Este documento descreve a modelação e otimização de uma caldeira vertical recuperadora de calor com três níveis de pressão utilizada em uma central termoelétrica a ciclo combinado. Um modelo analítico foi desenvolvido no Excel para simular a troca de calor e maximizar a produção de vapor, considerando parâmetros como o "Approach Point", o "Pinch Point" e as temperaturas dos gases e vapor. Os resultados do modelo serão comparados com uma simulação numérica para validação.
Otimização de caldeira vertical HRSG de três níveis de pressão
1. OPTIMIZAÇÃO DE UMA CALDEIRA VERTICAL RECUPERADORA DE CALOR E DE
CIRCULAÇÃO NATURAL
Grácio, L.(1)
, Carvalho, I.(2)
, Félix, P.(3)
(1)
ALSTOM Portugal – Setúbal, S.A.
(2)
Instituto Superior de Engenharia de Lisboa
(3)
EDP Produção EM, Grupo EDP
(2)
Departamento de Engenharia Mecânica
Rua Conselheiro Emídio Navarro, 1
1949 – 014 Lisboa
e-mail: icarvalho@dem.isel.ipl.pt
RESUMO
Este trabalho dedica-se ao estudo de uma caldeira vertical recuperadora de calor com três níveis de pressão, circulação natural e
sistema de reaquecimento (HRSG – Heat Recovery Steam Generator) em regime estacionário, sendo parte integrante de uma central
termoeléctrica a ciclo combinado. De acordo com as leis fundamentais da termodinâmica, foi elaborado um modelo analítico em
MsExcel que simula o efeito dos mecanismos de permuta de calor, visando a optimização quantitativa da caldeira.É analisada a
distribuição dos caudais de água/vapor em função de parâmetros de controlo, como o “Approach Point”, o “Pinch Point”, a
temperatura dos gases quentes à saída da chaminé e a temperatura do vapor sobreaquecido à saída dos três níveis de pressão da
caldeira. O modelo desenvolvido é aplicável a qualquer tipo de caldeira, permitindo controlar e monitorizar detalhadamente todos
os parâmetros de operação e de segurança, prevendo situações de funcionamento e análise de soluções, sem comprometer o
rendimento e a potência térmica da caldeira. O estudo e visualização numérica do escoamento gasoso, simulado para as mesmas
condições fronteira usadas no modelo em MsExcel, visa a validação e a optimização do modelo analítico, através da comparação e
transferência directa dos resultados numéricos para o sistema analítico.
Palavras – chave: “Approach Point”, “Pinch Point”, HRSG, Caldeira Recuperadora, Circulação Natural
NOMENCLATURA
Ap = Área de permuta, m2
C = Capacidade térmica do fluido, kW/ºC
Cp = Calor específico do fluido, kJ/Kg.K
h = Coeficiente de convecção térmica, W/m2
.ºC
h = Entalpia, kJ/kg
kmaterial = Coeficiente condutibilidade térmica do material, kW/m.ºC
m = Caudal mássico de fluido, kg/s
N = Número de passagens por permutador
NTU = “Number of Transfer Units”, número de unidades térmicas transferidas
P = Pressão absoluta, bar (a)
Q = Potência térmica, kW
R = Razão entre as capacidades térmicas de ambos os fluidos
T ou t = Temperatura Absoluta, K ou ºC
Ug = Coeficiente global de transmissão de calor, kW/m2
.ºC
∆ta = Approach Point, ºC ou K
∆tp = Pinch Point, ºC ou K
ε = Eficiência global do permutador, %
εa = Eficiência parcial, por passagem, do permutador, %
1. INTRODUÇÃO
Este trabalho tem como principal objectivo a optimização da produção de vapor de uma caldeira recuperadora de calor
de circulação natural, com três níveis de pressão e com sistema de reaquecimento, funcionando em regime estacionário,
aplicada a uma central termoeléctrica de ciclo combinado. A caldeira tem a importante função de recuperar a energia
térmica disponível nos gases de exaustão da turbina de gás (provenientes do ciclo de Brayton), e gerar vapor
sobreaquecido, desempenhando assim o papel de interface térmica entre ambos os fluidos, ou ambos os ciclos térmicos,
tal como representado na figura 1.
