Priscila Torres relata ter sofrido discriminação por fiscais da empresa Julio Simões ao utilizar seu cartão de gratuidade no transporte público. Os fiscais Cristiano e Celso retiraram o cartão de Priscila de forma arbitrária e questionaram repetidamente a natureza de sua deficiência, expondo-a de forma humilhante na frente de outros passageiros. Priscila solicita a devolução de seu cartão e uma investigação sobre a conduta dos fiscais.
1. Excelentíssimo Senhor Doutor Promotor de Justiça da
Comarca de Itaquaquecetuba
Eu Priscila Torres ..... Venho respeitosamente relatar os seguintes fatos
que ensejam a atuação do Ministério Público.
Discriminação, humilhação e arbitrariedade em Transporte Público na
Região Metropolitana de São Paulo.
Empresa: Julio Simões “área de concessão 4 da EMTU”
No dia 26 de Abril de 2011, por volta das 18:50hs, ao utilizar o ônibus da
empresa Julio Simões, usando o cartão de gratuidade desta empresa sob n°
48644 de minha titularidade com direito a acompanhante, como de costume
encostei o cartão no painel da catraca e em seguida apresentei ao motorista
que liberou e ao encostar o cartão pela segunda vez a catraca foi liberada,
porém o cartão foi retirado arbitrariamente de minhas mãos sem nenhum
pronunciamento. Ao questionar sobre o que estava acontecendo, tive as
seguintes respostas.
- Fiscal Celso: (que recolheu o cartão e estava antes da catraca), perguntou,
“quem é o deficiente”.
- Priscila: respondi, sou eu, porquê?
- Fiscal Celso: em tom de desconfiança e ironicamente diz; o que você tem
para usar o cartão de deficiente?
- Priscila: comecei a explicar sobre a minha doença, porém, neste momento
tive consciência, que tais respostas não lhe cabiam e disse a ele que não iria
responder pois não era da competência dele saber o motivo que fez com que
tivesse direito a gratuidade.
- Fiscal Celso: e porque o seu cartão de acompanhante só passa 01 pessoa?
- Priscila: eu expliquei que em 2009 eu havia perdido a visão no olho esquerdo
e por um tempo não conseguia andar sozinha, porém após quimioterapia no
final do ano de 2010 voltei a andar sozinha, e ao usar o cartão em um ônibus
da Julio Simões, um fiscal que não recordo o nome, solicitou o cartão para
averiguação e questionou porque eu estava sozinha, então expliquei a situação
e o fiscal disse que à partir daquele dia o meu cartão iria passar apenas uma
pessoa e na época de renovar o beneficio, seria emitido um novo cartão sem
acompanhante, e desde então, o cartão somente liberava na catraca 1 pessoa
e pedi que tentasse passar novamente para se certificar que não estava
liberando acompanhante, aparece no visor a informação “uso seguido” o que
pode ser verificado nos registro do cartão.
- Fiscal Celso: passa o cartão no visor e certifica-se da informação “uso
seguido”, e informa que vai recolher meu cartão e que eu deveria prestar
esclarecimentos na empresa.
- Priscila: informo o fiscal Celso que ele não tem o direito de reter o cartão e
questiono sobre o fundamento legal desta ação. Neste momento um 2° fiscal
no ônibus (fiscal Cristiano) se levanta e começa a falar.
2. - Fiscal Cristiano: O seu cartão será recolhido e se a você tiver o direito ao
beneficio, terá que provar isso na empresa, eu vou chamar o meu supervisor e
ele vai informar o fundamento legal.
- Priscila: pergunto o nome e registro profissional, ele se recusa a fornecer,
neste momento um passageiro se manifesta e diz a ele (fiscal Cristiano) que
ele deve se identificar sim.
Neste momento chegou o local onde deveria descer, comunico que
preciso descer e peço o meu cartão. O fiscal Cristiano informa que eu não iria
descer pois o fiscal Celso estava preenchendo o “auto de apreensão” e eu
desceria no terminal.
Informo ao fiscal Cristiano que se eu não descesse naquele local,
iríamos todos direto para a delegacia, pois tenho mobilidade reduzida e convivo
com dor 24hs por dia e por esta razão que uso a isenção tarifária, pois
caminhar longos períodos agrava a minha dor e leva a queda por instabilidade
no Membro Inferior Esquerdo.
