O documento descreve as características da narrativa brasileira após 1960, incluindo a experimentação, fusão de gêneros e estilos realistas. Aponta Rubem Fonseca como um expoente do hiperrealismo, que retrata a violência, sexo e marginalidade de forma crua.
2. LINHAS GERAIS
da narrativa brasileira depois de 1960
experimentação;
fusão de gêneros e de espécies literárias;
narrativas com tonalidades e técnicas romanescas;
recorte;
impacto do alargamento do jornalismo moderno;
ficcionalização de espécies como a crônica e a biografia;
ruptura com a escrita tradicional: elegante, realista e verossímil;
boom da narrativa de fôlego curto [conto].
4. RUBEM FONSECA
e a narrativa brasileira depois de 1960
Apaguei
as
luzes
e
acelerei
o
carro.
Tinha
que
bater
e
passar
por
cima.
Não
podia
correr
o
risco
de
deixá-‐la
viva.
Ela
sabia
muita
coisa
a
meu
respeito,
era
a
única
pessoa
que
havia
visto
o
meu
rosto,
entre
todas
as
outras.
E
conhecia
também
o
meu
carro.
Mas
qual
era
o
problema?
Ninguém
havia
escapado.
BaE
em
Ângela
com
o
lado
esquerdo
do
pára-‐lama,
jogando
o
seu
corpo
um
pouco
adiante,
e
passei,
primeiro
com
a
roda
da
frente
–
senE
o
som
surdo
da
frágil
estrutura
do
corpo
se
esmigalhando
–
e
logo
atropelei
com
a
roda
traseira,
um
golpe
de
misericórdia,
pois
ela
já
estava
liquidada,
apenas
talvez
ainda
senEsse
um
distante
resto
de
dor
e
perplexidade.
Quando
cheguei
em
casa
minha
mulher
estava
vendo
televisão,
um
filme
colorido,
dublado.
FONSECA,
Rubem.
Passeio
noturno.
In.:
Contos
reunidos.
São
Paulo:
Companhia
das
Letras,
2001.
5. ULTRARREALISMO ou HIPERREALISMO
a narrativa brasileira depois de 1960
características
violência
dos
temas
e
dos
recursos
técnicos;
noEcia
crua
da
vida;
denúncia
explícita;
caráter
transparente
e
documental.
autores
Rubem
Fonseca
Sérgio
Sant’Anna
Ferréz
Paulo
Lins
André
Sant’Anna
6. RUBEM FONSECA
e a narrativa brasileira depois de 1960
Dei
uma
magnum
pro
Pereba,
outra
pro
Zequinha.
Prendi
a
carabina
no
cinto,
o
cano
para
baixo,
e
vesE
uma
capa.
Apanhei
três
meias
de
mulher
e
uma
tesoura.
Vamos,
eu
disse.
Puxamos
um
Opala.
Seguimos
para
os
lados
de
São
Conrado.
Passamos
várias
casa
que
não
davam
pé,
ou
tavam
muito
perto
da
rua
ou
Enha
gente
demais.
Até
que
achamos
o
lugar
perfeito.
Tinha
na
frente
um
jardim
grande
e
a
casa
ficava
lá
no
fundo,
isolada.
A
gente
ouvia
barulho
de
música
de
carnaval,
mas
poucas
vozes
cantando.
Botamos
as
meias
na
cara.
Cortei
com
a
tesoura
os
buracos
dos
olhos.
Entramos
pela
porta
principal.
Eles
estavam
bebendo
e
dançando
num
salão
quando
viram
a
gente.
É
um
assalto,
gritem
bem
alto,
para
abafar
o
som
da
vitrola.
Se
vocês
ficarem
quietos
ninguém
se
machuca.
Você
aí,
apaga
essa
porra
dessa
vitrola.
FONSECA,
Rubem.
Feliz
ano
novo.
In.:
Contos
reunidos.
São
Paulo:
Companhia
das
Letras,
2001.
7. TEMAS RECORRENTES
a narrativa hiperrealista de Rubem Fonseca
solidão
violência
eroEsmo
marginalidade
incomunicabilidade
8. RUBEM FONSECA
e a narrativa brasileira depois de 1960
Ela
estava
grávida,
ele
disse
apontando
a
mulher,
vai
ser
o
nosso
primeiro
filho.
Olhei
a
barriga
da
mulher
esguia
e
decidi
ser
misericordi-‐
oso
e
disse,
puf,
em
cima
de
onde
achava
que
era
o
umbigo
dela,
desen-‐
carnei
logo
o
feto.
