SlideShare uma empresa Scribd logo
1 de 2
Baixar para ler offline
Porque criar uma bandeira de pagamento Brasileira?
O jornal O Estado de São Paulo, publicou hoje (28/04/10) uma matéria sob o título
“Criação de bandeira local era ''inevitável'', dizem especialistas”
http://tinyurl.com/2emc6kk

Na qual descreve e comenta a iniciativa dos bancos Bradesco e Banco do Brasil na
recriação da bandeira de cartão de crédito “ELO”. O cartão ELO foi criado por um pool
de 23 bancos em 1971 e resistiu até 1977 quando cada banco decidiu emitir seu
próprio cartão utilizando outras bandeiras.

Não posso concordar com o termo “inevitável”, isto me parece uma análise simplista
ou superficial. Acredito sim que existam algumas razões para a concepção de novas
bandeiras, entretanto uma nova bandeira de abrangência nacional é muito diferente de
uma regional. No Brasil existem diversos exemplos de bandeiras regionais,
desconhecidas do público do sudeste.

Analisando esta questão, abaixo descrevemos algumas das razões para a criação de
uma bandeira de cartão de pagamento nacional:

   1) Baixa penetração bancária, especialmente na baixa renda, representa uma
      grande oportunidade para os bancos. Um cartão de pagamentos nacional pode
      representar um baixo custo de aquisição de novas contas, principalmente
      quando combinado com o cartão de loja (Private Label);
   2) Uma bandeira nacional que atenda a esta estratégia tem necessariamente que
      representar baixos custos para o banco;
   3) Os bancos não apreciam os custos das bandeiras internacionais, como Visa e
      MasterCard. Principalmente quando a grande maioria de brasileiros só o
      utilizam no Brasil;
   4) Qualquer bandeira de cartão de pagamento para ter sucesso necessita ser
      aceito na maioria dos estabelecimentos comerciais. A Cielo e Redecard podem
      prover uma grande rede de aceitação, a partir da quebra de exclusividade entre
      Cielo e Visa (1º. de Julho de 2010).

Entretanto, algumas considerações:

O valor cobrado dos lojistas em uma transação com cartão de crédito é dividido entre
o Banco emissor do Cartão, a rede de Credenciamento (Acquirer) e a Bandeira do
cartão. Em média, entre 44% a 46% do valor ficam com o Credenciador (Redecard,
Cielo, etc.), O banco emissor recebe outros 44% a 46% (Interchange Fee) e, a
Bandeira (Visa e MasterCard) recebe entre 8% a 12% (Fee de bandeira).

Não acredito que o banco abriria mão de suas receitas com Interchange Fee, mas
pode se utilizar do ganho de escala do Credenciador (Cielo e Redecard) além da
economia com o Fee de bandeira. Por outro lado, deve fazer os mesmos
investimentos em sistemas, processamento, marca etc. que a Visa e MasterCard
fazem, mas em uma escala doméstica.

Se realmente acreditamos que as bandeiras internacionais são responsáveis pelos
juros cobrados nos cartões de crédito, pela pobre relação comercial entre banco e
cliente, ou pelos custos que o lojista incorre, é porque não conhecemos essa indústria
e isto não nos cabe culpa. Embora tenham surgido no final da década de 60,
MasterCard e Visa, eram associações que pertenciam aos bancos até 2007/08
(quando foram vendidas em IPO’s). Nunca houve interesse ou necessidade de revelar
ao público essas informações, principalmente no Brasil. Na década de 80 inicio-se
uma séria de discussões sobre Interchange Fee, mas somente no mundo acadêmico.
Diversos processos envolvendo diversas bandeiras foram julgados nos USA nas
décadas de 80 e 90 e, mesmo assim pouco se conhecia sobre esse mercado.

Mais recentemente, os bancos centrais de diversos países, incluindo o Brasil,
passaram a se interessar pelo assunto gerando diversas intervenções (Argentina,
México, Brasil, etc.), muitas vezes desastradas (Holanda e Austrália), o que tornou a
discussão pública. Entretanto, com a abertura de capital da MasterCard (2006),
Redecard (2007), Visa (2008) e VisaNet (2009), a indústria de meios eletrônicos de
pagamentos passou a ser discutida e questionada por diversos participantes, diretos
ou indiretos desse setor.

