1) O documento é uma revista de dezembro de 2015 da Vogue Brasil que apresenta uma entrevista com a modelo Gisele Bündchen.
2) A entrevista discute a carreira de 20 anos de Gisele com o fotógrafo Giovanni Bianco, que produziu um livro celebrando essa jornada.
3) Gisele fala sobre os desafios iniciais de sua carreira e como a gratidão a ajudou a superar as dificuldades enfrentadas como modelo.
3. O LIVRO
20 ANOS DE CARREIRA
FOTOS
FRANÇOIS NARS
GISELEA ÜBERMODEL CONVERSA COM GIOVANNI BIANCO SOBRE OS BASTIDORES
DO LIVRO QUE CELEBRA SEUS 20 ANOS DE CARREIRA
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4. Gisele usa jaqueta de tweed (a partir
de R$ 25.550) combinada a calça
jeans (a partir de R$ 8.150) e bijoux
de metal, acrílico, pedras, pérolas e
cristais (a partir de R$ 2.520). Todas
as peças do ensaio são da coleção
resort 2016 da Chanel
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6. Gisele usa, na pele, base Perfection Lumière e
pó finalizador Les Beiges; nos olhos, máscara
Le Volume Waterproof, sombra cremosa
Illusion D’Ombre na cor Illusoire, sombras
em pó Ombre Essentielle nas cores Infini e
Black Star e lápis Le Crayon Khôl Noir; na
sobrancelha, kit Le Sourcil; nos lábios, lápis de
boca Le Crayon Lèvres na cor Rouge Profond
e batom Rouge Allure na cor Passion; nas
unhas, esmalte Le Vernis na cor Pirate. Todos
os produtos são da linha de beleza da Chanel
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7. Jaqueta com flores bordadas usada
sobre maiô (a partir de R$ 3.690) e
combinada com óculos enfeitados
com pérolas (a partir de R$ 4.200)
e bijoux de metal, acrílico, pedras,
pérolas e cristais (a partir de R$ 3.040)
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8. ENTREVISTA
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GISELE Quando decidi fazer um livro, logo pensei no
seu nome – porque você me conhece desde o início
da carreira, achei que você conseguiria enxergar
quem eu sou, além de ser o mais talentoso. Como foi
para você fazer esse trabalho?
GIOVANNI Também já tinha na cabeça um livro sobre
você. E fiquei muito feliz ao saber do projeto e que
você queria fazer comigo. Tem uma história muito
engraçada, que talvez você não se lembre, da época
em que nos conhecemos. Trabalhamos juntos logo
no início da sua carreira, e achei que nunca
faríamos mais nada justo por causa desse episódio.
E sei que você é uma pessoa que não esquece as
coisas. A gente estava fazendo um catálogo da
Daslu com um fotógrafo internacional...
GISELE Um fotógrafo italiano...
GIOVANNI Isso. E a maquiadora era a Fulvia Farolfi,
que trabalhou com o Helmut Newton. No set,
estavam você e a Isabella Fiorentino. A Fulvia
disse: “Essa menina vai longe”. Já o fotógrafo
estava encantado com a Isabella, mas você não
estava nem aí, seguiu fazendo seu trabalho. E falou
num tom de brincadeira: “Vou ser a modelo
número 1 do mundo”. Você era muito jovem, e eu
disse: “Ah, tá! Talvez a número 1 comercial”.
Percebi que você fechou a cara. Depois, você
insistiu que não só seria a comercial, mas também
a maior modelo fashion do mundo. Sempre fui
polêmico e complicado porque tenho dislexia e
falo mais rápido do que penso, falo mais do que
deveria falar. E achei que você tinha guardado uma
mágoa dessa história. Ah, naquele mesmo dia eu
também disse brincando que você seria a número 1
de calcinha e sutiã. Tenho até vontade de chorar
quando penso nisso. E aí os anos se passaram, você
explodiu. Quando assinou o contrato com a
Victoria’s Secret, pensei: tá vendo? Sou visionário.
Tudo bem, você também foi visionária, mas eu não
estava errado. E aí a gente começou a fazer vários
trabalhos de novo, e percebi que a mágoa não
existia. Quando você me convidou para o livro,
senti um orgulho enorme. Ele não foi feito por
mim, mas a quatro mãos. Na verdade, a 500 mãos
porque contou com as mãos dos meus assistentes;
da Patricia, sua irmã; das suas outras irmãs. Fiz o
papel de maestro, mas, como numa orquestra,
precisava dos músicos. E o principal: precisava da
música – e você era a música. O melhor foram
nossas reuniões no meu estúdio, as grandes
discussões sobre o que entraria ou não no livro.
Nesse processo, descobri outra Gisele à qual não
tinha acesso – não a modelo, mas a amiga que
ganhei. O livro é só um objeto – lindo, mas que vai
ficar numa estante. Ter conhecido essa outra Gisele
foi meu melhor presente. E ela chora... (Gisele se
emociona).
GISELE Sou canceriana.
