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Projecto "Ninho"
                    Os produtos locais na identidade territorial
                          O Ciclo do Queijo: do pasto à mesa
                Serra da Gardunha – palimpsesto de paisagens
Albufeira de Santa Águeda: Um oásis para as aves migratórias
                        Crónica lírica de São Vicente da Beira
CONTEÚDOS                                                                                                                                                                                                                                EDITORIAL /




                                                                                                                                                Descobrindo
                   EDITORIAL


              ASSOCIATIVISMO
                                    3


                                    4
                                        Descobrindo o lado solar...

                                        Associativismo Juvenil... uma escola da cidadania
                                                                                                   FICHA TÉCNICA
                                                                                                   Propriedade
                                                                                                   DESCOBRINDO
                                                                                                   Associação de Desenvolvimento Territorial
                                                                                                   Largo de N. Sra. das Necessidades,
                                                                                                                                                	 o lado solar...
                                                                                                                                                   Subir a Gardunha e olhar para Sul é, concerteza, um exercício de contemplação único
                 ACONTECEU              Festas, Celebrações e Eventos                              Edifício da Biblioteca, 6005-300 Soalheira   que nos transporta até ao infinito da planura dos campos e nos transmite uma sensação de
                                                                                                   descobrindo@mail.com
                                                                                                   www.descobrindo.pt                           tranquilidade e pureza presentes na exuberância das cores que a Natureza nos oferece. Esta
                   DESTAQUE         5   Projecto “Ninho”                                           Director                                     visão peculiar do lado solar da Gardunha - vertente que está virada ao sol e também a Sul -
                                                                                                   Hugo Landeiro Domingues
                                                                                                                                                faz-nos acreditar que podemos ir mais longe e dá-nos força para continuar a descobrir, a
                                                                                                   Director-adjunto
                  IDENTIDADE   67      Os produtos locais na identidade territorial               Helder Carvalho Salvado                      conhecer e dinamizar este território.
                                                                                                   Conselho Editorial
                                                                                                   Ana Margarida Fazenda,
              PRODUTO LOCAL    815     O Ciclo do Queijo: do pasto à mesa.                        Helder Carvalho Salvado,                     Será o lado solar da Serra da Gardunha sinónimo de alegria, felicidade, fertilidade e abundância?
                                                                                                   Hugo Landeiro Domingues,
                                                                                                   Pedro Miguel Salvado, Celso Lopes            Acreditamos que sim e, por isso, continuamos na nossa caminhada de sol-a-sol descobrindo,
                  TERRITÓRIO   1623    Serra da Gardunha - Palimpsesto de paisagens               Colaboração                                  redescobrindo e exaltando os lugares, produtos, recursos, segredos e histórias que o sul da
                                                                                                   Alfredo Abrantes, Carlos Rodrigues,
                                                                                                   Celso Lopes, David Morgado, João Freitas,    Gardunha guarda de melhor.
                                                                                                   João Ruivo, Sónia Morgado, Fábio Oliveira
                   NATUREZA    2425    Albufeira da Marateca: Um oásis para as aves migratórias                                                A boa receptividade do número 0 da Solstício por parte de diferentes públicos mostrou que a
                                                                                                   Conceito e Design
                                                                                                   Hugo Domingues                               Solstício tem futuro e que é uma aposta com futuro por parte da Descobrindo.
               TERRA A TERRA   2629    Crónica Lírica de São Vicente                              Ilustrações com base em:                     O número 1 da revista Solstício - O Sul da Serra da Gardunha de Sol a Sol reflecte mais algumas
                                                                                                   Clipart ETC is copyright © 2010 by
                                                                                                   the University of South Florida              descobertas, mais vôos migratórios e mais alguns passos dos longos percursos da transumância,
                   SABOREAR    3033    Restaurante Rural Gardunha                                 Preço                                        marcas dos ciclos do quotidiano no imaginário do sul da Gardunha. Esta edição mostra a
                                                                                                   1,50 EU
                                                                                                                                                preocupação com a imagem, ao nível gráfico e fotográfico que queremos manter no modelo que
                                                                                                   Tiragem
                       FICAR   3437    Solar dos Caldeira e Bourbon                               1.000 exemplares                             pensamos para esta publicação.
                                                                                                   IMPRESSÃO
                                                                                                   Ciência Gráfica LDA.
               UM MOMENTO       38      Uma imagem                                                                                              Espero que goste e desfrute da revista descobrindo
                                                                                                   DEPÓSITO LEGAL
                                                                                                   305367/10                                    o lado solar da Serra da Gardunha...
                     AGENDA     39      A não perder...

          CONTACTOS ÚTEIS      4041    Turismo, Alojamento, Restaurantes e outros
                                                                                                                                                Hugo Landeiro Domingues
                                                                                                                                                Presidente da DESCOBRINDO




                                                                                                                                                                                                                                                         Alexandre Azevedo
                INSTITUIÇÕES   4243    Juntas de Freguesia, Associações e outras




Apoios


INSTITUTO               CÂMARA
PORTUGUÊS               MUNICIPAL
DA JUVENTUDE            DO FUNDÃO

                                                                                                                                                                                                                                                    2 3
ASSOCIATIVISMO                                                       ACONTECEU                                                                                                                                                                                             EM DESTAQUE /




 Associativismo Juvenil...                                                                                                                                                                                                                                    HELDER CARVALHO SALVADO


 uma escola de cidadania.


                                                                                                                                                        Projecto “Ninho”...
 As Associações Juvenis têm na sociedade portuguesa, impondo-                 JANEIRO
 -se como agentes de dinamização sociocultural, de desenvolvi-
 mento local e de socialização principalmente dos jovens.                              5 HÁ QUE SE CHÁ
                                                                                            em honra aos Reis Magos . Tinalhas
 Em particular, estas organizações têm sido responsáveis por gran-
 de parte da educação cívica da juventude portuguesa, bem como
                                                                                      10 FESTA DAS PAPAS
                                                                                            em honra a São Sebastião . Póvoa da Atalaia

 da aprendizagem do exercício democrático e da difusão de va-                         17 BODO (Festa dos Cascoréis)
                                                                                            em honra a São Sebastião . Lardosa                          NINHO é um projecto musical de altíssima qualidade feito por        ções e como a linha de investigação que segue o seu Doutora-
 lores positivos, que norteiam e regem a vida das comunidades.
                                                                                      20 SÃO SEBASTIÃO
                                                                                            Celebração Religiosa . Sobral do Campo
                                                                                                                                                        artistas que têm uma relação profunda com a região.
                                                                                                                                                        Trata-se de um magnífico percurso pela música tradicional por-
                                                                                                                                                                                                                            mento tem a ver, igualmente, com a recolha, edição e difusão
                                                                                                                                                                                                                            do património ibero-americano, teve a feliz ideia de formar um
                                                                                      23 CASCORÉIS E FILHOSES
                                                                                            em honra a São Sebastião . Soalheira e Louriçal do Campo    tuguesa e pela música de autores consagrados como Eric Satie,       grupo para reproduzir estas músicas de tradição oral.
                                                                                                                                                        Jacques Ibert, ou Carlos Paredes, tendo como pano de fundo a        As músicas são, assim, originárias da Serra da Gardunha, ou-
                                                                                                                                                        paisagem mediterrânica. Tem como mentor o músico beirão Mi-         tras da sua própria autoria ou de autores consagrados já acima
                                                                                    ABRIL
                                                                                                                                                        guel Carvalhinho (guitarra de 10 cordas) que com Irene Ferreira     referidos, sempre procurando a influência das raízes musicais

                                                                                        5 SENHORA DA ENCARNAÇÃO
                                                                                            Romaria e Celebração Religiosa . Póvoa de Rio de Moinhos
                                                                                                                                                        (voz e violino), Pedro Ladeira (clarinete), Sérgio Chitas (bando-
                                                                                                                                                        lim), Fernando Gordo (baixo) e Aldovino Munguambe (percus-
                                                                                                                                                                                                                            tradicionais beirãs.
                                                                                                                                                                                                                            O projecto é já um sucesso nacional contando com actuações
                                                                                            SENHORA DA SERRA
                                                                                            Celebração Religiosa . Serra da Gardunha . Castelo Novo     são) dão corpo ao projecto. Todos os músicos estão ligados à        em todo o distrito de Castelo Branco, tais como no Cine-Teatro

                                                                                      11 SENHORA DAS NECESSIDADES
                                                                                            Romaria e Celebração Religiosa . Soalheira
                                                                                                                                                        Escola Superior de Artes Aplicadas do Instituto Politécnico de
                                                                                                                                                        Castelo Branco, sendo professores, alunos, ex-alunos ou cola-
                                                                                                                                                                                                                            Avenida de Castelo Branco, no teatro clube de Alpedrinha e no
                                                                                                                                                                                                                            programa Viva a Música, da Antena 1.
                                                                                      17 SENHORA DAS PRECES
                                                                                            Celebração Religiosa . Cortiçada . Vale de Prazeres         boradores desta instituição.

 Por outro lado, os poderes públicos têm vindo a entregar às asso-
                                                                                    MAIO
                                                                                                                                                                     ...
 ciações um conjunto de intervenções nos domínios social, cultu-
 ral e desportivo, no que tem constituído um dos mais interessan-
                                                                              (31)›2 FEIRA DO QUEIJO
                                                                                            Soalheira
                                                                                                                                                         Os temas são originais ou
 tes fenómenos de transferência (ou desconcentração) efectiva de
 poder para a esfera civil por parte da administração pública.                   23 SENHORA DA ORADA
                                                                                            Romaria e Celebração Religiosa . São Vicente da Beira         inspirados em melodias
 Como consequência deste apoio efectivo que o Estado tem vindo
 a destinar ao movimento associativo, começa agora a surgir uma
                                                                                JUNHO
                                                                                                                                                          da Serra da Gardunha e
 nova realidade com o aparecimento de numerosos grupos juvenis
 de carácter informal, denominados “segunda geração” de asso-
                                                                                    5 SAGRADO CORAÇÃO DE JESUS                                            recebem influências das




                                                                                                                                                                                                                                                                                              IMAGEM DA CAPA DO ÁLBUM "nNINHO"
                                                                                            Sobral do Campo
 ciações, caracterizadas por uma maior especialização ao nível das
 actividades organizadas, que traduzem uma nova mentalidade e                      10 SANTA ÁGUEDA
                                                                                            Romaria e Celebração Religiosa . Barragem de Santa Águeda   raízes tradicionais musicais
 que procuram responder às novas exigências de uma sociedade
 actual, onde os jovens não devem ser encarados como um pro-
                                                                                   13 SANTO ANTÓNIO
                                                                                            Festa Popular . Soalheira
                                                                                                                                                                   beirãs.
 blema, mas sim como parte activa e interessada na solução.                     19/20 FEIRA DE GASTRONOMIA E ARTESANATO
                                                                                            São Vicente da Beira

 Atento a esta nova realidade está particularmente o Instituto Por-
                                                                                   24 SÃO JOÃO
                                                                                            Festas Populares . Atalaia do Campo
                                                                                                                                                                     ...
 tuguês da Juventude, entidade responsável pela implementação
 e execução das políticas públicas de juventude definidas pelo                                                                                          Miguel Carvalhinho nasceu em Gonçalo, município da Guarda           O belíssimo CD que tem na capa um ninho de uma cegonha
 Governo, promovendo e dinamizando acções no âmbito da Edu-                         JULHO                                                               e viveu alguns anos, a Sul da Gardunha, na aldeia histórica de      (dando nome a todo o projecto) contou com a edição de 200
 cação Não Formal, na preparação e formação complementar das                                                                                            Castelo Novo e em Ninho do Açor, onde recolheu pelas aldeias        esculturas numeradas, que acompanham o CD, da autoria de
 novas gerações, estimulando o exercício da cidadania activa por                      25 SÃO SEBASTIÃO
                                                                                            Celebração Religiosa .Vale de Prazeres                      e vilas vizinhas: Alpedrinha, Soalheira, Casal da Serra, Louriçal   José Simão e tem ainda imagens de Rui Monteiro, que é designer
 parte de todos os jovens.                                                                                                                              do Campo, São Vicente da Beira, Souto da Casa e Alcongosta          e faz as projecções nos concertos ao vivo, estando à venda em
                                                                                                                                                        várias músicas que compõem este disco, tais como: Viradinho         todo o país, pela módica quantia de 10 euros.
                                                                                                                                                        ao Norte, Anabela, Senhora da Serra, Loureiro Verde Loureiro,
 Miguel Nascimento
 Director Regional do Centro | Instituto Português da Juventude                                                                                         entre outras. O compositor começou a fazer recolhas de can-

                                                                                                                                                                                                                                                                                         4 5
IDENTIDADE




                                                                                                                                                                  HUGO LANDEIRO DOMINGUES*




           OS PRODUTOS
                                        Ao longo dos anos, a identidade dos territórios fez parte das       Os produtos locais são, por isso, a salvaguarda da herança cul-
                                        alterações e mutações, na criação ou recriação de um con-           tural, gastronómica e artesanal dos lugares e das suas gentes,
                                        junto de ideias apreendidas através da aplicação nas nossas         tão importante no desenvolvimento local. Comportam-se como



              LOCAIS
                                        actividades diárias, dos saberes e dos conhecimentos passa-         aglutinadores das memórias, dos saberes e das histórias dos
                                        dos de geração em geração.                                          territórios.
                                                                                                            O Homem imaginou, criou, inventou e reinventou, colmatou as



          NA IDENTIDADE
                                        Identidade territorial que se foi construindo e adaptando aos       suas necessidades com objectos de ritual, instrumentos musi-
                                        tempos, através de uma panóplia de factos e acontecimentos          cais, iguarias gastronómicas e outras soluções que facilitaram a
                                        naturais, sociais ou culturais, que transportam a história, o pa-   sua vida. Criações que sobrevivem e resistem ao tempo, porque



           TERRITORIAL
                                        trimónio e a memória dos nossos antepassados nas suas vivên-        foram utilizados e se mantiveram genuínos, úteis e vivos duran-
                                        cias, medos, crenças e rituais.                                     te séculos, tornando-se, por isso, intemporais.

