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A ESPIRAL DO SILÊNCIO: A REPERCUSSÃO DE
                  “TEMPOS MODERNOS” NA REVISTA DO GLOBO (1936)

                                                                                Eduardo de Souza Soares1
                                                                              dudahistoria@yahoo.com.br


Resumo
A proposta central deste artigo é, através de alguns pressupostos da Teoria da Espiral do Silêncio,
compreender o distanciamento que a Revista do Globo impôs ao não comentar o grande
lançamento do cinema mundial em 1936, o filme Tempos Moderno , de Charles Chaplin, que fez
parar Porto Alegre durante sua exibição.
Palavras-chave: Tempos Modernos. Charles Chaplin. Anticomunismo.

1 Introdução
       A espiral do silêncio é uma teoria baseada na possibilidade de os agentes sociais poderem
ser isolados de seus grupos de convívio se expressarem, em publico, opiniões divergentes
daquelas consideradas como dominantes pelo grupo.
       É sob alguns pressupostos dessa perspectiva que se propõe neste artigo buscar
compreender o distanciamento imposto pela Revista do Globo ao deixar de comentar o grande
lançamento do cinema mundial de 1936, o filme Tempos Modernos, de Charles Chaplin, cuja
exibição fez parar Porto Alegre.

2 A Teoria da Espiral do Silêncio
        Os primeiros estudos sobre a Espiral do Silêncio começaram na década de 1960, mais
especificamente a partir das pesquisas realizadas pela estudiosa alemã Elizabeth Noelle-
Neumann, que, durante as campanhas eleitorais realizadas na Alemanha entre 1965 e 1972,
começou a perceber a mudança de opinião repentina, por parte dos eleitores, nos últimos
instantes do processo eleitoral. De acordo com Estudos realizados pela pesquisadora à época, essa
mudança ocorria em função da tendência demonstrada pelos agentes sociais de aproximarem-se
mais das opiniões que consideravam dominantes:
                           A idéia central desta teoria situa-se na possibilidade de que os agentes sociais
                           possam ser isolados de seus grupos de convívio caso expressem publicamente
                           opiniões diferentes daquelas que o grupo considere como opiniões dominantes.
                           Isso significa dizer que o isolamento das pessoas, de afastamento do convívio
                           social, acaba sendo a mola mestra que aciona o mecanismo do fenômeno da
                           opinião pública, já que os agentes sociais têm aguda percepção do clima de
                           opinião. E é esta alternância cíclica e progressiva que Noelle-Neumann chamou
                           de Espiral do Silêncio (LAGE, 1998, p. 16).
       A tendência das pessoas em acompanhar a opinião da maioria pode ser tanto devido a um
processo de aprendizagem como também em função do medo do isolamento, já que a sociedade
exige uma rápida conformidade em torno das questões que estão em mudança. Esta exigência se
dá com o objetivo de manter um mínimo de unidade, em grau suficiente para garantir a
integração. De alguma forma essa é a função dos meios de comunicação dentro da Teoria da


1
 Mestrando em História pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, bolsista do CNPq, orientando
da profª. Drª Claudia Musa Fay (cmusafay@pucrs.br).

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Espiral do Silêncio, exercendo funções que vão além das presumíveis como educar, informar e
entreter.
        Noelle-Neumann explica que os efeitos da mídia costumam ser cumulativos, uma vez que
as pessoas, a partir de mensagens veiculadas pela imprensa, discutem determinados assuntos
entre si. A autora também alerta para o fato de que essa influência dos meios é
predominantemente inconsciente, já que os agentes sociais acabam mesclando suas experiências
pessoais com aquelas apresentadas pelos meios de comunicação. Assim sendo, as pessoas passam
a exercer sobre o texto a sua interpretação, construindo um conhecimento enciclopédico sobre
determinado assunto:
                        A pesquisadora passou a intuir que a influência da mídia sobre o receptor não
                        seria, portanto, assim tão tênue. Pelo contrário, o efeito de acumulação,
                        levantado pela hipótese de agenda setting, poderia ter outros resultados: era
                        bem mais forte a influência da mídia sobre o público do que se poderia
                        imaginar [...]. Esta influência, ao contrário do que se dissera nas últimas
                        décadas, não se limitava apenas ao sobre o quê pensar ou opinar, como
                        afirmava a hipótese de agenda, mas também atingiria o quê pensar ou dizer
                        (HOHLFELDT, 2002, p. 222).
        A Espiral do Silêncio trata de um fenômeno que atribui aos meios de comunicação uma
prerrogativa decisiva de construção e imposição da opinião que se deve ter sobre os fatos. Logo,
acaba impondo, ainda que indiretamente, a construção e a opinião que se deva ter sobre todo e
qualquer assunto, o que ocorre de maneira progressiva. Essa influência, entretanto, tem o seu
limite e pode sempre existir um abismo considerável entre a consonância da mídia e a atitude da
população. Nesse aspecto, nosso exemplo é bastante significativo, ao passo que um evento
mundial como o lançamento de Tempos Modernos foi simplesmente “esquecido” pela Revista do
Globo.

