADO PELA ORGANIZAÇÃO WIKILEAKS Trabalho de conclusão apresentado ao Mestrado em Processos e Manifestações Culturais como requisito para a obtenção do grau de mestre em Processos e Manifestações Culturais. Orientadora: Profª. Drª. Sandra Portella Montardo Co-orientador: Prof. Dr. Ernani Cesar Freitas Novo Hamburgo 2013
  • 3. 2
  • 4. 3 Universidade Feevale Mestrado em Processos e Manifestações Culturais WILLIAN FERNANDES ARAÚJO “WE OPEN GOVERNMENTS”: UMA ANÁLISE DE DISCURSO DO CIBERATIVISMO PRATICADO PELA ORGANIZAÇÃO WIKILEAKS Trabalho de Conclusão de mestrado aprovado pela banca examinadora em 15 de janeiro de 2013, conferindo ao autor o título de mestre em Processos e Manifestações Culturais. Componentes da Banca Examinadora: _______________________________ Prof. Dra. Sandra Portella Montardo Universidade Feevale _______________________________ Prof. Dr. Antônio Fausto Neto Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS) _______________________________ Prof. Dra. Suely Dadalti Fragoso Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)
  • 5. 4 RESUMO O estudo busca discutir o discurso no ciberativismo, mais especificamente abordando construções discursivas no ciberativismo praticado pela organização WikiLeaks. Desta maneira, a pesquisa tem como objetivo geral identificar de que maneira esta organização constrói seus discursos. Os objetivos específicos são compreender qual o papel do discurso no ciberativismo, tendo a internet como situação extralinguística; apontar como se dá a encenação discursiva no âmbito da organização WikiLeaks e quais estratégias são usadas; e discutir e problematizar o conceito de ciberativismo, apontando uma proposição adequada ao nosso entendimento deste fenômeno social. A metodologia é qualitativa e apresenta uma formação híbrida, utilizando a análise do discurso de base semiolinguística para o estudo dos textos que formam o corpus desta pesquisa, composto pela página inicial do sítio da organização durante maio de 2012, pela produção audiovisual “What Does it Cost to Change the World?” publicada no sítio Vímeo em julho de 2011 e por postagens da organização WikiLeaks em sua página no Facebook de 1° de junho a 5 de julho de 2012. Nesta última unidade de análise, foi aplicada a metodologia Teoria Fundamentada para identificação dos principais usos da ferramenta pela WikiLeaks e escolha dos textos a serem analisados segundo a Semiolinguística. A formação teórica do trabalho é organizada em três capítulos. No primeiro, discutimos o conceito de ciberativismo com base em diversos autores. A partir disto, propomos uma conceituação de ciberativismo adequada ao nosso entendimento e baseada na intersecção de diversos conceitos. No segundo capítulo, apresentamos reflexões sobre a internet como espaço social de disputas, e por isso, sua estrutura de protocolos que garante o status de mídia massiva mais controlada conhecida até agora, assim como as formas que constituem o poder na sociedade em rede e de controle. No terceiro capítulo, são construídos os principais pontos da Semiolinguística, como disciplina de estudo do discurso que compreende o dito como um arranjo entre vozes sociais e intencionalidade individual. Também é apresentada neste trabalho uma revisão bibliográfica de abordagens sobre a WikiLeaks. Por fim, trazemos as considerações finais em que identificamos, como resultado da análise, o direcionamento das estratégias discursivas essencialmente para captação dos interpretantes, buscando com isso garantir aporte colaborativo, visibilidade e legitimação dos discursos desta organização. Palavras-chave: Ciberativismo; WikiLeaks; Análise de discurso; Semiolinguística; Cibercultura.
  • 6. 5 ABSTRACT The study aims to discuss the discourse in cyberactivism, more specifically addressing the discursive constructions in the cyberactivism practiced by the organization WikiLeaks. Thus, the research aims at identifying how this organization builds its discourses. The specific objectives are to understand the role of discourse in cyberactivism, taking the internet as extralinguistic situation, to point out how the staging discourse in the ambit of the organization WikiLeaks is made and which strategies are used, and discuss and problematize the concept of cyberactivism, indicating a proposition that is adequate to our understanding of this social phenomenon. The methodology is qualitative and presents a hybrid formation, using the discourse analysis based on Semiolinguistics as the basis for the study of texts that form the corpus of this research, consisted by the homepage of the website of the organization during May of 2012, the audiovisual production “What Does it Cost to Change the World?” published in the Vimeo website in July of 2011 and by posts of the organization WikiLeaks on its Facebook page during June 1st and July 5th of 2012. In this last unit of analysis it was applied the methodological Grounded Theory to identify the main uses of the tool by WikiLeaks and choose the texts to be analyzed according to Semiolinguistics. The theoretical framework is organized into three chapters. In the first one, we discuss the concept of cyberactivism based on several authors. From this, we propose a conceptualization of cyberactivism suitable to our understanding and based on the intersection of several concepts. In the second chapter we present reflections on the internet as a social space of disputes, and therefore its structure of protocols that provides the status of mass media more controlled, known so far, as well as forms that constitute the power in the networked society and the control. In the third chapter, the main points of Semiolinguistics are constructed, as a discipline of study of the discourse which comprehends the dictum as an arrangement between social voices and individual intentionality. A literature review of approaches about WikiLeaks is also presented in this work. Lastly, we bring the final considerations where we identify as a result of the analysis, the targeting of discursive strategies essentially to capture the interpretants, seeking with it to ensure collaborative contribution, visibility and legitimacy of the discourses of this organization. Keywords: Cyberactivism; WikiLeaks; Discourse analysis; Semiolinguistic; Cyberculture.
  • 7. 6 LISTA DE QUADROS Quadro 1 – Sistematização das tipologias sobre ciberativismo.............................................. 43 Quadro 2 - Níveis do ato de linguagem.................................................................................. 76 Quadro 3 – Dispositivo de análise........................................................................................ 104 Quadro 4 - Componentes da situação de comunicação na página de web WikiLeaks.org........................................................................................................................ 111 Quadro 5 - Categorias identificadas na análise das postagens na página de Facebook da WikiLeaks.............................................................................................................................. 135
  • 8. 7 LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Representação gráfica do histórico do ciberativismo............................................ 39 Figura 2 – Exemplo de estrutura de “árvore invertida” do DNS.............................................53 Figura 3 – Modelo do Ato de linguagem para semiolinguística............................................. 70 Figura 4 – Modelo do processo de semiotização do mundo de Charaudeau.......................... 72 Figura 5 – Esquema que representa graficamente o percurso metodológico deste estudo... 101 Figura 6 – Página inicial do sítio da WikiLeaks durante paralisação de suas atividades em 2009........................................................................................................................................ 106 Figura 7 – Retrato parcial da página inicial do sítio da WikiLeaks onde estão numerados diferentes elementos deste ato de linguagem......................................................................... 107 Figura 8 – Página inicial do sítio da WikiLeaks, com marcação nos hiperlinks para página “doação”................................................................................................................................. 113 Figura 9 – Logomarca da WikiLeaks retirada de sua página de web e com marcação de seus elementos............................................................................................................................... 115 Figura 10 – Frames retirados da produção audiovisual “Wikileaks needs you”................... 118 Figura 11 – Detalhe retratando unidade de conteúdo retirado do setor 6 (da Figura 7) da página inicial do sítio da WikiLeaks...................................................................................... 119 Figura 12 – Imagem retirada da página inicial do sítio da WikiLeaks................................. 121 Figura 13 – Captação de tela da página inicial do sítio da WikiLeaks como é vista pelo usuário.................................................................................................................................... 123 Figura 14 – Frame retirado do vídeo “WikiLeaks needs you!” (1’8’’) que mostra a utilização da imagem de uma notícia publicada no sítio da revista Forbes sobre o bloqueio bancário sofrido pela WikiLeaks.......................................................................................................... 126 Figura 15 – Reprodução parcial da página onde está publicada a produção audivisual “What Does it Cost to Change the World?”...................................................................................... 128 Figura 16 – Reprodução parcial da página onde está publicada a produção audiovisual no momento em que a identidade psicossocial de Julian Assange é usada neste ato de linguagem............................................................................................................................... 129 Figura 17 – Reprodução parcial da página onde está publicada a produção audiovisual no momento em que, através de um efeito gráfico, a logomarca da empresa MasterCard é transformada na logomarca da WikiLeaks............................................................................. 131
  • 9. 8 Figura 18 – Reprodução parcial de postagem na página de Facebook da WikiLeaks identificada na categoria “Sugestão de atitude”..................................................................... 136 Figura 19 – Reprodução parcial de postagem na página de Facebook da WikiLeaks identificada na categoria “Comentário opinativo”................................................................. 137 Figura 20 – Reprodução parcial de postagem na página de Facebook da WikiLeaks identificada nas categorias “Comentário opinativo” e “Divulgação de conteúdo”................ 138 Figura 21 – Reprodução parcial de postagem na página de Facebook da WikiLeaks identificada na categoria “Divulgação de conteúdo”........................................................... 139 Figura 22 – Gráficos das interações nas publicações da WikiLeaks em sua página no Facebook................................................................................................................................ 141 Figura 23 – Representação gráfica dos dados de compartilhamento nas postagens da WikiLeaks no Facebook da categoria “Divulgação de conteúdo – Opinativo – interno” em relação aos dados totais.......................................................................................................... 142 Figura 24 – Reprodução parcial de três postagens na página de Facebook da WikiLeaks, identificadas na categoria “Divulgação de conteúdo – Opinativo – Interno”........................ 143 Figura 25 – Reprodução parcial de postagem na página de Facebook da WikiLeaks na qual se vê texto iconográfico, representado pela logomarca da WikiLeaks estilizada, e também texto escrito e hiperlink................................................................................................................... 147 Figura 26 – Reprodução parcial de postagem na página de Facebook da WikiLeaks sobre suposta tentativa de extradição de Assange para os EUA..................................................... 150 Figura 27 – Reprodução parcial de postagem na página de Facebook da WikiLeaks que fala sobre asilo de Assange no Equador........................................................................................ 151 Figura 28 – Reprodução parcial das duas postagem na página de Facebook da WikiLeaks com maior número de interação............................................................................................. 152 Figura 29 – Reprodução parcial de postagem na página de Facebook da WikiLeaks onde são apresentados efeitos de saber que buscam comprovar a assertiva de que Assange precisa ser protegido................................................................................................................................ 153 Figura 30 – Reprodução parcial de duas postagem na página de Facebook da WikiLeaks onde são apresentadas composições gráficas que demonstram saberes avaliativos do enunciador.............................................................................................................................. 154