Está mais do que na hora de entendermos esta indústria em detalhe e de nos
aprofundarmos nas questões e problemas relacionados. Afinal de contas, entre nos
brasileiros, perto de 25% de toda nossa despesa já é feitas através de um cartão de
pagamento. Ao final desta década, o mercado de cartões de pagamento deverá atingir
o triplo do tamanho que teve ao final da década passada, com uma penetração
próxima a 50% de todo consumo privado brasileiro.

Mais conteúdo relacionado

Destaque

PEPSICO Presentation to CAGNY Conference Feb 2024
PEPSICO Presentation to CAGNY Conference Feb 2024PEPSICO Presentation to CAGNY Conference Feb 2024
PEPSICO Presentation to CAGNY Conference Feb 2024Neil Kimberley
 
Content Methodology: A Best Practices Report (Webinar)
Content Methodology: A Best Practices Report (Webinar)Content Methodology: A Best Practices Report (Webinar)
Content Methodology: A Best Practices Report (Webinar)contently
 
How to Prepare For a Successful Job Search for 2024
How to Prepare For a Successful Job Search for 2024How to Prepare For a Successful Job Search for 2024
How to Prepare For a Successful Job Search for 2024Albert Qian
 
Social Media Marketing Trends 2024 // The Global Indie Insights
Social Media Marketing Trends 2024 // The Global Indie InsightsSocial Media Marketing Trends 2024 // The Global Indie Insights
Social Media Marketing Trends 2024 // The Global Indie InsightsKurio // The Social Media Age(ncy)
 
Trends In Paid Search: Navigating The Digital Landscape In 2024
Trends In Paid Search: Navigating The Digital Landscape In 2024Trends In Paid Search: Navigating The Digital Landscape In 2024
Trends In Paid Search: Navigating The Digital Landscape In 2024Search Engine Journal
 
5 Public speaking tips from TED - Visualized summary
5 Public speaking tips from TED - Visualized summary5 Public speaking tips from TED - Visualized summary
5 Public speaking tips from TED - Visualized summarySpeakerHub
 
ChatGPT and the Future of Work - Clark Boyd
ChatGPT and the Future of Work - Clark Boyd ChatGPT and the Future of Work - Clark Boyd
ChatGPT and the Future of Work - Clark Boyd Clark Boyd
 
Getting into the tech field. what next
Getting into the tech field. what next Getting into the tech field. what next
Getting into the tech field. what next Tessa Mero
 
Google's Just Not That Into You: Understanding Core Updates & Search Intent
Google's Just Not That Into You: Understanding Core Updates & Search IntentGoogle's Just Not That Into You: Understanding Core Updates & Search Intent
Google's Just Not That Into You: Understanding Core Updates & Search IntentLily Ray
 
Time Management & Productivity - Best Practices
Time Management & Productivity -  Best PracticesTime Management & Productivity -  Best Practices
Time Management & Productivity - Best PracticesVit Horky
 
The six step guide to practical project management
The six step guide to practical project managementThe six step guide to practical project management
The six step guide to practical project managementMindGenius
 
Beginners Guide to TikTok for Search - Rachel Pearson - We are Tilt __ Bright...
Beginners Guide to TikTok for Search - Rachel Pearson - We are Tilt __ Bright...Beginners Guide to TikTok for Search - Rachel Pearson - We are Tilt __ Bright...
Beginners Guide to TikTok for Search - Rachel Pearson - We are Tilt __ Bright...RachelPearson36
 
Unlocking the Power of ChatGPT and AI in Testing - A Real-World Look, present...
Unlocking the Power of ChatGPT and AI in Testing - A Real-World Look, present...Unlocking the Power of ChatGPT and AI in Testing - A Real-World Look, present...
Unlocking the Power of ChatGPT and AI in Testing - A Real-World Look, present...Applitools
 
12 Ways to Increase Your Influence at Work
12 Ways to Increase Your Influence at Work12 Ways to Increase Your Influence at Work
12 Ways to Increase Your Influence at WorkGetSmarter
 
Ride the Storm: Navigating Through Unstable Periods / Katerina Rudko (Belka G...
Ride the Storm: Navigating Through Unstable Periods / Katerina Rudko (Belka G...Ride the Storm: Navigating Through Unstable Periods / Katerina Rudko (Belka G...
Ride the Storm: Navigating Through Unstable Periods / Katerina Rudko (Belka G...DevGAMM Conference
 
Barbie - Brand Strategy Presentation
Barbie - Brand Strategy PresentationBarbie - Brand Strategy Presentation
Barbie - Brand Strategy PresentationErica Santiago
 

Destaque (20)