GIOVANNI Fiquei impressionado com a quantidade
de fotos que vi. As pessoas não sabem, mas a gente
deixou quase 30 mil imagens de fora! Todo mundo
pensa só no glamour e no conto de fadas, mas, nos
primeiros 15 anos de carreira, imagino que você
tenha feito dois trabalhos por dia, não descansava
nos fins de semana. Como arranjava tempo para
namorar, estudar, conversar com a família?
GISELE Dos meus 15 até os 25 anos, eu não tenho
memória. Para mim, esses dez anos parecem um
só. Sábados e domingos nunca existiram na minha
cabeça. Trabalhava, basicamente, os 365 dias do ano.
Mas graças a Deus que eu tinha a (cachorrinha)
Vida, que era minha companheira, estava sempre
comigo, senão me sentiria muito sozinha. Vivia
numa correria, passava dois dias em Paris, três em
Londres, dois em Nova York. Minha vida foi assim,
no mínimo, durante uns dez anos. Eram umas duas
semanas livres ao todo por ano. E não sabia o que
era feriado porque para mim eles não existiam. Se
fosse Thanksgiving nos Estados Unidos, estava em
Londres trabalhando; se fosse feriado em algum
país, eu estava em outro país trabalhando. Mas eu
era muito feliz. Sempre me senti meio estranha,
acho que isso vem da minha infância, por eu ter
sofrido muito bullying na escola, ser a Olivia Palito.
Eu nunca achei que fosse...
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9. GIOVANNI Ter tudo isso?
GISELE Isso! Ter essa oportunidade. Então, quando
a oportunidade surgiu, não conseguia dizer não.
Também não sabia que podia dizer não – pensava
que não iam mais querer trabalhar comigo, tinha
medo. Eu via tantas meninas nesse processo, que
faziam vários trabalhos e, depois de dois anos,
sumiam. Eu não tinha ideia de quanto tempo isso
iria durar. Então, só o que eu queria era abraçar as
oportunidades porque não sabia quando elas iam
acabar. Sentia muita gratidão. Eu fui indo, indo.
GIOVANNI É interessante contar também o lado árduo
do trabalho, porque as pessoas acham que é só ir lá
e fazer a foto. A modelo acorda de manhã, faz a
mala, viaja, chega...
GISELE Vai direto para o estúdio...
GIOVANNI Depois, são 500 mãos em cima de você,
tiram sua cutícula, enfiam um negócio no seu olho,
puxam seu cabelo...
GISELE É queimada por babyliss direto...
GIOVANNI Puxam dali, apertam daqui, mexem no
seu peito... Existe uma agressividade.
GISELE Às vezes, parece que estão lidando com um
objeto, né?
GIOVANNI Exatamente! E é preciso trabalhar isso
bem, como você soube fazer...
GISELE Eu acho que foi importante para mim ter
essa enorme sensação de gratidão por estar ali.
Porque eu me achava o Patinho Feio com 13, 14
anos. E, quando começaram a me bookar para
trabalhos como modelo, eu não acreditei. E é
engraçado porque, de certa forma, me sinto assim
até hoje, 20 anos depois.
GIOVANNI Num dia em que a gente encontrou o
Mario Testino, ele olhou a foto antiga de um teste e
falou: “Você deveria ir à igreja acender algumas
velas. Quem diria que você iria se tornar a super
top model Gisele Bündchen!”. Mas, no fundo, você
sabia que iria ser aquilo!
GISELE Olha, eu não sabia. Mas sabia o que queria.
Porque não foi fácil sair de casa, deixar minhas
irmãs, estar longe da minha família aos 14 anos e
embarcar nessa jornada. Eu morria de medo do
escuro e estava sozinha, vivendo em apartamentos
onde algumas meninas usavam drogas. Era difícil,
eu não sentia que pertencia àquele mundo. Eu não
entendia nada de moda. Estava com frio, mas como
não tinha dinheiro para comprar uma bota,
colocava meia com uma sandália mesmo. Eu ia
para os castings assim. Não tinha bolsa ou roupa de
marca, e nem me importava com isso. Mas nunca
foquei nas dificuldades, que com certeza sempre
existiram. Porque tem gente falando na sua cara, a
toda hora, que você não é boa o suficiente.
GIOVANNI É, nem todo mundo, mas tem muita gente
assim...
GISELE Nem todo mundo, mas eu diria que muita
gente. Acho que nem todos conseguem enxergar o
ser humano dentro do corpo da modelo. Algumas
vezes, é como se você fosse um objeto, sem
sentimentos, e está ali simplesmente para fazer
aquilo. Acho que isso é uma coisa que não é nem
consciente, sabe? Você tem um determinado
tempo para fazer a foto funcionar. A pessoa entra
e, talvez, nunca mais vá ver você na vida. No início,
não existe a intimidade, carinho, respeito. É uma
coisa meio rápida.
GIOVANNI Mas a gratidão fez você superar toda a
questão da dor.