A
mulher
caiu
emborcada.
Encostei
o
revólver
na
têmpora
dela
e
fiz
ali
um
buraco
de
mina.
FONSECA,
Rubem.
O
cobrador.
In.:
Contos
reunidos.
São
Paulo:
Companhia
das
Letras,
2001.
9. A VIOLÊNCIA
a narrativa hiperrealista de Rubem Fonseca
aparece na linguagem, na escrita, nas descrições das cenas e nos diálogos;
é retratada com alto grau de verossimilhança;
paródia/pastiche do gênero policial: reflexão sobre o homem contemporâneo;
faz parte do cotidiano [é intrínseca ao homem e ao sistema].
10. RUBEM FONSECA
e a narrativa brasileira depois de 1960
AErei
bem
no
meio
do
peito
dele,
esvaziando
os
dois
canos,
aquele
tremendo
trovão.
O
impacto
jogou
o
cara
com
força
contra
a
parede.
Ele
foi
escorregando
lentamente
e
ficou
sentado
no
chão.
No
meio
do
peito
dele
Enha
um
buraco
que
dava
para
colocar
um
panetone.
FONSECA,
Rubem.
Feliz
ano
novo.
In.:
Contos
reunidos.
São
Paulo:
Companhia
das
Letras,
2001.
11. O SEXO
a narrativa hiperrealista de Rubem Fonseca
aparece retratado de forma naturalista;
quase sempre aparece relacionado à violência;
é animalizado e desenfreado e parece não saciar as personagens.
12. RUBEM FONSECA
e a narrativa brasileira depois de 1960
Roberto
morde
as
bochechas
de
Paula,
abraça
o
corpo
dela
como
um
urso,
ela
abre
caminho
para
que
ele
entre
no
corpo
dela,
meu
amor
diz
que
adora
foder
comigo,
rolam
pela
cama
larga,
ele
fica
em
cima,
ela
fica
em
cima,
diz
que
me
ama,
ele
diz
tudo
o
que
ela
quer
que
ele
diga,
e
quando
ele
goza
um
trem
de
ferro
passa
por
cima
dele
e
ele
urra
como
um
animal
ferido
de
morte.
FONSECA,
Rubem.
Histórias
de
amor.
In.:
Contos
reunidos.
São
Paulo:
Companhia
das
Letras,
2001.
13. A MARGINALIDADE
a narrativa hiperrealista de Rubem Fonseca
é o eixo transgressor das narrativas;
visa à ruptura do sistema e à denúncia das mazelas sociais;
aparece associada à exclusão social e à maldade;
a maldade atravessa todas as classes sociais: é inerente ao homem.
14. RUBEM FONSECA
e a narrativa brasileira depois de 1960
Subi.
A
gordinha
estava
na
cama,
as
roupas
rasgadas,
a
língua
de
fora.
MorEnha.
Pra
que
ficou
de
flozô
e
não
deu
logo?
O
Pereba
tava
atrasado.
Além
de
fudida,
mal
paga.
Limpei
as
jóias.
A
velha
tava
no
corredor,
caída
no
chão.
Também
Enha
baEdo
as
botas.
Toda
penteada,
aquele
cabelão
armado,
pintado
de
louro,
de
roupa
nova,
rosto
encarquilhado,
esperando
o
ano
novo,
mas
já
tava
mais
pra
lá
do
que
pra
cá.
Acho
que
morreu
de
susto.
Arranquei
os
colares,
broches
e
anéis.
Tinha
um
anel
que
não
saía.
Fiquei
puto
e
dei
uma
dentada,
arrancando
o
dedo
dela.
FONSECA,
Rubem.
Feliz
ano
novo.
In.:
Contos
reunidos.
São
Paulo:
Companhia
das
Letras,
2001.
15. A ESCRITA
a narrativa hiperrealista de Rubem Fonseca
linguagem enxuta, direta;;
oralidade;
convivência de registro elevado com coloquialismos;;
convivência do calão com refinados jogos intertextuais.
16. RUBEM FONSECA
e a narrativa brasileira depois de 1960
Os
despojos
da
vaca
estão
estendidos
numa
poça
de
sangue.
João
chama
com
um
assobio
os
seus
dois
auxiliares.
Um
deles
traz
um
carrinho
de
mão.
Os
restos
da
vaca
são
colocados
no
carro.
Na
ponte
fica
apenas
a
poça
de
sangue.
FONSECA,
Rubem.
Relato
de
ocorrência.
In.:
Contos
reunidos.
São
Paulo:
Companhia
das
Letras,
2001.