Neste momento o motorista para o ônibus, no ponto de ônibus próximo
a Drogaria Milton na Rua Piracicaba, desembarcamos eu, os fiscais Cristiano
e Celso e o passageiro Agnaldo, o fiscal Cristiano desembarca do ônibus ainda
falando, chamando a atenção de todas as pessoas que estavam no ponto de
ônibus, sendo eu, o centro dos olhares curiosos, falando em alto tom,
gesticulando e apontando o dedo para os nossos rostos (eu e Agnaldo).
Solicito a ele que devolva o meu cartão e forneça suas identificações.
- Fiscal Cristiano: não temos que dar nossa identificação, “você é deficiente”
(em alto tom e irônico) e seu cartão esta apreendido, pronto, agora você deve
ligar no 0800 e depois deve ir na na empresa explicar a sua deficiência e se for
direito o seu cartão será devolvido.
- Passageiro Agnaldo se identifica como Guarda Civil Metropolitano e solicita
gentilmente que eles apresentem as suas identificações e informa que eles não
tem o direito de falar comigo naquele tom e que ele seria minha testemunha.
Neste momento o fiscal Cristiano tira o crachá de dentro da camisa, o
fiscal Celso permanece calado preenchendo o tal “auto de apreensão”.
- Fiscal Celso: apresenta um documento e pedi para assinar, explica que é o
“auto da apreensão”, apenas isso.
- Fiscal Cristiano: insiste em continuar falando alto, gesticulando, repetindo
diversas vezes que se eu tiver o direito de usar o cartão deveria provar na
empresa que sou deficiente, se você for deficiente o seu cartão será devolvido
e pronto.
- Priscila: informo a ele que ele na função de fiscal, não tem o direito de
questionar a minha deficiência, disse a ele que tenho conhecimento dos meus
direitos e deveres e que não iria ficar na rua discutindo com ele, solicito a
devolução do cartão.
- Fiscal Cristiano: ironicamente ri e diz vai se explicar na empresa, liga no
0800, e continua a satirizar a minha situação como pessoa com deficiência.
- Priscila: informo que estava indo pra casa e solicito a eles (fiscais) que se
retirem de minha presença, pois estava causando grande constrangimento e
humilhação me expondo como deficiente de forma irônica e preconceituosa.
Ambos os fiscais entram em outro ônibus, levando consigo o meu cartão
e o fiscal Cristiano continua dentro do ônibus falando e gesticulando em minha
direção.
3. Recolho os dados da testemunha servidor da Guarda Civil
Metropolitana, Sr. Agnaldo Rogério de Lima, RG: 18.926.645-4, endereço: Rua
Dirceu Pastos n° 21, Centro, Itaquaquecetuba (BASE_GSM), telefone: (11)
6278-2147.
Fiscais: Cristiano – matricula: 2488. Celso – matricula: 2387.
Informo que durante toda a discussão o motorista do ônibus não se
pronunciou. O ônibus estava lotado, todas as pessoas com atenção em mim,
as pessoas que estavam perto entendiam que estava sendo retirado o cartão
da gratuidade, porém o que pensou as pessoas que estavam longe da catraca?
A empresa Julio Simões, tem concessão na Secretaria de Transportes
Metropolitanos, para prestar serviços na Área de Concessão 4.
A isenção tarifária foi concedida em caráter de renovação em Agosto de
2009 com Laudo Médico da Equipe Multidisciplinar do SUS “Sistema Único de
Saúde”, Laudo PE n° 803874, desta forma, concedido a Isenção de Tarifas de
Transporte Coletivo Urbano, conforme o que determina o Decreto Estadual n°
34.753 de 01/04/1992.
Informo que apenas uma vez foi solicitado esclarecimentos quanto a
minha condição especial, a SPTRANS, solicitou esclarecimento através de
“Carta enviada por correio” com total discrição e sob protocolo n°
50.015.766/469.081 na data de 08 de Julho de 2009.
Esclareço que a minhas limitações ocorrem por conta de “doença
crônica degenerativa e grave” e traz como agravante a dor que limita e
compromete a qualidade de vida, ficando desta forma com limitações de
mobilidade “mobilidade reduzida”, porém são deficiência não visíveis, trago
também visão tubular no olho esquerdo, o que me causa importante limitação,
dentro de Itaquaquecetuba consigo circular sem a presença de acompanhante,
por estar perto de casa e havendo a necessidade terei pronto auxílio de minha
família, porém quando é necessário sair da cidade, ainda utilizo acompanhante
por medida de segurança, pois tenho dificuldades para atravessar ruas,
identificar o rosto das pessoas, assim como ler letreiros de ônibus e
identificações gerais.
Atenciosamente
Itaquaquecetuna, 03 de Maio de 2011