4. 3.2. MODELO ANALÍTICO DA PRODUÇÃO DE VAPOR DA CALDEIRA
O método de cálculo aplicado relaciona os parâmetros inerentes a todo o volume de controlo da caldeira e simula
analiticamente a produção de vapor nos 3 níveis de pressão, em função dos elementos fronteira e variáveis de controlo.
As variáveis de controlo devem estar dentro dos limites admissíveis de funcionamento, indicadas pela especificação do
produto (normas ASME) para caldeiras recuperadoras de calor.
Os principais aspectos a ter em conta na aplicação do método ε – NTU (Effectiveness and Number of Transfer Units),
são os seguintes:
• O método só se aplica quando se conhecem as propriedades de ambos os fluidos à entrada de cada
permutador, tais como, pressão, temperatura, calor específico e caudal;
• A transferência de calor entre ambos os fluidos é do tipo directa, designada de “cross-counterflow”;
• Nas passagens e entre as passagens de cada permutador, o escoamento é do tipo “Unmixed”, onde a
temperatura de ambos os fluidos varia num plano perpendicular ao seu trajecto;
• Caracterização de cada permutador e identificação dos seguintes parâmetros: NTU, R, N, kMaterial e
Configuração do fluxo.
O sistema analítico desenvolvido encontra-se esquematicamente representado na figura 3.
Figura 3: Sistema analítico do balanço energético de um permutador de calor, método ε – NTU aplicado no MsExcel.
A vantagem do método ε – NTU está na facilidade de cálculo da eficiência global de cada permutador, ε, através de
expressões explícitas e seus parâmetros, como indicado na figura 3. Os parâmetros não estão condicionados às
propriedades de ambos os fluidos à saída de cada permutador, no entanto, uma vez conhecidas estas propriedades, o
NTU e o R podem ainda ser iterativamente optimizados, em função do Cmin. (média aritmética das capacidades térmicas
da água/vapor, entre a entrada e a saída).
Tomando como referência a figura 4, a expressão da eficiência global, ε, que relaciona todos esses parâmetros é a
seguinte:
( ) ( )
( ) ( )N
a
N
a
N
a
N
a
RR
R
εε
εε
ε
−×−×−
−−×−
=
11
11
(1)
A eficiência parcial de cada permutador, εa, é obtida explicitamente pela seguinte expressão:
( )[ ]
−⋅−×−= 1expexp1 78,0
22,0
NTUR
R
NTU
aε (2)
6. alimentação da água, como indicado na figura 5. Todos os valores representados no menu principal são
automaticamente actualizados pelo processo de cálculo iterativo do modelo (cerca de 800 iterações), tendo a vantagem
de permitir ao utilizador a percepção, em tempo real, da variação de todos os parâmetros de controlo.
Figura 5: Menu principal de interface entre o utilizador e o modelo analítico em MsEXCEL.
O caso prático da aplicação do modelo diz respeito às condições personalizadas, referenciadas pelas condições iniciais
dos elementos fronteira dos gases de combustão à entrada da caldeira, tal como indicado na figura 6. Este submenu rege
a quantidade de energia térmica disponível, necessária à produção de vapor. O utilizador deve também introduzir os
parâmetros das condições iniciais dos restantes elementos indicados no 1º submenu da introdução de dados, tais como:
• Preaquecedor de Combustível: Purga de água do nível de MP, utilizado para preaquecer o
combustível (gás natural) necessário na combustão do primeiro ciclo. O seu objectivo é quantificar o
caudal mássico, m, que é purgado à saída do economizador de MP, visualizado na figura 2.
• Circuito de Água/Vapor: Introdução do caudal mássico total de água de alimentação da caldeira,
cerca de 100kg/s, que posteriormente será distribuído pelos três níveis de pressão (AP, MP, BP),
segundo um balanço médio percentual definido pelo projectista da caldeira (AP = 69%, MP = 22%,
BP = 9%). O utilizador pode definir os valores de pressão de saturação dos três níveis, os quais estão
permanentemente condicionados à quantidade energética disponível nos gases quentes, verificando-se
um menor rendimento térmico, quando maior for a pressão de saturação escolhida.