                                                                     ...
                                          É preciso acreditar que uma boa ideia local, desenvolvida
                                         com base na responsabilidade social, cultural e ambiental,
                                        pode transformar-se num produto global de grande qualidade
                                                   e de grande retorno económico e social.
                                                                     ...
                                        A procura de justificação para os fenómenos naturais, o instinto    Um infindável saber endógeno que resiste ao tempo muitas ve-
                                        de sobrevivência e a descoberta de novas formas de alimento,        zes em pequenos lugares onde, quase tudo, o que faz parte
                                        obrigaram o Homem a descobrir e a criar inúmeras soluções           do quotidiano nasceu do cerne da cultura e das ideias locais.
                                        para os problemas do dia-a-dia. Soluções que são hoje artefac-      Não devemos esquecer que estes produtos, parte da identidade
                                        tos, instrumentos, construções ou mesmo receitas e iguarias de      de cada lugar, são memórias vivas e pedaços da cultura e da
                                        inigualável valor. Ideias, saberes e experiências ancestrais que    história do território a que pertencem. Além disso, têm uma
                                        chegaram até hoje porque, mais do que essenciais para a nossa       importância imensa porque respeitam o Homem, a Natureza e
                                        sobrevivência, foram, e ainda são, parte da identidade dos luga-    a sustentabilidade do território e dos seus recursos.
                                        res e dos povos que os descobriram, utilizaram e transformaram
                                        em fenómenos sociais e culturais de pertença.                       É positivo acreditar que um produto é melhor que os outros,
                                                                                                            mas é preferível distinguir um produto pela sua diferença, espe-
                                        Esses produtos, elementos identitários dos territórios, demons-     cificidade e sustentabilidade. É preciso acreditar que uma boa
                                        tram grande importância como poderosos mensageiros agre-            ideia local, desenvolvida com base na responsabilidade social,
                                        gadores desse conhecimento, cultura e história, capazes de          cultural e ambiental, pode transformar-se num produto global
                                        guardar, agregar e transportar o património genético dos lugares    de grande qualidade e de grande retorno económico e social.
                                        onde foram criados e manipulados durante séculos. Conjugam
                                        a essência dos valores genuínos dos povos, da cultura e do ima-
                          Ana Fazenda




                                        ginário de cada lugar, demonstrando a sua missão de afirmação       *
                                                                                                            Licenciatura em Design de Comunicação (Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa)
                                        e distinção da identidade territorial.                              P. G. Comunicação e Imagem (IADE) e P. G. Marketing de Eventos e Produtos Turísticos (U.B.I.)


                                                                                                                                                                                                            6 7
PRODUTO LOCAL




                                           ANA MARGARIDA FAZENDA                  MARIA DE JESUS CARVALHO
                                                  Licenciada em Turismo (I.P.L)      Licenciada em Ambiente (I.P.C.B.)




                  Em terras de transição, entre o Norte e o Sul do interior de Portugal, onde pontos
                  e pontes de passagem de pastores e rebanhos transumantes transportam os se-
                  gredos da arte de fazer queijo conjungam-se, numa simbíose de saberes, práticas,
                  técnicas e experiências milenares capazes de criar este delicioso produto local.

                  Uma arte tão antiga como a prática de domesticação de animais e a criação de reba-
                  nhos para obter alimentos como a carne ou o leite.
                  Os Gregos acreditavam que Aristeu, filho de Apolo e Cirene, descobrira o queijo numa
                  viagem pelo deserto. Este teria levado, para se alimentar, tâmaras secas e leite num
                  cantil feito de estômago de carneiro. Dias depois, o leite transformara-se numa pasta
                  sólida de agradável sabor que daria origem ao queijo. Os gregos reconheceram-lhe tal
                  importância que o queijo passou a ser um alimento dos deuses, presente nas célebres
                  cerimónias e súplicas, como oferenda no Monte Olimpo.
                  Também, é certo que nas sociedades pré-romanas o queijo seria fundamental na dieta




                                                                                                                         Alexandre Azevedo
                  alimentar dos "Lusitanos", nas suas comunidades de subsistência agro-pastoril.
                  Mais tarde, os romanos, aperfeiçoaram a produção e a maturação do queijo, que
                  passou a ser frequente na alimentação dos nobres, de soldados e atletas. As casas de
                  habitação da Roma Antiga já possuíam um espaço que seria utilizado como queijaria,
                  para o fabrico e a cura desta iguaria.
                  A confecção do queijo, próxima de como hoje a conhecemos, remonta à Idade Média,
                  em grande parte da responsabilidade das ordens religiosas que transportaram o co-
                  nhecimento aos camponeses. A agricultura e pequenas indústrias rudimentares, eram
                  da responsabilidade dos monges cristãos que se especializaram no fabrico do queijo,
                  transformando-a numa verdadeira arte.


                                                                                                                     8 9 9
                                                                                                                      8
PRODUTO LOCAL
                                                                                                                                                                                                                  O CICLO DO QUEIJO: DO PASTO À MESA.




 A produção de queijo fazia parte da rotina diária dos pastores como o retirar e o acon-
 chegar o rebanho do bardo ao amanhecer e ao anoitecer, respectivamente. Era no bardo
 que, no princípio e no final de cada dia de pastoreio, se procedia à ordenha, retirando o
 leite da urbe dos animais para a confecção do queijo. Após a ordenha o leite era levado
 para casa onde, a mulher, conhecedora de todos os segredos guardados e herdados dos
 seus antepassados, prosseguia empiricamente com o seu fabrico.
 Hoje, embora não sejam utilizadas ferramentas e acessórios tão rudimentares, o proces-
 so é muito semelhante. As queijarias seguem as etapas de confecção do saber tradicio-
 nal mas usam as normas de higiene recomendadas. Também o processo de obtenção
 do leite é idêntico, embora seja realizado de forma mecânica.

                  ...
    É uma alimentação variada, com
  base na vegetação natural endémica,
  que dá origem ao leite de excepcional
        qualidade desta região.
                  ...
 Preparar
 A obtenção de um queijo de qualidade parte dos cuidados que são dados aos animais
 que produzem o leite, ao local da sua produção, à época do ano e, por isso, à qualidade
 das pastagens que os alimentam.
 A Sul da Gardunha, a interacção do clima com as características do solo, são a aliança




                                                                                                                                                                                                                                                        Jorge Firmino
 prefeita para que os pastagens sejam propícias à dieta dos rebanhos de ovelhas.



                                                                                                                                                          Numa região onde, os invernos são longos e suaves e os verões são extremamente
                                                                                                                                                          quentes e secos, predominam as culturas forrageiras e as culturas de cereais de se-
                                                                                                                                                          queiro, alternadas com o pousio. As pastagens intencionalmente semeadas valorizam
                                                                                                                                                          a dieta dos ruminantes. O valor nutricional das culturas reflecte-se na qualidade e na
                                                                                                                                                          quantidade da matéria-prima do queijo, na medida em que as ovelhas produzem mais e
                                                                                                                                                          melhor leite. É uma alimentação variada com base na vegetação natural endémica que
                                                                                                                                                          dá origem ao leite de excepcional qualidade desta região. No Verão, alguns pastores
                                                                                                                  Transumância
                                                                                                                                                          praticavam a transumância dos seus rebanhos, movendo-se para as pastagens de alti-
                                                                                                                  É um tipo de migração ancestral, um
                                                                                                                  movimento sazonal e reversivo, que      tude na montanha, garantindo assim uma melhor alimentação.
                                                                                                                  se deve às características oro-climá-
                                                                                                                  ticas nacionais e às alterações nas
                                                                                                                  estações do ano.
                                                                                                                                                          Os seres transumantes passaram, mas os saberes ficaram e os novos rebanhos do Sul
                                                                                                                  Praticavam-se dois deslocamentos
                                                                                                                  distintos: a estival quando os reba-    da Gardunha, produzem a matéria-prima que permite confeccionar queijos de sabor
                                                                                                                  nhos eram conduzidos para os pastos
                                                                                                                                                          distinto com base nos saberes ancestrais deixados ao longo do tempo.
                                                                                             Jorge Firmino




                                                                                                                  de montanha no Verão e Outono;
                                                                                                                  e a invernal quando desciam para a
                                                                                                                  planície, no Inverno e Primavera.
                                                                                                             HD




                                                                                                                                                                                                                                                   10 11
PRODUTO LOCAL
                                                                                                                                                                                                              O CICLO DO QUEIJO: DO PASTO À MESA.




 Fazer
 O fabrico tradicional do queijo começava com a preparação do leite para gerar a coa-
 lhada. O leite era vertido, para um recipiente, onde se atava um pano branco. Neste
 coador era deitado o coalho, de origem vegetal (cardo) ou animal, que se misturava
 com o líquido enquanto este era derramado.
 Para finalizar esta etapa, o pano era espremido a fim de aproveitar todas as essências e
                                                                                            Cardo (Cynara cardunculus L.)
 propriedades do coalho, que potencia a coagulação do leite. Ao calor da lareira, o leite
                                                                                            O cardo é uma planta espinhosa
 era mexido com a "fataca" até coalhar, por cerca de meia hora a três quartos de hora.      semelhante a uma alcachofra, de
                                                                                            sabor amargo.
 Daqui resultavam dois produtos distintos, um sólido, a coalhada, e uma líquida, o soro.
                                                                                            A sua flor, de cor lilás, é recolhida
 A coalhada era retirada e colocada pouco a pouco no "cincho", uma forma ou aro             durante o Verão, sendo depois seca
                                                                                            e moída.
 circular furado, onde as mãos frias, quase gélidas, pressionavam a massa com maior
                                                                                            O pó de cardo tem a propriedade de
 ou menor força, fazendo com que o soro escorresse pela "francela" até ser esgotado.        coalho quando se mistura com o leite
                                                                                            originando uma pasta solidificada,
 O soro excedente era recolhido, para posteriormente fazer travia ou requeijão, e comer     denominada coalhada.




                                                                                                                                                                                                                                                    HD
                                                                                                                                    HD
 como uma “sopa” doce ou mesmo para acompanhar com broa.

                                                                                                                                                    Quando a coalhada se tornava consistente e firme, procedia-se à salga do queijo.
                                                                                                                                                    O sal contribui para o amadurecimento da côdea e a libertação do excesso de água,
                                                                                                                                                    além de regular os processos fermentativos. Ainda no "cincho" colocava-se sal na face
                                                                                                                                                    superior. Passado um dia, o queijo era salgado dos lados e na face inferior, voltava-se e
                                                                                                                                                    recolocava-se na mesma forma, que era retirada quando o queijo se encontrasse mais
                                                                                                                                                    seco e com forma mais definida. Posteriormente aconchegava-se, envolvendo os lados
                                                                                                                                                    num pano branco, chamada a cinta ou "empesga". Para finalizar, o queijo era colocado
                                                                                                                                                    nas tábuas da queijaria cobertas por um pano branco, onde a circulação do ar facilitava
                                                                                                                                                    a cura. Uma vez aqui, as limpezas e lavagens para eliminar e libertar as impurezas eram
                                                                                                                                                    regulares. Passado um mês o queijo adquire uma “côdea” e uma cor amarela estando
                                                                                                                                                    pronto a ser consumido.

                                                                                                                                                                           ...
                                                                                                                                                            Quando a coalhada se tornava
                                                                                                                                                            consistente e firme, procedia-se
                                                                                                                                                                   à salga do queijo.
                                                                                                                                                                           ...
                                                                                                                                                    Nesta região produzem-se três tipos de queijo com Denominação de Origem Protegida
                                                                                                                                                    (DOP): o Queijo Amarelo da Beira Baixa (DOP) deve maturar entre os 10ºC e os 18ºC
                                                                                                                                                    num ambiente com 50% a 70% de humidade durante cerca de 40 dias; o Queijo de
                                                                                                                                                    Castelo Branco (DOP), que deve maturar a temperaturas entre 8ºC e 14ºC num am-
                                                                                                                                                    biente com 80% a 90% de humidade, durante no mínimo 40 dias; o Queijo Picante da
                                                                                                                                                    Beira Baixa (DOP) com maturação de pelo menos 6 meses que deve ser efectuada a



                                                                                                                                    Jorge Firmino
                                                                                                                                                    temperaturas entre 10ºC e 18ºC num ambiente com 70 a 80% de humidade.


                                                                                                                                                                                                                                               12 13
PRODUTO LOCAL
                                                                                                                                                                                                                                                O CICLO DO QUEIJO: DO PASTO À MESA.




 A Denominação de Origem Protegida obriga a seguir um conjunto de regras e requisitos, que                                                                                 Servir
 incluem desde as condições de produção do leite, higiene, conservação, fabrico e à rotulagem do
 produto.                                                                                                                                                                  Como entrada ou para terminar agradavelmente qualquer refeição, antes da fruta ou dos doces, é
 Como referimos anteriormente, as características organolépticas únicas, relacionadas com tipo de                                                                          de bom grado servir um prato ou uma tábua, composto de diversos queijos, afastados entre si.
 leite, processo de fabrico, aparência, consistência, aroma e sabor justificam a classificação DOP                                                                         Deverão ser apresentados sem invólucro ou embalagem. Escolhidos consoante a época ou gosto
 em três produtos distintos: o Queijo de Castelo Branco ("Ovelha"), o Queijo Amarelo da Beira                                                                              pessoal, devem ser colocados por ordem, de sabor suave, intermédio e intenso, no sentido dos
 Baixa ("Mistura") e o Queijo Picante da Beira Baixa ("Queimoso").                                                                                                         ponteiros do relógio.




 "Ovelha"
                                                                                                                  "Queimoso"
                                                                                                                  Queijo Picante da Beira-Baixa (DOP)
                                                                                                                                                                                                                    à mesa.
                                                                                                                  Feito da mistura do leite de ovelha, cabra e/ou vaca     Para acompanhar são ideais pão escuro, branco, centeio, com sementes, torrado, bolachas de
 Queijo de Castelo-Branco (DOP)
                                                                                                                  e coalho animal, feito à "cabreira", resulta na pasta    água de sal, mini tostas, azeitonas, e para um gosto mais requintado com tomate cereja, frutos
 Queijo curado de pasta semidura ou semimole, com        "Mistura"                                                dura ou semidura, de cor branca-acinzentada, sem         secos, fatias de maçã ou pêra, uvas, figos, mel ou geleia. No caso de servir queijo fresco, é neces-
 alguns olhos pequenos, fabricado a partir do leite de                                                            olhos ou com pequenos olhos irregulares.                 sário, colocar à disposição sal, pimenta e cominhos.
                                                         Queijo Amarelo da Beira-Baixa (DOP)
 ovelha puro e coalho vegetal, feito à "ovelheira".                                                               É característico o aroma bastante activo e o sabor       Para melhor aproveitar o sabor e a textura, é aconselhável que os queijos estejam à temperatura
 Durante a cura adquire um aroma acentuado e um          É fabricado com a mistura de leites de ovelha, cabra     acentuadamente picante.                                  ambiente, antes de serem consumidos e nunca directamente do frigorífico. É importante ter em
 sabor levemente picante.                                ou apenas com leite de ovelha e coalho animal, feito     É comercializado com um diâmetro entre 10 e 15           atenção a dureza do queijo, já que os mais duros levam mais tempo a ficar à temperatura do ar.
 Inicialmente possui uma crosta maleável, passando       à "cabreira".                                            cêntimetros, uma altura entre 3 e 5 cêntimetros e peso   O corte no queijo, define todo um "saber de gourmet", deve ser regular, desde o centro até a
 posteriormente a dura, de tom amarelado.                Curado de pasta semidura, com alguns olhos irregula-     entre 400 e 1000 gramas.                                 casca, e este, voltado para baixo enquanto não são utilizados, para prevenir a oxidação e alteração
 É comercializado com 12 e 16 cêntimetro de diâmetro,    res, obtém a cor amarela-torrada que o caracteriza.                                                               do sabor. A faca utilizada para o corte deve ser de gume liso e nunca de serrilha. Caso o queijo
 e 5 a 8 cêntimetro de altura e entre 800 e 1300         O seu sabor apesar de intenso é limpo e levemente                                                                 seja de pasta dura e semidura o ideal é recorrer a uma faca de cabo duplo e de gume largo. Ao
 gramas de peso.                                         acidulado. O aroma intenso mas muito agradável.                                                                   contrário de um queijo de pasta mole, é conveniente usar uma faca de gume estreito.
                                                         É comercializado com um diâmetro entre 12 e 16                                                                    Ao servir queijo a crianças a melhor opção é cortar previamente em pedaços, cubos ou até mes-
                                                         cêntimetros, uma altura entre 3 e 5 cêntimetros e peso                                                            mo triângulos, se for queijo fresco.
                                                         entre 600 e 1000 gramas.




