1) O documento discute o Acordo Trans-Pacífico de Parceria Estratégica Econômica (TPP), um acordo comercial entre 12 países da bacia do Pacífico que tem gerado preocupações sobre seus impactos socioeconômicos e ambientais.
2) Críticas ao TPP incluem que ele pode prejudicar o acesso a medicamentos e minar leis de proteção cultural e meio ambiente. O acordo também é negociado secretamente e lobby de grandes corporações pressiona por ele.
3) O TPP pode afetar o Brasil indiret
Política, manifestações e o pensamento conservador no Brasil - Parte I
O ACORDO TRANS-PACÍFICO DE PARCERIA ESTRATÉGICA ECONÔMICA: A MAIS NOVA AFRONTA AOS POVOS
1. O ACORDO TRANS-PACÍFICO DE PARCERIA ESTRATÉGICA ECONÔMICA:
A MAIS NOVA AFRONTA AOS POVOS
Sérgio Botton Barcellos
Uma das reações frente à crise internacional do sistema capitalista na atualidade, como uma
das estratégias de reconfiguração de acúmulo de capital e da exploração socioambiental, são os
diversos acordos comerciais que estão sendo realizados pelo mundo. Talvez pareça ser algo ainda
não muito palpável no Brasil ou algo que não componha a realidade devido às poucas notícias e
esse assunto estar sem muita repercussão, pois no Brasil está ao nosso alcance o MERCOSUL e a
UNASUL. Além disso, todos os “holofotes” estão direcionados ao “julgamento” do mensalão, o
segundo turno das eleições e o final da novela das oito. Contudo, além desses fatos, o nosso país
está mais articulado do que imaginamos junto a outros fatos que estão ocorrendo, e um deles é o
Acordo Trans-Pacífico de Parceria Estratégica Econômica (TPP). 1
O TPP que é similar ao Tratado de Livre Comércio da América do Norte (TLC) ou como foi
apelidado por diversos movimentos sociais no mundo como “NAFTA em esteróides” ou a “Estrela da
Morte empresarial”, abrirá diversos setores das economias dos países da Ásia ao investimento
estrangeiro, eliminará barreiras e tarifas que limitam o comércio e concederá aos investidores
estrangeiros e às corporações o direito de demandar judicialmente os governos caso seus
investimentos sejam ameaçados por políticas públicas locais.
As negociações desse Acordo inicialmente incluíram três países: Chile, Nova Zelândia e
Cingapura. Após, Brunei posteriormente se juntou no mesmo ano. Em 2007, as negociações
começaram em uma versão expandida do Acordo, na qual abrangeu um grupo maior de países. Em
fevereiro de 2008 os Estados Unidos concordaram em entrar nas conversações sobre esse Acordo
para a liberalização do comércio e de serviços financeiros. A primeira rodada de negociações entre
os 4 países e os EUA iniciaram em 2009. Ainda, em novembro de 2008,
Austrália, Vietnã e Peru anunciaram que iriam se juntar ao bloco comercial. Em outubro de 2010, a
Malásia anunciou que também iria se juntar às negociações do TPP.
Ainda nesse contexto, a Coréia do Sul manifestou interesse em ingressar desde 2010 junto
com o Japão, como observadores nas discussões. Os governos de Taiwan e Filipinas também já
manifestaram interesse em aderir ao TPP. Em junho de 2012, o Escritório de Representação
Comercial dos Estados Unidos (USTR) anunciou que o México foi convidado para participar. Em
junho de 2012 o Canadá também anunciou que se juntou nas negociações do Acordo.
1
Esse texto foi produzido a partir da compilação de uma série de pesquisas realizadas na internet e documentos em
inglês e alguns em português. Portanto, podem ter ocorrido algumas eventuais falhas do autor ao traduzir os textos e
notícias.