• Bombas de Alimentação da Água: São os elementos de impulsão do escoamento ao longo de todo o
percurso do sistema de água/vapor da caldeira. São dimensionadas para vencerem as perdas de carga
de todo o circuito da linha de água, nomeadamente o de alta e média pressão, perdas essas que são
provenientes do atrito viscoso. O utilizador apenas introduz a pressão que prentende atingir nas
bombas de AP e MP.
Uma vez introduzidos todos os dados nos campos assinalados (a amarelo) do 1º submenu, o utilizador pode então
visualizar, numa primeira apreciação, os resultados dos parâmetros de controlo, tal como se indica na figura 7.
7. Figura 6: Submenu das condições iniciais dos Gases de Combustão.
Figura 7: Primeira apreciação dos resultados, depois da introdução das condições fronteira iniciais.
É manifestada a necessidade de correcção dos parâmetros de controlo assinalados com o aviso, “controlar (<=1)”,
sinalizados nomeadamente na coluna do “Approach Point no Economizador de MP e preaquecedor de condensados”.
Este aviso deve-se à ocorrência de vapor no economizador de MP e preaquecedor de condensados. Este fenómeno
deve-se à existência de grandes quantidades de calor disponibilizadas pelos gases quentes, proporcionalmente ao caudal
circulante nos respectivos permutadores, conduzindo a um deficiente aproveitamento de calor a montante destes pontos.
Da mesma forma, o caudal de água aí circulante não tem a capacidade de dissipar todo o calor disponibilizado pelos
gases quentes.
O objectivo é garantir que os valores das variáveis de controlo, nomeadamente o Approach Point, o Pinch Point, a
temperatura dos gases na chaminé e as temperaturas finais do vapor sobreaquecido, se mantenham dentro das gamas
funcionais (pré-definidas no modelo) e optimizadas em função da regulação (aumento ou decréscimo) do caudal de
água nos três níveis de pressão. Uma vez satisfeitas todas as variáveis de controlo, dentro dos valores admissíveis, pode
considerar-se que a caldeira foi optimizada, como apresentado na figura 8. Uma análise comparativa entre as figuras 7 e
8, permite verificar que o rendimento da caldeira aumenta de 86,12% para 86,99%, com um aumento de produção total
de vapor de 161,387 kg/s para 166,180 kg/s. O diagrama de Mollier (T-h) e o diagrama das potências térmicas e
temperaturas da linha dos gases e da água/vapor, encontram-se apresentados nas figuras 9 e 10, respectivamente.
Admitindo as mesmas condições fronteira, a diferença obtida entre os resultados do M.A.E e os dados de projecto. foi
quantificada entre 2 a 3%.
8. Figura 8: Quadro final das varíáveis de controlo e apresentação de resultados optimizados.
Figura 9: Diagrama de Mollier (T-h) do M.A.E., depois da optimização da caldeira.
Figura 10: Diagrama (Q-T) do M.A.E., potências térmicas e temperaturas da linha dos gases e da água/vapor.
9. 5. VISUALIZAÇÃO NUMÉRICA DO COMPORTAMENTO DOS GASES QUENTES
Realiza-se, aqui, uma análise detalhada visando a validação do M.A.E. Utiliza-se como exemplo o comportamento dos
gases quentes durante a sua passagem pelo reaquecedor 2 (ver figura 2). Numa primeira fase, efectuou-se a modelação
tridimensional de um volume elementar de tubos do reaquecedor 2, através do SolidWorks2001 [4], como se ilustra na
figura 11. Para a visualização numérica do comportamento do escoamento dos gases quentes, recorre-se a um programa
de cálculo numérico, o FloWorks2001 [5], gentilmente cedido pela FloWorks, numa versão experimental de 8 dias.
Figura 11: Imagem do volume elementar de tubos do reaquecedor 2, alheta do tubo (SolidWorks2001) e sistema numérico.
