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Princípios Filosóficos do Ayurveda
1. Instituto de Medicina
Tradicional
CURSO GERAL DE NATUROPATIA E CIÊNCIAS
TRADICIONAIS HOLÍSTICAS
Ano lectivo: 2009/2010
Disciplina: Medicina Ayurvédica
Docente: Michele Pó
“ Princípios Filosóficos do Ayurveda ”
Autora: Gisela Jetá, 3ºB
Nº 4118
Lisboa, 29 de Novembro de 2009
2. GISELA JETÁ 2009/2010
Índice
Nota Introdutória .............................................................................................. 3
Desenvolvimento .............................................................................................. 4
A Origem do Ayurveda ....................................................................................... 5
Breve comentário sobre a história do Ayurveda ................................................. 6
O Veda............................................................................................................ 7
Os Upanishads ............................................................................................... 8
A filosofia Védica ................................................................................................ 9
Nyaya .................................................................................................... 9
Vaisheshika ......................................................................................... 10
Samkhya ............................................................................................. 12
Yoga .................................................................................................... 17
Purva Mimamsa .................................................................................. 17
Uttara Mimamsa .................................................................................. 17
As Sub-escolas da Vedantas: ....................................................................... 19
Os cinco elementos - Pancha Maha Bhutas ................................................. 22
O tridosha e a sua relação com o pancha maha bhutas ............................... 24
Conclusões (notas pessoais) ........................................................................ 25
Referências bibliográficas:............................................................................ 26
“Princípios filosóficos do Ayurveda” 2
3. GISELA JETÁ 2009/2010
Nota introdutória
Com este trabalho pretendo apresentar os fundamentos onde se baseia a
medicina mais antiga do mundo - Medicina Ayurvédica, também denominado
como “Princípios Filosóficos do Ayurveda”. Escolhi este tema por considerar
toda a envolvência da história e os seus princípios fascinantes e muito actuais
aos dias de hoje.
No decorrer deste trabalho, apesar da variedade de bibliografia disponível e a
extensão do tema, senti alguma dificuldade em seleccionar a informação
correcta e sucinta para a apresentação deste trabalho. Outra dificuldade que
me deparei foi o tempo para a sua realização, pois por ser trabalhadora-
estudante tenho o tempo reduzido para o cumprimentos dos prazos
estabelecidos, assim como a entrega dos restantes trabalhos solicitados ás
restantes disciplinas do curso! Apesar do enorme prazer que tive na realização
deste tema, tive de realizar algumas traduções de livros em Inglês, que por
vezes pareceu-me faltar as palavras para descrever verdadeiramente o seu
significado.
Por fim quero agradecer à Prof. Michele Pó pela disponibilidade e pelos
materiais emprestados e à Petra Silva (colega de turma e amiga) também pela
bibliografia partilhada!
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4. GISELA JETÁ 2009/2010
Desenvolvimento
É sabido que desde o inicio da história da humanidade que o Homem busca a
paz e a prosperidade, e o objectivo do Ayurveda não é mais do que ensinar o
caminho para lá chegar, preservando a saúde dos indivíduos saudáveis e
tratando as doenças que quem precisa. Apesar desta procura incessante e
constante, a generalidade dos Homens ainda não encontrou o seu propósito de
vida, preferem “agarrar-se” aos bens materiais e ignoram a sua verdadeira
natureza divina. Assim a mente torna-se a porta de entrada da doença, da dor,
da ansiedade em vez de ser o veículo para encontrar o amor e a esperança de
restaurar a coesão com o Todo!
“Esta parte de restaurar e preservar o todo é o fulcro da medicina ayurvédica.”
[Gerson, S., in “Ayurveda – A antiga medicina Indiana”, p. 13]
Ao aprendermos a nutrir o corpo mental e os aspectos mais subtis da nossa
natureza, alinhamos as nossas vidas, os pensamentos e os comportamentos
com o nosso Eu Superior e asseguramos uma boa saúde física, mental e
espiritual.
“Quando o Sol e a Lua se puserem, o fogo se extinguir e o som se silenciar,
qual será a luz do Homem? O Eu é, de facto, a luz.”
[in “Brihadaranyaka Upanisad”]
Mas não é só da falta da higiene espiritual que faz com
que a humanidade padeça de tantas doenças. Os
especialistas em saúde dizem que cerca de 80% dos
problemas de saúde são devidos á dieta inadequada, á falta de exercício físico
e do stress em que as sociedades modernas vivem, e estes hábitos acabam
por reflectir o rápido crescimento de doenças como a diabetes e a obesidade,
ansiedade e depressão entre outros problemas.
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5. GISELA JETÁ 2009/2010
Assim para o Ayurveda, Saúde representa o estado em que a mente se
encontra num em felicidade, os sentidos e os órgãos em perfeito
funcionamento, a digestão efectuada correctamente, os tecidos estão bem
nutridos e as excreções estão a ser devidamente eliminadas. Por ser um
sistema de tratamento holístico o Ayurveda preocupa-se em tratar a mente tão
bem como o corpo, e faculta as ferramentas para manter a saúde!
A Origem do Ayurveda
“Nós meditamos sobre o glorioso esplendor do divino Vivificador. Que ele
ilumine as nossas mentes. OM”
[in Rig Veda I, 62:10]
O mundo do Ayurveda literalmente significa “Ciência da vida”, surgiu no
continente indiano há cerca de 3 000 – 5 000 anos a.C., e representa uma
completa ciência médica transmitida pelos grandes sábios Vedas. Eles
transmitiram que o objectivo da vida humana é viver uma vida longa (cerca de
100 anos), com saúde, felicidade e envelhecer com dignidade.