3 O anticomunismo em Tempos Modernos
        Tempos Modernos foi recebido em 1936 com certas reservas nos Estados Unidos. O filme
apresenta uma sátira à sociedade industrial e ao maquinismo que faz o homem tornar-se simples
ferramenta do processo produtivo, perdendo toda a dimensão do humano. Alguns setores da
sociedade levantaram-se contra Charles Chaplin, acusando-o de simpatizante do comunismo.
Como fonte de inspiração para seu novo filme, a crise de 1929 fora um elemento importante em
sua filmografia, moldando uma mudança significativa em sua carreira.
                        Na véspera de estourar a Bolsa, jantei com Irving Berlin, que estava cheio de
                        otimismo quanto ao mercado de valores. Disse-me que uma garçonete daquele
                        mesmo restaurante ganhara quarenta mil dólares em menos de um ano,
                        dobrando seus investimentos. Ele próprio tinha aplicado vários milhões de
                        dólares em ações, com lucro de mais de um milhão. Perguntou-me se eu
                        também estava jogando na bolsa. Respondi-lhe que não podia acreditar em
                        títulos quando havia quatorze milhões de desempregados (CHAPLIN, 2005, p.
                        380).
       A imprensa norte-americana em nenhum momento poupou o astro de críticas as mais
diversas. Entre tantas, a de que o filme seria um retrocesso na história do cinema, contrastando
com os estúdios sonorizados de Hollywood como o último dos filmes mudos, empregando
métodos que já haviam sido abandonados. Todos os estúdios das grandes firmas eram enormes
construções, verdadeiras usinas de produções. Porém, Chaplin continuava instalado há quinze
anos num grupo de vivendas, construções tipicamente britânicas. Os jornalistas americanos as
consideravam insuficientes e velhas.

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A distração constante do personagem de Carlitos perturba a ordem da cadeia de produção,
em que ele tem a tarefa mecânica de apertar eternamente o mesmo parafuso. Sua ineficácia o
condena a uma casa de loucos, de onde sai curado, mas desempregado. O desemprego é um tema
constante do filme. Andando sem rumo pelas ruas, apanha quase que instintivamente um pedaço
de pano vermelho caído de um caminhão. Atrás dele, em um brilhante jogo de cena, aparece uma
manifestação, onde a polícia imediatamente o acusa de ser um dos agitadores. Preso, constata que
as condições a que agora estava submetido eram muito melhores comparadas àquelas dos tempos
de operário:
                        Panfleto contra a sociedade industrial, o filme castiga as suas contradições.
                        Desde a máquina que desumaniza o operário ao limite de enlouquecê-lo à fome
                        que aliena os desempregados em assaltantes de rua. Há uma greve. A polícia
                        intervém. Um trabalhador é morto. E Carlitos, que não participava do
                        movimento, vai preso por ter apanhado na rua a bandeira dos grevistas
                        (SILVEIRA, 1970, p. 42).
       A assinatura de Charles Chaplin garantiu ao filme ampla repercussão no mundo inteiro,
não sendo diferente em Porto Alegre. A cidade recebeu o filme com grande entusiasmo, como
atestam os cartazes veiculados na imprensa. As salas dos cinemas Imperial e Apollo exibiram o
filme durante algumas semanas, sempre com grande sucesso. A película de Carlitos era descrita
aos porto-alegrenses como uma das melhores de todos os tempos, o grande lançamento de 1936.

4 O silêncio da Revista do Globo
        As quatro primeiras décadas do século XX marcam o período de transição para a
formação do jornalismo informativo moderno, consolidado a partir de 1930. Notícias e
publicidade são dois aspectos básicos dessa fase. É nesse contexto de modificações do regime
jornalístico que surge a Revista do Globo, em 1929. Um periódico perfeitamente inserido dentro
da lógica capitalista, voltado para o mercado, utilizando-se fartamente de publicidade para atingir
seus fins. Em seu nascimento, contou com a força da Livraria do Globo, empresa já consolidada
no Estado desde 1883, e com o prestígio de importantes nomes da intelectualidade e da vida
política gaúcha, como Getúlio Vargas e Oswaldo Aranha:
                        Consta que foi dentro da própria Livraria do Globo, no ano de 1928, em uma
                        das tantas reuniões de sábado entre os homens de letras e da política, que
                        Getúlio Vargas, então presidente do Estado do Rio Grande do Sul,
                        acompanhado pelo seu secretário do Interior e Justiça, Oswaldo Aranha, teria
                        sugerido a José Bertaso a publicação de uma revista moderna, digna de
                        representar a Capital do Estado (DALMÁZ, 2002, p. 33).
       Charles Spencer Chaplin, o homem mais famoso do mundo, acabava de lançar Tempos
Modernos, o filme mais comentado de todos os tempos até aquele instante, e a Revista do Globo,
que em 1936 já se mostrava como uma publicação interessada no cinema norte-americano, não
escreve uma linha sequer sobre a película. O que teria acontecido? Nossa hipótese sugere que
uma das causas deste silêncio teria sido o sentimento anticomunista, fortemente enraizado na
população desde as primeiras lutas operárias, mas principalmente após a frustrada tentativa de
golpe por parte dos comunistas em 1935, em que destacamos a reação da elite política nacional,
especialmente Getúlio Vargas, por sua influência no periódico:
                        O talento de Vargas como grande manipulador apareceu verdadeiramente após
                        a insurreição, não antes. Ele soube explorar com maestria, em proveito do
                        fortalecimento do governo, o pânico gerado pelo movimento comunista. [...] O
                        levante de 1935, não há dúvida, foi um presente para o Presidente gaúcho. Ele
                        contribuiu para reverter a situação de instabilidade e fragilidade política