PEPSICO Presentation to CAGNY Conference Feb 2024
PEPSICO Presentation to CAGNY Conference Feb 2024PEPSICO Presentation to CAGNY Conference Feb 2024
PEPSICO Presentation to CAGNY Conference Feb 2024
 
Content Methodology: A Best Practices Report (Webinar)
Content Methodology: A Best Practices Report (Webinar)Content Methodology: A Best Practices Report (Webinar)
Content Methodology: A Best Practices Report (Webinar)
 
How to Prepare For a Successful Job Search for 2024
How to Prepare For a Successful Job Search for 2024How to Prepare For a Successful Job Search for 2024
How to Prepare For a Successful Job Search for 2024
 
Social Media Marketing Trends 2024 // The Global Indie Insights
Social Media Marketing Trends 2024 // The Global Indie InsightsSocial Media Marketing Trends 2024 // The Global Indie Insights
Social Media Marketing Trends 2024 // The Global Indie Insights
 
Trends In Paid Search: Navigating The Digital Landscape In 2024
Trends In Paid Search: Navigating The Digital Landscape In 2024Trends In Paid Search: Navigating The Digital Landscape In 2024
Trends In Paid Search: Navigating The Digital Landscape In 2024
 
5 Public speaking tips from TED - Visualized summary
5 Public speaking tips from TED - Visualized summary5 Public speaking tips from TED - Visualized summary
5 Public speaking tips from TED - Visualized summary
 
ChatGPT and the Future of Work - Clark Boyd
ChatGPT and the Future of Work - Clark Boyd ChatGPT and the Future of Work - Clark Boyd
ChatGPT and the Future of Work - Clark Boyd
 
Getting into the tech field. what next
Getting into the tech field. what next Getting into the tech field. what next
Getting into the tech field. what next
 
Google's Just Not That Into You: Understanding Core Updates & Search Intent
Google's Just Not That Into You: Understanding Core Updates & Search IntentGoogle's Just Not That Into You: Understanding Core Updates & Search Intent
Google's Just Not That Into You: Understanding Core Updates & Search Intent
 
How to have difficult conversations
How to have difficult conversations How to have difficult conversations
How to have difficult conversations
 
Introduction to Data Science
Introduction to Data ScienceIntroduction to Data Science
Introduction to Data Science
 
Time Management & Productivity - Best Practices
Time Management & Productivity -  Best PracticesTime Management & Productivity -  Best Practices
Time Management & Productivity - Best Practices
 
The six step guide to practical project management
The six step guide to practical project managementThe six step guide to practical project management
The six step guide to practical project management
 
Beginners Guide to TikTok for Search - Rachel Pearson - We are Tilt __ Bright...
Beginners Guide to TikTok for Search - Rachel Pearson - We are Tilt __ Bright...Beginners Guide to TikTok for Search - Rachel Pearson - We are Tilt __ Bright...
Beginners Guide to TikTok for Search - Rachel Pearson - We are Tilt __ Bright...
 
Unlocking the Power of ChatGPT and AI in Testing - A Real-World Look, present...
Unlocking the Power of ChatGPT and AI in Testing - A Real-World Look, present...Unlocking the Power of ChatGPT and AI in Testing - A Real-World Look, present...
Unlocking the Power of ChatGPT and AI in Testing - A Real-World Look, present...
 
12 Ways to Increase Your Influence at Work
12 Ways to Increase Your Influence at Work12 Ways to Increase Your Influence at Work
12 Ways to Increase Your Influence at Work
 
ChatGPT webinar slides
ChatGPT webinar slidesChatGPT webinar slides
ChatGPT webinar slides
 
More than Just Lines on a Map: Best Practices for U.S Bike Routes
More than Just Lines on a Map: Best Practices for U.S Bike RoutesMore than Just Lines on a Map: Best Practices for U.S Bike Routes
More than Just Lines on a Map: Best Practices for U.S Bike Routes
 
Ride the Storm: Navigating Through Unstable Periods / Katerina Rudko (Belka G...
Ride the Storm: Navigating Through Unstable Periods / Katerina Rudko (Belka G...Ride the Storm: Navigating Through Unstable Periods / Katerina Rudko (Belka G...
Ride the Storm: Navigating Through Unstable Periods / Katerina Rudko (Belka G...
 