  • 10. 9 SUMÁRIO INTRODUÇÃO...................................................................................................................... 11 1. CIBERATIVISMO: FENÔMENO IMANENTE À REDE........................................... 21 1.1 O CONCEITO DE CIBERATIVISMO........................................................................ 21 1.2 BREVE HISTÓRICO DO CIBERATIVISMO............................................................ 27 1.2.1 Das listas de discussão à Desobediência Civil Eletrônica................................. 28 1.2.2 Zapatistas e as possibilidades do ciberativismo na origem da Web................ 30 1.2.3 Colapso da primeira Web e a ampliação das mídias digitais.......................... 33 1.3 TIPOLOGIAS DE CIBERATIVISMO........................................................................ 40 2. INTERNET: AMBIENTE DO CIBERATIVISMO, SÍMBOLO DA SOCIEDADE DE CONTROLE.......................................................................................................................... 45 2.1 A CONCEPÇÃO DA REDE DISTRIBUÍDA............................................................. 45 2.2 PROTOCOLO: O ESTILO DA SOCIEDADE DE CONTROLE............................... 49 2.3 A BIOPOLÍTICA E O BIOPODER NA ERA DO PROTOCOLO............................. 55 2.4 O PODER EM REDE................................................................................................... 60 3. SEMIOLINGUÍSTICA..................................................................................................... 66 3.1 O ATO DE LINGUAGEM COMO ENCENAÇÃO................................................... 68 3.1.1 Os sujeitos da linguagem..................................................................................... 69 3.1.2 O duplo processo de semiotização do mundo.................................................... 71 3.1.3 Contrato de comunicação................................................................................... 73 3.2 MODOS DE ORGANIZAÇÃO DO DISCURSO....................................................... 77 3.2.1 Enunciativo........................................................................................................... 77 3.2.2 Descritivo.............................................................................................................. 78 3.2.3 Narrativo.............................................................................................................. 78 3.2.4 Argumentativo..................................................................................................... 79 3.3 VISADAS DISCURSIVAS........................................................................................ 80 3.4 O DISCURSO MIDIÁTICO....................................................................................... 82 4. OBJETO E CONSTRUÇÃO METODOLÓGICA......................................................... 86 4.1 WIKILEAKS: A CONSTRUÇÃO DE UM OBJETO DE ESTUDO INTERDISCIPLINAR........................................................................................................ 86 4.1.1 Colaboração e visibilidade: desvendando as dinâmicas da WikiLeaks.......... 87 4.2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS.................................................................. 95 5. ANÁLISE DOS CORPORA .......................................................................................... 103 5.1 PÁGINA INICIAL DO SÍTIO WIKILEAKS.ORG................................................... 104 5.1.1 O sítio de web como ato de linguagem............................................................. 109 5.1.2 Nível situacional: o contrato de comunicação em páginas de web................ 110 5.1.3 Sujeitos do ato de linguagem............................................................................ 114 5.1.4 Sobre o quê? A semiotização do mundo.......................................................... 117 5.1.5 Nível discursivo: o espaço do mise-en-scène.................................................... 120 5.2 “WHAT DOES IT COST TO CHANGE THE WORLD?”............................................ 127 5.3 PÁGINA DA WIKILEAKS NO FACEBOOK........................................................... 132 5.3.1 Análise dos dados levantados............................................................................ 134 5.3.2 Sugestão de Atitude........................................................................................... 135
  • 11. 10 5.3.3 Comentário Opinativo....................................................................................... 137 5.3.4 Divulgação de conteúdo..................................................................................... 138 5.3.5 A resposta do interpretante: os dados de participação/interação nas postagens analisadas................................................................................................... 140 5.3.6 Análise dos textos iconográficos da subcategoria “Divulgação de conteúdo – Opinativo – Interno”.................................................................................................. 144 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................. 156 REFERÊNCIAS................................................................................................................... 161 APÊNDICES......................................................................................................................... 174 ANEXOS............................................................................................................................... 196
  • 12. 11 INTRODUÇÃO Como enfatizou Walter J. Ong (1998), as tecnologias nunca são recursos essencialmente externos à condição humana. Ao contrário, elas representam aplicações pragmáticas de transformações da consciência interior ao ser humano. Ou melhor, como propõe Neil Postman (1998), as tecnologias carregam consigo as formas filosóficas de interpretação do mundo nas quais foram forjadas. Assim, assumindo essa perspectiva ecológica de abordagem da mídia, o presente estudo, que tem como tema o discurso no ciberativismo, presume que as mudanças nas práticas sociais aqui enquadradas não advêm da adição de uma nova tecnologia, mas sim da interação dos atores sociais com estes meios, moldando tanto a cultura de ativismo, quanto o próprio meio tecnológico de ação, a internet. Por isso, ao abordar, mais especificamente, as construções discursivas no ciberativismo praticado pela organização WikiLeaks, o fazemos considerando esta prática imanente às redes temáticas como a internet, em uma perspectiva que a compreende também como fator de mutação tecnológica. É sob esta ótica que observamos as ações que tornaram esta organização mundialmente conhecida. Seus “vazamentos”, como nomearam a divulgação de documentos, tornaram público, por exemplo, um grande volume de informações consideradas sigilosas pelo governo norte-americano. Apesar de sua fama ter se espalhado pelo mundo inteiro, tornando-se assunto recorrente na cobertura midiática, poucos são os fatos aceitos unanimemente sobre a história da WikiLeaks. Mesmo o sítio da organização, repleto de informações sobre seus vazamentos, apresenta dados limitados sobre sua trajetória, organização interna e identidade dos integrantes. Sabe-se que a origem desta organização é baseada na figura do ativista australiano Julian Assange. Hacker de reconhecida reputação entre seus pares, Assange tornou-se um ativista da livre informação, intitulando-se, por diversas vezes, como jornalista investigativo. Capa de quase todos os grandes periódicos do mundo (revistas como Time, Rolling Stone, Forbes, etc), além de criador, Assange tornou-se também a figura pública da WikiLeaks. A primeira versão do sítio da organização foi colocada na rede no fim de 2006. Conforme os primeiros textos disponíveis neste espaço, o objetivo inicial era ser uma enciclopédia de documentos censurados, em que todos seriam editores, ao estilo consagrado pela Wikipédia. O foco inicial de ação seriam os regimes opressores na Ásia, África e países do desfeito bloco soviético. “A WikiLeaks irá proporcionar um fórum para toda a comunidade global examinar a credibilidade, plausibilidade, veracidade e falsidade de qualquer
  • 13. 12 documento”1 (WIKILEAKS, 2007, online, tradução nossa). Todo o material recebido pela WikiLeaks seria vazado e a avaliação da veracidade seria feita por qualquer um que se interessasse pela iniciativa, colaborativamente. Na prática, o modelo de colaboração aberta da WikiLeaks não teve êxito e acabou nunca funcionando. As consequências do que podemos chamar de “efeito WikiLeaks” podem ser notadas em diversos aspectos políticos, sociais e tecnológicos, observando a questão de um ponto de vista geral. O mais evidente está relacionado ao conteúdo dos documentos divulgados por esta organização. Entre os vazamentos mais destacados pela mídia institucional, por exemplo, está a divulgação de um vídeo gravado durante uma ação norte-americana no Iraque, onde um helicóptero modelo Apache bombardeia uma região urbana e mata mais de uma dezena de civis. Entre eles, dois funcionários da agência de notícias Reuters. Sob o slogan “Nós abrimos governos”2, em 28 de novembro de 2010, a organização divulgou documentos confidenciais da diplomacia norte-americana. Intitulado pela WikiLeaks como o maior vazamento de documentos confidenciais da história, o fato ganhou o nome de Cablegate3. Segundo a WikiLeaks (2010), no total são 251.287 documentos, sendo 15.652 classificados como secretos e 101.748 como confidenciais, que datam de 1966 até o final de fevereiro de 2010 e abrangem comunicações entre 274 embaixadas em países de todo o mundo e do próprio Departamento de Estado em Washington. Tais fatos, além de causarem imensa repercussão na mídia internacional, levaram o governo norte-americano a tomar uma série de medidas contra a WikiLeaks, como ações judiciais, bloqueio do acesso ao sítio da organização em órgãos públicos e a prisão do soldado analista de inteligência, Bradley Manning, acusado de ser o responsável por repassar documentos confidenciais à WikiLeaks. Além destas repercussões diretas, o conteúdo dos vazamentos também causou reações em diversas partes do mundo, afetando as relações da diplomacia norte-americana. Conforme Trevor Timm (2011), ativista do Electronic Frontier Foundation, algumas das informações divulgadas neste vazamento influenciaram diretamente, por exemplo, na Revolução de Jasmim, manifestações insurrecionais na Tunísia, que causaram a queda do presidente Zine el-Abidine Ben Ali, no poder desde 1987. 1 Texto original: “Wikileaks Will provide a forum for the entire global community to examine any document for credibility, plausibility, veracity and falsifiability”. 2 O texto original é “We open governments”. 3 O nome Cablegate faz alusão ao episódio de “Watergate”, deflagrado por jornalistas do Washington Post, que causou a renúncia do presidente norte-americano da época, Richard Nixon, por envolvimento em esquemas de corrupção (MARCONDES FILHO, 1989). Thompson (2002, p. 239) considera que o ‘Watergate’ “adquiriu um tipo de status paradigmático, tornando-se ponto de referência (exemplificado pelo uso disseminado do sufixo gate) para muitos escândalos subseqüentes”.
