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                                                     Hélio Ronaldo Lemos
                                                             G de Gaiolão


No rebanho Gir brasileiro temos 2 touros se destacaram com esse nome. Ambos
importados da Índia. Um na Bahia de propriedade de Aristóteles Góes, pai de Aderbal
Góes e outro, no Estado de São Paulo, trazido na importação de 1930, levada a efeito
pelo doutor Ravísio Lemos. Tratava-se um garrote novo, que veio no meio do gado
sem nenhuma referência, e que, depois, foi vendido para a cidade de Casa Branca, ao
avô do Quincão, proprietário do C.A. Everest e C. A. Sansão.

Totó Pompane e um outro corretor, ambos da cidade de Ribeirão Preto, descobriram
Gaiolão e comentou com Nilo Lemos sobre o mesmo que, de imediato, foram a
fazenda do Coronel, no início 1938, e assim que viu o animal, Nilo Lemos, comentou
emocionado: “isso aqui é Gir. Nunca vi nada igual”. Um animal que deveria valer 5
contos de réis, no máximo, levado pela empolgação Nilo Lemos pagou 15 contos de
réis, sendo 10 contos de réis em moeda corrente e o restante através de 10 garrotes gir
comercial. Valor esse até então nunca pago a um animal neste país. Mas, isto, se deve
em minha opinião, ao altíssimo conhecimento que o Nilo Lemos tinha sobre a raça
Gir.

Natural de Passos, Minas Gerais, filho de Honório Coelho Lemos e de Maria Teodora
Jacinto da Silva (Tia Tadola) mudando-se posteriormente para a cidade de Franca,
São Paulo, alugou um retiro da antiga Fazenda Taquaral, do Cel. Antônio Jacintho da
Silva, com a finalidade de criar Gir. Em criança, Nilo Lemos, na idade de 1 para 2
anos de vida, por um descuido de sua pajem levou uma queda fraturando a coluna
vertebral. Embora deixando sequelas, estas não comprometeram sua coordenação
motora. Nilo Lemos foi um predestinado no conhecimento sobre a raça Gir. Sempre
dizia que uma vaca boa escolhida por ele tinha que valer o dobro de mercado mais
alguma coisa. João Navega, avô de Orlando Moraes, marido da atriz Glória Pires, por
ser espírita convicto e praticante, dizia que eles, em vidas passadas, tinham convivido
de maneira estreita com a raça na Índia, por isso, essa familiaridade com a mesma.

Duas pessoas foram escolhidas por Nilo Lemos para acompanhá-lo em suas
andanças: eu e o doutor Julinho, Júlio Batista Costa Filho, seu cunhado. Meu pai,
Paulo Lemos, Nilo Lemos e Honorina Lemos eram irmãos. Esta última, por sua vez,
casada com o doutor Julinho. Daí resulta a confiança do Tio Nilo em mim, mesmo
contanto com 8 a 10 anos de idade.

Para diferenciá-lo do Gaiolão no Norte de Aristóteles Góes, o Gaiolão adquirido por
Nilo Lemos passou a ser identificado como Gaiolão do Sul. No retiro São José, a
primeira vaca coberta por ele foi Tirolesa, um animal de pelagem cinza clara, cabeça
exagerada, fora do padrão racial, crioula de José de Pádua Diniz, de Barretos. Era
filha de um touro Indubrasil com a vaca Roseira, que era filha da importada Minhoca.
O que ninguém entendeu foi como Continentino Jacintho da Silva, o Tenente Jacinto,
ao invés de mandar a vaca Noronha, filha de importados, Alambique e Gabarra, com
uma produção extraordinária de leite para ser enxertada de Gaiolão, num presente de
seu primo Nilo, mandou Tirolesa. Desse acasalamento nasceu em agosto de 1939, o
touro Goiolinha, que trouxe excelente retorno financeiro ao tenente, isto em função
de que, naquela época, a preferência era por animais de cabeças pesadas. Achavam
que essa era a cabeça do verdadeiro Gir. A falta de consistência genética no touro
Goiolinha, advinda de sua mãe, uma vaca mestiça, fez com que essa linhagem
desaparecesse com o tempo.

Com a vaca Fortuna, de propriedade de Nilo Lemos, que posteriormente foi vendida
para a Estação Experimental de Umbuzeiro, numa deferência a Epitácio Pessoa,
Gaiolão produziu Guilherme II (registro 300). Esse nome se deve ao rei Guilherme II,
da Inglaterra.