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vivenciada pelo governo. Vargas saiu da crise extremamente fortalecido,
                        enaltecido como o chefe de governo que conseguiu derrotar a “revolução”
                        comunista (MOTTA, 2002, p. 196).
       O episódio de 1935 teve sérias conseqüências, pois abriu caminho para amplas medidas
repressivas e para a escalada autoritária. O fantasma do comunismo internacional ganhou
enormes proporções, tanto mais porque Moscou havia enviado ao Brasil alguns quadros
dirigentes estrangeiros para ajudar nos preparativos da insurreição. Durante o ano de 1936, o
Congresso aprovou todas as medidas excepcionais encaminhadas pelo poder executivo. Nesse
mesmo ano, a polícia invadiu o Congresso e prendeu cinco parlamentares, que tinham apoiado a
ANL ou simplesmente demonstrado simpatia por ela. O Congresso aceitou a justificativa para as
prisões e autorizou o processo contra os presos:
                        A criação de um órgão judiciário específico, estritamente subordinado ao
                        governo, era uma medida necessária para garantir a punição dos presos, sem
                        grande consideração pelos princípios jurídicos vigentes. Com esse objetivo, o
                        Congresso aprovou uma lei que instituía o Tribunal de Segurança Nacional, que
                        começou a funcionar em fins de outubro de 1936. A princípio, esse tribunal se
                        destinava apenas a julgar os comprometidos na insurreição de 1935, mas
                        acabou se transformando em um órgão permanente, que existiu durante todo o
                        Estado Novo, instituído em 1937 (FAUSTO, 2003, p. 362).
         Pensar o anticomunismo no Brasil certamente esgotaria em muito os limites desse breve
artigo. Uma análise mais aprofundada exigiria uma pesquisa de maior fôlego, partindo das
primeiras lutas operárias, ainda motivadas pelo movimento anarquista, passando pela constituição
de um partido comunista brasileiro e todas as suas intervenções na vida política nacional, trabalho
para uma ou mais dissertações e teses. Mesmo assim, consciente de que estamos fazendo um
recorte bastante limitado, acreditamos que o ano de 1936 representou um marco nessa luta entre
opostos. A frustrada tentativa dos comunistas e o conseqüente posicionamento das autoridades do
governo levaram o conflito a uma intensificação sem precedentes.
         A Revista do Globo, talvez motivada por seus estreitos laços com grandes personalidades
da vida política nacional entre eles o presidente Getúlio Vargas, homem que representa ao
máximo o novo projeto de país, que já às vésperas do Estado Novo delineava suas metas de
modernização, influenciando boa parte da intelectualidade regional, marcada pela falta de
manifestações claras de apoio ou de discordância em relação aos detentores do poder, adotando
uma postura pouco participativa em questões políticas, conforme afirma René Gertz (2005, p.
115) não poderia deixar de refletir este momento, demonstrando que era importante “varrer” da
sociedade toda e qualquer influência subversiva.
         Essa é uma imagem bastante significativa não só do pensamento da época como também
do posicionamento do periódico. Em um artigo de título bastante sugestivo, denominado Os
Inventos da Miséria (1936), o leitor é conduzido a acreditar que a Revolução Russa, liderada por
Lênin, teria levado “bons homens” a uma situação de miséria absoluta, sendo obrigados a
recorrer aos intentos mais inventivos para sobreviver. Nesse caso, um antigo proprietário de
cavalos teria sido obrigado a domesticar baratas em uma espécie de circo, para desta atividade
obter o seu sustento. A Rússia era descrita como um paraíso, palavra estrategicamente posta em
itálico, deixando clara a ironia do que estava por vir.
         Outro bom exemplo, nesta mesma linha de argumentos, encontramos no artigo
denominado Da Revolução Francesa à Revolução Russa (1936). Em atitude absolutamente
desrespeitosa, Lênin é descrito como um “homenzinho” receptor e emissor de ondas de violência
inspiradas por Marx, líder de uma revolução brutal que despreza as massas e crê nas minorias. O
leitor é novamente conduzido a pensar que, assim como em qualquer revolução o que explica o
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paralelo com o caso francês os direitos dos cidadãos são boicotados, mas, especialmente no caso
russo, uma ideologia perversa e subversiva corrompe os valores democráticos, não respeitando a
vontade da maioria.
        Relembrando o que já havíamos exposto sobre a teoria da Espiral do Silêncio, a Revista
do Globo está em perfeita sintonia com os acontecimentos de 1936, participando ativamente da
tarefa de convencer a opinião pública quanto aos “perigos” representados pelo comunismo. De
acordo com este instrumental teórico, as pessoas, a partir deste tipo de mensagem veiculada pela
imprensa, passariam a discutir o assunto de acordo com a ótica construída, uma alienação da
capacidade de opinar, demonstrando uma clara influência deste meio de comunicação, em que o
periódico assume uma prerrogativa decisiva de construção e imposição da opinião que se deveria
ter sobre determinados fatos.
        Retomando a ilustração de Amanda Lucia, intitulada Charlie Chaplin em seu novo filme,
única referência ao filme Tempos Modernos encontrada na Revista do Globo, mesmo que nossa
intenção não seja a de fazer uma análise detalhada da imagem, não é difícil perceber que ali estão
presentes todos os ícones dessa ideologia subversiva a ser combatida. O “vagabundo”, tipo que
seria execrado pelo Estado Novo por não conseguir representar os ideais de um país que anseia à
modernização resultante do trabalho; a engrenagem associada ao operário, que não cumpre com
eficiência suas tarefas interrompendo o processo produtivo, analogia destrutiva aos ideais de
industrialização; e, por fim, o mais grave de todos os “pecados” de Chaplin: o homem que
tremula a bandeira vermelha, ícone maior do comunismo internacional e muito “subversivo” para
os padrões brasileiros.