Os resultados obtidos são directamente comparados com os resultados obtidos pelo M.A.E., considerando as mesmas
condições fronteiras, tais como:
• Material dos tubos alhetados: SA 213 T22 (Códigos ASME section I);
• Temperatura inicial das paredes dos tubos ≈ 500ºC;
• Condutibilidade térmica do material, k;
• Rugosidade, Rf ≈ 1 μm;
• Configuração dimensional do permutador
• Composição mássica dos produtos da combustão do gás natural (Ciclo de Brayton);
• Temperatura inicial: 579,6ºC (igual a TIN, ver figura 6);
• Pressão inicial: 1,05 bar (a);
• Velocidade inicial: vIN = 6,5 m/s na direcção YY;
• Transmissão de calor por convecção e condução através dos tubos.
Foi considerado um volume elementar no interior dos tubos, que dissipasse uma quantidade volumétrica de calor
(≅ 1319 kW/m3
), equivalente à quantidade total perdida pelos gases neste permutador, estabelecido pelo M.A.E.
Na figura 12 observa-se que a velocidade do escoamento gasoso aumenta quando a área de passagem diminui (região
entre os tubos – ver figura 12a), com consequentemente redução de pressão. Na figura 12a observa-se a curva de
estagnação ao longo da qual a velocidade média do escoamento se anula. Este tipo de geometria favorece a troca de
calor por convecção e por condução térmica tal como se pode observar na figura 12b. A área útil de permuta de calor,
pode ser associada à zona de recirculação, assinalada (a azul) na figura 12a. As características da zona de recirculação
estão directamente relacionadas com o processo de permuta de calor, tal como se pode observar pela comparação
directa entre as figuras 12a e 12b (zonas a cor de laranja).
A figura 13 representa a curva da temperatura média dos gases (a cheio), traçada automaticamente no final do cálculo
iterativo. Se admitirmos uma tendência linear (a tracejado), o gradiente desta recta é idêntico ao obtido para o
reaquecedor 2 (ver figura 10, para o parcial Q1), apresentando resultados muito próximos, que podem encontrar
justificação na proximidade da temperatura final dos gases quentes: cerca de 566ºC, relativamente a 563ºC.
Os resultados obtidos pelo M.A.E. e a visualização numérica apresentam uma diferença de 3ºC, associada a um erro
inferior a 1%. Assim, se este erro, inferior a 1% se mantiver, para a análise pormenorizada de toda a caldeira, leva a
concluir que o M.A.E apresenta resultados válidos, garantindo a sua eficácia no cálculo analítico.
10. a) b)
Figura 12: Campo de velocidade média (a) e distribuição de temperaturas (b) dos gases quentes.
Figura 13: Evolução da temperatura média dos gases quentes no reaquecedor 2 (FloWorks2001 – MsEXCEL).
6. CONCLUSÕES
Efectuou-se a optimização de uma caldeira vertical recuperadora de calor com três níveis de pressão, circulação natural
e sistema de reaquecimento (HRSG – Heat Recovery Steam Generator) em regime estacionário, actuando ao nível:
• do balanço dos caudais de água de entrada nos vários níveis de pressão, em função da escolha das condições
fronteira, referentes aos elementos envolventes que garantem o funcionamento normal da caldeira, permitindo
receber como variável de saída o caudal produzido pela caldeira;
• do funcionamento real da caldeira, segundo um controlo apertado dos principais parâmetros de operação e/ou de
segurança tais como: “Pinch Point”, “Approach Point”, gradiente de temperatura dos gases ao longo da caldeira e
propriedades da linha de água em todos os pontos de medida.
A caldeira foi optimizada sem comprometer o seu rendimento e a sua potência térmica, definidas no projecto original. A
optimização.
O modelo é flexível permitindo atingir diferentes soluções através da selecção dos parâmetros relevantes: Ap, Materiais
que suportem temperaturas e pressões mais elevadas, Configuração do escoamento e sistema de permutadores. A
optimização do funcionamento real segundo um controlo apertado dos principais parâmetros de segurança/operação:
“Pinch Point”, “Approach Point” e gradiente da temperatura dos gases ao longo da caldeira.