Desde o seu nascimento, a sabedoria do Ayurveda não só sobreviveu como foi
uma profunda influência em vários sistemas de saúde por todo o mundo, como
no Egipto, na Síria, na Pérsia, na medicina tradicional chinesa… os elementos
da prática Ayurveda podem ser vistos em alguns dos métodos usados hoje na
medicina moderna, como a cirurgia plástica, das quais existe referência nos
antigos textos ayurvédicos. Escrito cerca de 3 000 anos a. C., o Susruta
Samhita tem detalhes precisos de como reparar uma lesão no nariz ou nos
ouvidos, retirando pele da parte interna no braço e suturando no local lesado.
Não era apenas informação sobre medicina que continham estes tratados, mas
também, por exemplo, práticas de higiene, onde foi escrito que algumas
doenças causadas por bactérias e vírus eram transmitidos pelo toque. Por este
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6. GISELA JETÁ 2009/2010
motivo é que o cumprimento tradicional indiano – Namasté – é efectuado com
as palmas das mãos da pessoa voltadas uma para a outra,
como forma de evitar o contacto entre as pessoas, além de
dignificar o indivíduo a quem é enviado o cumprimento.
Assim como o facto do corpo de um falecido apenas ser
visitado 11 dias após a morte, para que não contenha
contaminações, e o conceito dos “intocáveis” promovido pelo sistema de castas
indianas, aparenta ter as suas origens no desejo de manter uma boa higiene e
evitar a propagação de doenças.
Breve comentário sobre a história do Ayurveda
“No início da Criação havia Deus, a Encarnação do Desejo, imbuído do desejo
de criar o universo. O desejo foi o primeiro poder criador do Omnisciente. A
Encarnação do Desejo e o Seu grande desejo de criação estavam centrados
no mesmo lugar - na expansão total do universo. Oxalá Kama derrame
riquezas e prosperidade sobre o imolador.”
[in Atharvveda]
O local específico na Índia onde nasceu o Ayurveda não é
conhecido, sabe-se sim, que a Civilização Pré-histórica e do
Vale do Indo (3 500 a 1 500 anos a.C.) é considerado o berço
das cinco nações: China, Egipto, Suméria, Peru e o Vale do
Indo. O solo fértil do grande sistema de rios do nordeste da
Índia actual tornou possível a produção de um excedente
alimentar, o que levou ao desenvolvimento do comércio e, com a formação das
cidades, ao início da urbanização. As cidades eram constituídas com um
avançado sistema de esgotos e drenagem, dando ênfase ao rigor da higiene
patente na literatura ayurvédica. O conhecimento do Ayurveda teve a sua
origem nesta civilização sofisticada e desenvolvida. A ciência tradicional do
Ayurveda descreve a maneira como os rishis, sábios, se aperceberam da
necessidade de se isolarem da sua civilização para encontrarem a serenidade
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7. GISELA JETÁ 2009/2010
e a clareza de espírito necessárias para receberem o conhecimento que
procuravam. O seu objectivo era erradicar as doenças, não só da raça humana
mas de todas as criaturas e meditaram sobre isso. Foi neste período de
meditação que surgiu todo o conhecimento e informação do Ayurveda.
O Veda
Pensa-se que o Ayurveda teve origem num povo que emigrou para o Vale do
Indo por volta de 2 000 a.C., denominados por “Arianos”. A religião
desenvolvida por este povo ficou expressa por uma colecção de hinos e
canções chamados Veda (“conhecimento”), contém a informação necessária
para a realização dos rituais do fogo, foram conservados primeiramente
oralmente por este povo. Os hindus sempre consideraram que os Vedas
tinham origem divina. O Veda é comporto por quanto livros ou colectâneas de
material para ritual (Samhitas):
Rig Veda Samhita – comporto por 10 livros de
hinos a divindades, onde os sábios sacerdotes eram
responsáveis pela sua conservação, inclui rituais de fogo.
Todos os outros vedas são baseados neste.
Sama Veda Samhita – livro de cânticos do Rig
Veda, com as instruções, representam o êxtase e a
bênção da auto-realização. Enquanto que o Rig Veda é o passo ou a
palavra, o Sama Veda é a dança ou a compreenção.
Yajur Veda – rituais e sacrifícios do yoga no sentido da purificação da
mente e do acordar para a consciência. Tem o objectivo de estimular o
universo no interior do indivíduo, unindo-os.
Atharva Veda – cânticos e encantamentos para apaziguar os deuses e
mantras para afastar o mal, o azar, os inimigos e a doença. Contém
feitiços mágicos utilizados pelos sacerdotes.
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A literatura védica inclui ainda textos que fornecem explicações secretas e
místicas de rituais chamados aranyakas, e os Upanishads.
Os Upanishads
No final do período védico surgiram especulações de natureza cosmológica
em várias escolas filosóficas. As especulações foram
registadas e aos tratados deu-se o nome de Upanoshads,
onde são enfatizados o significado espiritual do ritual védico
e a sua relação com a humanidade. Os seus ensinamentos
básicos podem ser percebidos através das seguintes seis
máximas (mahavakyas):
1. Aham Brahmasmi – Eu sou Brama – estabelecimento da identidade do
indivíduo com o Eu Supremo;
2. Ayam Atma Brahma – O Eu é Brama – afirmação da unidade do Eu
individual com o Absoluto;
3. Tat tvam asi – Tu és isto – o conhecimento está em todo o lado e em
tudo e é a mente que concebe a ilusão do “outro”;
4. Prajnanam Brahma – A Inteligência é Brama – afirma-se que a
inteligência individual é a presença da inteligência divina em nós, da
qual se pode conceber o Absoluto;
5. Sarvam khalvidam Brahma – Todo o Universo é Brama – Tudo o que
existe e que não existe formam o Eu Supremo Uno. Nada é, foi ou será
a não ser por Brama;
6. So’ham – Ele sou Eu – revela o Absoluto no ciclo natural da nossa
respiração. So é o som natural da inalação e ham o da exaltação.