5 Conclusão
        Retomando tudo que foi dito, procurando entender os motivos que levaram a Revista do
Globo a não repercutir o filme Tempos Modernos, apresentamos a teoria da Espiral do Silêncio
de Elizabeth Noelle-Neumann, demonstrando a importância da abordagem dada pelos meios de
comunicação sobre determinado fato. Essa teoria baseia-se principalmente na idéia de existência
de uma opinião dominante que provocaria um clima de opinião. e este seria espelhado para o
público através da mídia. Sua base está no pressuposto de que a sociedade ameaça com
isolamento e exclusão aqueles que se desviam do consenso.
        Entendemos como opinião dominante em 1936, no que diz respeito ao Brasil, todo um
Estado que estava organizando-se em torno de Getúlio Vargas, uma peça que centralizava todo o
anseio de uma nova elite política do país, que, em passos largos, se constituía como resultado de
um projeto de modernização e industrialização. O traço comum entre essa economia industrial
ainda adormecida e a já consolidada estrutura dos Estados Unidos era justamente um inimigo
comum, o comunismo internacional, que, desde as primeiras lutas operárias no início do século
XX, assustava a elite conservadora nacional.
        O forte e agressivo sentimento anticomunista desse período nos ajuda a entender o
posicionamento da Revista do Globo. Ainda mais quando ficam expostos seus estreitos laços com
a elite política e intelectual do nosso Estado, especialmente Getúlio Vargas, que, desde a
idealização do projeto de uma revista de grande circulação, já se mostrava um entusiasmado
colaborador. Feitas essas considerações, não nos parece estranho o silêncio da revista em relação
ao filme. Tempos Modernos poderia “subverter” e conduzir a população a um posicionamento
crítico quanto a determinados padrões estabelecidos pela sociedade.
        Era preciso “proteger” a frágil opinião pública contra as “ameaças” que o comunismo
internacional e seus “ícones” , como Charles Chaplin, poderiam representar. Acreditamos que a
preocupação em não comentar o filme fazia parte de uma estratégia, na qual as pessoas
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precisavam acreditar que sua opinião fazia parte de um consenso mesmo sem perceber que
estavam sendo orquestradas por uma elite abrindo assim a possibilidade de se expressarem
publicamente, transmitindo esse ideário manipulado que passavam a adotar como seu. É
exatamente esta a perspectiva adotada pela teoria da Espiral do Silêncio: a existência de uma
opinião dominante que, espelhada na mídia, isola aqueles que dela discordam. Nosso estudo é só
mais um exemplo dessa prática tão comum.

THEORY OF THE SPIRAL OF SILENCE: “MODERN TIMES” IN GLOBO
MAGAZINE
Abstract
The principal proposal of this article is, trough some presupposed of the theory of the Spiral of
Silence, understand the separating that Globo Magazine impose when it doesn’t comment the
largest casting of the worldwide movie in 1936, the film Modern Times of Charlie Chaplin, that
makes Porto Alegre to stop during its exhibition.
Keywords: Modern Times. Charlie Chaplin. Anticommunism.

Referências
BARTHES, Roland. Mitologias. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1993.
CHAPLIN, Charles. Minha vida. Rio de Janeiro: José Olympio, 2005.
CLARET, Martin. Chaplin: vida e pensamentos. São Paulo: Martin Claret, 2002.
DALMÁZ, Mateus. A imagem do Terceiro Reich na Revista do Globo (1933-1945). Porto
Alegre: EDIPUCRS, 2002.
DA REVOLUÇÃO Francesa à Revolução Russa. Revista do Globo, Porto Alegre, p. 22, 10 out.
1936.
FAUSTO, Boris. História do Brasil. São Paulo: EDUSP, 2003.
FERRO, Marc. Cinema e História. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
FLORES, Moacyr. Cinema: imagens da história. Porto Alegre: Evangraf, 2002.
GERTZ, René. O Estado Novo no Rio Grande do Sul. Passo Fundo: UPF, 2005.
HOHLFELDT, Antonio. Teorias da comunicação. Petrópolis: Vozes, 2002.
KOUTZII, Jacob. A tela branca. Porto Alegre: Unidade Ed., 1997.
LAGE, Louise Costa. Do silêncio à fala: O caminho da mensagem jornalística. 1998. Dissertação
(Mestrado em Comunicação) – Faculdade de Comunicação, Pontifícia Universidade Católica do
Rio Grande do Sul, Porto Alegre.
LEPROHON, Pierre. Charles Chaplin: o seu destino e sua obra. Lisboa: Livros do Brasil, 1936.
MORIN, Edgar. As estrelas: mito e sedução no cinema. Rio de Janeiro: José Olympio, 1989.
MOTTA, Rodrigo Patto. Em guarda contra o perigo vermelho. São Paulo: Perspectiva, 2002.
OS INVENTOS da miséria. Revista do Globo, Porto Alegre, p. 49, 10 out 1936.
SCHILLING, Voltaire. América: história e contradições do império. Porto Alegre: LPM, 2004.
SILVEIRA, Walter. Imagem e roteiro de Charles Chaplin. Salvador: Mensageiro da Fé, 1970.