2. As 14 rodadas formais de negociações do TPP foram realizadas em diversos países, como:
Austrália, Brunei, Chile, Cingapura, Vietnã e muitas nos EUA. A última rodada, ocorreu entre 06 a
15 setembro desse ano, em Leesburg, na Virgínia, EUA. Os nove parceiros têm atualmente um PIB
conjunto de aproximadamente US$ 17 trilhões. Se o Canadá e o México passarem a integrar esse
Acordo, esse montante subirá para mais de US $ 20 trilhões.
No início de 2012, o governo Obama divulgou que um requisito para a conclusão das
negociações do TPP é a renovação do "fast track" Trade Promotion Authority . O "fast track" é um
dispositivo acionado para a ratificação de tratados internacionais e que não é de praxe junto ao
Congresso dos EUA, pois não é um trâmite que ocorre com uma grande rodada de debates e o
projeto original tem que ser aprovado, sem alterações, em até 90 dias.
O Congresso Americano criou o fast track na Lei de Comércio em 1974 e foi uma lei que
expirou em 1980. Depois essa lei foi prorrogada por mais oito anos, e depois até 1993 para
acomodar a negociação da Rodada Uruguai realizada no âmbito do Acordo Geral sobre Tarifas e
Comércio (GATT). Após, foi novamente estendida até Abril de 1994, no Acordo de Marraquexe no
qual o GATT foi transformado efetivamente na Organização Mundial do Comércio (OMC) que
passou a vigorar em 1995. Também sob o uso da fast track que foram aprovadas a Zona de
Comércio Estados Unidos-Israel Livre , o Acordo de Livre Comércio entre Estados Unidos-
Canadá e o Acordo Norte-Americano de Livre Comércio (NAFTA).
No último dia da reunião da APEC 2010, os líderes dos nove países que fazem parte das
negociações aprovaram a proposta apresentada por Barack Obama, que estabelecia uma meta para a
liquidação das negociações até novembro de 2011. No entanto, as negociações continuaram em
2012.
O TPP e as suas implicações socioambientais e econômicas
“Pergunta a cada idéia: Serves a quem?”
Bertolt Brecht
As críticas ao TPP são direcionadas as suas disposições relativas à execução de patentes e
direitos autorais, após as cópias que vazaram na internet da proposta dos EUA para esse Acordo, em
relação à propriedade intelectual, como: termos de direitos autorais sem limites; a aplicação de
patentes contra cirurgiões e outros profissionais médicos, que não respeitem as regras em matéria de
patentes sobre medicamentos biológicos etc.; eliminar qualquer possibilidade de comércio paralelo
de livros com direitos autorais, periódicos, partituras, gravações de som, programas de computador
3. e obras de áudio e visual pela internet; exigir punição criminal comercial e não-comercial violação
de direitos autorais e marca registrada2.
Nos EUA, uma parcela dos congressistas está publicamente demonstrando preocupação com
o TPP, pois na forma em que propõe proteger a propriedade intelectual, pode prejudicar o acesso a
medicamentos a preços acessíveis nos países em desenvolvimento, especialmente no Vietnã. Da
mesma forma, na Nova Zelândia em um fórum público em julho de 2011, especialistas em direito
denunciaram que esse Acordo poderia minar a lei sobre a cultura Maori neozelandesa, sobre a
modificação genética, os direitos autorais e prejudicar o acesso a medicamentos subsidiados que a
população tem acesso por meio de sua Agência de Gestão Farmacêutica.
Dentre essa conjuntura, há ainda o fator que o processo de implementação do TPP ocorre
sob um forte esquema de sigilo. Diversas organizações e movimentos sociais nos países onde
entrará em vigência esse Acordo alegam que esse sigilo é contrário aos seus ideais de democracia,
pois é uma decisão que poderá ter um grande impacto, seja em relação à soberania nacional dos
países, seja em toda economia internacional. Essa confidencialidade que tramita em "modelo de
carta" contém cláusulas, como por exemplo: “Estabelecer que o nível de segurança necessário para
proteger a confidencialidade do acordo, inclusive mantê-lo em um "armário de arquivo bloqueado"
ou dentro de um "edifício garantido" (tradução do autor). Os responsáveis pela negociação alegam
que o sigilo ocorre, pois quando os rascunhos das negociações da Área de Livre Comércio das
Américas (ALCA) foram liberados os negociadores não conseguiram chegar a um acordo final.