Gaiolão com a Mancha (registro 128) marca Âncora, da fazenda Cidreira, em Santa
Rita de Cássia, Minas Gerais, de propriedade do Cel. Antenor Machado de Azevedo,
produziu Manchinha que, com Guilherme II, produziu Triunfo NL (registro 2054).

Uma História interessante marcou o touro Triunfo NL. No ano de 1943 ou 44, Nenê
Costa e Bruno Silveira, que na época residiam em Barretos, compraram toda a
produção de machos Gir da Fazenda Santa Gema, de propriedade de Nilo Lemos e
doutor Julinho, à média 1 conto de reis por cabeça. Nessa leva foi o Triunfo NL
juntamente com mais de 100 bezerros. Manchinha morreu quando Triunfo NL estava
com mais ou menos 6 meses de idade. Com isso, Bruno Silveira e Nenê Costa
resolveram criar o bezerro numa chácara na cidade de Barretos. Com o passar do
tempo, o bezerro Triunfo NL chamava a atenção pelo seu desenvolvimento e
expressão racial, revelando-se em um exemplar considerado “fora de série”. Nesta
época, foi visto pelo criador da cidade de Paulo Faria, São Paulo, Brasiliano Barbosa,
que interessou pelo mesmo. Todavia, Bruno e Nenê disseram o aquele bezerro não
tinha preço. Brasiliano Barbosa voltando-se para ambos disse: _”acabei de matar
1000 bois de 19 arrobas no Frigorífico Anglo aqui em Barretos. Ofereço o dinheiro
desses mil bois que se encontra no escritório do frigorífico, mais 20 contos de reis”.
Vale a pena afirmar que a boiada da cidade de Paulo Faria, era uma das melhores do
Estado de São Paulo. Bruno e Nenê se renderam a oferta e realizaram o negócio. Em
venda de bezerro é bem provável que seja o bezerro mais bem vendido em todos os
tempos. O final dessa História não foi dos mais felizes. Dois anos depois veio a crise
do Zebu do “vale quanto pesa”. Dentre os que quebraram com o zebu estava
Brasiliano Barbosa.

Essa História é interessante. Um dos palcos foi montado na cidade de Uberaba,
Minas Gerais, com o touro Triunfo NL como personagem principal. Contam que
quando Getúlio Vargas em visita a inauguração da EXPOZEBU. ao desfilar pelos
pavilhões, quando aproximou do animal cujo preço de compra o tornará mais famoso
do que ele próprio, num gesto de entusiasmo e vaidade, o proprietário mandou puxar
o touro e perguntou: _ Quanto vale, presidente? Este deu um tapa na anca do animal e
respondeu: _ Vale quanto pesa. Logo depois, o Banco do Brasil cortou a linha de
crédito para a compra de animais de elite, o que colocou o mercado do Gir em
dificuldades, quebrando muitos criadores. E esse “vale quanto pesa” ficou como
responsável pela crise no Zebu, notadamente, na raça Gir que lidera as raças no país
naquele momento. O outro palco foi o Parque de Exposições Gameleira, de Belo
Horizonte, Minas Gerais, e o personagem seria o touro Canadá, campeão em BH no
ano de 1944, de propriedade da Companhia Agropecuária Canadá Limitada. A
propaganda do touro Canadá, era um saco de ração com ele comendo. Esse touro,
Canadá, está documentado no livro Os Grandes Reprodutores Indianos no Brasil, de
André Weiss, 1956, página 215. João Feliciano Ribeiro, confirmava a História do
“vale quanto pesa” com o touro Canadá, em Belo Horizonte.

Depois da crise do zebu em 45, Triunfo estava com aproximadamente 3 anos de idade
quando em suas andanças atrás de gado Gir puro de reprodutivo, com seu “olhar de
lince”, Nilo Lemos, o descobriu na Fazenda do sogro de Brasiliano, em Paulo Faria,
relatando esse fato ao doutor Julinho, na cidade de Franca, que, por debaixo do pano
o comprou por 500 contos de reis se transformando em um dos maiores reprodutores
de sua época.

Durante o auge de sua exploração como reprodutor, contando com seis para sete
anos, quando considerado, quiçá, o melhor touro do Brasil, a desdita. Num dia infeliz
para a pecuária girista, Triunfo NL e mais 12 fêmeas Gir foram atingidos por um raio.
Honorina, esposa do doutor Julinho, chorou por 12 meses seguidos, o que mostra não
somente sua sensibilidade, a paixão pelo Gir, bem como seu apego ao touro Triunfo
NL.