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A espiral do silêncio

  • 1. A ESPIRAL DO SILÊNCIO: A REPERCUSSÃO DE “TEMPOS MODERNOS” NA REVISTA DO GLOBO (1936) Eduardo de Souza Soares1 dudahistoria@yahoo.com.br Resumo A proposta central deste artigo é, através de alguns pressupostos da Teoria da Espiral do Silêncio, compreender o distanciamento que a Revista do Globo impôs ao não comentar o grande lançamento do cinema mundial em 1936, o filme Tempos Moderno , de Charles Chaplin, que fez parar Porto Alegre durante sua exibição. Palavras-chave: Tempos Modernos. Charles Chaplin. Anticomunismo. 1 Introdução A espiral do silêncio é uma teoria baseada na possibilidade de os agentes sociais poderem ser isolados de seus grupos de convívio se expressarem, em publico, opiniões divergentes daquelas consideradas como dominantes pelo grupo. É sob alguns pressupostos dessa perspectiva que se propõe neste artigo buscar compreender o distanciamento imposto pela Revista do Globo ao deixar de comentar o grande lançamento do cinema mundial de 1936, o filme Tempos Modernos, de Charles Chaplin, cuja exibição fez parar Porto Alegre. 2 A Teoria da Espiral do Silêncio Os primeiros estudos sobre a Espiral do Silêncio começaram na década de 1960, mais especificamente a partir das pesquisas realizadas pela estudiosa alemã Elizabeth Noelle- Neumann, que, durante as campanhas eleitorais realizadas na Alemanha entre 1965 e 1972, começou a perceber a mudança de opinião repentina, por parte dos eleitores, nos últimos instantes do processo eleitoral. De acordo com Estudos realizados pela pesquisadora à época, essa mudança ocorria em função da tendência demonstrada pelos agentes sociais de aproximarem-se mais das opiniões que consideravam dominantes: A idéia central desta teoria situa-se na possibilidade de que os agentes sociais possam ser isolados de seus grupos de convívio caso expressem publicamente opiniões diferentes daquelas que o grupo considere como opiniões dominantes. Isso significa dizer que o isolamento das pessoas, de afastamento do convívio social, acaba sendo a mola mestra que aciona o mecanismo do fenômeno da opinião pública, já que os agentes sociais têm aguda percepção do clima de opinião. E é esta alternância cíclica e progressiva que Noelle-Neumann chamou de Espiral do Silêncio (LAGE, 1998, p. 16). A tendência das pessoas em acompanhar a opinião da maioria pode ser tanto devido a um processo de aprendizagem como também em função do medo do isolamento, já que a sociedade exige uma rápida conformidade em torno das questões que estão em mudança. Esta exigência se dá com o objetivo de manter um mínimo de unidade, em grau suficiente para garantir a integração. De alguma forma essa é a função dos meios de comunicação dentro da Teoria da 1 Mestrando em História pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, bolsista do CNPq, orientando da profª. Drª Claudia Musa Fay (cmusafay@pucrs.br). Cadernos FAPA - N. Especial VI Fórum FAPA – www.fapa.com.br/cadernosfapa 92
  • 2. Espiral do Silêncio, exercendo funções que vão além das presumíveis como educar, informar e entreter. Noelle-Neumann explica que os efeitos da mídia costumam ser cumulativos, uma vez que as pessoas, a partir de mensagens veiculadas pela imprensa, discutem determinados assuntos entre si. A autora também alerta para o fato de que essa influência dos meios é predominantemente inconsciente, já que os agentes sociais acabam mesclando suas experiências pessoais com aquelas apresentadas pelos meios de comunicação. Assim sendo, as pessoas passam a exercer sobre o texto a sua interpretação, construindo um conhecimento enciclopédico sobre determinado assunto: A pesquisadora passou a intuir que a influência da mídia sobre o receptor não seria, portanto, assim tão tênue. Pelo contrário, o efeito de acumulação, levantado pela hipótese de agenda setting, poderia ter outros resultados: era bem mais forte a influência da mídia sobre o público do que se poderia imaginar [...]. Esta influência, ao contrário do que se dissera nas últimas décadas, não se limitava apenas ao sobre o quê pensar ou opinar, como afirmava a hipótese de agenda, mas também atingiria o quê pensar ou dizer (HOHLFELDT, 2002, p. 222). A Espiral do Silêncio trata de um fenômeno que atribui aos meios de comunicação uma prerrogativa decisiva de construção e imposição da opinião que se deve ter sobre os fatos. Logo, acaba impondo, ainda que indiretamente, a construção e a opinião que se deva ter sobre todo e qualquer assunto, o que ocorre de maneira progressiva. Essa influência, entretanto, tem o seu limite e pode sempre existir um abismo considerável entre a consonância da mídia e a atitude da população. Nesse aspecto, nosso exemplo é bastante significativo, ao passo que um evento mundial como o lançamento de Tempos Modernos foi simplesmente “esquecido” pela Revista do Globo. 