  • 14. 13 Nos estágios iniciais dos protestos políticos de massa na Tunísia, o influente grupo de blogueiros tunisianos Nawaat criou um site chamado Tunileaks e divulgou amplamente os telegramas para os cidadãos do país. Os telegramas confirmaram que os EUA viam o Presidente tunisiano Ben Ali como um tirano corrupto e brutal, o que acendeu as chamas da revolução que já estava inflamada. A Amnistia Internacional creditou a WikiLeaks e seus parceiros na mídia como "catalisadores" do movimento que derrubou Ali (TIMM, 2011, online, tradução nossa)4. Assim como na Tunísia, Timm (2011) considera que os telegramas divulgados tiveram influência evidente na política de países em convulsão social como Líbia, Paquistão, Iêmem, Egito e Iraque. Na América Latina, além da repercussão direta dos telegramas pela mídia institucional, podemos apontar com destaque o livro “Wiki Media Leaks”, dos jornalistas argentinos Martín Becerra e Sebastián Lancunza (2012). Nesta publicação, os autores buscam construir, a partir dos telegramas divulgados pela WikiLeaks, uma espécie de radiografia das relações entre mídia e os governos em países latino-americanos: Como os despachos diplomáticos se concentram especialmente no período de 2004- 2009, o material liberado proporciona uma excelente oportunidade para analisar a perspectiva que, a partir dos EUA, se constrói sobre a nova e heterogênea realidade político a econômica da América Latina. Fica exposta uma irresistível trama a ser contada, apesar de que, alguns “diques”5 vinculados aos meios de comunicação têm resistido ao bombardeio de informações com extraordinária eficiência (BECERRA, LANCUNZA, 2012, p. 7, tradução nossa, grifo dos autores). 6 Desta forma, no campo da diplomacia e relações internacionais, esses vazamentos foram recebidos como uma “bomba” que ameaça reconfigurar não só o fazer da diplomacia, mas também a construção histórica a partir dela, como defende o diplomata brasileiro e doutor em ciências sociais, Paulo Roberto de Almeida (2011). Segundo ele, esses vazamentos tendem a fazer com que as informações sobre relações diplomáticas se tornem de mais difícil acesso, dificultando o trabalho de historiadores e jornalistas. A relação desta organização com o campo midiático também faz parte do nomeado “efeito WikiLeaks”. Através de parceria com grandes conglomerados de mídia como The New York Times, The Guardian, Le Monde, Al Jazeera e Der Spiegel, entre outros, os vazamentos realizados pela organização alcançaram maior visibilidade, colocando os assuntos 4 Texto original: “In the early stages of mass political protests in Tunisia, Nawaat—the influential Tunisian blogging group—set up a website called Tunileaks and widely distributed the cables to Tunisian citizens. The cables confirmed that the U.S. viewed Tunisian President Ben Ali as a corrupt and brutal tyrant and fanned the flames of the already smoldering revolution. Amnesty International would credit WikiLeaks and its media partners as ‘catalysts’ in the people’s successful ouster of Ali”. 5 Este termo apresenta um uso figurado, no sentido de ‘reserva de informação’, ao invés do seu sentido literal como mecanismo para represar águas correntes. 6 Texto original: “Como los despachos diplomáticos se concentran especialmente en el lapso 2004-2009, el material liberado brinda una magnífica oportunidad para analizar la perspectiva que, desde Estados Unidos, se construye sobre la novedosa y heterogénea realidad política y económica de América Latina. Queda expuesta una trama irresistible a ser contada, pese a lo cual, algunos diques vinculados a los medios de comunicación han resistido el aluvión de información con extraordinaria eficacia”.
  • 15. 14 na cobertura jornalística de âmbito internacional. Conforme levantamento publicado no sítio da revista norte-americana The Atlantic Wire (2011), até 25 de abril de 2011 metade dos assuntos tratados no The New York Times naquele ano se baseavam em documentos vazados pela WikiLeaks. O fato da associação de vários conglomerados de informação em torno de uma organização de mídia independente é algo novo na história dos meios de comunicação. Outro reflexo observado no campo da mídia é a apropriação do formato popularizado por esta organização. É o caso do Wall Street Journal que lançou o sítio “Safehouse” que, assim como a WikiLeaks, é uma plataforma em rede de submissão de documentos e informações com a garantia do anonimato à fonte. No Brasil, o jornal Folha de São Paulo apropriou-se inclusive de parte do nome da organização e criou o “Folhaleaks”. Outras iniciativas fora do campo das mídias institucionalizadas também replicam o modelo consagrado pela WikiLeaks, como o caso do Openleaks, sítio criado por dissidentes da WikiLeaks e que tem como objetivo oferecer uma plataforma segura de submissão de documentos a organizações não-governamentais. No Brasil, um sítio denominado WikiLeaks Brasil, aparentemente sem ligação com a organização capitaneada pelo australiano Julian Assange, mas uma espécie de homenagem, vazou no início de 2011 dados sigilosos sobre a Operação Satiagraha7, na qual o banqueiro Daniel Dantas foi preso pela Polícia Federal. A grande repercussão na mídia internacional é comprovada por pesquisa realizada no primeiro semestre de 2011 pelo instituto Ipsos, na qual 79% da amostra de cidadãos entrevistados já ouviram falar da WikiLeaks. A pesquisa, realizada em 24 países e com uma amostra de 18.829 adultos de 16 a 64 anos, demonstrou que no Brasil 54% afirmaram já ter ouvido falar da organização (IPSOS, 2011). Já em países como Suécia, Índia, Turquia, Austrália, Inglaterra, o índice fica acima dos 90%. Sobre o posicionamento dos entrevistados em relação às ações da WikiLeaks, 74% da amostra se diz a favor da organização. No Brasil, este número chega a 78%. Já nos Estados Unidos, apenas 34% apoiam a WikiLeaks. Da mesma forma, em sondagem aplicada no 12° Fórum Internacional do Software Livre (FISL)8, realizado na PUC-RS, em Porto Alegre, de 29 de junho a dois de julho de 2011, constatou-se que mais de 70% das 61 pessoas escolhidas, por acessibilidade não probabilística, para responder ao questionário, conheceram a WikiLeaks por empresas de comunicação, ou seja, através da mídia institucionalizada ou por sítios de conteúdos 7 Operação da Polícia Federal brasileira realizada em de julho de 2008. Foram presas mais de 20 pessoas acusadas de crimes financeiros, como lavagem de dinheiro, gestão fraudulenta, evasão de divisas e formação de quadrilha (G1, 2008). 8 Os dados completos podem ser conferidos no apêndice A.
  • 16. 15 noticiosos9. Entretanto, dos mais de 45% que afirmaram acompanhar informações sobre a WikiLeaks frequentemente, 60% o fazem através de blogs ou sítios colaborativos10. É possível depreender destas estatísticas a importância da mídia institucionalizada na popularização da WikiLeaks. Em contrapartida, os dados também apontam que, entre a amostra determinada, boa parte do acompanhamento das informações sobre a organização se dá fora do eixo midiático tradicional. A amostra desta sondagem, como referido, foi composta aleatoriamente e é formada predominantemente por profissionais e estudantes da área de tecnologia da informação, de diversas nacionalidades, sendo que mais de 80% respondeu ter entre 21 e 35 anos de idade. Sobre a imagem que a organização detém, mais de 80% da amostra disse ter uma visão positiva, 18% afirmaram ser indiferentes e apenas 1,6% disse ter uma visão negativa da organização. Outro dado interessante desta sondagem é que mais de 80% da amostra se disse disposta a colaborar com a WikiLeaks e 54% fariam algum tipo de doação à organização. Os dados citados apontam que, dentro da referida amostra, a organização goza de boa imagem, a ponto de alcançar um elevado número de possíveis colaboradores. A colaboração é um dos pilares das ações diretas (realizadas por ela própria) e indiretas (manifestações de apoio) da WikiLeaks. Quando questionados sobre quais termos melhor qualificariam as ações realizadas pela organização, “liberdade de informação” foi marcado em 80% dos questionários, “ciberativismo” em 29%, “jornalismo” também em 29%, “hackativismo” em 18% e “espetacularização” em menos de 5%. O termo “crime”, que também estava disponível no questionário de múltipla escolha, não foi assinalado. Esses dados mostram uma associação muito forte do nome da organização com o termo abstrato de “liberdade de informação”. Tal assertiva também pode ser observada nas vozes sociais captadas pelos noticiários. Duas figuras representativas da política brasileira utilizaram o nome da organização para ilustrar “divulgação de documentos sigilosos”. Em 14 de junho de 2011, o presidente do Senado brasileiro, José Sarney, ao se posicionar contra a Lei de Acesso à Informação Pública, afirmou: “Acho que nós não podemos fazer o WikiLeaks da história do Brasil, da construção das nossas fronteiras” (BONIN, 2011, online). Tratando sobre esse assunto, o ex-presidente da República e atual senador pelo estado de Alagoas, Fernando Collor, declarou da tribuna do Parlamento em 22 de agosto de 2011: 9 O questionário aplicado pode ser consultado no apêndice B. 10 Publicações na rede desvinculadas e alternativas aos grandes portais noticiosos, geralmente alimentadas por um ou mais indivíduos.
  • 17. 16 “Trata-se, na prática, de uma espécie de oficialização do WikiLeaks, com todos os seus inconvenientes e perigos, inclusive diante de possíveis e prováveis ações de hackers” (SENADO FEDERAL, 2011, online). Os dois trechos reproduzidos demonstram uma consonância com os dados da amostra da sondagem, apesar de suas motivações parecerem opostas. No caso das afirmações de Collor e Sarney, a utilização do termo carrega um tom pejorativo. Entretanto, tais dados demonstram uma possível cristalização da associação entre vazamentos de documentos e a organização WikiLeaks. No caso da amostra da sondagem, esta associação também está diretamente ligada ao potencial de colaboração, demonstrando uma visão positiva ao associar majoritariamente a organização com o termo abstrato “liberdade de informação”. Outro reflexo evidente do “efeito WikiLeaks” é a popularização de mobilizações ciberativistas descentralizadas, diversas delas em apoio à organização11. A Revista Info (2011) afirmou que a onda de ataques a sites por grupos determinados, que teve seu auge no meio de 2011, começou em 2010 com a prisão de Assange. O grupo de difícil definição autointitulado “Anonymous”12 realizou uma série de ataques em favor da WikiLeaks. Os alvos principais foram entidades financeiras como PayPal, Visa e MasterCard, que bloquearam as contas da WikiLeaks, inviabilizando as doações que mantêm a organização. O “Anonymous” surgiu e passou a atuar antes da WikiLeaks ganhar notoriedade no cenário internacional. Entretanto, segundo a Revista Info (2011), após os acontecimentos com a WikiLeaks o grupo passou a ter um posicionamento mais político. No Brasil, estas manifestações encontraram principal alvo nos sites governamentais e tiveram autoria assumida pelo grupo LulzSec Brasil. Não se pode fazer uma ligação direta entre estas manifestações, que atingiram diversas partes do mundo, e as ações da WikiLeaks, mas é evidente que este tipo de ciberativismo ganhou notoriedade e se popularizou com os protestos em favor da organização comandada por Julian Assange. Estas três faces do que optamos por chamar de “efeito WikiLeaks” demonstram a importância deste objeto de pesquisa. Trata-se de uma problemática nova e complexa, exigindo do pesquisador maior cuidado ao abordá-la. De outra maneira, acreditamos que este estudo, ao analisar um tipo emergente de prática social, pode contribuir com construções teóricas que venham a fomentar o crescente debate em torno do ciberativismo dentro do 11 Esta relação será melhor abordada no primeiro e quarto capítulos. 12 A relação entre WikiLeaks e Anonymous é melhor definida no item 4.1.1, do quarto capítulo.