Os lobistas identificados vinculados a grandes corporações como Big Oil, Ag Grande
Halliburton, Chevron, PhRMA , Comcast , a Motion Picture Association of America e diversos
corretores do poder de Wall Street são os que estão atuando para que ocorra o acordo o quanto
antes.
O mercado agrícola e de commodities em geral também vai receber atenção especial,
principalmente pela grande demanda asiática por produtos agropecuários. Entre as corporações que
estão pressionando para que o Acordo ocorra o quanto antes é a Cargill, que é principal importadora
de óleo de palma para os Estados Unidos. Caso o TPP ocorra, por exemplo, a empresa será capaz de
exportar o óleo de palma que produz na Malásia livre de tarifas para os 11 países que farão parte.
O Acordo Trans-Pacífico a cada dia está gerando protestos e diversas manifestações em
defesa da liberdade de expressão, devido às possíveis restrições no acesso e uso do conhecimento e
das inovações tecnológicas, que serão aplicadas pelas leis de patentes e restrições na infra-estrutura
global da Internet (como foi o caso da megaupload), similar ao que ocorre nos EUA.
2
Maiores análises sobre possíveis impactos globais do acordo encontram-se disponíveis no site da Organização Global
Trade Watch.
4. Sob essa perspectiva, os diversos movimentos sociais nos EUA, Canadá e Austrália
denunciam que diversos lobistas dessas empresas estão investindo politicamente e economicamente
para incluir nesse Acordo a figura do que seria chamado "investidor-Estado". A partir disso será
possível criar disposições que concedem as empresas transnacionais o poder para transpassar as leis
ambientais, regulamentos ou decisões judiciais nacionais que possam afetar as expectativas de lucro
das empresas (Fonte: ColoradoDaily.com). A partir disso, o direito das empresas será reforçado no
tocante a processar governos quando as políticas públicas interferirem como, quando e aonde
poderão obter lucros. Caso isso ocorra, serão descumpridas ou modificadas as atuais legislações
nacionais relativas à gestão ambiental, proteção dos direitos humanos e regulamentação do bem-
estar colocando em risco a soberania nacional e o direito de auto-determinação dos mais diferentes
povos que vivem nesses e em outros países.
O TPP pelo mundo e alguns dos motivos para nos preocuparmos com esse acordo no Brasil
A partir desse Acordo, além do interesse em manter a hegemonia, a estratégia dos EUA é
ampliar sua influência geopolítica e econômica na região do pacífico a partir da sua presença militar
e seu engajamento político com o objetivo de diminuir a influência da China na região, a qual está
ausente do TPP junto com a Rússia.
Desde o ano passado os EUA estão realizando um maior investimento “diplomático” e
econômico na região Ásia-Pacífico, compondo a característica tradicional da estratégia
internacional ianque, militarismo e economia fundidas em uma política. Nesse sentido, foi realizado
o envio de 250 infantes da marinha para a cidade de Darwin no norte da Austrália, até que se
alcance 2500 militares. Atualmente o Pentágono tem bases militares no Japão, Coréia do Sul,
Taiwan e Guam. Ao se estabelecer na Austrália forma um cerco sobre a saída da China no oceano
Pacífico. O outro passo, que é o econômico, é o próprio TPP.
Pelo mundo, dentre as manifestações que ganham destaque e conseguiram furar os bloqueios
midiáticos, destacou-se uma que ocorreu em março desse ano, quando um grupo de manifestantes
interceptou uma transmissão na cidade Federation Square - Austrália, na qual ficaram sabendo que
ocorreriam negociações secretas do TPP em um hotel da cidade. Em julho, cerca de 300 pessoas
marcharam em direção ao hotel onde ocorria a reunião que tratava do TPP. Nesse mesmo período
na cidade ocorreu a "Conferência do Povo" que foi um evento alternativo a reunião do Acordo.