3 O anticomunismo em Tempos Modernos Tempos Modernos foi recebido em 1936 com certas reservas nos Estados Unidos. O filme apresenta uma sátira à sociedade industrial e ao maquinismo que faz o homem tornar-se simples ferramenta do processo produtivo, perdendo toda a dimensão do humano. Alguns setores da sociedade levantaram-se contra Charles Chaplin, acusando-o de simpatizante do comunismo. Como fonte de inspiração para seu novo filme, a crise de 1929 fora um elemento importante em sua filmografia, moldando uma mudança significativa em sua carreira. Na véspera de estourar a Bolsa, jantei com Irving Berlin, que estava cheio de otimismo quanto ao mercado de valores. Disse-me que uma garçonete daquele mesmo restaurante ganhara quarenta mil dólares em menos de um ano, dobrando seus investimentos. Ele próprio tinha aplicado vários milhões de dólares em ações, com lucro de mais de um milhão. Perguntou-me se eu também estava jogando na bolsa. Respondi-lhe que não podia acreditar em títulos quando havia quatorze milhões de desempregados (CHAPLIN, 2005, p. 380). A imprensa norte-americana em nenhum momento poupou o astro de críticas as mais diversas. Entre tantas, a de que o filme seria um retrocesso na história do cinema, contrastando com os estúdios sonorizados de Hollywood como o último dos filmes mudos, empregando métodos que já haviam sido abandonados. Todos os estúdios das grandes firmas eram enormes construções, verdadeiras usinas de produções. Porém, Chaplin continuava instalado há quinze anos num grupo de vivendas, construções tipicamente britânicas. Os jornalistas americanos as consideravam insuficientes e velhas. Cadernos FAPA - N. Especial VI Fórum FAPA – www.fapa.com.br/cadernosfapa 93
  • 3. A distração constante do personagem de Carlitos perturba a ordem da cadeia de produção, em que ele tem a tarefa mecânica de apertar eternamente o mesmo parafuso. Sua ineficácia o condena a uma casa de loucos, de onde sai curado, mas desempregado. O desemprego é um tema constante do filme. Andando sem rumo pelas ruas, apanha quase que instintivamente um pedaço de pano vermelho caído de um caminhão. Atrás dele, em um brilhante jogo de cena, aparece uma manifestação, onde a polícia imediatamente o acusa de ser um dos agitadores. Preso, constata que as condições a que agora estava submetido eram muito melhores comparadas àquelas dos tempos de operário: Panfleto contra a sociedade industrial, o filme castiga as suas contradições. Desde a máquina que desumaniza o operário ao limite de enlouquecê-lo à fome que aliena os desempregados em assaltantes de rua. Há uma greve. A polícia intervém. Um trabalhador é morto. E Carlitos, que não participava do movimento, vai preso por ter apanhado na rua a bandeira dos grevistas (SILVEIRA, 1970, p. 42). A assinatura de Charles Chaplin garantiu ao filme ampla repercussão no mundo inteiro, não sendo diferente em Porto Alegre. A cidade recebeu o filme com grande entusiasmo, como atestam os cartazes veiculados na imprensa. As salas dos cinemas Imperial e Apollo exibiram o filme durante algumas semanas, sempre com grande sucesso. A película de Carlitos era descrita aos porto-alegrenses como uma das melhores de todos os tempos, o grande lançamento de 1936. 4 O silêncio da Revista do Globo As quatro primeiras décadas do século XX marcam o período de transição para a formação do jornalismo informativo moderno, consolidado a partir de 1930. Notícias e publicidade são dois aspectos básicos dessa fase. É nesse contexto de modificações do regime jornalístico que surge a Revista do Globo, em 1929. Um periódico perfeitamente inserido dentro da lógica capitalista, voltado para o mercado, utilizando-se fartamente de publicidade para atingir seus fins. Em seu nascimento, contou com a força da Livraria do Globo, empresa já consolidada no Estado desde 1883, e com o prestígio de importantes nomes da intelectualidade e da vida política gaúcha, como Getúlio Vargas e Oswaldo Aranha: Consta que foi dentro da própria Livraria do Globo, no ano de 1928, em uma das tantas reuniões de sábado entre os homens de letras e da política, que Getúlio Vargas, então presidente do Estado do Rio Grande do Sul, acompanhado pelo seu secretário do Interior e Justiça, Oswaldo Aranha, teria sugerido a José Bertaso a publicação de uma revista moderna, digna de representar a Capital do Estado (DALMÁZ, 2002, p. 33). Charles Spencer Chaplin, o homem mais famoso do mundo, acabava de lançar Tempos Modernos, o filme mais comentado de todos os tempos até aquele instante, e a Revista do Globo, que em 1936 já se mostrava como uma publicação interessada no cinema norte-americano, não escreve uma linha sequer sobre a película. O que teria acontecido? Nossa hipótese sugere que uma das causas deste silêncio teria sido o sentimento anticomunista, fortemente enraizado na população desde as primeiras lutas operárias, mas principalmente após a frustrada tentativa de golpe por parte dos comunistas em 1935, em que destacamos a reação da elite política nacional, especialmente Getúlio Vargas, por sua influência no periódico: O talento de Vargas como grande manipulador apareceu verdadeiramente após a insurreição, não antes. Ele soube explorar com maestria, em proveito do fortalecimento do governo, o pânico gerado pelo movimento comunista. [...] O levante de 1935, não há dúvida, foi um presente para o Presidente gaúcho. Ele contribuiu para reverter a situação de instabilidade e fragilidade política Cadernos FAPA - N. Especial VI Fórum FAPA – www.fapa.com.br/cadernosfapa 94