A origem do conhecimento médico ayurvédico parece ser uma combinação
daquilo que é directamente recebido pelo divino e do ensinamentos dos sábios
antigos. O Charaka Samhita – o mais antigo texto ayurvédico – começa com a
reunião de grandes sábios.
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A filosofia Védica
Após o surgimento dos Vedas, nasceram as seis escolas filosóficas ou da
filosofia Sânscrita - Astika – (आस्तिक):
Nyaya
Vaisheshika
Samkhya
Yoga
Purva Mimamsa ou Mimamsa
Uttara Mimamsa ou Vedanta
Estas escolas ajudam a Ayurveda a desenvolver teorias das patologias
humorais.
No coração do Ayurveda reside a teoria que o corpo humano é composto por
três humores ou doshas: Pitta, Vata e Kapha (ver p. 23). A pessoa que tem
estes três doshas em equilíbrio goza de uma saúde perfeita e o seu
desequilíbrio a consequente doença.
A escola Nyaya (lógica) é baseada no texto Sutra
Nyaya, escritos por Aksapada Gautama (ou Gotama).
Nyaya também conhecido por Tarka-Vidya ou Ciência do
Debate ou Vada-Vidya ou Ciência da Discussão, tem
como propósito final a Libertação (niḥśreyasa) atingido
pelo conhecimento das seguintes categorias (ou os
dezasseis padārtha):
1) Meio de conhecimento válido (pramana);
2) Objectos de conhecimento válido (prameya);
3) Dúvida (samshaya);
4) Finalidade (prayojana);
5) Exemplo (drstanta);
6) Conclusão (siddhanta);
7) Os componentes de um silogismo (avayava);
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8) Argumentação (tarka);
9) Averiguação (nirnaya);
10) Debate (vada);
11) Discordar (jalpa);
12) Crítica destrutiva (Vitanda);
13) Falácia (hetvabhasa);
14) Trocadilho (chala);
15) Refutações (jāti);
16) Pontos para derrotar o adversário (nigrahasthana)
De acordo com o Sutra Nyaya, existem quatro
meios para atingir o conhecimento válido:
percepção, interferência, comparação e testemunho
verbal. O Sutra deixa implícita a teoria da causa-
efeito, que deve ser homogénea na natureza,
embora o efeito deva ser encarado como um novo
começo e não uma simples consequência da causa.
A tese budista de que tudo é negativo na natureza
(na medida de que a própria natureza é constituída pela sua diferença em
relação ao resto), é rejeitada, assim como que todas as coisas são eternas
ou não são eternas. Assim, a metafísica resultante admite os dois tipos de
entidades: o eterno e o não eterno, onde o Todo é uma nova entidade,
acima de todas as partes que o constituem. Também a ideia de que Deus é
a causa material do Universo também é rejeitada, é antes visto como a
causa eficiente, onde as acções humanas produzem os seus resultados sob
o controle e cooperação de Deus.
A escola Vaisheshika é associada com a escola
hindu da lógica. Ela defende a teoria atómica, afirmando
que todos os objectos do universo físico são constituídos
por átomos e são redutíveis a um número finito de
átomos, isto já no século II a.C. Embora esta escola se
tenha desenvolvido independentemente do Nyaya, as
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duas confundem-se por causa das suas teorias metafísicas e estão assim
intimamente ligadas. Porém há uma diferença básica nestas duas escolas:
Nyaya aceitou quatro fontes de conhecimento válido, enquanto que
Vaisheshika aceitou apenas a percepção e a interferência. A teoria atómica
de Vaishehika difere da ciência moderna, pois alega que o funcionamento
dos átomos foi orientado ou dirigido pela vontade do Ser Supremo.
Segundo também este escola, todas as coisas que existem são padartha,
isto é, são objectos da experiência, e todos eles podem ser classificados em
seis categorias, onde as três primeiras são definidas como artha (que pode
ser entendido e não têm existência real objectiva), as três últimas
classificações são definidas como budhyapeksam (produto de discriminação
intelectual, são categorias lógicas):
1) Dravya (substância): as substâncias são concebidas em número 9. Eles
são, pṛthvī (terra), jala (água), tejas (fogo), vayu (ar), Akasa (céu), kala
(tempo), dik (espaço), Atman (eu) e manas (mente). Os cinco primeiros são
chamados bhuta (ver p. 22), as substâncias com algumas qualidades
específicas para que eles pudessem ser percebidos por um ou os outros
sentidos externos;
2) Guna (qualidade): O Sutra Vaisesika menciona 17 qualidades (gunas), aos
quais Praśastapāda acrescentou outros 7. Enquanto que uma substância é
capaz de existir por si só, um guna não pode existir. Os 17 gunas originais
são: rupa (cor), rasa (sabor), gandha (cheiro), Sparsa (toque), Sámkhya
(número), parimāṇa (tamanho), pṛthaktva (individualidade), saṁyoga
(conjunção), vibhāga (disjunção), paratva (prioridade), aparatva
(posterioridade), Buddhi (conhecimento), sukha (prazer), duhkha (dor), Iccha
(desejo), dveṣa (aversão) e prayatna (esforço). A estes Praśastapāda
adicionou ainda gurutva (peso), dravatva (fluidez), sneha (viscosidade), o
dharma (mérito), adharma (demérito), sabda (som) e saṁkāsra (faculdade);
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3) Karma (actividade): tanto o karma (actividade) como guna (qualidade) não
têm existências separadas, eles pertencem às substâncias. Mas, enquanto
que a qualidade é uma característica permanente da substância, a
actividade é passageira. Assim, akasa (céu), kala (tempo), dik (espaço) e
atman (eu), apesar de substâncias, são desprovidos de actividade de
karma;
4) Samanya (generalidade): visto que há várias substâncias, então há
ligações entre eles. Sempre que é encontrada uma propriedade comum a
muitas substâncias, é chamada de samanya;
5) Visesa (particularidade): devido a esta propriedade somos capazes de
perceber que as substâncias tão diferentes umas das outras. Assim como
os átomos são inumeráveis também são os visesa;
6) Samavaya (consequência): Kanada definiu como a relação entre a causa e
o efeito. Praśastapāda definiu como a relação existente entre as substâncias
que são inseparáveis, estando uma para a outra numa relação de conter e
ser contido.