Sobre Guilherme II (registro 300), irmão de Manchinha, filho de Gaiolão (do Sul)
com Fortuna, descendente da família dos Maxixes, que eram descendentes de
importados, outra história. Ao apartarem a sociedade, doutor Julinho optou por ficar
com a Fazenda Santa Gema, em Franca, e, Nilo Lemos partiu para Barretos,
adquirindo a Fazenda Santa Adelaide, hoje pertencente a Armando Milani, onde
morou com a família, sua mulher e as três filhas, Ibi, Iza e Edi. Na divisão do gado,
Nilo Lemos ficou com Guilherme II e o doutor Julinho com o touro Rançoso,
também filho de Gaiolão. Posteriormente, Nilo Lemos adquiriu de sua mãe o touro
Iman, por 6 contos de réis, filho de Tamoio com Lembrança, Campeão Nacional em
Barretos e, posteriormente vendido a Mamedi Mussi. Outro touro que serviu na
Fazenda Santa Adelaide foi Sangue, filho-neto de Guilherme II.

Instalado na Fazenda Santa Adelaide, em Barretos, com Guilherme II, Iman e Sangue
e mais 50 matrizes que ele considerava como o supra-sumo da raça no Brasil,
resolveu levar na Exposição de Barretos o touro Guilherme II (registro 300) que foi
submetido a uma comissão composta por jurados da Sociedade Rural do Triângulo
Mineiro (SRTM), onde foi surpreendido pelos uberabenses. Quando da segunda volta
dos animais em pista, mandou Guilherme II para a cerca. Nilo Lemos dentro de sua
educação nada reclamou, mas ficou destruído como criador. Tinha consciência do que
representava para o Gir brasileiro o touro Guilherme II. Por outro lado, para os
jurados uma coisa normal, como normal foi negar o registro ao touro White, do
doutor Evaristo Soares de Paula.

No ano seguinte, Nilo Lemos preparou toda a progênie de Guilherme II para a pista
da Exposição, que ocorria no início do mês de abril de cada ano. Para a surpresa a
comissão julgadora era a mesma. Todavia, não se incomodou, mandou o gado para a
pista. Um dos membros daquele comissão perplexo com o que via, chamou Nilo
Lemos e perguntou de onde ele havia tirado tão excelentes animais? Com sua lisura
de sempre, respondeu: _ Com aquele touro que no ano passado os senhores
colocaram na cerca. Vocês estão esperando que eu relate a posição da comissão
uberabense, mas como? De que maneira? Como diz o ditado: diante daquele fato era
por a viola no saco e ir embora.

Tio Nilo, como carinhosamente sempre o tratei e que me chamava de filho, passou
um pedaço sombrio. Durante 2 anos perdeu toda a produção nascida na Fazenda
Santa Adelaide. Investigando a causa descobriu que era falta de cobalto. Com a
utilização desse elemento no sal mineral, a questão foi solucionada. Em seguida, deu
o gado a meia para o Fernandinho Sampaio, o primeiro criador a colocar uma balança
em seu curral. Numa das visitas à Fazenda de Fernandinho, Nilo Lemos deparou com
o touro Campônio, marca VR, cobrindo suas vacas e Guilherme II (registro 300)
encostado num piquete. Outra decepção. Resolveu então vender o gado sob a
corretagem de Zé Neca para João de Oliveira Guimarães.

Outra História interessante. Gaiolão foi campeão na cidade do Rio de Janeiro. Sob a
influência de criadores insatisfeitos com o resultado, porém, influentes politicamente,
levaram o Ministério da Agricultura a comete um erro fatal, o de cassar o campeonato
de Gaiolão, sob a alegação de que o mesmo era importado. Coube ao doutor Júlio
Batista da Costa Filho, o doutor Julinho, grande advogado, a defender a causa. Muito
inteligente, argumentou que Gaiolão havia nascido no navio que trazia o gado
importado para o Brasil, em águas brasileiras, por conseguinte, era de acordo com a
Carta Magna, brasileiro, com isso o Ministério teve que recuar e manter o título de
Campeão do Estado do Rio de Janeiro ao touro Gaiolão. Um touro diferenciado que
aportou a esse país ao lado de Krishna.