  • 4. vivenciada pelo governo. Vargas saiu da crise extremamente fortalecido, enaltecido como o chefe de governo que conseguiu derrotar a “revolução” comunista (MOTTA, 2002, p. 196). O episódio de 1935 teve sérias conseqüências, pois abriu caminho para amplas medidas repressivas e para a escalada autoritária. O fantasma do comunismo internacional ganhou enormes proporções, tanto mais porque Moscou havia enviado ao Brasil alguns quadros dirigentes estrangeiros para ajudar nos preparativos da insurreição. Durante o ano de 1936, o Congresso aprovou todas as medidas excepcionais encaminhadas pelo poder executivo. Nesse mesmo ano, a polícia invadiu o Congresso e prendeu cinco parlamentares, que tinham apoiado a ANL ou simplesmente demonstrado simpatia por ela. O Congresso aceitou a justificativa para as prisões e autorizou o processo contra os presos: A criação de um órgão judiciário específico, estritamente subordinado ao governo, era uma medida necessária para garantir a punição dos presos, sem grande consideração pelos princípios jurídicos vigentes. Com esse objetivo, o Congresso aprovou uma lei que instituía o Tribunal de Segurança Nacional, que começou a funcionar em fins de outubro de 1936. A princípio, esse tribunal se destinava apenas a julgar os comprometidos na insurreição de 1935, mas acabou se transformando em um órgão permanente, que existiu durante todo o Estado Novo, instituído em 1937 (FAUSTO, 2003, p. 362). Pensar o anticomunismo no Brasil certamente esgotaria em muito os limites desse breve artigo. Uma análise mais aprofundada exigiria uma pesquisa de maior fôlego, partindo das primeiras lutas operárias, ainda motivadas pelo movimento anarquista, passando pela constituição de um partido comunista brasileiro e todas as suas intervenções na vida política nacional, trabalho para uma ou mais dissertações e teses. Mesmo assim, consciente de que estamos fazendo um recorte bastante limitado, acreditamos que o ano de 1936 representou um marco nessa luta entre opostos. A frustrada tentativa dos comunistas e o conseqüente posicionamento das autoridades do governo levaram o conflito a uma intensificação sem precedentes. A Revista do Globo, talvez motivada por seus estreitos laços com grandes personalidades da vida política nacional entre eles o presidente Getúlio Vargas, homem que representa ao máximo o novo projeto de país, que já às vésperas do Estado Novo delineava suas metas de modernização, influenciando boa parte da intelectualidade regional, marcada pela falta de manifestações claras de apoio ou de discordância em relação aos detentores do poder, adotando uma postura pouco participativa em questões políticas, conforme afirma René Gertz (2005, p. 115) não poderia deixar de refletir este momento, demonstrando que era importante “varrer” da sociedade toda e qualquer influência subversiva. Essa é uma imagem bastante significativa não só do pensamento da época como também do posicionamento do periódico. Em um artigo de título bastante sugestivo, denominado Os Inventos da Miséria (1936), o leitor é conduzido a acreditar que a Revolução Russa, liderada por Lênin, teria levado “bons homens” a uma situação de miséria absoluta, sendo obrigados a recorrer aos intentos mais inventivos para sobreviver. Nesse caso, um antigo proprietário de cavalos teria sido obrigado a domesticar baratas em uma espécie de circo, para desta atividade obter o seu sustento. A Rússia era descrita como um paraíso, palavra estrategicamente posta em itálico, deixando clara a ironia do que estava por vir. Outro bom exemplo, nesta mesma linha de argumentos, encontramos no artigo denominado Da Revolução Francesa à Revolução Russa (1936). Em atitude absolutamente desrespeitosa, Lênin é descrito como um “homenzinho” receptor e emissor de ondas de violência inspiradas por Marx, líder de uma revolução brutal que despreza as massas e crê nas minorias. O leitor é novamente conduzido a pensar que, assim como em qualquer revolução o que explica o Cadernos FAPA - N. Especial VI Fórum FAPA – www.fapa.com.br/cadernosfapa 95
  • 5. paralelo com o caso francês os direitos dos cidadãos são boicotados, mas, especialmente no caso russo, uma ideologia perversa e subversiva corrompe os valores democráticos, não respeitando a vontade da maioria. Relembrando o que já havíamos exposto sobre a teoria da Espiral do Silêncio, a Revista do Globo está em perfeita sintonia com os acontecimentos de 1936, participando ativamente da tarefa de convencer a opinião pública quanto aos “perigos” representados pelo comunismo. De acordo com este instrumental teórico, as pessoas, a partir deste tipo de mensagem veiculada pela imprensa, passariam a discutir o assunto de acordo com a ótica construída, uma alienação da capacidade de opinar, demonstrando uma clara influência deste meio de comunicação, em que o periódico assume uma prerrogativa decisiva de construção e imposição da opinião que se deveria ter sobre determinados fatos. Retomando a ilustração de Amanda Lucia, intitulada Charlie Chaplin em seu novo filme, única referência ao filme Tempos Modernos encontrada na Revista do Globo, mesmo que nossa intenção não seja a de fazer uma análise detalhada da imagem, não é difícil perceber que ali estão presentes todos os ícones dessa ideologia subversiva a ser combatida. O “vagabundo”, tipo que seria execrado pelo Estado Novo por não conseguir representar os ideais de um país que anseia à modernização resultante do trabalho; a engrenagem associada ao operário, que não cumpre com eficiência suas tarefas interrompendo o processo produtivo, analogia destrutiva aos ideais de industrialização; e, por fim, o mais grave de todos os “pecados” de Chaplin: o homem que tremula a bandeira vermelha, ícone maior do comunismo internacional e muito “subversivo” para os padrões brasileiros. 