A arte se comunica, basicamente sob duas maneiras
paradigmáticas e distinta: figuração e não-figuração. A
primeira carrega a imagem do mundo, em que o produto é
o reconhecimento. A segunda dispensa a imagem do
mundo e, quando totalmente não-figurativa, é chamada
também arte abstrata.
Elas tem valores diferentes, são submetidas a leituras
diferentes e alteram vínculos emocionais antagônicos.
A Arte Figurativa comunica a recuperação da realidade
exterior (também chamada realidade fenomênica, matérica
ou física), que está no espaço, em tridimensionalidade,
para o plano (bidimensionalidade) com a técnica da
perspectiva ou escorço. Os artistas da Renascença
(clássicos do século XVI) tiveram domínio pleno e absoluto
dessa técnica que proporciona à tela uma ilusão de
realidade, também chamada de tromp l’oeil.
A Figuração absoluta de uma arte é chamada de mimética (mímesis
do grego, imitação). É a representação do “de fora” (vida, realidade)
“para dentro” (a obra, tela, suporte).
O receptor da arte figurativa “entende” o que vê na tela porque a
obra inspira sempre uma leitura clara e objetiva do mundo
“conhecido”.
Essa forma de comunicar contempla as evidências, enquanto a arte
não-figurativa ou abstrata comunica a matéria simbiotizada nela
mesma, sobre o suporte, sem evidências do mundo reconhecível.
A Arte Não-figurativa ou Abstrata não expressa o mundo, expressa a
cor, o metal, o material utilizado, estabelecendo uma comunicação
especial.
Entre a Arte Figurativa Absoluta (perto da fotografia) e a Arte Não-
figurativa Absoluta (Abstrata), existem as chamadas Artes
Degeneradas.
As Artes Degeneradas comunicam a leitura do mundo por objetos
reconhecíveis, mas de forma desconcertada, alterada
formalmente, ou seja, no Impressionismo é “vaporizada”, no
Expressionismo é tortuosa, exagerada e dolosa; no Cubismo é
geometrizada
As Artes Degeneradas intermediam a Figuração e a Não-
figuração absolutas.
A Arte Não-figurativa apresenta uma grande dependência da
matéria, mas também emblematiza a forma mais absoluta de
democratização na arte, pois, fomenta o artista a necessidade de
permanecer no estado de constante experimentação e, ao mesmo
tempo, produção de conhecimento.
.As Artes Figurativas e Não-figurativas estão extremamente
ligadas aos meios de comunicação, aos meios de publicidade,
aos processos dinâmicos de informação.
Plurais, intensas, ricas em simbolismos e conceitualismos, ambas as
formas de arte fazem-se Ler, principalmente as abstratas, muito mais
pelo que há por trás delas do que pela expressão visível em si
mesma.
O artista da Arte Figurativa materializa a representação e o da Arte
Abstrata materializa a presentação. Há espaços, dimensões,
movimentos, temporalidades, volumes, fusões óptico-sensoriais entre
o real e o ilusório no cerne dessas artes.
A Arte Não-figurativa é uma forma de comunicação visual peculiar:
comunica através dos sentidos, de um mental diferente, de uma
maneira de ver a própria arte tendo os reconhecimentos da realidade
como inexistentes e inessenciais. É um meio de expressão e
comunicação que se pode considerar exótico. Através dela,
penetramos no sentido das coisas, numa comunicação plural. Pois,
os recursos icônicos da Arte Não-figurativa absoluta ou Abstrata
tendem a ser subversivos, com a extirpação da realidade fenomênica
e reconhecível. Por sua própria natureza, procura caminhos de
inconformidade e ruptura.
As Artes Figurativas e Não-figurativas existiram desde os homens da
Idade da Pedra. Nas paredes de Altamira e Lascaux, na França,
tem-se Figuração e Abstração, ainda que de forma precária, prosaica
e arcaica. Foram os século XIX e XX que legitimaram a Arte
Abstrata.
A Pintura Abstrata é o sintoma de um momento histórico
surpreendente para o homem moderno, pois foi num momento de
mudança histórica, pós-revolução industrial e suas conseqüências
que surgiu a Arte Abstrata.
O que comunica e educa na Arte Abstrata é uma ordem lógica.
Precisamos ter um repertório para compreendermos e
interpretarmos essa ordem lógica.
Na Arte Abstrata nada é fortuito, nada é aleatório, nada é arbitrário,
embora pareça. As linhas, as formas, as cores e outros elementos
visuais tem lugar determinado na composição. A alteração desses
elementos implica também numa alteração de valor.