GISELE Com certeza. Gente, eu sou de Horizontina,
uma cidade bem pequena no interior do Rio
Grande do Sul. Eu não me esqueço disso. Quando
você tem uma origem simples, não esquece porque
teve de batalhar por cada coisinha que conquistou.
Voltando ao livro, como você chegou ao formato
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10. final? Quando vi que ele era todo colorido, quase
caí para trás – parecia telepatia.
GIOVANNI O primeiro layout do livro era todo em
preto e branco, não sei se você lembra. Trabalhamos
ao todo quatro anos no livro e por uns oito meses
ele foi assim. E, quando a gente se encontrava, você
nunca falava: “Sou eu!”. Dizia que o livro era
elegante – e elegante é uma palavra horrorosa.
GISELE Desculpa! (risos)
GIOVANNI Um dia acordei, fiquei pensando muito no
elegante da Gisele e falei: não sou eu. Ela é
brasileira, eu sou brasileiro, eu sou Carnaval, a
gente ama cor. Gisele é pura energia. Fui para o
estúdio e fiz uma maquete pequenininha com as
cores que achava que deveriam ser usadas. E meus
assistentes ficaram malucos porque mudei
radicalmente o livro, ele virou uma explosão de
cores. Aí você viu e falou: “Sou eu!”. Quando a
gente olha para você, tem coisas que são muito
óbvias: você é linda, sexy, brasileira. Eu tentei fugir
de tudo isso no início, mas foi bom ter passado por
esse processo. Por isso falei que o livro foi feito por
tantas mãos, foram muitas idas e vindas. Outra
coisa interessante foram nossas brigas. A gente tem
que falar do seu amigo (fotógrafo) Nino Muñoz...
GISELE Eu queria incluir um monte de fotos dele.
GIOVANNI Cada foto que você queria tirar das minhas
preferidas, eu falava: “Morre uma do Nino”. Foi
minha moeda de troca, coitado do Nino. Mas ele
foi homenageado: uma das minhas imagens
prediletas, uma das que abrem o livro, é aquela em
que você aparece na areia com um coração. Também
teve a época em que você cismou que queria incluir
todas as campanhas. E eu falava: “Querida, não é
um livro de campanhas”.
GISELE Eu queria a memória...
GIOVANNI Sua irmã Patricia lembra muito bem. Eu
falei: “Avisa pra Gisele que o livro que ela quer vai
ter 10 mil páginas. E não existe livro de 10 mil
páginas! Você tem que dar um jeito nela, porque
assim não dá”.
GISELE É que eu queria que todo mundo tivesse
um espaço.
GIOVANNI E sua memória é inacreditável. Toda vez
que eu tirava uma imagem do painel, você olhava,
olhava, depois perguntava: “Cadê aquela foto?”.
Era impressionante! Algumas delas entraram –
não são fotos que eu teria incluído, mas tinham
uma grande importância pra você. E também
aconteceu o contrário: entraram fotos que eu
defendia e você não queria, mas que depois
compreendeu que, historicamente, existia uma
relevância fotográfica. Por isso o livro ficou tão
bacana, ele teve o equilíbrio entre esses dois lados.
Um detalhe engraçado: toda vez que achava uma
imagem importante sua com outra modelo, a foto
acabava no chão. A única que entrou, apesar de você
ter tentado derrubar até o segundo ano da
preparação do livro, foi a com a Malgosia Bela, do
Richard Avedon. Eu demorei, mas entendi o motivo
da sua resistência: não se reconhece a Gisele ali.
Algum tempo depois, você percebeu o quanto
aquela foto era importante, a única que fez com o
Avedon. Além dessa, teve outra que foi uma vitória
para mim, porque sei que você não acha que está
linda nela, mas...
GISELE Tem várias em que não estou!
GIOVANNI Foi a do Helmut Newton, que era uma
foto importante. Não se preocupar em estar linda
em todas as imagens foi fundamental para o livro
sair vitorioso.
GISELE Acho que tem várias fotos assim. Mas a gente
teve as nossas conversas, e pensei: todas essas
pessoas sou eu! E não interessa se tem umas mais
bonitas, outras mais glamorosas. Só não me senti
confortável em me mostrar nua naquelas fotos do
Mario Sorrenti. Você faria um livro só com elas.
(Continua na página 319)
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12. Top (a partir de R$ 12.480), hot
pants (a partir de R$ 5.370) e casaco
de tweed (a partir de R$ 56.720)
usados com bijoux de metal, pedras,
pérolas e cristais (a partir de R$ 2.520)
e luvas (a partir de R$ 5.300)
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13. Terno de tweed usado com bijoux
de metal, acrílico, pedras, pérolas
e cristais (a partir de R$ 3.560) e
luvas (a partir de R$ 5.300)
Digital tech: Quinton Jones
Assistentes de fotografia:
David Diesing, Lucas Flores Piran
e Kevin Vast
Produção de moda:
Taylor Kim e Taryn Shumway
Assistente de cabelo:
Taka Shibata
Assistente de
maquiagem: William Kahn
Tratamento de imagem:
Impact Digital
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