  • 18. 17 campo da cibercultura. Campo este que se expandiu na última década, alcançando legitimidade na pesquisa brasileira (AMARAL; MONTARDO, 2012). Acreditamos que a contribuição do nosso estudo pode ser mais efetiva ao tratar da dimensão do discurso nas práticas ciberativistas, abordagem pouco realizada na pesquisa brasileira sobre o tema. Esse fato foi constatado em levantamento do estado da arte da pesquisa sobre ciberativismo no Brasil, realizado com o objetivo de mapear as características deste campo de estudo (ARAÚJO, 2011). Após a análise de conteúdo de três grandes bases de dados da pesquisa brasileira, constatou-se a predominância de trabalhos com área de origem no campo da comunicação (ARAÚJO, 2011), tendência em boa parte do campo da cibercultura, como constatam Amaral e Montardo (2012). Quanto ao período de produção dos trabalhos, 18,2% foram elaborados entre 2000 e 2003, 45,5% entre 2004 e 2007 e 36,3% entre 2008 e 2010 (AMARAL; MONTARDO, 2012). As porcentagens mostram que realmente o início e a consolidação da pesquisa em ciberativismo se deram na primeira década do século XXI, período estudado no levantamento do estado da arte desta pesquisa. Em relação ao objeto de pesquisa dos trabalhos analisados, elaboraram-se seis categorias de acordo com as abordagens realizadas. A maior parte abordou iniciativas ciberativistas pelas suas ferramentas. Pelo menos oito trabalhos realizaram esta abordagem, como, por exemplo, o estudo da utilização ciberativista do YouTube (ANTOUN, 2001; PIMENTA, 2004; RIGITANO, 2004; PIMENTA, SOARES, 2006; DOMINGUES, 2007; BRESSAN, 2007; ROSAS, 2008). Em seguida, aparecem os trabalhos que estudaram a utilização da rede por organizações pré-internet (CAMPOS, 2006; PIMENTA, RIVELLO, 2008; FONSECA, 2009; MARZOCHI, 2009) e as discussões teóricas sobre ciberativismo, cada uma das categorias com quatro trabalhos (BRETAS, 2005; SELAIMEN, 2009; GUIMARÃES, 2006; PIMENTA, 2005). O estudo de mobilizações específicas, como protestos e campanhas, representou três trabalhos (CAVALCANTI, 2002; LORENA, 2007; CAPUTO, 2008), enquanto sobre o estudo das organizações comunitárias ativistas foram encontrados dois trabalhos (SCHWINGEL, 2003; FREIRE, 2007). O estudo do discurso ciberativista representou apenas um trabalho (CARVALHO, 2002). Os dados encontrados no referido levantamento estão em consonância com as afirmações de Amaral e Montardo (2010), em estudo exploratório comparativo sobre a produção científica em cibercultura no Brasil e nos Estados Unidos. Uma das categorias estudadas foi justamente o ciberativismo. A pesquisa registrou que no corpus de análise brasileiro foi encontrado um número pequeno e decrescente de artigos sobre o ciberativismo. No entanto, no corpus de análise de caráter internacional, houve um crescimento significativo
  • 19. 18 de publicações sobre o tema, tornando-se a categoria mais abordada pelos artigos entre os anos de 2007 e 2009. Segundo as autoras, a razão de tal crescimento pode se dar “em função das discussões acerca das políticas das tecnologias de comunicação e seu potencial de democratização ou não” (AMARAL E MONTARDO, 2010, p. 70). De outra forma, em estudo recente, em que analisaram as produções científicas nos quatro anos do Simpósio da Associação Brasileira dos pesquisadores em Cibercultura, Amaral e Montardo (2012) identificaram um número constante e crescente de artigos sobre ciberativismo, de diversas áreas do conhecimento. Diante do panorama exposto pelos dados encontrados no levantamento citado (ARAÚJO, 2011) e nos estudos de Amaral e Montardo (2010, 2011, 2012), são possíveis algumas inferências sobre a pesquisa em ciberativismo no Brasil. Apesar de representar um número relevante de trabalhos, acreditamos que a produção brasileira sobre o tema está abaixo do nível constatado no panorama internacional. Parte significativa dos trabalhos estudados é produzida por pesquisadores já consagrados na temática, demonstrando pouca renovação e pouco surgimento de novos pesquisadores no assunto. Também nota-se, na maioria dos trabalhos, fraco debate sobre o conceito de ciberativismo, consagrando uma ideia comum, mas não problematizada. Cabem também aqui, como justificativas para realização do presente estudo, as motivações pessoais do pesquisador, que se interessa pelas novas dinâmicas comunicacionais proporcionadas pela popularização do suporte digital. Tal interesse se dá desde o trabalho de conclusão do curso de jornalismo, apresentado em dezembro de 2008 na Universidade Federal de Santa Maria, em que estudou os blogs, propondo um roteiro de análise baseado na sistematização das ferramentas deste tipo de mídia digital (ARAÚJO, 2009). Por fim, acreditamos que o presente estudo contempla características importantes do Mestrado em Processos e Manifestações Culturais, como a interdisciplinaridade e a inovação. A interdisciplinaridade está presente na intersecção de abordagens das ciências sociais aplicadas com a linguística, através da análise do discurso de base semiolinguística, procedimento essencialmente interdisciplinar, importante para o desenvolvimento deste estudo. Da mesma forma, a inovação, caracterizada no estudo através da escolha do objeto e do ciberativismo como temática de abordagem. Pensamos que nosso estudo pode contribuir com o campo do ciberativismo, estando de acordo com o objetivo principal de um programa de pós-graduação, que é fomentar o avanço da ciência através das produções discentes. Além disso, consideramos que este estudo está de acordo com a linha de pesquisa em “Linguagens e processos comunicacionais”, que tem como principal objetivo investigar os
  • 20. 19 fenômenos culturais por meio das linguagens, principalmente das mídias contemporâneas e das tecnologias da informação e da comunicação. Assim, este estudo, ao deter-se sobre a utilização do discurso como prática de um fenômeno típico da cibercultura, como o ciberativismo, encontra-se de acordo com sua linha de pesquisa. Então, após listar as justificativas que conduzem este estudo, apresentamos como objetivo geral analisar de que maneira a organização WikiLeaks constrói seus discursos em suas ações ciberativistas. Da mesma maneira, buscamos como objetivos específicos compreender qual o papel do discurso no ciberativismo, tendo a internet como situação extralinguística; apontar como se dá a encenação discursiva no âmbito da organização WikiLeaks; e, por fim, discutir e problematizar o conceito de ciberativismo, no sentido de apontar uma proposição adequada deste fenômeno social, conforme o nosso entendimento. Em relação às escolhas metodológicas, como já é claro, esta se trata de um estudo qualitativo. Optamos por uma perspectiva descritiva composta por três fases integradas de estudo. Inicialmente, partimos ao estudo bibliográfico (construído pelo levantamento do estado da arte da pesquisa em ciberativismo e construção do aporto teórico) e às sondagens empíricas do objeto de pesquisa (pela observação de suas diversas facetas e da sondagem realizada no 12° Fórum Internacional do Software Livre (FISL), citada neste item introdutório). Em um segundo momento, passamos a seleção intencional do corpus de estudo, onde foram escolhidas três unidades de análise, que são a página inicial do sítio da WikiLeaks, durante o mês de maio de 2012; a produção audiovisual “What Does it Cost to Change the World?” publicada no sítio Vímeo; e a página no Facebook da organização. Para esta última, em virtude da abundância de possíveis textos a serem analisados, optamos pela aplicação da metodologia Teoria Fundamentada, buscando criar categorias e assim identificar que construções discursivas mais acrescentariam a este estudo. Por fim, passamos ao estudo dos dados coletados, que é conduzido pela análise do discurso de base semiolínguística e das demais categorias teóricas que serão apresentadas nos três primeiros capítulos. O primeiro capítulo deste estudo representa uma reflexão sobre os conceitos de ciberativismo. Ao final do primeiro item deste capítulo, propomos uma conceituação de ciberativismo baseada na intersecção de diversos conceitos. Também realizamos neste capítulo uma retomada histórica das ações ciberativistas, agrupando-as em quatro grandes momentos demarcados pela própria história da internet. Por fim, trazemos as principais tipologias deste objeto de estudo.
  • 21. 20 Após considerarmos o ciberativismo como fenômeno social imanente à internet, apresentamos o surgimento e o desenvolvimento desta tecnologia, com o objetivo de compreender como se tornou uma rede sem centro, distribuída, que ao mesmo tempo em que diminui as hierarquias, impõe uma regulação nunca antes vista. Abordamos neste capítulo os conceitos de protocolo, de acordo com os estudos de Alexander Galloway (2004, 2007, 2010). Ao tentar compreender como o controle se exerce ao ciberativismo, passamos a discussão dos conceitos de biopoder e biopolítica diante dos novos aparatos de controle, a partir de Galloway (2004), em uma perspectiva foucaultiana. Após estabelecer esta discussão, apresentamos a reinterpretação do conceito de biopolítica por Hardt (2005) correlacionando-o com o ciberativismo. Por fim, apresentamos a concepção de poder em rede para Castells (2009) que, a partir do entendimento de que o formato estrutural da rede passa a permear as formas de organização social, considera que as formas de poder estão nas capacidades de criação/programação de redes e a conexão entre elas. O terceiro capítulo apresenta a semiolinguística, como disciplina de estudo do discurso que compreende o dito como um arranjo entre vozes sociais e intencionalidade individual (CHARAUDEAU, 2004, 2005, 2006, 2008, 2010; BARBISAN et al., 2010; MACHADO, 1996, 1998, 2001; FREITAS, 2009). Desta forma, apresentamos as principais construções conceituais referentes à semiolinguística, como o ato de linguagem, o contrato de comunicação, as visadas discursivas, os modos de organização do discurso, o discurso das mídias, etc. No quarto capítulo, o objeto de estudo é apresentado através de uma revisão bibliográfica e aproximação das categorias teóricas conceituadas nos itens anteriores. Neste capítulo detalhamos os pressupostos metodológicos deste estudo. Por fim, no quinto capítulo apresentamos a análise dos corpora de estudo. Após esta análise dos dados, são feitas as considerações finais da presente pesquisa, norteadas pelo seu objetivo geral e em função das categorias teóricas apresentadas nos três primeiros capítulos.