                                                                                                                                                                                                                                                                                 14 15
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     Serra da Gardunha
palimpsesto d e paisagens.
               I - A PROPÓSITO DE UMA GRAVURA OITOCENTISTA


               A Serra da Gardunha assume-se como um relevo cultural de transição, um autêntico marcador geológico de
               encontro entre distintas correntes civilizacionais. Estamos perante uma orografia de destinos e de milenares
                      passagens e diante de uma paisagem em continuada construção que expressa determinadas concep-
                                     ções de vida. Paisagem que vai irradiar, ao longo do tempo, um peculiar significado e
                                                   sentido ora como limite, ora como porosa zona de passagem e de contac-
                                                                   to entre horizontes mais setentrionais ou mais meridionais.




                                                                                                                            16 17
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                                                                                                                                                                                                                                                                                       Ana Fazenda
 Primeiro as vagas pré e proto-históricas do Este longínquo e do     comunidades estabelecerem e marcarem linhas, mais palpáveis          da utilização das águas, vão transformar o grão das subsistên-     de conduzir, sazonalmente, os gados da montanha para os re-
 Sul; séculos depois, as ideias e a cultura sopradas do mediterrâ-   ou mais invisíveis, para desenvolver e aplicar os seus actos, ges-   cias dos quotidianos, pontuando a serra de sociabilidades uni-     levos aplanados do Sul. A presença de ricos filões metalíferos
 neo clássico, mais tarde, reflexo das contínuas apropriações por    tos, poderes, dinâmicas e vontades.                                  das por caminhos. À água que escorria do cimo da montanha,         na região também deve ter sido um dos factores determinantes
 parte dos pólos religiosos medievais dominantes na Península        Numa primeira apreensão, a Serra caracteriza-se por uma varia-       juntava-se-lhe o suor do corpo e as ânsias do futuro das gentes.   nas orgânicas económicas e sociais de então. Estes povoados,
 – a Serra foi barreira e ponte.                                     bilidade de altitudes escalonadas. A sua matriz é preenchida pe-                                                                        de que são bons exemplos, o de São Brás (Freguesia de Fun-
                                                                     las texturas dos plutónicos granitos e pelas nuances das urzes,      O tempo longo da história antrópica desta Serra só agora co-       dão) e o do Castelo Velho (Freguesia de São Vicente da Beira)
 Todos esses momentos expressaram-se com maior ou com me-            dos ervedeiros, das carqueijas, das caldoneiras, das marcelas,       meça a ser descodificada. A primeira grande transformação          articulavam-se com outros construindo uma rede de comple-
 nor enraizamento na paisagem indefinidamente mutante num            dos rosmaninhos que todas as primaveras enchem a serra de            produziu-se na passagem de uma economia móvel aos primei-          mentaridades e de solidariedades formando, no seu conjunto, o
 duradouro, mais activo ou mais adormecido, processo continu-        cromias e de cheiros num apelo à renovação.                          ros processos de sedentarização das comunidades humanas.           mais antigo fenómeno de territorialização conhecido na região.
 ado de criação.                                                     Os ecossistemas serranos eram dominados por uma densa e              Fixação humana que remontará ao Bronze Final com as suas
 A Serra da Gardunha afirma, igualmente, os vínculos e as rela-      variada vegetação de espécies caducifólias (carvalhos e casta-       morfologias da existência, em determinadas cotas, de locais        Um segundo momento antrópico desenvolveu-se durante o lar-
 ções entre os ancestrais quadros culturais das comunidades de       nheiros) de que já só subsistem a memória e a toponímia. Esse        amuralhados que dominavam os horizontes. O espaço foi,             go processo romanizador. As cotas que bordejavam o maciço
 montanha com as da planície, concentrando neste ponto do            manto verde “espontâneo” foi, em vários momentos, altera-            paulatinamente, apropriado e os grupos humanos projectando-        foram densamente ocupadas através da instalação de pequenos
 Portugal central todas as redes estabelecidas entre a matricial     do com a introdução de novas espécies como foi o caso, por           -se e identificando-se com e no território. Na paisagem pré-ro-    casais e granjas de vocação agrícola. Mais tarde, ricas ‘villae’,
 Estrela e os mundos sonhados do Tejo que conduziam ao mar.          exemplo durante a Idade Média, do plantio de castanheiros ou         mana destacavam-se então os povoados com as suas cinturas          com os seus mosaicos e estruturas termais, reforçam a aptidão
 A paisagem deste autêntico palimpsesto cultural, sempre atra-       da tão custosa e metódica construção e cultivo, nas vertentes,       amuralhadas onde viviam populações sustentadas numa eco-           agrícola da região ao tempo dos romanos. Os solos foram in-
 vessado por gentes, animais e esperanças, também resulta e          de pequenas folhas de pão onde, até ao início do século XX,          nomia essencialmente de base agro-pastoril. Estes aglomerados      tensamente cultivados e largas zonas da floresta primitiva terão
 se teceu do equilíbrio e dos vincos de várias fronteiras, umas      crescia o centeio. A fluida rede hídrica permitiu a instalação nos   vivenciais utilizavam a altitude como forma de afirmação de po-    sido destruídas através de queimadas para facilitar o surgimento
 de alcance alargado, outras mais domésticas que, ao longo da        pequenos vales de espécies diferenciadas mais dependentes do         der e de controlo das vias de comunicação que sulcavam a flo-      dos pastos e um aumento das áreas de cultivo de cereal e da
 História, se justificaram, por aquela necessidade intrínseca das    teor de humidade. O surgimento de azenhas, engenhos sábios           resta primitiva. Estas vias tiveram a sua origem na necessidade

                                                                                                                                                                                                                                                                                  18 19
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 expansão da oliveira. A exploração mineira dos coutos limítro-     domésticos. A partir dos afloramentos das geologias dominan-
 fes do maciço terá sido incrementada com a territorialização do    tes, o xisto e o granito, os seixos arredondados, as areias, vão
 poder e com o controlo dos recursos locais, ligando a região       erguer casas, muros, poços, solares, capelas, igrejas. São comu-
 aos grandes centros através da materialização de firmes vias de    nidades expansivas que com as suas hortas bordejando os rios,
 comunicação. Este período de intensa construção paisagística       domesticam a altitude construindo socalcos e casais dispersos
 terá começado a desvanecer-se a partir do século VIII d. C. As     na paisagem serrana. A nova reorganização territorial a que se
 convulsões políticas, sociais e demográficas, e as novas cen-      procedeu, fez emergir assim uma nova rede de povoamento for-
 tralidades dos poderes emergentes noutras escalas e latitudes,     mada por pequenos núcleos onde se cruzam funções religiosas

                                 ...
       Na escassez de uma firme permanência humana,
    as antigas vias e trilhos eram, contudo, periodicamente,
  remarcados em tempos de paz atravessadas pelos rebanhos
                           transumantes,
                                 ...
 transformaram o activo pequeno mundo da Gardunha ‘post’ ro-        e administrativas, económicas e vivenciais com uma restrita área
 mana numa área repulsiva e algo periférica. A floresta primitiva   de influência. São, contudo, terras unidas através de itinerários
 avançou e o verde denso e cerrado voltou a dominar, durante        por onde circulam pequenos fluxos de gentes e de capitais. A
 séculos. Na escassez de uma firme permanência humana, as           ciclicidade dos trabalhos e dos dias é marcada pelo ciclo festi-
 antigas vias e trilhos eram, contudo, periodicamente, remar-       vo e religioso tradicional. A floresta assumirá uma importância
 cados em tempos de paz atravessadas pelos rebanhos transu-         vital para a fruste economia camponesa em expansão com a
 mantes, débil base económica regional que apesar de todas as       destruição da mesma para área de cultivo. Era um provedor de
 circunstâncias terá continuado. Mas foi a passagem cíclica de      combustível, era a fonte do pão de castanha. Com os níveis de
 movimentos de guerreiros cristãos e islâmicos que deu outros       cota antrópica sempre em expansão, o uso e o entendimento
 sons e rumos de fixação à quietude da natureza.                    cultural dos cumes foi outro. Aí eram os místicos, sentidos e
                                                                    temidos domínios do sagrado protector que dominavam, locais
 Os finais do século XII, até ao século XV constituíram uma fase    a que se ia em sentida e rogada peregrinação em determinados
 de antropização complexa, caracterizada por uma intensa e pro-     dias do ano quebrando-se os silêncios do perfil serrano.
 gressiva transformação do habitat natural. Na serra de Ocaia,
 como então se designava a Gardunha, os tempos posteriores à        Durante a segunda metade do século XIX, e todo o século XX,
 “Reconquista” criaram formas paisagísticas muito diferenciadas     assistiu-se a uma alteração profunda dos conceitos económi-
 como as que resultaram da criação do concelhos de S. Vicente       cos e dos quadros vivenciais da Gardunha. O processo migra-
 da Beira em 1195 ou de Alpreade (Castelo Novo) em 1202. A          tório, o abandono dos campos, a introdução de novas culturas
 atractividade da região, com a fixação de agregados familiares     e espécies como o pessegueiro ou a cada vez mais dominante
 de outras paragens, permitiu uma mutabilidade acelerada. Se o      cerejeira, a doença dos castanheiros, a multiplicação de redes
 castelo dos poderes dominantes ou a casa torre dos senhores        de acessibilidades, a destruição dos cocurutos geológicos e as
 dominaram a silhueta de algumas comunidades, será à volta do       sucessivas vagas de incêndios – tudo isto criou uma nova pai-
 campanário da nova geografia devocional, entretanto marcada        sagem.
 na paisagem, que as populações vão construir os seus espaços

                                                                                                                                                                                  20 21
TERRITÓRIO
                                                                                                                                                                             SERRA DA GARDUNHA - PALIMPSESTO DE PAISAGENS



                                  ...
      Os “lugares saudosos” tecidos com materialidades e com     Hoje, em grandes áreas da sua extensão, a cinza e o acastanha-       a narrativa expositiva da Orologia: a penha da Senhora da Serra.
                                                                 do são as cores dominantes. Contudo, todas as Primaveras se          O principal elemento da rede fluvial desta encosta, a Ribeira de
      espiritualidades sentidas, indagadas, veneradas que este   vai espalhando, numa eclosão de flores e sons, o sentido de          Alpreada é apontado, indicando-se os topónimos das fontes do
                                                                 renovação periódica da paisagem nesta verdura aromática em           Corisco e do Couto, cujas águas também criam e desenvolvem
        autor quis resgatar à voraz passagem do tempo e dos      todas as suas gamas. Aqui e além, num território fustigado pelo      esta linha líquida da face oriental da serra.
                                                                 fogo destruidor, são estes ‘oásis de resistência’, onde a sombra     Estamos perante uma figuração espacial que interpreta a leitura
              subadjacentes e terríveis esquecimentos.           convive com a água, que ainda convocam o ancestral espírito          empírica da totalidade de uma realidade observada e de uma tem-
                                                                 da paisagem e que nos fazem sentir todo o valor da altitude          poralidades interrogadas por José Inácio Cardoso na organicidade
                                  ...                            libertadora, da tal linha de contacto entre a rocha e os deuses.     desta parcela da paisagem serrana. Paralelamente aos modos de
                                                                 Tal como ontem, a Gardunha nunca foi local de imutáveis quie-        habitar, de viver e de circular como são os casos de Alpedrinha,
                                                                 tudes. Pelo contrário. Foi sim sempre um sítio de convergência       de Castelo Novo, de Vale de Prazeres, do lugar da Cortiçada, uni-
                                                                 dos tempos, dos trabalhos, das passagens, dos esquecimentos          dos pela estrada de Castelo Branco ou pela estrada Real, também
                                                                 e dos sonhos: do passado e do futuro.                                se representam elementos de uma cartografia do sagrado regio-
                                                                 Daí a importância que assume para sua História, a existência de      nal, ligação religiosa muito presente ao longo do texto.
                                                                 uma representação, das primeiras imagens desta serra até à data      Convergem, assim, na gravura sensações emitidas e percepcio-
                                                                 identificadas, incluída na importantíssima obra de José Inácio       nadas a partir de uma geografia pessoal, criando uma imagem
                                                                 Cardoso “Orologia da Gardunha ou breve descripção topográfica        mental relacionada com o sistema de valorização e de iden-
                                                                 da Serra da Gardunha considerada no seu estado actual”, editada      tificação do espaço vivido e interiorizado por alguém que se
                                                                 em Lisboa, em 1848. Trata-se de um elemento bibliográfico pio-       considerava um “curioso indagador” das distintas espessuras,

                                                                                                     ...
                                                                               Hoje, em grandes áreas da sua extensão, a cinza
                                                                                  e o acastanhado são as cores dominantes.
                                                                                                     ...
                                                                 neiro nos estudos regionais sobre formas do relevo que se desen-     dimensões e transformações da sua paisagem doméstica. Neste
                                                                 volvem nas paisagens da Beira. A Orologia considerada como a         caso, a paisagem envolve e são também lugares, carregados de
                                                                 ciência do conhecimento das montanhas foi, de um modo muito          significações. Os “lugares saudosos” tecidos com materialida-
                                                                 particular e sentido, desenvolvida pelo autor que tentou descodi-    des e com espiritualidades sentidas, indagadas, veneradas que
                                                                 ficar o espaço envolvente do seu quotidiano vital, carregando-o      este autor quis resgatar à voraz passagem do tempo e dos su-
                                                                 de significados. A introdução da gravura na totalidade da obra       badjacentes e terríveis esquecimentos. A Orologia foi a certeza
                                                                 reforça a descrição literária do espaço, fornecendo ao leitor uma    da afirmação de uma memória para a Serra. Como escreveu, em
                                                                 visualidade complementar da realidade que se quis apontar.           1874, o grande geógrafo Humboldt “existe ao lado do mundo
                                                                 O debuxo imagético apresenta a seguinte legenda: «Serra da           real ou exterior, um mundo ideal ou interior, cheio de mitos fan-
                                                                 Gardunha. Vista oriental» e a sua feitura captou e deseja repre-     tásticos e, algumas vezes, simbólicos e de formas cujas partes
                                                                 sentar um conjunto de realidades físicas e humanas. Evidencie-       heterógeneas foram tomadas do mundo actual ou dos restos
                                                                 -se o perfil e o tipo de traço que o litógrafo Figueiras que assi-   de gerações extintas”. É tudo isto que devemos considerar ao
                                                                 na a peça, realizada na Litografia de Santos que se situava no       contemplarmos hoje esta Serra de união cultural.
                                                                 Largo Conde Barão, em Lisboa, desenvolveu para interpretar as
                                                                 convulsões do relevo. O recorte do horizonte gizado, dando a
                                                                 sensação de volume, releva o ponto de maior altitude da Gardu-
                                                                 nha. Também individualiza o sítio da Portela e, de uma feição        *PEDRO MIGUEL SALVADO
                                                                                                                                      Licenciado em História (U.C.). Mestre em Culturas Regionais (U.N.L.). Doutorando (USAL).
                                                                 desproporcionada, o local centralizador e congregador de toda        Divisão de Cultura da Câmara Municipal do Fundão. Membro da equipa da Gardunha XXI.