Samkhya ou escola da enumeração é considerado um dos mais antigos
sistemas filosóficos da Índia. Sage Kapila é tradicionalmente considerado o
fundador desta escola, apesar de não existir verificação histórica. O texto
principal desta escola védica é a sobrevivente Samkhya, escrito por Ishvara
Krishna, por volta de 200 d.C. Este texto é como a Sankhya, ou Tantra e a
sua filosofia era uma das principais influências naquela época, fala tanto
sobre a ascensão dos Tantras como a ascensão do corpo. Não há escolas
puramente Samkhya existentes hoje em dia no hinduísmo, mas a sua
influência é sentida nas escolas Yoga e Vedantas. Samkhya é uma filosofia
fortemente dualista, que respeita o universo como sendo constituído por
duas realidades: Purusha (consciência) e Prakriti (matéria). Prakriti está
presente em ambos os reinos animados e inanimados, mas por outro lado,
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Purusha separa em Jivas ou unidades individuais de consciência das almas
quando se fundem na mente e no corpo animado ou vivo do Prakriti.
Existem diferenças entre o Samkhya e formas ocidentais do dualismo. No
Ocidente, a distinção fundamental é entre a mente e o corpo. No Samkhya,
no entanto, é entre o Eu Superior (Purusha) e a matéria (Prakriti).
Purusha é o eu transcendental ou Consciência Pura. É absoluto,
independente, livre, imperceptível, desconhecido e acima de qualquer
experiência e além de qualquer palavra ou explicação. Mantém-se puro.
Purusha não é produzido nem se deixa produzir.
Prakriti é a causa principal do universo - de tudo, excepto o Purusha, que é
sem causa, e é responsável por tudo o que é físico, tanto a matéria como a
força. Uma vez que é o primeiro princípio (tattva) do universo, é chamado
de Pradhâna, mas, como é o princípio inconsciente e ignorante, é também
chamado de Jada. É composto por três características essenciais (Triguna):
Sattva - fino, leveza, iluminação, e alegria;
Rajas - actividade, excitação, e dor;
Tamas - grosseiro, pesado, obstrução, e preguiça.
Todos os eventos físicos são consideradas manifestações da evolução de
Prakriti, ou da natureza primária (a partir da qual todos os corpos físicos são
derivados). O Purusha e é ilimitado e não se restringe ao copo físico. O
Samsaara ou a servidão surge quando o Purusha não tem conhecimento e seja
induzido em erro quanto á sua própria identidade, confundindo-se com o corpo
físico que pertence a Prakriti. O espírito só é libertado quando o conhecimento
de perceber a diferença entre o Purusha e o Pakriti é conscientemente
realizado!
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O sistema Yoga está intimamente
relacionado com as disciplinas mentais e físicas
originárias na Índia. A própria palavra está
associada às práticas meditativas no hinduísmo,
budismo e jainismo. Crê-se que nasceu da
filosofia Samkhya, e baseou-se no texto de
Patanjali – Yoga Sutras, embora também se
estude esta escola recorrendo ao Upanishads
(ver p. 8).
Estátua de Shiva (Bangalore,
Índia) a realizar meditação Os principais ramos de yoga na filosofia hindu
Yoga na postura Padmasana. incluem: Raja Yoga, Karma Yoga, Jnana Yoga,
Bhakti Yoga e Hatha Yoga. Muitos textos hindus discutem os aspectos do
yoga, incluindo Upanishads, a Bhagavad Gita, o Hatha Yoga Pradipika, o
Shiva Samhita entre outros. A palavra Yoga em sânscrito tem muitos
significados, e é derivada da raiz "yuj", que significa "controle", "juntar" ou
"unir-se." As traduções incluem "unir", "união", "conjunção", etc.
No Samhitas há referências aos ascetas, em práticas semelhantes (tapas),
referenciados pelos brâmanes (em 900 a 500 a.C.), nos primeiros
comentários sobre Yoga nos Vedas. Também foram descobertos diversos
selos da Civilização do Vale do Indo (datado de 3 300 - 1 700 a.C.),
mostrando onde é agora o Paquistão, figuras de indivíduos em posições
semelhantes ao yoga ou em pose de meditação comum, mostrando uma
forma de disciplina ou ritual, o que sugere um precursor do yoga. São
técnicas levadas a cabo para experimentar estados superiores de
consciência na meditação e foram desenvolvidas pelas tradições shramanic
e na tradição dos Upanishads.