  • 22. 21 1. CIBERATIVISMO: FENÔMENO IMANENTE À REDE Imbuídos da perspectiva ecológica de pensamento sobre a relação do ser humano com seus artefatos tecnológicos, consideramos o ativismo como fenômeno social imanente às redes telemáticas como a internet. Como bem coloca Sérgio Amadeu da Silveira (2010, p. 31), o ativismo “influenciou decisivamente grande parte da dinâmica e das definições sobre os principais protocolos de comunicação utilizados na conformação da Internet”. Isto é, prática social e tecnologia se entrelaçam em uma relação de mutua influência, como veremos ao longo deste capítulo. Ao tratá-lo como fenômeno social emergente, mas imanente ao processo que deu origem a internet, buscamos neste capítulo conceituar exatamente o que compreendemos como ciberativismo. Apresentamos diversos entendimentos em relação a esse fenômeno social, condensando, ao fim, uma proposta adequada a este estudo. Para compreender seu surgimento, assim como os reflexos de suas práticas na evolução da rede, realizamos um apanhado histórico das principais expressões do ciberativismo. Por fim, apresentamos as variadas tipologias desse fenômeno social. Antes de iniciarmos a discussão sobre o conceito de ciberativismo, é importante considerar que em nenhum momento a organização objeto deste estudo, a WikiLeaks, se autointitulou como ciberativista, preferindo predicados como “organização não profissional de mídia”. Entretanto, ao refletir sobre a definição do que consideramos como ciberativismo, exposta ao longo deste capítulo, observamos nas ações da WikiLeaks pontos relevantes para a análise proposta, principalmente em relação à construção coletiva da visibilidade de suas ações. 1.1 O CONCEITO DE CIBERATIVISMO A definição sobre que práticas designa o termo ciberativismo não encontra construção teórica consolidada no campo de estudos da cibercultura. Apesar do atual crescente número de trabalhos sobre este tema (AMARAL, MONTARDO, 2012), não é grande o número de autores que se detêm de alguma forma na discussão do que consideram como ativismo em rede, webativismo, netativismo ou ciberativismo (termos, neste estudo, adotados como sinônimos) (ARAÚJO, 2011). É possível considerar que um dos entendimentos sobre ciberativismo mais difundido é o encontrado na obra de McCaughey e Ayers (2003 apud RIGITANO, 2005), que o
  • 23. 22 consideram como a presença do ativismo político na internet. Entretanto, como assevera Silveira (2010), com a expansão e complexificação do uso da internet – ampliando possibilidades de atuação em rede –, o leque de causas defendidas, assim como as formas de apropriação dessas possibilidades, reconfiguram-se e se expandem. Por isso, consideramos limitada a compreensão do ciberativismo como a manifestação do ativismo político através da internet. Esse entendimento traz consigo uma separação entre práticas sociais online e offline. Ou seja, considera as práticas do ciberativismo como apenas a migração de fenômenos sociais para as novas formas de comunicação em rede e não a ressignificação dessas práticas, diante da apropriação realizada pelos atores sociais. Esta concepção é característica do princípio dos estudos qualitativos sobre a internet, como retomam Adriana Amaral, Suely Fragoso e Raquel Recuero (2011). Conforme já apresentado no princípio deste capítulo, Silveira (2010, p. 31) observa o ciberativismo na conformação da internet, influenciando decisivamente as definições técnicas e sociais que a tornaram o que conhecemos hoje. A definição de ciberativismo usada por Silveira (2010) identifica-o como o conjunto de práticas realizadas em redes cibernéticas em defesa de causas específicas, sejam elas políticas, ambientais, sociotécnicas, etc. A abrangência desta conceituação mostra a relevante preocupação de Silveira (2010) em reconhecer a pluralidade de expressões desta prática, principalmente diante do atual espectro ideológico, que não mais proporciona definições estanques, como no mundo industrial (SILVEIRA, 2010). Ao colocar o ciberativismo na gênese da própria internet, Silveira (2009, p. 104) se refere ao processo peculiar que deu origem ao modelo não proprietário pelo qual a conhecemos atualmente, principalmente por ter sido construída colaborativamente por grupos de voluntários que no decorrer de sua história foram envolvendo, além dos acadêmicos e hackers, engenheiros e especialistas de várias empresas, para construírem os elementos fundamentais do funcionamento da rede, a saber, os seus protocolos de comunicação. As características do modelo pelo qual se constitui a internet são justamente o que proporciona o poder comunicativo que serve ao ciberativismo. Como coloca Silveira (2011a) em texto posterior, ao mesmo tempo em que o modelo trazido pela internet representa um grande arranjo de técnicas de controle, apontado como símbolo máximo do patamar social chamado por Gilles Deleuze (1992) de “Sociedade de controle”13, provê a expansão do poder comunicacional através da grande interatividade, velocidade e dispersão da comunicação. 13 Conteúdo melhor explicado no segundo capítulo.
  • 24. 23 Com isso, o ciberativismo age pela utilização radical de possibilidades como as redes distribuídas, o anonimato, e o novo campo de visibilidade social pela comunicação em rede. Esse posicionamento de Silveira (2011a) em relação à tensão entre controle e liberdade no ciberativismo é semelhante ao apresentado por Henrique Antoun e Fábio Malini (2010, 2012). Esses autores compreendem a internet como um campo social em que a liberdade é disputada e que atuação social, mobilização e engajamentos são valores inerente à rede. Esta liberdade é considerada, pragmaticamente, como os mecanismos e atos autônomos de cooperação através da rede. O que optamos chamar neste trabalho de ciberativismo é tratado por Antoun e Malini (2010) como a biopolítica da rede, em contraposição ao biopoder, como será melhor abordado no próximo capítulo. Esse posicionamento remete à reinvenção do conceito de Michel Foucault por Antonio Negri e o seu aprimoramento por autores posteriores. Essa biopolítica evocada por Antoun e Malini (2010) configura-se como a capacidade da vida governar-se. Ou seja, ela se exerce como uma liberdade positiva na atividade dos usuários ao construírem de forma singular um campo mais extenso de significados dos acontecimentos sociais. Isso se entrelaça com novas narrativas que esmiúçam fatos, ideias, dados, imagens, que ampliam a capacidade da rede de revelar sentidos que até então eram negociados na lógica do gatekeeper14 da mídia tradicional (ANTOUN; MALINI, 2010). Nesta perspectiva, a biopolítica da rede constitui-se como a forma pela qual manifestações autônomas conseguem exceder os controles e bloqueios da rede (ANTOUN; MALINI, 2010). Em outras palavras, a biopolítica consiste em fazer uma utilização ativista da internet, colocando suas ferramentas a favor de disputas travadas neste suporte. Apesar de não trabalhar com o termo ciberativismo, a obra de Manuel Castells (1999; 2001; 2003; 2009) é repleta de apontamentos relevantes sobre a utilização da tecnologia em disputas sociais. Castells (2003) aborda tal utilização pelo viés dos movimentos sociais, considerando suas mudanças até o momento em que conceitua como “sociedade em rede”15. A noção de “ativista” como um indivíduo engajado em uma disputa simbólica é contemplada na obra de Castells (2003), principalmente ao se referir aos movimentos mais recentes. Em sua obra “O poder da identidade”, Castells (2001) detalha melhor as características dos movimentos sociais em atividade no que chama de sociedade em rede. Ao desenhar 14 Termo largamente usado nos estudos de comunicação para caracterizar a edição dos meios de comunicação de massa, a escolha do que será veiculado. Segundo Nelson Traquina (1999), o termo foi criado pelo psicólogo Kurt Lewin, em artigo de 1947. Entretanto, sua aproximação com o campo da comunicação se deve a David Manning White (TRAQUINA, 1999). 15 Tal definição será apresentada no item 2.4 do próximo capítulo.