                                                               Hélio Ronaldo Lemos,
                                                é consultor e jurado de raças zebuínas

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De a a z hélio ronaldo lemos g de gaiolão

  • 1. De A a Z Hélio Ronaldo Lemos G de Gaiolão No rebanho Gir brasileiro temos 2 touros se destacaram com esse nome. Ambos importados da Índia. Um na Bahia de propriedade de Aristóteles Góes, pai de Aderbal Góes e outro, no Estado de São Paulo, trazido na importação de 1930, levada a efeito pelo doutor Ravísio Lemos. Tratava-se um garrote novo, que veio no meio do gado sem nenhuma referência, e que, depois, foi vendido para a cidade de Casa Branca, ao avô do Quincão, proprietário do C.A. Everest e C. A. Sansão. Totó Pompane e um outro corretor, ambos da cidade de Ribeirão Preto, descobriram Gaiolão e comentou com Nilo Lemos sobre o mesmo que, de imediato, foram a fazenda do Coronel, no início 1938, e assim que viu o animal, Nilo Lemos, comentou emocionado: “isso aqui é Gir. Nunca vi nada igual”. Um animal que deveria valer 5 contos de réis, no máximo, levado pela empolgação Nilo Lemos pagou 15 contos de réis, sendo 10 contos de réis em moeda corrente e o restante através de 10 garrotes gir comercial. Valor esse até então nunca pago a um animal neste país. Mas, isto, se deve em minha opinião, ao altíssimo conhecimento que o Nilo Lemos tinha sobre a raça Gir. Natural de Passos, Minas Gerais, filho de Honório Coelho Lemos e de Maria Teodora Jacinto da Silva (Tia Tadola) mudando-se posteriormente para a cidade de Franca, São Paulo, alugou um retiro da antiga Fazenda Taquaral, do Cel. Antônio Jacintho da Silva, com a finalidade de criar Gir. Em criança, Nilo Lemos, na idade de 1 para 2 anos de vida, por um descuido de sua pajem levou uma queda fraturando a coluna vertebral. Embora deixando sequelas, estas não comprometeram sua coordenação motora. Nilo Lemos foi um predestinado no conhecimento sobre a raça Gir. Sempre dizia que uma vaca boa escolhida por ele tinha que valer o dobro de mercado mais alguma coisa. João Navega, avô de Orlando Moraes, marido da atriz Glória Pires, por ser espírita convicto e praticante, dizia que eles, em vidas passadas, tinham convivido de maneira estreita com a raça na Índia, por isso, essa familiaridade com a mesma. Duas pessoas foram escolhidas por Nilo Lemos para acompanhá-lo em suas andanças: eu e o doutor Julinho, Júlio Batista Costa Filho, seu cunhado. Meu pai, Paulo Lemos, Nilo Lemos e Honorina Lemos eram irmãos. Esta última, por sua vez, casada com o doutor Julinho. Daí resulta a confiança do Tio Nilo em mim, mesmo contanto com 8 a 10 anos de idade. Para diferenciá-lo do Gaiolão no Norte de Aristóteles Góes, o Gaiolão adquirido por Nilo Lemos passou a ser identificado como Gaiolão do Sul. No retiro São José, a
  • 2. primeira vaca coberta por ele foi Tirolesa, um animal de pelagem cinza clara, cabeça exagerada, fora do padrão racial, crioula de José de Pádua Diniz, de Barretos. Era filha de um touro Indubrasil com a vaca Roseira, que era filha da importada Minhoca. O que ninguém entendeu foi como Continentino Jacintho da Silva, o Tenente Jacinto, ao invés de mandar a vaca Noronha, filha de importados, Alambique e Gabarra, com uma produção extraordinária de leite para ser enxertada de Gaiolão, num presente de seu primo Nilo, mandou Tirolesa. Desse acasalamento nasceu em agosto de 1939, o touro Goiolinha, que trouxe excelente retorno financeiro ao tenente, isto em função de que, naquela época, a preferência era por animais de cabeças pesadas. Achavam que essa era a cabeça do verdadeiro Gir. A falta de consistência genética no touro Goiolinha, advinda de sua mãe, uma vaca mestiça, fez com que essa linhagem desaparecesse com o tempo. Com a vaca Fortuna, de propriedade de Nilo Lemos, que posteriormente foi vendida para a Estação Experimental de Umbuzeiro, numa deferência a