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Uso de Plutônio Produzido por Reatores de Água Leve em Explosivos Nucleares:
uma ameaça plausível?
O assuntoé polêmicoporque dadosconfiáveis sobre explosivos nucleares são classificados e
grande parte da discussão gira em torno de especulações.
Pode- se afirmar que a confiabilidade de explosivos nucleares de plutônio está diretamente
ligadaà quantidade de Pu240 presente namassade plutônioutilizadae à velocidade com que
é realizadasuamontagemsupercrítica.Emvirtude danaturezaestatística doproblemada pré-
ignição, dois explosivos nucleares idênticos podem, em condições de igual performance,
produzir explosões nucleares de potências completamente díspares.
Considerável polêmica tem sido travada a respeito da possibilidade de se fabricarem
explosivos nucleares de potência razoavelmente elevada (> 1 quiloton), utilizando como
elementofíssil oplutônioproveniente de reatores nucleares de potência (portanto com altas
porcentagens de Pu240) e técnicas usuais de implosão.
A questão, como se pode depreender das Tabelas a seguir, tem de ser examinada
probabilisticamente. Do ponto de vista da aplicação militar, em que é exigida alta
confiabilidadee,geralmente,altapotência, tais explosivos seriam considerados inadequado,
em razão da alta probabilidade de pré-detonação.
Probabilidade de não ocorrer a pré-ignição durante a
inserção de criticalidade em função de diferentes
porcentagens dePu-240 na massa deplutônio de6 kg[i]
Energia liberada supondo quea explosão nuclear ocorra
em pontos do criticalidade menor do que o máxima
alcançada(k =1.3)ea probabilidadedenão ocorrer o pré-
ignição atéos respectivos valores decriticalidade.[ii]
Já sob a óticada ameaçade eventual empregoporgruposterroristas com capacidade e meios
de fabricá-los, a probabilidade de não ocorrer a pré-detonação, mesmo quando considerada
baixa para os padrões militares, poderia, para esses grupos, ser admitida "suficientemente
alta" para cumprir propósitos chantagistas.
Alémdisso,mesmoocorrendoprecocemente areaçãode fissãoemcadeiadivergentetãologo
a massa físsil se tornasse supercrítica,haveriachance aindadainserçãode razoável excessode
reatividade, com liberação de energia tremendamente destrutiva comparada à outros
explosivos convencionais.
Deve-se frisar, porém, que o projeto e a construção de explosivos nucleares requerem
conhecimentos teóricos e práticos específicos, complexas simulações computacionais,
aquisição de materiais especiais, instalações adequadas, testes experimentais de
componentes, os quais, provavelmente, estão muito acima da capacidade de realização de
grupos avulsos.
Alémdisso,existemduascircunstânciasadicionais,dificilmente contornáveis, relacionadas ao
plutônio com alto teor de isótopos pares: sua mais alta radioatividade, que dificultaria
sobremodo sua manipulação (exigindo, provavelmente, que fosse remota e sob alguma
espécie de blindagem),e oproblemadoauto-aquecimentocausadopelaradiaçãoalfa emitida
por esses isótopos. Considerando resfriamento por convecção natural, estima-se uma
diferençade temperaturade mais ou menos 65°C entre a superfície da massa do plutônio e o
ambiente. Tal auto-aquecimento causaria danos significativos ao alto explosivo químico em
volta do núcleo físsil do explosivo nuclear.
Não é por outra razão que a totalidade dosexplosivosnuclearesde plutônio utiliza-o com alto
teor de pureza em Pu239, produzido em reatores nucleares especialmente projetados para
esse fim.
[i] Barroso,D.E.G., AFísica dos Explosivos Nucleares, 2ª. Edição,SãoPaulo, Editora Livraria da Física, 2009,pág. 199
[ii] Idem, pág. 200

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