“Princípios filosóficos do Ayurveda” 14
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Na literatura Hindu, o termo yoga surge primeiro na Katha Upanishad, onde
se refere ao controle dos sentidos e da cessação da actividade mental,
levando a um estado supremo. As mais importantes fontes textuais para a
expansão do conceito de Yoga são Upanishads (c. 400 a.C.), o
Mahabharata, o Bhagavas Gita (c. 200 a. C.) e o Yoga Sutras de Patanjali
(150 a.C.). Patanjali aceita a psicologia e a metafísica do Samkhya, mas em
vez dos vinte e cinco elementos da realidade descritos pelo Samkhya, fala
apenas de uma entidade divina. Os textos budistas são provavelmente os
primeiros textos que descrevem técnicas de meditação, onde são descritas
práticas de meditação e estados meditativos que já existiam antes de Buda.
A filosofia Samkhya é anterior ao bramanismo (hinduísmo). A relação íntima
entre Samkhya e Yoga é explicado por Heinrich
Zimmer: “São ambas consideradas filosofias
gémeas na Índia, ou seja como dois aspectos
diferentes de uma única filosofia. Samkhya
oferece uma exposição teórica básica da
natureza humana, enumerando e definindo os
seus elementos, analisando a sua forma de co-
operação em estados de servidão (bandha), e
descreve o estado de desarticulação ou de
separação na libertação da mente (Moksa),
enquanto que o Yoga explica especificamente a
Escultura de um yogue
dinâmica do processo desta mesma libertação,
hindu no Mandir Birla, Delhi.
descrevendo especificamente as técnicas
práticas para a obtenção da libertação, ou “isolamento” (kaivalya). (…) A
diferença mais significante do Samkhya é que a escola de Yoga não
somente incorpora o conceito do Ishvara (ou Deus pessoal) numa uma
visão do mundo metafísica mas também sustenta Ishvara como um ideal
sobre o qual meditar. A razão é que Ishvara é o único aspecto de Purusha
(do infinito Terreno Divino) que não foi mesclado com prakruti (forças
criativas temporárias). Também utiliza as terminologias Brahman/Atman e
conceitos profundos dos Upanishads, adoptando uma visão vedântica
monista. A realização do objectivo do Yoga é conhecido como moksha ou
“Princípios filosóficos do Ayurveda” 15
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samadhi. E como nos Upanishads, busca, o despertar ou a compreensão
de Atman como sendo nada mais que o infinito Brahman, através da
(mente) ética, (corpo) físico meditação (alma) o único alvo das suas práticas
é a 'verdade suprema.”
[in 2ª Aula Medicina Ayurvédica, Prof. Michele Pó]
Os escritos de Patanjali também se tornaram a base de um sistema
denominado por Ashtanga Yoga (“Yoga dos oito elementos”), conceito derivado
da 29ª Sutra do segundo livro, e é uma característica essencial de
praticamente todas as variações do Raja Yoga ensinado nos nossos dias, e
eles são:
1. Yama (os cinco "contras"): não-violência, não mentir, não-cobiça, não
sensualidade, e não possessividade;
2. Niyama (as cinco "observâncias"): pureza, contentamento, austeridade,
estudo e entrega a Deus;
3. Asana (literalmente significa "lugar", o Sutras de Patanjali refere-se à
posição sentada utilizada para a meditação);
4. Pranayama ("suspensão da respiração"): prana (respiração) e Yama
(limitar ou parar). Também interpretado como o controle da força da
vida;
5. Pratyahara (abstracção) dos órgãos dos sentidos dos objectos externos;
6. Dharana (concentração): fixar a atenção em um único objecto ou
propósito;
7. Dhyana (meditação ou contemplação): Intenso objectivo meditação;
8. Samādhi (Libertação da consciência): a fusão com o objecto da
meditação.
No ponto de vista desta escola, a maior realização é a compreensão de que o
mundo é uma ilusão, apesar do mundo quotidiano parecer ser real.
Percebendo que o Eu Superior é um conjunto de muitos “Eu’s” e que cada
indivíduo cria o seu próprio universo de “Eu’s”.
“Princípios filosóficos do Ayurveda” 16
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Purva Mimamsa ou apenas Mimamsa significa “investigação”,
enquanto de Purva significa “cedo”. As origens desta
escola encontram-se na tradição erudita, quando o
ritualismo sacerdotal do sacrifício védico estava a ser
marginalizado pelo budismo e Vedanta. O texto
fundamental de Mimamsa é o Purva Mimamsa Sutras de
Jaimini (c. século 3 a.C.), que resume as regras gerais
de Nyaya na interpretação Védica. O texto possui 12
capítulos, dos quais o primeiro capítulo é de um grande
valor filosófico.
“O principal objectivo do Purva ("cedo") ou da escola Mimamsa é
estabelecer a autoridade dos Vedas,
consequentemente a valiosa contribuição desta escola
para o hinduísmo foi a formulação das regras da
interpretação Védica. Os seus aderentes acreditam que
a revelação deveria ser provada através da razão, e
não aceita como um dogma cego. Este método
empírico e eminentementesensível de aplicação
religiosa é a chave para Sanatana/Hindu Dharma e foi especialmente
desenvolvido por racionalistas como Adi Sankara e Swami Vivekananda.”
[in 2ª Aula Medicina Ayurvédica, Prof. Michele Pó]
Uttara Mimamsa ou Vedantas (parte dos Vedas Veda-anta = “Veda-
end” = “o apêndice dos Vedas”). O Vedantas original era composto por
quatro versos, que mas se expandiu a milhares de pessoas. Até ao século
VIII, esta palavra era usada para descrever um grupo de tradições
filosóficas que se preocupam com a auto-realização, através da qual se
compreende a natureza da realidade (Brahman).