                                                                                                                                                                                                                                 22 23
NATUREZA




                                                                                                                                                                                                             SAMUEL INFANTE
                                                                                                                                                                                    Presidente do Núcleo da Quercus de Castelo Branco




Albufeira
de Santa Águeda:
Um oásis
para as aves
migratórias.




                                                                                                                                                                                                                                        Alfredo Abrantes
                                                                                         A albufeira de Santa Águeda está localizada no rio Ocreza, abrangendo os municípios de Castelo Branco e Fundão. Esta infra-
ALBUFEIRA DE SANTA ÁGUEDA                                                                -estrutura entrou em funcionamento em 1990 e ocupa uma área com cerca de 634 ha. A albufeira encontra-se classificada como
Localização:                                                                             albufeira de águas públicas protegidas, cuja água é utilizada para abastecimento de populações e cuja protecção é ditada por
Concelhos de Castelo Branco e Fundão, Freguesias de Lardosa, Louriçal do Campo,
Póvoa de Rio de Moinhos, Ninho do Açor, Tinalhas, Sobral do Campo e Soalheira            razões de defesa ecológica.
Área: 634 ha	   Capacidade total: 37200 (x1000 m3)   Capacidade útil: 34200 (x1000 m3)


                                                                                                                                                                                                                                   24 25
                                                                                                                                                                                                                                    24 25
NATUREZA
                                                                                                                                                                                                                                                                                                                         ALBUFEIRA DE SANTA ÁGUEDA: UM OÁSIS PARA AS AVES MIGRATÓRIAS




 A albufeira foi construída num local onde existiam bosques de Carvalho Negral (Quercus pyrenaica), ecossistemas cada vez mais                                                                Cegonha Branca (Ciconia ciconia) onde actualmente conta com uma colónia com cerca de 40 casais reprodutores, já a mais rara
 raros na Beira interior Sul, e que possuem uma grande biodiversidade. Com a construção da albufeira foram alteradas as condições                                                             Cegonha Preta (Ciconia nigra), também pode ser avistada na albufeira mas apenas raras vezes e apenas alimentando-se, pois prefere
 ecológicas do local, sendo que algumas delas favoreceram o aparecimento de outras espécies, em particular de aves pouco frequentes                                                           nidificar em zonas mais isoladas.
 na região. Com o aparecimento de um plano de água permanente de grandes dimensões foram criadas condições para que diversos
 grupos de aves, que passavam pela região nas suas migrações, pudessem parar ou mesmo passar o inverno na albufeira. Desta forma a                                                            Actualmente a albufeira é um local privilegiado para um contacto com a natureza, para passeios a pé ou de bicicleta, ou mesmo para
 albufeira passou a ser um ponto de passagem anual na migração de mais de 25 espécies de aves que percorrem milhares de quilómetros                                                           a pesca. Os bosques de carvalhal que bordeiam o espelho de água, e os caminhos existentes podem ser percorridos em busca de um
 para o norte da Europa.                                                                                                                                                                      reencontro com a natureza.

 Espécies como a Garça Vermelha (Ardea purpurea), o Colhereiro (Platalea leucorodia) podem ser observadas na sua migração ou-
 tonal. Diversas espécies de aves aquáticas como o Mergulhão de Crista (Podiceps cristatus), o Pato-trombeteiro (Anas clypeata)                                                                       Agarrar numa máquina fotográfica ou binóculos,
 invernam na albufeira e chegam a ocorrer em bandos de várias centenas de indivíduos.
 Muitas outras espécies passaram a nidificar nas margens da albufeira, como as Garças Boieiras (Bulbucus íbis), a Garça Real (Ardea                                                                pode ser um desafio para uma tarde ou um dia em busca
 cinerea), a Garça Branca (Egretta garzetta), ou a Galinha d’Água (Gallinula chloropus).
                                                                                                                                                                                                    dos encantos da natureza, neste oásis aqui tão perto...
 Desde 1997 que a Quercus realizou alguns trabalhos científicos de inventariação de fauna e flora, tendo sido registados 117 espécies
 de aves, 32 espécies de mamíferos, 16 espécies de anfíbios e répteis, 8 espécies de peixes e 153 espécies de plantas. Entre os mamí-
 feros é possível observar a tímida lontra, o texugo e a raposa. Uma das espécies de aves mais emblemáticas da área da albufeira é a

 Cegonha branca (Ciconia ciconia)
 Peso: 3000 a 3500g

 Comprimento: 90 a 115cm	         Envergadura: 195 a 215cm         Garça Real (Ardea cinerea)
 Postura: 3 a 5 ovos      	       Incubação: 29 a 30 dias          Peso: 600 a 1200g

 Crescimento: 2 meses      	      Longevidade: 26 anos             Comprimento: 90 a 98cm	         Envergadura: 175 a 195cm

 Voo: planante e longo, pescoço esticado, patas projectadas        Postura: 4 a 5 ovos      	      Incubação: 26 dias

 Voz: espécie de sopro gutural e batimentos com o bico             Crescimento: 2 meses     	      Longevidade: 25 anos                                                                       Colhereiro (Platalea leucorodia)
 Dieta: anfíbios. répteis, peixes, pequenos mamíferos e insectos   Voo: pescoço retraído, asas arqueadas com batimento lento                                                                  Peso: 1100 a 2000g                                                                                                                    Galinha d'Água (Gallinula chloropus)
                                                                   Voz: crocito ruidoso e áspero, geralmente ao anoitecer                                                                     Comprimento: 80 a 90cm	          Envergadura: 120 a 135cm                                                                             Peso: 250 a 400g

                                                                   Dieta: pequenos peixes e mamíferos, insectos, crustáceos,                                                                  Postura: 3 a 5 ovos      	       Incubação: 22 a 25 dias                                                                              Comprimento: 32 a 37cm	           Envergadura: 50 a 55cm
                                                                   e répteis
                                                                                                                               Mergulhão de Crista (Podiceps cristatus)                       Crescimento: 7 semanas       	   Longevidade: 10 a 15 anos     Pato-trombeteiro (Anas clypeata)                                       Postura: 5 a 12 ovos      	       Incubação: 19 a 22 dias

                                                                                                                               Peso: 750 a 1200g                                              Voo: pescoço esticado, asas arqueadas, batimentos regulares    Peso: 400 a 1000g                                                      Crescimento: 7 semanas        	   Longevidade: 15 anos

                                                                                                                               Comprimento: 46 a 51cm	        Envergadura: 85 a 90cm          Voz: emite apenas sons guturais, grunhidos e grasnados         Comprimento: 35 a 46cm	           Envergadura: 85 a 90cm               Voo: difícil. baixo, normalmente circular de patas pendentes

                                                                                                                               Postura: 2 a 5 ovos     	      Incubação: 28 a 30 dias         Dieta: insectos e larvas, pequenos peixes, moluscos, crustá-   Postura: 5 a 12 ovos      	       Incubação: 22 a 23 dias              Voz: variada, repentina, cacarejar rápido, chilreante e nasal
                                                                                                                                                                                              ceos, rãs, minhocas, sangessugas e algum material vegetal
                                                                                                                               Crescimento: 2 meses     	     Longevidade: 10 anos                                                                           Crescimento: 1,5 meses        	   Longevidade: 12 anos                 Dieta: insectos aquáticos, larvas, aranhas, moluscos, semen-
                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                    tes e rebentos de plantas
                                                                                                                               Voo: esguio e alongado, algo trémulo, de patas projectadas                                                                    Voo: lento com o ruído das asas sibilante

                                                                                                                               Voz: gralhar ruidoso nasal, trinado e lentamente repetitivo                                                                   Voz: grasnar ruidoso, grave e nasal, geralmente repetitivo

                                                                                                                               Dieta: pequenos peixes, moluscos, insectos aquáticos e algas                                                                  Dieta: plâncton, moluscos, insectos e vegetação aquática




                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                26 27
TERRA A TERRA




                                                                     MARIA DO CARMO RAMOS PRATA
                                                                                 Professora do Ensino Básico




 CRONICA LIRICA
    DE SAO VICENTE DA BEIRA
                     Ao sul, no regaço da Gardunha           Ó vila medieval tens pergaminhos
                     Embalada no acalanto dos pinhais        Paisagens de encanto e sedução:
                     Aconchega-se um lugar de sortilégios    Cantigas da ribeira aos passarinhos
                     Que resiste ao tempo e aos vendavais:   Narram lendas de tempos que lá vão.
                     São Vicente da Beira os privilégios     Que se inscrevem, além, nos escaninhos
                     Que te cercam acolhem a quem chegar.    E por vales e serras ecoarão.
                     São Vicente da Beira, vila antiga       Há páginas de coragem em tua História
                     Geografia serrana de encantar.          Ressonâncias de valentia e glória.




                                                                                                               HD
                                                                                                           28 29
                                                                                                            28
TERRA A TERRA
                                                                                                                                                                                        CRÓNICA LÍRICA DE SÃO VICENTE DA BEIRA




                                                                                                                            Jprge Firmino




                                                                                                                                                                                                                                           HD
                                                         HD




 Certamente já vens de tempos mouros     Se episódios de infância e de amargura   No prado aceso, silêncio palpitante                       São quatro faces, - sempre viva memória
 Antiga povoação já existia.             A crónica vicentina assinalaram          Ouvem-se flautas - avenas pastoris:                       Pássaro e barca, o escudo, a cruz florida
 Assim como houve e há, nas cercanias    Não levaram por certo a formosura        Será a brisa, serão águas da fonte                        Que testemunham na pedra a tua história.
 Um Castelo lendário e seus tesouros     Saqueando-lhe honras e foral             Ou são folgares de amores pueris?                         Eternamente dirão da tua vida.
 Onde um gato de pedra guarda ouros      As grandezas remotas não levaram         E nas longínquas fragas tão serenas                       Mais não te digo e ouso que não sei
 Sentinela velando noite e dia.          Nem o orgulho da vila medieval:          O vento passa, acordando açucenas                         Pois sendo vila, fundada por um rei
 As lendas são tesouros da História      Casario silencioso de telhados           Há contradanças, Cantares, concertinas                    Tem tua história silêncios conventuais
 Da rama às raízes da memória.           Pelos séculos dos séculos patinados.     Pelos pinhais, com cheiro de resinas.                     Pausas e falhas nocturnas, sepulcrais.



 Tanto assim, sendo terra de valia       Ruazinhas secretas nos seduzem           Natais de neve, filhoses e fogueira:
 Há oito séculos tu foste fundada        Por rotas de segredos e oferendas        Ó amada terra, querida São Vicente




                                                                                                                                                                                                                                           HD
 Quando Afonso Henriques agradecia       A fontes e monumentos nos conduzem       De romarias, desfolhadas nas eiras
 Ajuda que na guerra lhe foi dada        Ó Vila que nos recebes e festejas:       Antigas cenas, mundo de antigamente.                      Ó São Vicente,
 Por castelão que aos mouros combatia:   Aqui um chafariz nos mata a sede         De procissões e colchas nas varandas
 Com insignias e honras assinalada       Além uma capela se desvenda.             A mesa farta, cavacas, tigeladas                          vila de sempre, acesa
 Salve, salve, da Beira, ó São Vicente   E os sinos do poente e madrugadas        Bolos de azeite, amêndoas, figos, vinho
 Terra da melhor cepa e melhor gente.    Contrapõem-se ao silêncio das veredas.   E passam anjos, asas leves de arminho.                    Ó minha pátria,
                                                                                                                                            ó chão da minha vida
 Depois, a São Vicente consagrada        A charneca acende os candelabros         Ó vila antiga mundo de antigamente,
 Tiveste tua heráldica e padroado        De giestas e sol e primavera:            A cada passo, marcos em cada esquina.                     Ó São Vicente da Beira,
 À capital do reino irmanada:            E nas minas, à fimbria do crepúsculo     De oito séculos, marcando a tua sina
 Na crónica e nos anais do teu passado   Sinfonia de grilos nos espera.           Idade Média perpétua no presente.                         minha casa.
 De Lisboa Pequena então chamada         Cheiro agreste de urzes e pinheiros      Em alguns solares e casa vicentinas
 Conforme rezam versos do teu fado       Saragaço, pampilho e amieiro             Brasões de armas, mapas de neblinas:




                                                                                                                                                                                                                                     Jprge Firmino
 Da rama às raízes da memória            Estevas, margaça e rosmaninho            São oito séculos que um capitel coroa
 Há seiva de tua fama na História.       Musgo e heras e amoras no caminho.       Do Pelourinho que te guarda e abençoa.

