O queixo reclama que é pequeno em comparação com o grande nariz. A boca sugere deixar crescer a barba para esconder o tamanho do queixo. A mão tem a ideia e a barba cresce densamente, escondendo o queixo e fazendo-o parecer maior, fazendo com que ele deixe de se queixar.
1. O QUEIXO
QUEIXOSO
Q ueixou-se o queixo de que era pouco para o
tamanho do nariz.
– Ele lá à frente, o presunçoso, e eu cá atrás, quase a ser
engolido pelo pescoço.
– Corta-se o nariz – riu-se a boca, uma desbocada.
Os olhos reprovaram. O nariz, a bem dizer, pertencia-
-lhes. Direcionava-lhes o olhar, era um prolongamento
muito conveniente da testa e, no vértice das sobrancelhas
espessas, ficava bem a quilha de um nariz como proa de
navio. Indispensável e quanto maior melhor. Até porque,
faltando o nariz, onde é que se apoiavam os óculos?
– O queixo, se acha que é pouco que puxe por ele. Puxe
e repuxe, pode ser que cresça – dizia a boca, sempre a
rir-se.
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2. Ele bem tentava, mas a natureza não correspondia. Era
um queixo curto que se havia de fazer! E mais curto se
sentia, dado o tamanho do nariz.
– Se fosse ao contrário era pior. Um narizinho
minúsculo e uma queixada redonda e grossa que nem um
joelho isso é que era horrível – dizia a boca, que não
parava de falar.
A mão deu-lhe uma palmada, para que se calasse. Não se
aturava. Nem podia uma pessoa pensar à vontade.
Cofiando o pequeno queixo, a pensativa mão teve uma
ideia. Fez uma festa à volta do rosto, a medir a extensão do
seu projecto. O rosto respondeu-lhe com o áspero ruído de
uma barba por escanhoar. Como lixa.
– Entendo – disse a boca. – Vais deixar crescer a barba.
Assim aconteceu. A barba densamente cresceu como um
tufo de cedro, a tapar um muro baixo. Já ninguém podia
dizer que o queixo era pequeno, em comparação com o
nariz. Disfarçado pela barba, era um queixo de todo o
respeito.
E o queixo deixou de queixar-se.
FIM
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