A palavra de Vedantas ensina que a meta do crente é transcender aos
limites da auto-identidade. A fonte da sua filosofia não é restrita ou
confinada a um único livro. Mas baseia-se em duas premissas simples:
“Princípios filosóficos do Ayurveda” 17
18. GISELA JETÁ 2009/2010
A Natureza humana é divina.
O objectivo da vida humana é perceber que a natureza humana é
divina.
O objectivo da filosofia Vedantas é o próprio
estado de auto-realização ou consciência cósmica.
Historicamente e actualmente, é assumido que
este estado pode ser experimentado por qualquer
pessoa, mas não se consegue transmitir em toda a
sua essência apenas pela palavra, tem e deve ser
experienciada. A Uttara Mimamsa (“último
inquérito” ou “mais investigação”) também está frequentemente ligada
ao Purva Mimamsa (“o inquérito interior”), pois este último lida com as
explicações sobre o sacrifício do fogo (ritual comum no hinduísmo) dos
mantras védicos e brâmanes, enquanto que Vedantas explica os
ensinamentos mais esotéricos da Aranyaka (“escrituras da floresta”). A
prática tradicional desta filosofia védica kanda Karma e os componentes
ritualísticos da religião continuou a ser praticada pelos brâmanes com
ritos de meditação com o propósito de orientar a sociedade para o auto-
conhecimento ou o jnana (“conhecimento entrado, levando ao
surgimento do entendimento”). Esta é a mística da religião védica, o ser
focalizado na meditação, auto-disciplina e conectividade espiritual, em
vez de ser apenas centrado nos rituais em si!
No período medieval do hinduísmo, a palavra Vedantas passou a
significar a escola de filosofia que interpretou o Upanishads. Porém,
Vedantas é a busca individual da verdade através da meditação
governado pela moralidade do amor, na certeza de que a felicidade
infinita espera quem a segue. Quase todos os ritos existentes do
hinduísmo estão directa ou indirectamente influenciados pelos sistemas
de pensamento desenvolvido pelos pensadores Vedantas. O hinduísmo
em grande parte, deve a sua sobrevivência pela formação e
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desenvolvimentos coerentes e logicamente avançados dos sistemas de
Vedantas.
“A Escola Uttara ("tarde") Mimamsa é talvez a pedra angular dos
movimentos do Hinduísmo e certamente foi responsável por uma nova
onda de investigação filosófica e meditativa, renovação da fé, e reformas
culturais. Primeiramente associada com os Upanishad e seus
comentários por Badarayana, e Vedanta Sutra, o pensamento Vedanta
dividiu-se em três grupos, iniciados pelo pensamento e escrita ou Adi
Sankara. A maioria a actual filosofia Hindu está relacionada às
mudanças que foram influenciadas pelo pensamento Vedântico, o qual é
focalizado na meditação, moralidade e centralização no Eu ao invés de
rituais ou distinções sociais insignificantes como as castas.”
[in 2ª Aula Medicina Ayurvédica, Prof. Michele Pó]
As Sub-escolas da Vedantas:
Advaita Vedanta (puro monismo): proposta por Ari Sankara e o seu guru
Gaudapada que descreveu Ajativada. De acordo com esta escola, Brahman é a
única realidade, e o mundo, como ele é, não passa de uma ilusão. Um poder
ilusório de Brahman é Maya, que fez com que o mundo se formasse. O
desconhecimento desta realidade é a causa de todo o sofrimento no mundo e
apenas mediante o verdadeiro conhecimento de Brahman a libertação pode ser
alcançada. Quando um indivíduo tenta receber Brahman na sua mente, devido
à influência de Maya, Brahman aparece como Deus (Ishvara), separando do
mundo e o indivíduo. Na realidade, não há diferença entre o Jivatman (“alma
individual”- Atman) e Brahman. A libertação reside em saber a realidade da
não-diferença (ou seja, um dvaita, "não-dualidade"). Assim, o caminho para a
libertação é conseguido, finalmente, através do conhecimento (jnana).
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Vishishtadvaita Vendanta (monimo qualificado): proposta por Ramanuja,
diz que o Jivatman é uma parte de Brahman e, portanto, é semelhante, mas
não idêntico. A principal diferença é que no Advaita Visishtadvaita, o Brahman
tem atributos específicos, incluindo as almas individuais conscientes e a
matéria, ou seja, Brahman, a matéria e as almas individuais são distintos, mas
inseparáveis. Ensina que a realidade possui três aspectos: Ishvara (Vishnu), cit
(alma) e acit (matéria). Vishnu é a única realidade independente, enquanto que
a alma e a matéria são dependentes de Deus para a sua existência.
Dvaita Vendanta (dualismo): proposta por Madhwacharya. É também
referido como tatvavādā - A Filosofia da Realidade. Identifica Deus com
Brahman, e por sua vez, com Vishnu, ou as suas várias encarnações (Krishna,
Narasimha, Srinivasa etc). É também conhecida como a filosofia Vaishnava
que se diferencia da escola Vishishtadvaita (conhecida por Sri-Vaishnavism).
Esta escola defende também que Bhakti é como o caminho para a libertação
(sattvic) enquanto que o ódio (Dvesha) e indiferença para com o Deus vai levar
o indivíduo para o inferno eterno e escravidão eterna. A libertação é o estado
para atingir a máxima alegria, que é concedido às almas individuais (no final do
seu sadhana), baseado na disposição das almas. O Achintya-Adbhuta shakti
(poder incomensurável) de Vishnu é visto como a causa eficiente do universo e
da matéria primordial ou Prakriti é a causa material.