                                                                                                                                                                                                                            30 31
SABOREAR




                                ...                                                                                                                                                 TEXTO:
                                                                                                                                                                                    SOFIA LOURENÇO
                                                                                                                                                                                    FOTOGRAFIAS:

    Na região sul da Gardunha há um restaurante que serve                                                                                                                           JORGE FIRMINO



     sabores tradicionais que se misturam entre si de forma
      pouco convencional, sabores da terra, sabores de dias
               de festa e sabores de todos os dias...
                                ...




GARDUNHA       RESTAURANTE RURAL


                                                              Falar de comida é também falar de memórias, de afectos, de             Depois das entradas com produtos típicos da região o prato
                                                              tradições, de valores, de sabores, de cheiros e de sentidos.           principal:
                                                              Come-se com os olhos, com o nariz, com as mãos e até com               Polvo à lagareiro com batatinhas a murro.
                                                              a boca…                                                                Lombinhos de porco preto com molho de manga e um toque
                                                              Na região sul da Gardunha há um restaurante que serve sa-              de caril acompanhado de arroz basmat e arroz selvagem
                                                              bores tradicionais que se misturam entre si de forma pouco             Barrosã com batata do Louriçal do Campo.
                                                              convencional, sabores da terra, sabores de dias de festa e             Não faltou a salada mista temperada com azeite da região e
                                                              sabores de todos os dias, tem também sabores diferentes sa-            vinagre de framboesa.
                                                              bores de outras paragens....                                           O vinho de Monsaraz fez as honras da casa.
                                                                                                                                     Os doces.
                                                              Dividido em vários espaços que vão desde a esplanada ao RG             Os doces não podiam ser mais gulosos e não fosse o dia estar
                                                              Bar, espaço Chill Out, sala Tília e a sala Rural ou sala principal,    tão quente tinham sabido ainda melhor…
                                                              Rural Gardunha é um restaurante que nos leva a viajar pelos pa-        Arroz doce com canela e cacau, tigelada da Gardunha, mousse
                                                              ladares da Beira Baixa e que explora o que de melhor a Serra tem       de chocolate com amêndoa lascada regada com vinho do
                                                              para oferecer: cereja da Gardunha, queijo da Beira Baixa, pão de       Porto LBV e ainda creme de maçã com doce de natas coberto
                                                              cereais: trigo e centeio, cozido na hora e servido ainda quente,       com doce de cereja.
                                                              azeite da região, batata do Louriçal do Campo…                         O repasto entrou pela tarde, a simpatia do Ricardo Ambrósio
                                                              O dia estava quente e a hora de almoço ia avançada, nada que           fez-nos companhia durante todo o almoço.
                                                              um sumo de maracujá bem fresco não fizesse esquecer.                   A chefe Maria Otília merece uma visita.
                                                              Foi assim no restaurante Gardunha Rural:
                                                              Pão caseiro de sementes com paté de atum e queijo fresco com           RESTAURANTE RURAL GARDUNHA
                                                                                                                                     Rua Dr. Daniel Proença de Carvalho, Lote 5 Soalheira
                                                              flor de sal foram o início de uma vasta refeição.                      T. 272 419 410  M. 966 567 063
                                                                                                                                     http://ruralgardunha.com.sapo.pt
                                                              O queijo da "Soalheira" (queijo misto curado: amarelo da Beira Bai-
                                                                                                                                     GPS: (N) 40.032206º (W) 7.0487043º
                                                              xa) com doce de cereja e lascas de amêndoa, fez as delícias da mesa.   25Km de Castelo Branco  18Km do Fundão


                                                                                                                                                                                                     32 33
Solar
                                                                                                                                                                        TEXTO:
                                                                                                                                                                        SOFIA LOURENÇO
                                                                                                                                                                        FOTOGRAFIAS:
                                                                                                                                                                        JORGE FIRMINO




dos Caldeira
e Bourbon
Património histórico, envolvente natural, simpatia e hospitalidade
são bons motivos para visitar o Solar dos Caldeira e Bourbon.




                                                                                                                           Perde-se na memória dos tempos a origem do Solar dos Caldeira e Bourbon.
                                                                                                                  Foi recuperado por volta de 1867, mas por esta altura a Casa Senhorial já existia.
                                                                                                         Ana Maria Caldeira de Bourbon herdou a casa do seu bisavô João José Caldeira Pinto Giraldes
                                                                                                de Bourbon que morreu em 1929.
                                                                                       O pai de João José de seu nome Albano descende dos Caldeiras da Sertã, cujo nome lhe foi atribuído por Dom
                                                                             João I quando este tomou aos Castelhanos um caldeirão que ofereceu ao Rei.
                                                                     A mãe Emília, irmã do Marquês da Graciosa e descendente pelo lado Bourbon dos Condes de Avintes, Condes dos Arcos, Duques
                                                                     de Bourbon, de Bourgogne e do Rei Luis de França.
                                                                     Conta a história que a pedra de armas que a Casa Senhorial ostenta na fachada principal tem neles a sua origem.