Barbie - Brand Strategy Presentation
Barbie - Brand Strategy PresentationBarbie - Brand Strategy Presentation
Barbie - Brand Strategy Presentation
 

Porque criar uma bandeira de pagamento brasileira

  • 1. Porque criar uma bandeira de pagamento Brasileira? O jornal O Estado de São Paulo, publicou hoje (28/04/10) uma matéria sob o título “Criação de bandeira local era ''inevitável'', dizem especialistas” http://tinyurl.com/2emc6kk Na qual descreve e comenta a iniciativa dos bancos Bradesco e Banco do Brasil na recriação da bandeira de cartão de crédito “ELO”. O cartão ELO foi criado por um pool de 23 bancos em 1971 e resistiu até 1977 quando cada banco decidiu emitir seu próprio cartão utilizando outras bandeiras. Não posso concordar com o termo “inevitável”, isto me parece uma análise simplista ou superficial. Acredito sim que existam algumas razões para a concepção de novas bandeiras, entretanto uma nova bandeira de abrangência nacional é muito diferente de uma regional. No Brasil existem diversos exemplos de bandeiras regionais, desconhecidas do público do sudeste. Analisando esta questão, abaixo descrevemos algumas das razões para a criação de uma bandeira de cartão de pagamento nacional: 1) Baixa penetração bancária, especialmente na baixa renda, representa uma grande oportunidade para os bancos. Um cartão de pagamentos nacional pode representar um baixo custo de aquisição de novas contas, principalmente quando combinado com o cartão de loja (Private Label); 2) Uma bandeira nacional que atenda a esta estratégia tem necessariamente que representar baixos custos para o banco; 3) Os bancos não apreciam os custos das bandeiras internacionais, como Visa e MasterCard. Principalmente quando a grande maioria de brasileiros só o utilizam no Brasil; 4) Qualquer bandeira de cartão de pagamento para ter sucesso necessita ser aceito na maioria dos estabelecimentos comerciais. A Cielo e Redecard podem prover uma grande rede de aceitação, a partir da quebra de exclusividade entre Cielo e Visa (1º. de Julho de 2010). Entretanto, algumas considerações: O valor cobrado dos lojistas em uma transação com cartão de crédito é dividido entre o Banco emissor do Cartão, a rede de Credenciamento (Acquirer) e a Bandeira do cartão. Em média, entre 44% a 46% do valor ficam com o Credenciador (Redecard, Cielo, etc.), O banco emissor recebe outros 44% a 46% (Interchange Fee) e, a Bandeira (Visa e MasterCard) recebe entre 8% a 12% (Fee de bandeira). Não acredito que o banco abriria mão de suas receitas com Interchange Fee, mas pode se utilizar do ganho de escala do Credenciador (Cielo e Redecard) além da economia com o Fee de bandeira. Por outro lado, deve fazer os mesmos investimentos em sistemas, processamento, marca etc. que a Visa e MasterCard fazem, mas em uma escala doméstica. Se realmente acreditamos que as bandeiras internacionais são responsáveis pelos juros cobrados nos cartões de crédito, pela pobre relação comercial entre banco e
  • 2. cliente, ou pelos custos que o lojista incorre, é porque não conhecemos essa indústria e isto não nos cabe culpa. Embora tenham surgido no final da década de 60, MasterCard e Visa, eram associações que pertenciam aos bancos até 2007/08 (quando foram vendidas em IPO’s). Nunca houve interesse ou necessidade de revelar ao público essas informações, principalmente no Brasil. Na década de 80 inicio-se uma séria de discussões sobre Interchange Fee, mas somente no mundo acadêmico. Diversos processos envolvendo diversas bandeiras foram julgados nos USA nas décadas de 80 e 90 e, mesmo assim pouco se conhecia sobre esse mercado. Mais recentemente, os bancos centrais de diversos países, incluindo o Brasil, passaram a se interessar pelo assunto gerando diversas intervenções (Argentina, México, Brasil, etc.), muitas vezes desastradas (Holanda e Austrália), o que tornou a discussão pública. Entretanto, com a abertura de capital da MasterCard (2006), Redecard (2007), Visa (2008) e VisaNet (2009), a indústria de meios eletrônicos de pagamentos passou a ser discutida e questionada por diversos participantes, diretos ou indiretos desse setor. Está mais do que na hora de entendermos esta indústria em detalhe e de nos aprofundarmos nas questões e problemas relacionados. Afinal de contas, entre nos brasileiros, perto de 25% de toda nossa despesa já é feitas através de um cartão de pagamento. Ao final desta década, o mercado de cartões de pagamento deverá atingir o triplo do tamanho que teve ao final da década passada, com uma penetração próxima a 50% de todo consumo privado brasileiro.