Dvaitadvaita: proposta por Nimbarka, com base numa anterior escola
chamada bhedabheda, que foi ensinado por Bhaskara. De acordo com esta
escola, o Jivatman é diferente de Brahman. Nesta escola, Deus é visualizado
como Krishna.
Shuddhadvaita: proposta por Vallabha. Este sistema também identifica
Bhakti como o único meio de libertação.
Achintya bhedabheda: proposta por Chaitanya Mahaprabhu (Bengala,
1486-1534). Ele era um seguidor da Vedanta Dvaita do Sri Madhwacharya.
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Esta é uma filosofia de "inconcebível unidade e diferença" é seguido por uma
série de modernos movimentos Gaudiya Vaishnava, incluindo ISKCON.
Purnadvaita ou Advaita Integral: Segundo os seus seguidores, Sri
Aurobindo, esta sub-escola sintetiza todas as escolas da Vedantas e tem uma
visão mais abrangente, integrando sugestões da metafísica ocidental e da
ciência moderna. Diz-se ser o restaurado da ligação umbilical entre o
Vedantas com o Vedas.
Modern Vedanta (revivalismo hindu): o termo "Vedanta moderno", que é por
vezes utilizado para descrever a interpretação do Advaita Vedanta, ressalta-se
que:
Apesar de Deus ser a realidade absoluta, o mundo tem uma realidade
relativa. Não deve, portanto, ser completamente ignorado;
Condições de pobreza extrema deve ser eliminado, pois só assim as
pessoas serão capazes de transformar as suas mentes na direcção de
Deus;
Todas as religiões estão a esforçar-se em percorrer o caminho para
alcançar a verdade suprema. As disputas devem ser por isso
abandonadas, e deve ser praticada a tolerância religiosa.
Vivekananda viajou até ao Parlamento das Religiões do Mundo em Chicago
em 1893, e tornou-se numa figura influente na síntese de pensamento
oriental e ocidental. Desempenhou um papel importante na difusão do
Vedantas nas nações ocidentais. A sua viagem, até o Ocidente, foi
criticada por alguns hindus ortodoxos. Os seus defensores afirmam que ele
conseguiu renascer o Vedantas, por entender como poderia ser aplicada ao
mundo moderno, e investindo-o com seu próprio espírito. Para
Vivekananda, Vedantas não era algo seco ou esotérico, mas uma
abordagem de vida em busca do auto-conhecimento. Na sua interpretação
do Advaita (como em Shankara), ainda há um lugar para Bhakti (devoção).
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Os cinco elementos - Pancha Maha Bhutas
“Deste Eu surgiu o espaço; do espaço, o ar, do ar, o fogo; do fogo, a água, e a
terra; da terra, as ervas; das ervas, o alimento; do alimento, o Homem.”
[in Taittiriya Upanishad]
O ser humano possui cinco órgãos dos sentidos, podendo assim captar o
mundo de cinco maneiras diferentes. Os órgãos dos sentidos são os ouvidos, a
pele, os olhos, a língua e o nariz. Cada um deles tem uma maneira única de
captar uma forma especial de energia externa e de a absorver para dentro do
corpo. As cinco energias, ou elementos, que são captadas pelos cinco sentidos
ou cinco elementos (ou pancha maha bhutas). São conhecidos pelos nomes:
Akasha (éter)
Vayu (ar)
Tejas (fogo)
Jala (água)
Prthivi (terra)
É importante reconhecer que as tradições não exprimem, nem podem exprimir,
o verdadeiro sentido das palavras sânscritas originais. Por exemplo, ao traduzir
“jala mahabhuta” por “água” não se refere á imagem mental da água vulgar no
organismo, mas sim às forças coesas entre as moléculas e o seu poder de
atracção. Assim, todos os elementos modernos (descritos na Tabela periódica)
podem ser classificados nas categorias mais práticas dos cinco mahabhutas.
Apesar dos mahabhutas serem completamente distintos entre si, partilham
atributos comuns, como: protões, neutrões, electrões e outras partículas sub-
atómicas. Por conseguinte, as forças que operam dentro dos átomos e que
atraem e mantêm os electões na proximidade do núcleo representam jala
(água). A quantidade de energia que se desprende com a cisão do átomo e a
energia latente que está presente quando intacto, reflectem os atributos do
tejas (fogo). A força que faz girar os electrões á volta do seu núcleo demonstra
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os traços dominantes do vayu (ar), e o espaço em que se move representa o
akasha (éter). E é assim que os cinco grandes elementos existem em todas as
formas de matéria.
De acordo com o Ayurveda, no inicio do mundo existia um estado não
manifesto de conhecimento puro. A partir desse estado começaram a
manifestar-se as vibrações do primeiro som, o som OM inaudível. Foi a partir
daqui que nasceu o elemento éter. Algum tempo depois, o éter começou a
manifestar-se, dando origem ao elemento ar. O movimento do éter produziu
fricção a partir do qual surgiu o calor. Das partículas deste calor primário
formou-se a luz que gerou o elemento fogo. Através do calor do fogo
dissolveram-se e liquidificaram-se algumas partes de éter, dando origem à
água. A água solidificou-se, formando as moléculas do elemento terra. Como
tal, a partir do som divino de OM surgiu o éter do qual surgiram os outros
elementos.