  • 25. 24 conceitualmente o panorama desse novo estágio social, Castells (2001) salienta a premência da identidade como principal significado em um contexto de desestruturação de instituições e de manifestações culturais marcadas pela efemeridade. Esse diagnóstico também é apresentado por Stuart Hall (1999): ele aponta um processo de enfraquecimento das velhas identidades e o surgimento de novas que fragmentam o antes unificado indivíduo moderno. A partir disto, as identidades passam a ser construídas pelos indivíduos ao longo de suas vidas. Compreender o panorama das identidades no atual estágio social é fundamental para o entendimento da lógica dos movimentos ciberativistas. Conforme lembra Castells (2001), é através das práticas, principalmente das práticas discursivas, que estes movimentos constroem sua autodefinição, ou seja, sua identidade a ser compartilhada entre seus apoiadores. Diante disto, Castells (2001) propõe como método de análise destes movimentos a utilização das categorias da tipologia clássica de Alain Touraine, que já na década de 1970 as definiu baseada em três fatores principais: identidade do movimento, o adversário do movimento e a visão ou modelo social do movimento, que aqui denomino como meta societal. Em minha adaptação (que acredito estar coerente com a teoria de Touraine), identidade refere-se à autodefinição do movimento, sobre o que ele é, e em nome de quem se pronuncia. [...] Meta societal refere-se à visão do movimento sobre o tipo de ordem ou organização social que almeja no horizonte histórico da ação coletiva que promove (CASTELLS, 2001, p. 95). Essa tipologia utilizada por Castells (2001) propõe uma análise totalmente calcada nas construções discursivas destes movimentos. Seja diante da construção de sua máscara discursiva (autodefinição, identidade) (CHARAUDEAU, 2008), de sua meta de mudança social ou mesmo pela afirmação do adversário do movimento. Todas essas categorias de análise retomadas por Castells (2001) podem ser identificadas através da análise das construções discursivas desses movimentos ciberativistas. A definição proposta por Castells (2001) se baseia em um método de estudos de grupos organizados, principalmente os denominados movimentos sociais. Entretanto, ao abordar o ciberativismo, vê-se um espectro mais amplo e complexo de formas de mobilização. Isto pode fazer com que as categorias propostas por Castells (2001) não se apliquem a determinados movimentos ciberativistas. David de Ugarte (2008), em seu livro “O poder das redes”, caracteriza as novas tecnologias de comunicação como protagonistas de uma mudança de estrutura de poder. Para o autor (2008), a abertura do polo de emissão no ciberespaço cria um meio global de comunicação capaz de suplantar a edição da mídia institucionalizada, o gatekeeping. É marcada na obra do autor a ideia de que a internet devolve aos indivíduos um poder
  • 26. 25 comunicacional monopolizado pela comunicação de massa. Na sua concepção de ciberativismo, Ugarte (2008) enfatiza-o como uma disputa por visibilidade social, facilitada pela popularização da conexão à internet e posterior ampliação das possibilidades interativas. Ugarte (2008), sem entrar em detalhes técnicos sobre a infraestrutura da rede16, atribui à forma de comunicação distribuída a força de fenômenos sociais emergentes como o ciberativismo. Assim, a premissa básica de Ugarte (2008) é que passamos de um fluxo comunicacional descentralizado para um fluxo distribuído, diminuindo o poder dos conglomerados de mídia: O ciberativismo é uma estratégia para formar coalizões temporais de pessoas que utilizando ferramentas dessa rede, geram a massa crítica suficiente de informação e debate, para que este debate transcenda à blogosfera e saia a rua, ou modifique, de forma perceptível o comportamento de um número amplo de pessoas (UGARTE, 2008, p. 111). Assim, para Ugarte (2008, p. 55), esta nova dinâmica comunicativa, formada pela multiplicidade de agentes autônomos, coordena-se espontaneamente sem necessidade de um centro. O autor chama tal dinâmica de swarming17, ou seja, uma formação espontânea sem planificação aparente, considerada “letal para os velhos elefantes organizacionais”. Nesse sentido, Ugarte (2008) acredita que fenômenos sociais como o ciberativismo se potencializam diante da ampliação da autonomia individual. Para isto, o autor atribui à identidade o status de elemento chave destas mobilizações em redes distribuídas. A partir desta compreensão, Ugarte (2008) defende que o ciberativismo, atualmente, é composto de três vias principais unidas pelo que o autor chama de “empoderamento individual”: discurso, ferramentas e visibilidade. O discurso, chamado por Ugarte (2008, p. 57) de “hacking social18”, além de propiciar uma gama de significados sociais alternativos à mídia de massa, também é apontado como responsável pelo estabelecimento dos componentes identitários classificados como fundamentais diante do ambiente distribuído da internet. Ou seja, a efetividade das ações ciberativistas diante do diagrama da rede distribuída depende do engajamento de indivíduos desconhecidos. Esse engajamento se dá quando há identificação com a imagem discursiva construída através das enunciações ciberativistas: 16 Ao contrário de Ugarte (2008), consideramos fundamental a abordagem destes ‘detalhes técnicos’. Proposemos tal reflexão no segundo capítulo. 17 Podemos traduzir tal termo por “enxameamento”. 18 O termo hacker será aprofundado neste capítulo. No sentido empregado pelo autor neste momento, hacking está ligado à ideia de reconfiguração social, ou seja, o discurso ativista em redes distribuídas como uma forma de reconfiguração das vozes sociais que circulam na sociedade.
  • 27. 26 Por isso, toda essa lírica discursiva traz implícito um forte componente identitário que facilita, por sua vez, a comunicação entre pares desconhecidos sem que seja necessária a mediação de um “centro”, ou seja, assegura o caráter distribuído da rede e, portanto, sua robustez de conjunto (UGARTE, 2008, p. 57, grifo do autor). Já as ferramentas, apontadas por Ugarte (2008) como uma das três vias fundamentais do ciberativismo, surgem da ideia do “faça você mesmo”. Baseada no ideário da cultura hacker, a criação de ferramentas em prol de ações ciberativistas podem ser caracterizadas como a essência do hacktivismo, uma das tipologias de ciberativismo, como será exposto no decorrer deste capítulo. Por fim, a visibilidade é conceituada por Ugarte (2008) como o objetivo de luta permanente desses movimentos. Como foi referido, o ciberativismo para Ugarte (2008) representa uma estratégia de busca da inclusão de determinados temas na pauta do debate público. A partir do entendimento desse tripé de sustentação do ciberativismo (discurso, ferramentas e visibilidade), Ugarte (2008, p. 58) define o ciberativista como “alguém que utiliza a Internet [...] para difundir um discurso e colocar à disposição pública ferramentas que devolvam às pessoas poder e a visibilidade que hoje são monopolizadas pelas instituições”. Assim o autor retoma e enfatiza a ideia do ciberativismo como disputa pela inclusão de determinadas pautas no agendamento público. Samira Feldman Marzochi (2009), em tese de doutorado em sociologia que teve como corpus de análise a ONG Greenpeace, vê o ciberativismo sob o prisma da cidadania. Cabe lembrar, como faz Marzochi (2009), que geralmente este conceito está ligado à participação dentro de um Estado. Neste caso, a autora frisa que o termo é usado no sentido de pertencimento a um determinado grupo social. Assim, diante das novas formas de mobilização possibilitadas pela rede mundial de computadores, a autora considera que o ciberativismo pressupõe uma nova cidadania, chamada por ela de “cibercidadania”. Trata-se de uma ligação social que extrapola as fronteiras nacionais. Assim, o ciberativismo representa “uma nova cultura de ligação individual com o mundo [...] O universo deste novo ser político, o cibercidadão, é a Terra em sua existência material e finita” (MARZOCHI, 2009, p. 286). Como apresenta Poster (2004, p. 324), atualmente a figura do cidadão reúne “a individualidade autônoma da modernidade e o tradicionalismo pós-moderno da política da identidade”, configurando uma mistura desajeitada e inadequada às novas formas políticas emergentes na comunicação distribuída em escala global. Nessa perspectiva, Poster (2004) vê emergir, com a internet, formas políticas pós-nacionais, através de movimentos – muitas
  • 28. 27 vezes – dissociados de identidades geográficas, mas identificados com territorialidades virtuais. Ao compreender os conceitos de ciberativismo explanados anteriormente, propõe-se a definição a ser adotada para o presente estudo. Dessa maneira, consideramos ciberativismo o conjunto de práticas realizadas em redes cibernéticas, com o objetivo de ampliar os significados sociais através da circulação na rede de discursos e ferramentas capazes de colaborar na defesa de causas específicas. Trata-se de uma nova cultura de mobilização, mais difusa e abrangente, que tem sua força baseada na ação coletiva. Retomaremos a discussão a respeito deste conceito ao final do próximo item, quando relacionaremos a conceituação proposta com os aspectos contextuais retirados de um apanhado histórico do ciberativismo. Através da revisão bibliográfica em estudos sobre este tema, são apresentados os principais episódios que possam colaborar com o entendimento de como este fenômeno social consolidou-se diante dos avanços da tecnologia que lhe dá suporte. 1.2 BREVE HISTÓRICO DO CIBERATIVISMO Apesar de considerarmos imanente à própria internet (SILVEIRA, 2010), este fenômeno social passou a ser chamado de ciberativismo19 nas duas últimas décadas. Conforme Érico Gonçalves de Assis (2006), mesmo o termo “ativismo” passa a figurar recentemente nos textos acadêmicos. Segundo o autor (2006), baseado nos estudos de Tim Jordan20, este fato poderia ser explicado pela adoção do termo por grupos norte-americanos e europeus, com o suposto objetivo de escapar da carga social dos significados de “revolucionário” e “radical”. Já o prefixo ciber, conforme retoma Montardo (2004), vem da cibernética, palavra popularizada pelos estudos do matemático Norbert Wiener. Desde então, o prefixo vem sendo utilizado para compor nomes de diversas faces da relação entre a sociedade e suas tecnologias. É exemplo disto a própria cibercultura, que engloba a diversidade de aspectos culturais potencializados pelas novas tecnologias. 19 Ou termos equivalentes como “netativismo”, “webativismo” e “ativismo em rede”, neste estudo tratados como sinônimos. 20 Autor da publicação “Activism!: Direct Action, Hacktivism and the Future of Society” de 2002.
  • 29. 28 1.2.1 Das listas de discussão à Desobediência Civil Eletrônica Conforme o pesquisador Stefan Wray (1998), as primeiras ações práticas de ativismo através da utilização de computadores em rede, como conhecemos hoje, surgem em meados da década de 1980, ao que chama de “pré-história da web”. Wray (1998, online, tradução nossa) cita como primeira ação concreta de ativismo a criação do PeaceNet, em 1986: “pela primeira vez - ativistas políticos comunicaram-se uns com os outros através de fronteiras internacionais com relativa facilidade e velocidade”21. Tratava-se de uma rede internacional de pacifistas e ativistas políticos que trocavam mensagens através dos mecanismos das redes telemáticas. Esse ambiente comunicativo baseado em troca de mensagens em texto persistiu, segundo Wray (1998), até 1995, quando os primeiros programas de navegação na web foram introduzidos. Até então a internet representava apenas um espaço comunicativo, em que informações eram trocadas de maneiras mais eficiente pelo suporte digital. Como a PeaceNet e diversas outras redes criadas na mesma época, a tecnologia tornava mais eficiente a organização e troca de informações entre ativistas de todo o mundo. Wray (1998) destaca que a comunicação por e-mail, assim como o uso de aparelhos como fax, teve papel importante no contexto internacional de mobilizações ainda no fim dos anos 1980, sendo destaque nas lutas de estudantes chineses pró-democracia e no movimento transnacional que levou a dissolução da União Soviética. Entretanto, apenas a partir do fim da década de 1990, surgem as primeiras ações diretas de ativismo no ambiente de rede. Estas ações estavam ligadas ao que foi chamado de "Desobediência Civil Eletrônica". Segundo Wray (1998), tal ideário de mobilização através das novas ferramentas tecnológicas foi baseado na “Desobediência Civil”, termo criado por Henri David Thoreau, em texto de 1849, que designa a utilização de ações simbólicas pacíficas nas mobilizações, como ocupações de prédios e trancamento de vias. Conforme Wray (1998, online, tradução nossa), a Desobediência Civil Eletrônica, “como uma massa eletrônica descentralizada de ação direta, utiliza bloqueios e ocupações virtuais”22. A adaptação das ideias já centenárias de mobilização de Thoreau ao contexto dos novos ambientes de sociabilidade como a web, segundo Wray (1998), foi realizada em 1994 pelo grupo de artistas e teóricos chamado Critical Art Ensemble. Em dois livros, o grupo 21 Texto original: “for the first time - political activists to communicate with one another across international borders with relative ease and speed”. 22 Texto original: “as a form of mass decentered electronic direct action, utilizes virtual blockades and virtual sit-ins”.
