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“Asempresasdevemretribuirpartedoseu
lucro à sociedade. Entendo que é mais útil
dar algo no desporto do que plantar árvo-
res.Portugaléopaíseuropeuondeajuven-
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tor de um projecto inédito em Portugal.
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2003, apostar no râguebi e escolheu o Cal-
das Rugby Clube, da I Divisão (escalão
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ceria. A empresa do sector aeronáutico,
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assistentes de bordo da Ryanair, contrata
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em Lisboa e alinhar no clube da região
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a tornar-se algo cada vez mais sério. Ber-
nardino entusiasmou-se e, depois da che-
gadadeNunoTafulnoiníciodoano–con-
tratado ao campeão nacional Direito –, já
assegurou mais seis atletas da Divisão de
Honra provenientes do Belenenses e do
Técnico.
Assim, com o início da pré-temporada,
estesseteelementossãoactualmentecom-
panheiros de equipa... e colegas de traba-
lho. O i passou 24 horas no estágio do Cal-
das, em Sangalhos (de 11 a 14 deste mês),
paraconhecerasligaçõesquesedesenvol-
veram no projecto. No plantel convivem
agora jogadores consagrados com jovens
daformação.Onomequeporventuramais
chama a atenção é David Mateus, um dos
“Lobos”doMundial2007eaindaumhabi-
tué na selecção nacional. “Tenho 33 anos,
nãoachoquesejaaestreladaequipa.Nun-
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res com menos experiência, mas que me
surpreenderampelapositiva.Ficoconten-
te de estar aqui”, explica o ponta que, de
segunda a sexta, é supervisor de tráfego.
O ambiente no estágio é descontraído e
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seus ídolos no râguebi ali ao lado. A
Divisão de Honra tinha apenas oito
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conhecem bem. Além das habituais
picardias entre os que jogaram no
Técnico ou no Direito, o râguebi já não é
o único motivo de pirraça, pois o convívio
no escritório abre um mundo de novas
brincadeiras e conversas. Às 18h, no fim
de um dia de trabalho, as calças são
trocadas pelo equipamento de râguebi e
os sete colegas fazem o trajecto Lisboa-
Caldas-Lisboa três dias por semana para
treinar.
Este vai ser um ano de
transição,comjogosnaIDivisão,ondevão
ter pela frente, entre outros, o Benfica e o
Sporting. O objectivo do projecto, que pre-
tendeserauto-sustentável,ésubirdeesca-
lão em três anos. Poucos o dizem aberta-
mente,mascomaqualidadequetemsido
injectada nesta equipa é provável que isso
suceda antes – além dos reforços, a estru-
turaintegraagoraumfisioterapeutaeum
nutricionista. Masparaissoéprecisomui-
to trabalho: de campo, não de escritório.
Após o jantar, o treinador argentino Patrí-
cioLambogliaavisaosatletasquevãocor-
rer às 8 da manhã. A primeira reacção é
de espanto, acompanhado de risos, mas
quandopercebemqueotécnicofalaasério,
os jogadores acatam a ordem e, no dia
seguinte, lá estão eles na porta do hotel,
preparados para mais um dia de muito
suor.
“O que me atraiu neste projecto é o horá-
rio flexível e o facto de poder continuar
a praticar râguebi com bons jogadores
com quem já tinha jogado ao longo dos
anos. E obriga-me a sair da zona de con-
forto, que é sempre bom para nos testar-
mos a nós próprios”, afirma Frederico
Melim, um dos mais irreverentes no está-
gio; foi internacional nos escalões jovens
e jogava no Belenenses. E como é aturar
os colegas oito horas no escritório e depois
treinar com eles? “Há uns que no traba-
lho são insuportáveis, como o caso do
Bernardo Gonçalves [“é porque sou che-
fe dele”, responde o Bernardo], mas se
calhar até estamos mais unidos pelo fac-
to de jogarmos juntos. O David não o vejo
muito, está sempre na selecção, com as
lesões dele, mas é um gajo porreiro”, diz
em tom de brincadeira o 3ª linha, que
está integrado no departamento finan-
ceiro da Groundlink.
Como
em muitos desportos (à excepção do fute-
bol), mesmo no principal escalão os atle-
tas são amadores. Por vezes têm de deci-
direntretrabalharoujogar,emuitosficam
pelo caminho. “Este projecto ajudou-me

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