Todas as substâncias orgânicas e inorgânicas derivam da terra: os seres vivos
do reino vegetal (ervas, grãos e árvores) e todo o reino animal (incluindo o
Homem). A terra também inclui as formas inorgânicas que constituem o reino
mineral. Assim, toda a matéria em toda a sua diversidade deriva dos cinco
elementos.
Elemento Mahabhuta Sentido Órgão Qualidades do elemento
Éter Akasha Audição Ouvidos Som subtil, não resistente,
(espaço) iluminado, leve
Ar Vayu Tacto Pele Pressão, frio, duro, seco
Fogo Tejas Visão Olhos Calor, leve, activo. Claro,
acídico
Água JalPrthivia Paladar Língua Líquido, frio, viscoso,
suave
Terra Olfacto Nariz Sólido, pesado, estável,
lento, imóvel
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O tridosha e a sua relação com o pancha maha bhutas
Embora toda a matéria seja composta pelos cinco elementos, apenas a matéria
viva possui os doshas ou tridosha, as três forças que governam todos os
processos biológicos. Dosha significa “aquilo que escurece ou causa a
decadência” e eles são: Pitta, Vata e Kapha. Quando os doshas estão em
desequilíbrio, inicia-se o processo da doença.
Os doshas formam-se a partir dos cinco maha bhutas e podem ser
considerados como os três princípios energéticos que regulam o processo
fisiológico e psicológico do organismo vivo. Os doshas regulam tudo: desde o
processo celular mais básico aos aspectos complexos do funcionamento
biológico. A sua interacção determina a condição subjectiva do ser vivo. O
estado harmonioso dos três doshas cria o equilíbrio fisiológico (em termos
modernos, a homeostase), sendo a base de um bom estado de saúde.
Quaisquer desequilíbrio dos tridoshas manifestam-se em variados sinais e
sintomas.
Cada dosha é composto de dois maha bhutas, recebendo deles o seu carácter
específico. Os elementos éter e ar combinam-se no vata, o fogo e a água
regulam a formação do pitta e a água e a terra o kapha. Assim o vata tem a
mobilidade do éter e do ar, o pitta a energia do fogo e o kapha a estabilidade e
a solidez da terra.
Também a palavra vata significa “o que move as coisas”, é por vezes traduzida
por “vento”. É a força móvel por trás dos outros dois doshas, considerando-se
que eles não se podem mover sem o primeiro. É responsável por todas as
actividades e sensações do corpo. É o que canaliza as percepções através dos
canais sensoriais apropriados, as converte em acontecimentos psicológicos e
dirige a resposta adequada através dos órgãos de acção. É responsável pela
entrada e saída do ar dos pulmões, pelo movimento do sangue no sistema
circulatório e dos pensamentos através da mente. Promove o equilíbrio mental
e a compreensão.
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Pitta significa “o que digere as coisas”. É responsável por todas as
transformações químicas e metabólicas do corpo, bem como pela produção de
calor. Governa a nossa capacidade de digerir as ideias e impressões e de
captar a verdadeira natureza da realidade. Estimula o intelecto e fornece o
entusiasmo.
Kapha fornece o alimento e a substância ao corpo. Significa “aquilo que
mantém a união”, Concebe todas as estruturas, desde a célula ao esqueleto.
Oferece força e estabilidade, tanto física como psicológica, e governa as
emoções humanas, como o amor, a compaixão, o perdão, a lealdade e a
paciência. Torna o corpo resistente às doenças e auxilia o processo de cura.
Enquanto os efeitos do vata e do pitta são activos, o kapha restringe estas
duas forças, evitando a sua manifestação excessiva. Juntos, os três doshas
governam todas as actividades da vida: catabolismo (vata), metabolismo (pitta)
e anabolismo (kapha). Por isso se considera que o indivíduo possui os três
doshas, embora possa ter um (ou dois) em prevalência.
Conclusões (notas pessoais)
Com este trabalho fica descrito o processo de origem do conhecimento védico,
assim como a sua filosofia. O seguidor védico aceita o sastra como sendo a
palavra do Eu Supremo, e a sua consequente verdade, ou seja, não há
necessidade de se comprovar as verdades apresentadas nos Vedas, pois elas
são reais e só quem as vive e compreende encontra a paz e a sua finalidade.
Além disso os seguidores védicos entendem as causas de todas as causas,
não pelo conhecimento material, mas ouvindo o seu Eu Superior. Os segredos
desta vida espiritual estão acessíveis a todos, independentemente da raça,
extracto social, etc.
A Medicina Ayurvédica tem uma base religiosa em crenças, mas que consegue
relacionar o bem estar mental e espiritual com o físico, nunca os dissociando. E
esta á a verdadeira base para a VIDA e do CRESCIMENTO INDIVIDUAL!
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Referências bibliográficas:
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Tradução portuguesa. Editorial Estampa, Lisboa, Potugal, pp 15-29.
Lie, S (2007) “Ayurveda” Teach yourself collection
Língua Inglesa. Bookpiont editor, Oxon, UK, pp 1-16.
Kishore, B.R. (2003) “Atharvveda”
Língua Inglesa. Diamond Books editor, New Delhi, Índia.
Shattuck, C. (1999) “Hinduísmo”
Tradução portuguesa. Edições 70, Lisboa, Portugal, pp 11- 34
Travassos, L. (2005) “Hinduísmo”
Língua portuguesa. Editora Anjo Dourado, Mafra, Portugal, pp 25 – 28
Pó, M. (2009) “Sebenta da disciplina de Medicina Ayurvédica”
Língua portuguesa. pp 12- 18.
Goswami, S.D. (2002) “Introdução á Filosofia Védica”
Língua portuguesa (brasileira), Editora Bhaktivedanta book trust, 2ª edição
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