5 Conclusão Retomando tudo que foi dito, procurando entender os motivos que levaram a Revista do Globo a não repercutir o filme Tempos Modernos, apresentamos a teoria da Espiral do Silêncio de Elizabeth Noelle-Neumann, demonstrando a importância da abordagem dada pelos meios de comunicação sobre determinado fato. Essa teoria baseia-se principalmente na idéia de existência de uma opinião dominante que provocaria um clima de opinião. e este seria espelhado para o público através da mídia. Sua base está no pressuposto de que a sociedade ameaça com isolamento e exclusão aqueles que se desviam do consenso. Entendemos como opinião dominante em 1936, no que diz respeito ao Brasil, todo um Estado que estava organizando-se em torno de Getúlio Vargas, uma peça que centralizava todo o anseio de uma nova elite política do país, que, em passos largos, se constituía como resultado de um projeto de modernização e industrialização. O traço comum entre essa economia industrial ainda adormecida e a já consolidada estrutura dos Estados Unidos era justamente um inimigo comum, o comunismo internacional, que, desde as primeiras lutas operárias no início do século XX, assustava a elite conservadora nacional. O forte e agressivo sentimento anticomunista desse período nos ajuda a entender o posicionamento da Revista do Globo. Ainda mais quando ficam expostos seus estreitos laços com a elite política e intelectual do nosso Estado, especialmente Getúlio Vargas, que, desde a idealização do projeto de uma revista de grande circulação, já se mostrava um entusiasmado colaborador. Feitas essas considerações, não nos parece estranho o silêncio da revista em relação ao filme. Tempos Modernos poderia “subverter” e conduzir a população a um posicionamento crítico quanto a determinados padrões estabelecidos pela sociedade. Era preciso “proteger” a frágil opinião pública contra as “ameaças” que o comunismo internacional e seus “ícones” , como Charles Chaplin, poderiam representar. Acreditamos que a preocupação em não comentar o filme fazia parte de uma estratégia, na qual as pessoas Cadernos FAPA - N. Especial VI Fórum FAPA – www.fapa.com.br/cadernosfapa 96
  • 6. precisavam acreditar que sua opinião fazia parte de um consenso mesmo sem perceber que estavam sendo orquestradas por uma elite abrindo assim a possibilidade de se expressarem publicamente, transmitindo esse ideário manipulado que passavam a adotar como seu. É exatamente esta a perspectiva adotada pela teoria da Espiral do Silêncio: a existência de uma opinião dominante que, espelhada na mídia, isola aqueles que dela discordam. Nosso estudo é só mais um exemplo dessa prática tão comum. THEORY OF THE SPIRAL OF SILENCE: “MODERN TIMES” IN GLOBO MAGAZINE Abstract The principal proposal of this article is, trough some presupposed of the theory of the Spiral of Silence, understand the separating that Globo Magazine impose when it doesn’t comment the largest casting of the worldwide movie in 1936, the film Modern Times of Charlie Chaplin, that makes Porto Alegre to stop during its exhibition. Keywords: Modern Times. Charlie Chaplin. Anticommunism. Referências BARTHES, Roland. Mitologias. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1993. CHAPLIN, Charles. Minha vida. Rio de Janeiro: José Olympio, 2005. CLARET, Martin. Chaplin: vida e pensamentos. São Paulo: Martin Claret, 2002. DALMÁZ, Mateus. A imagem do Terceiro Reich na Revista do Globo (1933-1945). Porto Alegre: EDIPUCRS, 2002. DA REVOLUÇÃO Francesa à Revolução Russa. Revista do Globo, Porto Alegre, p. 22, 10 out. 1936. FAUSTO, Boris. História do Brasil. São Paulo: EDUSP, 2003. FERRO, Marc. Cinema e História. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992. FLORES, Moacyr. Cinema: imagens da história. Porto Alegre: Evangraf, 2002. GERTZ, René. O Estado Novo no Rio Grande do Sul. Passo Fundo: UPF, 2005. HOHLFELDT, Antonio. Teorias da comunicação. Petrópolis: Vozes, 2002. KOUTZII, Jacob. A tela branca. Porto Alegre: Unidade Ed., 1997. LAGE, Louise Costa. Do silêncio à fala: O caminho da mensagem jornalística. 1998. Dissertação (Mestrado em Comunicação) – Faculdade de Comunicação, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. LEPROHON, Pierre. Charles Chaplin: o seu destino e sua obra. Lisboa: Livros do Brasil, 1936. MORIN, Edgar. As estrelas: mito e sedução no cinema. Rio de Janeiro: José Olympio, 1989. MOTTA, Rodrigo Patto. Em guarda contra o perigo vermelho. São Paulo: Perspectiva, 2002. OS INVENTOS da miséria. Revista do Globo, Porto Alegre, p. 49, 10 out 1936. SCHILLING, Voltaire. América: história e contradições do império. Porto Alegre: LPM, 2004. SILVEIRA, Walter. Imagem e roteiro de Charles Chaplin. Salvador: Mensageiro da Fé, 1970. Cadernos FAPA - N. Especial VI Fórum FAPA – www.fapa.com.br/cadernosfapa 97