                                                                                                                                                                                                  34 35
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Solsticio 01

  • 1. Projecto "Ninho" Os produtos locais na identidade territorial O Ciclo do Queijo: do pasto à mesa Serra da Gardunha – palimpsesto de paisagens Albufeira de Santa Águeda: Um oásis para as aves migratórias Crónica lírica de São Vicente da Beira
  • 2. CONTEÚDOS EDITORIAL / Descobrindo EDITORIAL ASSOCIATIVISMO 3 4 Descobrindo o lado solar... Associativismo Juvenil... uma escola da cidadania FICHA TÉCNICA Propriedade DESCOBRINDO Associação de Desenvolvimento Territorial Largo de N. Sra. das Necessidades, o lado solar... Subir a Gardunha e olhar para Sul é, concerteza, um exercício de contemplação único ACONTECEU Festas, Celebrações e Eventos Edifício da Biblioteca, 6005-300 Soalheira que nos transporta até ao infinito da planura dos campos e nos transmite uma sensação de descobrindo@mail.com www.descobrindo.pt tranquilidade e pureza presentes na exuberância das cores que a Natureza nos oferece. Esta DESTAQUE 5 Projecto “Ninho” Director visão peculiar do lado solar da Gardunha - vertente que está virada ao sol e também a Sul - Hugo Landeiro Domingues faz-nos acreditar que podemos ir mais longe e dá-nos força para continuar a descobrir, a Director-adjunto IDENTIDADE 67 Os produtos locais na identidade territorial Helder Carvalho Salvado conhecer e dinamizar este território. Conselho Editorial Ana Margarida Fazenda, PRODUTO LOCAL 815 O Ciclo do Queijo: do pasto à mesa. Helder Carvalho Salvado, Será o lado solar da Serra da Gardunha sinónimo de alegria, felicidade, fertilidade e abundância? Hugo Landeiro Domingues, Pedro Miguel Salvado, Celso Lopes Acreditamos que sim e, por isso, continuamos na nossa caminhada de sol-a-sol descobrindo, TERRITÓRIO 1623 Serra da Gardunha - Palimpsesto de paisagens Colaboração redescobrindo e exaltando os lugares, produtos, recursos, segredos e histórias que o sul da Alfredo Abrantes, Carlos Rodrigues, Celso Lopes, David Morgado, João Freitas, Gardunha guarda de melhor. João Ruivo, Sónia Morgado, Fábio Oliveira NATUREZA 2425 Albufeira da Marateca: Um oásis para as aves migratórias A boa receptividade do número 0 da Solstício por parte de diferentes públicos mostrou que a Conceito e Design Hugo Domingues Solstício tem futuro e que é uma aposta com futuro por parte da Descobrindo. TERRA A TERRA 2629 Crónica Lírica de São Vicente Ilustrações com base em: O número 1 da revista Solstício - O Sul da Serra da Gardunha de Sol a Sol reflecte mais algumas Clipart ETC is copyright © 2010 by the University of South Florida descobertas, mais vôos migratórios e mais alguns passos dos longos percursos da transumância, SABOREAR 3033 Restaurante Rural Gardunha Preço marcas dos ciclos do quotidiano no imaginário do sul da Gardunha. Esta edição mostra a 1,50 EU preocupação com a imagem, ao nível gráfico e fotográfico que queremos manter no modelo que Tiragem FICAR 3437 Solar dos Caldeira e Bourbon 1.000 exemplares pensamos para esta publicação. IMPRESSÃO Ciência Gráfica LDA. UM MOMENTO 38 Uma imagem Espero que goste e desfrute da revista descobrindo DEPÓSITO LEGAL 305367/10 o lado solar da Serra da Gardunha... AGENDA 39 A não perder... CONTACTOS ÚTEIS 4041 Turismo, Alojamento, Restaurantes e outros Hugo Landeiro Domingues Presidente da DESCOBRINDO Alexandre Azevedo INSTITUIÇÕES 4243 Juntas de Freguesia, Associações e outras Apoios INSTITUTO CÂMARA PORTUGUÊS MUNICIPAL DA JUVENTUDE DO FUNDÃO 2 3
  • 3. ASSOCIATIVISMO ACONTECEU EM DESTAQUE / Associativismo Juvenil... HELDER CARVALHO SALVADO uma escola de cidadania. Projecto “Ninho”... As Associações Juvenis têm na sociedade portuguesa, impondo- JANEIRO -se como agentes de dinamização sociocultural, de desenvolvi- mento local e de socialização principalmente dos jovens. 5 HÁ QUE SE CHÁ em honra aos Reis Magos . Tinalhas Em particular, estas organizações têm sido responsáveis por gran- de parte da educação cívica da juventude portuguesa, bem como 10 FESTA DAS PAPAS em honra a São Sebastião . Póvoa da Atalaia da aprendizagem do exercício democrático e da difusão de va- 17 BODO (Festa dos Cascoréis) em honra a São Sebastião . Lardosa NINHO é um projecto musical de altíssima qualidade feito por ções e como a linha de investigação que segue o seu Doutora- lores positivos, que norteiam e regem a vida das comunidades. 20 SÃO SEBASTIÃO Celebração Religiosa . Sobral do Campo artistas que têm uma relação profunda com a região. Trata-se de um magnífico percurso pela música tradicional por- mento tem a ver, igualmente, com a recolha, edição e difusão do património ibero-americano, teve a feliz ideia de formar um 23 CASCORÉIS E FILHOSES em honra a São Sebastião . Soalheira e Louriçal do Campo tuguesa e pela música de autores consagrados como Eric Satie, grupo para reproduzir estas músicas de tradição oral. Jacques Ibert, ou Carlos Paredes, tendo como pano de fundo a As músicas são, assim, originárias da Serra da Gardunha, ou- paisagem mediterrânica. Tem como mentor o músico beirão Mi- tras da sua própria autoria ou de autores consagrados já acima ABRIL guel Carvalhinho (guitarra de 10 cordas) que com Irene Ferreira referidos, sempre procurando a influência das raízes musicais 5 SENHORA DA ENCARNAÇÃO Romaria e Celebração Religiosa . Póvoa de Rio de Moinhos (voz e violino), Pedro Ladeira (clarinete), Sérgio Chitas (bando- lim), Fernando Gordo (baixo) e Aldovino Munguambe (percus- tradicionais beirãs. O projecto é já um sucesso nacional contando com actuações SENHORA DA SERRA Celebração Religiosa . Serra da Gardunha . Castelo Novo são) dão corpo ao projecto. Todos os músicos estão ligados à em todo o distrito de Castelo Branco, tais como no Cine-Teatro 11 SENHORA DAS NECESSIDADES Romaria e Celebração Religiosa . Soalheira Escola Superior de Artes Aplicadas do Instituto Politécnico de Castelo Branco, sendo professores, alunos, ex-alunos ou cola- Avenida de Castelo Branco, no teatro clube de Alpedrinha e no programa Viva a Música, da Antena 1. 17 SENHORA DAS PRECES Celebração Religiosa . Cortiçada . Vale de Prazeres boradores desta instituição. Por outro lado, os poderes públicos têm vindo a entregar às asso- MAIO ... ciações um conjunto de intervenções nos domínios social, cultu- ral e desportivo, no que tem constituído um dos mais interessan- (31)›2 FEIRA DO QUEIJO Soalheira Os temas são originais ou tes fenómenos de transferência (ou desconcentração) efectiva de poder para a esfera civil por parte da administração pública. 23 SENHORA DA ORADA Romaria e Celebração Religiosa . São Vicente da Beira inspirados em melodias Como consequência deste apoio efectivo que o Estado tem vindo a destinar ao movimento associativo, começa agora a surgir uma JUNHO da Serra da Gardunha e nova realidade com o aparecimento de numerosos grupos juvenis de carácter informal, denominados “segunda geração” de asso- 5 SAGRADO CORAÇÃO DE JESUS recebem influências das IMAGEM DA CAPA DO ÁLBUM "nNINHO" Sobral do Campo ciações, caracterizadas por uma maior especialização ao nível das actividades organizadas, que traduzem uma nova mentalidade e 10 SANTA ÁGUEDA Romaria e Celebração Religiosa . Barragem de Santa Águeda raízes tradicionais musicais que procuram responder às novas exigências de uma sociedade actual, onde os jovens não devem ser encarados como um pro- 13 SANTO ANTÓNIO Festa Popular . Soalheira beirãs. blema, mas sim como parte activa e interessada na solução. 19/20 FEIRA DE GASTRONOMIA E ARTESANATO São Vicente da Beira Atento a esta nova realidade está particularmente o Instituto Por- 24 SÃO JOÃO Festas Populares . Atalaia do Campo ... tuguês da Juventude, entidade responsável pela implementação e execução das políticas públicas de juventude definidas pelo Miguel Carvalhinho nasceu em Gonçalo, município da Guarda O belíssimo CD que tem na capa um ninho de uma cegonha Governo, promovendo e dinamizando acções no âmbito da Edu- JULHO e viveu alguns anos, a Sul da Gardunha, na aldeia histórica de (dando nome a todo o projecto) contou com a edição de 200 cação Não Formal, na preparação e formação complementar das Castelo Novo e em Ninho do Açor, onde recolheu pelas aldeias esculturas numeradas, que acompanham o CD, da autoria de novas gerações, estimulando o exercício da cidadania activa por 25 SÃO SEBASTIÃO Celebração Religiosa .Vale de Prazeres e vilas vizinhas: Alpedrinha, Soalheira, Casal da Serra, Louriçal José Simão e tem ainda imagens de Rui Monteiro, que é designer parte de todos os jovens. do Campo, São Vicente da Beira, Souto da Casa e Alcongosta e faz as projecções nos concertos ao vivo, estando à venda em várias músicas que compõem este disco, tais como: Viradinho todo o país, pela módica quantia de 10 euros. ao Norte, Anabela, Senhora da Serra, Loureiro Verde Loureiro, Miguel Nascimento Director Regional do Centro | Instituto Português da Juventude entre outras. O compositor começou a fazer recolhas de can- 4 5
  • 4. IDENTIDADE HUGO LANDEIRO DOMINGUES* OS PRODUTOS Ao longo dos anos, a identidade dos territórios fez parte das Os produtos locais são, por isso, a salvaguarda da herança cul- alterações e mutações, na criação ou recriação de um con- tural, gastronómica e artesanal dos lugares e das suas gentes, junto de ideias apreendidas através da aplicação nas nossas tão importante no desenvolvimento local. Comportam-se como LOCAIS actividades diárias, dos saberes e dos conhecimentos passa- aglutinadores das memórias, dos saberes e das histórias dos dos de geração em geração. territórios. O Homem imaginou, criou, inventou e reinventou, colmatou as NA IDENTIDADE Identidade territorial que se foi construindo e adaptando aos suas necessidades com objectos de ritual, instrumentos musi- tempos, através de uma panóplia de factos e acontecimentos cais, iguarias gastronómicas e outras soluções que facilitaram a naturais, sociais ou culturais, que transportam a história, o pa- sua vida. Criações que sobrevivem e resistem ao tempo, porque TERRITORIAL trimónio e a memória dos nossos antepassados nas suas vivên- foram utilizados e se mantiveram genuínos, úteis e vivos duran- cias, medos, crenças e rituais. te séculos, tornando-se, por isso, intemporais. ... É preciso acreditar que uma boa ideia local, desenvolvida com base na responsabilidade social, cultural e ambiental, pode transformar-se num produto global de grande qualidade e de grande retorno económico e social. ... A procura de justificação para os fenómenos naturais, o instinto Um infindável saber endógeno que resiste ao tempo muitas ve- de sobrevivência e a descoberta de novas formas de alimento, zes em pequenos lugares onde, quase tudo, o que faz parte obrigaram o Homem a descobrir e a criar inúmeras soluções do quotidiano nasceu do cerne da cultura e das ideias locais. para os problemas do dia-a-dia. Soluções que são hoje artefac- Não devemos esquecer que estes produtos, parte da identidade tos, instrumentos, construções ou mesmo receitas e iguarias de de cada lugar, são memórias vivas e pedaços da cultura e da inigualável valor. Ideias, saberes e experiências ancestrais que história do território a que pertencem. Além disso, têm uma chegaram até hoje porque, mais do que essenciais para a nossa importância imensa porque respeitam o Homem, a Natureza e sobrevivência, foram, e ainda são, parte da identidade dos luga- a sustentabilidade do território e dos seus recursos. res e dos povos que os descobriram, utilizaram e transformaram em fenómenos sociais e culturais de pertença. É positivo acreditar que um produto é melhor que os outros, mas é preferível distinguir um produto pela sua diferença, espe- Esses produtos, elementos identitários dos territórios, demons- cificidade e sustentabilidade. É preciso acreditar que uma boa tram grande importância como poderosos mensageiros agre- ideia local, desenvolvida com base na responsabilidade social, gadores desse conhecimento, cultura e história, capazes de cultural e ambiental, pode transformar-se num produto global guardar, agregar e transportar o património genético dos lugares de grande qualidade e de grande retorno económico e social. onde foram criados e manipulados durante séculos. Conjugam a essência dos valores genuínos dos povos, da cultura e do ima- Ana Fazenda ginário de cada lugar, demonstrando a sua missão de afirmação * Licenciatura em Design de Comunicação (Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa) e distinção da identidade territorial. P. G. Comunicação e Imagem (IADE) e P. G. Marketing de Eventos e Produtos Turísticos (U.B.I.) 6 7
  • 5. PRODUTO LOCAL ANA MARGARIDA FAZENDA MARIA DE JESUS CARVALHO Licenciada em Turismo (I.P.L) Licenciada em Ambiente (I.P.C.B.) Em terras de transição, entre o Norte e o Sul do interior de Portugal, onde pontos e pontes de passagem de pastores e rebanhos transumantes transportam os se- gredos da arte de fazer queijo conjungam-se, numa simbíose de saberes, práticas, técnicas e experiências milenares capazes de criar este delicioso produto local. Uma arte tão antiga como a prática de domesticação de animais e a criação de reba- nhos para obter alimentos como a carne ou o leite. Os Gregos acreditavam que Aristeu, filho de Apolo e Cirene, descobrira o queijo numa viagem pelo deserto. Este teria levado, para se alimentar, tâmaras secas e leite num cantil feito de estômago de carneiro. Dias depois, o leite transformara-se numa pasta sólida de agradável sabor que daria origem ao queijo. Os gregos reconheceram-lhe tal importância que o queijo passou a ser um alimento dos deuses, presente nas célebres cerimónias e súplicas, como oferenda no Monte Olimpo. Também, é certo que nas sociedades pré-romanas o queijo seria fundamental na dieta Alexandre Azevedo alimentar dos "Lusitanos", nas suas comunidades de subsistência agro-pastoril. Mais tarde, os romanos, aperfeiçoaram a produção e a maturação do queijo, que passou a ser frequente na alimentação dos nobres, de soldados e atletas. As casas de habitação da Roma Antiga já possuíam um espaço que seria utilizado como queijaria, para o fabrico e a cura desta iguaria. A confecção do queijo, próxima de como hoje a conhecemos, remonta à Idade Média, em grande parte da responsabilidade das ordens religiosas que transportaram o co- nhecimento aos camponeses. A agricultura e pequenas indústrias rudimentares, eram da responsabilidade dos monges cristãos que se especializaram no fabrico do queijo, transformando-a numa verdadeira arte. 8 9 9 8
  • 6. PRODUTO LOCAL O CICLO DO QUEIJO: DO PASTO À MESA. A produção de queijo fazia parte da rotina diária dos pastores como o retirar e o acon- chegar o rebanho do bardo ao amanhecer e ao anoitecer, respectivamente. Era no bardo que, no princípio e no final de cada dia de pastoreio, se procedia à ordenha, retirando o leite da urbe dos animais para a confecção do queijo. Após a ordenha o leite era levado para casa onde, a mulher, conhecedora de todos os segredos guardados e herdados dos seus antepassados, prosseguia empiricamente com o seu fabrico. Hoje, embora não sejam utilizadas ferramentas e acessórios tão rudimentares, o proces- so é muito semelhante. As queijarias seguem as etapas de confecção do saber tradicio- nal mas usam as normas de higiene recomendadas. Também o processo de obtenção do leite é idêntico, embora seja realizado de forma mecânica. ... É uma alimentação variada, com base na vegetação natural endémica, que dá origem ao leite de excepcional qualidade desta região. ... Preparar A obtenção de um queijo de qualidade parte dos cuidados que são dados aos animais que produzem o leite, ao local da sua produção, à época do ano e, por isso, à qualidade das pastagens que os alimentam. A Sul da Gardunha, a interacção do clima com as características do solo, são a aliança Jorge Firmino prefeita para que os pastagens sejam propícias à dieta dos rebanhos de ovelhas. Numa região onde, os invernos são longos e suaves e os verões são extremamente quentes e secos, predominam as culturas forrageiras e as culturas de cereais de se- queiro, alternadas com o pousio. As pastagens intencionalmente semeadas valorizam a dieta dos ruminantes. O valor nutricional das culturas reflecte-se na qualidade e na quantidade da matéria-prima do queijo, na medida em que as ovelhas produzem mais e melhor leite. É uma alimentação variada com base na vegetação natural endémica que dá origem ao leite de excepcional qualidade desta região. No Verão, alguns pastores Transumância praticavam a transumância dos seus rebanhos, movendo-se para as pastagens de alti- É um tipo de migração ancestral, um movimento sazonal e reversivo, que tude na montanha, garantindo assim uma melhor alimentação. se deve às características oro-climá- ticas nacionais e às alterações nas estações do ano. Os seres transumantes passaram, mas os saberes ficaram e os novos rebanhos do Sul Praticavam-se dois deslocamentos distintos: a estival quando os reba- da Gardunha, produzem a matéria-prima que permite confeccionar queijos de sabor nhos eram conduzidos para os pastos distinto com base nos saberes ancestrais deixados ao longo do tempo. Jorge Firmino de montanha no Verão e Outono; e a invernal quando desciam para a planície, no Inverno e Primavera. HD 10 11
