1. Uma Listinha para Futuras Vovós
Por Nurit Bensusan1
Algumas histórias da minha avó sobre como as coisas funcionavam na sua época
me surpreendiam. Minha favorita era a do advento da geladeira. Na verdade, a maioria
das histórias contava como era a vida sem coisas que hoje nos parecem bem básicas.
Eu já tenho uma listinha de coisas que acho que vão surpreender meus netos, se
eu chegar a conhecê-los. Esta lista é, entretanto, essencialmente diferente daquela da
minha avó. Ela certamente contém coisas da mesma natureza, como relatos de como é a
vida sem o computador, mas também coisas que acredito que estão se perdendo – para o
bem e para o mal.
Encabeça a minha lista, a meu ver para o bem, o desaparecimento da escrita,
assim manuscrita, com a mãozinha. Tenho certeza de que meus netos virão me pedir que
eu escreva alguma coisa pra eles com minha mão, pois eles saberão, quando muito,
digitar. Acho que falar será suficiente para que o computador escreva, pontue e até
traduza de um idioma para o outro.
No entanto, outros fatos irão surpreender mais. Imagino-me contando para eles
que havia uma geleira gigante de 275 quilômetros quadrados, e com uma frente que
media uns cinco quilômetros. Será que eles vão acreditar, em um mundo bem mais
aquecido, que havia algo como a geleira Perito Moreno, na Argentina? E uma floresta
tropical que cobria mais de 40% da extensão do Brasil? Onças-pintadas? Baleias?
Rinocerontes? Peixes-boi?
Outra surpresa para os meus futuros netos será a experiência do feijãozinho no
algodão. Quase todos nós fizemos essa experiência em algum momento da infância:
trata-se de colocar um grão de feijão em um algodão molhado, dentro de um recipiente, e
esperar a semente brotar. Como é bem possível que, no admirável mundo novo que nos
espera, os grãos de feijão não sejam sementes de feijão, essa tradicional experiência se
tornará lenda. Isso porque uma das novas tecnologias agrícolas, chamada “terminator”,
faz com que os grãos derivados das sementes compradas e plantadas não sejam
sementes – isto é, sejam estéreis. Dessa forma, o agricultor precisa comprar, a cada nova
safra, novas sementes.
Lamentavelmente, se continuarmos na mesma toada é provável que isso soe aos
ouvidos das futuras gerações como soavam para nós as histórias dos dinossauros. Ao
contrário de uma amiga que ficou furiosa quando seu neto perguntou se ela já havia
nascido quando os dinossauros existiam, teremos que admitir que um dia compartilhamos
este planeta com onças, baleias, florestas tropicais e geleiras e pouco fizemos para
mantê-las...
1 Extraído do livro “Meio Ambiente. E eu com isso? Editora Petrópolis.