  • 30. 29 tratou de apresentar hipóteses de como aplicar as práticas de desobediência civil na infraestrutura da internet. No entanto, até 1998 a Desobediência Civil Eletrônica não passava de proposições teóricas. Desta forma, Wray (1998) afirma que em dezembro de 1997, após o massacre de Acteal em Chiapas, no México23, pela primeira vez passou-se a um ativismo de posição híbrida entre a utilização da internet como um meio de comunicação e como um ambiente de ação direta. Conforme Maria de Lourdes Balbinot de Lamônica Freire (2007), foi realizado um protesto na internet em que foi construído um monumento virtual às vítimas do massacre. Freire (2007, p.76) explica o funcionamento do considerado primeiro ato de Desobediência Civil Eletrônica: Nesse monumento [...] contava quem eram as pessoas que haviam morrido e porque foram massacradas. No servidor que hospedava o site-monumento foi colocado um aplicativo criado por Brett24 para contar o número de pessoas que visitavam o site. A cada visitante que acessava o site o aplicativo enviava um sinal eletrônico à presidência mexicana. Esse sinal batia à porta do endereço virtual do presidente Zedillo e pedia o mesmo documento. Depois de milhares de visitantes fazendo isto, durante quatro horas, o sistema do site presidencial entrou em colapso e travou. Assim, no início de 1998 surge uma das primeiras ações realmente diretas no uso da infraestrutura da internet que, conforme Wray (1998), foi o software FloodNet. Assim como o protesto contra o massacre de Acteal, este programa de computador foi criado pelo grupo Electronic Disturbance Theater, um dos primeiros coletivos a se autodenominar “ciberativista”. O FloodNet consistia na ocupação virtual de sítios “inimigos” através da sobrecarga de solicitações. Dessa maneira, este grupo convidou usuários da internet a participaram de uma ocupação virtual contra o governo mexicano. Wray (1998) avalia que o FloodNet teve capacidade mais simbólica que prática, já que raramente alcançou o objetivo de impedir o acesso aos sítios inimigos. Entretanto, estas ações de Desobediência Civil Eletrônica iniciadas no fim da década de 1990 representam o princípio de uma forma de ciberativismo recorrente no contexto atual. São exemplos disso os Protestos de Negação de Serviço (DDOS)25, em que se faz exatamente o que se buscava com o FloodNet, ou seja, ocupação simbólica de um certo espaço virtual. Como define Richard Stallman (2011, online), ativista do software livre fundador da Free Software Foundation26, tais protestos não buscam invadir um espaço privado, mas sim, 23 Massacre em que 45 indígenas foram mortos por grupo paramilitar contrário ao Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN) (BBC, 2002). 24 Trata-se de Brett Stalbaum, um dos criadores do Critical Art Ensemble. 25 Sigla da definição em inglês: Distributed Denial of Service. 26 Fundação do Software livre.
  • 31. 30 “eles entram pela porta da frente de uma página, que simplesmente não é capaz de suportar tantos visitantes ao mesmo tempo”. Esta definição de Stallman foi proferida em um contexto de protestos de negação de serviço que o grupo autointitulado “Anonymous” fez durante o ano de 2011 em favor da WikiLeaks, após o bloqueio financeiro à organização por empresas como PayPal, Visa e MasterCard, canais utilizados para realização de doações à organização. Esses eventos, chamados por Stallman (2011) de “protestos de negação de serviço”, ao invés de “ataque de negação de serviço”27, causaram problemas na operação destas empresas, responsáveis por boa parte do mercado de transações monetárias via internet. Logo, tal ação realmente causou um grande transtorno, chamando a atenção midiática. Stallman (2011) compara estas ações do grupo Anonymous com um protesto de rua, onde os manifestantes trancam e afetam as ações na cidade. Stallman (2011, online) também critica a ação do Estado neste episódio: A internet não pode funcionar se os sites forem constantemente bloqueados por multidões, assim como uma cidade não funciona se suas ruas estiverem sempre tomadas por protestos. Mas, antes de declarar seu apoio à repressão dos protestos na internet, pense no motivo de tais protestos: na internet, os usuários não têm direitos. Como ficou claramente demonstrado no caso do WikiLeaks, devemos suportar sozinhos as consequências daquilo que fazemos na rede. [...] Desconectar o WikiLeaks equivale a sitiar manifestantes em uma praça. Ataques preventivos da polícia provocam uma reação; então eles usam os pequenos delitos das pessoas enfurecidas para afastar a atenção dos grandes delitos do Estado. Esses protestos serão retomados no quarto capítulo, quando o objeto de pesquisa será apresentado. 1.2.2 Zapatistas e as possibilidades do ciberativismo na origem da web Um dos primeiros grupos a usar a internet efetivamente como instrumento de divulgação de suas causas foi o movimento zapatista, no México. Trata-se até hoje de um objeto de estudo recorrente nas pesquisas sobre ciberativismo. Surgido em um contexto de levantes contra a globalização, os Zapatistas chegaram a tomar o poder do estado de Chiapas em primeiro de janeiro de 1994, data de início da vigência do Acordo Norte-Americano de Livre-comércio (NAFTA) (PIMENTA; RIVELLO, 2008). Formado principalmente por camponeses indígenas que desde a década de 1940 habitavam comunidades estabelecidas próximo a divisa com a Guatemala, o Exército 27 Stallman (2011, online, grifo do autor) esclarece: “Chamar os protestos organizados por eles de ‘ataques de negação de serviço’ (DDoS) também está errado. Um ataque DDoS propriamente dito é feito por meio de milhares de computadores zumbis”. Ou seja, ataque configura, para o autor, a utilização ilegal de outros computadores sob influência de um vírus.
  • 32. 31 Zapatista de Libertação Nacional (EZLN) também teve a participação de intelectuais oriundos de regiões urbanas, como a figura pública do grupo paramilitar, o célebre Subcomandante Marcos (CASTELLS, 2001). Castells (2001) afirma que o sucesso deste movimento deveu-se a sua estratégia de comunicação, que teve como ferramenta fundamental a internet. Como enfatizam Pimenta e Rivello (2008), na época em que o movimento zapatista alcançou notoriedade, a internet apresentava possibilidades limitadas como troca de e-mails e sites de armazenamentos de arquivos, os FTPs. A web, interface gráfica da internet, ainda dava seus primeiros passos. O primeiro sítio do movimento zapatista só foi vinculado à rede no final de 1996. Foi justamente no ambiente comunicativo das listas de discussões e redes formadas por ONGs e ativistas de todo o mundo que o movimento zapatista alcançou apoio que garantiu visibilidade às suas ações. Castells (2001, p. 105) considera que a utilização da internet neste episódio teve papel determinante: A utilização amplamente difundida da Internet permitiu aos zapatistas disseminarem informações e sua causa a todo o mundo de forma praticamente instantânea, e estabelecerem uma rede de grupos de apoio que ajudaram a criar um movimento internacional de opinião pública que praticamente impossibilitou o governo mexicano de fazer uso da repressão em larga escala. Desta maneira, com a possibilidade de expor ao mundo as causas em disputa no território de Chiapas, o movimento zapatista alcançou apoio que lhe garantiu segurança no enfrentamento com o governo mexicano. Além de ter sido uma das primeiras mobilizações a usar a internet, o movimento zapatista também, como referido neste item, serviu de motivação para o desenvolvimento das ações de Desobediência Civil Eletrônica. Entretanto, mesmo após relativa popularização da web, a criação de novas ferramentas capazes de ampliar as possibilidades ciberativistas não ocorreu em grande escala. Francisco José Paoliello Pimenta (2003), ao estudar as possibilidades de hipermídia no ativismo de caráter global na primeira década do século XXI, constatou que as novas tecnologias, em sua maioria, estavam sendo usadas como forma de organização e divulgação dos movimentos ativistas, em detrimento da criação de novas formas de ação remota pela rede: Os sites se preocupam em fornecer informações sobre diversos tipos de mobilizações, em alguns casos de forma extensiva, incluindo motivações, datas, locais, horários e, até mesmo, recomendações de como participar, onde deixar crianças e como agir em caso de prisão. No entanto, pelo menos aqueles observados, não se propõem a servir, propriamente, como plataformas de ação à distância (PIMENTA, 2003, p. 6)
  • 33. 32 O apontamento de Pimenta (2003) se refere à criação de novas ferramentas aproveitando potencialidades da comunicação pela internet. Neste período analisado por Pimenta (2003), a web apresentava ainda sua estrutura inicial, já mais acessível, mas ainda com sua construção restrita a usuários com conhecimentos mínimos de sua codificação. Nesse contexto, foram destaque iniciativas como Indymedia, formada por ativistas após série de protestos contra globalização em Seattle (RIGITANO, 2005). Com ramificações em diversas partes do mundo, estes sítios buscavam proporcionar uma cobertura alternativa, desvinculada do interesse corporativo dos grandes meios de comunicação. A versão brasileira do portal, o Centro de Mídia Independente (CMI), criada em 2001, até hoje atua como meio alternativo de divulgação noticiosa (RIGITANO, 2005). De acordo com Rigitano (2005), durante os protestos, a cobertura dos meios de comunicação tradicionais atribuiu aos manifestantes valores com os quais eles não concordavam, enfocando a violência e a banalidade das ações. Desta maneira, os sítios serviram para contrapor o discurso midiático, alimentando um espaço com a visão dos manifestantes, onde era possível acompanhar fatos como a suposta violência policial (RIGITANO, 2005). A ONG internacional Greenpeace também é um dos exemplos de organização ativista que se apropriou da internet como campo de potencialização de suas práticas. Surgida no ambiente de contracultura estadunidense na década de 1970, a ONG se expandiu internacionalmente realizando atos midiáticos em favor de causas ambientais (MARZOCHI, 2009). O Greenpeace viu na internet uma forma de ampliar suas campanhas e, com isso, aumentar o suporte colaborativo em todo o planeta. Como apresenta Marzochi (2009), a utilização pelo Greenpeace das possibilidades da internet enfatizou busca de apoio às ações da ONG: “Você pode ajudar tanto quanto um ativista mesmo sem sair de casa” (GREENPEACE apud MARZOCHI, 2009, p. 283). Ou seja, a ONG cria formas pelas quais seus simpatizantes possam colaborar com a causa ambiental através da internet, como doações financeiras, fóruns de discussões, cartas pré-escritas a serem enviadas aos governantes, etc. Desta maneira, Marzochi (2009, p. 287) considera que o ciberativismo praticado pelo Greenpeace está em relação com conteúdo (informação, conhecimento científico, discursos políticos, ideologias, imagens, sons) organizados ou produzidos pela ONG inserida num sistema técnico, científico e político, que já é, ela mesma, uma tecnologia capaz de economizar esforço intelectual dos indivíduos no conhecimento, interpretação e julgamento da realidade. Assim, ao analisar o estilo de ciberativismo e as metas do Greenpeace, Marzochi (2009) identifica que o indivíduo instado a apoiar a ONG é colocado em uma posição de