Alguns ativistas na Austrália criaram um perfil no site de relacionamentos do Facebook para
denunciar o TPP. Na Austrália, em geral, as propostas do TPP foram denunciadas por serem
excessivamente restritivas no que tange a propriedade intelectual. Como resposta a isso, uma
5. coalizão de organizações sem fins lucrativos e mais de 100.000 pessoas organizaram uma campanha
internacional chamada “Pare A Armadilha“.
No Canadá, as preocupações com o TPP incluem questões como a autonomia do país na
gestão e abastecimento de alimentos, como a produção de aves, produtos lácteos e ovos, bem como
sobre a regulamentação da propriedade intelectual e a extrema proteção para as grandes empresas
farmacêuticas; a questão do “investidor-estado” que será criado pelo Acordo; restrições de compras
governamentais; e as regras de direitos autorais que minam a liberdade na internet3.
No Japão o grupo político do primeiro-ministro favorável ao Acordo enfrentou consistente
oposição, principalmente de alguns setores agrícolas que não são favoráveis ao clima de competição
internacional que poderá ser criado com esse Acordo. No entanto, a organização empresarial
Keidaren apela pela participação do Japão no TPP.
Em matéria recente publicada no Canal Ibase, Pedro Abramovay, diretor de campanhas da
Avaaz e o Profº da Faculdade de Direito da FGV, declarou que o TPP representará um risco
aos esforços brasileiros de garantir direitos na internet. “As várias empresas, ligadas principalmente
às indústrias farmacêuticas e de entretenimento, que tentam controlar a internet endurecendo as leis
de Propriedade Intelectual com projetos de lei como Sopa, Acta e Pipa. No site Avaaz está
disponível uma petição contra o TPP.
Em relação aos reflexos desse Acordo no Brasil, ainda pelo Canal Ibase, foi declarado que
embora o Brasil não esteja entre os participantes do Acordo também será afetado. De acordo com
Pedro Abramovay, “sobretudo porque é muito comum criar um fato consumado e o impor aos
países que não aderirem, que acabam sofrendo chantagens com o discurso de que afugentam
investimentos. Não é à toa que eles estão começando a negociar em países mais consensuais, para
depois estender aos restantes. Isso cria um poder de adesão que é perigosíssimo.”
Conforme publicado no Correio da Cidadania em Janeiro desse ano, no Brasil ganhou
espaço a convicção de que se devem enfrentar ameaças militares e que elas vêm dos países centrais,
em particular dos Estados Unidos. Consta nessa matéria que cinco dias depois do discurso de
Obama no parlamento australiano ano passado, militares brasileiros lançaram à imprensa um
informe interno do Ministério da Defesa sobre a situação dos equipamentos das diversas armas. A
difusão do “informe secreto” se produziu em um momento em que diversos setores, incluindo o
ministro da Defesa, pressionavam o governo para acelerar o processo de modernização dos
equipamentos das Forças Armadas, e muito em particular da Marinha, encarregada de defender a
Amazônia e as principais riquezas do país: biodiversidade e petróleo.
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Mais alguns protestos no Canadá podem ser vistos a partir desse link.
6. Ao que tudo indica, esse Acordo é mais um tratado comercial que visa beneficiar uma
pequena de parcela de corporações empresariais e reorganizar o “mandonismo” americano e dos
seus parceiros na reconfiguração do atual estágio de desenvolvimento capitalista e dos blocos de
poder político no mundo. A partir das vivências e lutas acerca dos acordos internacionais que
ocorreram em outros países ou mesmo com a experiência de luta contra a ALCA, que vivemos no
Brasil, parece ser importante desafiar-nos a esse tipo de informação e nos mobilizarmos, por que
caso o TPP seja firmado influenciará não só a macroeconomia, provavelmente irá influenciar na
vida cotidiana das pessoas e em seus espaços socioambientais.