  • 7. PRODUTO LOCAL O CICLO DO QUEIJO: DO PASTO À MESA. Fazer O fabrico tradicional do queijo começava com a preparação do leite para gerar a coa- lhada. O leite era vertido, para um recipiente, onde se atava um pano branco. Neste coador era deitado o coalho, de origem vegetal (cardo) ou animal, que se misturava com o líquido enquanto este era derramado. Para finalizar esta etapa, o pano era espremido a fim de aproveitar todas as essências e Cardo (Cynara cardunculus L.) propriedades do coalho, que potencia a coagulação do leite. Ao calor da lareira, o leite O cardo é uma planta espinhosa era mexido com a "fataca" até coalhar, por cerca de meia hora a três quartos de hora. semelhante a uma alcachofra, de sabor amargo. Daqui resultavam dois produtos distintos, um sólido, a coalhada, e uma líquida, o soro. A sua flor, de cor lilás, é recolhida A coalhada era retirada e colocada pouco a pouco no "cincho", uma forma ou aro durante o Verão, sendo depois seca e moída. circular furado, onde as mãos frias, quase gélidas, pressionavam a massa com maior O pó de cardo tem a propriedade de ou menor força, fazendo com que o soro escorresse pela "francela" até ser esgotado. coalho quando se mistura com o leite originando uma pasta solidificada, O soro excedente era recolhido, para posteriormente fazer travia ou requeijão, e comer denominada coalhada. HD HD como uma “sopa” doce ou mesmo para acompanhar com broa. Quando a coalhada se tornava consistente e firme, procedia-se à salga do queijo. O sal contribui para o amadurecimento da côdea e a libertação do excesso de água, além de regular os processos fermentativos. Ainda no "cincho" colocava-se sal na face superior. Passado um dia, o queijo era salgado dos lados e na face inferior, voltava-se e recolocava-se na mesma forma, que era retirada quando o queijo se encontrasse mais seco e com forma mais definida. Posteriormente aconchegava-se, envolvendo os lados num pano branco, chamada a cinta ou "empesga". Para finalizar, o queijo era colocado nas tábuas da queijaria cobertas por um pano branco, onde a circulação do ar facilitava a cura. Uma vez aqui, as limpezas e lavagens para eliminar e libertar as impurezas eram regulares. Passado um mês o queijo adquire uma “côdea” e uma cor amarela estando pronto a ser consumido. ... Quando a coalhada se tornava consistente e firme, procedia-se à salga do queijo. ... Nesta região produzem-se três tipos de queijo com Denominação de Origem Protegida (DOP): o Queijo Amarelo da Beira Baixa (DOP) deve maturar entre os 10ºC e os 18ºC num ambiente com 50% a 70% de humidade durante cerca de 40 dias; o Queijo de Castelo Branco (DOP), que deve maturar a temperaturas entre 8ºC e 14ºC num am- biente com 80% a 90% de humidade, durante no mínimo 40 dias; o Queijo Picante da Beira Baixa (DOP) com maturação de pelo menos 6 meses que deve ser efectuada a Jorge Firmino temperaturas entre 10ºC e 18ºC num ambiente com 70 a 80% de humidade. 12 13
  • 8. PRODUTO LOCAL O CICLO DO QUEIJO: DO PASTO À MESA. A Denominação de Origem Protegida obriga a seguir um conjunto de regras e requisitos, que Servir incluem desde as condições de produção do leite, higiene, conservação, fabrico e à rotulagem do produto. Como entrada ou para terminar agradavelmente qualquer refeição, antes da fruta ou dos doces, é Como referimos anteriormente, as características organolépticas únicas, relacionadas com tipo de de bom grado servir um prato ou uma tábua, composto de diversos queijos, afastados entre si. leite, processo de fabrico, aparência, consistência, aroma e sabor justificam a classificação DOP Deverão ser apresentados sem invólucro ou embalagem. Escolhidos consoante a época ou gosto em três produtos distintos: o Queijo de Castelo Branco ("Ovelha"), o Queijo Amarelo da Beira pessoal, devem ser colocados por ordem, de sabor suave, intermédio e intenso, no sentido dos Baixa ("Mistura") e o Queijo Picante da Beira Baixa ("Queimoso"). ponteiros do relógio. "Ovelha" "Queimoso" Queijo Picante da Beira-Baixa (DOP) à mesa. Feito da mistura do leite de ovelha, cabra e/ou vaca Para acompanhar são ideais pão escuro, branco, centeio, com sementes, torrado, bolachas de Queijo de Castelo-Branco (DOP) e coalho animal, feito à "cabreira", resulta na pasta água de sal, mini tostas, azeitonas, e para um gosto mais requintado com tomate cereja, frutos Queijo curado de pasta semidura ou semimole, com "Mistura" dura ou semidura, de cor branca-acinzentada, sem secos, fatias de maçã ou pêra, uvas, figos, mel ou geleia. No caso de servir queijo fresco, é neces- alguns olhos pequenos, fabricado a partir do leite de olhos ou com pequenos olhos irregulares. sário, colocar à disposição sal, pimenta e cominhos. Queijo Amarelo da Beira-Baixa (DOP) ovelha puro e coalho vegetal, feito à "ovelheira". É característico o aroma bastante activo e o sabor Para melhor aproveitar o sabor e a textura, é aconselhável que os queijos estejam à temperatura Durante a cura adquire um aroma acentuado e um É fabricado com a mistura de leites de ovelha, cabra acentuadamente picante. ambiente, antes de serem consumidos e nunca directamente do frigorífico. É importante ter em sabor levemente picante. ou apenas com leite de ovelha e coalho animal, feito É comercializado com um diâmetro entre 10 e 15 atenção a dureza do queijo, já que os mais duros levam mais tempo a ficar à temperatura do ar. Inicialmente possui uma crosta maleável, passando à "cabreira". cêntimetros, uma altura entre 3 e 5 cêntimetros e peso O corte no queijo, define todo um "saber de gourmet", deve ser regular, desde o centro até a posteriormente a dura, de tom amarelado. Curado de pasta semidura, com alguns olhos irregula- entre 400 e 1000 gramas. casca, e este, voltado para baixo enquanto não são utilizados, para prevenir a oxidação e alteração É comercializado com 12 e 16 cêntimetro de diâmetro, res, obtém a cor amarela-torrada que o caracteriza. do sabor. A faca utilizada para o corte deve ser de gume liso e nunca de serrilha. Caso o queijo e 5 a 8 cêntimetro de altura e entre 800 e 1300 O seu sabor apesar de intenso é limpo e levemente seja de pasta dura e semidura o ideal é recorrer a uma faca de cabo duplo e de gume largo. Ao gramas de peso. acidulado. O aroma intenso mas muito agradável. contrário de um queijo de pasta mole, é conveniente usar uma faca de gume estreito. É comercializado com um diâmetro entre 12 e 16 Ao servir queijo a crianças a melhor opção é cortar previamente em pedaços, cubos ou até mes- cêntimetros, uma altura entre 3 e 5 cêntimetros e peso mo triângulos, se for queijo fresco. entre 600 e 1000 gramas. 14 15
  • 9. TERRITÓRIO PEDRO MIGUEL SALVADO * Serra da Gardunha palimpsesto d e paisagens. I - A PROPÓSITO DE UMA GRAVURA OITOCENTISTA A Serra da Gardunha assume-se como um relevo cultural de transição, um autêntico marcador geológico de encontro entre distintas correntes civilizacionais. Estamos perante uma orografia de destinos e de milenares passagens e diante de uma paisagem em continuada construção que expressa determinadas concep- ções de vida. Paisagem que vai irradiar, ao longo do tempo, um peculiar significado e sentido ora como limite, ora como porosa zona de passagem e de contac- to entre horizontes mais setentrionais ou mais meridionais. 16 17
  • 10. TERRITÓRIO SERRA DA GARDUNHA - PALIMPSESTO DE PAISAGENS Ana Fazenda Primeiro as vagas pré e proto-históricas do Este longínquo e do comunidades estabelecerem e marcarem linhas, mais palpáveis da utilização das águas, vão transformar o grão das subsistên- de conduzir, sazonalmente, os gados da montanha para os re- Sul; séculos depois, as ideias e a cultura sopradas do mediterrâ- ou mais invisíveis, para desenvolver e aplicar os seus actos, ges- cias dos quotidianos, pontuando a serra de sociabilidades uni- levos aplanados do Sul. A presença de ricos filões metalíferos neo clássico, mais tarde, reflexo das contínuas apropriações por tos, poderes, dinâmicas e vontades. das por caminhos. À água que escorria do cimo da montanha, na região também deve ter sido um dos factores determinantes parte dos pólos religiosos medievais dominantes na Península Numa primeira apreensão, a Serra caracteriza-se por uma varia- juntava-se-lhe o suor do corpo e as ânsias do futuro das gentes. nas orgânicas económicas e sociais de então. Estes povoados, – a Serra foi barreira e ponte. bilidade de altitudes escalonadas. A sua matriz é preenchida pe- de que são bons exemplos, o de São Brás (Freguesia de Fun- las texturas dos plutónicos granitos e pelas nuances das urzes, O tempo longo da história antrópica desta Serra só agora co- dão) e o do Castelo Velho (Freguesia de São Vicente da Beira) Todos esses momentos expressaram-se com maior ou com me- dos ervedeiros, das carqueijas, das caldoneiras, das marcelas, meça a ser descodificada. A primeira grande transformação articulavam-se com outros construindo uma rede de comple- nor enraizamento na paisagem indefinidamente mutante num dos rosmaninhos que todas as primaveras enchem a serra de produziu-se na passagem de uma economia móvel aos primei- mentaridades e de solidariedades formando, no seu conjunto, o duradouro, mais activo ou mais adormecido, processo continu- cromias e de cheiros num apelo à renovação. ros processos de sedentarização das comunidades humanas. mais antigo fenómeno de territorialização conhecido na região. ado de criação. Os ecossistemas serranos eram dominados por uma densa e Fixação humana que remontará ao Bronze Final com as suas A Serra da Gardunha afirma, igualmente, os vínculos e as rela- variada vegetação de espécies caducifólias (carvalhos e casta- morfologias da existência, em determinadas cotas, de locais Um segundo momento antrópico desenvolveu-se durante o lar- ções entre os ancestrais quadros culturais das comunidades de nheiros) de que já só subsistem a memória e a toponímia. Esse amuralhados que dominavam os horizontes. O espaço foi, go processo romanizador. As cotas que bordejavam o maciço montanha com as da planície, concentrando neste ponto do manto verde “espontâneo” foi, em vários momentos, altera- paulatinamente, apropriado e os grupos humanos projectando- foram densamente ocupadas através da instalação de pequenos Portugal central todas as redes estabelecidas entre a matricial do com a introdução de novas espécies como foi o caso, por -se e identificando-se com e no território. Na paisagem pré-ro- casais e granjas de vocação agrícola. Mais tarde, ricas ‘villae’, Estrela e os mundos sonhados do Tejo que conduziam ao mar. exemplo durante a Idade Média, do plantio de castanheiros ou mana destacavam-se então os povoados com as suas cinturas com os seus mosaicos e estruturas termais, reforçam a aptidão A paisagem deste autêntico palimpsesto cultural, sempre atra- da tão custosa e metódica construção e cultivo, nas vertentes, amuralhadas onde viviam populações sustentadas numa eco- agrícola da região ao tempo dos romanos. Os solos foram in- vessado por gentes, animais e esperanças, também resulta e de pequenas folhas de pão onde, até ao início do século XX, nomia essencialmente de base agro-pastoril. Estes aglomerados tensamente cultivados e largas zonas da floresta primitiva terão se teceu do equilíbrio e dos vincos de várias fronteiras, umas crescia o centeio. A fluida rede hídrica permitiu a instalação nos vivenciais utilizavam a altitude como forma de afirmação de po- sido destruídas através de queimadas para facilitar o surgimento de alcance alargado, outras mais domésticas que, ao longo da pequenos vales de espécies diferenciadas mais dependentes do der e de controlo das vias de comunicação que sulcavam a flo- dos pastos e um aumento das áreas de cultivo de cereal e da História, se justificaram, por aquela necessidade intrínseca das teor de humidade. O surgimento de azenhas, engenhos sábios resta primitiva. Estas vias tiveram a sua origem na necessidade 18 19
  • 11. TERRITÓRIO SERRA DA GARDUNHA - PALIMPSESTO DE PAISAGENS expansão da oliveira. A exploração mineira dos coutos limítro- domésticos. A partir dos afloramentos das geologias dominan- fes do maciço terá sido incrementada com a territorialização do tes, o xisto e o granito, os seixos arredondados, as areias, vão poder e com o controlo dos recursos locais, ligando a região erguer casas, muros, poços, solares, capelas, igrejas. São comu- aos grandes centros através da materialização de firmes vias de nidades expansivas que com as suas hortas bordejando os rios, comunicação. Este período de intensa construção paisagística domesticam a altitude construindo socalcos e casais dispersos terá começado a desvanecer-se a partir do século VIII d. C. As na paisagem serrana. A nova reorganização territorial a que se convulsões políticas, sociais e demográficas, e as novas cen- procedeu, fez emergir assim uma nova rede de povoamento for- tralidades dos poderes emergentes noutras escalas e latitudes, mada por pequenos núcleos onde se cruzam funções religiosas ... Na escassez de uma firme permanência humana, as antigas vias e trilhos eram, contudo, periodicamente, remarcados em tempos de paz atravessadas pelos rebanhos transumantes, ... transformaram o activo pequeno mundo da Gardunha ‘post’ ro- e administrativas, económicas e vivenciais com uma restrita área mana numa área repulsiva e algo periférica. A floresta primitiva de influência. São, contudo, terras unidas através de itinerários avançou e o verde denso e cerrado voltou a dominar, durante por onde circulam pequenos fluxos de gentes e de capitais. A séculos. Na escassez de uma firme permanência humana, as ciclicidade dos trabalhos e dos dias é marcada pelo ciclo festi- antigas vias e trilhos eram, contudo, periodicamente, remar- vo e religioso tradicional. A floresta assumirá uma importância cados em tempos de paz atravessadas pelos rebanhos transu- vital para a fruste economia camponesa em expansão com a mantes, débil base económica regional que apesar de todas as destruição da mesma para área de cultivo. Era um provedor de circunstâncias terá continuado. Mas foi a passagem cíclica de combustível, era a fonte do pão de castanha. Com os níveis de movimentos de guerreiros cristãos e islâmicos que deu outros cota antrópica sempre em expansão, o uso e o entendimento sons e rumos de fixação à quietude da natureza. cultural dos cumes foi outro. Aí eram os místicos, sentidos e temidos domínios do sagrado protector que dominavam, locais Os finais do século XII, até ao século XV constituíram uma fase a que se ia em sentida e rogada peregrinação em determinados de antropização complexa, caracterizada por uma intensa e pro- dias do ano quebrando-se os silêncios do perfil serrano. gressiva transformação do habitat natural. Na serra de Ocaia, como então se designava a Gardunha, os tempos posteriores à Durante a segunda metade do século XIX, e todo o século XX, “Reconquista” criaram formas paisagísticas muito diferenciadas assistiu-se a uma alteração profunda dos conceitos económi- como as que resultaram da criação do concelhos de S. Vicente cos e dos quadros vivenciais da Gardunha. O processo migra- da Beira em 1195 ou de Alpreade (Castelo Novo) em 1202. A tório, o abandono dos campos, a introdução de novas culturas atractividade da região, com a fixação de agregados familiares e espécies como o pessegueiro ou a cada vez mais dominante de outras paragens, permitiu uma mutabilidade acelerada. Se o cerejeira, a doença dos castanheiros, a multiplicação de redes castelo dos poderes dominantes ou a casa torre dos senhores de acessibilidades, a destruição dos cocurutos geológicos e as dominaram a silhueta de algumas comunidades, será à volta do sucessivas vagas de incêndios – tudo isto criou uma nova pai- campanário da nova geografia devocional, entretanto marcada sagem. na paisagem, que as populações vão construir os seus espaços 20 21