  • 34. 33 passividade. A autora chega a essa conclusão ao comparar o ciberativista do Greenpeace com outras categorias de envolvimento político, como o militante partidário. Dessa maneira, o suporte ativista é usado em função de metas institucionais com as quais ele não delibera ou compartilha, como o aumento de apoiadores ou imagem de “marca”. Neste caso, Marzochi (2009, p. 301) considera que os indivíduos que colaboram com o Greenpeace, entendendo-os como quem despende parte de seu tempo ou dinheiro em apoio à ONG, são tratados como um espectador, restando ao “ativista” observar pela mídia como sua contribuição está sendo empregada. 1.2.3 Colapso da primeira web e a ampliação das mídias digitais Desde o princípio, a internet proporcionou a movimentos e atividades sociais força e robustez diante de seu formato fluido de organização (ANTOUN, 2008). O surgimento da web facilitou a consolidação da internet como um ambiente interativo e distribuído, que teve como uma de suas características a capacidade de servir a mobilizações de âmbito mundial. Assim, a mudança nesta nova dimensão comunicativa também determina mudanças na forma pela qual o ciberativismo se apropria da infraestrutura da internet. Henrique Antoun (2008), ao refletir sobre a evolução da web, considera que movimentos como o zapatismo e os levantes contra redes globais de regulamentação representaram o sucesso desta primeira fase da web. Para Antoun (2008), o fim deste primeiro estágio da web está ligado justamente ao declínio das formas de interação utilizadas nas mobilizações ativistas, como os grupos de discussões. O autor atribui este declínio a uma violenta reação de empresas e do Estado após os ataques terroristas de 11 de setembro. Assim, Antoun (2008, p. 18-19, grifos do autor) aponta a mudança da web, o fim de seu primeiro estágio diante da desordem participativa: os limites dessa expressão serão apropriados pelas empresas e Estados e voltados violentamente contra esses movimentos a partir do final de 2001. As violentas e intermináveis guerras verbais (flame wars), os palhaços que falam de tudo para aparecer, os ególatras que acham que sabem mais do que ninguém sobre algo, os trogloditas (trolls) que gostam de ofender e humilhar os participantes das discussões dos grupos de interesse, as desconfigurações (defacements) dos sítios por seus antipatizantes, os ataques de negação de serviço (DDOS) aos sítios tornados alvos, as derrubadas e seqüestros de redes, computadores e salas de bate papo (chat rooms) do universo web, tudo isso refluiu no seio dos movimentos da multidão, esfacelando suas práticas. [...] Isso, acrescido aos spams decreta a morte da Web 1.0, abrindo espaço para a nova web e seus filtros eficientes, mineração de dados miraculosa e redes sociais promissoras.
  • 35. 34 Ou seja, Antoun (2008) acredita que iniciativas colaborativas utilizadas por movimentos em rede, como os grupos de discussões, entraram em colapso. Segundo o autor, os atentados de 11 de setembro fazem retroceder os movimentos de multidão em âmbito internacional. Ao mesmo tempo, a ampliação de acesso a esses espaços de sociabilidade, em conjunto com as deficitárias formas de regulação das interações, criam a desordem responsável pelo fim deste primeiro estágio da web. Assim, o novo estágio desta tecnologia tem como base justamente a busca pela organização do público crescente da web e a ampliação dos mecanismos de participação. Conforme Antoun (2008), esta concepção da web 2.0, nome dado por Tim O’Reilly, emerge em discussões no sítio Cluetrain Manifest, que posteriormente tornou-se um livro. Cabe aqui fazer uma ressalva a fim de deixar claro um ponto que seguidamente é tratado de maneira confusa: a web 2.0 é um rótulo dado a um novo momento tecnológico que influenciou o modo pelo qual a web evoluiu a caminho de se tornar um ambiente cada vez mais interativo. Então, não se trata de uma tecnologia implantada, mas sim um pensamento tecnológico que desde o início do século XXI norteia as iniciativas que sobreviveram à seleção natural da internet. Essa nova web fica marcada pela ampliação das possibilidades de interação e de produção dos seus usuários, projetando novos espaços em que estes indivíduos passam a criar e compartilhar conteúdos com sua rede social na internet. Ao mesmo tempo, esses ambientes de utilização gratuita são uma rica fonte de dados sobre seus usuários. Desta maneira, o preço da utilização destes novos mecanismos é o rastro deixado pelas formas de uso dos indivíduos. Antoun (2008, p. 23) destaca isso ao apontar características imanentes aos novos mecanismos surgidos: “tudo na Web 2.0 já nasce com filtro de palhaços, derrubadores de ego, pesquisadores de opinião, controladores de spam e mineradores de dados – todos os antídotos contra as mazelas da primeira web”. Estas mudanças na web vão modificar fundamentalmente as maneiras pelas quais o ciberativismo age. Talvez uma das primeiras ferramentas a condensar as características do que viria a se chamar de web 2.0, os blogs28 serviram, e continuam servindo, como mecanismo importante em ações ciberativistas. Conforme aponta Antoun (2008, p. 22), “em 2003, essa nova web mostra seu poder político, auxiliando os movimentos contra a guerra do Iraque a promoverem a primeira manifestação internacional descentralizadas de massa através do blog do Move On”. 28 Surgidos ainda na primeira web, os weblogs, como foram denominados primeiramente, eram sítios de estrutura simples que, via de regra, funcionavam como selecionadores de links para outros sítios em uma web ainda sem grandes sistemas de busca. Com a popularização através dos servidores gratuitos, os blogs cresceram vertiginosamente transformando-se em um espaço utilizado de inúmeras formas (ARAÚJO, 2009).
  • 36. 35 Mecanismo também surgido sob a égide da web 2.0, os sítios de redes sociais representam um campo fértil para proliferação das ações ciberativistas. Atualmente, grande parte do fluxo de navegação dos usuários está em determinados sites de redes sociais (SRS)29. Danah Boyd e Nicole Ellison (2007, online, tradução nossa) definem sítios de redes sociais baseados em três aspectos principais: Definimos site de redes sociais como serviços na web que permitem aos indivíduos (1) construir um perfil público ou semi-público, dentro de um sistema limitado, (2) articular uma lista de outros usuários com quem compartilham conexão e (3) poder ver e percorrer sua lista de conexões e aquelas feitas pelos outros dentro do sistema. 30 A natureza e nomenclatura dessas conexões podem variar de local para local. Raquel Recuero (2009) lembra que SRS como Facebook, Orkut ou Google + são apenas o meio técnico que proporciona a emergência destas redes. Desta forma, redes sociais não são “pré-construídas pelas ferramentas, e, sim, apropriadas pelos atores sociais que lhes conferem sentido e que as adaptam para suas práticas sociais” (RECUERO, 2009, p. 21). A partir desta afirmação, identificamos o ciberativismo como uma das inúmeras práticas sociais pelas quais são apropriados os SRS. Como apresentam Jandré Batista e Gabriela Zago (2010), baseados nos estudos de Recuero (2009), estes sítios representam espaços de trocas entre atores sociais com diversas finalidades. Batista e Zago (2010, p. 131) destacam a apropriação destas mídias digitais pelo ciberativismo, que, segundo os autores, encontra nestes novos espaços possibilidades comunicativas que são colocadas em função da busca de reverberação política, alcançada através da cooperação: Dadas as possibilidades de reinventar as formas de interação social em cada sistema e coordenar-se coletivamente perante o novo em um meio de comunicação em constante transformação – em que se registram formas de cooperação e agregação –, os atores sociais estariam naturalmente convidados à ação coletiva. Pelo seu caráter mais horizontal de comunicação, como ressaltam Batista e Zago (2010), os sítios de redes sociais garantem visibilidade a mobilizações onde se engajam um número relevante de indivíduos. Estas características foram reforçadas pelos autores em texto posterior (2011), em que analisaram a mobilização colaborativa de apoiadores da WikiLeaks no Twitter, onde o objetivo era colocar o nome da organização em posição de visibilidade, 29 No Brasil, o número de indivíduos que acessam a internet e participam de algum SRS chega a 69%, segundo pesquisa do Centro de Estudos sobre Tecnologia da Informação e da Comunicação sobre uso de internet nos domicílios brasileiros (CETIC.BR, 2012). 30 Texto original: “We define social network sites as web-based services that allow individuals to (1) construct a public or semi-public profile within a bounded system, (2) articulate a list of other users with whom they share a connection, and (3) view and traverse their list of connections and those made by others within the system. The nature and nomenclature of these connections may vary from site to site”.