Dizer que os valores são sempre iguais em toda e qualquer Arte
Abstrata é um grande engodo.
Muitas vezes a comunicação na Arte Abstrata degenera-se por
incompetência do próprio receptor que a vê com preconceito e
pressupostos adquiridos, emitindo manifestações como: “isto é
qualquer coisa”, “não entendo”, “até meu filho de três anos faz”, “é
um borrão só”, “não é arte” e outros despautérios afins.
Isso prova uma carência no instrumental do receptor para a correta
leitura da Arte Abstrata.
A Arte Abstrata goza de uma comunicação específica porque sua
nova codificação não é factível com os parâmetros cognitivos,
lingüisticos e racionais do senso comum.
Cria-se com a Abstração, uma nova ideologia, uma outra razão
estética, uma filosofia nas artes que tem nos acompanhado até
hoje e acaba se transformando na mais difundida das artes visuais.
A Pintura Abstrata advém de um padrão mental inerente ao homem
de todos os tempos, ao qual se atribui o nome de Abstração. Como
capacidade inata, a Abstração é uma atividade mental de seleção e
síntese. Homens de muitas tribos primitivas antiquíssimas, em
muitos de seus desenhos não faziam referência à realidade exterior,
mas, sim, à própria composição em si.
A Arte Abstrata, sendo uma forma de comunicar e um princípio
diferente de educar, não procura reproduzir as formas e as cores
naturais, pois, ambiciona-se por criar formas puras e soltas,
construídas com os elementos mesmos da pintura. Os arranjos
livres ou controlados em estados de tensão, ou seja, a composição
é que constrói a coluna vertebral da pintura abstrata.
Na Arte Não-figurativa não há recuperação da realidade exterior
porque na Abstração não é mais essa realidade que tem
importância e sim a matéria que o artista usa, cria e recria nela
mesma. O Artista abstrato não copia nada da realidade exterior,
somente trabalha com o material: cores que se fundem (pintura) ou
ferros que se misturam (escultura).
Na abstração a arte perde a ilusão da vida, mesmo porque não há
vida a recuperar; não há mímesis, porque não há imitação; não há
representação e sim presentação: o material está presente nele
mesmo.
Em termos comunicacionais e educacionais, a Arte Abstrata convida
o observador/ fruidor a participar mais ativa e convenientemente com
o criador na feitura da obra.
O autor da Arte Abstrata permite múltiplas interpretações para a sua
criação, tendo no apreciador um co-participante, um reelaborador, um
reexecutor e um “realimentador” de ilusões”. Ilusões que estão no
receptor não na obra.
A Arte Abstrata, contestando os valores clássicos do acabado,
definido, perfeito e inequívoco, propõe uma obra indefinida e
plurívoca, aberta, que se vem configurando como um feixe de
possibilidades móveis e intercambiáveis mais adaptadas às
condições nas quais o homem moderno desenvolve suas ações.
A Arte Abstrata encharca os olhos de seu receptor com uma
multplicidades de imagens sujeitas a decodificações.
O receptor da Arte Abstrata não está decodificando imagens
“conhecidas”, mas pontos, linhas, contornos, direções, tons, cores,
texturas, escalas, dimensões, movimentos e ritmos.
Entender a Arte Abstrata é entender o tralho que o artista desenvolve
com esses elementos, em tensões diversificadas e múltiplas, através
da composição ou arranjo na superfície plana da tela ou outro
suporte.
A Arte Não-figurativa ou Abstrata transmite conteúdos peculiares que
não são os da Arte Figurativa, mas que visam ensinar novas formas
de visão das coisas, das cores, da própria arte e da vida.
Saber Ler a Arte Abstrata é saber Ler mais longe. A Arte Abstrata
informa, forma e educa o olhar.
A Arte Abstrata reeduca o sujeito para uma decodificação
inovadora. A Arte Abstrata comunica, no sentido de levar o a seu
receptor a educar-se para construir julgamentos ou juízos de valor
sobre ela.
.Na Figuração ainda há um conceito hegemônico a ser seguido,
indicado pela própria figura. Na Arte Não-figurativa ou Abstrata, o
conceito é diverso, diretrizado pela pulsão e fusão das cores, e
ainda, pela coexistência de diferentes códigos, propondo uma
comunicação peculiar, paradigmática e diferente da clássica
concepção Renascentista de mímesis e representação.