Epitácio Pessoa, Gaiolão produziu Guilherme II (registro 300). Esse nome se deve ao rei Guilherme II, da Inglaterra. Gaiolão com a Mancha (registro 128) marca Âncora, da fazenda Cidreira, em Santa Rita de Cássia, Minas Gerais, de propriedade do Cel. Antenor Machado de Azevedo, produziu Manchinha que, com Guilherme II, produziu Triunfo NL (registro 2054). Uma História interessante marcou o touro Triunfo NL. No ano de 1943 ou 44, Nenê Costa e Bruno Silveira, que na época residiam em Barretos, compraram toda a produção de machos Gir da Fazenda Santa Gema, de propriedade de Nilo Lemos e doutor Julinho, à média 1 conto de reis por cabeça. Nessa leva foi o Triunfo NL juntamente com mais de 100 bezerros. Manchinha morreu quando Triunfo NL estava com mais ou menos 6 meses de idade. Com isso, Bruno Silveira e Nenê Costa resolveram criar o bezerro numa chácara na cidade de Barretos. Com o passar do tempo, o bezerro Triunfo NL chamava a atenção pelo seu desenvolvimento e expressão racial, revelando-se em um exemplar considerado “fora de série”. Nesta época, foi visto pelo criador da cidade de Paulo Faria, São Paulo, Brasiliano Barbosa, que interessou pelo mesmo. Todavia, Bruno e Nenê disseram o aquele bezerro não tinha preço. Brasiliano Barbosa voltando-se para ambos disse: _”acabei de matar 1000 bois de 19 arrobas no Frigorífico Anglo aqui em Barretos. Ofereço o dinheiro desses mil bois que se encontra no escritório do frigorífico, mais 20 contos de reis”. Vale a pena afirmar que a boiada da cidade de Paulo Faria, era uma das melhores do Estado de São Paulo. Bruno e Nenê se renderam a oferta e realizaram o negócio. Em venda de bezerro é bem provável que seja o bezerro mais bem vendido em todos os tempos. O final dessa História não foi dos mais felizes. Dois anos depois veio a crise do Zebu do “vale quanto pesa”. Dentre os que quebraram com o zebu estava Brasiliano Barbosa. Essa História é interessante. Um dos palcos foi montado na cidade de Uberaba, Minas Gerais, com o touro Triunfo NL como personagem principal. Contam que
  • 3. quando Getúlio Vargas em visita a inauguração da EXPOZEBU. ao desfilar pelos pavilhões, quando aproximou do animal cujo preço de compra o tornará mais famoso do que ele próprio, num gesto de entusiasmo e vaidade, o proprietário mandou puxar o touro e perguntou: _ Quanto vale, presidente? Este deu um tapa na anca do animal e respondeu: _ Vale quanto pesa. Logo depois, o Banco do Brasil cortou a linha de crédito para a compra de animais de elite, o que colocou o mercado do Gir em dificuldades, quebrando muitos criadores. E esse “vale quanto pesa” ficou como responsável pela crise no Zebu, notadamente, na raça Gir que lidera as raças no país naquele momento. O outro palco foi o Parque de Exposições Gameleira, de Belo Horizonte, Minas Gerais, e o personagem seria o touro Canadá, campeão em BH no ano de 1944, de propriedade da Companhia Agropecuária Canadá Limitada. A propaganda do touro Canadá, era um saco de ração com ele comendo. Esse touro, Canadá, está documentado no livro Os Grandes Reprodutores Indianos no Brasil, de André Weiss, 1956, página 215. João Feliciano Ribeiro, confirmava a História do “vale quanto pesa” com o touro Canadá, em Belo Horizonte. Depois da crise do zebu em 45, Triunfo estava com aproximadamente 3 anos de idade quando em suas andanças atrás de gado Gir puro de reprodutivo, com seu “olhar de lince”, Nilo Lemos, o descobriu na Fazenda do sogro de Brasiliano, em Paulo Faria, relatando esse fato ao doutor Julinho, na cidade de Franca, que, por debaixo do pano o comprou por 500 contos de reis se transformando em um dos maiores reprodutores de sua época. Durante o auge de sua exploração como reprodutor, contando com seis para sete anos, quando considerado, quiçá, o melhor touro do Brasil, a desdita. Num dia infeliz para a pecuária girista, Triunfo NL e mais 12 fêmeas Gir foram atingidos por um raio. Honorina, esposa do doutor Julinho, chorou