  • 12. TERRITÓRIO SERRA DA GARDUNHA - PALIMPSESTO DE PAISAGENS ... Os “lugares saudosos” tecidos com materialidades e com Hoje, em grandes áreas da sua extensão, a cinza e o acastanha- a narrativa expositiva da Orologia: a penha da Senhora da Serra. do são as cores dominantes. Contudo, todas as Primaveras se O principal elemento da rede fluvial desta encosta, a Ribeira de espiritualidades sentidas, indagadas, veneradas que este vai espalhando, numa eclosão de flores e sons, o sentido de Alpreada é apontado, indicando-se os topónimos das fontes do renovação periódica da paisagem nesta verdura aromática em Corisco e do Couto, cujas águas também criam e desenvolvem autor quis resgatar à voraz passagem do tempo e dos todas as suas gamas. Aqui e além, num território fustigado pelo esta linha líquida da face oriental da serra. fogo destruidor, são estes ‘oásis de resistência’, onde a sombra Estamos perante uma figuração espacial que interpreta a leitura subadjacentes e terríveis esquecimentos. convive com a água, que ainda convocam o ancestral espírito empírica da totalidade de uma realidade observada e de uma tem- da paisagem e que nos fazem sentir todo o valor da altitude poralidades interrogadas por José Inácio Cardoso na organicidade ... libertadora, da tal linha de contacto entre a rocha e os deuses. desta parcela da paisagem serrana. Paralelamente aos modos de Tal como ontem, a Gardunha nunca foi local de imutáveis quie- habitar, de viver e de circular como são os casos de Alpedrinha, tudes. Pelo contrário. Foi sim sempre um sítio de convergência de Castelo Novo, de Vale de Prazeres, do lugar da Cortiçada, uni- dos tempos, dos trabalhos, das passagens, dos esquecimentos dos pela estrada de Castelo Branco ou pela estrada Real, também e dos sonhos: do passado e do futuro. se representam elementos de uma cartografia do sagrado regio- Daí a importância que assume para sua História, a existência de nal, ligação religiosa muito presente ao longo do texto. uma representação, das primeiras imagens desta serra até à data Convergem, assim, na gravura sensações emitidas e percepcio- identificadas, incluída na importantíssima obra de José Inácio nadas a partir de uma geografia pessoal, criando uma imagem Cardoso “Orologia da Gardunha ou breve descripção topográfica mental relacionada com o sistema de valorização e de iden- da Serra da Gardunha considerada no seu estado actual”, editada tificação do espaço vivido e interiorizado por alguém que se em Lisboa, em 1848. Trata-se de um elemento bibliográfico pio- considerava um “curioso indagador” das distintas espessuras, ... Hoje, em grandes áreas da sua extensão, a cinza e o acastanhado são as cores dominantes. ... neiro nos estudos regionais sobre formas do relevo que se desen- dimensões e transformações da sua paisagem doméstica. Neste volvem nas paisagens da Beira. A Orologia considerada como a caso, a paisagem envolve e são também lugares, carregados de ciência do conhecimento das montanhas foi, de um modo muito significações. Os “lugares saudosos” tecidos com materialida- particular e sentido, desenvolvida pelo autor que tentou descodi- des e com espiritualidades sentidas, indagadas, veneradas que ficar o espaço envolvente do seu quotidiano vital, carregando-o este autor quis resgatar à voraz passagem do tempo e dos su- de significados. A introdução da gravura na totalidade da obra badjacentes e terríveis esquecimentos. A Orologia foi a certeza reforça a descrição literária do espaço, fornecendo ao leitor uma da afirmação de uma memória para a Serra. Como escreveu, em visualidade complementar da realidade que se quis apontar. 1874, o grande geógrafo Humboldt “existe ao lado do mundo O debuxo imagético apresenta a seguinte legenda: «Serra da real ou exterior, um mundo ideal ou interior, cheio de mitos fan- Gardunha. Vista oriental» e a sua feitura captou e deseja repre- tásticos e, algumas vezes, simbólicos e de formas cujas partes sentar um conjunto de realidades físicas e humanas. Evidencie- heterógeneas foram tomadas do mundo actual ou dos restos -se o perfil e o tipo de traço que o litógrafo Figueiras que assi- de gerações extintas”. É tudo isto que devemos considerar ao na a peça, realizada na Litografia de Santos que se situava no contemplarmos hoje esta Serra de união cultural. Largo Conde Barão, em Lisboa, desenvolveu para interpretar as convulsões do relevo. O recorte do horizonte gizado, dando a sensação de volume, releva o ponto de maior altitude da Gardu- nha. Também individualiza o sítio da Portela e, de uma feição *PEDRO MIGUEL SALVADO Licenciado em História (U.C.). Mestre em Culturas Regionais (U.N.L.). Doutorando (USAL). desproporcionada, o local centralizador e congregador de toda Divisão de Cultura da Câmara Municipal do Fundão. Membro da equipa da Gardunha XXI. 22 23
  • 13. NATUREZA SAMUEL INFANTE Presidente do Núcleo da Quercus de Castelo Branco Albufeira de Santa Águeda: Um oásis para as aves migratórias. Alfredo Abrantes A albufeira de Santa Águeda está localizada no rio Ocreza, abrangendo os municípios de Castelo Branco e Fundão. Esta infra- ALBUFEIRA DE SANTA ÁGUEDA -estrutura entrou em funcionamento em 1990 e ocupa uma área com cerca de 634 ha. A albufeira encontra-se classificada como Localização: albufeira de águas públicas protegidas, cuja água é utilizada para abastecimento de populações e cuja protecção é ditada por Concelhos de Castelo Branco e Fundão, Freguesias de Lardosa, Louriçal do Campo, Póvoa de Rio de Moinhos, Ninho do Açor, Tinalhas, Sobral do Campo e Soalheira razões de defesa ecológica. Área: 634 ha Capacidade total: 37200 (x1000 m3) Capacidade útil: 34200 (x1000 m3) 24 25 24 25
  • 14. NATUREZA ALBUFEIRA DE SANTA ÁGUEDA: UM OÁSIS PARA AS AVES MIGRATÓRIAS A albufeira foi construída num local onde existiam bosques de Carvalho Negral (Quercus pyrenaica), ecossistemas cada vez mais Cegonha Branca (Ciconia ciconia) onde actualmente conta com uma colónia com cerca de 40 casais reprodutores, já a mais rara raros na Beira interior Sul, e que possuem uma grande biodiversidade. Com a construção da albufeira foram alteradas as condições Cegonha Preta (Ciconia nigra), também pode ser avistada na albufeira mas apenas raras vezes e apenas alimentando-se, pois prefere ecológicas do local, sendo que algumas delas favoreceram o aparecimento de outras espécies, em particular de aves pouco frequentes nidificar em zonas mais isoladas. na região. Com o aparecimento de um plano de água permanente de grandes dimensões foram criadas condições para que diversos grupos de aves, que passavam pela região nas suas migrações, pudessem parar ou mesmo passar o inverno na albufeira. Desta forma a Actualmente a albufeira é um local privilegiado para um contacto com a natureza, para passeios a pé ou de bicicleta, ou mesmo para albufeira passou a ser um ponto de passagem anual na migração de mais de 25 espécies de aves que percorrem milhares de quilómetros a pesca. Os bosques de carvalhal que bordeiam o espelho de água, e os caminhos existentes podem ser percorridos em busca de um para o norte da Europa. reencontro com a natureza. Espécies como a Garça Vermelha (Ardea purpurea), o Colhereiro (Platalea leucorodia) podem ser observadas na sua migração ou- tonal. Diversas espécies de aves aquáticas como o Mergulhão de Crista (Podiceps cristatus), o Pato-trombeteiro (Anas clypeata) Agarrar numa máquina fotográfica ou binóculos, invernam na albufeira e chegam a ocorrer em bandos de várias centenas de indivíduos. Muitas outras espécies passaram a nidificar nas margens da albufeira, como as Garças Boieiras (Bulbucus íbis), a Garça Real (Ardea pode ser um desafio para uma tarde ou um dia em busca cinerea), a Garça Branca (Egretta garzetta), ou a Galinha d’Água (Gallinula chloropus). dos encantos da natureza, neste oásis aqui tão perto... Desde 1997 que a Quercus realizou alguns trabalhos científicos de inventariação de fauna e flora, tendo sido registados 117 espécies de aves, 32 espécies de mamíferos, 16 espécies de anfíbios e répteis, 8 espécies de peixes e 153 espécies de plantas. Entre os mamí- feros é possível observar a tímida lontra, o texugo e a raposa. Uma das espécies de aves mais emblemáticas da área da albufeira é a Cegonha branca (Ciconia ciconia) Peso: 3000 a 3500g Comprimento: 90 a 115cm Envergadura: 195 a 215cm Garça Real (Ardea cinerea) Postura: 3 a 5 ovos Incubação: 29 a 30 dias Peso: 600 a 1200g Crescimento: 2 meses Longevidade: 26 anos Comprimento: 90 a 98cm Envergadura: 175 a 195cm Voo: planante e longo, pescoço esticado, patas projectadas Postura: 4 a 5 ovos Incubação: 26 dias Voz: espécie de sopro gutural e batimentos com o bico Crescimento: 2 meses Longevidade: 25 anos Colhereiro (Platalea leucorodia) Dieta: anfíbios. répteis, peixes, pequenos mamíferos e insectos Voo: pescoço retraído, asas arqueadas com batimento lento Peso: 1100 a 2000g Galinha d'Água (Gallinula chloropus) Voz: crocito ruidoso e áspero, geralmente ao anoitecer Comprimento: 80 a 90cm Envergadura: 120 a 135cm Peso: 250 a 400g Dieta: pequenos peixes e mamíferos, insectos, crustáceos, Postura: 3 a 5 ovos Incubação: 22 a 25 dias Comprimento: 32 a 37cm Envergadura: 50 a 55cm e répteis Mergulhão de Crista (Podiceps cristatus) Crescimento: 7 semanas Longevidade: 10 a 15 anos Pato-trombeteiro (Anas clypeata) Postura: 5 a 12 ovos Incubação: 19 a 22 dias Peso: 750 a 1200g Voo: pescoço esticado, asas arqueadas, batimentos regulares Peso: 400 a 1000g Crescimento: 7 semanas Longevidade: 15 anos Comprimento: 46 a 51cm Envergadura: 85 a 90cm Voz: emite apenas sons guturais, grunhidos e grasnados Comprimento: 35 a 46cm Envergadura: 85 a 90cm Voo: difícil. baixo, normalmente circular de patas pendentes Postura: 2 a 5 ovos Incubação: 28 a 30 dias Dieta: insectos e larvas, pequenos peixes, moluscos, crustá- Postura: 5 a 12 ovos Incubação: 22 a 23 dias Voz: variada, repentina, cacarejar rápido, chilreante e nasal ceos, rãs, minhocas, sangessugas e algum material vegetal Crescimento: 2 meses Longevidade: 10 anos Crescimento: 1,5 meses Longevidade: 12 anos Dieta: insectos aquáticos, larvas, aranhas, moluscos, semen- tes e rebentos de plantas Voo: esguio e alongado, algo trémulo, de patas projectadas Voo: lento com o ruído das asas sibilante Voz: gralhar ruidoso nasal, trinado e lentamente repetitivo Voz: grasnar ruidoso, grave e nasal, geralmente repetitivo Dieta: pequenos peixes, moluscos, insectos aquáticos e algas Dieta: plâncton, moluscos, insectos e vegetação aquática 26 27
  • 15. TERRA A TERRA MARIA DO CARMO RAMOS PRATA Professora do Ensino Básico CRONICA LIRICA DE SAO VICENTE DA BEIRA Ao sul, no regaço da Gardunha Ó vila medieval tens pergaminhos Embalada no acalanto dos pinhais Paisagens de encanto e sedução: Aconchega-se um lugar de sortilégios Cantigas da ribeira aos passarinhos Que resiste ao tempo e aos vendavais: Narram lendas de tempos que lá vão. São Vicente da Beira os privilégios Que se inscrevem, além, nos escaninhos Que te cercam acolhem a quem chegar. E por vales e serras ecoarão. São Vicente da Beira, vila antiga Há páginas de coragem em tua História Geografia serrana de encantar. Ressonâncias de valentia e glória. HD 28 29 28
  • 16. TERRA A TERRA CRÓNICA LÍRICA DE SÃO VICENTE DA BEIRA Jprge Firmino HD HD Certamente já vens de tempos mouros Se episódios de infância e de amargura No prado aceso, silêncio palpitante São quatro faces, - sempre viva memória Antiga povoação já existia. A crónica vicentina assinalaram Ouvem-se flautas - avenas pastoris: Pássaro e barca, o escudo, a cruz florida Assim como houve e há, nas cercanias Não levaram por certo a formosura Será a brisa, serão águas da fonte Que testemunham na pedra a tua história. Um Castelo lendário e seus tesouros Saqueando-lhe honras e foral Ou são folgares de amores pueris? Eternamente dirão da tua vida. Onde um gato de pedra guarda ouros As grandezas remotas não levaram E nas longínquas fragas tão serenas Mais não te digo e ouso que não sei Sentinela velando noite e dia. Nem o orgulho da vila medieval: O vento passa, acordando açucenas Pois sendo vila, fundada por um rei As lendas são tesouros da História Casario silencioso de telhados Há contradanças, Cantares, concertinas Tem tua história silêncios conventuais Da rama às raízes da memória. Pelos séculos dos séculos patinados. Pelos pinhais, com cheiro de resinas. Pausas e falhas nocturnas, sepulcrais. Tanto assim, sendo terra de valia Ruazinhas secretas nos seduzem Natais de neve, filhoses e fogueira: Há oito séculos tu foste fundada Por rotas de segredos e oferendas Ó amada terra, querida São Vicente HD Quando Afonso Henriques agradecia A fontes e monumentos nos conduzem De romarias, desfolhadas nas eiras Ajuda que na guerra lhe foi dada Ó Vila que nos recebes e festejas: Antigas cenas, mundo de antigamente. Ó São Vicente, Por castelão que aos mouros combatia: Aqui um chafariz nos mata a sede De procissões e colchas nas varandas Com insignias e honras assinalada Além uma capela se desvenda. A mesa farta, cavacas, tigeladas vila de sempre, acesa Salve, salve, da Beira, ó São Vicente E os sinos do poente e madrugadas Bolos de azeite, amêndoas, figos, vinho Terra da melhor cepa e melhor gente. Contrapõem-se ao silêncio das veredas. E passam anjos, asas leves de arminho. Ó minha pátria, ó chão da minha vida Depois, a São Vicente consagrada A charneca acende os candelabros Ó vila antiga mundo de antigamente, Tiveste tua heráldica e padroado De giestas e sol e primavera: A cada passo, marcos em cada esquina. Ó São Vicente da Beira, À capital do reino irmanada: E nas minas, à fimbria do crepúsculo De oito séculos, marcando a tua sina Na crónica e nos anais do teu passado Sinfonia de grilos nos espera. Idade Média perpétua no presente. minha casa. De Lisboa Pequena então chamada Cheiro agreste de urzes e pinheiros Em alguns solares e casa vicentinas Conforme rezam versos do teu fado Saragaço, pampilho e amieiro Brasões de armas, mapas de neblinas: Jprge Firmino Da rama às raízes da memória Estevas, margaça e rosmaninho São oito séculos que um capitel coroa Há seiva de tua fama na História. Musgo e heras e amoras no caminho. Do Pelourinho que te guarda e abençoa. 30 31
  • 17. SABOREAR ... TEXTO: SOFIA LOURENÇO FOTOGRAFIAS: Na região sul da Gardunha há um restaurante que serve JORGE FIRMINO sabores tradicionais que se misturam entre si de forma pouco convencional, sabores da terra, sabores de dias de festa e sabores de todos os dias... ... GARDUNHA RESTAURANTE RURAL Falar de comida é também falar de memórias, de afectos, de Depois das entradas com produtos típicos da região o prato tradições, de valores, de sabores, de cheiros e de sentidos. principal: Come-se com os olhos, com o nariz, com as mãos e até com Polvo à lagareiro com batatinhas a murro. a boca… Lombinhos de porco preto com molho de manga e um toque Na região sul da Gardunha há um restaurante que serve sa- de caril acompanhado de arroz basmat e arroz selvagem bores tradicionais que se misturam entre si de forma pouco Barrosã com batata do Louriçal do Campo. convencional, sabores da terra, sabores de dias de festa e Não faltou a salada mista temperada com azeite da região e sabores de todos os dias, tem também sabores diferentes sa- vinagre de framboesa. bores de outras paragens.... O vinho de Monsaraz fez as honras da casa. Os doces. Dividido em vários espaços que vão desde a esplanada ao RG Os doces não podiam ser mais gulosos e não fosse o dia estar Bar, espaço Chill Out, sala Tília e a sala Rural ou sala principal, tão quente tinham sabido ainda melhor… Rural Gardunha é um restaurante que nos leva a viajar pelos pa- Arroz doce com canela e cacau, tigelada da Gardunha, mousse ladares da Beira Baixa e que explora o que de melhor a Serra tem de chocolate com amêndoa lascada regada com vinho do para oferecer: cereja da Gardunha, queijo da Beira Baixa, pão de Porto LBV e ainda creme de maçã com doce de natas coberto cereais: trigo e centeio, cozido na hora e servido ainda quente, com doce de cereja. azeite da região, batata do Louriçal do Campo… O repasto entrou pela tarde, a simpatia do Ricardo Ambrósio O dia estava quente e a hora de almoço ia avançada, nada que fez-nos companhia durante todo o almoço. um sumo de maracujá bem fresco não fizesse esquecer. A chefe Maria Otília merece uma visita. Foi assim no restaurante Gardunha Rural: Pão caseiro de sementes com paté de atum e queijo fresco com RESTAURANTE RURAL GARDUNHA Rua Dr. Daniel Proença de Carvalho, Lote 5 Soalheira flor de sal foram o início de uma vasta refeição. T. 272 419 410 M. 966 567 063 http://ruralgardunha.com.sapo.pt O queijo da "Soalheira" (queijo misto curado: amarelo da Beira Bai- GPS: (N) 40.032206º (W) 7.0487043º xa) com doce de cereja e lascas de amêndoa, fez as delícias da mesa. 25Km de Castelo Branco 18Km do Fundão 32 33
  • 18. Solar TEXTO: SOFIA LOURENÇO FOTOGRAFIAS: JORGE FIRMINO dos Caldeira e Bourbon Património histórico, envolvente natural, simpatia e hospitalidade são bons motivos para visitar o Solar dos Caldeira e Bourbon. Perde-se na memória dos tempos a origem do Solar dos Caldeira e Bourbon. Foi recuperado por volta de 1867, mas por esta altura a Casa Senhorial já existia. Ana Maria Caldeira de Bourbon herdou a casa do seu bisavô João José Caldeira Pinto Giraldes de Bourbon que morreu em 1929. O pai de João José de seu nome Albano descende dos Caldeiras da Sertã, cujo nome lhe foi atribuído por Dom João I quando este tomou aos Castelhanos um caldeirão que ofereceu ao Rei. A mãe Emília, irmã do Marquês da Graciosa e descendente pelo lado Bourbon dos Condes de Avintes, Condes dos Arcos, Duques de Bourbon, de Bourgogne e do Rei Luis de França. Conta a história que a pedra de armas que a Casa Senhorial ostenta na fachada principal tem neles a sua origem. 34 35 34 35