por 12 meses seguidos, o que mostra não somente sua sensibilidade, a paixão pelo Gir, bem como seu apego ao touro Triunfo NL. Sobre Guilherme II (registro 300), irmão de Manchinha, filho de Gaiolão (do Sul) com Fortuna, descendente da família dos Maxixes, que eram descendentes de importados, outra história. Ao apartarem a sociedade, doutor Julinho optou por ficar com a Fazenda Santa Gema, em Franca, e, Nilo Lemos partiu para Barretos, adquirindo a Fazenda Santa Adelaide, hoje pertencente a Armando Milani, onde morou com a família, sua mulher e as três filhas, Ibi, Iza e Edi. Na divisão do gado, Nilo Lemos ficou com Guilherme II e o doutor Julinho com o touro Rançoso, também filho de Gaiolão. Posteriormente, Nilo Lemos adquiriu de sua mãe o touro Iman, por 6 contos de réis, filho de Tamoio com Lembrança, Campeão Nacional em Barretos e, posteriormente vendido a Mamedi Mussi. Outro touro que serviu na Fazenda Santa Adelaide foi Sangue, filho-neto de Guilherme II. Instalado na Fazenda Santa Adelaide, em Barretos, com Guilherme II, Iman e Sangue e mais 50 matrizes que ele considerava como o supra-sumo da raça no Brasil, resolveu levar na Exposição de Barretos o touro Guilherme II (registro 300) que foi
  • 4. submetido a uma comissão composta por jurados da Sociedade Rural do Triângulo Mineiro (SRTM), onde foi surpreendido pelos uberabenses. Quando da segunda volta dos animais em pista, mandou Guilherme II para a cerca. Nilo Lemos dentro de sua educação nada reclamou, mas ficou destruído como criador. Tinha consciência do que representava para o Gir brasileiro o touro Guilherme II. Por outro lado, para os jurados uma coisa normal, como normal foi negar o registro ao touro White, do doutor Evaristo Soares de Paula. No ano seguinte, Nilo Lemos preparou toda a progênie de Guilherme II para a pista da Exposição, que ocorria no início do mês de abril de cada ano. Para a surpresa a comissão julgadora era a mesma. Todavia, não se incomodou, mandou o gado para a pista. Um dos membros daquele comissão perplexo com o que via, chamou Nilo Lemos e perguntou de onde ele havia tirado tão excelentes animais? Com sua lisura de sempre, respondeu: _ Com aquele touro que no ano passado os senhores colocaram na cerca. Vocês estão esperando que eu relate a posição da comissão uberabense, mas como? De que maneira? Como diz o ditado: diante daquele fato era por a viola no saco e ir embora. Tio Nilo, como carinhosamente sempre o tratei e que me chamava de filho, passou um pedaço sombrio. Durante 2 anos perdeu toda a produção nascida na Fazenda Santa Adelaide. Investigando a causa descobriu que era falta de cobalto. Com a utilização desse elemento no sal mineral, a questão foi solucionada. Em seguida, deu o gado a meia para o Fernandinho Sampaio, o primeiro criador a colocar uma balança em seu curral. Numa das visitas à Fazenda de Fernandinho, Nilo Lemos deparou com o touro Campônio, marca VR, cobrindo suas vacas e Guilherme II (registro 300) encostado num piquete. Outra decepção. Resolveu então vender o gado sob a corretagem de Zé Neca para João de Oliveira Guimarães. Outra História interessante. Gaiolão foi campeão na cidade do Rio de Janeiro. Sob a influência de criadores insatisfeitos com o resultado, porém, influentes politicamente, levaram o Ministério da Agricultura a comete um erro fatal, o de cassar o campeonato de Gaiolão, sob a alegação de que o mesmo era importado. Coube ao doutor Júlio Batista da Costa Filho, o doutor Julinho, grande advogado, a defender a causa. Muito inteligente, argumentou que Gaiolão havia nascido no navio que trazia o gado importado para o Brasil, em águas brasileiras, por conseguinte, era de acordo com a Carta Magna, brasileiro, com isso o Ministério teve que recuar e manter o título de Campeão do Estado do Rio de Janeiro ao touro Gaiolão. Um touro diferenciado que aportou a esse país ao lado de Krishna. Hélio Ronaldo Lemos, é consultor e jurado de raças zebuínas